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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Considero extremamente arbitraria esta distincção entre a prerogativa real e o seu exercicio.

E considero-a arbitraria, porque a carta constitucional se reservou o direito de regular o seu exercicio, prescrevendo o modo como deveria ser exercida aquella prerogativa. Nada deixou pois para1 regular ás leis ordinarias.

O artigo 110.° determina, que os conselheiros d'estado serão ouvidos nos actos em que o poder moderador tiver de exercer a sua prerogativa com excepção da nomeação dos ministros; o artigo 111.º declara que os conselheiros d'estado são responsaveis pelo voto que derem quando consultados pelo poder moderador.

Está já portanto perfeitamente regulado o exercicio do poder moderador. O mesmo se não póde dizer quanto ás faculdades o attribuições do poder executivo, porque n'esse ponto a carta não só suppõe a existencia de leis ordinarias para regular o seu exercicio, mas ale a estas se refere muitas vezes. E por isso as côrtes, no uso dos seus poderes ordinarios, têem regulado o exercicio das attribuições do poder executivo.

Mas, sr. presidente, permitta-me v. ex.ª que eu diga, que não comprehendo como possa ser regulado por leis ordinarias o exercicio das funcções do poder moderador, quando este poder e a chave da organisação politica, e está collocado sobranceiro aos outros poderes! (Apoiados.)

O artigo 74.° § 1.° da carta diz: «o Rei exerce o poder moderador, nomeando os pares sem numero lixo». O artigo 75.°, diz: «o Rei é o chefe do poder executivo e o exercita pelos seus ministros d'estado». O artigo 102.° diz: «que os ministros d'estado assignam e referandam todos os actos do poder executivo». O artigo 110.° declara: «que os conselheiros d'estado serão ouvidos em todos os negocios graves e em todas as occasiões em que o Rei se proponha exercer qualquer das attribuições do poder moderador com excepção da nomeação e demissão dos ministros». E o artigo 111.° determina, «que os conselheiros d'estado são responsaveis pelo voto que derem ao Rei quando consultados sobre o exercicio das funcções do poder moderador».

Aqui tem v. ex.ª como o poder moderador está organisado. Segundo este systema, este poder não tem responsabilidade. O artigo 72.° diz, que a pessoa do Rei é inviolavel e sagrada o não está sujeita a responsabilidade alguma.

Ora, se nós vamos a regular o exercicio do poder moderador, havemos de admittir que o Rei póde violar as disposições legaes que regularem esse exercicio, e n'esse caso havemos de admittir a responsabilidade de tal violação; mas se, o Rei a não tem, para que serve regular o exercicio das funcções do poder moderador? (Apoiados.) O Rei é irresponsavel no uso das suas attribuições. Nós regulâmos o seu exercicio. Declarâmos por exemplo, que não póde nomear pares senão uns certos individuos. O Rei deixa de obedecer ás prescripoões regulamentares, que nós lhe impomos. Não cumpre os preceitos da lei. Abusa das suas attribuições. Qual é a consequencia? Vamos pedir-lhe responsabilidade pela violação da lei? Não podemos. (Apoiados.) Logo, para que vamos regular o exercicio das suas attribuições?

(Interrupção.)

Temos a responsabilidade dos ministros! Os ministros respondem pelos actos do poder executivo, mas não podem responder pelos actos do poder moderador, que segundo a carta não tem responsabilidade, nem são sujeitos a referenda. E se respondem, annullam e supprimem em proveito do poder executivo as prerogativas do poder moderador. Não ha então differença entre os dois poderes.

Poderão dizer-me que os actos do poder moderador todos têem responsabilidade, porque essa é a doutrina recebida, e a praxe geralmente acceite entre nós. Mas isso é uma heresia em face da carta. Os actos do poder moderador, segundo esta, não têem responsabilidade. Os actos do poder executivo, de que o Rei e chefe, são exercidos pelos ministros; os do poder moderador são exercidos directamente

pelo Rei, sendo só responsaveis os conselheiros d'estado pelos conselhos que lhe derem. Logo os actos do poder moderador não são sujeitos a responsabilidade alguma.

É mais isto? Talvez, mas essa reforma faz-se em côrtes constituintes. É o que determina a constituição do reino. Quando quizermos traduzir em lei o que na pratica já se obserya de ha muito tempo, isto é, acabar a differença entre os actos do poder moderador e do poder executivo, collocando-os todos igualmente sob a responsabilidade dos ministros, poderemos fazel-o, mas em côrtes constituintes e pelos meios designados na carta. Mas regular por uma lei ordinaria o exercicio das funcções do poder moderador é evidentemente atacar a constituição. O exercicio das funcções do poder moderador não póde ser regulado. Se o Rei abusa, a responsabilidade que de ahi possa resultar, é só moral, porque não temos direito de exigir-lhe nenhuma responsabilidade legal quando a carta declare que elle exerce, não pelos seus ministros, mas por si proprio, as attribuições do poder moderador, e que por ellas é irresponsavel.

Se queremos alterar esta instituição, se pretendemos organisar o poder moderador por outra fórma, se desejâmos sujeitar todos os actos do poder moderador á responsabilidade que acompanha os actos do poder executivo, façamos uma lei constitucional. Todos os partidos d'este paiz têem proposto reformas da carta mais ou menos adiantadas, não devendo portanto haver grande difficuldade em tratar d'esse assumpto. Reveja-se legalmente a constituição, mas pela fórma e segundo o processo ali prescripto. Mas por uma lei ordinaria não podemos regular o exercicio das funcções do poder moderador. E eu fiquei na verdade maravilhado de ver que o sr. presidente do conselho, na camara dos pares, pronunciou ha poucos dias estas phrases: «Insisto em que ha tanto direito para regular o exercicio do poder executivo, como ha direito para regular o exercicio do poder moderador».

Oh! Sr. presidente! D'esta maneira, com um traço de penna, nós supprimimos a distincção entre o poder moderador e o poder executivo. Qual é a distincção que fica havendo entre os actos do poder moderador e os do executivo, quando se determine que o exercicio do poder moderador póde ser regulado por uma lei ordinaria, e que os ministros são responsaveis igualmente pelos actos do poder moderador como o são pelos do poder executivo? Não sei qual é a differença constitucional que fica distinguindo os dois poderes. (Apoiados.)

O Rei, depois de vingar esta doutrina, como disposição legislativa, passa a ser simplesmente chefe do poder executivo. Deixou de ser depositario do poder moderador.

Insisto, pois, em ponderar á camara a necessidade de explicações categoricas a este respeito, porque o projecto tem um alcance revolucionario, que á primeira vista se não comprehende, mas que eu logo direi. (Apoiados.)

Regular o exercicio dos actos do poder moderador é o mesmo que impor ao Rei ou aos ministros a responsabilidade d'esses actos. Os ministros não podem ser responsaveis por taes actos, porque os ministros só respondem pelos actos do poder executivo. Logo, a quem se ha de impor a responsabilidade? Ao Rei? Ao Rei não póde ser, porque o Rei, segundo a carta é irresponsavel.

Eu já disse que a responsabilidade dos ministros só póde exigir-se pelos actos do poder executivo, e agora acrescento que tambem se póde e deve exigir por qualquer acto do poder executivo que dê execução ás resoluções do poder moderador, mas só desde esse momento em diante, porque até ahi, e emquanto o poder moderador delibera no uso das suas attribuições, o poder executivo não póde tomar a responsabilidade d'essas attribuições, porque legalmente a não tem. É absolutamente impossivel exigir responsabilidade das attribuições do poder moderador, porque elle não é responsavel.

Mas eu disse ha pouco que este projecto é eminente-

Sessão de 16 de abril de 1878