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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Pois bem, estava eu em França quando li n'um jornal que no dia 24 de julho se tinha feito a revista tal qual como d'antes, e fiquei convencido de que estas revistas, de que estes actos de ostentação não são tão condemnaveis como parece ao illustre deputado. (Apoiados.)
Vozes: — Muito bem.
(S.'ex.ª não revê os seus discursos.)
O sr. Pinheiro Chagas: — O governo que se senta n'aquellas cadeiras é apoiado energicamente pela maioria parlamentar. (Apoiados da direita)
A maioria parlamentar representa legitimamente a opinião publica. (Apoiados da direita) A maioria parlamentar está consubstanciada com o pensamento do governo. (Apoiados da direita.),;
O sr. Fontes declara que precisa muitas vezes abdicar do sou pensamento para transigir com a opinião publica! (Apoiados da esquerda)
Oh! illustres representantes da opinião publica. Oh! legitimes representantes da opinião publica, para que precisaes transigir com á opinião que representaes? (Muitos apoiados.) Oh! illustres é legitimos representantes da opinião publica, que ouvis o sr. presidente do conselho dizer-vos, a vós que o apoiaes, que tem de abdicar do seu pensamento, que vós sustentaes energicamente, para transigir com a opinião publica, de que sois legitimos representantes!
O sr. Adolpho Pimentel: — N'essa mesma transigencia representamos a opinião publica.
O Orador: -—O anno passado, sr. Adolpho Pimentel, a maioria que apoiava o governo, representando a opinião publica, votou a lei do imposto do real de agua; a opposição, que não representava a opinião publica, combatia esse importo. E o imposto não foi applicado, porque o sr. presidente do conselho transigiu com a opinião publica, que não era do certo a opinião publica representada aqui por aquella maioria. (Muitos apoiados.)
¦ O sr. Fontes disse que era difficil conhecer onde estava a opinião publica, porque não se linha ainda descoberto um instrumento que podesse indicar o meio do a reconhecer, e comtudo, o sr. Fontes conheceu que a opinião publica estava com h opposição, tanto na questão do real de agua, como na de Tancos.
Elle mesmo o confessou.
E, transigindo com ella, reconheceu que a voz da opinião não era a voz da maioria. -(Apoiados)
É costume, diz o sr. presidente do conselho, as opposições declararem sempre que representam a opinião, e que a maioria não é a sua legitima representante.
E possivel que assim aconteça, mas muitas vezes as opposições acertam, que muitas vezes tambem é justa e verdadeira a sua accusação. (Apoiados.)
Quando aqui se discutiram as ultimas eleições, parece-me que a opposição demonstrou largamente que tinha plenissimo direito para dizer que a maioria não representava a opinião publica, que não era a legitima representante do paiz. (Apoiados)
Está na memoria do todos o modo como se fizeram as ultimas eleições.
Diz o sr. Fontes que a accusação de que o exercito se emprega nas eleições, é antiga, e mostrou que o exercito por occasião do uma eleição na Madeira, foi empregado para restabelecer a ordem.
Para "manter em qualquer acto da vida social a ordem é que é destinado o exercito; mas não se estabeleceu decerto para. entrar nas igrejas, quando se votava; (Apoiados.) de fórma que se fizessem os escrutinios a sombra das bayonetas, (Apoiados.) nem para dar tiros nas ruas de Moncorvo, nos dias de eleição. (Apoiados.)
Não foi para isso que se estabeleceu o exercito o quando se praticam taes actos, e quando o exercito é obrigado a descer a o:Áe caminho, a opposição tem direito a dizer que o exercito não se fez para violentar a consciencia dos
eleitores, nem para fazer eleger deputados á vontade do governo. (Apoiados.)
¦ Sr. presidente, eu não quero tratar do assumpto das eleições, não quero saír da materia do projecto, mas não posso deixar de dizer, que foi o sr. presidente do conselho que 'ainda hontem nos chamou para a questão das eleições e que não me posso eximir a acompanhal-o a esse terreno.
Não nos veiu s. ex.ª aqui citar a maneira como procedera com o sr. Cunha Monteiro, candidato governamental por Villa Nova do Famalicão, querendo mostrar assim que se não prestava a viciações no recenseamento, e que punira um facultativo militar, logo que lhe tinham aportado alguns actos pouco regulares que esse facultativo praticara na inspecção dos recrutas?
Pois então eu citarei um facto que mostra bem que a resolução tardia do sr. presidente do conselho não mostrava um desejo sincero de impedir irregularidades que redundassem em proveito das candidaturas sociaes.
O sr. presidente do conselho tomou em tempo uma medida para evitar as viciações das leis do recrutamento pelos cirurgiões militares.
S. ex.ª estabeleceu que os cirurgiões militares fossem fazer as inspecções dos recrutas nos districtos a que não pertencessem, o assim, por exemplo, os cirurgiões militares do districto do Porto iam para Villa Real ou Bragança, e vice-versa.
Isto era para evitar que as relações de amisade e do familia, os empenhos dos amigos podessem influir no julgamento dos inspectores. Para subtrahir a consciencia dos facultativos a estas pressões embaraçosas é que o sr. ministro da guerra organisou essas commissões do inspecção.
Mostrava assim que queria ver comprida a lei, a lei do recrutamento. Mas emquanto tomava esta medida consentia que o cirurgião militar o sr. Cunha Monteiro inspeccionasse recrutas no circulo onde o proprio sr. Cunha Monteiro era candidato a deputado.
Recciava a pressão dos amigos, dos parentes, dos conhecidos no animo dos cirurgiões residentes na terra onde tinham de ser inspectores, o expunha um candidato a deputado ás pressões que haviam do exercer na sua consciencia os seus eleitores, áquelles do quem estava dependente a sua victoria, áquelles cujos votos ia supplicar. (Apoiados.)
Como póde allegar então que queria impedir a viciação do recrutamento? Para que consentiu n'esse facto? O resultado foi o que se viu. Para o prever não era necessario ser propheta, e o sr. Fontes, que e, apesar do que diz o provérbio, um grande propheta, mesmo na sua terra, podia perfeitamente adivinhal-o. Podia prevenir o mal, preferiu aproveital-o e punil-o. (Apoiados.)
O sr. ministro da guerra fez hoje, em resposta ao sr. Rodrigues de Freitas, algumas considerações sobre o serviço militar obrigatorio, que o sr. Fontes é o primeiro a reconhecer que é util e necessario, muitas vezes tem dito que é esse o seu pensamento pessoal, que quer o serviço obrigatorio, mas que o não propõe nem o estabelece.
Portanto, o que vejo é que o serviço obrigatorio só será posto em pratica quando estiver n'aquellas cadeiras um ministro da guerra que declare ao parlamento que é completamento adverso ao serviço obrigatorio. (Riso.) Assim realmente não é possivel adivinhar pelo programma de um governo qual a marcha que hão de seguir os negocios publicos.
Effectivamente todos suppõem que quando um ministro tem um certo pensamento e está no poder trata do o executar, mas não acontece isto com o sr. ministro da guerra. S. ex.ª declara-nos o seu pensamento, mas declara-nos tambem que procederá em sentido absolutamente contrario. (Apoiados)
De modo que não póde o paiz imaginar sequer qual será o caminho que ha do tomar a administração publica, nem avaliar pelas suas declarações se lhe convem ou não a permanencia d'este governo no poder. (Apoiados)
Sessão de 4 do abril de 1879