O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1254 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Estamos cançados de ler isto nos livros de philosophia utopista, nas declamações dos clubs, e nas expansões da politica barata, feita ao ar livre.
No seio de uma academia, era que se educam as intelligencias jovens, podem, devem desenvolver-se as theorias e os principios puros, que hão de educar e fazer expandir os espiritos juvenis, para que n'elles brotem todas as aspirações nobres, que constituem a mais sublime feição da alma humana.
Se desde logo arrastássemos as tenras intelligencias á desillusão dos factos, e ás contrariedades da experiencia e observação, o espirito retrahir-se-ía logo; acabaria pela indifferença ou pelo scepticismo, a mais terrivel doença do homem que pensa e observa!
Depois o mundo pratico modifica, pela força natural das resistencias e attritos sociaes, a expansão indefinida dos ideaes do espirito, que são o estimulo o constante fóco de attração de todas as suas actividades. Sr. presidente. O meio da governação publica é essencialmente positivo, util e pratico. Os principios e as theorios não são o criterio unico das reformas.
O elemento pratico, determinado pelo genio, raça, costumes, tradições, grau de perfectibilidade e necessidades predominantes, é fundamental em todas as reformas organicas, para que, modificando, ampliando ou restringindo os principios theoricos, converta estas n'uma utilidade pratica, e não sejam uma justa posição violenta ou esteril.
Vejamos, sr. presidente, se o complexo geral das reformas do projecto satisfaz ao verdadeiro fim d'ella, o forte remodelamento dos poderes politicos, em ordem a poderem vencer, pelos meios normaes, as resistencias do meio politico em que vivemos.
No artigo 1.° do projecto declara-se que os deputados não são representantes de circulos que os elegem, mas sim da nação.
Esta doutrina, sr. presidente, estava formulada no artigo 12.° da constituição e mais conscienciosamente.
As cousas são o que são, e não o que cada um quer que sejam.
Esta prohibição, imposta aos deputados, de não poderem representar os seus circulos, perece-me, salvo o devido respeito, uma negação dos principios mais elementares do direito publico, uma inutilidade pratica.
Á excepção dos deputados por accumulação, todos os restantes representam a vontade e interesses dos circulos, circulos que os elegeram. A consideração dos interesses nacionaes é uma norma que natural e necessariamente se impõe ao nosso espirito, para que os interesses locaes não prejudiquem, antes se harmonisem com os interesses geraes do paiz.
É tal a solidariedade reciproca d'estas duas concepções, que uma suppõe a outra.
Supposto, porém, e não admittido, que esta separação podia fazer-se na pratica, qual o meio de tornar effectiva similhante disposição?
Mas, agora, muito á puridade, sr. presidente, que vantagens resultariam para a organisação viril dos poderes politicos parlamentares d'uma disposição tão cathegorica?
O deputado não seria sempre o que é, porque não póde deixar de o ser, o procurador dos seus eleitores e do seu circulo perante os poderes publicos?
Não tem elle de promover no parlamento os interesses legitimos das localidades?
Por isso eu, sr. presidente, hei de propor na especialidade a emenda d'este artigo - acrescentando a palavra só e ficando - ou só dos circulos que os elegeram.
Sr. presidente, a proposta enunciada no artigo 2.° do projecto é inconveniente e prejudicial. Consultar de tres em tres annos a vontade do paiz, para seguir a corrente da opinião, é uma idéa de plnlosophia pura, e sem attenção ás condições do meio em que vivemos.
Pois o acto eleitoral representa porventura a consciencia do paiz? Alguem acredita em tão grande ingenuidade? A auctoridade e a influencia local é que fazem a eleição.
Que compromissos, que despezas, que incommodos, transtornos e animosidades não deixa esta grande mentira social?!
Parece pouco que estas scenas se repitam de quatro em quatro annos?
A reforma não dá tempo a respirar sequer. Que volubilidade é essa de opinião que é preciso consultal-a, do tres em tres annos, para a boa direcção dos negocios publicos?
Peço mais um anno de descanço para os que se envolvem na faina eleitoral, e uma lição de menos para a corrupção dos costumes publicos!
Esta reforma, em vez de fortificar, enfraquece os poderes politicos, pela dependencia mais approximada que cria todo o acto eleitoral.
N'este sentido propuz uma substituição para que seja mantido o artigo 17.° da constituição que marca o praso de quatro annos para a duração de cada legislatura.
Passemos ao artigo 6.° do projecto, que é talvez o mais importante, pelo menos segundo os auctores do projecto.
Sr. presidente, na discussão da especialidade terei occasião de justificar a substituição que offereço a este artigo.
Por agora limito-me a considerações geraes, dentro dos limites da segunda parte da generalidade.
Sr. presidente, a reforma proposta para a camara dos pares é a negação dos principios mais adiantados de direito publico, não é util nem viavel na marcha regular dos corpos politicos parlamentares.
Sr. presidente, o movimento e a vida social resulta, como no mundo physico, da acção combinada de duas forcas contrarias - acção e reacção; movimento e inércia com as resistencias do meio - attracção e repulsão.
A força motora politica - de invenção - impulso o aspiração apaixonada, é exercida pela camara de eleição popular, á qual competem as grandes iniciativas do progresso material, intellectual e moral dos povos que representa.
Só aos indefinidos impulsos, que lhe são próprios, daria em resultado o augmento progressivo de velocidade até ao desequilibrio, á perturbação do systema.
O movimento uniformemente variado, no mundo physico, resulta da acção da força motora, regulada pela sua lei - isto é, a força opposta, as condições de resistencia do meio, - a reacção de outras forças, etc.
Pois no meio social o phenomeno é similhante.
Necessario se torna, pois, uma outra funcção que modifique e harmonise as naturaes expansões da camara popular, ligando por criterio distincto as indicações da tradição, da prudencia, do maduro exame, que resultam da situação social do homem, o que tudo converte uma reforma em instituição util, effectiva e viavel.
O orgão social, correspondente a esta funcção, é a segunda camara ou senado.
Sr. presidente, o espirito deduz já necessariamente que a organisação de uma segunda camara deve ter bases differentes das da camara popular.
Não pode partir-se do mesmo principio - a eleição - ainda mesmo a indirecta. Teremos uma duplicação da camara popular e mais nada.
Terei occasião de desenvolver o meu pensamento na discussão da especialidade.
Farei por mostrar que o systema electivo, ainda dentro das categorias, adultera completamente a natureza das funcções de uma segunda camara, sem embargo das condições especiaes dos elegiveis e eleitores.
Mas, o que mais me impressiona n'este artigo, é a composição heterogenea da segunda camara!
Que cohesão poderá existir entre o elemento vitalicio do nomeação regia e o electivo, temporario, e ainda sujeito á dissolução?