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SESSÃO DE 27 DE JUNHO DE 1887

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral

SUMMARIO

Segunda leitura e admissão dos projectos de lei apresentados pelos srs. Ribeiro Ferreira, Góes Pinto, Luiz José Dias, visconde da Torre e visconde de Silves. - Representações mandadas para a mesa pelos srs. Antonio Candido, Pedro Victor, Jacinto Candido, Luiz José Dias, Eduardo José Coelho, Teixeira de Vasconcellos, Abreu Castello Branco e João Arroyo. - Requerimentos de interesse publico apresentados pelo sr. Jacinto Candido, e de interesse particular apresentados pelos srs. Antonio Candido, Sousa e Silva, Victor dos Santos, Francisco Machado e Luiz José Dias.- Justificações de faltas dos srs. Alves Matheus, visconde de Monsaraz, Alpoim, Antonio Maria de Carvalho, Oliveira Matos, Bernardo Machado, Gabriel Ramires, Sousa e Silva, Urbano de Castro, Oliveira Valle e Figueiredo Mascarenhas.- Presta juramento o sr. Henrique de Sant'Anna. - É concedida a licença pedida pelo sr. Campos Valdez para se ausentar do reino. - O sr. Pedro Victor faz algumas considerações justificando a representação que mandou para a mesa. - O sr. Dantas Baracho allude ao facto de ter sido preterido na promoção um coronel de infanteria, e chama a attenção do governo para outros assumptos. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Jacinto Cândido justifica alguns requerimentos que manda para a mesa, renova o pedido de diversos esclarecimentos e allude á necessidade da construcção de pharoes nos Açores. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas.- Apresenta dois projectos de lei o sr. Cardoso Valente. - O sr. Teixeira de Vasconcellos faz algumas considerações favoraveis á representação que mandou para a mesa. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Luiz José Dias manda para a mesa dois projectos de lei; pede, e obteve, a declaração de urgentes. - O sr. Sousa e Silva pergunta, ao governo se as obras do porto de Lisboa prejudicariam a construcção do grande collector que fara parte da canalisação de Lisboa; associa-se ao pedido de outros srs. deputados com relação aos pharoes dos Açores. Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Scarnichia apresenta um parecer da commissão de marinha.
Na ardem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 119, approvando o protocollo entre Portugal e a China, assignado em Lisboa em 26 de março ultimo. - O sr. Pinheiro Chagas, usando da palavra, começa perguntando ao governo o que havia de verdade com respeito á noticia de que a guarnição de Tungue estava em situação deploravel por falta de mantimentos. Responde-lhe o sr. ministro dos negocios estrangeiros. - O sr. Pinheiro Chagas, continuando, agradece a explicação e entra na discussão do projecto, combatendo-o largamente. Responde-lhe o sr. ministro dos negocios estrangeiros. - Toma parte no debate o sr. Consiglieri Pedroso, que combate igualmente o projecto, e apresenta uma moção de ordem. - A requerimento do sr. Mazziotti julga-se a materia discutida, sendo em seguida approvado o projecto na generalidade e successivamente cada um dos seus artigos. - Fica prejudicada a moção do sr. Consiglieri. - O sr. Estevão de Oliveira apresenta um parecer da commissão administrativa da camara.- Mandam igualmente pareceres para a mesa os srs. Matoso Santos e Scarnichia.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 61 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Sousa e Silva, Antonio Castello Branco, Antonio Cândido, Oliveira Pacheco, Antonio Villaça, Antonio Ennes, Antonio Maria de Carvalho, Simões dos Reis, Santos Crespo, Miranda Montenegro, Bernardo Machado, Eduardo de Abreu, Madeira Pinto, Feliciano Teixeira, Matoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Francisco de Barros, Fernandes Vaz, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Soares de Moura, Candido da Silva, Pires Villar, Cardoso Valente, Scarnichia, Franco de Castello Branco, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Rodrigues dos Santos, Joaquim da Veiga, Oliveira Valle, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Ferreira Galvão, Barbosa Collen, Pereira e Matos, Ruivo Godinho, Abreu Castello Branco, Figueiredo Mascarenhas, José de Napoles, Alpoim, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Santos Moreira, Santos Reis, Abreu e Sousa, Lopo Vaz, Vieira Lisboa, Luiz José Dias, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Brito Fernandes, Matheus de Azevedo, Miguel da Silveira, Pedro Victor, Sebastião Nobrega, Dantas Baracho, Estrella Braga, Visconde de Monsaraz e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Baptista de Sousa, Ribeiro Ferreira, Gomes Neto, Pereira Borges, Tavares Crespo, Mazziotti, Pereira Carrilho, Urbano de Castro, Augusto Fuschini, Victor dos Santos, Lobo d'Avila, Eduardo José Coelho, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Goes Pinto, Estevão de Oliveira, Firmino Lopes, Almeida e Brito, Francisco Beirão, Castro Monteiro, Francisco Ravasco, Severino de Avellar, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Santiago Gouveia, Silva Cordeiro, Oliveira Martins, Jorge O'Neill, Avellar Machado, José Castello Branco, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Barbosa de Magalhães, José Maria dos Santos, Simões Dias, Julio Graça, Julio Pires, Julio de Vilhena, Poças Falcão, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel José Vieira, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Marianno de Carvalho, Marianno Prezado, Miguel Dantas, Pedro Monteiro, Tito de Carvalho, Vicente Monteiro e Visconde de Silves.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Campos Valdez, Antonio Centeno, Guimarães Pedrosa, Moraes Sarmento, Fontes Ganhado, Jalles, Barros e Sá, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Elvino de Brito, Freitas Branco, Francisco Matoso, Lucena e Faro, Frederico Arouca, Guilhermino de Barros, Sá Nogueira, Baima de Bastos, João Pina, Dias Gallas, Menezes Parreira, Vieira de Castro, Sousa Machado, Correia Leal, Alves Matheus, Jorge de Mello (D.), Alves de Moura, Ferreira de Almeida, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, Ferreira Freire, José Maria de Andrade, Oliveira Matos, Pinto de Mascarenhas, Mancellos Ferraz, Pedro Diniz, Visconde da Torre e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - No regimen constitucional não basta que a lei conceda aos cidadãos o direito de manifestarem o seu voto na escolha dos seus representantes, ou dos que devem gerir os negocios publicos.
É indispensavel tambem assegurar-lhes o exercido d'este direito por modo que na pratica se não converta n'uma ficção, ou em um onus penoso de difficil cumprimento.
É preciso que os collegios eleitoraes sejam organisados por fórma que os eleitores possam, sem grande incommodo e sem percorrer longas distancias, comparecer e depor o seu voto na urna respectiva.
Foi de certo tendo em vista estas idéas, que a lei do 21 de maio de 1884 preceituou que as commissões de re-

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censcamento reunidas em janeiro de 1885 procedessem á divisão das respectivas assembléas eleitoraes, comtanto que cada uma d'estas não fosse constituida com menos de 500 eleitores.
Acontece, porém, que o concelho do Cartaxo, que faz parte do circulo n.° 83, tem cerca de 3:000 eleitores e uma só assembléa, onde devem votar não só os eleitores das freguezias de Pontevel, Ereira, Valle da Pinta e Cartaxo, mas ainda os de Vallada, que ficam a 12 kilometros de distancia d'aquella assembléa!
Resulta d'aqui que o eleitor d'esta freguezia, para exercer o direito de votar, tem de fazer uma jornada de 24 kilometros, 12 para ir á assembléa, e 12 para regressar á sua casa. Acresce que de inverno a estrada de Vallada á Ponte de Sant'Anna está muitas vezes coberta de agua em consequencia das cheias que invadem o campo, e n'estas occasiões é inteiramente impossível áquelles eleitores concorrerem á urna, por maiores que sejam os desejos de o fazerem.
Em taes circumstancias é evidente a necessidade da creação de uma nova assembléa eleitoral na freguezia de Vallada, para que os eleitores da mesma freguezia ali possam exercer o direito de votar; alem de que, em harmonia com a lei, tem mais de 500 eleitores.
Por estas considerações e porque a alteração proposta de modo algum contraria quaesquer interesses legitimos, e antes vae satisfazer as justas aspirações dos povos d'aquella freguezia, tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O concelho do Cartaxo, pertencente ao circulo n.° 83, é dividido em duas assembléas eleitoraes, a primeira com séde na freguezia do Cartaxo, e composta dos eleitores das freguezias de Valle da Pinta, Ereira, Pontevel e Cartaxo; a segunda, com sede na freguezia de Vallada, e composta dos eleitores da mesma freguezia.
Art. 2.° Esta divisão serve para as eleições de deputados e para as eleições municipaes e districtaes.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 25 de junho de 1887. = O deputado pelo circulo do Cartaxo, Antonio Francisco Ribeiro Ferreira.
Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

Projecto de lei

Senhores. - Ha em Vianna do Castello um estabelecimento de beneficencia, o hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade, estabelecimento tão modesto quanto útil e digno da sympathia publica, cujo piedoso e humanitario fim é, como diz o nome, recolher e manter os invalidos e entrevados de ambos os sexos, que, no ultimo quartel da vida, não podem sequer mendigar o pão de cada dia.
No fim do seculo passado um prestante filho de Vianna, José Pimenta Jarro, congregou alguns amigos pessoaes que com elle tomaram a seu cargo solicitar esmolas e obter donativos, e, comprando com o pequeno producto colhido uma casa terrea, installaram ali o primeiro asylado.
Esta piedosa instituição foi alargando successivamente os seus beneficios, á humilde casa terrea foram-se juntando outras contiguas, e hoje albergam-se n'ella quarenta e quatro velhos de ambos os sexos, cercados de indispensavel conforto, e tratados com os cuidados e desvelos que a caridade inspira e as condições económicas da instituição permittem.
A casa, porém, tal qual está, é insufficiente, e as zelosas administrações que têem presidido áquelle estabelecimento, já de ha muito cuidam em crear um fundo especial para a construcção de um edificio apropriado; mas, infelizmente, só muito tarde poderá esse fundo attingir a somma necessaria.
N'estes termos, nem póde uma tão salutar instituição estender os seus beneficios a maior numero de asylados, como é indispensavel, porque o está reclamando instantemente muita desgraça, sem amparo, nem tão pouco póde ella tão cedo melhorar as condições de installação.
Existe n'aquella cidade um edifício nacional que, pelas circumstancias em que se acha, póde satisfazer as necessidades que deixâmos apontadas. É o convento de Sant'Anna, onde existe ainda uma religiosa professa.
Concedido que seja este convento depois do fallecimento da ultima freira, podem as administrações d'aquelle sympathico albergue, não só dispor de um edificio, que os indispensaveis melhoramentos tornarão em breve apropriados ao fim a que se destina, mas também, o que é ainda mais importante, consagrar o rendimento de todos os seus fundos á manutenção de asylados, augmentando o numero destes, como o reclamam bastantes desgraçados a quem, por falta de recursos, é hoje impossivel attender.
Pelo que fica exposto, e de harmonia com o artigo 11.° da lei de 4 de abril de 1861, temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedido ao hospital de velhos e entrevados de Nossa Senhora da Caridade de Vianna do Castello, o convento de Sant'Anna da mesma cidade, com a igreja e suas alfaias, casa do capellão e a parte da cerca adjacente ao convento, com toda a agua que ao mesmo pretence, com excepção da que tenha sido concedida a outrem anteriormente á publicação da presente lei.
Art. 2.° O hospital só poderá tomar posse de tudo o referido no artigo 1.°, quando deixe de existir no convento a ultima das religiosas professas que ali reside actualmente.
Art. 3.° Ficará sem effeito esta concessão, revertendo tudo á posse do estado, quando o referido hospital deixe de satisfazer aos fins da sua instituição ou de empregar n'elles tudo o que pela presente lei lhe é concedido.
Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 25 de junho de 1887.= José Maria Rodrigues de Carvalho, deputado pelo circulo n.º 1 = Manuel Afonso Espregueira, deputado pelo circulo n.° 1 = Visconde da Torre = Miguel Dantas = Luiz José Dias = Manuel Pinheiro Chagas = Ernesto Júlio Goes Pinto.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores.- A maioria dos eleitores do logar de Aldeia da freguezia de Lara, do concelho de Monsão pedem, como se vê da representação, que está em poder da illustrada commissão de administração publica, a sua annexação administrativa ao concelho de Monsão, visto estarem sugeitos a esta comarca civil e ecclesiasticamente, e por isso tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei, que é da maxima conveniencia e justiça, como se affirma na citada representação.
Artigo 1.° É annexado administrativamente ao concelho de Monsão o logar da Aldeia da freguezia de Lara do mesmo concelho.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões, 27 de junho de 1887.= O deputado, Luiz José Dias.
Pedida e approvada a urgencia, foi lido na mesa, admittido e enviado á commissão de administração publica.

Projecto de lei

Senhores. - A creação de um julgado municipal no concelho de Condeixa, tornou-se indispensavel a creação de um officio de tabellião. Já no antigo julgado, que houve n'aquelle concelho, havia dois escrivães, que exerciam simultaneamente as respectivas funcções e as dos tabelliães.
A posição topographica da villa de Condeixa, situada entre campo e serra e cabeça de um dos melhores concelhos de segunda ordem do districto de Coimbra, e que por

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si só daria muito que fazer áquelles funccionarios, faz com que grande numero de habitantes da freguezia pertencentes ás comarcas de Coimbra, Penella e Soure, prefiram pela distancia, e, por outras commodidades annexas, a villa de Condeixa a qualquer das sedes das referidas comarcas.
É por todos estes fundamentos que julgâmos deverem merecer a attenção do poder legislativo, que temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É creado no concelho de Condeixa um officio de tabellião.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 27 de junho de 1887 = Joaquim Helioduro da Veiga = Antonio Simões dos Reis = Luiz José Dias.
Pedida e approvada a urgencia, foi lido na mesa, admittido e enviado á commissão de legislação civil.

Projecto de lei

Artigo 1.° É auctorisado o governo a conceder definitivamente á camara municipal de Villa Nova da Cerveira os terrenos das antigas muralhas e fossos ao nascente e sul da villa, que por carta de lei de 22 de março de 1885 lhe foram provisoriamente concedidos.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Camara dos senhores deputados, em sessão de 25 de junho de 1887.= O deputado por Valenca e Cerveira, Visconde da Torre.
Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de fazenda e de guerra.

Projecto de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a abolir o imposto de tonelagem, creado pela lei de 7 de junho de 1862 no porto de Villa Nova de Portimão.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 20 de junho de 1887. = O deputado, Visconde de Silves.
Lido na mesa, foi admittido e envido á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a effectuar a cobrança da contribuição industrial no districto de Faro, em quatro prestações.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 25 de junho de 1887. = O deputado, Visconde de Silves.
Lido na musa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

REPRESENTAÇÕES

Dos professores vitalicios das escolas normaes de Lisboa e Porto, pedindo que lhes sejam concedidos os vencimentos estrictamente equivalentes aos dos funccionarios dos lyceus de Lisboa. Coimbra e Porto.
Apresentada pelo sr. deputado Antonio Candido, enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Serpa, pedindo que sejam votados:
1.° O augmento de direitos sobre os cereaes importados;
2.° Que a fava importada pague, alem dos direitos de importação actuaes, o imposto do consumo como a nacional;
3.° O augmento de direitos de importação sobre o azeite de oliveira estrangeiro;
4.° O augmento de direitos sobre as lãs importadas do estrangeiro.
Apresentada pelo sr. deputado Pedro Victor, enviada ás commissões de agricultura e da fazenda e mandada publicar no Diario da camara.

Das juntas de parochia da freguezia de Santa Cruz, S. Matheus da Graciosa e S. Jorge, districto dos Açores, pedindo que, se for approvado o projecto de lei que estabelece a igualdade da moeda entre os Açores e o continente, se mantenha a moeda fraca com a differença actual de 25 por cento da do continente.
Apresentada pelo sr. deputado Jacinto Candido e enviada á commissão de fazenda.

Dos empregados da secretaria do governo civil do districto de Angra do Heroísmo, pedindo augmento de vencimento.
Apresentada pelo sr. deputado Jacinto Candido e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

De habitantes do logar da Aldeia, freguezia de Lara, pedindo que sejam annexados para todos os effeitos ao concelho de Monsão.
Apresentada pelo sr. deputado Luiz José Dias e enviada á commissão de administração publica.

De officiaes da administração dos quatro bairros de Lisboa, pedindo que lhes seja extensiva a applicação dos artigos 350.º e 358.° do codigo administrativo, que estabelecem o direito de aposentação para os empregados administrativos.
Apresentada pelo sr. deputado Eduardo José Coelho e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

De habitantes de Lixa, pedindo que as malas do correio que lhes são destinadas sejam recebidas directamente de Cabide.
Apresentada pelo sr. deputado Teixeira de Vasconcellos e enviada á commissão de obras publicas.

Dos empregados da secretaria do governo civil do districto de Angra do Heroismo, pedindo augmento de vencimento.
Apresentada pelo sr. deputado Abreu Castello Branco e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de fazenda.

De estudantes do Porto, pedindo que não sejam augmentadas as propinas para as matriculas, exames e cartas nos cursos superiores.
Apresentada pelo sr. deputado Arroyo e enviada á commissão de administração superior.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, me seja enviada uma nota de todas as estradas reaes e municipaes do districto central dos Açores, comprehendendo-se n'ella e devidamente descriminadas:
1.° As estradas já construidas;
2.° As que se acham em construcção;
3.° As que já têem projectos approvados, embora vão ainda era começo de construcção:
4.° As que sem projecto approvado estão apenas em estudo;
5.° As que sem ainda terem sido estudadas, se indicam como de conveniencia publica, em quaesquer pedidos, ou representação dos povos ou de quaesquer corporações. = O deputado pelo circulo n.° 99, Jacinto Candido.

Renovo os meus requerimentos feito na sessão diurna de 25 de maio, sobre o cabo submarino para os Açores; os pharoes nas costas das mesmas ilhas; o porto de abrigo de Angra e a ente, agricola do paiz.
Renovo tambem os meus requerimentos feitos na sessão de 7 do corrente sobre os concursos de vigario da fregue-

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zia da Ribeira, do concelho e districto de Angra e do segundo official do governo civil do mesmo districto. = O deputado pelo circulo n.° 99, Jacinto Candido.

Requeiro que, pelos ministerios competentes, me seja enviada copia da correspondencia ultimamente trocada entre o governo e a auctoridade superior do districto do Funchal sobre a livre importação dos cereaes estrangeiros. = O deputado pelo circulo n.° 99, Jacintho Candido.
Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

Dos escreventes da capitania do porto de Lisboa, João Maria Martins, Manuel Francisco, e José Maria Loureiro, pedindo melhoria de situação.
Apresentado pelo sr. deputado Antonio Candido e enviado á commissão de marinha ouvida a de fazenda.

De Jacinto Ignacio Cabral, engenheiro civil, conductor de 1.ª classe do corpo de engenheiros das obras publicas, contra a ultima organisação das obras publicas, que levou os seus interesses.
Apresentado pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviado á commissão de obras publicas.

De Thomás Augusto Serpa, capitão almoxarife de artilheria, pedindo que não seja approvada a proposta do ministerio da guerra, diminuindo o pessoal dos postos superiores do quadro a que pertence, sem se estabelecer proporção de uns para outros postos, ou pelo menos sem ser supprimida a clausula de espera de tempo determinado no posto de capitão.
Apresentado pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviado á commissão guerra, ouvida a de fazenda.

De Nuno Leopoldo Cordeiro, soldado de cavallaria n.° 7 ex-alumno do collegio militar, onde completou o curso como alumno externo, pedindo que se lhe tornem extensivas as vantagens do artigo 37.° do decreto com força de lei de 11 de dezembro de 1851.
Apresentado pelo sr. deputado Victor dos Santos, e enviado á commissão de guerra.

De Manuel Cardoso dos Santos Vasques, facultativo veterinario militar de 2.ª classe, em commissão na escola do exercito, pedindo que á classe a que pertence seja concedida a mercê do habito de S. Bento de Aviz.
Apresentado pelo sr. deputado F. J. Machado, e enviado á commissão de guerra.

De Thomás Augusto Serpa, capitão almoxarife de artilheria, pedindo que á sua classe seja extensiva a gratificação aos officiaes arregimentados, determinada por uma proposta do sr. ministro da guerra e pendente de discussão.
Apresentado pelo sr. deputado Sousa e Silva e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

De Antonio Gonçalves, chegador de navios da armada, pedindo se lhe pague a differença entre o ordenado que actualmente recebe e o que recebeu desde a data da sua admissão na divisão de veteranos até ao anno de 1878.
Apresentado pelo sr. deputado Luiz José Dias e enviado ás commissões de marinha e de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Declaro que o sr. deputado Alves Matheus faltou a algumas sessões e ainda faltará a outras por motivo justificado. = Joaquim Simões Ferreira.

Declaro que faltei durante o mez de junho a algumas sessões por motivo justificado. = Visconde de Monsaraz.

Declaro que o sr. deputado José Maria de Oliveira Matos tem faltado a algumas sessões por motivo justificado. = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Declaro que, por motivo justificado, faltei ás sessões de 20, 21, 23 e 25 do corrente. = O deputado, António Maria de Carvalho.

Declaro que faltei a algumas sessões neste mez por motivo de doença. = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.

Declaro que não compareci á sessão de 25 do corrente por motivo justificado. = Bernardo Homem Machado.

Declaro ter faltado a algumas sessões da camara no corrente mez por motivo justificado. = O deputado, Gabriel José Ramires.

Participo a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, tenho deixado de comparecer a algumas das sessões do corrente mez. = Sousa e Silva.

Participo a v. exa. que, por motivos justificados, tenho deixado de comparecer ás ultimas sessões. = Urbano de Castro.

Declaro que faltei, por motivo justificado, ás sessões nocturnas de 22 e 25 e diurnas de 23 e 25 do corrente. = Dr. Oliveira Valle.

Declaro que, por motivo justificado, não compareci á sessão de sabbado. = José Gregorio Figueiredo Mascarenhas.
Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Está nos corredores da camara o sr. deputado Henrique de Sant'Anna. Convido os srs. António Maria de Carvalho e Poças Falcão a introduzil-o na sala.
Foi introduzido na sala, prestou juramento e tomou assento.
O sr. Presidente: - O sr. deputado Campos Valdez mandou hontem para a mesa um requerimento, pedindo licença á camara para se ausentar do reino. Não o puz logo á votação, por se ter entrado na ordem do dia; mas faço-o hoje.
Leu-se o seguinte:

Requerimento

Desejando ausentar-me do paiz, por alguns dias, rogo a v. exa. queira consultar a camara se me concede a necessaria licença. = Campos Valdez.
Concedeu-se a licença pedida.

O sr. Antonio Candido: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação dos professores vitalicios das escolas normaes de Lisboa e Porto, que pedem augmento de vencimento.
As rasões que elles adduzem são justas. Os professores das escolas normaes estão equiparados aos dos lyceus centraes e aos do collegio militar, mas em desfavoravel desigualdade nos vencimentos. Ao passo que os professores do lyceu ganham 800$000 réis, elles ainda estão sujeitos á lei de 1868, que lhes arbitra apenas 400$000 réis.
É de muito interesse tudo quanto se refere á instrucção publica; por isso peço que seja devidamente considerada esta representação.
Aproveito a occasião de estar com a palavra para mandar tambem para a mesa um requerimento dos empregados civis da capitania do porto de Lisboa, pedindo augmento

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do vencimentos, pois que recebem apenas 500 réis diarios sujeitos a deducções.
Não cansarei a camara, fazendo considerações, sobre este pedido, porque ainda ha pouco tempo foi aqui apresentado um requerimento identico e n'elle vinham largamente fundamentadas e expostas as rasões que o justificam.
Peco a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que seja publicada no Diario do governo a representação dos professores.
Assim se resolveu.
(S. exa. não reviu as notas.)
O sr. Pedro Victor: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da camara municipal de Serpa.
Eu vou ler as conclusões finaes da representação. São as seguintes:
1.ª Que seja votado o augmento de direitos sobre os cereaes importados;
2.ª Que a fava importada pague, alem dos direitos de importação actuaes, o imposto do consumo como a nacional;
3.ª Que seja votado o augmento de direitos de importação sobre o azeite de oliveira estrangeiro;
4.ª Que se vote tambem o augmento de direitos sobre as lãs importadas do estrangeiro.
Peço á camara que considere estes modestos pedidos. Eu apenas tenho a dizer que no districto de Beja e no concelho de Serpa a producção cerealifera está nas mais precarias circumstancias.
A despeza a fazer com o alqueire de trigo produzido em Serpa ou em quasi todo o districto de Beja, augmentada com os transportes desde o local aonde foi produzido até ao mercado principal, que é Lisboa, é superior ao preço por que se vende o trigo estrangeiro que concorre ao mercado já sobrecarregado com o actual direito de importação.
N'estas condições é absolutamente impossivel que o lavrador continue a cultivar trigo.
Não digo que seja esta a unica medida para acabar com a crise agricola que está tomando proporções assustadoras especialmente no districto de Beja.
Parece-me que n'este momento o governo deveria attender e fazer estudar com todo o cuidado esta questão, visto estar-se procedendo ao inquerito agricola do paiz e merecerem todo o respeito e consideração estes clamores que dizem respeito aos interesses dos lavradores.
Na minha opinião, parece-me que não é só o augmento dos direitos de importação nos trigos, azeites ou lãs estrangeiras o remédio sufficiente para resolver a crise agricola d'aquelle districto.
Entendo que, promovendo-se a creação do credito agricola em todo o paiz, fomentando-se a emigração para o baixo Alemtejo, promulgando-se medidas que possam influir na divisão e subdivisão da propriedade, etc., etc., é que se fornecem aos agricultores de Beja os importantes elementos para se resolverem de uma maneira mais ou menos completa as difficuldades em que se acha o districto sob o ponto de vista agricola.
Chamo, pois, a attenção do governo para esta representação e peço a v. exa., sr. presidente, que consulte a camara se consente que ella seja publicada no Diario das sessões.
Assim se resolveu.
O sr. Dantas Baracho: - Começando por estranhar a não comparencia do governo, recordou que, pelo decreto de 30 de outubro de 1884, os generaes de brigada são em numero de vinte e quatro, dos quaes dois promovidos entre os coroneis mais antigos de todas as armas do exercito e do corpo do estado maior. Devia portanto haver todo o escrupulo em que as vacaturas de coroneis fossem preenchidas segundo a ordem por que se davam, para que não houvesse preterições como a que se deu ha pouco com uma promoção a coronel no corpo do estado maior, com prejuizo manifesto de um tenente coronel de infanteria, arma esta em que ha tempo existia uma vaga de general de brigada, e que não era preenchida por circumstancias, por certo, estranhas ao official prejudicado.
Agora, havendo uma vacatura de coronel na arma de artilheria, bom era que não se procedesse, como se praticou anteriormente, visto que ainda está em aberto a vaga de general de brigada, em que deve ser provido um coronel de infanteria.
Apesar de não estar presente o sr. ministro da guerra, como s. exa. teria conhecimento, pelo Diario das sessões, das considerações que elle, orador, acabava de fazer, chamava a sua attenção para que fosse indemnisado o coronel que deixára de ser promovido, contando-se-lhe a antiguidade desde o dia em que deveria ter tido logar a promoção.
Chamava tambem a attenção do sr. ministro da marinha para um facto que víra narrado n'um jornal.
O facto era estar a guarnição de Tungue sem receber pret havia quatro mezes.
Se este acontecimento era verdadeiro, era preciso pôr-lhe cobro, porque envergonhava o paiz perante o mundo.
Disse que o coronel Palma Velho tinha acabado o seu tempo de serviço e estava para regressar á Europa, quando se dera a necessidade de organisar a expedição de Tungue.
Offerecêra-se como voluntario e fôra nomeado commandante d'aquella expedição; mas, apesar d'esse e de outros feitos que praticou, o governo não lhe dera recompensa alguma.
E, sendo de lei conceder aos officiaes, que acabam o tempo de serviço nas colonias, passagem para a Europa, taes difficuldades se levantaram, que aquelle official preferiu vir á sua custa.
Chamava para este assumpto a attenção do sr. ministro da marinha. Não era assim que se recompensava quem prestava taes serviços.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro):- O sr. Baracho foi muito injusto na referencia que acabou de fazer ao sr. ministro da marinha, porque a verdade é que s. exa. tem no mais alto apreço os serviços d'esse valente militar.
Havendo ainda negociações pendentes ácerca do assumpto a que s. exa. se referiu, o governo aguarda a occasião opportuna para dar aquelle official uma manifestação de apreço, que signifique o testemunho de gratidão nacional, e de que é digno pelo grande feito de armas que praticou.
O illustre deputado sabe perfeitamente quanto é defeituosa a machina ultramarina, e por isso não é para admirar que com officiaes como o sr. Palma Velho se dêem certos attritos que não dependem da acção do governo, mas de circumstancias bem alheias á sua vontade.
Quanto aos outros assumptos em que o illustre deputado tocou, eu communicarei as suas observações ao meu collega da marinha.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Jacinto Candido: - Mando para a mesa um requerimento dos empregados da secretaria do governo civil de Angra do Heroismo pedindo augmento de vencimento.
Mando tambem para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos, o outros dois renovando um que fiz em uma das sessões do mez passado.
Igualmente mando para a mesa tres representações das juntas de parochia de S. Jorge, Santa Cruz e S. Matheus da Graciosa, relativamente á questão da moeda.
Por esta occasião, abstendo-me de quaesquer considerações de ordem politica partidaria, folgo de prestar o meu testemunho de agradecimento ao governo e significar-

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lhe a gratidão de que os povos açorianos estão possuidos pela attenção que prestou ás representações que lhe enviaram sobre este assumpto, deferindo-as e mantendo a moeda fraca com a differença de 25 por cento.
Não obstante militar nas fileiras da opposição, é certo que, a este respeito, julgo do meu dever prestar o meu testemunho de reconhecimento ao sr. ministro da fazenda.
Já que estou com a palavra, insto mais uma vez com o sr. ministro das obras publicas pelos melhoramentos materiaes de que me occupei em uma das sessões passadas, e peço a s. exa. o obsequio de attender á questão da illuminação das costas dos Açores, que se torna de todo o ponto urgente, porque a navegação para as ilhas está atravessando uma crise bastante seria.
Á medida que se vae desenvolvendo, augmentam naturalmente as probabilidades dos sinistros, e torna-se mister combatel-as com os meios adequados, a fim de que não esmoreça, antes se dê incremento, e condições de garantia, a essa fonte de riqueza publica.
Ácerca do porto de abrigo de Angra do Heroismo ha um parecer da commissão de obras publicas, e é para sentir que, tendo o governo apresentado uma proposta para construcção do porto de abrigo da Horta e de Ponta Delgada, não tratasse tambem do porto de abrigo do Angra do Heroismo.
Este assumpto deve merecer toda a attenção do sr. ministro das obras publicas, porque, sendo as outras ilhas contempladas com tão importante melhoramento, é de justiça que a ilha Terceira o seja igualmente, porque tem todo o direito á consideração dos poderes publicos.
Tenho ainda de tocar em outro assumpto, que não se refere ao ministerio das obras publicas, mas estou certo de que o sr. Emygdio Navarro communicará ao seu collega da fazenda as observações que vou fazer.
Em tempo opportuno requeri copia de toda a correspondencia trocada entre o governo e a auctoridade superior do districto do Funchal, ácerca da suspensão de direitos de importação dos cereaes estrangeiros.
Em consequencia da pouca abundancia de generos que vinham dos Açores, e que não chegavam para as necessidades do consumo no Funchal, e porque não bastasse a producção local, deu-se ali uma crise alimenticia, e em virtude disso a auctoridade administrativa superior suspendeu os direitos de importação sobre os cereaes estrangeiros.
A crise terminou, e essa medida, que tinha tido um caracter extraordinario, converteu-se em um estado definitivo, e hoje os cereaes estrangeiros estão sendo admittidos no Funchal, sem pagamento de direitos de importação, e isto em prejuizo manifesto dos lavradores e proprietarios d'aquella ilha.
Não me occuparei dos inconvenientes que este facto acarreta ao Funchal, porque os seus representantes n'esta casa terão occasião de se referir a esse assumpto, mas não posso deixar de dizer que os Açores, pelas circumstancias especiaes do porto do Funchal, na actualidade o vêem fechado aos seus productos, e n'estas condições não é justo que permaneça tal estado de cousas, que se me afigura ser devido a um mal entendido da auctoridade local, e não ás ordens ou instrucções emanadas do governo.
Por ultimo associar-me-hei ás palavras proferidas em uma das sessões passadas pelo sr. Hintze Ribeiro, ácerca da livre cultura do tabaco nos Açores, e manutenção do actual estado de cousas.
Qualquer alteração que vá affectar a nascente industria do fabrico e manipulação de tabaco, será de tão graves consequencias; e produzirá taes prejuizos, que ao governo e ao parlamento não poderão deixar de impressionar.
As fabricas de S. Miguel e uma da Terceira mandaram aqui suas representações. Ha, porém, em Angra ainda outra fabrica, a «Flor de Angra», que, comquanto não tenha enviado representação, a todas, quantas tendam a garantir a permanencia do actual estado de cousas, adhere, e eu estou auctorisado pelos seus gerentes a declaral-o n'esta casa.
Demais estas fabricas montaram-se e estabeleceram-se confiadas na legislação vigente, e á sombra das garantias que ella lhes conferia.
Repentinamente alterar taes condições, matando esta industria, que ainda hontem da lei teve a vida, alem de cruel, seria manifestamente iníquo e injusto, e offenderia direitos adquiridos.
Emquanto ao requerimento dos empregados do governo civil de Angra do Heroismo, peço que seja enviado á commissão respectiva, não me alongando neste momento em considerações sobre a justiça d'aquella pretensão.
Sendo em these contra tudo quanto importa augmento de despeza, parece haver contradicção entre o apoio que presto á pretensão dos requerentes e os principios que tenho sustentado; mas entendo que, por não serem propicias as circumstancias do thesouro, devemos combater todos os projectos que importem augmento de despeza, quando sejam dispensaveis, sem que todavia se vá tão longe, e se seja tão radical, que se offendam os principios da justiça, que devem superiormente pairar sobre todos os projectos, e nos quaes, primeiro do que tudo, nos devemos inspirar. Ora, desde que se augmentam os ordenados a muitas das classes de servidores do estado, não póde prescindir-se, sem offensa da justiça, de attender ás reclamações das outras classes, cujo trabalho não é sufficientemente remunerado, e que devem ser, e são, como as demais, dignas de toda a consideração dos poderes publicos. Por isso, não só me não opponho ao pedido, mas até o secundo com a minha voz, e confio bastante na camara para alimentar a esperança de que ha de ser attendido.
Eram estas as considerações que tinha a fazer, pedindo a v. exa., sr. presidente, o favor de instar pelos ministerios competentes, para que se dignem satisfazer os requerimentos por mim apresentados nas sessões passadas, e que renovo hoje.
Os requerimentos pedindo esclarecimentos vão publicados na secção competente; os de interesse particular e as representações tiveram o destino indicado a pag. 1435.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Transmittirei ao meu collega da fazenda as observações que o illustre deputado acaba de fazer, relativamente á exportação de cereaes para o Funchal. Ignorando o estado da questão, por que ella não corre pelo ministerio a meu cargo, devo comtudo dizer que se alguma cousa se fez do que s. exa. referiu, ou foi por ordem do governo ou, abusivamente, por ordem do governador civil.
O actual governo já tem tomado providencias para cohibir os abusos e arbitrios praticados, em larga escala, por governadores dos districtos insulares, que umas vezes suspendem sem auctorisação superior os direitos de entrada, outras não duvidam mantel-os. O meu collega da fazenda dará ao illustre deputado as informações que possa, e, se tiver havido abusos, o governo não deixará de os corrigir.
Relativamente á questão dos pharoes nos Açores, devo dizer a s. exa. que, quando tomei conta da pasta das obras publicas, quiz dar-lhes o possivel desenvolvimento, mas achei-me em face de graves difficuldades, porque não havia um unico projecto, e não quiz fazer, com relação a pharoes; o mesmo que se fez com relação a portos, começando-se obras, sem se saber em quanto ellas importavam.
Incumbi por isso um illustre engenheiro, o sr. Ayala, de fazer os estudos definitivos dos pharoes para os Açores. Á maneira que elle me for enviando os seus trabalhos, mandarei proceder á construcção.
Desde que o pensamento do governo era attrahir aos portos dos Açores o maior numero de navios, evidentemente não podia deixar de reconhecer, como condição indispensavel, a collocação dos pharoes. As costas dos Açores são perigosissimas, e se não estiverem illuminadas, o perigo será maior.

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Com respeito ao porto de Angra, devo dizer a s. exa. que é minha intenção mandar proceder, o mais breve possivel, aos estudos das obras que ha a fazer ali.
Não quero proceder da maneira inconveniente como se procedeu a respeito de Ponta Delgada e Horta. Quanto ao primeiro, tinha-se calculado que o porto artificial custaria 600:000$00 réis, e todavia já estão gastos 2.000:000$000 réis, e é preciso gastar mais 1.300:000$000 réis!
É sempre conveniente que o paiz saiba qual é a importancia real do que gasta em obras, e não menos conveniente é que ellas não comecem sem haver projectos definitivos, para não succeder que, tendo-se calculado o seu custo em 200:000$000 réis ou 300:000$000 réis, venham depois a importar em 600:000$000 réis ou 1.000:000$000 réis, como aconteceu com a construcção das docas de Ponta Delgada e Horta.
É por isso que vou mandar previamente estudar o projecto para a doca de Angra; e se, na proxima sessão legislativa, estiver habilitado com os estudos feitos por um distincto engenheiro, apresentarei á camara uma proposta de lei analoga á que foi apresentada n'esta camara, relativamente ao porto de Ponta Delgada.
É o que se me offerece responder a s. exa.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Jacinto Candido: - Sr. presidente, se eu pedi a palavra, foi simplesmente para agradecer ao illustre ministro das obras publicas as explicações que acaba de me dar.
O sr. Cardoso Valente: - Sr. presidente, mando para a mesa um projecto de lei estabelecendo que seja extensivo aos delegados do procurador regio nas varas de Lisboa e Porto a faculdade de advogar, que actualmente têem os delegados nas outras comarcas do reino.
Este projecto vae tambem assignado pelo sr. Rodrigues dos Santos.
Escuso de demonstrar a justiça que assiste ao pensamento d'este projecto, justiça evidente, que resalta da sua simples leitura. Nenhum motivo rasoavel póde adduzir-se para justificar a continuação da actual desigualdade entre os delegados de Lisboa e Porto e os das demais comarcas do reino emquanto á faculdade de advogar que a estes é permittida. Consta-me que o unico argumento com que se pretende defender esta desigualdade é tirado do facto de ter sido em tempos, que já vão distantes, augmentado o vencimento dos delegados de Lisboa e Porto com a clausula de não exercerem ali a advocacia. Se, porém, considerarmos que, posteriormente e pela creação dos curadores especiaes dos orphãos, ficaram esses delegados privados de funcções importantes sob o ponto de vista dos seus interesses, e facil de ver que tal augmento de vencimento se tornou absolutamente illusorio.
Sendo em tudo iguaes as funcções dos agentes do ministerio publico nas diversas comarcas do reino, afigura-se me que devem tambem ser iguaes as suas faculdades, devendo, portanto, eliminar-se a restricção imposta aos delegados de Lisboa e Porto, permittindo-se-lhes a faculdade de advogar nos justos limites em que ella é concedida aos seus collegas das restantes comarcas do reino. Repito, creio justissimo o pensamento d'este projecto de lei e creio que a camara na sua alta sabedoria assim o considerará.
Limito-me pois a mandar para a mesa este projecto pedindo a v. exa. que o envie á commissão respectiva, esperando que ella não deixará de o tomar na devida consideração dando com brevidade o seu parecer sobre elle, no que praticará um acto de justiça.
Visto estar com a palavra, mando tambem para a mesa outro projecto de lei concedendo á parochia de Santa Marinha de Villa Nova de Gaia, da diocese do Porto, para residencia do respectivo parocho e de seus coadjuctores, a propriedade denominada da vigararia, pertencente ao convento das Donas de Corpus Christi da mesma villa.
Não me demorarei a fazer considerações a respeito d'este projecto, pois que o assumpto a que elle se refere vem sufficientemente desenvolvido no relatorio que o precede.
Ficaram para segunda leitura.
O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação dos habitantes de Lixa, povoação muito importante, que faz parte do concelho de Felgueiras, e em que se queixam de que o serviço do correio entre a estação de Cabide e aquella povoação fosse de tal fórma alterado, que prejudica gravemente os interesses d'aquella povoação.
Depois da creação da administração do correio n'aquella povoação, as malas eram directamente conduzidas de Cabide á Lixa por intermedio das carreiras diarias entre estes dois pontos. Esta era a maneira mais commoda e barata de conservar a facilidade de relações, muito desejavel, entre o Porto e aquella povoação; mas depois este serviço foi inesperadamente alterado e por uma fórma que demora muito a recepção da correspondencia que vem do Porto, prejudicando enormemente os interesses commerciaes d'aquella localidade.
Eu creio que o sr. ministro das obras publicas, tendo conhecimento do facto, como tem n'este momento pelas minhas palavras e pelo conteúdo d'esta representação, dará as ordens convenientes para que o serviço se restabeleça como estava antes de abril de 1886. Não ha rasão alguma, nem de economia, nem de outra qualquer natureza, que justifique a profunda alteração que este serviço soffreu, a não ser que se possa dar credito a uma rasão apresentada n'um documento que tenho presente e de que não faço uso n'este momento, porque não é isso necessario, estou certissimo, para que o sr. ministro procure melhorar este serviço, como tem procurado sempre fazer, desde que gere a pasta das obras publicas. E é uma prova evidente do seu zêlo o melhorar este ramo importantissimo do serviço a que estão presos interesses tão diversos. (Apoiados.)
Espero, pois, que o illustre ministro procurará fazer com que o serviço do correio se faça directamente entre a estação de Cabide e a povoação de Lixa, porque esta irregularidade que se dá, esta alteração que se fez no serviço, é altamente inconveniente, não só para umas poucas de freguezias que ficam em volta d'esta povoação, mas para as que ficam ao norte do concelho de Amarante, que recebem a correspondencia com mais brevidade pela administração do correio de Lixa que pela administração do correio de Amarante.
Nada mais direi, limitando-me a mandar para a mesa esta representação, que espero será attendida pelo sr. ministro.
A representação teve o destino indicado a pag. 1435.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emvgdio Navarro): - Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado, que as suas considerações são muito sensatas, mas actualmente escusadas, porque já a semana passada dei as precisas providencias no sentido das reclamações que s. exa. agora apresentou.
O sr. Luiz José Dias: - Mando para a mesa um projecto de lei, assignado tambem pelos srs. Joaquim Heliodoro da Veiga e Simões dos Reis, creando no concelho de Condeixa um officio de tabellião.
No relatorio, que me abstenho de ler, apresentam-se os fundamentos que justificam a sua approvação.
Mando tambem para a mesa outro projecto de lei, annexando administrativamente ao concelho de Monsão o logar de Aldeia da freguezia de Lara, attendendo-se assim á representação que os respectivos habitantes dirigiram a esta camara e que acompanha o projecto.
N'essa representação expõem elles nitidamente os fundamentos que justificam o pedido e é tão clara e obvia a justiça que assiste aos povos d'aquelle logar, que me abstenho de acrescentar quaesquer considerações a este respeito.
Tanto o código administrativo de 1878 como o actual

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não preveniram a hypothese de que se trata n'este projecto e é de uma alta conveniência que se providenceie.
Trata-se da desannexação de uma freguezia que pertence administrativamente ao concelho de Valença, ao passo que se acha ligada civil e ecclesiasticamente ao concelho de Monsão, resultando d'este estado de cousas, como é facil de ver, enormes inconvenientes para aquelles povos.
Mando finalmente para a mesa um requerimento do sr. Antonio Gonçalves, chegador de navios da armada, pedindo que lhe seja abonada a quantia de 240 réis diarios, em vez da quantia de 160 réis, que até agora lhe tem sido dada.
Confio que a illustre commissão de marinha tomará na devida consideração o pedido, incontestavelmente justo, d'este indigente.
Requeiro que os projectos de lei sejam declarados urgentes, e peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que seja publicada no Diario do governo a representação e do mesmo modo o requerimento.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O requerimento e representação tiveram o destino indicado a pag. 1436 e 1435.
O sr. Presidente: - O illustre deputado pediu que a representação e o requerimento sejam publicados no Diario do governo, ou sómente a representação?
Pediu tambem a urgencia para ambos os projectos ou apenas para o primeiro?
O Orador: - Peço a urgencia para ambos, e a publicação do requerimento e da representação.
Consultada a camara, foi approvada a urgencia dos projectos e a publicação do requerimento e representação no Diario do governo.
Tiveram logo segunda leitura e foram admittidos os dois projectos. Vão publicados no expediente.
O sr. Sousa e Silva: - Mando para a mesa uma justificação de faltas e dois requerimentos do sr. Thomás Augusto de Serpa, capitão almoxarife de artilheria, identicos aos que têem apresentado outro officiaes da sua classe, pedindo n'um que não seja approvada a proposta do sr. ministro da guerra, que reduz os quadros dos officiaes superiores de praças de guerra, e no outro que se torne extensiva aos officiaes almoxarifes a gratificação que for approvada para os officiaes arregimentados de igual graduação.
Mando mais para a mesa um requerimento do sr. Jacinto Ignacio Cabral, engenheiro civil, conductor de 1.ª classe no ministerio das obras publicas, em que pede para ser classificado como engenheiro conductor.
O requerente era em 1882 conductor de obras publicas e tinha dezeseis annos de serviço.
N'essa occasião estava desempenhando as funcções de chefe de secção em Ponta Delgada.
Requereu licença ao governo, sem vencimento, para ir estudar á Belgica, e assim concluiu o curso com distincção em outubro do anno findo, poucos dias depois da classificação de engenheria civil.
Parece muito attendivel esta petição, porque no caso contrario ir-se ha dar áquelle decreto dictatorial effeito retroactivo; entendo, portanto, que se deve proceder aqui como se procedeu quando foram extinctas no exercito as classes dos alferes graduados e alumnos.
Aproveito a occasião de estar com a palavra para fazer uma pergunta e um pedido ao sr. ministro das obras publicas.
Em primeiro logar farei a pergunta.
Em 1885, quando na commissão de obras publicas se discutiu o projecto dos melhoramentos do porto de Lisboa, dois membros da commissão, o sr. Almeida Pinheiro e eu perguntámos ao sr. ministro das obras publicas de então, se alguma cousa havia, com respeito ao projecto para a canalisacuo de Lisboa, porque nos parecia que esses dois projectos deviam caminhar a par um do outro; pois a canalisação de Lisboa que se devia fazer entre Santa Apolonia e Alcantara, não podia deixar de se fazer senão ao mesmo tempo que se executassem os melhoramentos do porto.
Respondeu-nos s. exa. que não apresentava proposta alguma n'esse sentido, porque estava o projecto affecto á junta consultiva de obras publicas, que ainda não dera parecer ácerca d'elle.
Segundo vi no appendice ao Diario do governo, exige se no projecto de melhoramentos do porto de Lisboa, que o empreiteiro prolongue a actual canalisação até aos caes e docas.
Não me parece que com este expediente ganhe a hygiene da cidade, nem as docas.
Em primeiro, logar, sendo preciso dar escoante aos cannos, elles terão forçosamente de ir terminar a um nivel inferior ao da maré vasia, não permittindo isso que sejam lavados pelo ar; depois, sendo os dejectos mais leves do que a agua, sobrenadarão nas docas, onde não haverá correntes que os arrastem para longe, infeccionando a atmosphera em maior escala do que na actualidade; e finalmente precipitar-se-hão produzindo grandes açoriamentos.
Consequentemente, parece-me que não só por economia, mas tambem para se attender á hygiene da cidade, se devia começar o mais breve possivel esta obra.
Portanto, desejo saber se ha idéa de se estabelecer ou não o grande collector, pelo menos entro Santa Apolonia e a Junqueira e de fazer commuuicar com elle, tanto a canalisação actual, como a que houver de fazer-se, executando assim desde já uma parte do projecto para a canalisação de Lisboa.
Agora referir-me-hei ao outro ponto, isto é, ao pedido que ha pouco declarei que ia fazer ao sr. ministro.
Os meus collegas dos Açores têem dirigido por diversas vezes ao sr. ministro das obras publicas pedidos para que se apressem os trabalhos para a illuminacão das costas açorianas; entrando eu tambem n'este assumpto serei muito breve, mesmo porque não tenho mais que juntar a minha voz e unir os meus pedidos aos d'elles.
Mas ha outra cousa que é verdadeiramente um bom principio do administração e por isso vou referir-me a ella.
Estão escolhidos os pontos para estabelecimento de mais pharoes nas ilhas, e naturalmente nenhum é á beira da estrada real.
Parece-me pois que a construcção se fará com difficuldade e por preço muito mais elevado do que se fossem estudados e mandados construir ramaes que os ponham em communicação com as estradas reaes.
Creio que o sr. ministro concordará em que, não havendo estradas, de rodagem para os pharoes, o transporte dos materiaes será muito mais dispendioso; peço lhe pois que mande proceder aos estudos e construcção dos pequenos ramaes a que me refiro.
Não me leva a fazer este pedido o menor intuito politico, pois considero isto apenas como uma questão de administração e de economia.
Tenho dito.
Os requerimentos tiveram o destino indicado a pag. 1436.
A justificação vae publicada no logar competente.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - Respondeu que não duvidava mandar estudar as estradas a que se referia o sr. Sousa e Silva, logo que estivessem definitamente marcados os pontos onde os pharoes haviam de ser construidos.
Com relação ao porto de Lisboa, disse que as obras se fariam de fórma que não ficasse prejudicada a construcção futura do grande collector.
(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Scarnichia: - Mando para a mesa o parecer da commissão de marinha sobre a proposta de lei do governo relativa á fixação da força naval.
A imprimir.

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SESSÃO DE 27 DE JUNHO DE 1887 1441

ORDEM DO DIA

Entra em discussão o projecto de lei n.° 119, approvando o protocollo entre Portugal e a China

Leu-se na mesa. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 119

Senhores. - Á vossa commissão de negócios externos foi presente a proposta de lei n.° 107-R, approvando o protocollo assignado em Lisboa, em 26 de março ultimo, entre os representantes de Portugal e da China, e bem assim auctorisando o governo a ratificar desde logo o tratado de commercio que, nos termos do artigo 1.° do mesmo protocollo, deve ser negociado e firmado em Pekim.
Pelo exame dos próprios documentos póde a vossa commissão apreciar as phases successivas por que passaram as negociações encetadas em Macau, e que proseguindo depois em Lisboa vieram condensar-se finalmente nas formulas a um tempo simples e precisas, mas de todas as mais convenientes dos artigos do protocollo.
Definir finalmente, e de modo para ambas as nações acceitavel, a situação de Macau em face da China, dando a este imperio a garantia por elle muito apreciada de que d'essa situação nunca lhe poderá provir, em epocha alguma, um embaraço politico contra o qual entendia dever premunir-se, o da possível cessão dos nossos direitos a uma terceira potência; garantir a negociação de um tratado de commercio desde tanto tempo desejado por toda a colonia mas sempre postergado, e tudo isto a preço de uma cooperação fiscal por nós promettida á China, unica e exclusivamente nos termos em que a colonia ingleza de Hong-Kong entendesse poder concedel-a, parece á vossa commissão uma combinação feliz, que permitte dar uma solução honrosa a esse problema, pendente de tão remota data, das nossas relações officiaes com o imperio da China.
Bem diversas foram a principio as propostas apresentadas pelo delegado da China ao governo portuguez, tanto no que se referia á situação de Macau, como ainda aos methodos e processos indicados como indispensáveis para garantir a efficacia da cooperação fiscal que nos era pedida.
É sem duvida de importância vital para Macau a celebração de um tratado, que dê as garantias internacionaes á nossa representação consular na China, que ponha no imperio, de par com os das outras nações europeas, os súbditos portuguezes e garanta ao nosso commercio o tratamento de nação mais favorecida, que lance as bases reguladoras da extradição, evitando-nos o vexame de não podermos acudir por effeito das disposições beneficas de um pacto internacional a qualquer subdito portuguez, incriminado na China e sujeito até aqui, a não ser por deferencia e cortezia, ás leis e tribunaes d'aquelle imperio, tão diversas na penalidade e no modo de funccionar das de Portugal. Mas se todas estas circumstancias explicam o muito que em Macau se deseja a celebração do tratado, é certo que em hypothese alguma o governo portuguez poderia sacrificar a esse empenho a dignidade nacional, ou ainda consentir no estabelecimento em Macau de repartições ou auctoridades chinezas, situação essa a que o acto audacioso de Ferreira do Amaral pozera um termo em 1849, pagando pouco depois aquelle funccionario com uma vida, por tantos titulos preciosa, as reivindicações patrioticas que fora sempre memorado o seu honrado nome em Portugal.
Mas se por nosso lado cumpria salvaguardar todos estes interesses, não havia menos que attender ás susceptibilidades da China baseadas em princípios do seu direito publico e em supremas conveniências da sua política internacional, as quaes tinham até agora tolhido a probabilidade de um accordo, e é neste sentido e em vista de todas estas difficuldades que a vossa commissão entende dever affoutamente propor á vossa approvação o protocollo de 26 de março, no qual se consigna a formula conciliadora de todas ellas e que removeu o principal senão o unico estorvo para a celebração de um tratado, necessario para Macau, reclamado por conveniencias internacionaes de ordem a mais elevada a que não é alheia a dignidade nacional, e que a vossa commissão com justificado fundamento espera que poderá agora ser facilmente negociado em Pekim.
A cooperação fiscal começou a funccionar provisoriamente em Macau em 4 do corrente.
Pelo decreto de 28 de março, deveria ter principiado em 2 de abril. A causa d'este adiamento veiu provar quanto é acertada a elasula 4.ª do protocollo de 20 de março.
Entre sir Robert Hart como representante da China e as auctoridades de Hong-Kong foi firmado, no decurso do anno findo, um accordo ácerca dos termos em que aquella colonia entendia dever conceder a cooperação solicitada pela China; esse accordo ficara porém dependente da approvação do conselho legislativo de Hong-Kong, e este examinando o e discutindo-o em março e abril deste anno, introduziu n'elle varias alterações que foi depois necessario concertar com o Tsung-li-yamen; a formula geral de similhança com o que se praticasse em Hong-Kong faz com que essas modificações de certo benéficas sejam tambem applicaveis a Macau.
Achando-se a caminho de Pekim a missão extraordinaria ali enviada para negociar o tratado de commercio e dar na capital do império um solemne testemunho dos sentimentos de amisade felizmente subsistentes entre Portugal e a China, sentimentos que têem as mais fundas raizes em uma tradição de tres seculos, é de crer que concedida por vós a auctorisação que o governo pede no artigo 2.° da proposta, o que a commissão reputa de grande conveniência, Macau possa ainda no decurso d'este anno celebrar a realisação do tratado.
O direito convencional da China está hoje assente e formulado em numerosíssimos documentos firmados pelos representantes do imperio com os da quasi totalidade dos governos europeus e americanos. Pelos moldes dessas numerosas convenções e ainda do que já preceituava o tratado portuguez não ratificado de 18 de agosto de 1862, são amoldadas as instrucções fornecidas ao nosso enviado extraordinario e ministro plenipotenciario. Não podem ellas, nem devem, constituir embaraço ou difficuldade para a sua acceitação em Pekim. Ao protocollo deverá pois em breve substituir-se o tratado e á cooperação provisoria, como hoje funcciona em Macau, e que, estabelecida por um decreto do governo póde por outro ser supprimida, deverá tambem succeder a cooperação definitiva capaz de garantir e assegurar á China a cobrança de uma das mais importantes e valiosas receitas do seu thesouro.
De accordo, pois, com quanto tem assim a honra de expor-vos, é a vossa commissão de parecer, que deveis conceder a vossa approvação ao seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É approvado o protocollo entre Portugal e o imperio da China, assignado em Lisboa em 26 de março de 1887.
Art. 2.° Fica o governo auctorisado a ratificar desde logo o tratado de commercio entre Portugal e o império da China, que, nos termos do artigo 1.° do mesmo protocollo, será negociado e firmado em Pekim.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão dos negócios externos, 18 de junho de 1887. = J. P. Oliveira Martins = J. Alves Matheus = José Frederico Laranjo = José de Saldanha Oliveira e Sousa = Antonio Ennes = Carlos Lobo d'Avila = Antonio Candido = V. Monteiro = F. Castello Branco = J. E. Scarnichia, relator.

N.° 107-R

Senhores. - Em 13 de agosto de 1862 assignou-se em Tien-Tsin um tratado de amisade e commercio entre El-

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Rei de Portugal e o Imperador da China, o qual, firmando sobre bases amplas e nos termos os mais cordiaes as relações existentes desde seculos entre os dois paizes e pondo termo ás causas de desintelligencia e incerteza de direitos, que repetidas vezes haviam assombrado a historia de Macau, foi saudado pela colonia como um beneficio incontestavel e inicio de uma era de renascimento e segurança.
Não corresponderam, porém, os factos ás esperanças suscitadas pela assignatura d'essa convenção, que, apesar de approvada pelas cortes e ratificada pelos governos das duas nações, nunca chegou a vigorar. Uma divergencia de interpretação com respeito ao que dispunham os artigos II e IX do tratado, o primeiro dos quaes se referia á situação de Macau, e o segundo ás attribuições do funccionario chinez que poderia, nos termos do mesmo tratado, residir n'aquella cidade nas condições de um consul, como o de outras nações ali representadas, baldou os esforços do nosso ministro o sr. José Rodrigues Coelho do Amaral, que, tendo ido a Tien-Tsin em 1864 encarregado pelo governo da troca das ratificações, se viu obrigado a regressar para Macau sem conseguir levar a bom termo a missão que lhe fôra confiada.
Os esforços intelligentes e patrióticos tentados mais tarde sob a inspiração e instrucções do ministerio dos negócios estrangeiros, entre outros pelos srs. José Horta e visconde de S. Januario, quando governadores de Macau, não lograram tambem melhor exito. De todas as vezes persistira a China na declaração de que nenhuma duvida oppunha á immediata troca das ratificações, uma vez que por acto authentico ficasse previamente consignada a interpretação dada pelo governo do celeste imperio ás clausulas dos disputados artigos II e IX do tratado.
Protrahiram-se estas e outras tentativas até ao anno de 1881. A China celebrara successivamente tratados de commercio e amisade com a quasi totalidade das nações da Europa e da America. Portugal, cujas relações com o imperio eram as mais antigas em data, e se haviam mantido, apesar das vicissitudes dos tempos e das alternativas occasionaes na direcção da política geral do imperio ou na das auctoridades locaes vizinhas de Macau, com um caracter de innegavel cordialidade e sympathia, Portugal ficava constituindo uma excepção unica, causa muitas vezes de dissabores e graves inconvenientes para os governos de Macau.
A negociação de um tratado inteiramente novo, similhante nas suas clausulas aos que o imperio celebrara com as demais nações e assim limitado ás condições geraes dos tratados de commercio e amisade, tal pareceu ser o expediente melhor para pôr um termo á situação anomala creada pela falta da troca das ratificações do tratado de 1862.
Coube a iniciativa d'essa nova e por muitos titulos interessante negociação ao sr. Antonio de Serpa Pimentel, que diligenciou interessar as principaes potencias europêas, com relações na China e representadas em Pekim, na solução d'esta já antiga pendencia, concertando para esse fim com os governos d'essas potencias a iniciativa que nos cumpria tomar, e firmando-se para tanto já nas relações de cordialidade e alliança que nos prendem a muitas d'ellas, já no interesse commum que ordinariamente liga as nações da Europa perante os povos do Extremo Oriente. Foi n'esse empenho e com estes intuitos que se redigiu e distribuiu pelas chancellarias da Europa uma importante Memoria ácerca de Macau, e que tiveram começo na China por intermédio do governador que então estava em exercício, o sr. Graça, as novas negociações, tendo unicamente em mira a celebração de um tratado de commercio sobre a base ou clausula da nação mais favorecida.
Foi, porém, ainda n'este caso, mallograda a tentativa do governo portuguez, e a garantia dos nossos importantes interesses, bem como a protecção dos subditos portuguezes no imperio da China continuaram, como anteriormente, sem documento internacional em que se apoiassem, e á mercê, em muitos casos, da boa ou má vontade das auctoridades locaes chinezas.
Nullo foi igualmente o resultado de uma nova tentativa de negociação auctorisada pelo sr. Barbosa du Bocage em 1884, a instancias do consul de Portugal em iShangae, e por este funccionario encetada com o Tantae, residente n'aquella cidade, conservando essa negociação, que se prolongou até 1886, um caracter sempre officioso.
A necessidade experimentada pelo governo imperial de melhorar a fiscalisação de uma das suas mais importantes fontes de receita, constituída pela cobrança dos direitos sobre o opio, veiu, porém, modificar esta situação. Foram esses direitos recentemente aggravados e uniformisados em todo o imperio, havendo-se encorporado em um só os que o opio pagava anteriormente, quer na importação quer no consumo, os ultimos dos quaes li-kin, variavam de um para outro ponto do imperio, e essa circumstancia deu aso a que se celebrasse em 16 de setembro do anno findo uma convenção com o governo de Hong-Kong, em virtude da qual esta colonia assegurou á China a sua cooperação na fiscalisação dos direitos sobre o opio.
Entrava, como aliás era evidente que devia succeder no plano geral financeiro adoptado pelo governo imperia, o alcançar uma cooperação similhante por parte das auctoridades portuguezas de Macau.
Interessavam n'isso a China, e a própria colónia de Hong-Kong, que, na convenção ha pouco referida, tornou dependente da adopção de providencias e accordo similhantes com respeito a Macau, a vigência das clausulas da mesma convenção em Hong-Kong.
Dirigiu-se, pois, sir Robert Hart, inspector geral das alfândegas chinezas, com esse intuito a Macau, e ahi encetou em fins do primeiro semestre de 1886 uma negociação com o governador, o major Thomás Rosa, no decurso da qual se lançaram as primeiras bases, sujeitas á approvação dos dois governos, de um tratado que resolvesse de vez a nossa antiga pendencia diplomatica com a China, e assegurasse ao império a cooperação fiscal de que elle carecia para melhor garantir o exito das suas reformas financeiras.
Terminava por esse tempo o periodo de governo do sr. Thomás Rosa, e por tal motivo se interromperam as negociações. Ficou, porém, assentado com sir Robert Hart, que estas se reabrissem em Lisboa, o que lhes garantiria mais rapido andamento, vindo para esse fim a Portugal um funccionario da China, o sr. James Duncan Campbell, o mesmo que em 1880 tratara em Paris com os srs. Billot e Julcs Feriy as clausulas preliminares constantes do protocollo de 4 de abril d'aquelle anno e que foram a base do tratado de paz celebrado em 9 de junho seguinte entre o império e a Republica Franceza.
A negociação a principio officiosa, por ter esse caracter o agente enviado pela China a Portugal, proseguiu activa e directamente entre Lisboa e Pekim de fins de novembro até abril, sendo o sr. Campbell o intermediário a principio de sir Robert Hart e mais tarde não só deste, mas tambem do Tsung-li-yamen com o governo portuguez.
Das laboriosas negociações assim realisadas, e no decurso das quaes variaram bastante as bases a principio formuladas, resultou por fim a assignatura em Lisboa do protocollo de 26 de março.
Os documentos relativos a essas, bem como a todas as negociações que as precederam e as que ficou feita referencia, serão opportunamente publicados e presentes ás camaras.
Os poderes conferidos ao sr. James Duncan Campbell para firmar o acto diplomatico, que assim veiu dar uma terminação official ás negociações encetadas com um caracter puramente officioso, foram-lhe conferidos por um decreto imperial de cuja existencia deu noticia telegra-

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phica para o Foreign Office em Londres, a legação de Sua Magestade Britannica em Pekim, sendo-me essa existencia confirmada mais tarde oficialmente pelo ministro de Inglaterra n'esta côrte.
Estabelecida assim e consignada em documento solemne a harmonia entre a China e Portugal nas bases essenciaes do tratado a celebrar, o governo de Sua Magestade Fidelíssima resolveu de prompto mandar a Pekim um ministro plenipotenciario e enviado extraordinario, encarregado especialmente de ultimar a negociação d'esse tratado, cuja importancia para Macau resalta de todos os esforços, empenhados até hoje por tantas situações políticas em Portugal, e por successivos governadores no intuito de o alcançar.
A situação creada aos súbditos portuguezes na China pelo estado de cousas subsistente é de facto, e por muitos motivos, deplorável. Urge pôr-lhe um termo, e quanto possível rapido, similhante consideração, cujo peso e importancia só avaliam completamente os que de perto conhecem os factos, impelle o governo a propor-vos o ficar auctorisado a negociar e desde logo ratificar o tratado a que faz referencia o artigo 1.º do protocollo. A vantagem de estreitar no momento actual as nossas relações com a China é de per si evidente, e vale bem qualquer modificação que nas clausulas aliás geraes de um tratado de commercio, que necessariamente ha de ser pautado sobre os que as outras potencias têem celebrado com a China, podesse ainda introduzir a discussão parlamentar.
Esse grande, antiquíssimo e poderoso império da China chegou, bem como quasi todas as nações orientaes, a um período de notável transformação. Augmentam a cada momento as suas relações com a Europa, e a natural agudeza de espirito dos seus filhos abrange pelo trato com os povos do occidente novos e largos horisontes. Os mais intelligentes diplomatas da China, depois de terem adquirido nas côrtes de Londres, Berlim e S. Petcrsburgo o trato com os homens e as cousas europêas, vão mais tarde, alguns d'ellcs, para o Tsung-li-yamen influir directamente na administração e governo do imperio: não é, portanto, n'estas condições que seria util ou conveniente protelar a rapida conclusão de uma negociação difficil, que deve dar em resultado o consolidar de vez essas relações de sympathia e amisade existentes ha mais de tres seculos entre o paiz que primeiro abriu os mares da China ao commercio europeu e o grande imperio asiatico.
Começadas em 1517, anno em que uma primeira esquadra aportára a Cantão levando a seu bordo um embaixador do Rei de Portugal, essas relações assignalaram se pouco depois com um serviço real, positivo, que a audacia dos portuguezes poude o soube prestar a uma província da China, victimada pelas depredações e insultos de um bando de piratas.
Ainda em 1810 a activa cooperação das forças navaes portuguezas, solicitada pelas auctoridades da China, contribuiu eficazmente para a derrota e sujeição do enorme poder dos piratas insurgidos e em revolta contra a dynastia. Possam, pois, essas relações entre os dois paizes assim cimentadas mais de uma voz atravez de tres seculos, por bons officios reciprocamente prestados, accentuar-se de novo em um documento solemne que affirme e consolide a amisade e boa intelligencia subsistentes durante tão largo praso de tempo entre Portugal e a China.
Firmado n'estas rasões tenho, portanto, a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º É approvado o protocollo entre Portugal e o imperio da China, assignado em Lisboa em 26 de março de 1867.
Art. 2.° Fica o governo auctorisado a ratificar desde logo o tratado de commercio entro Portugal e o imperio da China, que, nos termos do artigo 1.° do mesmo protocollo, será negociado e firmado em Pekim.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario. Lisboa, 4 de junho de 1887. = Henrique de Barros Gomes.

Protocollo

O governo de Sua Magestade Fidelíssima El-Rei de Portugal e dos Algarves, e o governo de Sua Magestade Imperial o Imperador da China, tendo resolvido regular as relações amigaveis existentes ha mais de tres seculos entre os dois paizes, concordaram para este fim em firmar um protocollo preliminar.
Com este intuito os abaixo assignados, Henrique de Barros Gomes, do conselho de Sua Magestade e seu ministro e secretario d'estado dos negocios estrangeiros, gran-cruz das ordens de Nosso Senhor Jesus Christo, da Legião de Honra, de Pio IX, dos Santos Maurício e Lazaro, de Carlos III, e de Leopoldo da Belgica, etc.; e James Duncan Campbell, commissario e secretario não residente da inspecção geral das alfandegas imperiaes marítimas chinezas da segunda classe da hierarchia civil chineza, tendo a condecoração do duplo Dragão, segunda divisão, segunda classe, commendador da ordem da Legião de Honra, e cavalleiro (companion) da mui distincta ordem de S. Miguel e S. Jorge, devidamente auctorisados pelos seus respectivos governos, convieram no seguinte protocollo:
Artigo 1.º Um tratado de commercio e de amisade com a clausula da nação mais favorecida, será concluído e assignado em Pekim.
Art. 2.° A China confirma a perpetua occupação e governo de Macau e suas dependencias por Portugal como qualquer outra possessão portugueza.
Art. 3.º Portugal obriga-se a nunca alienar Macau e suas dependencias sem accordo com a China.
Art. 4.° Portugal obriga-se a cooperar com a China na cobrança do rendimento do opio em Macau, do mesmo modo que a Inglaterra em Hong-Kong.
Feito em Lisboa, em 26 de março de 1887. = Barros Gomes = J. Duncan Campbell.
Está conforme. - Secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, em 4 de junho de 1887. = A. de Ornellas.

O sr. Presidente. - Está em discussão na generalidade.
O sr. Pinheiro Chagas: - Refere-se, em primeiro logar, á notícia, publicada n'um jornal, de que a guarnição de Tungue estava n'uma situação deploravel por falta de mantimentos, afirmando-se mesmo que, por esse motivo, o posto fiscal de Meningane tinha sido abandonado.
Pedia por isso, antes de entrar na discussão do projecto, que o sr. ministro da marinha desse algumas explicações sobre este ponto importante.
O. sr. Ministro da Marinha (Barros Gomes): - Responde que apenas tivera conhecimento da noticia a que se referira o sr. Pinheiro Chagas, telegraphára para Moçambique, e hoje mesmo recebera um telegramma do governador geral, dizendo que a guarnição do Tungue estava paga até ao fim de maio, e que os fardamentos tambem tinham sido enviados com a frequencia possível.
Referindo-se depois ao que dissera o sr. Baracho, assegura que o governo tinha toda a consideração pelos serviços prestados pelo sr. coronel Palma Velho, como a tinha pelo procedimento, em Matibane, do guarda marinha Ferreira, que, apesar de ferido n'uma coxa, continuou dando as vozes de commando, e do mesmo modo pelo do marinheiro que, apesar de perder um olho, continuou fazendo fogo.
O governo não esqueceria taes serviços; havia de recompensal-os.
O sr. Pinheiro Chagas: - Continuando, agradece ao sr. ministro da marinha as suas explicações relativas ao sr. Palma Velho, ao guarda marinha, e ao marinheiro, explicações que eram satisfactorias.
Agradecia tambem as que havia dado a respeito de Tungue, mas essas explicações não o satisfaziam, porque ali não havia só a questão do pagamento, havia tambem a do

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fornecimento dos géneros alimentícios, fornecimento que era muito difficil.
Entrando na discussão do projecto, o orador começa por declarar que lhe faltavam todos os esclarecimentos para o poder apreciar.
Apresentava-se á discussão um projecto para ser approvado um protocollo que tinha por fim ratificar um tratado de commercio, que era completamente desconhecido, e que tinha só a clausula de ser assimilhado á nação mais favorecida.
Era necessario ter com a China relações de amisade, de commercio e de boa vizinhança, mas não se sabia em que sentido tinham sido dirigidas as negociações pelo governo, porque a proposta vinha desacompanhada de quaesquer documentos que a elucidem. Nem sobre este tratado havia o Livro branco.
Parecia-lhe que o projecto equivalia a dizer que se vão restabelecer as alfandegas chinezas em Macau, que o bravo governador Ferreira do Amaral havia expulsado completamente. Oxalá que o tratado não fosse a ruína de Macau!
Desejava que o governo fallasse francamente á camara, porque se o tratado podia trazer para Portugal algumas vantagens, era tambem certo que elle podia ser o gérmen de ruína d'aquella nossa colonia.
A situação de Macau era muito differente da de Hong-Kong, e o systema estabelecido nesta possessão ingleza não podia ser applicado a Macau.
Se se estabelecesse ali uma fiscalisação chineza, em que situação ficavam os negociantes e fabricantes de chá e de seda?
Não queria que, a pretexto de se fiscalisar o contrabando, se fosse estabelecer uma fiscalisação chineza, quando ella podia ser feita por auctoridades portuguesas.
Entendia que se deviam dar á China certas garantias, desde que ella reconhecia o nosso direito em Macau; mas era tambem indispensavel que se dessem ás industrias, ali estabelecidas, garantias contra os vexames e prepotencias das auctoridades chinezas.
A China confirmava pelo tratado a Portugal a posse de Macau e suas dependencias: desejava saber se se comprehendia tambem a ilha da Lapa.
Perguntava mais ao sr. ministro da marinha o que tencionava fazer de Macau.
Era sabido que o que dava vida a Macau eram principalmente as industrias da seda e do chá, e essas industrias haviam de definhar logo que não podessem obter a materia prima com facilidade, ou que fosse onerada com impostos pesados.
Tambem não podia deixar de chamar a attenção do sr. ministro para uma questão importante; era a das condições d'aquelle porto, do qual, se não se tomassem providencias, se afastaria a navegação.
Sabia que um engenheiro distincto, o sr. Loureiro, estudara os melhoramentos de que o porto carecia e orçara as obras em 50:000$000 réis, e sabia tambem que se porventura não se lhe acudisse com alguns melhoramentos, dentro de pouco tempo o porto ficaria arruinado.
Termina, declarando que pela ignorancia em que estava do modo como foi dirigida a negociação, via-se impossibilitado de dar o seu voto ao projecto.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir,}
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Sr. presidente, todo o meu trabalho agora consiste em diligenciar resumir por tal fórma a minha argumentação que, sem tomar demasiado tempo á camara, nem deixe desamparados de defeza os actos do governo, nem possa ao mesmo tempo ser accusado de ter para com os illustres deputados da opposição, que no uso liberrimo do seu direito e no exercício do seu dever impugnam os actos governativos, toda aquella deferencia que justamente merecem aos membros do governo.
Sr. presidente, sou accusado porque apresentei ás côrtes esta proposta de lei, não a tendo acompanhado com todos os documentos da negociação que deveriam illustrar a opinião da camara, e habilital-a a formar um juizo claro e seguro sobre a importancia d'este protocollo e sobre as consequencias legitimas que se derivarão da approvação d'esta proposta de lei.
Declaro francamente que, apresentando esta proposta de lei nos termos em que o faço, peço á camara um voto de confiança, visto que venho solicitar auctorisação para celebrar e desde logo ratificar um tratado. E desde o momento que não apresento o próprio tratado, é certo que, se a maioria não depositar confiança nos membros do governo actual, esse pedido será necessariamente seguido de uma recusa. Mas parece-me que, tratando se apenas de um convénio a celebrar com a China, nas condições geraes em que o póde ser um tratado de commercio celebrado com aquella potencia, conhecidas já as formulas por ella usadas e estabelecidas em taes casos, a clausula precisa e essencial de que não poderemos deixar de gosar por virtude d'elle, do condições de nação mais favorecida, auctorisa bem o affirmar-se que este pedido de confiança, assim feito á camara, não vae alem de um limite que me parece póde ser digna e patrioticamente acceite por uma maioria tão illustrada como a actual.
Dá-se, é certo, uma circumstancia que o sr. Pinheiro Chagas notou, e é que a China tratando comnosco tem a attender a uma especialidade que lhe não cumpria ter em conta ao tratar com qualquer outra potência, pela circumstancia de vizinhança em que está com Macau.
E até a propria Inglaterra, que tambem está nas condições de vizinhança, só o é por uma ilha e não por uma península ligada a territorio chinez, como acontece com Portugal.
Mas é precisamente attendendo a esta particularidade que eu affirmo poder a maioria, legitima, patriotica e dignamente conceder auctorisação para o governo negociar com a China tudo quanto clara e terminantemente se contém nos limites deste protocollo.
As relações em que fica Macau com respeito á China vem aqui precisa e substancialmente definidas. O tratado, que se ha de celebrar tem de inserir estes princípios que já estão assentes; e nestes termos, repito, as unicas condições de largo alcance político, que poderiam levar esta camara a recusar a qualquer governo uma auctorisação para tratar com a China, estando desde já perfeitamente definidas n'este protocollo não podem de modo algum embaraçar a maioria da camara, se o julgar opportuno, a conceder ao governo a auctorisação que lhe é pedida.
Resta, é claro, o tratado de commercio propriamente dito, mas para isso lá está a clausula geral de uma convenção baseada sobre o principio de nação mais favorecida, ainda assim, é certo que, se a maioria da camara entender que o governo não lhe merece confiança para lhe conceder uma auctorisação tão limitada, está no seu direito pleno de lh'a recusar.
É portanto um voto de confiança, mas não me parece que vá alem dos limites muito ligitimos e rasoaveis que uma camara póde e deve praticamente acceitar. (Apoiados.)
A respeito de documentos diz o illusíre deputado: Se o sr. ministro não os apresenta agora, quando eu d'elles careço, de que me servem mais tarde, quando o governo tiver usado da auctorisação que se lhe confere e quando o contrato for ratificado e estiver em vigor?
Pois o parlamento não tem direito de apreciar o procedimento do governo, de o censurar; não póde impor ao governo responsabilidade política pelo bom ou mau uso de uma auctorisação parlamentar? (Apoiados.}
Se por acaso o ministro, usando, ou abusando de uma tal auctorisação, fizesse um tratado que fosse de qualquer forma desvantajoso para a colónia de Macau, não se pode-

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ria, está claro, voltar atraz, porque tinha de se respeitar o que estava pactuado em nome da nação. (Apoiados.) Todavia, é tambem certo que o ministro dos negocios estrangeiros, que devia, n'essas circumstancias, dar contas dos seus actos perante a camara, diante de um veredictum desfavoravel do parlamento, teria de desapparecer d'estas cadeiras, e assim soffrer as consequencias da justa censura que sobre elle fizesse recair o exame parlamentar, e a livre critica, que n'esta discussão se poderia exercer com perfeita consciencia e conhecimento de causa. É pois necessario que venham aqui todos os documentos, permittindo apreciar as condições em que o governo tratou. Não é de modo algum inutil, como o pretendia o sr. deputado, a vinda destes documentos á camara.
O illustre deputado, que já foi ministro da marinha, é um espirito tão illustrado, (Apoiados.) que não desconhece muitas das condições da China, como acaba de o revelar no erudito discurso que a camara ouviu, pois houve alguns pontos no discurso de s. exa. que a camara toda applaudiu, e em que eu tambem estou de accordo; o illustre deputado não reparou que as suas reflexões, naturalmente, suscitavam uma pergunta, e era porque, sendo s. exa. tão conhecedor, como demonstra, das conveniências de Macau, não quiz, não soube, ou não poude usar por seu lado, em quanto esteve no poder, de todos esses elementos que indicou, e que são na maior parte independentes do tratado, para restituir a Macau tudo que s. exa. desejava, tanto que se lhe restituísse o seu antigo brilho e explendor?
Pois em boa paz, que terá o protocollo que estamos discutindo de commum com a regulamentação da emigração chineza, por exemplo, ou com as condições em que o chá é fabricado em Macau, ou exportado para Portugal? O protocollo que n'este momento faz assumpto da discussão e deliberação da camara, nada tem com as condições das loterias em Macau, ou com quaesquer circumstancias administrativas que se verificam n'aquella colonia.
O illustre deputado voltou-se para o ministro interino da marinha e ultramar para lhe perguntar: - «Que fez s. exa. de Macau?»
Eu tinha vontade de lhe responder. - E que fez o sr. Pinheiro Chagas de Macau nos longos annos em que foi ministro? (Apoiados.) - Porque todas as providencias ácerca da emigração chineza a que s. exa. alludiu, todas essas attenuantes á - «mesure trop généreuse mais un peu radicale» na expressão do escriptor da Revista dos Dois Mundos, ainda ha pouco citado por s. exa. podiam ter sido estabelecidas ha muito por fórma a antiullar para Portugal e sem detrimento da China os males produzidos pelo nosso excessivo humanitarismo, e pelos interesses ligados contra nós.
E perguntarei eu, pois, ainda uma vez, porque é que durante o largo praso em que s. exa. se conservou n'estas cadeiras não regulamentou por outra fórma a emigração chineza de Macau?
(Interrupção do sr. Pinheiro Chagas.)
Que eu asseguro a v. exa. é que ainda hoje, e não ha muitas horas tomei conhecimento de um officio do governador de Macau, reclamando providencias com respeito á regulamentação da emigração que póde e deve ser consentida sem que isso torne possível o sermos accusados de querer restabelecer o que havia de odioso no antigo commercio dos colies, sendo certo que nenhum governo quereria para si esta responsabilidade.
Mas seja como for, dado mesmo que v. exa. nas providencias que adoptou fosse o mais feliz, o que assevero a v. exa. é que o protocolo que estamos discutindo nada tem nem com as condições em que se verifica a emigração, nem sequer com aquellas segundo as quaes se realisa o commercio do chá.
Eu lamento não ter trazido hoje á camara, e desde já me comprometto para com o nobre deputado que usou da palavra antes de mim, a trazer aqui o regulamento estabelecido de accordo entre as auctoridades chinezas e o conselho governativo de Hong-Kong, para realisar essa cooperação official que a Inglaterra concedeu em Hong-Kong á China. Esse regulamento é curto e em extremo singelo nas suas disposições. E é certo que o conselho legislativo em Hong-Kong, tendo tomado conhecimento d'elle, lhe introduziu algumas modificações para tornar essa cooperação official por parte da Inglaterra ainda mais facil e acceitavel, e por consequencia de natureza a tornar impossível o embaraçar as boas relações entre as auctoridades dos dois paizes.
N'esses dermos, a cooperação por parte da Inglaterra reduz-se a tão pouco, que me parece que não devemos nós tambem assustar-nos pelo facto da cooperação identica que por nosso lado nos cumpre prestar em Macau.
A regulamentação da venda e a fiscalisação dos depositos pelo nosso arrematante do opio, a intervenção do capitão do porto com respeito ás embarcações que fazem o transporte do opio, no sentido de as obrigar a manifesto e a pagamento de direitos na alfandega chineza, situada em território chinez, provavelmente na ilha da Laja, a tanto se reduz a cooperação de que se trata. Posso, pois, asseverar ao sr. deputado Pinheiro Chagas e á camara, de um modo terminante, que nenhum embaraço póde advir ao commercio do chá ou a qualquer outro commercio licito da cooperação fiscal concedida á China.
O conhecimento dos documentos, que eu desejaria, mas que não pude apresentar á camara toda, porque d'ahi podia resultar embaraço às negociações de Pekin, virá, segundo espero, demonstrar a s. exa. que era perfeitamente inexacto na sua asserção de que este tratado importava o estabelecimento do terrível hopu, a que pozera termo o acto valente e heroico de Ferreira de Amaral, que o pagou com a vida sacrificada pelo punhal dos sicarios.
Quando as negociações começaram em Lisboa, ou, para melhor dizer, nas conferencias havidas primeiro em Macau, é certo que se pedia o estabelecimento de uma alfândega portugueza de ópio em Macau onde houvesse uma secção chineza, sob auctoridade tambem chineza, que fizesse ali a cobrança dos direitos do ópio. Mas o governo não acceitou essa combinação, nem se quer acceitámos, por fim, embora a discutíssemos, a hypothese da constituição do que se chama um hulk afloat, o illustre deputado, que conhece bem o inglez, sabe o que isto quer dizer, um deposito marítimo, embora sob a bandeira portugueza, onde estivesse um empregado chinez para fazer a fiscalisação e a cobrança dos direitos do opio. Não haverá portanto, auctoridade alguma chineza, nem alfândega chineza, ou porto aduaneiro chinez em Macau.
A cobrança dos direitos do opio, note a camara, ha de effectuar-se fóra do territorio de Macau, embora em pontos proximos da cidade.
A auctoridade chineza não poderá, em qualquer circumstancia, funccionar em Macau, nem ter ali especie alguma de repartição onde trate dos negocios a seu cargo. Portanto, longe de se estabelecer o hopu, o que vamos com o protocollo é regularisar de vez a situação de Macau em face da China, e, apesar das circumstancias assim estabelecidas serem inteiramente diversas das que existiam no tempo de Ferreira do Amaral, o que poderá talvez auctorisar a constituição da secção chineza em deposito marítimo sob bandeira portugueza, não admittimos a presença de funccionarios chinezes em Macau, com direito de fiscalisação em o nosso territorio.
Esse deposito, que aliás é indispensavel, vae estabelecer-se fóra de Macau, e, embora o funccionario chinez que lá estiver possa residir em Macau, como qualquer particular, o que nunca poderá é exercer as suas funcções publicas na área de Macau. Onde estás pois, aqui o restabelecimento do hopu?
S. exa., usando de toda aquella eloquencia, dispondo de todos aquelles recursos oratorios que a camara lhe reco-

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nhece, e a que eu folgo de prestar homenagem roais uma vez, diz que este tratado é o hopu que resuscita, e eu digo que é a regularisação da nossa situação com a China, regularisação em que se têem empenhado todos os governos d'esta terra, e que por um conjuncto feliz de circumstancias, e do qual eu não me attribuo a gloria, por serem alheias á minha vontade, mas que eu diligenciei aproveitar quanto pude e soube, a final se vae conseguir com este tratado, que representa, como disse, a regularisação das nossas relações officiaes com a China, e da situação de Macau em face d'aquelle imperio, sem isto importar o restabelecimento das alfandegas chinezas, nem a existência de uma auctoridade chineza em Macau.
A verdade de tudo isto resalta de documentos que estão escriptos, que hão de vir á camara, e que ella mais tarde apreciará, avaliando então as responsabilidades do governo, não com benevolencia, que não póde haver n'estes casos, mas com a intelligencia que resultará do conhecimento pleno e inteiro dos factos, como elles se passaram.
Dizia o nobre deputado que a situação da fiscalisação em Hong-Kong e Macau era inteiramente diversa, e que em Macau nós não unhamos consentido até agora que as lorchas chinezas viessem a uma pequena distancia do porto e da cidade incommodar-nos.
Está presente o illustre deputado por Macau, e una antigo governador d'aquella província, poderiam elles dizer a s. exa. que foram por vezes necessarios actos de grande energia para afastar as lorchas das proximidades de Macau, e evitar que ellas por todas as fórmas nos incommodassem, sem que apesar de tudo isso tenhamos conseguido impedir que ellas continuem a estar como estão á distancia de um tiro de pistola da cidade.
O que é certo é que a população de Macau pedia instante e constantemente á administração superior que diligenciasse quanto em si coubesse pôr termo a uma situação, que não só era violenta, mas que podia originar a cada momento graves complicações e responsabilidades.
Tal era a situação de Macau, e só me admira, que s. exa., por tantos annos ministro da marinha, parecesse desconhecel-a.
Estando a questão nestes termos, vem s. exa., com espanto meu, dizer-nos:
«Como é que poderemos de futuro manter o commercio da seda e do chá, que são os dois generos que alimentam e dão vida a Macau?»
Pergunto eu, porém, sr. presidente, em que e que este protocollo vae ferir tão gravemente esses ramos de commercio?
Até hoje a fiscalisação aduaneira chineza, que se exercia em torno de Macau, era dirigida pelo vice-rei de Cantão, e hoje essa fiscalisação exercer-se-ha em condições muito mais favoraveis, porque vae ser superiormente dirigida pelo director geral das alfândegas chinezas em Pekin.
A circumstancia do não poder ser uma auctoridade chineza secundaria que vá, influenciada muitas vezes pelo espirito mais acanhado e mais pequenino da província, espirito que aliás não existe nos centros governativos e nas altas regiões do império da China, intervir no modo de fazer a fiscalisação, a circumstancia, repito, de afastar o vice-rei de Cantão dessa interferencia, não póde deixar de considerar se muitíssimo importante por parte de todos os que conhecem de perto Macau.
Não sei, porém, em que este tratado vae ferir as condições commcrciaes de Macau.
O illustre deputado, querendo corrigir o que eu asseverara no meu relatorio, notou que não houvera ratificação do tratado de 1862; pois eu insisto no meu erro supposto, e assevero a s. exa. que esse tratado foi ratificado pelo governo portuguez.
(Interrupção do sr. Pinheiro Chagas que se não ouviu.)
O illustre deputado é muitíssimo illustrado para saber que entre ratificação de tratado e troca de ratificações ha muita differença.
Ratificação é o acto pelo qual o poder executivo declara acceitar as clausulas ou condições de um tratado ou convenção. Ratificado este pelos dois governos que n'elle intervieram, realisa-se mais tarde, em ponto previamente escolhido, o exame e comparação dos dois instrumentos de ratificação, e verificada a sua absoluta identidade, tem logar a troca d'esses dois instrumentos.
Ora o tratado de 1862 foi ratificado por Portugal, e o instrumento d'essa ratificação foi levado a Pekim, pelo nosso plenipotenciário o sr. Rodrigo do Amaral.
Foi então, e quando ia proceder-se á troca, reunidos os dois plenipotenciarios, que a da China pedia para primeiro se esclarecer o sentido de algumas das disposições do tratado, e eram as que precisamente, e de modo aliás muito incoberto se referiam a Macau; porque o tratado dizia, não o que se lê n'este protocollo actual onde a China confirma o governo e a posse perpetua de Macau por Portugal, como qualquer outra possessão portugueza não se dizia nada d'isto no tratado de 1862, dizia-se apenas: «Macau d'antes na província de Cantão», e foi sobre este d'antes palavra que se dizia não existir na versão chineza, e onde exclusivamente se queria ver a affirmação do domínio de Portugal em Macau, que a questão toda versou, e d'ahi a origem das difficuldades que até hoje tolhiam como todos os governos, que insistente, e patrioticamente, o têem diligenciado, celebrar um tratado de commercio com a China, o qual só agora se conseguirá realisar.
Mas havia tambem no tratado um artigo 9.°, que deu origem a duvidas. Era o que estabelecia em Macau um consul segundo a versão portugueza, um mandarim ou funccionario do imperio, segundo a versão chineza.
E diz o sr. Pinheiro Chagas, mas agora vamos ter o mesmo mandarim em virtude deste tratado!
Não, senhor, não vamos ter nada d'isso, esteja s. exa. certo, e tome nota do que assevero, o que vamos ter são as nossas relações consulares regularisadas com aquelle imperio; vamos ter o que o illustre deputado nunca conseguiu, apesar dos seus melhores desejos, porque nomeou ministros para a China e não conseguiu que elles fossem recebidos em Pekim; vamos ter cônsules com attribuições perfeitamente definidas, porque não ha ali nenhum consul nosso, senão tolerado, nem existe disposição alguma que defina o exercício das suas attribuições; vamos acabar com o risco de ver um súbdito portuguez qualquer, accusado perante um tribunal chinez, quando tivesse de ser julgado pelas leis d'aquelle imperio, não poder ser protegido pelo seu consul, ou pelo seu ministro, diligenciando-se a sua extradicção para o salvarmos muitas vezes da pena de morte por crimes ou delictos, que, embora aos chinezes pareçam muito graves em virtude da sua legislação, comtudo o não são, segundo a nossa; vamos ter emfim uma cousa de que muito precisávamos, qual é a regularisação da nossa situação diplomatica e consular com a China, o que para nós é de uma altíssima conveniencia. (Apoiados.)
E repito, não pretendo avocar para mim a gloria de conseguir agora a realisação d'este tratado tão desejado, assim como não pretendo attribuir a menos esforços por parte dos meus antecessores a sua não realisação; circumstancias especiaes assim o determinaram e quiz Deus que fosse eu quem tivesse a fortuna de o realisar.
Acrescenta ainda o illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas: «mas não se lê aqui uma unica palavra ácerca das condições em que ficará o porto de Macau, nem se curou do accordo, que é conveniente estabelecer com o governo da China, para assegurar aquelle porto os melhoramentos que o distincto engenheiro, o sr. Loureiro, indica na sua obra muito importante, obra que eu conheço perfeitamente, apesar de mo parecer que o illustre deputado poz um tanto em duvida que o governo a conhecesse; não ha no proto-

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SESSÃO DE 27 DE JUNHO DE 1887 1447

collo uma unica palavra, dizia s. exa., que pareça revelar o conhecimento d'esse trabalho!
Ora, repito, eu conheço o perfeitamente, tive occasião de ler o exemplar que o seu auctor teve a amabilidade de me enviar, e é um documento que, a par de outros muitos, honra sobremodo aquelle distincto engenheiro. (Apoiados.)
Mas, do que nós tratámos foi de regular a nossa situação diplomatica e consular com a China, não tratámos de estabelecer convenios particulares que poderão vir mais tarde, com relação a outros assumptos e como naturaes corollarios do primeiro e essencial. (Apoiados.)
Se nós quizessemos tratar de uma convenção com a China a proposito do porto de Macau, não tínhamos ali um ministro, e hoje em virtude deste protocollo e do tratado, de que espero em Deus ver colher grandes resultados pelo paiz, poderemos ter um representante permanente em Pekim, e quando houver qualquer difficuldade entre os dois paizes, que nasça ou das relações da vizinhança entre Macau e a China ou de outra causa, teremos uma representação no imperio da China para ajudar a resolvel-a desde logo. E emquanto estas vantagens se conseguem, o porto de Macau não vae ser prejudicado com este tratado em cousa alguma ou em qualquer ramo de commercio licito.
Eu folguei de ouvir dizer ao illustre deputado que, comquanto entendesse que eram sacrificados os interesses provenientes do commercio do opio, não se affligia com isso, pois não defendia o contrabando.
O illustre deputado formulou uma proposição que deve ser adoptada e seguida por todos aquelles que prezam a dignidade da nação. (Apoiados.)
Nós temos sustentado relações com a China, muito dignas e muito cordiaes, relações que se têem conservado atravez de alguns séculos, relações de amisade e de boa vizinhança, e debaixo d'este ponto de vista digo, um commercio por mais rendoso que elle fosse, quando se baseasse na exploração do contrabando, no cerceamento illegitimo dos interesses do thesouro chinez, não era defensavel, nem devia consentir-se.
Portanto, o governo entende que procedeu bem, unindo os seus esforços aos da Inglaterra, para se pôr termo ao contrabando que se fazia á luz do dia, passando ás caravanas que o introduziam na China, a toda a hora, debaixo das janellas dos governadores de Macau.
Perguntou o illustre deputado se nas negociações com a China havia referencia á ilha da Laja.
Permitia me s. exa. que sobre esse ponto eu seja muito reservado. Essa idéa nunca chegou a ter acceitação na corte de Pekim, e nos termos em que está feito o protocollo não ha a tal respeito referencia alguma.
Sr. presidente, termino por onde comecei; creio haver respondido no que respeita á defeza do protocollo, aos argumentos apresentados contra a proposta do governo pelo illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas.
Trata-se de um voto de confiança muito restricto, é certo, a dar ao governo, e aquelles que têem essa confiança no governo votam a proposta; aquelles, porém, que não abrigam esse sentimento de benevolência e de confiança para com o gabinete, naturalmente votarão contra.
E não me alargo em mais considerações porque a hora vae adiantada e desejo tomar pouco tempo á camara.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Declara que não estava de accordo com o sr. ministro dos negocios estrangeiros, quando dizia que, tratando-se de um voto de confiança, os deputados da maioria votariam a favor e os deputados da opposição contra.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Observa que o governo, olhando simplesmente para a questão das suas responsabilidades, estimaria mais trazer o tratado á camara.
Mas de certo o illustre deputado não ignorava que a colonia de Macau desejava este tratado, desde muitos annos, e quereria que elle mais cedo tivesse sido celebrado e ratificado.
N'estas circumstancias, attendendo aos interesses de Macau, bem conhecidos por quantos sabem o que é aquella colonia, e sendo as condições essenciaes do tratado já sabidas, elle, ministro, não hesitava em trazer ao parlamento a proposta de lei tal qual está.
O Orador: - Não era de um simples voto de confiança que se tratava, e sim de um preceito constitucional, que mandava que os tratados feitos com as outras nações fossem presentes ás côrtes. Portanto, na sua opinião, do que se tratava era de um bill, que os srs. ministros deviam pedir ás duas camaras.
Disse que o sr. ministro apresentara a sua proposta como um expediente facil, quando o não era e não podia deixar de protestar contra tal doutrina.
Já não bastava protrahir a discussão e votação do lill sobro os actos da dictadura: agora transformava-se tudo em votos de confiança e bills de indemnidade. Não queria alargar a discussão e por isso não faria muitas considerações que viriam a propósito, mas não podia deixar de dizer que mais uma vez o governo transformava a sua obrigação constitucional em um expediente.
E sendo sua opinião que um voto de confiança, como o sr. ministro chamara á proposta que se discute, não podia desobrigar o governo do cumprimento dos preceitos que a constituição lhe impunha, havia de mandar para a mesa uma moção no sentido que acabava de indicar.
Tambem entendia, como o sr. Pinheiro Chagas, que o projecto vinha desacompanhado dos documentos necessarios para a camara poder votar com perfeito conhecimento de causa. Não só permittindo á camara o exame dos documentos, era isso collocar os deputados na impossibilidade de entrarem no debate.
Não conhecia o alcance da auctorisação que se pedia, nem sabia se elle era grande ou pequeno, nem até onde podia ir.
Via que pelo artigo 1.° do protocollo se approvava um tratado de commercio e de amisade com a clausula da nação mais favorecida, e pelo artigo 2.° a China confirmava a perpetua occupação e governo de Macau como qualquer outra possessão portugueza.
Mas a redacção d'este artigo não lhe parecia bem clara.
Era uma questão de direito ou de facto? Se era questão de direito, não vinha bem expressa; se era questão de facto, podia não ter valor nenhum, porque simplesmente sã limitava ao passado.
Mas o artigo 3.°, que dizia que Portugal se obrigava a nunca alienar Macau e suas dependencias sem accordo com a China, reputava o muito grave, e parecia-lhe que uma imposição não devia ser acceita pelo parlamento portuguez.
Declarou que votava contra o tratado, porque não foram respeitadas as praxes parlamentares: se o governo entendia que devia negociar um tratado, não o devia ratificar sem primeiro o trazer á approvação das côrtes.
Depois de outras considerações mandou para a mesa a seguinte:

Proposta

A camara, reconhecendo que um simples voto de confiança não póde dispensar o governo da obediencia a um preceito constitucional, passa á ordem do dia = Consiglieri Pedroso.
Foi admittida e ficou em discussão.

O sr. Mazziotti: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara se julga a materia sufficientemente discutida.
A camara resolveu affirmativamente.
Lido e posto á votação o projecto, foi approvado na generalidade e na especialidade.
O sr. Estevão de Oliveira: - Mando para a mesa o parecer da commissão administrativa sobre as contas da

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1448 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

junta administrativa da camara, relativas á sua gerencia desde 12 de julho de 1885 a 25 de janeiro de 1886.
A imprimir.
O sr. Matosos Santos: - Mando para a mesa o parecer das commissões reunidas de fazenda e de obras publicas, ácerca da proposta do governo n.° 119-C, para a construcção e exploração de um entreposto commercial livre, no porto de Lisboa, entre Belem e Cascaes.
A imprimir.
O sr. Scharnichia: - Mando para a mesa o parecer da commissão do ultramar sobre o projecto do sr. Laranjo, auctorisando o governo a reintegrar Francisco José Diniz no posto de tenente do exercito de Africa oriental.
A imprimir.
O sr. Presidente: - A ordem da noite é, alem da que estava dada, a discussão dos projectos n.ºs 122 e 120, começando a discussão pelo projecto n.° 125, e seguindo-se o projecto n.° 111.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Representação apresentada n'esta sessão

E. N.° 31

Senhores deputados da nação portugueza. - A camara municipal do concelho de Serpa, deliberou em sessão de 20 de junho corrente, representar e fazer bem patente, perante vós, o lamentavel estado de decadencia a que tem chegado nos ultimos tempos a agricultura deste concelho, especialmente no que respeita á cultura e producção de cereaes: têem alguma importância entre nós a cultura e producção da oliveira, da vinha, da azinheira, a industria agrícola da creação e engorda de gado suino e lanígero; mas, sobre todas, é importantíssima a cultura e producção do trigo, sendo com certeza este concelho o segundo no districto de Beja, que mais se dedica a esta especialidade agrícola.
Esta camara, conhecedora das clamorosas e justificadissimas queixas dos seus agricultores, que são quasi todos os habitantes do concelho, conhecedora do definhamento da quasi ruína da sua única riqueza, resultante da impossibilidade de realisar a necessaria troca dos géneros da sua producção pelo capital indispensavel para a sustentação do agricultor, e costeio da propriedade, não podia deixar de vir perante vós, expor que a continuação d'este estado desastroso, será a morte inevitável da sua riqueza publica e a da agricultura portugueza, base principal da nossa vida nacional: a propriedade diminuo de valor de uma maneira assustadora, e algumas propriedades vão ficando já sem cultura, pela falta completa de meios para o seu grangeio; estes factos podem já hoje provar-se pelas numerosas reclamações por diminuição de rendimento collectavel nas matrizes, que annualmente afluem às respectivas repartições de fazenda em todos os concelhos agrícolas.
Senhores deputados da nação portugueza, esta camara, vem pedir-vos, que, com o patriotismo, seriedade, e saber que vos são proprios, deis remedio prompto a este temeroso estado de cousas; que, alem de outras medidas sabiamente tomadas para resolver e debelar a crise agrícola no paiz, decreteis com a máxima brevidade o augmento do imposto aduaneiro nos cereaes importados do estrangeiro, com uma taxa tal que os productos da nossa agricultura tenham um preço remunerador, e possam competir com as producções dos paizes exportadores.
Se assim praticardes, seguindo o louvavel exemplo dos homens mais eminentes em sciencia, economia e politica, da França, da Allemanha e da Belgica, e do parlamento francez, que ultimamente augmentou a taxa sobre os trigos importados, sem temer por fórma alguma prejudicar o consumidor, ficai certos que prestareis um grande serviço á patria, e que adquirireis jus á gratidão dos vossos concidadãos. Está provado que o consumidor, hoje que o trigo custa tresentos e tantos réis cada 13, 52, não come o pão mais barato, do que na epocha em que elle valia 500, 600 e 700 réis cada alqueire; é pois certo que o augmento no imposto sobre trigos de importação, não influirá nada no preço do pão, unicamente os srs. argentarios, importadores de cereaes e fabricantes de farinhas, farão alguma reducção nos seus enormes lucros, excessivos em demasia, e a numerosa classe agrícola, talvez os dois terços dos filhos desta nação, não será completamente aniquilada pela desmedida ganância de meia duzia de indivíduos.
Confiando no zêlo com que tratareis esta questão tão importante, espera esta camara municipal que, com a urgência que demanda o assumpto, voteis:
1.° O augmento de direitos sobre os cereaes importados;
2.° Que a fava importada pague, alem dos direitos de importação actuaes, o imposto do consumo como a nacional;
3.° O augmento de direitos de importação sobre o azeite de oliveira estrangeiro;
4.° O augmento de direitos sobre as lãs importadas do estrangeiro.
Serpa, sala das sessões da camara municipal, 25 de junho de 1887. - (Seguem-se as assignaturas.)

Redactor = S. Rego.

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