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1036-B DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

isso que o povo tem uma indifferença extraordinaria pelo negocios publicos.

Que confiança póde merecer um homem, por maior que seja o seu talento, se um dia diz uma cousa e outro diz outra?

Eu fiquei surprehendido quando ouvi a censura que ha pouco me fez o sr. Pinheiro Chagas, e ainda mais surprehendido fiquei quando vi s. exa. ser o relator do bill de indemnidade.

Vou dizer á camara por que.

Quando teve logar a discussão do bill era 1881, por ter o ministerio Sampaio, de que faziam parte tres dos actuaes ministros, cobrado os impostos em dictadura, o sr. Pinheiro Chagas levantou aqui a sua voa auctorisada para combater energicamente esse attentado á liberdade.

Então dizia s. exa.: «O governo assassinou a liberdade e eu receio ouvir nas margens do Tejo e do Douro uma voz mysteriosa que diga: expira a liberdade!»

Eu acreditava nestas palavras do sr. Pinheiro Chagas porque as julgava propheticas e saídas de uma consciencia immaculada.

S. exa. receiava ouvir em 1881 nas margens do Tejo e do Douro uma voz que se dissesse: expira a liberdade.

Não sei se esses receios continuam ou acabaram, ou se a liberdade expirou, ou se a liberdade expira quando está este partido no poder. O sr. Pinheiro Chagas é que nos póde dizer se já não tem receio de ver a liberdade expirar, não obstante os assassinos que estão apostados a dar cabo d'ella. Qual seria a mudança que se operou de 1881 para cá? É por isso, que eu tenho pena de ver homens da estatura do sr. Pinheiro Chagas praticarem actos contradictorios. Eu respeito muito a s. exa. e os homens da sua estatura, porque são esses que podem ser uteis ao paiz; mas para isso devem ser coherentes, para que todos nós possamos considerar os seus autos como dogmas.

Mas, sr. presidente, eu tenho muito que dizer e discutir. Ainda hoje, antes de vir para a camara, li um discurso do sr. Hintze Ribeiro feito na camara dos pares em 1887, relativo a uma questão perfeitamente analoga a esta, porque s. exa. discutiu largamente as questões de fazenda.

Se o sr. Hintze Ribeiro, que e um estadista, levou tres sessões a discutir a questão de fazenda, não admira que eu, humilde membro d'esta casa, imite o procedimento de um cavalheiro tão importante, tão experimentado e de tanta auctoridade. E deve notar-se, que em 1887 não se discutiam novas medidas tributarias, como succede agora.

Portanto, o papel que estou a desempenhar não é unico e sem precedentes nos anuaes parlamentares. O sr. Hintze Ribeiro, com a auctoridade do seu nome, em 1887, levou tres sessões; eu não sei quantas levarei, porque hei de empregar todos os meios ao meu alcance para demorar o mais possivel a approvação d'este projecto, projecto, que constitue a maior iniquidade que conheço. Estou convencido que presto um serviço ao paiz.

Já declarei hontem a v. exa., que hei de continuar a discutir, emquanto vir que a minha attitude é conveniente aos interesses do povo, que não póde pagar mais, e ainda que podesse, não devia, porque o governo tem esbanjado doudamente os dinheiros do que é simples administrador.

O sr. ministro da fazenda teima em não deixar fallar mais nenhum dos oradores inscriptos, mas essa teimosia não fará senão evidenciai-o como um dos homens mais prejudiciaes ao paiz.

É preciso, que o sr. ministro da fazenda saiba, que as suas perrices não lhe dão resultado nenhum, e se s. exa. tivesse consentido, que depois de mim fallassem os oradores inscriptos, principalmente os srs. Manuel de Arriaga e Bandeira Coelho, esta discussão estava terminada; mas o que não póde ser é que esta camara seja governada pelos nervos do sr. Franco Castello Branco.

Eu hei de continuar a protestar com todas as minhas forças contra este projecto, e não sou só eu.

Tenho levado tres dias a discutil-o com o fim de não consentir que elle possa ser votado; mas é que eu tenho compaixão dos desgraçados contribuintes, e cada dia que eu demorar a discussão, são quatro 4 contos do réis que lhes poupo.

Já hontem citei o nome do sr. Baracho, que em 1888 levou una poucos de dias a fallar sobre o orçamento rectificado, e os illustres deputados da maioria que então eram opposição. não acharam muito. O sr. Hintze Ribeiro, levou na camara dos pares tres dias a discutir negocios de fazenda, e o proprio sr. ministro da fazendo levou n'esta camara a discutir as pautas, tambem tres dias. Que auctoridade tem então s. exa. para se tornar o censor do deputado que falla por mais ou menos tempo?

O sr. ministro da fazenda levou tres dias a discutir as pautas, e que admiração é, que eu leve tres ou quatro sessões a discutir uma questão, que comprehende tudo, porque os 6 por cento vão recair sobre todas as contribuições.

Eu respeito muito o caracter do sr. ministro da fazenda, das o que não respeito são os seus nervos, nem as suas purricos. E, o sr. ministro da fazenda alem de pirrhonico é um teimoso systematico, a quem se póde applicar a seguinte quadra oriunda da sua provincia, que s. exa. naturalmente conhece e por isso n'ella se inspira para guiar o seu modo de proceder. No Alcaide, terra do sr. ministro da fazenda, canta-se lá a seguinte quadra:

Ao almoço dão-me peras,
Ao jantar peras me dão:
A merenda pão com peras,
A ceia peras com pão.

Sempre peras. O sr. ministro da fazenda sempre teimoso. O sr. ministro da fazenda tem uns habitos que não quer perder.

Sr. presidente, o sr. ministro da fazenda está tão habituado a fazer insinuações, que mesmo do logar de ministro, quando falla, não perde o habito.

Veja-se do que modo esse habito lhe está inveterado! Ainda hoje isso aconteceu, quando se discutiu o projecto do monopolio dos tabacos.

Ora, se eu quizesse aqui reproduzir os boatos que correm lá fora a respeito de interessados no monopolio do tabaco, v. exa. comprehende que eu tambem poderia ir para esse caminho, e se o fizesse talvez interpretasse os sentimentos da opinião publica, o dizia talvez a verdade. E direi mais ainda, estou convencido de que nós estâmos aqui a discutir os tabacos conjunctamente com os 6 por cento, porque houve alguem, mais poderoso do que o sr. ministro da fazenda, que teve força para fazer entrar esse projecto hoje em discussão. Não comprehendo como se discutem de mistura dois projectos tão importantes. Eu tambem quero entrar na discussão dos tabacos, mas por este processo não sei como v. exa. entende que isso possa ser. Com este systema fico privado de um direito, que me assiste e do qual não quero prescindir, mas por este modo não o posso exercer.

E não obstante isto, o sr. ministro da fazenda não perde uma occasião de fazer insinuações; s. exa. não se emenda, mas não ganha nada com isso, porque ha de encontrar sempre d'este lado da camara quem lhe responda com a vehemencia com que merece, e muito mais quando as minhas responsabilidades são muito diversas das de s. exa. Tenho a responsabilidade do meu logar e da minha posição, mas tambem tenho o dever de zelar os interesses do povo, procurando conseguir que o mais tarde possivel sejam votados os 6 por cento, porque estou convencido que elles são absolutamente desnecessarios e obedecem só a um capricho e ao temperamento do sr. ministro da fazenda.

Pois tenho ainda muitas outras considerações a fazer, e