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N: 68

SESSÃO DE 30 DE ABRIL DE 1896

Presidencia do exmo. Sr. Antonio José de Costa Santos

Secretarios - os exmos. srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Eduardo Simões Baião

SUMMARIO

Approvada a acta, o sr. presidente participa que Sua Magestade El-Rei tinha recebido a deputação da camara com a costumada affabilidade, e que a commissão de redacção não fez alterações aos projectos n.º 67, 72 e 94. - Lido em seguida o expediente, e dando-se conhecimento das segundas leituras, o sr. Romano Santa Clara apresenta um projecto de lei. - O sr. Carlos Braga declara ter lançado uns requerimentos na caixa de petições, associa se ás considerações do sr. Marianno de Carvalho sobre a introducção de machinas para a fabricação de calçado e avisa o sr. presidente do conselho de que lhe deseja dirigir uma interpellação. - O sr. Marianno de Carvalho declara ter lançado na caixa de petições um requerimento de interesse particular, insta pela remessa de esclarecimentos que pediu pelo ministerio da marinha o manda para a mesa duas representações. - Igualmente mandam para a mesa representações os srs. Mendes Lima, Teixeira de Sousa, Abilio Beça, Carneiro de Moura e Costa Pinto. - O sr. Ferreira Marques declara ter lançado na caixa de petições varios requerimentos. - O sr. Polycarpo Anjos requer licença para sair do reino, o que lhe é concedido. - Apresentam pareceres de commissões os srs. Carlos Braga e Magalhães Lima; e o sr. Teixeira de Sousa a ultima redacção do projecto n.º 76.

Na ordem da dia approvam-se, sem discussão, os projectos n.º 76 e 89, ficando pendente da discussão o n.º 71, asando sobre elle da palavra os srs. João Arrojo, Teixeira de Vasconcellos e Salgado de Araujo. - O sr. presidente communica á camara ter recebido uma mensagem da camara dos pares, e que a commissão de redacção não fez alterações aos projectos n.º 79 e 86.

Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.

Presentes á chamada, 63 srs. deputados. São os seguintes: - Aarão Ferreira de Lacerda, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adolpho da Cunha Pimentel, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Amandio Eduardo da Costa, Antonio Adriano da Costa, Antonio Augusto Correira da Silva Cardoso, Antonio d'Azevedo Castello Branco, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio José da Costa Santos, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto dias Dantas da Gama, Carlos de Almeida Braga, Conde de Pinhel, Conde de Tavarede, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Rangel de Lima, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jayme de Magalhães Lima, João Alves Bebiano, João Ferreira Franco Pinto Castelo Branco, João José Pereira Charula, João Lopes Carneiro de Moura, João Marcellino Arroyo, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, José Adolpho de Mello e Sousa, José Eduardo Simões Baião, José Joaquim Aguas, José Joaquim Dias Gallas, José Mendes Lima, José Pereira da Cunha da Silveira e Sousa Junior, José dos Santos Pereira Jardim, Licinio Pinto Leite, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel de Bivar Weinholts, Manuel Joaquim Ferreira Marques, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Polycarpo Pecquet Ferreira dos Anjos, Romano Santa Clara gomes, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Thomás Victor da Costa Sequeira, Visconde do Banco, Visconde do Ervedal da Beira e Visconde da Idanha
.
Entraram durante a sessão o» srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Arthur Alberto de Campos Henriques, Conde de Valle Flor, Diogo de Macedo, Eduardo Augusto Ribeiro Cabral, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Jacinto José Maria do Couto, Jayme Arthur da Costa Pinto, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, José Coelho Serra, José Freire Lobo do Amaral, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Gomes da Silva Pinheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Manuel Bravo Gomes, Manuel Pedro Guedes, Quirino Avelino de Jesus e Visconde de Palma de Almeida.

Não compareceram á sessão os srs.: - Alfredo de Moraes Carvalho, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Candido da Costa, Antonio José Boavida, Augusto Victor dos Santos, Bernardino Camillo Cincinnato da Costa, Conde de Anadia, Conde de Villar Secco, Diogo José Cabral, Francisco José Patricio, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, Jacinto Candido da Silva, João Maria Correia Ayres de Campos, João da Mota Gomes, João Rodrigues Ribeiro, Joaquim do Espirito Santo Lima, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Antonio Lopes Coelho, José Bento Ferreira de Almeida, José Correia de Barros, José Dias Ferreira, José Gil Borja Macedo e Menezes (D.), José Marcellino de Sá Vargas, José Teixeira Gomes, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Julio Cesar Cau da Costa, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Maria Pinto do Soveral, Luiz Osorio da cunha Pereira de Castro, Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Fancisco Vargas, Manuel José de Oliveira Guimarães, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Fisconde de Leite Perry, Visconde de Nandufa e Visconde de Tinalhas.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Participo á camara que a deputação encarregada de comprimentar Sua Magestade El-Rei pelo anniversario da outorga da carta constitucional cumpriu a sua missão, tendo sido recebida com a costumada affabilidade.

Participo tambem á camara que a commissão de redacção não fez alteração alguma nos projectos n.º 67, 72 e 94.

EXPEDIENTE

Officio

Do governo civil do districto do Porto, com uma representação da camara municipal do concelho de Bouças, pedindo que o mesmo concelho faça parte do circulo eleitoral do Porto.

Para a secretaria.

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Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores: - Comquanto a lei de 26 de fevereiro determina que não será concedido nenhum augmento por diuturnidade de serviço emquanto durarem as suas disposições tributarias, é certo que tal disposição não pôde attingir aquelles magistrados, que já tinham direitos adquiridos ao tempo da sua publicação, e muito menos aquelles que já a esse tempo tinham completo o processo da respectiva liquidação, sem que se dê effeito retroactivo á lei, effeito que ella não póde ter sem que expressamente o declare e na lei de 26 de fevereiro nenhuma declaração se faz a similhante respeito.

Está nas circumstancias declaradas o bacharel José Joaquim de Fontoura Araujo Madureira o Freitas, actual juiz de direito da comarca da Feira, pois que muito antes da publicação d'aquella lei tinha completado vinte annos de serviço effectivo na magistratura judicial, pois que tambem muito antes d'aquella publicação tinha requerido o beneficio do terço concedido pelo § 2.º do artigo 1.° do decreto de 29 de março de 1890, e achava-se concluido o processo de liquidado de tempo de effectivo serviço na secretaria do ministerio da justiça, com parecer favoravel da procuradoria geral da corôa.

E por que não ha rasão para negar a este magistrado o que por direito incontestavel lhe pertence, sem que tal importe denegação de justiça, tanto menos acceitavel quando ainda ha pouco foi concedido igual beneficio a outro magistrado em iguaes se não peiores circumstancias.

Tenho a honra de submetter ao vosso exame e apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º É concedido no bacharel José Joaquim de Foutonra Aranjo Madureira e Freitas, actual juiz de direito na comarca da Feira, o terço por diuturnidade de serviço, a contar do dia em que completou vinte annos de effectivo serviço.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 28 do abril de 1896. = O deputado, Antonio da Costa Pereira Côrte Real

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de legislação civil e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores.: - O estado actual da questão agricola portugueza é ainda bastante grave para impressionar os espiritos de todos os homens, que se occupam das grandes questões vitaes da economia publica do nosso paiz, tradiccional e essencialmente agricola nas manifestações do trabalho nacionaç. São dois os termos principaes da questão, embora de signal contrario: a insufficiencia da nossa producção de cereaes; e a abundancia da nossa producção vinicola. Podem estes dois termos compensar-se pelo seu effeito opposto na balança commercial, comprando-se cereaes com o producto da venda do vinho? Ainda que assim succeda, é certo que não podemos vender vinho em quantidade sufficiente para cobrirmos a despeza, em demasia, a que nos obriga o nosso deficit economico geral, composto das faltas: de trigo, base principal de toda a subsistencia publica, de grandes quantidades de artefactos, para consumo, e de materias primas e machinismos, para as nossas rudimentares industrias. Os generos agricolas de producção nacional penam na nossa balança commercial com talvez, 3/4 do valor da exportação total. São, pois, o unico penhor de nação livre para Portugal!

E mais efficaz será esse punhor, quando podermos igualar a nossa exportação com a importação, deixando de exportar, em cada anno, de 5:000 a 6:000 contos de réis em oiro para comprar cereaes; que o mesmo será que fixal-os, progressiva e annualmente, ao nosso solo agricola pelo augmento da nossa producção de cereaes, até extinguirmos o deficit actual d'esta cultura. Não póde continuar indefinidamente este estado de cousas que parece aggravar-se cada vez mais. É indispensavel tentar alguma solução, pelo menos, para attenuar a intensidade de uma crise, cujo alcance não é facil prever. Procurar meio de vender cada vez mais vinho será o remedio de prompto effeito; e n'esse sentido devem convergir todos os esforços de governantes e governados. Porém, não nos parece bastante, porque a cultura preponderante da vinha não deve ser levada até ao abuso de poder desequilibrar a nossa economia agricola. Todos conhecem o perigo que ha nas culturas exclusivaa, ou abusivamente preponderantes, em qualquer exploração agricola, ainda a mais modesta; quer se trate de crise de abundancia, quer se trate de crise de escassez. E, pois, necessario, para fixar ao solo do nosso paiz os mais caros interesses da economia nacional, tomar um ponto de vista mais alto para tentar uma solução duradoura á primeira questão economica da actualidade.

Julgâmos indispensavel, como medidas urgentes do nosso fomento agricola:

].º O augmento progressivo da cultura cerealifera;

2.° A limitação racional da cultura da vinha.

Só assim poderemos conseguir desafogo economico e financeiro para nossa vida do nação livre.

O regimen protector actual da cultura cerealifera não tem sido bastante para animar a sua progressão. Com effeito, nem a lei de 15 de julho de 1889, que modificou profundamente a lei de 15 de julho de 1889, estabelecendo novas condições especiaes de importação de trigos estrangeiros, nem o decreto com força de lei do 27 de agosto do 1891, que prohibiu a importação de trigos, emquanto não estiver esgotada a producção nacional, e regulou a importação do que for necessario para cobrir o deficit animal d'aquella producção, poderam conseguir o augmento da cultura do cereaes, de modo a diminuir progressivamente a sua grande falta no consumo normal.

Vejâmos o que nos dizem os dados estatisticos dos ultimos cinco annos cerealiferos. Importação de trigos estrangeiros, auctorisada por decretos especiaes:

Kilogrammas da trigo

1891-1892 60.000:000
1892-1893 138.000:000
1893-l894 150.000:000
1894-1895 93.000:000
1895'1896 141.000:000

Sendo com destino ao fabrico de massas alimenticias:

Kiloggrammas de trigo

1893-1894 10.000:000
1894-1895 3.000:000
1895-1896 5.000:000

O primeiro e quarto annos, do periodo considerado, constituem excepções; por isso não podem servir de base a qualquer raciocinio concludente. O primeiro é o anno de transição do regimen protector, da lei de 15 de julho de 1889, para o do decreto de 27 de agosto de 1891; não traduz por isso a verdade dos factos succedidos n'aquella campanha cerealifera.

O quarto é um anno de extraordinaria abundancia da nossa producção de cereaes, chegando a vir ao mercado central de productos agricolas quasi 90.000:000 de kilogrammas do trigo nacional; isto é, talvez a metade do que é necessario para o consumo publico conhecido. Devem, pois, considerar se annos normaes de producção e importação do trigo ou seguintes, depois de corrigidos das quantidades destinadas ao fabrico das massas alimenticias:

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Kilogrammas de trigo

1892-1893 138.000:000
1893-1894 140.000:000
1895-1896 136.000:000

E quem sabe se será necessario ainda algum supprimento para o consumo do corrente anno?!

D'estes tres annos deduz-se o deficit, medio annual, de 138.000:000 kilogrammas de trigo.

Conforme ás indicações officiaes, que têem servido de base aos calculos da economia de alguns decretos, que fixaram as quantidades de trigo a importar em cada anno, o consumo mensal do paiz é de 14.000:000 de kilogrammas; é claro, que não entra n'este computo o trigo nacional, consumido sem conhecimento das estações offificiaes encarregadas de coordenar os elementos estatisticos, o que, aliás, é factor constante em todos os annos cerealiferos, e, como tal, sem influencia na determinação do deficit de cada colheita. Sendo assim, o consumo total annual conhecido é, em numeros redondos, de 170.000:000 de kilogrammas. Mas, para segurança de previsão, elevemos mesmo o consumo annual até 200.000:000 de kilogrammas, comprehendendo o trigo que se farina para massas alimenticias, e acharemos que a nossa producção de trigo póde concorrer, em annos de colheitas ordinarias, quando muito, com 50.000:000 de kilogrammas; isto é, 1/4 do consumo total, e que só excepcionalmente, como succedeu no anno de 1894-1895, poderá attingir a metade. Logo, é justo concluir que a cultura cerealifera não tem progredido, como era para desejar, debaixo da acção benefica do regimen protector.

Vejamos qual é a gravidade dos encargos que acarreta para a economia nacional a grande importação de cereaes.

O mappa comparativo das receitas das alfandegas dá-nos até 1893 os seguintes dados estatisticos, desde o começo do regimen protector accentuado:

Direitos de cereaes

1889 1.357:249$061
1890 1.718:992$415
1891 1.462:241$913
1892 737:712$674
1893 2.063:930$766

A menor importancia dos direitos em 1892 é devida ao abatimento da tarifa aduaneira, por causa do premio do oiro durante o periodo mais agudo da crise financeira.

Aquellas importantes receitas podem traduzir vantagens occasionaes para o thesouro, mas corroboram a verdade do estacionamento da nossa cultura cerealifera e são um encargo para o consumidor, sem vantagem para a riqueza publica, como aconteceria se, em vez de importação, tivessemos producção sufficiente de trigos para o nosso consumo.

O mais terrivel effeito d'este desequilibrio, entre a producção e consumo de trigo, está na exportação do oiro que fazemos todos os annos.

Ponhamos em evidencia este phenomeno economico, servindo-nos apenas dos dados estatisticos de importação de cereaes no anno de 1893, que não é d'aquelles em que ella foi maior, como deverá succeder no anno corrente:

Cevada em grão, 1.977:186 kilogrammas; sendo de Marrocos, 1.531:794 kilogrammas.

Preço medio de cada kilogramma, 27 réis.

Farinha de trigo, 1.442:468 kilogrammas; sendo de França, 1.263:742 kilogrammas.

Preço medio de cada kilogramma, 69 réis.

Milho em grão, 7:553:465 kilogrammas; sendo de Marrocos, 4.563:285 kilogrammas, dos Estados Unidos do Norte, 1.137:262 kilogrammas.

Preço medio de cada kilogramma, 25 réis.

Trigo em grão, 144.404:455 kilogrammas; sendo dos Estados Unidos, 136.161:465 kilogrammas, da Roumania, 3,726:641 kilogrammas, e da Inglaterra, 3.257:698 kilogrammas.

Preço medio de cada kilogramma 37 réis, ou 370 réis os 10 kilogrammas.

São estas as maiores quantidades da importação de cereaes de diversas nações n'este anno.

O valor declarado d'estes generos, a maior parte de primeira necessidade, foi de 5:900 contos de réis.

Similhantes indicações numericas provam que a nossa lavoura de cereaes continua esmagada debaixo da concorrencia das outras nações cerealiferas, designadamente os Estados Unidos, da America do Norte, a despeito do regimen protector actual; e que a exportação de oiro nos arruinará fatalmente, se não melhorarmos as nossas condições economicas de producção natural.

Demonstrada a falta quasi constante de cereaes, apesar as leis protectoras, e demonstrada tambem a impossibilidade de continuarmos a comprar trigo indefinidamente, impõe-se imperiosamente a necessidade de augmentar progressivamente a cultura de cereaes, sob um novo regimen de protecção directa á lavoura cerealifera, conservando o regimen vigente, modificado no preço do trigo, para assegurar a collocação prompta dos seus productos. E d'este modo julgâmos ter justificado a primeira these do nosso humilde estudo.

A limitação racional da cultura da vinha justifica-se: 1.º pela diminuição progressiva da nossa exportação de vinho, e pelo augmento desordenado da sua producção em relação com as necessidades do consumo; 2.° sobretudo pelo desvario economico das immobilisações de importantes capitães com a plantação de vinhas em terrenos de varzea, de grande fertilidade, proprios para a cultura dos trigos de primavera, sem duvida os mais apreciados pelas industrias da moagem e da panificação.

Na estatistica aduaneira, publicada em 1895, encontram-se os quadros da exportação dos nossos vinhos desde 1865 até 1893; e no relatorio que precede as propostas de fazenda, apresentado ao parlamento pelo illustre titular da pasta respectiva, encontra-se e que diz respeito aos annos de 1894 e 1895.

Para pôr em relevo o estado economico do nosso commercio de exportação de vinhos, escolheremos o periodo mais caracteristico dos dois movimentos inversos, de augmento e diminuição da salda dos nossos vinhos para os mercados externos:

Hectolitros Contos de réis

1880 593:271 9:609
1881 701:545 9:807
1882 777:813 10:148
1883 871:109 11:133
1884 847:877 10:894
1885 1.500:771 13:466
1886 1:963:114 16:883
1887 1.467:344 11:359
1888 1.730:886 12:946
1889 1.474:288 12:323
1890 913:841 10:898
1891 825:774 11:122
1892 1.001:747 13:432
1893 769:588 11:246
1894 611:424 ?
1895 681:447 ?

Da simples comparação d'estes numeros vê-se:

1.° Que o periodo aureo da nossa exportação de vinhos decorreu de 1885 a 1889 (cinco annos);

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8.° Que a diminuição da exportação é tão notavel que dentro de pouco tempo teremos regressado ás condições do anno de 1880, ou ainda peiores, se o movimento descensional for accentuando-se, como tudo leva a presumir;

3.° Que o preço dos nossos vinhos parece ter augmentado, ao passo que diminue a exportação; ou antes, que a exportação tem diminuido com o augmento do preço do vinho.

Vejâmos quaes eram os melhores mercados em 1886 (anno da maxima exportação) pela ordem decrescente da sua importancia:

França, 1.318:851 hectolitros.
Brasil, 329:975 hectolitros.
Inglaterra, 185:937 hectolitros.

Pois em 1893 appareceram os mesmos mercados nas seguintes condições:

França, 8:734 hectolitros.
Brazil, 454:932 hectolitros.
Inglaterra, 164:090 hectolitros

Tendo o Brazil já decrescido em relação a 1892, que importou 520:950 hectolitros.

E, como mediana compensação, apparecem-nos melhorados os mercados das nossas colonias africanas, que, em 1892-1893, receberam da metropole, respectivamente, 60:465, e 56:575 hectolitros de vinho.

Segundo as indicações apresentadas pelo nobre presidente do conselho de ministros, a proposito da historia, da questão do alcool, a nossa producção vinicola media, de 1889 a 1893, foi de 4.883:500 hectolitros, descendo a 3.000:00 em 1894, e subindo em 1895 a 6.500:000 hectolitros. E, como consequencia da analyse destes numeros, reputa a producção media actual de 5.000:000 de hectolitros, dos quaes julga serão consumidos 4.000:000 pelo mercado interno!

A comparação com os dados da exportação de 1895 daria um excesso de 318:553 hectolitros de vinho sem collocação remuneradora.

E dizemos «sem collocação remuneradora» porque é nossa convicção, originada na pratica pessoal da cultura actual da vinha, que a distillação dos vinhos, hoje de consumo directo, considerada como remedio para acudir aos terriveis effeitos da plethora crescente da nossa producção vinicola só póde dar resultados, praticamente economicos, em regiões relativamente limitadas, caracterisadas pelos excesso de producção de vinhos de baixa percentagem alcoolica.

E é exactamente n'essas regiões de terrenos de varzea, ferteis e humidos, que o incremento da cultura da vinha deve sustar-se, para não deslocar a cultura cerealifera; como succedeu no seculo passado e vae succedendo agora, com grave prejuizo da subsistencia publica e perigoso desequilibrio da economia nacional.

Sabemos que alguns espiritos de escolha têem a previsão de que a distillação, em grande escala, será o unico meio compensador da falta de mercados para os nossos vinhos de consumo directo; e pensam que assim se conseguirá uma vazão indirecta para a grande massa dos nossos vinhos ordinarios, que saírão para o estrangeiro transformados em alcool vinico, beneficiador dos nossos vinhos de qualidades superiores, tanto do pasto como generosos. Bom seria que assim succedesse, e que a nossa affirmativa fosse completamente gratuita.

Quanto a nós, afigura-se-nos que, quando chegar a necessidade absoluta de distillar vinhos para lhes dar collocação normal, chega tambem a necessidade de abandonar muita exploração viticola, porque o seu producto bruto ficará aquem das despezas geraes de cultura.

Ainda mais, a historia viticola dos ultimos quinze annos ensina-nos que agrande exportação para a França de vinhos de lotação desvairou a nossa viticultura, ao ponto de as abandonarem as bellas castas de cepas, cultivadas até então, que davam a feição especial aos vinhos das nossas regiões afamadas, e substituirem-se por outras ordinarias de alta producção dos vinhos, que os francezes procuravam como materia prima para o fabrico das suas diversas marcas do vinhos, acreditadas nos mercados externos, com o fim patriotico de manterem o seu commercio durante a invasão phylloxerica dos seus vinhedos.

A febre do interesse de occasião não deixou ver o perigo; e o resultado foi ficarmos com muito vinho ordinario quando se fechou, ou reduziu ao minimo o mercado francez. A invasão phylloxerica das nossas vinhas, elevando o preço ao vinho, tambem concorreu para a recrudescencia das novas plantações de vinhas resistentes, com a circumstancia deploravel de se invadirem insensatamente os terrenos baixos, como atraz dissemos, proprios da cultura de cereaes, com a mira nas grandes producções, compensadoras das elevadas despezas culturaes e da má qualidade do genero produzido; e nem ao menos se pensou nas graves consequencias do chegarmos a ter maus vinhos sem comprador, por não podermos luctar com as nações productoras que os vendem mais baratos.

A critica dos dados numericos e da exposição que acabâmos de fazer, diz-nos que fechados ou reduzidos os mercados externos e degenerados os nossos vinhos (sem entrar em linha de conta com as numerosas falsificações, que só fazem nos grandes centros de consumo), a regressão á producção equilibrada com as necessidades do consumo, tanto interno como externo, e a regeneração ou creação de typos dos nossos vinhos de consumo directo, gastarão um longo periodo, cheio de difficuldades, que só a limitação da cultura da vinha, especialmente em terrenos do varzea, pôde attennar.

Julgâmos ter demonstrado a verdade das duas theses geraes, que traduzem o estado da questão agricola portugueza na presente conjunctura «temos vinho de mais o pão de menos». Agora exporemos a economia do projecto de um novo regimen do protecção directa á cultura cerealifera, e de restricção da cultura da vinha.

Tentemos demonstrar a possibilidade de augmentar a nossa cultura cerealifera. A historia mesmo d'este seculo tem lição bastante para nos ensinar que este phenomeno economico não é novo. Desde 1821 até 1856 viveu a lavoura de cereaes sob o regimen proteccionista, e, no periodo decorrido de 1838 a 1855, a nossa producção dos cereaes não só chegou mas até sobejou do consumo; sendo o valor medio da exportação annual de 305 contos de réis, baixando o preço medio do trigo a 576 réis e o do milho a 386 réis, cada alqueire.

Não foi necessaria a importação de trigo exotico para baixar o preço da materia prima do pão, bastou a concorrencia dos productores no mercado interno. E assim se conseguiu o duplo effeito benefico para a economia nacional: deixar de exportar oiro e conseguir pão barato, sem esquecer ainda o augmento da riqueza publica pela valorisação dos terrenos agricultados, e a maior circulação interna dos capitães moveis.

Do mesmo modo succederá se estabelecermos um novo regimen, efficazmente, protector da lavoura dos cereaes.

O terrivel periodo do escassez de 1855 a 1860 e ss doutrinas do livre cambio, pregadas, pela Inglaterra, avassallaram os espiritos dos nossos homens publicos, por modo que, durante trinta e tres annos, não comprehenderam que a lavoura nacional ia progressivamente arruinando-se pela livre concorrencia estrangeira, e só em 1888, pelas reclamações energicas e justas dos agricultores, se comprehendeu a necessidade economica de acudir á cultura cerealifera, pois que já, em 1887, se tinham importado mais de 149.000:000 kilogrammas de todos os cereaes.

E tanto foi um erro aquelle abandono da cultura de cereaes á livre, ou quasi livro, concorrencia estrangeira, que na propria Inglaterra, o paiz classico do livre cambio e da abundancia dos capitães baratos, já sôam bem alto os clamores da agricultura, que não póde supportar a esma-

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gadora concorrencia dos productos similares dos paizes novos.

É certo que, alem das leis especiaes de effeito directo para determinadas culturas, ninguem desconhece os favores que os poderes publicos têem dispensado, recentemente, á agricultura em geral.

Com effeito, como medida de superior ponto de vista educativo, tem-se aprimorado o ensino agricola, desde as culminancias do ensino superior, onde verdadeiros homens de sciencia exercem o magisterio com superior distincção, até ás ultimas ramificações do ensino pratico nas diversas escolas graduadas, adequadas ás diversas categorias do instrucção dos homens, que se destinam ao muito sympatico e util mister da agricultura.

Não tem sido menor, nem menos proficua, a boa vontade do pessoal agronomico official, dando exemplos de quanto vale a educação profissional bem orientada.

Mas tudo isto não é bastante, necessitamos de muito mais para augmentarmos a producção de trigo, progressivamente, até extinguirmos o seu deficit, que é, como nós examinamos já, de proximo 100:000:000 de kilogrammaa. A possibilidade physica d'este emprehendimento é evidente, basta lembrar que as grandes regiões cerealiferas do paiz, ao sul e occidente da serra da Estrella, comprehendendo os districtos administrativos de Castello Branco, Leiria, Santarem, Lisboa, Portalegre, Evora e Beja, medem a enorme superficie de 4.899:631 hectares, para a qual concorre a provincia do Alemtejo (districtos de Portalegre, Evora e Beja) com 2.441:077 hectares, isto é, quasi a metade; figurando o districto de Beja com a importante área de 1.087:281 hectares.

Conhecida a superficie, cultivada de trigo em cada anno, 300:000 hectares proximamente, a eloquencia dos numeros dispensa quaesquer considerações, para demonstrar a possibilidade physica da solução do problema, sem prejuizo para as outras culturas e alimentação do gado manadio, ainda mesmo que aquelle numero seja quadruplicado.

Necessitâmos agora procurar a possibilidade economica de augmentarmos progressivamente a cultura de cereaes, especialmente a do trigo.

Nos calculos que vamos fazer escolhemos para bases os dados experimentaes da cultura alemtejana, de terras pobres que serão os mais desfavoraveis do problema; e, por isso mesmo, os mais presumiveis em questões agricolas, alem de que são sempre os mais seguros em todas as previsões.

É claro que não considerâmos como elementos auxiliares os terrenos sujeitos actualmente á cultura intensiva de cereaes, como são os das courellas nas proximidades das povoações, etc.; pois que elles constituem tão sómente elementos preexistentes e sensivelmente constantes da questão. Ficamos assim reduzidos a duas hypotheses: 1.ª, a fertilização com adubos dos terrenos cultivados (augmento da cultura intensiva); 2.°, arroteamento das charnecas susceptiveis da cultura de cereaes

Cada hectare leva em semeadura 90 litros de trigo, em media, cujo peso póde calcular-se em 68 kilogrammas, approximadamente.

A producção media é muito difficil de calcular pela diversidade do terreno, clima, semente e processos culturaes; mas não póde presumir-se, com reserva prudente, em mais de 900 kilogrammas por hectare, para os terrenos adubados, e 720 kilogrammas para os terrenos apenas arroteados.

Sendo o deficit de 150.000:000 de kilogrammas de trigo, será necessario sujeitar a cultura intensiva, sem prejudicar a colheita actual, 166:600 hectares ou arrotear 208:333 hectares de charneca.

Não será sensato o uso exclusivo de qualquer dos expedientes.

Como é sabido, os terrenos deixados de pousio entram no afolhamento das herdades, cultivadas extensivamente por necessidade economica da conservação das colheitas actuaes e alimentação (pastagens) dos gados.

Os terrenos de charneca depois de arroteados, só podem conservar a sua fertilidade, sujeitos ao mesmo regimen de cultura extensiva, ou entrando no da cultura intensiva com adubos.

Logo, impõe-se logicamente a necessidade do emprego dos dois expedientes, simultaneamente. E como não é facil estabelecer como elles poderão concorrer, por causa das variadissimas circumstancias que podem dar-se, sendo a principal a iniciativa dos agricultores, igualmente não é facil fixar o praso em que poderemos augmentar a nossa producção com mais 150 milhões do kilogrammas trigo.

Para fixarmos idéas, supponhamos que a nova cultura intensiva concorre com o arroteamento dos terrenos de charneca na relação mathematica de um terço, e que o periodo do augmento progressivo, até extinguir o deficit da nossa producção da cultura cerealifera, é de dez annos; o augmento, proporcional annual, será de 15 milhões de kilogrammas de trigo, sendo 5 milhões dos terrenos Cultivados e 10 milhões dos terrenos arroteados.

Conseguintemente entrariam em cultura intensiva 5 a 6 mil hectares por anno, e seriam arroteados 13 a 14 mil lectares de charneca.

Ora, as despezas totaes por hectare são, respectivamente, 50$000 réis para os terrenos adubados e 45$000 réis para os arroteados - verbas calculadas sobre dados experimentaes. Logo, o augmento annual do capital de exploração da cultura cerealifera deveria ser de 6:000 X X 50$000 = 300:000$000; 14:000 X 45$000 réis = = 630:000$000, ou, na totalidade, 930 contos de réis, ou ainda, em numero redondo, 1:000 contos de réis. D'onde se conclue que o capital geral progressivo de exploração, no fim do praso de dez annos, deveria attingir a importantissima quantia de 55 mil contos de réu. Mas não, deve assim succeder, porque o trabalho de arroteamento não se repete no mesmo terreno. Qual deverá ser a reducção, ou antes correcção a fazer n'aquella verba? Não é facil responder.

Em todo o caso, seja qual for a sua importancia presumivel, não cabe ella nas forças da lavoura portugueza, e só o estado póde acudir com o seu valioso auxilio, que amais deve ser inferior a metade d'aquelle resultado, ou sejam 27:500 contos de réis, emprestados ao juro maximo de 4 por cento ao anno, durante dez annos; o que corresponde á annuidade de 2:750 contos de réis, que deve ser elevada até 3:000 contos de réis, nos primeiros annos de exercicio d'esta fórma de credito agricola cerealifero. Esta estimativa é fundada em que os capitães de exploração dos agricultores hão de ir crescendo com o augmento da cultura cerealifera.

Parecerá extraordinario o alvitre do estado garantir emprestimos a particulares nas actuaes condições financeiras do paiz! E assim seria, se não fosse certo que, tratando-se de uma questão interna, a circulação fiduciaria resolveria completamente, ou, pelo menos, prestaria o melhor auxilio á resolução do mais grave problema economico dos nossos dias.

Quem desconhece a facilidade relativa com que o estado póde garantir, no banco emissor, emprestimos exclusivamente applicavejs á cultura cerealifera, ao juro maximo de 4 por cento ao anno, facilmente reembolsaveis, sem prejuizo para o estado, com decidido interesse para o banco, e poderoso auxilio para os agricultores?

Basta ampliar convenientemente os effeitos do contrato de 9 de fevereiro de 1895, que tornou gratuita a conta corrente entre o thesouro e o referido banco.

E não se diga que o acto teria menos moralidade administrativa, quando é certo que em peores condições de segurança e vantagem publica, sob o fundamento de utilidade publica, só tem dispensado importantes favores d'esta ordem a empresas particulares. São d'isso eloqüente exem-

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plo algumas das nossas linhas ferreas, cujos planos financeiro-economicos de construcção e exploração têem assentado na subvenção kilometrica, ou na garantia de juros aos capitaes empregados. Emquanto que, no alvitre apresentado, não haveria offerta de capitães a longo prazo de reembolso, nem mesmo o perigo do pagamento de juro complementar dos capitães levantados, como succede em alguns dos nossos caminhos de ferro, feitos precipitadamente,sem corresponderem a necessidade alguma existente; tomando fóros de causa quando não deviam passar de simples effeito, unico procedimento cordato proprio dos paizes pobres.

Estabelecer industria de transportee, autos de haver que transportar, é a mais deploravel inversão da ordem logica.

Quando muito, deviamos ter desenvolvido parallelamente a nossa producção natural com o estabelecimento da viação accelerada, dispensando a mais acrisolada protecção á primeira, base principal da nossa riqueza publica.

Justificada a possibilidade economica do augmento da oroducção cerealifera, e demonstrada a moralidade da protecção pecuniaria que merece, indiquemos quaes deverão ser os bases geraes dos emprestimos.

As areas, para cuja cultura cada individuo poderá pedir emprestimo, são de 5 a 100 hectares.

O capital levantado será a rasão de 50$000 réis por hectare para o primeiro caso, e de 45$000 réis para o segundo, em cada emprestimo.

Serão sempre ouvidos os funccionarios technicos e tomadas todas as precauções legaes de segurança, embora o fundamento principal dos emprestimos seja o credito pessoal.

Como complemento d'este regimen de protecção especial, e com intuito de promover o estimulo no esmero da cultura, já pelo que diz respeito á selecção das sementes, já quanto á maior e melhor producção, serão estabelecidas duas series de premios de cultura, calculados de modo que, em dados circumstancias, correspondam ao perdão de juros dos capitães levantados, ou sirvam de justo galardão aos que tudo fizerem pelo seu esforço proprio exclusivo.

Resta-nos ainda justificar a necessidade da elevação do preço maximo do trigo. O augmento da cultura de cereaes ha de incidir principalmente nos terrenos incultos de charneca; e, como nós calculamos a producção normal de 720 kilogrammas de trigo por cada hectare, é claro que o producto bruto da exploração será 720 X 60 = 43$200 réis, ao passo que a despeza é de 45$000 réis. Não é, pois, de mais elevar o preço maximo do trigo a 70 réis por kilogramma; e ainda assim os emprestimos, levantados para este caso, deverão ter o praso de dois annos, para os ignorar em condições economicos com os destinados aos terrenos cultivados intensivamente.

Baseados nas conclusões a que nos conduzem os numerou, escolhidos como mais proximos das necessidades economicas da cultura cerealifera, demonstramos que o limite superior do preço do trigo deve subir de 60 réis para 70 réis o kilogramma, aliás o lavoura não póde engrandecer os seus emprehendimentos de progresso, a despeito mesmo do regimen protector actual e do credito agricola exclusivo, alvitrado n'este projecto.

O premio do oiro foi o fundamento attendido, no decreto de 27 de agosto de 1891, para baixar a taxa aduaneira do trigo importado, garantindo os interesses da grande industria da moagem, a fim de evitar a elevação do preço do pão - nada mais justo, apparentemente, como medida de ordem publica. Mas esqueceu inteiramente a justiça da lavoura, que vendia o trigo a 600 réis (em oiro) os 10 kilogrammas e passou a vendel-o a 600 réis em moeda com curso legal, taes são as expressões claras do artigo 2.° do citado decreto. Isto é, a lavoura ao passo que vende o seu trigo, com abatimento de 30 porcento, compra tudo quanto lhe é necessario para a sua laboração, sementes, alfaias e adubos, por mais 80 por cento do valor da circulação fiduciaria, inconvertivel; verdadeiro papel moeda com que a grande industria da moagem lhe paga o trigo!

Só acrescentarmos a estas considerações da mais esmagadora verdade, a satisfação das necessidades ordinarias da vida, que encareceu da mesma fórma para a classe dos agricultores, é mais do que justo o preço de 70 réis por cada kilogramma de trigo nacional.

Não cremos que a elevação de 10 réis em kilogramma do trigo nacional provocasse uma crise mortal á industria da moagem, cujo progresso nos meios mechanicos da execução do seu trabalho é incessante e da maxima intensidade. Ficaria reduzida a margem dos seus lucros por algum tempo? É possivel. Mas, acima de todas as conjecturas ou presumpções ácerca dos segredos profissionaes, servindo de criterio para calcular interesses, estão os factos culminantes da vida das classes sociaes, que a brilhante luz da publicidade mostra a todos os olhos como phenomenos symptomaticos differenciaes.

A industria da moagem figura dignamente na alta banca.

A agricultura não encontra capitães, muitas vezes, nem mesmo a troco da mais ominosa hypotheca!

E bastava um pouco mais de patriotismo da parte dos fortes de hoje, que podem ser os fracos de ámanhã, para nos salvarmos todos.

N'um paiz, onde não ha cereaes para a alimentação publica, deve ser prohibida absolutamente a sua distillação, tanto mais que o alcool industrial sempre nocivo á saude, concorre com os productos da distillação do vinho e seus derivados. É, pois, mais do que necessaria, é imperiosa a obrigação de prohibir a distillação dos cereaes, e deve esta providencia ser acompanhada de penas severas; aliás continuaremos a commetter um erro economico, que toma proporções de crime de lesa nacionalidade.

A analyse d'esta interessante questão parece-nos dispensavel para demonstrar a verdade do nosso parecer, porque os factos fallam mais alto e mais claro do que todas as considerações eruditas de qualquer ordem.

Para limitar a cultura da vinha nos terrenos de varzea, só vemos um meio que caiba nos nossos costumes politicos: é elle augmentar a collecta da contribuição predial até igualar as condições fiscaes d'estas vinhas, de alta producção com as das vinhas de encostas da mesma região ou localidade. Está calculado por muitos viticultores, de reconhecida auctoridade, que o vinha do varzea dá, normalmente, cinco vezes mais do que a vinha de encosta de cada localidade; deverá, pois, ser esta a base da incidencia da contribuição predial.

Tambem não ha motivo plausivel para continuarem o subsistir, n'estas circunstancias, as isenções de algumas contribuições, quer se trate de replantação de vinhos por motivo de invasão phylloxerica, quer de novas plantações em terrenos de varzea, naturalmente indicados para a cultura dos trigos de primavera, e de milho, base principal da alimentação das populações das provincias do norte.

Faro levar á execução esta medida, serão tomadas as devidas precauções, a fim de se evitar qualquer abuso do poder, fazendo intervir em todos os casos d'esta ordem de cultura da vinha os funccionarios technicos da especialidade, que tão bem provaram a sua alta competencia e reconhecida auctoridade pratica no congresso viticola do anno passado, que foi, sem duvida, a mais solemne affirmação de vitalidade de uma das classes mais trabalhadoras da sociedade portuguesa, e a quem o paiz deve a sua maior riqueza publica, de caracter fundeario.

Senhores: - Depois d'esta exposição do estudo que intentámos ácerca do estado actual da questão agricola portugueza, sob o aspecto, culminante para a economia nacional, da nossa producção cerealifera deficiente e grande producção vinicola, e convencidos da humildade d'este modesto trabalho, que sómente tem o intuito de chamar á attenção dos poderes publicos para o mais momentoso

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assumpto economico da actualidade, resta-nos submetter á vossa sabia apreciação o seguinte projecto do lei:

Artigo l.° Durante dez annos, a partir da primeira sementeira, são isentas da contribuição de registo as transmissões, sob qualquer titulo, de terrenos incultos, que se destinarem á cultura exclusiva de cereaes.

§ unico. São considerados terrenos incultos para os effeitos d'esta lei, aquelles que estiverem comprehendidos em algum dos casos previstos no artigo 2.°

Art. 2.º São isentos de contribuição predial:

1.° Pelo praso de dez annos, contados da primeira cultura de cereaes, os baldios, as charnecas e os terrenos tirados As marés; assim como os terrenos pantanosos, depois de enxutos, e os que tenham deixado de ser cultivados por mais de trinta annos consecutivos;

2.° Pelo praso de seis annos, a contar da primeira cultura, outros terrenos reputados incultos, não considerados na classificação do numero anterior, como são os conservados de pousio por mais de seis annos consecutivos.

§ 1.º A isenção da contribuição predial, a que se refere este artigo, é tão sómente applicavel a area, nunca inferior a 5 hectares, de terreno semeado de cereaes em cada propriedade.

§ 2.° A eliminação da contribuição predial de terreno semeado de cereaes, nos termos do paragrapho anterior, será baseada no auto, levantado pelo agronomo districtal com todas as formalidades legaes, que terá fé publica até prova em contrario.

§ 3.° A data do auto, de que reza o § 2.°, será a do começo do prazo para a isenção da contribuição predial.

Art. 3.° Durante dez annos, contados da publicação d'esta lei, o governo garantirá, sob responsabilidade do estado, emprestimos feitos, no banco de Portugal, ou nas suas agencias, exclusivamente aos cultivadores de cereaes, ao juro maximo de 4 por cento ao anno; de modo que a importancia annual destes emprestimos não exceda a quantia de 3:000 contos de réis.

§ 1.° Os prasos dos emprestimos serão os seguintes:

1.° Sendo cultura de cereaes em terrenos cultivados, um anno, servindo de bases, para a fixação da importancia de cada emprestimo, a area comprehendida entre 5 e 100 hectares, e a verba de 50$000 réis por hectare.

2.° Sendo a cultura de cereaes em terrenos classificados no n.° 1.° do artigo 2.º, dois annos, servindo de bases, para a fixação da importancia de cada emprestimo, a area comprehendida entre 5 e 100 hectares, e a verba de 45$000 réis por hectare.

§ 2.º Para se effectuar qualquer emprestimo é indispensavel:

1.° Que o interessado, dono ou rendeiro da propriedade, apresente a planta do terreno junta ao requerimento inicial do pedido de emprestimo;

2.° Que o agronomo districtal proceda directamente á medição geral da area destinada á cultura de cereaes, reduzindo o resultado da sua inspecção a auto, que será documento indispensavel na instrucção do contrato de cada emprestimo.

3.° Nenhum individuo poderá requerer emprestimo, nos termos d'esta lei, sem possuir reconhecida capacidade moral e material de bem satisfazer os encargos do respectivo contrato, ou apresentar fiador idoneo que possua estes requisitos de segurança.

§ 4.° Os individuos, que empregarem o producto dos emprestimos em fins diversos da cultura dos cereaes, serão obrigados a pagar uma multa igual á quinta parte da importancia do emprestimo, pertencendo ao estado a receita d'esta proveniencia.

§ 5.° No caso de falta de pagamento dos emprestimos, dentro do prazo legal, na execução judicial, promovida pelos agentes do ministerio publico, é o estado o primeiro credor privilegiado, já em relação aos fructos pendentes, já em relação aos bens de qualquer natureza do devedor remisso, ou do seu fiador; salvo o caso de esterilidade comprovada, em que poderá ser prorogado o prazo de emprestimo, procedendo-se a todas as formalidades e cautelas, como se fosse um novo emprestimo.

Art. 4.° Em cada um dos districtos administrativos das regiões cerealiferas são estabelecidas duas series annuaes de prmios de cultura:

N.° 1. Uma para os agricultores que tiverem augmentado a area da sua cultura de cereaes, pelo menos, 5 hectares em relação á area cultivada no anno agricola anterior.:

N.° 2. Outra para os agricultores que tiverem produzido melhores e maiores quantidades de cereaes, não podendo a area da cultura ser inferior a 5 hectares.

§ 1.º Cada serie comprebenderá onze premios, graduados pela seguinte fórma:

1.° Premio de 200$000 réis, correspondente á area cultivada de 100 hectares.
2.° Premio de 180$000 réis, correspondente á area cultivada de 90 hectares.
3.° Premio de 160$000 réis, correspondente á area cultivada de 80 hectares.
4.° Premio de 140$000 réis, correspondente á area cultivada de 70 hectares.
5.° Premio de 120$000 réis, correspondente á area cultivada de 60 hectares.
6.° Premio de 100$000 réis, correspondente á area cultivada de 50 hectares.
7.° Premio de 800$00 réis, correspondente á area cultivada de 40 hectares.
8.º Premio de 60$000 réis, correspondente á area cultivada de 40 hectares.
9.° Premio de 40$000 réis, correspondente a area cultivada de 20 hectares.
10.° Premio de 20$000 réis, correspondente á area cultivada de 10 hectares.
11.° Premio de l0$000 réis, correspondente á area cultivada de 5 hectares.
§ 2.° Os agricultores premiados receberão diplomas especiaes respectivos aos premios que lhes foram adjudica-los, podendo o governo substituir a importancia pecuniaria dos premios por igual valor em sementes, adubos ou alfaia agricola, se os interessados assim o desejarem.

§ 3.° Para adjudicação dos premios será instituido um jury especial, composto do agronomo districtal, presidente nato, e de dois vogaes nomeados pelo governo, de entre seis individuos, indicados annualmente em lista especial, organisada pelo conselho de agricultura do respectivo districto administrativo.

§ 4.° Em igualdade de circumstancias, será dada preferencia, na adjudicação, dos premios, áquelles agricultores que empregarem melhores processos culturaes, recommendados pela economia e sobre tudo pela conservação da fertilidade do sólo.

Art. 5.° Para os effeitos da lei de 15 de julho de 1889 e legislação subsequente, que a modificou, é fixado em 70 réis por kilogramma o preço maximo do trigo nacional, offerecido á venda no mercado central de productos agricolas.

Art. 6.° É absolutamente prohibida a distillação dos cereaes, trigo, centeio e milho, seja qual for o destino dos productos industriaes da distillação.

§ unico. Aos individuos que transgredirem as disposições d'este artigo, serão impostas correecionalmente multas, que irão desde 100$000 réis até l conto de réis, segundo a gravidade da transgressão, sem prejuizo das penalidades das leis geraes applicaveis; sendo apprehendidos, em qualquer caso, os productos da distillação e os cereaes em deposito para este fim.

Art. 7.° As isenções consignadas nos artigos 1.° e 2.º d'esta lei, não são applicaveis á cultura da vinha em terrenos de varzea, ferteis e proprios para a cultura de trigos de primavera e milho; quer se trate de replantações

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por effeito de invasão phylloxerica, quer se trate de novas plantações em terrenos incultos.

Art. 8.° Depois da publicação d'esta lei a cultura da vinha, que se fizer em terrenos de varzea nas condições indicadas no artigo anterior, fica obrigada, desde o primeiro anno da sua plantação, ao pagamento de cinco vezes a collecta de contribuição predial, por hectare, que pagar á vinha de encosta da respectiva região ou localidade

§ unico. A medição da arca de cada nova plantação de vinhas n'estas condições será feita pelo agronomo districtal, com a assistencia de dois louvados, um escolhido pelo viticultor interessado, e o outro nomeado pela fazenda. Todas os operações a que procederem, para o fim indicado, serão reduzidas a auto, que será assignado pelos tres o constituirá titulo sufficiente para a organisação da matriz especial, ouvida a respectiva junta fiscal das matrizes.

Art. 9.° O governo publicará os regulamentos necessarios no exercicio d'esta lei.

Art. 10.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados da nação portuguesa, 28 de abril de 1896. = Adriano Augusto da Silva Monteiro.

Lido na mesa, foi admittido e enviado a commissão de fazenda.

O sr. Romano de Santa Clara: - Sr. presidente, mando para a mesa um projecto de lei concedendo á camara municipal do Funchal, para saneamento e aformoseamento da cidade, os terrenos e materiaes da muralha que formavam a antiga linha de defeza e bem assim os do Forte Novo de S. Pedro, Bateria das Fontes o Forte de Santa Catharina.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Carlos Braga: - Sr. presidente, participo a v. exa. que lancei na caixa de petições alguns requerimentos de sargentos do regimento de infanteria aquartelado em Guimarães, em que pedem o abono de 80 réis para rancho aos não arranchados.

Estes requerimentos são iguaes a muitos outros que têem sido apresentados por alguns srs. deputados, e como considero justo o pedido que n'elles se faz, recommendo-os á attenção da commissão competente.

Aproveito a occasião de estar com a palavra para participar a v. exa. que desejava conversar com o sr. ministro da fazenda ácerca da interpretação que se está dando ao n.º 1.º do regulamento da decima de juros, approvado em 1887.

S. exa. não está presente, se estivesse, formulava já a minha pergunta, mas como o não está, peço a v. exa. a finesa de avisar o illustre presidente do conselho do desejo que acabo de manifestar.

Aproveito ainda a occasião para juntar a minha voz humilde e despretenciosa ás considerações apresentadas, na ultima sessão, pelo distincto parlamentar, e notavel homem de estado, o sr. conselheiro Marianno do Carvalho, a proposito da introducção de machinas para a fabrico do calçado.

N'essa occasião não estava presente, mas, segundo as considerações de s. exa. que conheço pelo que vi nos jornaes, julgo que ha na introducção de machinas para o fabrico de calçado um prejuizo grande para a industria portugueza, ficando, talvez, mais de 3:000 pessoas desprovidas do trabalho.

Ora, sr. presidente, ha muito tempo, conversando com um honrado e importante industrial, o sr. José da Cunha Alves de Sousa, cavalheiro, por cujo caracter tenho uma profunda veneração, disse-me elle que era enorme o prejuizo, que resulta da admissão d'essas machinas.

Sei, perfeitamente, que o governo não póde prohibir que os particulares ao introduzam nos seus estabelecimentos; entretanto, chamo a sua attenção para este assumpto, e espero que o governo providenciará, de fórma, a evitar os prejuizos que possam advir da introducção das mesmas machinas.

Aviso previo

Desejo conversar com o sr. presidente do conselho e ministro da fazenda, ácerca da interpretação do n.° 1.° do artigo 2.° do regulamento da decima de juros do 1887. = Carlos Braga.

Mandou-se expedir.

O sr. Marianno de Carvalho: - Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos representantes do congresso das sociedades cooperativas do Porto e de Villa Nova do Gaia, sobre a contribuição industrial.

Esta representação foi-me entregue muito depois de estar discutido o projecto da contribuição industrial, n'esta e na outra casa do parlamento, e, portanto, não póde ter utilidade; entretanto, enviando-a hoje para a mesa, peço a v. exa. se digne remettel-a á commissão de fazenda, que poderá fazer a respeito d'ella, se assim o julgar conveniente, um projecto especial.

Mando tambem para a mesa uma representação da camara municipal da Gollegã, pedindo que seja modificado o decreto de 4 de janeiro, no sentido de serem partilhados mais equitativamente os encargos que pesam sobre o antigo concelho de Santarem e de lhe dar tambem uma parte que lhe cabe das dividas activas e de outros bens, que á data de 25 de novembro de 1895 possuia a referida camara.

Eu tenho toda a confiança nos cavalheiros que compõem a camara municipal da Gollegã, e por isso parece-me que este assumpto deve ser enviado á commissão de administração publica, para ver se aquella camara foi realmente prejudicada com a annexação de uma freguezia a ponto de não poder satisfazer os encargos que a oneram.

Participo a v. exa. que lancei na caixa de petições um requerimento do escrivão de fazenda da comarca de Valença sobre prejuizos na sua collocação e vencimento.

Por ultimo, sr. presidente, peço a v. exa. a fineza de lembrar ao ministerio da marinha que em fins de fevereiro ou principios de março pedi alguns documentos a respeito da compra do navios para a nossa armada. Como creio que o projecto já foi enviado para a mesa, peço a v. exa. que inste pela remessa d'esses documentos que são necessarios para a discussão d'aquelle projecto.

As representações vão, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Presidente: - Será satisfeito o desejo do sr. deputado.

O sr. Mendes Lima: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação dos escrivães de direito da comarca de Lisboa, pedindo varias modificações no projecto de lei de 24 do corrente que altera a tabella judicial em vigor (decreto n.° 2 de 22 de maio de 1995).

Fica-se no fim da sessão.

O sr. Teixeira dê Sousa: - Mando para a mesa duas representações, uma de alumnos do curso de 3.° anno de preparatorios medicos da universidade do Coimbra pedindo dispensa do exame de allemão até ao 5.° anno d'aquella faculdade e outra de differentes ex-officiaes inferiores do exercito ao serviço do ministerio da guerra.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte a publicação d'estas representações no Diario do governo.

Foi auctorisada a publicção.

As representares vão, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Polycarpo Anjos: - Mando para a mesa o seguinte:

Requerimento

Tendo de me ausentar para o estrangeiro, requeiro a v. exa. para que, nos termos do artigo 213,° do regula-

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mento, consulte a camara se permitte a minha saída do reino.

Sala das sessões, 30 de abril do 1896. == O deputado, Polycarpo Anjos.

Concedida a permissão.

O sr. Abilio Beça: - Mando para a mesa uma representação dos amanuenses apontadores da direcção das obras publicas do districto de Bragança, pedindo que se lhes conceda viajar com o abatimento de 50 por cento nos caminhos de ferro do estado á similhança do que se pratica com outros funccionarios.

Vae por extracto, no fim da sessão.

O sr. Ferreira Marques: - Pedi a palavra para dizer que dietei na caixa alguns requerimentos de individuos da classe medica e de outras classes do hospital da marinha, em que pedem o abono da ração que lhes foi tirado por um decreto disctatorial.

Peço a v. exa. que se digne remettel-os á respectiva commissão.

O sr. Carneiro de Moura: - Mando para a mesa uma representação dos ex-arbitradores da comarca de Valle Passos contra o decreto de 15 de setembro de 1892 que extinguiu a sua classe.

Peço a v. exa. que se digne dar-lhe o devido destino.

A representação vae, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Costa Pinto: - Mando para a mesa uma representação de diversos habitantes da freguezia de Freiria, pedindo que essa freguezia fique pertencendo ao concelho Mafra.

Vae por extracto, no fim da sessão.

O sr. Presidente: - Como não está mais nenhum sr. deputado inscripto, vae entrar-se na

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 86.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 86

Senhores: - Á vossa commissão de legislação criminal foi presente a proposta do governo n.° 73-A, pedindo auctorisação para reformar, dentro das respectivas verbas orçamentaes, o quadro do pessoal da cadeia geral penitenciaria, fixado por lei de 29 de maio de 1884, para reorganisar a casa de detenção e correcção da comarca de Lisboa, e para reformar os regulamentos e fixar os quadros do pessoal das cadeias civis da mesma cidade e da cadeia da relação, do Porto.

Com a organisado de diversos trabalhos compativeis com o regimen individual dos reclusos, e com a necessidade para isso da installado de algumas oficinas, augmentou consideralmente e tornou-se mais dificil e complicado o serviço a cargo dos guardas da cadeia geral penitenciaria de Lisboa. Quem bem conhece o funccionamento d'estes importantes estabelecimentos penaes, sabe que aos guardas não compete só a policia interna do edificio e a vigilancia constante sobre os presos, mas tambem o desempenho de diversos e trabalhosos serviços inherentes a uma instituição, que não serve apenas para reclusão de criminosos, mas tambem e principalmente para lhes servir de escola, moral e industrialmente fallando.

Em fins de 1887, quando o numero maximo dos reclusos, que as condições do edificio permitte alojar, estava longe de ser attingido, e quando os trabalhos das diversas oficinas não tinham ainda tomado o desenvolvimento, que hoje têem, reconheceu-se a indispensabilidade da nomeação interina de dois guardas de 1.ª classe e quatro de 2.ª Desde então até hoje, com esse pequenos augmento de pessoal, tanto mais pequeno, quanto mais difficeis de desempenhar são as funcções a cargo d'aquelles empregados, a direcção da penitenciaria tem conseguido embora por vezes com difficuldade, attender todas as exigencias do serviço.

Não podendo, de modo algum, dispensar-se o auxilio d'aquelles seis guardas, e não podendo também por isso riscar-se do orçamento a verba que com elles se despende melhor é, e mais conveniente parece á vossa commissão, legalisar a sua existencia igualando-os em direitos aos effectivos, como iguaes já lhes são em vencimentos e responsabilidades.

A organisação da secretaria precisa tambem de ser bem diversa da que foi primitivamente fixada. Em mentos d'esta natureza não da bom resultado o systema burocratico das repartições publicas. A sua secretaria precisa de compartilhar um pouco da organisação burocratica oficial, e bastante do adoptado nos escriptorios das casas industriaes. Para se lhe poder dar uma feição mais pratica, não têem sido providas duas vagas de officiaes, o que facilita fazer-se agora uma melhor remodelação de serviços sem aggravamento de despeza.

A casa de detenção e correcção de Lisboa, sympathica e humanitaria instituição, que tão relevantes serviços poderia prestar ao estado e á sociedade, está, infelizmente, muito longe de corresponder ao prestantissimo fim para que fôra creada. É da mais alta importancia introduzir-lhe reformas e adoptar medidas tendentes a conseguir-se, que d'este estabelecimento se tirem os proveitosos resultados, que d'elle havia a esperar.

A desorganisação dos quadros e a falta de convenientes regulamentos nas cadeias civis de Lisboa e Porto, está ha muito chamando a attenção dos poderes publicos e exigindo-lhes promptas providencias.

Para obviar a todos estes inconvenientes pede o governo auctorisação na sua proposta, que a vossa commissão de legislação criminal vos aconselha approveis, convertendo-a no seguinte projecto de lei:

Artigo l.º É o governo auctorisado a reformar, dentro das respectivas, verbas orçamentaes, o quadro do pessoal da cadeia geral penitenciaria, fixado por lei de 29 de maio de 1884, a reorganisar a casa de detenção é correcção da comarca de Lisboa, e a reformar os regulamentos e fixar os quadros do pessoal das cadeias civis da mesma cidade e da cadeia da relação do Porto.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes, na sua proxima sessão legislativa, do uso que houver feito d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de legislação criminal da camara dos senhores deputados, 20 de abril de 1896. = Teixeira de Sousa = Manuel Fratel = Abilio Beça = Lopes Navarro = Carlos Braga = José Maria Sá Vargas = Adolpho Pimentel, relator.

Senhores: - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta do governo, pedindo auctorisação para reformar, dentro das respectivas verbas orçamentaes, o quadro do pessoal da cadeia geral penitenciaria, fixado por lei de 29 de maio de 1884, a reorganisar a casa, de detenção e correcção da comarca de Lisboa, e a reformar os regulamentos e fixar os quadros do pessoal das cadeias civis da mesma cidade e da cadeia da relação do Porto, e, na parte que lhe diz respeito, de parecer, que deve ser approvada. aquella proposta e convertida no projecto de lei cuja approvação vos é aconselhada pela illustre commissão de legislação criminal.

Sala das sessões da commissão de fazendam 22 de abril de 1896. = Teixeira de 8ousa = Polycarpo Anjos = Mello e Sousa = Manuel Fratel = Dantas da Gama = Cabral Moncada = José Lobo = Teixeira de Vasconcellos = Leciona Monteiro = Adolpho Pimentel, relator.
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N.º 73-A

Senhores: - Não se demorou a experiencia em demonstrar a insufficiencia do numero de guardas da cadeia penitenciaria do Lisboa, fixado por lei de 29 de maio de 1884.

Installadas n'aquella prisão diversas oficinas, e organisados varios trabalhos compativeis com o regimen de separação individual dos reclusos, e accommodados ás condições do edificio, as funcções dos guardas não ficaram restrictas ao serviço policial das alas da cadeia, mas tiveram de multiplicar-se e dividir-se em variados ramos de serviço, que, pela sua natureza e continuidade, exigem vigilancia constante, não só para segurança dos presos, como para integra manutenção do systema penitenciario a que estão sujeitos.

N'esta conformidade, em dezembro de 1887, o governo auctorisou o augmento do quadro dos guardas, permittindo a nomeação interina de mais dois de 1.ª classe e quatro de 2.ª

Com o decurso dos annos, tendo-se attingido o maximo numero de reclusos que a prisão podia alojar, o havendo-se aperfeiçoado o seu regimen interno, mais evidente se tornou a indispensabilidade d'aquelles guardas interinos, não podendo de modo algum considerar-se o numero dos existentes superior ás necessidades dos serviços que lhes são impostos o ás responsabilidades que lhes competem.

Alterado, de facto, o quadro e sendo imprescindivel a despesa que ao fez com os interinos, mais regular e justo parece que se legalise a existencia d'estes empregados, igualando a sua situação á dos effectivos, para que adquiram pela maior estabilidade e pela perspectiva da aposentação maior solicitude e zêlo no desempenho do cargo.

O quadro da secretaria tambem precisa do modificação, de modo que, perdendo um pouco da sua feição demasiadamente burocratica, se amolde mais á indole especial do funccionamento economico da cadeia.

Na espectativa de uma reforma da secretaria, tem estado, ha muito, por prover duas vagas de officiaes, sendo por isso claro que se não pretende auctorisação para uma reforma que na realidade sirva de pretexto a nomeações da novos empregados.

A casa do detenção a correcção de Lisboa, com o seu actual regímen não corresponde cabalmente ao fim para que fôra instituida. Este modesto estabelecimento poderá ter influencia na moralidade social, evitando que muitos menores se precipitem o percam no abysmo da cniminalidade, se n'elle for introduzido um novo regimen que a parcimonia dos recursos infelizmente não consentirá que, por emquanto, passe de um prudente ensaio.

Os actuaes quadros do pessoal das cadeias civis de Lisboa e Porto necessitam de ser fixados definitivamente por lei quanto ao numero e vencimentos.

Grande parte dos empregados figuram no quadro respectivo como pessoal extraordinario, pagando-se a muitos em rações computadas em réis. Este systema tem obvios inconvenientes, consistindo o principal em não haver limites, nem sequer no orçamento, para a nomeação de funccionarios.

É urgente, pois, regular os serviços das referidas cadeias e determinar para cada uma o pessoal indispensavel com uniformidade na fixação de vencimentos certos.
São estes, senhores, os intuitos e os motivos fundamentaes do pedido de auctorisação a que se refere a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º É o governo auctorisado a reformar, dentro das respectivaa verbas orçamentaes, o quadro do pessoal da cadeia geral penitenciaria, fixado por lei de 29 de maio de 1884 a reorganisar a casa de detenção e correção da cp,arca de Lisboa, e a reformar os regulamentos o fixar os quadros do pessoal das cadeias civis da mesma cidade e da cadeia relação da do Porto.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes, na sua proxima sessão legislativa, do uso que houver feito d'esta auctorisação.

Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 20 de abril de 1896. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Antonio d'Azevedo Castello Branco.

Foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.º 79.

PROJECTO DE LEI N.° 79

Senhores: - Á commissão de fazenda foi presente a proposta de lei n.º 47-C auctorisando o governo a contratar com o banco de Portugal um emprestimo complementar de 25 contos de réis com juros não excedendo a 6 por cento, e hypothecando para esse effeito os bens e fundos administrados pela escola polytechnica, o sendo o producto do emprestimo applicado á construcção de um observatorio astronomico de estudo, á acquisição de instrumentos, apparelhos, collecções e mobilia para o mesmo observatorio e para as aulas de zoologia, mineralogia e physica.

Este emprestimo, continuação de outros anteriores e que tem permittido construir o edificio da escola polytechnica, aproprial-o aos seus fins e auxiliar o ensino com museus, jardim botanico, laboratorio de chimica, gabinete de physica, em nada aggrava os encargos actuaes do thesouro.

Por isso, e pelo fim util a que o emprestimo é applicado, nenhum objecção séria póde apresentar-se contra elle, devendo assim ser convertido no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a contratar com o banco de Portugal um emprestimo complementar de 25 contos de réis com juros que não excedam 6 por cento, hypothecando para isso os bens e fundos que a escola polytechnica administra.

Art. 2.º O producto d'este emprestimo será exclusivamente applicado á construcção de um observatorio astronomico do estudo e á acquisição de instrumentos, apparelhos, collecções e mobilia para o mesmo observatorio e para as aulas de zoologia, mineralogia e physica, conforme as mais urgentes necessidades, e tanto quanto o permittam a indispensavel construcção e a adaptação do observatorio astronomico ao ensino pratico dos alumnos e a observações de espectroscopia e photographia dos corpos celestes.

Art. 3.° A importancia d'este emprestimo complementar, addicionada ao saldo em divida ao banco de Portugal pelos anteriores emprestimos, contrahidos com o mesmo, banco, formam um capital, a cujos juros e amortisação é o governo auctorisado a applicar a verba de 16 contos de réis, para esse fim já consignada no orçamento do estado.

§ unico. Se os bens e fundos que a escola polytechnica administra não forem sufficientes para a hypotheca a que se refere o artigo 1.°, fica o governo igualmente auctorisado a completar a necessaria caução com titulos de divida consolidada interna na posse da fazenda nacional.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, 21 de abril de 1896. = M. F. Vargas = Manuel Fratel - C. Moncada - L. Monteiro - João Arroyo = Teixeira do Vasconcellos = Adriano da Costa = Polycarpo Anjos = Adolpho Pimentel = Teixeira de Sousa = Mello e Sousa = Marianno de Carvalho, relator.

N.º 47-C

Senhores deputados da nação portugueza. - É desde muito reconhecida a necessidade de reedificar e de installar convenientemente o observatorio astronomico, annexo á escola polytechnica de Lisboa.

Essa necessidade tem-se ultimamente aggravado por fórma a não ser possivel deixar de occorrer a ella sem grande perturbação nos serviços d'aquelle importante estabelecimento de instrucção,

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SESSÃO N.° 68 DE 30 DE ABRIL DE 1896 1317

Para obviar já a identicas difficuldades se adoptou, por carta de lei de l de julho de 1857, o expediente de auctorisar um emprestimo especial que, fixado inicialmente em 100:000$000 réis, foi successivamente augmentado por novos diplomas legislativos.

No proximo anno economico deve estar inteiramente amortisado esse emprestimo, graças ao qual se póde erguer e completar o grandioso edificio em que funcciona a escola polytechnica, sem maior encargo para o estado do que uma subvenção annual de 16 contos de réis, consignada no orçamento para juros e correspondente amortisação.

Tendo em consideração repetidas instancias do corpo docente, e a urgente necessidade de reedificar em melhores condições um edificio, onde possa installar-se o observatorio astronomico, tenho a honra de submetter á approvação legislativa a seguinte proposta de lei.:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a contratar com o banco de Portugal um emprestimo complementar de 25 contos de réis com juros que não excedam 6 por cento, hypothecando para isso os bens e fundos que a escola polytechnica administra.

Art. 2.° O producto d'este emprestimo será exclusivamente applicado á construcção de um observatorio astronomico do estado e á acquisição de instrumentos, apparelhos, collecções e mobilia para o mesmo observatorio e para as aulas de zoologia, mineralogia e physica, conforme as mais urgentes necessidades, e tanto quanto o permitiam a indispensavel construcção e a adaptação do observatorio astronomico ao ensino pratico dos alumnos e a observação de espectroscopia e photographia dos corpos celestes.

Art. 3.° A importancia d'este emprestimo complementar, addicionada ao saldo em divida ao banco de Portugal pelos anteriores emprestimos, contrahidos com o mesmo banco, formam um capital, a cujos juros e amortisação é o governo auctorisado a applicar a verba de 16:000$000 réis, para esse fim já consignada no orçamento do estado.

§ unico. Se os bens e fundos que a escola polytechnica administra não forem sufficientes para a hypotheca a que se refere o artigo 1.°, fica o governo igualmente auctorisado a completar a necessaria caução com titulos de divida consolidada interna na posse da fazenda nacional.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 14 de março de 1896. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.

Approvado sem discussão.

É o seguinte:

O sr. Carlos Braga: - Mando para a mesa, por parto da commissão do ultramar, um parecer sobre o decreto dictatorial de 16 de agosto de 1895, que confirma o contrato que o governo celebrou, prorogando por mais dez annos, que terminarão no fim do anno de 1909, o contrato entre o governo e a The Eastern and Smtth African Telegraph Company limited, assignado em 21 de maio de 1879 e approvado por carta de lei de 28 de abril de 1880.

A imprimir.

O sr. Presidente: -Vae entrar em discussão o projecto de lei.n.° 71.

É o seguinte;

PROJECTO DE LEI N.° 71

Senhores: - A commissão a que foi commettido o exame das reformas politicas decretadas pelo governo no exercicio dos poderes extraordinarios que assumiu vem hoje dar-vos conta do resultado do seu reflectido estudo sobre o decreto de 28 de março do anno findo, pelo qual foram feitos importantes alterações no regimen eleitoral do paiz e na constituição da camara dos deputados.

A opportunidade para a remodelação das nossas instituições representativas foi já largamente apreciada e debatida na discussão do bill de indemnidade e da reforma da camara dos dignos pares. Inutil é, portanto, insistir em assumpto, que a esta hora constitue caso julgado; e á vossa commissão incumbe examinar o conjuncto das disposições do decreto eleitoral, ponderando se ellas correspondem fielmente ao pensamento superior que as inspirou, se são accommodadas ás conveniencias publicas no actual momento da nossa vida nacional, e se podem porventura soffrer ainda modificações que melhor assegurem o exercicio proficuo dos direitos politicos e o funccionamento normal de um dos corpos legislativos.

Sobre quatro pontos capitães versa a reforma pendente do nosso exame: verificação do direito de votar, condições de exercicio do mandato legislativo, processo de escolha dos deputados, julgamento dos actos eleitoraes. Em cada um d'estes assumptos o decreto de 28 de março de 1895 introduziu notaveis alterações na legislação anteriormente em vigor, e se ellas não importam radicaes transformações no direito publico interno, conduzem, todavia, ao proposito que se pretendeu attingir, porque reunem os dois requisitos essenciaes de toda a reforma util e estavel - a ligação com o passado, cujo cumulo de experiencia, se conserva e defende como um capital precioso, e a adaptação ás circumstancias do presente que, recebendo a herança accumulada, deve contribuir com o seu esforço para a obra sempre incompleta do progresso e da civilisação.

Manteve o decreto eleitoral a base censitica sobra que assenta o direito de votar, segundo as nossas leis constitucionaes, e de cuja prova são; dispensados não sómente os cidadãos habilitados com titulos scientificos ou litterarios, mas tambem os que possuem alguma aptidão de cultura intellectual originada no facto de saber ler e escrever; e, por certo, nem a lição politica dos ultimos tempos, nem o exemplo, tantas vezes suggestivo, de outros paizes, podiam aconselhar a universalisação do suffragio á adopção do suffragio universal, que tem adquirido numerosos sectarios na propaganda de theoriaa erroneas pela confusão da origem dos direitos civis com a base dos direitos politicos, seria inteiramente descabida n'um paiz em que, a despeito de todos os esforços dos governo e das côrtes em favor da diffusão da instrucção popular, o numero de varões analphabetos excede ainda, segundo a mais recente estatistica, 72 por cento da população masculina.

Dm dos elementos mais perturbadores da politica portugueza foi, sem duvida, o inconsiderado alargamento do suffragio, a que deu azo a lei de 8 de maio de 1878, reconhecendo o direito de votar aos chefes de familia independentemente. Da prova do censo ou de qualquer grau de instrucção, o obedecendo a meras preoccupações theoricas, generosas nos seus intuitos, mas desconformes com a situação da nossa sociedade politica. O numero de eleitores, que em 1877 era de 476:120, elevou-se logo em 1878 a 823:856, sem que a multidão, chamada á partilha dos direitos politicos, tivesse de qualquer modo affirmado a sua capacidade para a nova funcção que a lei lhe commettia ou o deliberado proposito depenar, com o seu novo direito, a defeza de um grande principio de utilidade geral ou de alguma fecunda e justa aspiração de classe. A inercia, e o indifferentismo do corpo eleitoral, como o constituiu aquella lei, abriu caminho para uma larga alliciação de votos, debalde condemnada pelas disposições penaes, obrigou ao retrahimento muitas energias, suffocadas pela tyrannia occasional do numero. No desalento politico assim creado, ficaram os partidos desamparados dos elementos com que deveriam retemperar as suas forças em beneficio das instituições representativas; o seu prestigio começou a declinar, e para se lhes dar uma apparencia de vida substituiu-se pelo artificio dos accordos, nascido da
representação das minorias, a lucta aberta e franca conquista dos favores da opinião.

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Urgia, pois, restabelecer a verificação da capacidade eleitoral sobre as prudentes bases adoptadas pelo decreto de 30 de setembro de 1852 e pela lei de 23 de novembro de 1859, reconhecendo-se, todavia, o direito de voto aos cidadãos que, sabendo ler e escrever, requeresem a sua inscripção no recenseamento, como a lei de 8 de maio de 1878 havia auctorisado. Não bastava, porém, remodelar as disposições legaes sobre os indicadores da capacidade eleitoral; de igual urgencia se tornava providenciar efficazmente para que o direito de voto fosse assegurado a todos aquelles e sómente aquelles a quem a lei o conferisse. O processo do recenseamento, ou o complexo de garantias para a verificação d'esse direito, não é menos importante de que o reconhecimento legal d'elle, para que o direito não seja illusorio; e a contextura dos recenseamentos politicos andava eivada de taea irregularidades que, nem discrepancia de opiniões, era reclamada uma profunda alteração nas disposições reguladoras de materia tão melindrosa,

A vossa commissão entendo que este problema foi resolvido pelo decreto do 28 de março, de 1895, de uma fórma cabal e, no conjunto das suas proscripções, pela fórma mais perfeita que actualmente podia comportar a organisação dos serviços publicos. Deu-se ao recenseamento uma base documental, ou officiosamenta fornecida pelas repartições publicas, ou apresentadas pelos interessados, ou ainda requisitadas pelas commissões de recenseamento, e d'este, maneira o arbitrio das commissões, que tão damnoso se havia mostrado, ficou inteiramente tolhido, restringindo-se as funcções d'ellas á simples coordenação estatistica dos elementos sujeitos ao seu exame. Substituindo-se as antigas commissões electivas por commissões nomeadas por parte das corporações locaes e da magistratura judicial, arredou-se da constituição d'ellas o pernicioso espirito de facção, que tanto havia contribuido para a viciação dos recenseamentos. E, finalmente, collocando se sob a immediata vigilancia do poder judicial a
publicidade dos recenseamentos, a fiscalisação d'elles pelos cidadãos ou pelas auctoridades publicas e a sua organisacão definitiva, cortou-se toda a cabala de expedientes, com que era de uso prejudicar as reclamações e recursos indispensaveis para garantir a genuinidade dos recenseamentos e remediar as suas imperfeições, e assegurou-se a pontual e inteira execução, tantas vezes sophismada anteriormente, das decisões dos tribunaes.

As emendas que a commissão tem a honra de proporvou n'este capitulo não importam modificação substancial das disposições vigentes, mas sómente alguns aperfeiçoatos aconselhados pela experiencia já feita e inteiramente consentaneos com o pensamento, que presidiu ao decreto de 28 de março e que, largamente fundamentado e desenvolvido, consta do respectivo relatorio.

Limitou o decreto eleitoral o numero de funccionarios publicos, de medicos e de advogados, que devem ter ascento na camara dos deputados, e a vossa commissão é de parecer que se conserve tal preceito, muito plausivel para que no parlamento não preponderem estas profissões liberaes, e para que em cidadãos de outras classes possa recair em mais larga escala a escolha de representantes do paiz.
Não se pretende com esta disposição organisar uma estricta representação de classes ensaiando a applicação de um principio, que do campo especulativo difficilmente poderá passar para a realidade, mas sómente remediar o inconveniente, tantas vezes apontado, da excessiva e preponderante representação do funccionalismo, e prevenir o possivel inconveniente de assumirem de futuro preponderancia igual á dos funccionarios publicos, duas poderosas pelo seu ascendente notavel sobre a sociedade civil. Por certo que a escolha dos eleitores, quando feita com independencia e devidamente esclarecida, será sempre a melhor garantia da representação parlamentar de todos os grandes interesses nacionaes e das diversas escolas e partidos politicos; mas, não é menos exacto que, para corrigir habitos inveterados, é da mais comesinha prudencia fixar preceitos que attinjam immediatamente o mal que carece de remedio. O normal exercicio da funcção eleitoral poderá de futuro tornar inutil esta precaução, que, todavia, terá prestado o salutar serviço de impulsionar em nova orientação o corpo eleitoral na escolha dos seus representantes.

Connexas com a limitação numerica do funccionalismo na camara dos deputados são as disposições relativas a inelegibilidades e incompatibilidades por motivo de funcções publicas. N'esta materia a legislação eleitoral estava ainda adstricta ao que preceituára o decreto de 30 de setembro de 1852, com os additamentos feitos pela lei de 23 de novembro de 1859 ácerca dos empregos militares e magistrados judiciaes do ultramar e ácerca dos funccionarios inelegiveis na area da respectiva jurisdicção ou administração. E, todavia, por demais sabido o desenvolvimento que desde aquella epocha tiveram os serviços publicos, tanto attinentes á administração geral do estado, como á administração das corporações locaes. Muitos serviços se organisaram de novo, ampliaram-se os já existentes e para todos se decretaram os regulamentos indispensaveis ás multiplas e complexas funcções do estado. A sociedade civil encontra-se hoje mais apertada pela rede de uma regulamentação minuciosa de todos os serviços de interesse collectivo, e em meio frequente o immediato contacto com os agentes d'esses serviços. D'esta situação inevitavelmente resulta uma acção mais intensa do funccionalismo sobre as diversas manifestações dos direitos dos cidadãos, a qual necessariamente se repercutirá na vida politica, influindo directa ou directamente no exercicio do direito de suffragio. Inversamente, o espirito de facção ou de partido, procurando, para firmar clientelas, favorecer os interesses individuaes, embora muitas vezes com detrimento dos interesses publicos, pelos quaes todos os funccionarios devem zelosamente velar, origina attritos e levanta embaraços á marcha regular da administração. D'ahi a conveniencia de estabelecer, no duplo interesse da boa politica e da boa administração, restricções legues á elegibilidade dos funccionarios publicos, ou ao cumulativo exercicio do funcções publicas e do mandato legislativo.

Não padece duvida que a acertada organisação dos serviços publicos, a cuidada escolha dos funccionarios, a assidua vigilancia pelo cumprimento dos devores que lhes cabem, são condições impreteriveis e fundamentaes para que se converta na maxima somma de vantagens collectivas o sacrificio que representa, em homens e em valores desviados de outras funcções da economia social, o custeio da complicada engrenagem da administração publica nos seus differentes e multiplos ramos.

Incontestavel é igualmente que as luctas politicas têem a melhor garantia da sua proficuidade no alevantado ideal que as estimule, na opinião publica previdente e illustrada, que lhes corrija os desvios, na disciplina imposta por tradições de austeridade e patriotismo. Mas não é menos certo que os preceitos da lei podem influir utilmente, em maior ou menor grau, para que se atalhem alguns inconvenientes de uma perniciosa acção administrativa sobre a direcção politica do paiz ou de uma mal inspirada politica sobre o funccionamento da Administração publica.

A estes intuitos obedecem as disposições do presente projecto, que ampliando, de accordo com o governo, o preceituado no decreto eleitoral de 28 de março de 1895, declarou absolutamente inelegiveis os auditores adminis-

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trativos, os secretarios geraes e todos os empregados das secretarias, dos governos civis, e das secretarias das administrações do concelho, os funccionarios policiaes, os empregados das administrações de fazenda, districtaes e concelhias, e todo o pessoal do quadro interno das alfandegas; e ao mesmo pensamento obedeceu o decreto eleitoral declarando inelegiveis, embora sómente na area da respectiva jurisdicção da administração todos os magistrados administrativos, judiciaes, e do ministerio publico, as auctoridades militares, todos os empregados dos corpos administrativos os funccionarios de justiça, os empregados fiscaes, que por outra disposição não sejam absolutamente inelegiveis, e os empregados dos serviços technicos dependentes do ministerio das obras publicas.

Para a determinação d'estas inelegibilidades e para a sua distinção entre absolutas e relativas, se attendeu á natureza das funcções, á hierarquia administrativa, á inamovibilidade ou amovibilidade dos empregados; e deverá ainda ter-se presente que muitos funccionarios, a que respeitam as inelegibilidades relativas, são affectados pelas disposições sobre incompatibilidades.

A situação especial em que se encontram especial em que se encontram em relação a um dos poderes politicos do estado os empregados da casa real na effectividade de serviço , é rasão procedente para que não se lhes prohiba apenas o cumulativo exercicio das funcções legislativas de eleição com o exercicio d'esses empregos, conforme, anteriormente estava legislado, mas para que se lhes tolha a faculdade de disputarem perante os eleitores o diplona de representantes do paiz.

Os desvelos que deve merecer a administração das provincias ultramarias justificam a inelegibilidade dos respectivos empregados, para que nenhum d'elles possa distrahir-se do serviço a seu cargo. É alem d'isso notorio que nas mesmas provincias as paixões partidarias freqüentemente deflagram com mais ardor de que no continente e, por tal motivo é ali da mais instante conveniencia proteger a administração contra o despotismo das facções, cujos desmandos não podem muitas vezes ter, como no continente, tão rapido e efficaz correctivo da opinião publica ou da repressão legal.

Os empregados do corpo diplomatico e consular, tendo a sua residencia no estrangeiro e tende a seu cargo espinhosas funcções que devem absorver toda a sua attenção, só com damno dos interesses nacionaes, cuja protecção lhes é commettida, poderiam abandonar o seu posto para virem tomar parte nas luctas partidarias do paiz; a sua inelegibilidade é plenamente justificada pelas condições peculiares dos seus cargos.

A subordinação hierarchica dos empregados nos serviços das camaras legislativas explica a sua inelegibilidade.

As disposições restrictivas de elegibilidade dos funccionarios do estado e dos corpos administrativos completam-se com os preceitos relativos ás incompatibilidades, que, não excluindo do parlamento determinados funccionarios evitam o cumulativo exercicio das funcções do seu emprego e do mandato legislativo.

A incompatibilidade com os cargos de governador civil e de administrador do conselho, amoviveis e de confiança politica, a incompatibilidade com os cargos de procurador régio perante as relações, seus ajudantes, delegados e subdelegados, logares que tem legalmente a natureza de commissões amoviveis, estavam já estabelecidas pelo decreto de 30 de setembro de 1852, e o decreto eleitoral, que vimos apreciando, manteve-os com os mesmos effeitos de opção entre o cargo electivo e o de nomeação, acrescentando-lhes a incompatibilidade relativa ao cargo de juiz municipal, que, não sendo de commissão, é todavia de nomeação temporaria.

De novo introduziu a reforma eleitoral as incompatibilidades relativas aos juizes de direito de primeira instancia, aos officiaes do exercito e da armada na effectividade ou em qualquer commissão de serviço, e aos funccionarios superiores das secretarias d'estado, os quaes não são obrigados a optar entre o logar de deputado e os seus postos ou logares vitalicios; mas deixam de exercer os seus cargos durante todo o tempo da legislatura, e no mesmo periodo não recebem os ordenados, soldos, gratificações ou qualquer vencimento dos mesmos cargos. São foi nem devia ser intento da reforma excluir completamente da camara dos deputados a magistratura judicial, os officiaes do exercito de terra e mar ou os funccionarios dos serviços centraes do estado, porque à illustração d'estas classes e o seu conhecimento especial dos negocios publicos são elementos de valor para se aproveitarem no estudo e exame das diversas providencias submettidas á consideração do parlamento; e por tal motivo as incompatibilidades não foram extensivas aos juizes da segunda instancia e do supremo tribunal de justiça, aos officiaes generaes do exercito e da armada ou a empregados das secretarias d'estado alem dos directores geraes ou funccionarios que, pela hierarchia dos serviços, tenham attribuições e responsabilidades analogas ás dos directores geraes, embora differente seja a sua denominação. Tendo, porém, de attender-se n'este assumpto não só ás legitimas exigencias das instituições representativas mas também a outra ordem de considerações deduzidas da indole das funcções que incumbem á magistratura judicial, á armada, ao exercito e á burocracia, merece todo o applauso pela sua sensatez e opportunidade o intuito das disposições do decreto eleitoral sobre a materia sujeita.

Nos tribunaes singulares são mais prejudiciaes de que nos tribunaes collectivos, para a regular administração da justiça, as ausencias dos juizes proprietarios, por todo o tempo da sessão legislativa e repetidas durante periodo da legislatura»

Os directores gentes das secretarias d'estado, sendo os immediatos executores das ordens dos ministros, cujas resoluções preparam com as informações e pareceres, colligidos e formulados sob a sua direcção, e sendo responsaveis não só pelo serviço interno das suas secretarias, mas tambem pela larga superintendencia que, de jurisdicção propria, exercem sobre todas as repartições externas que lhes são subordinadas, e sobre todo o funccionalismo hierarchiamente dependente d'elles têem na verdade a seu cargo attribuições tão complexas e momentosas, que o assiduo cuidado devido ao respectivo desempenho só tem que padecer, permittindo-se que lhes acresçam as canceiras das luctas politicas para o ingresso e trabalho noscio das assembléias electivas.

Quanto ao exercito e á armada, o decreto eleitoral declarou incompativel o exercicio do logar de deputado com a effectividade de serviço em todos os postos, com excepção do generalato, para que a madureza da idade fosse uma garantia contra o arrebatamento de peixões partidarias; todavia a commissão, acatando ainda o mesmo pensamento e considerando que no momento actual, mais que nunca se torna evidente a íntima solidariedade das instituições militares, com a prosperidade e com o futuro da nação, entende que deve alargar-se o numero dos postos compativeis, para que mais se facilite aos eleitores a escolha de representantes na classe militar, e por isso propõe que sejam também compativeis com o mandato legislativo os postos superiores, do exercito e da armada, á similhança do que dispõe a legislação eleitoral italiana, e apartando-se do exemplo da Hespanha, que o mesmo decreto havia seguido n'esta materia.

A par das inelegibilidades motivadas pelo serviço de cargos publicos, o decreto eleitoral declarou inelegiveis os arrematantes, concessionarios ou empreiteiros de obras publicas e os membros dos conselhos administrativos, gerentes ou fiscaes de emprezas ou sociedades, cuja constitui-

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ção ou funccionamento depende de favor ou vantagem especial concedida pelo estado.

Já o decreto de 30 do setembro de 1852 incluia entre as inompatibilidades o logar de arrematante e administrador do obras publicas, o logar do arrematante, director, caixa geral o principal gestor de qualquer contrato de rendimento do estado e o logar de director de quaesquer companhias ou sociedades que recebessem subsidio do estado ou administrassem algum dos seus rendimentos: mas a lei de 22 de maio do 1884, modificando estas disposições, restringiu a incompatibilidade derivada de subsidio ou vantagem concedida pelo estado aos casos em que a concessão não fosse feita por lei geral, ou promulgada anteriormente á eleição de deputado, e em que a concessão não fosse adjudicada precedendo basta publica.

A moderna constituição de muitas companhias ou empresas que, pelas necessidades de fomento na metropole e nas colonias, ou por outros motivos de interesse publico têem recebido do estado concessões especiaes, privilegios, subsidios ou garantia de rendimento, e que para a economia geral do paiz ou para a administração financeira do estado importam graves restricções ou pesados encargos, despertou a attenção da opinião publica, que justamente reclamava rigorosa superintendencia, por parte dos governou e do parlamento, sobre o funccionamento d'essas corporações ou entidades, para que se convertessem em positivas utilidades do paiz todos os sacrificios que ellas importavam.

Tornava-se, portanto, indispensavel uma providencia que, tolhendo o ingresso nos corpos legislativos aos representantes legaes d'essas sociedades ou emprezas, deixasse a fiscalisação parlamentar inteiramente desassombrada de e lhe assegurasse toda a imparcialidade e prestigio, revigorando, com a precisa efficacia, o mesmo saudavel pensamento que o decreto eleitoral do 1852 com assignalada previdencia havia já trazido nas suas disposições.

O escrutinio de lista por circulos districtaes tem sido o ponto mais largamente debatido da reforma eleitoral e as rasões que podem invocar-se em favor d'este processo de eleição, ou sejam deduzidas das actuaes circumstancias da politica portugueza, ou fundadas em precedentes da nossa historia constitucional, ou abonadas com o exemplo de outros paizes, não lograriam nunca exposição mais eloquente do que a desenvolvida no brilhante relatorio que precede o decreto de 28 de março de 1895.

«A eleição por escrutinio de lista, ali se affirma, tem um caracter essencialmente politico, de politica geral, no mais amplo e elevado sentido da palavra.»

«Os programmas definidos e os partidos organisados são, a um tempo, uma necessidade e uma consequencia d'este regmen», proclama ainda o mesmo documento.

É estes conceitos que nitidamente traduzem as condições em que o escrutinio plurinominal póde servir a genuidade e a força das instituições representativas, implicitamente envolvem o reconhecimento de que elle será inopportuno sempre que faltem no meio politico todas as condições que demanda para fructificar utilmente.

Exige, de facto, o escrutinio de lista, no regimen da eleição directa, uma intensidade de vida politica dos partidos ou do corpo eleitoral que só de raro em raro se accentua e manifesta nos periodos excepcionaes em que o abalo de uma revolução, o impulso de uma poderosa aspiração patriotica ou um vigoroso movimento da opinião, sobresaltada com qualquer grave risco imminente, empolga a attenção do paiz, e, impondo-lhe uma idéa simples, de todos facilmente comprehendida, acorrenta e une no mesmo proposito as vontades de um grande numero de cidadãos, cujo pensamento politico se traduz n'um lemma commum.

Fóra d'esses casos singulares e nas circumstancias normaes da vida nacional, o eleitor será sempre naturalmente inclinado a considerar o apreciar as questões de interesse geral pela ligação e solidariedade que possam ter com os interesses do meio restricto em que vive, da classe a que pertence ou da terra em que tem o seu domicilio. Por este criterio se guiará na escolha dos seus representantes; e se a circumscripção eleitoral for tão larga que a diversidade de interesses não possa conciliar-se n'uma formula commum, o eleitor on se retrahirá, abandonando a lacta politica, ou se entregará despreoccupadamente á discrição dos corretores eleitoraes.

Suffoca, é certo, o escrutinio de lista as pequenas influencias locaes, mas deixa por isso mais livros e preponderantes todas as influencias poderosas, que não dão melhor garantia de justa e util orientação politica.

A dispersão dos eleitores por uma area vastissima, as difficuldades de se entenderem e concertarem directamente, quando os habitos de associação não minorem tal inconveniente, são obstaculos invenciveis para que a maioria dos eleitores possa consciente e deliberadamente formular a lista multipla. O eleitor que confiar n'um candidato votará nos restantes nomes que este lhe indicar, embora a indicação nem sempre se recommende pela communhão de idéas ou identidade de programma politico, mas sómente pelas conveniencias de combinações momentaneas, a que a lista multipla facilmente se acommoda; e assim as eleições, sendo directas por preceito constitucional, a que apparentemente se presta homenagem, tornar-se-hão de facto em eleições indirectas, com os inconvenientes d'este processo, clandestinamente creado, e sem as vantagens que porventura teria francamente traduzido em disposição legal.

Effectivamento a lista multipla é mais adequada ao regimen das eleições indirectas para os collegios eleitoraes do segundo grau, constituidos por limitado numero de eleitores, que entre si podem facilmente combinar a lista dos candidatos. Por isso ella vigorou para a eleição de pares do reino, que era indirecta, segundo a lei constitucional de 1885, e para a eleição de deputados, que tambem era indirecta segundo a carta, até á promulgação do primeiro acto addicional. E se a reforma eleitoral de 1852 conservou o escrutinio de lista, por circulos que só excepcionalmente tinham de eleger mais de quatro deputados, logo a lei de 23 de novembro de 1859 o aboliu e estabeleceu o escrutinio uninominal. Voltou-se, é certo, em 1884 ao regimen do escrutinio de lista noa circulos das capitães de districto, porque d'essa fórma se pretendeu garantir a representação parlamentar das opposições, mas ainda então se conservaram muitos circulos uninominaes.

A commissão tem, pois, a honra de propor-vos que no continente do reino e ilhas adjacentes se restabeleçam os circulos uninominaes, e sómente abre excepção a este principio para as duas grandes agglomerações urbanas de Lisboa e Porto. A illustração d'estes centros populosos, a facil e prompta intelligencia em que ahi podem entrar os eleitores para a combinação da luta multipla, e a quasi identificação dos interesses das duas cidades com os grandes interesses industriaes e commerciaes do paiz, são elementos que aconselham um regimen eleitoral diverso. A estas considerações acresce que retalhar as duas cidades em circulos eleitoraes para a representação politica é obra sem base natural, que prejudicaria a verdadeira significação do sufragio, fraccionado por circumscrições mais ou menos caprichosas, que não seriam n'este caso justificadas por nenhuma diferenciação de interesses attendiveis.

Em conformidade com este pensamento, e de accordo com o governo, a commissão formulou o mappa de circulos que acompanha o projecto, mantendo para cada districto o numero de deputados que, segundo o ultimo

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censo da população, lhe attribue o decreto eleitoral de 1895.

Na divisão doa circulas, attendendo-se quanto possivel á proporcionalidade da população, teve-se igualmente em vista a integridade das unidades administrativas, acatando para a representação politica a solidariedade que para os interesses locaes vincula os cidadãos do mesmo concelho; a sempre que para a constituição dos circulos foi necessario agrupar concelhos, não se preteriram as boas regras que na materia mandam considerar a communhão de interesses, as reciprocas affinidades, a facilidade de communicações e as ligações tradicionaes.

A commissão entende que com o regimen dos circulos uninominaes e a genuinidade dos recenseamentos politicos garantida pela ultima reforma, todos os partidos poderão ter na camara electiva, a representação que merecerem, sem que haja necessidade de voltar ao regimen da representação das minorias pela lista incompleta, o qual, amortecendo todo o estimulo de lucta partidaria, novamente convertiria n'uma ficção os actos eleitoraes, e sem que seja necessario correr o risco de experimentar novas e engenhosas combinações, cujos resultados a breve passo venham frustrar a confiança que porventura inspirassem.

O julgamento de todos os processos eleitoraes pelo tribunal de verificação de poderes deve ter-se já como uma vantagem definitivamente consagrada na nossa organisação eleitoral. Inutil é insistir em considerados contraprovadas pela experiencia feita. Estabelecido este processo de julgamento para casos especiaes, segundo a lei de 21 de maio de 1884, a ultima reforma eleitoral ampliou-o a todas as eleições de deputados, facilitando assim a constituição da camara, poupando-lhe tempo disponivel para os trabalhos legislativos, e afastando do seio d'ella a apreciação de questões irritantes.

A commissão propõe que no corrente anno, logo que os recenseamentos eleitoraes sejam encerrados, só proceda a nova divisão de assembléas eleitoraes, justificada pelas alterações na distribuição dos eleitores, em consequencia dos novos recenseamentos, pelo estabelecimento aos circulos uninominaea e pelas ultimas modificações das circumscripções administrativas. Analoga providencia acompanhou as leis eleitoraes de 1859, 1878 o 1884.

Para as eleições politicas e municipaes se propõe identica divisão de assembléas, nem outro alvitre era defensavel, sendo commum o recenseamento para umas e outras eleições, e não havendo fraccionamento do concelhos para a formação dos circulos que hão de eleger os deputados.

Omittindo por dorneccessaria a menção de todas as alterações que importam apenas maior clareza e precisão dos preceitos legaes ou mero desenvolvimento do pensamento n'elles consignado, a commissão tem a honra de propor-vos que o decreto eleitoral de 28 de março de 1895 seja convertido no seguinte projecto de lei:

CAPITULO I

Dos eleitores

Artigo 1.° São eleitores de cargos politicos e administrativos todos os cidadãos portuguezes, maiores de vinte e um annos e domiciliados em territorio nacional, em quem concorra alguma das seguintes circumstancias:

1.° Ser collectados em quantia não inferior a 500 réis de uma ou mais contribuições directas do estado;

2.° Saber ler e escrever.

Art. 2.° Não podem ser eleitores:

1.° Os interdictos, por sentença, da administração de sua pessoa ou de seus bens, e os fallidos não rehabilitados;

2.º Os indiciados por despacho de pronuncia com transito em julgado e os incapazes de eleger para funcções publicas, por effeito de sentença penal condemnatoria;

3.° Os condemnados por vadios ou por delicto equiparado, durante os cinco annos immediatos á condemnação;

4.° Os indigentes ou que não tiverem meios de vida conhecidos; e os que se entregarem á mendicidade, ou que para a sua subsistencia receberem algum subsidio da beneficencia publica ou particular;

5.º Os creados de galão branco da casa real, e os creados de servir, considerando-se como taes os individuos obrigados a serviço domestico na fórma definida pelo codigo civil;

6.º As praças de pret do exercito e da armada, e os assalariados dos estabelecimentos fabris do estado.

CAPITULO II

Dos deputados

Art. 3.º Todos os que têem capacidade para ser eleitores são habeis para ser eleitos deputados, sem condição de domicilio ou residencia,

Art. 4.° São absolutamente inelegiveis para o logar de deputado:

1.º Os estrangeiros naturalisados;

2.° Os membros da camara dos pares;

3.° Os que, nos termos do artigo 7.° do primeiro acto addicional á carta constitucional, não forem habilitados com um curso do instrucção superior, secundaria, especial ou profissional, ou que não tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, provenientes de bens de raiz, capitaes, commercio, industria ou emprego inamovivel;

4.° Os que servirem logares nos conselhos administrativos, gerentee ou fiscaes de empresaa ou sociedades constituidos por contrato ou consessão especial do estado, ou que d'este hajam privilegio, não conferido por lei generica, subsidio ou garantia de rendimento, salvo os que, por delegação do governo, representarem n'ellas os interesses do estado;

5.º Os que forem concessionarios, arrematantes ou empreiteiros de obras publicas;

6.° Os empregados da casa real em effectivo serviço;

7.° Os auditores administrativos, os secretarios geraes e mais empregados das secretarias dos governos civis, os funccionarios de policia e os empregados das administrações dos concelhos ou bairros;

8.° Os empregados das repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos ou bairros, e os empregados do quadro do serviço interno das alfandegas;

9.° Os empregados das provincias ultramarinas, os do corpo diplomatico ou consular em serviço no estrangeiro, e os dos serviços das camaras legislativas.

Art. 5.° São respectivamente inelegiveis e não podem ser votados para deputados nas divisões territoriaes a que respeitar o exercicio das suas funcções:

1.° Os magistrados administrativos, judiciaes e do ministerio publico;

2.° As auctoridades militares;

3.º Os empregados dos corpos administrativos;

4.° Os empregados fiscaes e de justiça;

5.° Os empregados dos serviços technicos dependentes do ministerio das obras publicas.

§ 1.º A inelegibilidade prevista n'este artigo subsisto ainda durante sessenta dias, depois que, por qualquer motivo, o funccionario deixou de servir o cargo na sua circumscripção.

§ 2.° A mesma inelegibilidade abrange os substitutos e interinos, que exerçam o cargo em todo ou em parte do tempo decorrido desde a publicação do diploma, que designar o dia da eleição, até á conclusão das operações eleitoraes.

§ 3.° A inelegibilidade prevista n'este artigo não affecta os funccionarios cuja jurisdicção abrange todo o continente

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ao reino e ilhas adjacentes ou tambem as provincias ultramarinas.

Art. 6.º São inelegiveis pelos circulos das provincias ultramarinas os cidadãos designados nos artigos 8.° e 9.°

Art. 7.° O exercicio do cargo de deputado é incompativel:

l.° Com o exercicio do logar de juiz de direito de 1.ª instancia;

2.° Com a effectividade ou qualquer commissão de serviço dos officiaes do exercito ou da armada, excepto os officiaes generaes e os officiaes superiores;

3.* Com o exercicio do logar de secretario geral, director ou administrador geral, ou director de serviços de qualquer ministerio;

4.° Com o exercicio do logar de chefe de repartição de contabilidade dos ministerios ou do chefe de repartição ou secção, independentes das direcções, nos mesmos ministerios;

5.° Com os logares de governador civil e de administrador de concelho ou bairro;

6.° dom os logares de procurador regio perante as relações, seus ajudantes, delegados e sub-delegados e com o logar de juiz municipal.

§ 1.° Os magistrados, officiaes e empregados a que se

referem as incompatibilidades dos n.°s 1.°, 2.°, 3.° e 4.º pelo facto de prestarem juramento como deputados, deixam de exercer os seus cargos durante a legislatura, não percebendo, no mesmo periodo, ordenado, soldo de patente, ou vencimento algum relativo ao cargo incompativel, contando-se-lhee como tempo de serviço para todos os effeitos, excepto o de tirocinios para promoção aos officiaes do exercito e da armada, o tempo da legislatura e o mais que decorrer até serem collocados na effectividade de serviço ou nas commissões legaes respectivas.

§ 2.º Os funccionarios mencionados nos n.ºs 5.° e 6.°, logo que prestem juramento como deputados, deixam vago o cargo, que estavam exercendo.

§ 3.º O presidente da camara, logo que prestem juramento os deputados a que se refere o presente artigo, participará o facto aos ministerios competentes, e os chefes das repartições de contabilidade serio responsaveis por qualquer abono que auctorisem em favor dos mesmos deputados e que lhes não seja devido em virtude das disposições d'este artigo.

Art. 8.° Os magistrados e funccionarios do estado, tanto civis como militares ou ecclesiastico, os empregados, dos corpos administrativos e os de corporações ou estabelecimento administrativos subsidiados pelo estado, eleitos para o logar de deputado, não poderão funccionar na camara em numero superior a quarenta; os ministros d'estado não serão comprehendidos n'este numero, durante a legislatura para que forem eleitos, ainda mesmo depois de exonerados, e não lhes são n'essa legislatura applicaveis as disposições do artigo 7.°

§ unico. Não são comprehendidos na disposição d'este artigo os funccionarios aposentados, jubilados ou reformados.

Art. 9.° Os medicos e advogados eleitos para o logar de deputado não poderão funccionar na camara em numero superior a vinte, no qual se não comprehendem os que forem ministros d'estado ao tempo da eleição, por todo o periodo da legislatura, ainda mesmo depois de exonerado?.

§ unico. Os medicos e advogados, que com a sua profissão exerçam simultaneamente funcção ou emprego mencionado no artigo antecedente, serão computados no numero fixado pelo presente artigo.

Art. 10.° Para os effeitos dos artigos 7.°, 8.° e 9.°, os governadores civis dos districtos, depois da proclamação dos deputados na assembléa de apuramento, participarão ao governo os empregos ou profissões dos mesmos deputados, instruindo as participações relativas aos medicos e advogados com as certidões que poderem obter e por onde se mostre que nos ultimos dois annos foram collectados em contribuição industrial pelo exercicio d'estas profissões.

§ unico. As informações mencionadas n'este artigo, conjunctamente com outras que o governo possuir, serão por este communicadas á camara dos deputados.

Art. 11.° Julgados definitivamente todos os processos eleitoraes do continente do reino e das ilhas adjacentes, e independentemente das eleições supplementares a que por virtude do julgamento haja de proceder-se, a mesa provisoria da camara organisará uma relação de todos os deputados na situação prevista pelo artigo 8.°, e outra de todos os mencionados no artigo 9.°, publicando-as na folha official, e, dentro de tres dias desde a publicação, poderão os deputados reclamar contra qualquer indevida inscripção ou omissão nas mesmas listas ou contra a elegibilidade de algum dos deputados eleitos n'ellas comprehendidos, sendo as reclamações decididas pela junta preparatoria em igual praso.

§ 1.° Quando os deputados a que respeitam as mesmas listas excederem o numero respectivamente fixado nos artigos 8.° e 9.°, a mesa, em sessão publica da junta preparatoria, procederá a sorteio dos deputados de cada lista para designação dos que até o numero legal poderão funccionar, e serão annulladas pela junta ou pela camara, depois de constituida, as eleições dos deputados não sorteados, excedentes ao mesmo numero, excepto se forem empregados e dentro de oito dias desde a data do sorteio renunciarem o seu emprego.

§ 2.° Tomará assento na camara o funccionario civil, militar ou ecclesiastico, o medico ou advogado, que for eleito em eleição supplementar, quando não esteja preenchido o numero respectivamente fixado pelos artigo» 8.° e 9.°, aliás será pela camara annullada a sua eleição, salvo o disposto na parte final do paragrapho antecedente.

Art. 12.° Perde o logar de deputado:

1.° O que acceitar do governo titulo, graça ou condecoração que lhe não pertença por lei;

2.° O que tomar assento na camara dos pares;

3.° O que perder a qualidade de cidadão portugues;

4.° O que por sentença com transito em julgado incorrer em interdicção ou incapacidade prevista no n.º 1.º e na ultima parte do n.° 2.° do artigo 2.°;

5.° O que acceitar emprego, commissão, serviço ou situação que o torne absolutamente inelegivel para o logar de deputado;

6.° O que acceitar logar mencionado nos n.°s 3.°, 4.° e 5.° do § l.º do artigo 13.°;

7.° O que não comparecer a tomar assento na camara na primeira sessão da respectiva legislatura;

8.° O que abandonar o logar, nos termos do artigo 104.°

§ 1.° Todos os deputados que perderem os seus logares em virtude da disposição do n.° 1.º sómente poderão ser reeleitos passados seis mezes.

§ 2.° Sómente á camara dos deputados compete declarar a perda de logar, em que incorrer algum dos seus membros, fundando-se, salvo nos casos dos n.ºs 7.° e 8.°, em documento authentico comprovativo do facto que a motivar.

Art. 13.° Nenhum deputado, depois de proclamado na assembléa de apuramento, póde ser nomeado pelo governo, durante o tempo da legislatura e ainda durante seis mezes depois que esta findar, para cargo, posto retribuido ou commissão subsidiada, a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

§ 1.° Exceptuam-se: 1.°, os cargos de ministro d'estado e de conselheiro d'estado, cuja acceitação não importa a perda do logar de deputado, e cujo exercicio não é incompativel com este logar; 2.°, as commissões auctorisadas pela camara, sem prejuizo do logar de deputado, nos casos previstos no artigo 33.° da carta constitucional; 3.°, o cargo do governador civil; 4.º as transferencias ou nomea-

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ções de funccionarios para logares de igual categoria ou que não tenham maior vencimento; 5.°, as nomeações de funccionarios para logares que por elles possam ser exercidos em commissão, segundo a lei organica dos quadros a que pertencem.

§ 2.° Nenhum deputado, depois da proclamado na assembléa de apuramento e durante todo o tempo declarado n'este artigo, póde acceitar logar nos conselhos administrativos, gerentes ou fiscaes de empresas ou sociedades designadas no n.° 4.º do artigo 4.°, nem acceitar concessões, arrematações ou empreitadas de obras publicas; e o que infringir este preceito incorrerá na pena de suspensão de direitos politicos até tres annos, e tornará nullos de direito todos ou actos em que individual ou collectivamente tomar parte no serviço das mesmas emprezas; sociedades, concessões, arrematações ou empreitadas.

CAPITULO III

Do recenseamento eleitoral

Art. 14.° O direito de votar é verificado em cada concelho ou bairro pelo recenseamento eleitoral, no qual se apurará tambem a elegibilidade absoluta para cargos administrativos. '

Art. 15.° O recenseamento eleitoral é organisado de tres em tres annos, sendo nos outros sujeito apenas a revisão.

Art. 16.º A idade para a inscripção no recenseamento eleitoral deverá completar-se até o dia 30 de junho do anno em que o recenseamento for organisado ou revisto.

Art. 17.° Os eleitores deverão ser recenseados no concelho ou bairro onde residirem a maior parte do turno; os empregados publicos n'aquelle onde exercerem as suas funcções na epocha do recenseamento, e os militares n'aquelle em que na mesma epocha estiver o seu quartel de habitação.

§ 1.° O eleitor que, em concelho ou bairro differente d'aquelle onde estiver residindo, for collectado em alguma das contribuições do estado, predial ou industrial, poderá ser inscripto no recenseamento d'esse concelho ou bairro, se assim o requerer ás commissões de recenseamento de um e de outro, instruindo o seu requerimento com documento comprovativo da collecta que tiver
pago.

§ 2.° Em Lisboa e Porto poderão ser recenseados no bairro da sua residencia, quando n'outro exerçam as suas funcções, os empregados publicos que assim o requeiram perante as commissões de recenseamento dos dois bairros.

Art. 18.° As operações de recenseamento serão iniciadas em cada concelho ou bairro por uma commissão composta de tres vogaes, sendo um nomeado pela commissão districtal de entre os cidadãos domiciliados no concelho on bairro, elegiveis para cargos administrativos; outro escolhido pela camara municipal de entre os seus membros effectivos ou substitutos; e o terceiro, que será o presidente, officiosamente nomeado pelo juiz de direito da comarca a que pertencer o concelho, devendo a nomeação ser feita para as commissões dos bairros de Lisboa e Porto pelos presidentes das relações, e para os outros concelhos das comarcas de Lisboa e Porto pelos juizes das respectivas varas civeis, recaindo sempre a nomeação em cidadão domiciliado no concelho ou bairro, elegivel para cargos administrativos.

§ 1.° Pela mesma fórma serão nomeados os substitutos que na falta ou impedimento do respectivo vogal effectivo serão chamados a fazer as suas vezes.

§ 2.° As nomeações serão feitas annualmente e logo communicadas aos nomeados e ao administrador do concelho ou bairro.

§ 3.º Quando no mesmo cidadão recair a nomeação por parte de mais de uma entidade, a nomeação do presidente da relação ou do juiz de direito, preferirá a qualquer outra, e a da commissão districtal preferirá á da camara municipal. O administrador do concelho ou bairro participará immediatamente a occorrencia á corporação, cuja nomeação ficar prejudicada, e que logo deverá proceder a nova escolha.

§ 4.º A falta de nomeação pela commissão districtal será supprida pelo governador civil, a de nomeação pela camara será supprida pela commissão districtal, e a do juiz de direito pelo presidente da relação, a quem o governador civil, segundo a participação do administrador do concelho, communicará falta.

§ 5.° As nomeações illegalmente feitos pelo juiz de direito, pela commissão districtal ou pela camara municipal, serão annuladas pelo presidente da relação, procedendo reclamação da auctoridade administrativa, apresentada dentro de tres dias depois de findo o praso para os nomeações sendo ouvido o magistrado ou corporação, cuja nomeação é logo que lhe for communicada a annullação.

§ 6. Na falta ou impedimento simultaneo da algum vogal da commissão e do seu substituto, será chamado pelo presidente, ou, na falta d'este, pelo vogal nomeado pela commissão districtal, o vogal do anno immediatamente anterior, nomeado pelo respectivo magistrado ou corporação, preferindo o effectivo ao substituto.

§ 7.° O cargo de vogal do commissão é gratuito e obrigatorio.

Art. 19.° O secretario da camara municipal será o da commissão do recenseamento eleitoral do concelho, e o secretario da administração do bairro trará o da commissão do mesmo bairro, sendo um e outro coadjuvados em todo o expediente da commissão pelos empregados da secretaria da camara ou da respectiva administração, que a commissão requisitar, e vencendo os secretarios e seus auxiliares a gratificação que a camara lhes arbitrar, sobre proposta da commissão, dentro da verba orçada para esse fim.

§ união. São despegas obrigatorias da camara municipal todas os que se fizerem com o expediente do recenseamento eleitoral e das eleições, comprehendendo urnas, cofres e mais objectos indispensaveis.

Art. 20.° As commissões de recenseamento funccionam nos paços do concelho ou nas casas da administração dos bairros, devendo a camara fornecer-lhes outras casas quando nos alludidos edificios não possam reunir-se.

Art. 21.º As commissões de recenseamento installam-se, independentemente de convocação, no dia designado por lei, e reunem-se diariamente as horas que designarem no dia da sua installação, as quaes serão immediatamente publicadas, bem como o local das reuniões, por meio de annuncios.

§ unico. De todas as sessões da commissão se lavrará acta em livro authenticado com termo de abertura assignado pelo presidente, e com termo de encerramento lavrado pelo secretario, que numerará o rubricará todas as folhas.

Art. 22.° Sómente serão validos as deliberações da commissão tomadas por dois votos conformes.

Art. 28.° O administrador do concelho ou bairro assisto ás sessões da commissão e sobre os assumptos sujeitos a deliberação d'ella poderá emittir parecer.

Art. 24.° A commissão não poderá inscrever ou eliminar o nome de nenhum eleitor nem alterar as circumstancias que a elle respeitem senão por deliberação fundado em documento ou em informação escripta que requisitar de quaesquer estações officiaes.

§ l.º As exclusões com fundamento nas disposições dos n.ºs 3.°, 4.°, 5.° e 6.° do artigo 2.º poderão ter por base os esclarecimentos que as auctoridades, funccionarios ou quaesquer pessoas prestem á commissão e que serão sempre exarados nas actas.

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5 2.° A commissão deverá convocar os parochos e regedores para prestarem informações, que serão reduzidas a termo lavrado pelo secretario e por elle assignado.

Art. 25.° A organisação do recenseamento terá exclusivamente por base os seguintes documentos, que até o decimo dia anterior á data da installação da commissão devem ser enviados ao seu secretario:

1.° Relações por freguezias, organisadas pelo escrivão de fazenda do concelho ou bairro, contendo os nomes de todos os contribuintes que no lançamento immediatamente anterior foram collectados pelo estado em quantia não inferior a 500 réis de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, sommando-se para este effeito as collectas das mesmas contribuições;

2.° Documentos apresentados pelos interessados provando que, pelo lançamento immediatamente anterior effectuado n'outro concelho ou bairro, perfizeram a quota censitioa das contribuições designadas no numero antecedente ou que, tendo sido tributados no anno immediatamente anterior em imposto mineiro ou de rendimento, attingiram igual quota, sommando-se para este effeito a importancia de todas as mencionadas contribuições;

3.° Requerimentos dos interessados pedindo a propria inscripção no recenseamento, pelo fundamento de saber ler e escrever, quando sejam por elles escriptos e assignados, e reconhecidos por tabellião nos termos prescriptos no § unico do artigo 2:436.° do codigo civil, bastando, porém, a authenticação pelos chefes dos serviços de que dependam os requerentes, quando estes sejam serventuarios do estado ou dos corpos administrativos;

4.° Uma relação de todos os individuos que no anno anterior incorreram nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 2.°, organisada, segundo o ultimo domicilio que constar, pelos encarregados do registo criminal junto dos tribunaes de 1.ª e 2.ª instancia;

5.° Requerimentos de transferencia de domicilio, em conformidade do disposto nos §§ 1.° e 2.° do artigo 17.°

§ 1.° A contribuição predial sobre fóros, censos ou pensões será levada em conta áquelle por conta de quem for paga.

§ 2.° O imposto de rendimento sobre titulos, sómente será levado em conta quando estiverem averbados ha mais de um anno, ininterruptamente, a favor do seu possuidor.

§ 3.° Ao marido se levarão em conta os impostos correspondentes aos bens da mulher, posto que entre elles não haja communhão de bens, e ao pae os impostos correspondentes aos bens do filho, quando por documento authentico se provar que lhe pertence o usofructo d'elles.

§ 4.° A contribuição directa paga por uma sociedade, companhia ou empreza, será attendida para o recenseamento dos socios ou accionistas, em proporção do interesse que cada um provar, por documento authentico, ter na mesma sociedade, companhia ou empreza. A mesma disposição se observará achando-se o casal indiviso, por viverem em commum os membros da mesma familia.

§ 5.° O secretario da commissão, por editaes afixados com quinze dias de antecedencia, tomará publico o praso em que são recebidos os documentos e requerimentos a que se referem os n.ºs 2.° e 3.°, e da recepção passará recibo aos interessados, se estes o reclamarem.

§ 6.° Todos os documentos a que se refere este artigo serão pelo secretario da commissão classificados e reunidos por freguezias para servirem de base ás operações do recenseamento.

Art. 26.° A commissão, examinando todos os documentos a que se referem os artigos antecedentes, deliberará, ouvido o parodio e regedor respectivo, nos termos do § 2.° do artigo 24.°, sobre a inscripção dos eleitores e sobre a sua elegibilidade para cargos administrativos, e, segundo as resoluções tomadas, o secretario, sob sua responsabilidade, organisará por freguezias listas em triplicado de todos os eleitores inscriptos, por elle datadas e assignadas, e rubricadas pelos membros da commissão, podendo tambem rubrical-as o administrador do concelho ou bairro.

§ 1.° Quando algum dos contribuintes comprehendidos nas relações do escrivão de fazenda não deva ser recenseado, nas mesmas relações ou em folha addicional, a commissão lançará nota, declarando o motivo da exclusão, a qual será rubricada pelo parocho ou regedor, se for fundada em informação de um ou de outro.

§ 2.° A commissão poderá mandar avisar qualquer cidadão que haja requerido a sua inscripção por saber ler e escrever, a fim de perante ella formular de novo o seu requerimento, que ficará sem effeito não comparecendo no praso de tres dias.

§ 3.° A lista deverá declarar a respeito de cada eleitor o seu nome, idade, estado, profissão e morada, o fundamento da sua inscripção, nos termos dos n.ºs 1.° e 2.° do artigo 1.°, mencionando-se no caso do n.° 1.° a collecta respectiva, e se é elegivel para cargos administrativos.

Art. 27.° Dois exemplares das listas de que trata o artigo anterior serão pelo secretario enviados ao juizo de direito da comarca e distribuidos na classe dos recursos eleitoraes, autuando-se officio de remessa.

§ 1.° O juiz pelos officiaes de diligencias ou por agentes administrativos, que requisitar, fará affixar um exemplar das listas nas igrejas das freguezias a que respeitarem, e expor a exame e reclamação outro exemplar pelo praso de quinze dias, no tribunal ou no cartorio do escrivão, o que se tornará publico por editaes affixados no concelho ou bairro respectivo, juntando-se ao processo um exemplar das listas, findo o praso da reclamação, e certidões da affixação d'ellas e dos editaes.

§ 2.° 5 secretario da commissão exporá tambem a exame, na casa das sessões da commissão, os exemplares das listas em seu poder, fazendo-o constar por editaes, de cuja affixação remetterá certidão para juizo, onde se juntará ao processo do recenseamento.

§ 3.° Das listas affixadas nas igrejas e patentes á reclamação, poderá qualquer pessoa tirar copias e fazel-as conferir e authenticar por oficial publico, mediante emolumento na rasão de l real por cada nome conferido.

Art. 28.° Contra a indevida ou inexacta inscripção de qualquer eleitor, poderá reclamar perante o juiz de direito o proprio interessado, qualquer cidadão do circulo recenseado como eleitor no anno antecedente, o administrador do concelho ou bairro, e qualquer dos vogaes da commissão de recenseamento; e contra a omissão de algum eleitor poderá reclamar o interessado, o administrador do concelho ou bairro e qualquer dos vogaes da mesma commissão.

§ 1.° A reclamação será interposta em requerimento assignado pelo reclamante ou por seu procurador, com a assignatura devidamente reconhecida, e instruido com os documentos que lhe servirem de prova.

§ 2.° As reclamações serão autuadas por appenso ao processo de organisação do recenseamento, e para o seu julgamento poderá o juiz requisitar da commissão de recenseamento quaesquer documentos que hajam servido de base ás resoluções d'ella e que lhe serão remettidos dentro de vinte e quatro horas.

§ 3.° Se contra qualquer inscripção no recenseamento, fundada no facto do saber ler e escrever, houver reclamação contestando esse facto, o juiz fará intimar o eleitor inscripto, para que no praso de tres dias compareça perante elle para escrever e assignar o que, em prova do facto contestado, lhe for ordenado. Não comparecendo, será julgada procedente a reclamação.

§ 4.° As decisões dos juizes de direito serão motivadas e os processos das reclamações não serão em caso algum entregues aos reclamantes.

§ 5.° Das eliminações, alterações e addicionamentos

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ordenados pelo juiz, organisará o escrivão, por freguezias, listas em triplicado, sendo um exemplar affixado na igreja respectiva, ficando outro patente a exame, pelo praso de cinco dias, no cartorio ou tribunal, o que só tornará publico por editaes, e sendo o terceiro junto ao processo judicial do recenseamento. Da affixação das listas e dos editaes, que será feita pelos officiaes de diligencia do juizo ou por agentes administrativos para este fim requisitados, se lavrarão certidões para serem juntas ao processo do recenseamento.

Art. 29.° Das decisões do juiz de direito poderão os reclamantes, o proprio interessado, o administrador do concelho ou bairro e os vogaes da commissão de recenseamento recorrer para a relação do districto, sendo o recurso interposto perante aquelle magistrado, independentemente de termo, por meio do petição em que se exponham os seus fundamentos, instruida com os documentos convenientes, podendo ainda juntar-se outros dentro de tres dias, findos os quaes o processo será officialmente expedido para o tribunal superior.

§ l.º O recurso será distribuido na relação com os feitos da 6.ª classe, e o relator o mandará com vista ao ministerio publico, que responderá no praso improrogavel de vinte e quatro horas.

§ 2.° Findo este praso, o escrivão cobrará o feito, fal-o-ha concluso ao relator, e este o proporá logo em sessão publica com cinco juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes.

§ 3.° FPra o julgamento d'estes feitos poderá haver sessão todos os dias, ainda em tempo de ferias.

Art. 30.° Do acoordão da relação podem recorrer para o supremo tribunal de justiça as pessoas designadas no artigo anterior, sendo o recurso interposto independentemente de termo, por meio de petição, que poderá ser instruida com documentos, e dentro de quarenta e oito horas officialmente enviado, sem ficar traslado, aquelle tribunal, onde será decidido sem mais termos que os determinados para o julgamento nas relações nos §§ l.°, 2.° e 3.° do artigo antecedente.

§ unico. Não são admissiveis sobre o recenseamento eleitoral outras reclamações ou recursos alem dos estabelecidos n'esta lei.

Art. 31.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão officiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes e, em vista das decisões, o juiz mandará cancellar nas listas os nomes dos cidadãos que tiverem sido excluidos, e lhes fará addicionar os nomes d'aquelles que deverem inscrever-se de novo, ou n'ellas ordenará as alterações que superiormente hajam sido julgadas.

§ 1.° O exemplar das listas, que esteve patente a exame, segundo a disposição do § 5.° do artigo 28.°, será modificado no» termos do presente artigo, o com a necessaria segurança remettido pelo escrivão do processo ao secretario da commissão de recenseamento do concelho ou bairro para que, em vista d'elle e da lista geral que ficou em seu poder, proceda á organisação do livro do recenseamento, o qual terá termo de abertura assignado pelo juiz, seguindo-se na inscripção a ordem alphabetica dos nomes em cada freguezia, e agrupando-se ou dividindo-se as freguezias conforme a divisão das assembléas. A respeito de cada eleitor se mencionarão as circumstancias constantes das listas, nos termos do § 8.° do artigo 26.°

§ 2.º O livro assim processado será enviado ao respectivo juiz do direito e, depois do conferida a exactidão pelas listas existentes no cartorio e feitas as rectificações necessarias, será authenticado pelo juiz, que rubricará todas as folhas e assignará o termo de encerramento, declarando-se n'este o numero de eleitores inscriptos em cada freguezia. Este livro ficará sendo para todos os effeitos o recenseamento original, não poderá ser alterado por determinação de nenhuma auctoridade e será remettido, com a necessária segurança, ao secretario da camara municipal do concelho respectivo.

§ 3.° Das listas archivadas no cartorio o escrivão, independentemente de despacho, dará sempre, dentro de oito dias, as copias authenticas que lhe forem pedidas. Estas copias não estão sujeitas a sêllo e serão expedidas mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto.

§ 4.° Ao escrivão do processo do recenseamento arbitrará o juiz, ouvida a camara municipal e em vista da respectiva verba orçamental, uma gratificação, que será paga por esta corporação como despesa obrigatoria.

Art. 32.° Organisado o recenseamento pela fórma declarada nos artigos antecedentes, será revisto nos dois annos immediatos, observando-se nas operações de revisão as disposições seguintes, e ouvindo-se os parochos e regedores, nos termos do § 2.° do artigo 24.°:

1.° A commissão, tornando por base o recenseamento vigente, que requisitará do competente funccionario, deverá eliminar da lista de cada freguezia:

a) Os fallecidos, sendo o obito comprovado por certidão ou pelas relações que, até o decimo dia anterior á installação da commissão, os parochos e officiaes do registo civil devem remetter ao secretario da commissão, relativamente aos obitos decorridos no ultimo anno;

b) Os individuos incursos nas incapacidades previstas nos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 2.°, em vista da relação que, até á mesma data e a respeito do mesmo periodo de tempo, devem remetter ao secretario os encarregados do registo criminal;

c) Os que deixaram de ter o seu domicilio no concelho ou bairro, segundo o que constar á commissão, nos termos do artigo 24.º;

d) Os que deverem ser excluidos, em conformidade do disposto no § 1.° do mesmo artigo;

e) Os que no lançamento immediatamente anterior deixaram de ser collectados na indispensavel quota censitica proveniente de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario da commissão até o decimo dia anterior á installação
d'esta, e os que no anno immediatamente anterior deixaram de ser tributados em igual quota proveniente de outras contribuições, que serviram de base á sua inscripção, quando o facto se prove por documento.

2.° A commissão addicionará ao recenseamento de cada freguezia:

a) Os cidadãos que attingiram a idade legal, nos termos do artigo 16.°, em vista de certidão de idade ou de relações remettidos pelos parochos e officiaes de registo civil ao secretario da commissão até o decimo dia anterior ao da installação d'esta, e do que á mesma constar sobre as respectivas collectas de contribuições directas do estado, pelas relações enviadas da repartição de fazenda no anno corrente ou nos dois ultimos;

b) Os que no lançamento immediatamente anterior attingiram de novo a indispensavel quota censitica de contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario da commissão até o decimo dia anterior ao da installação d'esta;

e) Os que deverem recensear-se em vista dos documentos e requerimentos apresentados pelos interessados, nos termos dos n.ºs 2.° e 3.° do artigo 25.°, ou em vista da transferencia de domicilio auctorisada pelos §§ 1.°. e 2.° do artigo 17.°

§ 1.° A inscripção por saber ler e escrever será mantida, sem novo requerimento, nos recenseamentos revistos ou organisados nos annos seguintes.
§ 2.º São applicaveis ás operações de revisão as dis-

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posições dos §§ 1.°, 2.°, 3.°, 4.°, 5.° e 6.° do artigo 25.° e as disposições dos §§ 1.°, 2.° e 3.° do artigo 26.°

Art. 33.° Em conformidade com as deliberações da commissão sobre as eliminações e addicionamentos declarados no precedente artigo, o secretario, sob sua responsabilidade, organisará em triplicado listas, por freguezias, contendo, os nomes dos eleitores inscriptos de novo e os nomes dos eliminados, com menção do motivo da eliminação, sendo as listas datadas e assignadas pelo secretario, e rubricadas pela commissão, podendo rubrical-as tambem o administrador do concelho ou bairro.

Art. 34.º Dois exemplares das listas a que se refere o artigo antecedente, serão pelo secretario enviados ao juizo de direito da comarca, para os fins designados no artigo 27.°, observando-se na affixação e publicação das listas, na interposição e julgamento das reclamações e recursos, os termos e prasos prescriptos no mesmo artigo e nos artigos 28.° a 30.°

§ 1.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão officiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes, e, em vista das decisões, se procederá na conformidade do artigo 31.°; o escrivão do processo remetterá o competente exemplar das listas modificadas ao secretario da commissão do recenseamento, e este lançará em folhas addicionaes ao livro respectivo todas as alterações resultantes da revisão, segundo a ordem alphabetica dos nomes em cada freguezia, e segundo a divisão das assembléas, remettendo em seguida o livro ao juiz de direito.

§ 2.° Conferida a exactidão do addicionamento, precedido de termo de abertura, na fórma declarada no § 1.° do artigo 31.°, será authenticado e encerrado pela fórma expressa no § 2.° do mesmo artigo, e o recenseamento definitivamente revisto será remettido ao secretario da camara municipal.

§ 3.° São applicaveis ás listas e trabalho de revisão as disposições dos §§ 3.° e 4.° do mesmo artigo 31.°

Art. 35.° O secretario da camara municipal é obrigado a guardar e conservar, sob sua responsabilidade, o livro do recenseamento eleitoral, e d'elle ou dos addicionamentos remetterá copia authentica ao governador civil, por intermedio do administrador do concelho ou bairro.

§ 1.° Dentro de oito dias o independentemente de despacho, o secretario passará, sem sêllo, todas as certidões que lhe forem pedidas do recenseamento, mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto, e conferirá e authenticará, tambem sem sêllo, todas as copias impressas ou lithographados, que para esse effeito lhe forem apresentadas, mediante o emolumento de l real por cada nome conferido.

§ 2.° Da copia do recenseamento archivada no governo civil, o secretario geral, nos mesmos termos do paragrapho antecedente e mediante igual emolumento, passará certidões e authenticará, depois de conferidas, as copias impressas ou lithographadas que lhe forem apresentadas.

§ 3.° Todos os documentos que serviram de base ás operações do recenseamento e que não hajam sido requisitados pelo juiz da comarca, nos termos do § 2.° do artigo 28.°, ficarão archivados, sob responsabilidade do secretario da commissão de recenseamento, na respectiva camara municipal ou administração do bairro.

Art. 36.° Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento, as reclamações, os recursos, os documentos com que forem instruidos, as petições ou requerimentos que a tal respeito se fizerem, o que nos tribunaes judiciaes se ordenar, conforme as disposições d'esta lei, e os reconhecimentos de assignaturas das mesmas petições, requerimentos ou documentos, é isento do imposto de sêllo e de quaesquer emolumentos ou salarios.

§ unico. Os documentos a que se refere este artigo deverão declarar o fim para que são passados e para nenhum outro poderão utilisar-se.

Art. 37.° Todas as auctoridades, funcionarios e repartições publicas são obrigados a passar impreterivelmente, dentro de tres dias, as copias, certidões e attestados que lhes sejam requeridos, para o effeito do recenseamento eleitoral, das reclamações ou dos recursos sobre o mesmo objecto. A mesma obrigação incumbe aos parochos.

Art. 38.° Os prasos para as diversas operações do recenseamento eleitoral são os fixados no quadro junto á presente lei.

§ unico. Quando em algum concelho ou bairro as operações do recenseamento se não effectuarem nos prasos legaes, poderá o governo, ouvidos os fiscaes da corôa e fazenda em conferencia, fixar novos prasos, analogos aos designados na lei para a realisação das mesmas operações.

Art. 39.° Só é considerado legal para o acto da eleição o recenseamento eleitoral encerrado no dia 30 de junho, immediatamente anterior ao da mesma eleição.

§ unico. No caso de força maior, devidamente comprovada, e na falta de copias authenticas, será considerado legal o recenseamento original ou copia authentica, immediatamente anterior.

CAPITULO IV

Dos circulos eleitoraes, das assembléas primarias e dos actos preparatorios da eleição

Art. 40.° A eleição de deputados é directa e feita pelos circulos eleitoraes, designados no mappa junto a esta lei, elegendo cada circulo o numero de deputados que no mesmo mappa é fixado.

§ unico. A circumscripção dos circulos eleitoraes e o numero de deputados, que devem eleger, só por lei póde ser alterado.

Art. 41.° No praso de oito dias, contado sobre a data do encerramento do recenseamento eleitoral do corrente anno, as commissões de recenseamento procederão á divisão dos concelhos em assembléas eleitoraes, que serão compostas de 500 a 1:000 eleitores approximadamente, agrupando-se na rasão directa da sua proximidade as freguezias que de per si não possam formar uma só assembleia, e no mesmo praso as commissões designarão as igrejas ou edificios publicos ou municipaes em que as assembléas devem reunir-se.

§ 1.° Se n'algum concelho, dentro do praso fixado, a commissão não proceder á divisão de assembléas e designação das suas sédes, ao governo compete supprir a commissão.

§ 2.° A constituição das assembléas eleitoraes será publicada, logo que finde o praso designado n'este artigo, por editaes affixados nas igrejas parochiaes e na casa de reunião da commissão de recenseamento, e contra ella poderão reclamar perante o juiz de direito, dentro de quinze dias desde a publicação, o administrador do concelho ou bairro, os vogaes da commissão de recenseamento e os eleitores do circulo, observando-se na decisão das reclamações e nos recursos, que subsequentemente forem interpostos, sem effeito suspensivo, para a relação e para o supremo tribunal de justiça, os prasos e mais disposições applicaveis, por que se regem as reclamações e recursos sobre recenseamento eleitoral.

§ 3.° A constituição das assembléas eleitoraes, depois de fixada nos termos d'este artigo, é permanente e só por lei póde ser modificada; porém, quando haja alteração na circumscripção de algum circulo eleitoral ou de algum concelho, a qual affecte a divisão estabelecida, será convocada por decreto a commissão de recenseamento para proceder ás indispensaveis modificações na constituição das assembléas, observando-se na parte applicavel as disposições do presente artigo.

§ 4.° A constituição de assembléas fixada para as elei-

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ções potiticas vigorará igualmente para as eleições municipaes.

5.° Nos municipios de Lisboa e Porto vigorará para as eleições politicas e municipaes a constituição de assembléas que está fixada em decretos especiaes.

6.º São nullos os actos eleitoraes realisados fóra do recinto competentemente designado.

Art. 42.º As assembléas eleitoraes serão convocadas por decreto do governo; que designará o dia em que deve proceder-se á eleição; e, no domingo immediatamente anterior ao fixado para este acto, o presidente da commissão de recenseamento, por editaes affixados nos logares do estylo e lidos pelos parochos á missa conventual, tornará publicas as assembléas em que o concelho se divide, os seus limites e os logares de reunião, declarando tambem o dia e a hora em que as assembléas devem reunir-se.

Art: 48.° As assembléas primarias serão presididas pelos vogaes da oommissão de recenseamento eleitoral, sendo a designação feita no domingo precedente ao da eleição, em sessão publica da commissão, por sorteio em que entrarão somente os vogaes effectivos, se as assembléas não forem mais de tres, e em que entrarão os vogaes effectivos e substitutos, se as assembléas excederem este numero ; e, quando restar ainda alguma assembléa sem presidente, será este designado á sorte de entre ou vereadores em exercido.

unico. Aos presidentes designados se communicará immediatamente a assembléa a que devem presidir, e dentro de quarenta e oito horas poderão reclamar a sua escusa perante a commissão do recenseamento, que, julgando-a fundada em comprovado impedimento, encolherá novo presidente de entre os cidadãos do concelho elegiveis para cargos municipaes.

Art. 44.° O presidente da commissão de recenseamento enviará aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do domingo em que deve effectuar-se a eleição, dois cadernos dos eleitores que podem votar nas assembléas, a que elles tiverem de presidir, e cobrará recibo da remessa.

1.ª Estes cadernos, que poderão ser impressos ou lithographados, serão a copia fiel do recenseamento original, requisitado do funcionario competente, terão termos de abertura e encerramento assignados pela commissão, e serão por ella rubricados em todas as suas folhas.

2.° O administrador do concelho ou bairro poderá tambem rubricar e assignar os mesmos cadernos.

Art. 45.° O presidente da commissão de recenseamento enviará tambem aos presidentes da assembléa, dentro do praso fixado no artigo antecedente, quatro cadernos com termo de abortara e rubricas, na fórma por que acima se dispoz, para n'elles se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO V

Da eleição

Art. 46.° No domingo designado por decreto especial do governo para se proceder á eleição, pelas nove horas da manhã, reunidos os eleitores no local competente, lhes proporá o presidente dois de entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e dois para supplentes, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito n'elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

1.° Para a opprovação da proposta são necessarias tres quartas partes dos eleitores presentes.

2.° Se a proposta do presidente for approvada por menos de tres quartas partes, mas por mais da quarta parte dos eleitores presentes, ficará a mesa composta do escrutinador, do secretario e do supplente, que o presidente primeiro indicar na ordem da sua proposta, e dos restantes membros indicados por um eleitor de entre os que rejeitaram, se n'essa indicação accordar por acclamação a maioria dos eleitores d'esta parte da assembléa. Se esta não concordar, procederá á eleição dos respectivos vogaes por escrutinio secreto em que ella só votará, considerando-se eleitos os que obtiverem a maioria relativa.

Servirão de vogaes da mesa d'esta eleição os vogaes que já fazem parte da mesa eleitoral pela proposta do presidente.

3.° Quando a proposta do presidente for rejeitada por tres quartas partes ou por mais de tres quartas partes dos eleitores presentes, ou vogaes da mesa serão eleitos por acclamação, sob proposta de um dos eleitores, que a rejeitaram, ou por escrutinio secreto, conforme os casos indicados no paragrapho antecedente. Quando tenha de proceder-se a eleição por escrutinio secreto, a mesa para esta eleição será composta do presidente, de um escrutinador á de um secretario por ella nomeado, cada um de differente lado da assembléa.

4.° A quarta parte do numero dos eleitores presentes, não incluindo o presidente, quando este numero não for multiplo de 4, é a quarta parte do multiplo de 4 immediatamente inferior, sommada com a unidade.

6.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecerem eleitores em numero suficiente para comporem a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto em que se declare esta falta e que será assignado por elle, pelo parodio e pela auctoridade administrativa.

Art. 47.° Da formação da mesa se lavrará acta, e o secretario, que a lavrar, a lerá immediatamente á assembléa.

unico. Uma relação contendo o nome dos approvados ou eleitos para comporem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada na porta principal do edificio em que a assembléa estiver reunida.

Art. 48.º A mesa eleita antes da hora fixada no artigo 40.° é nulla, e nullos serão todos os actos eleitoraes em que ella interferir.

Art. 49.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou se apparecer e se ausentar antes de constituida a mesa, tomará a presidencia o cidadão que para isso for escolhido pelo maior numero doa eleitores presentes.

unico. A infracção d'este artigo importa a nullidade dos actos eleitoraes incompetentemente presididos.

Art. 50.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa nem os cadernos do recenseamento dos eleitores, nem os cadernos para se lavrarem as actas, que o presidente da commissão de recenseamento devia ter remettido ao presidente da assembléa, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copias authenticos do recenseamento, que houverem sido extrahidas do livro competente, e que qualquer cidadão apresentar, e as actos poderão lavrar-se em cadernos com termo de abertura e rubrica da mesa que a assembléa escolher.

Art. 51.° A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores possam por todos os lados ter livro accesso a ella e observar todos os. actos eleitoraes.

Art. 62.° Constituida a mesa, serão validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando presentes, pelo menos, tres vogaes, sendo o presidente substituido, nos seus impedimentos, pelo escrutinador eleito ou approvado pela maioria da assembléa, preferindo o mais velho, quando ambos hajam sido eleitos ou approvados pela mesma maioria.

Art. 53.° Os parochos e os regedores das freguesias, que constituem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ 1.° Faltando o parocho ou o regedor, a mesa nomeará pessoas idoneas que façam as vezes d'elles.

2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que os parochos e os regedores ou quem ou substituir estejam presentes.

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3.° O parocho, ou quem suas vezes fizer, terá logar na mesa ao lado direito do presidente, emquanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguezia.

4.° Se houver uma só assembléa no concelho, assistirá ahi á eleição o administrador respectivo ; se houver duas assistirá a uma o administrador e a outra o seu substituto : se houver mais de duas, ou algum d'elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercicio pessoa ou pessoas que o representem e em quem delegue as attribuições conferidas por esta lei.

5.º A falta da auctoridade administrativa não impede os actos eleitoraes.

Art. 54.° As mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem ácerca das operações da assembléa.

1.° Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, verbaes ou escriptas, serão motivadas.

2.° As decisões serão tomadas á pluralidade de votos.

No caso de empate, o presidente tem voto de qualidade.

3.º Qualquer eleitor póde apresentar por escripto, com a sua assignatura ou com outras, se todas forem de eleitores do circulo, protesto relativo aos actos do processo eleitoral e instruil-o com os documentos convenientes.

4.° O protesto e documentos, numerados e rubricados pela mesa, que não poderá jamais negar-se a recebel-os, com o parecer motivado d'esta ou com o contra-protesto de qualquer outro cidadão ou cidadãos tambem eleitores, se assim o tiverem por conveniente, serão appensos ás actas, mencionando-se n'estas simplesmente a apresentação dos protestos e contra-protestos, o seu numero e o nome do primeiro cidadão que os assignar, bem como os pareceres da mesa nas mesmas condições.

Art. 55.° Nas assembléas eleitoraes não se póde discutir ou deliberar sobre objecto estranho ás eleições. Tudo que alem d'isso se tratar é nullo e de nenhum effeito.

Art. 56.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem, regular a policia da assembléa e providenciar para que esta seja livremente accessivel.

Art. 57.° Nenhum individuo póde apresentar-se armado nas assembléas eleitoraes e, ao que o fizer, ordenará o presidente que se retire.

Art. 58.° Se o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente, para a ordem da mesma assembléa, poderá mandar sair do local, onde estiver reunida, todos ou alguns dos individuos presentes, não recenseados.

Art. 59.° A nenhuma força armada é permittido, sob pretexto algum, apresentar-se no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, demarcada por um raio de 100 metros, excepto a requisição feita em nome do presidente.

1.° O presidente consultará a mesa antes de fazer a
acquisição.

A força só poderá ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto ou obstar a alguma aggressão dentro do edificio da assembléa ou na proximidade d'elle, no caso de ter havido desobediencia ás ordens do presidente duas vezes repetidas.

3.° Apparecendo a força armada no edificio da assembléa ou na sua proximidade, suspendem-se os actos eleitoraes, e só poderá proseguir-se n'elles meia hora depois da sua retirada.

4.° Nas terras em que se reunirem as assembléas eleitoraes, a força armada, com excepção dos militares recenseados conservar-se-ha nos quarteis ou alojamentos durante os actos das assembléas.

Art. 60.º A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art 61.° A votação é por escrutinio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a saber
O voto.

unico. Não serão recebidas listas em papel de côres ou transparentes, ou que tenham qualquer marca, signal, designação ou numeração externa.

Art. 62.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; e, tendo elles votado, mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguezias mais distantes.

Art. 63.° Ninguem póde ser admittido a votar se o seu nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores. Exceptuam-se:

1.° O presidente da mesa, que póde votar na assembléa a que presidir, ainda que não esteja ali recenseado;

2.° O administrador do concelho ou bairro, ou seu representante, que póde votar na assembléa a que assistir' ainda que n'ella não esteja recenseado;

3.° Os cidadãos que se apresentarem munidos de accordãos das relações ou do supremo tribunal de justiça, mandando-os inscrever como eleitores, e que não foram inscriptos antes do encerramento do recenseamento, devendo juntar-se á acta o documento que apresentarem.

Art. 64.° Nenhum cidadão, qualquer que seja o seu emprego ou condição, póde ser impedido de votar, quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se contra elle se apresentar sentença judicial, passada em julgado, que se exclua do recenseamento, ou certidão de despacho de pronuncia, com transito em julgado.

Art. 65.° Ao passo que cada um dos eleitores chamados se approximar á mesa, os dois escrutinadores descarregarão o nome d'elle nos dois cadernos de que se faz menção no artigo 44.°, escrevendo o proprio appellido ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então entregará ao presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

unico. As listas deverão conter um numero de nomes igual ao numero de deputados, que compete ao respectivo circulo eleitoral, e o presidente da mesa assim o annunciará á assembléa antes de começar a votação.

Art. 66.° Concluida a primeira chamada, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art. 67.° Duas horas depois d'esta chamada, o presidente perguntará se ha mais alguem que pretenda votar, recebendo as listas dos que immediata e successivamente se apresentarem. Recolhida qualquer lista, considerar-se-ha encerrada a votação, quando dentro da assembléa não haja eleitor algum que se apresente a votar.

Art. 68.° Encerrada a votação, o presidente fará contar as listas que se acharem na urna e confrontar o seu numero com as notas de descarga postas nos cadernos do recenseamento.

unico. O resultado d'esta contagem e confrontação será mencionado na acta e immediatamente publicado por edital affixado na porta principal da casa da assembléa. Do mesmo resultado é a mesa obrigada a certificar qualquer eleitor que o requeira.

Art. 69.° Seguir-se-ha o apuramento dos votos, tomando o presidente successivamente cada uma das listas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá ao presidente; o nome dos votados será escripto por ambos os secretarios, ao mesmo tempo que os votos que forem tendo, numerados por algarismos e sempre repetidos em voz alta.

unico. O resultado do apuramento de cada dia, até se concluir o escrutinio, será publicado por edital, affixado na porta principal do edificio da assembléa. Do mesmo resultado a mesa é obrigada a passar certidão a qualquer eleitor que a requeira.

Art. 70.º São validas as listas dos votantes, ainda quando contenham nomes do menos ou de mais. N'este ultimo caso não serão contados os derradeiros nomes excedentes.

Art. 71.° As mesas eleitoraes apurarão os votos que recairem em qualquer pessoa, sem que hajam de verificar se essa pessoa é absoluta ou relativamente inelegivel, e

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sem embargo doa protestos que sobre este assumpto podem ser apresentados, nos termos dos 8.° e 4.º do artigo 54.°, excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no unico do artigo 61.° N'este caso serão taes listas declaradas nullas.

unico. As listas annulladas por este ou por outro fundamento legitimo não se contam para o calculo da maioria ou para outro algum effeito.

Art. 72.° As listas que as mesas declararam violadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral, sob pena de nullidade das operações de apuramento. A mesma disposição e sob a mesma pena se observará quanto ás listas declaradas validas contra a reclamação de algum dos cidadãos que formarem a assembléa.

unico. Os votos que só contiverem nas listas annulladas serão em todo o caso apurados, mas em separado e separadamente escriptas nas actas.

Art. 78.° Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d'elles não for exactamente igual á somma dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos elleitores presentes reclamar a verificação d'elles, proceder-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

Art. 74.° A constituição das mesas, a votação, a contagem das listas e o escrutinio são operações eleitoraes que se praticarão sempre antes do sol posto.

1.° Se a votação se não concluir no primeiro dia, o presidente da mesa eleitoral mandara pelos dois secretarios rubricar nas costas as listas recebidas, e fal-as-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição n'um cofre de tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na de cada um dos escrutinados.
Este cofre deverá ser sellado pelo presidente e por qualquer dos eleitores presentes que assim o requeira, sendo depois guardado com toda a segurança no mesmo edificio em que sr procedeu á votação, em logar exposto á vista e guarda dos eleitores, se vinte d'estes, pelo menos, o exigirem, e aberto no dia, seguinte, pelas nove horas da manhã, em presença da assembléa, para se proseguir noa actos eleitoraes.

2.° Não havendo reclamação de qualquer eleitor da assembléa, as listas, em vez de rubricadas uma a uma, poderão ser reunidas em um só maço ou em mais, conforme a capacidade do cofre, onde têem de ser depois encerradas, nos termos d'este artigo, e fechadas por um envolucro de papel lacrado e sellado, no qual os secretarios lançarão as suas rubricas, sendo facultativo a qualquer dos eleitores presentes rubricar tambem o envolucro e imprimir-lhe algum sêllo ou sinete.

S.° A rubrica das listas ou dos maços de listas e seu encerramento no cofre poderão effectuar se depois do sol posto.

Art. 76.º Terminado o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital, affixado na porta principal da casa da assembléa; em presença da mesma serão queimadas as listas que não estiverem no caso declarado no artigo 79.°, e d'estas circumstancias se fará expressa menção na acta.

unico. Dos votos que obtiver cada votado a mesa deverá passar sempre certidão, a requerimento de qualquer eleitor.

Art. 76.º DA eleição se lavrará acta em um dos quatro cadernos de que trata o artigo 45.°, assignada e rubricada pela mesa, e na acta se mencionarão, alem das mais circunstancias relativas á eleição:

1.º Todas as duvidas que occorrerem e reclamações que se fizerem, pela ordem em que foram apresentadas, e decisão motivada que sobre ellas se tomou, observando-se ácerca dos protestos escriptos o disposto no 4.º do artigo 54.º;

2.º Quantos dias a eleição durou, e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um 3." O nome de todos os votados e o numero de votos qne cada um teve, esoripto por extenso',
4.° 00 rotos annnllados e o motivo por que o foram;
5.° A declaração de que os oidad&os que formam a as-semblóa outorgam aos deputados que, em resultado dos votos de todo o circulo eleitoral se mostrarem eleitos, a todos tn volidum e cada um em particular, os poderes necessários para que, reunidos com os doa outros circulou eleitoraes da monnrohia portngneza, façam, dentro dos limites da carta constitucional e dos actos addioionaes á mesma, tudo quanto for conducente ao bem geral da naçfto.
| 1.° As actas poderão ser lithographadas ou impressas nos seus-dizeres gerae" o a sua redacção poderá reali-aar-se depois do sol posto.
§ 2.° Terminada a acta, a requerimento de qualquer eleitor, a mesa será obrigada a passar por certidão o numero de votos obtido por qualquer candidato, segundo o que da mesma' acta constar.
Art. 77.* D'esta acta tirar-se-hSo três copias authenti-oas, osoriptas nos outros três cadernos de que trata o artigo 4õ.°. igualmente assignadàs e rubricadas pela mesa.
§ 1.° Uma d'estns copias será logo reraettida ao presidente da aSHeniblóa d" apuramento do circulo eleitoral, oom um dós cadernos de que trata o artigo 44.° e mais papeis relativos á eloiçtto, acompanhados de uma relaçlo eecripta por ura dos secretários da mesa, d'onde conste especificadamente quaeu elles sAo. A remessa far-ee-lia pelo seguro do correio, havendo-o, ou por próprio, qne cobrará recibo da entrega.
§ 2.° A outra copia será também logo entregue, oom outro dos cadernos de que trata o artigo 44.°. ao administrador do concelho ou bairro a que a assembléa pertencer, para que tudo remetia com a devida segurança ao administrador do concelho ou bairro da sede do circulo eleitoral, do qual cobrará recibo.
§ 8.° A terceira copia será roroeitida ao presidente da camará do concelho u que a assembléa pertencer, para ahi ser arohivada.
Art. 78.° Tanto as actas origínaea, como as copias a que SP refere o artigo antecedente, serio assignadaa por todos os vpgaes da mesa, effeotivos e supplentes, devendo, ooxntndo, julgar-ee validas quando forem aosignadaa, pelo menou, por três do entre oíles. Se algum deixar de assi-gnar, o secretario mencionará esta oircumetancia.
Art. 79.° Á qualqnnr cidadão é permittido pedir e os secretários das camarão rannicipaes ajo obrigados a passar, independentemente de despacho, gratuitamente, sem sâllo e dentro do três dias, certidões authenticas das actas e mais documentos relativos ás eleições, que estiverem guardados nos arcliivos das respectivas camarás. Todos ostes documentos serílo, para os effeitos d'esta lei, considerados originaes o anthentioos, e dar-se-ba inteiro credito, a qualquer certidão legal que d'elles se extraia.
Art. 80.° Os dois ourrutinadores1 s&o os portadores da acta. original da respectiva Ofisembléa e apresental-a-hSo no dia designado, na sede do circulo eleitoral. ' § 1.° Quando algum dos usorutinadorea tiver motivos quo o estorvem de ir á sede do circulo, será substituído, pelos secretários ou pelou snpplentes.
§ 2.° Tanto as actos originaes, que s&o entregues aos portadoras, como as copias authentioas e mais paneis aue na conformidade do wfatfo 77.", sKo remettidos para a sede! do circulo eleitoral, por V"L do presidente da assembléa " do administrador do concelho ou bairro, seroo fechadas e lacradas, e alem d'isso levarHo no reverso do sobrescripto os appellidos dos membi-os-d" reapeotiva mesa, postos por letra de cada um, r *
CAPITULO VT Do apuramento Art, 81.° No dominga innwdiato ao- d" eleiçSo, pelas

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1330 DIABIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nove horas da manhã, reunir-se-hão na casa da camara da cede do circulo eleitoral os portadores das actas de todo o circulo, sob a presidencia do presidente da commissão de recenseamento eleitoral; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 46.° e seguintes, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas primarias e ao modo de manter ahi a liberdade e fazer a policia, competindo para este fim ao presidente e mesa das assembléas de apuramento as mesmas attribuições que pelos citados artigos competem aos presidentes e mesas d'aquellas assembléas.

§ 1.° Se o presidente não comparecer á hora fixada n'este artigo, prover-se-ha á sua falta pela fórma indicada no artigo 49.°

§ 2.° O administrador do concelho da sede do circulo ou do bairro, onde se reunir a assembléa de apuramento, assistirá a todos os actos da mesma assembléa.

Art. 82.° Constituída a mesa, o presidente da assembléa lhe apresentará fechadas e lacradas as copias das actas que, na conformidade do artigo 77.°, § 1.°, lhe devem ter remettido as assembléas eleitoraes do circulo; os portadores das actas apresentarão tambem os originaes, que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho ou bairro da sede do circulo apresentarão tambem as outras copias legaes, que na fórma do § 2.° do mesmo artigo lhe devem ter remettido os administradores dos outros concelhos ou bairros do circulo.

Art. 83.° Feita esta apresentação, nomear-se-hão, pela fórma indicada no artigo 46.° para a formação das mesas das assembléas primarias, as commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das diversas assembléas do circulo, de maneira, porém, que o exame das actas de uma assembléa não seja nunca encarregado a uma commissão de que sejam membros cidadãos recenseados na mesma assembléa.

Art. 84.° Estas commissões procederão immediatamente ao exame das actas, que lhes forem distribuidas, e ao apuramento dos respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 85.º Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral dos portadores das actas.

Art. 86.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na conformidade d'elles, a fim de averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados teve em todo o circulo, e sobre isto lavrará um parecer que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 87.° As funcções das assembléas de apuramento reduzem-se exclusivamente a examinar, pela comparação das actas originaes trazidas pelos portadores com as copias authenticas subministradas pelo presidente da assembléa e respectivo administrador do concelho ou- bairro, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas originaes são realmente as mesmas que foram confiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que d'ellas consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim a apurar esses votos. De maneira nenhuma, porém, deixarão de os contar a qualquer cidadão ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, com o fundamento de que algum dos cidadãos votados é absoluta ou relativamente inelegivel ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuinidade expressamente especificadas n'este artigo.

§ unico. Quando por qualquer caso imprevisto deixar de ser apresentada á assembléa de apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem os artigos antecedentes, far-se-ha o apuramento pelas que apparecerem.

Art. 88.º Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão.

Art. 89.° Serão considerados como eleitos deputados pelo circulo os cidadãos mais votados em numero igual ao dos deputados que por elle houver a eleger.

§ 1.° Quando dois ou mais cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, preferirá:

1.° O que tiver mais tempo de deputado;

2.° O mais velho;

3.º O que a sorte designar.

§ 2.° O nome d'aquelles que saírem eleitos publicar-se-ha por editaes afixados na porta principal dá assembléa, e o presidente proclamal-os-ha tambem em voz alta diante de toda ella.

Art. 90.° Qualquer eleitor do circulo poderá apresentar protestos, nos mesmos termos determinados para as assembléas primarias, perante a assembléa de apuramento, que será tambem obrigada a receber os protestos ou contra-protestos que as mesas das assembléas primarias não tenham querido acceitar.

§ unico. Se os protestos apresentados nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa ouvirá immediatamente os cidadãos, que compozeram as mesas das mesmas assembléas, para que informem o que se lhes offerecer ácerca dos protestos, e a resposta, que derem, será junta ao processo eleitoral.

Art. 91.° Do apuramento se lavrará acta, na qual se declarará o nome dos deputados eleitos, o numero de votos que cada um teve, e como pelas actas das assembléas de todo o circulo eleitoral consta que os eleitores d'elle outorgaram aos cidadãos, que se mostrasse haverem sido eleitos deputados, os poderes de que falla o artigo 76.°

Art. 92.° Da acta do apuramento se entregarão copias, assignadas por toda a mesa, a cada um dos deputados que presentes estiverem; aos ausentes enviar-se-hão com participação official do respectivo presidente.

Art. 93.° A acta de apuramento, conjunctamente com as actas originaes, cadernos e mais papeis que tiverem vindo das assembléas primarias, serão immediatamente remettidos ao presidente do supremo tribunal de justiça, dando-se logo da remessa conhecimento ao ministro e secretario d'estado dos negocios do reino.

§ unico. As copias authenticas das actas, que houverem sido apresentadas pelo presidente, ficarão guardadas no archivo da camara municipal da séde do circulo, e aquellas que tiverem sido apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro da mesma séde serão remettidas ao respectivo governador civil, para serem por elle archivadas; excepto no caso em que umas ou outras tenham servido de fundamento para sobre ellas assentar alguma decisão da assembléa de apuramento, porque, n'este caso, terão o mesmo destino do processo eleitoral, ao qual serão juntas.

CAPITULO VII

Do tribunal de verificação de poderes

Art. 94.° O tribunal de verificação de poderes tem por fim conhecer de todos os processos das eleições de deputados, julgando ás reclamações ou protestos apresentados, e, independentemente de reclamações ou protestos, declarando validas ou nullas as mesmas eleições.

§ unico. Contra os actos eleitoraes das assembléas primarias ou de apuramento e contra a elegibilidade doa deputados eleitos, qualquer eleitor do respectivo circulo póde apresentar reclamação ou protesto escripto e documentado, perante o presidente do tribunal, até á distribuição do processo eleitoral.

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Art. 95.° O tribunal de verificação do poderes será composto:

1.° Pelo presidente do supremo tribunal de justiça, que será presidente do tribunal de verificação do poderes, e por tres juizes do mesmo supremo tribunal designados pela sorte;

2.° Por tres juizes da relação do Lisboa, tambem designados pela sorte.

§ 1.° Quando algum dos magistrados, de que tratam os n.os 1.° e 2.° d'este artigo, faltar ou estiver impedido, será chamado, para substituir o presidente, o juiz mais antigo do supremo tribunal, e, para os restantes juizes, os que lhes forem immediatos' em antiguidade. No caso de necessidade poderá recorrer-se, nos meamos termos, aos juizes da relação do Porto.

§ 2.° O sorteio, a que se referem os n.os 1.° e 2.° d'este artigo, será feito em sessão publica perante o supremo tribunal de justiça.

§ 3.° O tribunal constituir-se-ha por iniciativa do seu presidente, no dia immediato ao do apuramento da eleição geral de deputados no continente do reino.

Art. 96.° Os processos eleitoraea, contra os quaes não houver protestos ou reclamações, serão julgados no praso maximo de quinze dias, contados doado a sua recepção no tribunal, e os restantes deverão ser julgados no praso maximo de trinta dias, contados de igual data.

Art. 97.° As sessões do tribunal de verificação de poderes serão publicas e anteriormente fixadas em hora e dia por aviso do presidente publicado na folha official.

§ 1,° As discussões serão oraes.

§ 2.° O dia do julgamento será notificado com tres dias de antecedencia, por aviso publicado na folha official, aos candidatos, que poderão comparecer pessoalmente, fazer-se representar por advogados, ou produzir novos documentos até vinte e quatro horas antes do dia fixada para o julgamento. Se algum processo não poder ser julgado na sessão prefixada, ser lhe-ha no fim d'esta determinado novo dia de julgamento sem necessidade de outra notificação.

§ 3.° Será sempre facultada aos candidatos, ou aos seus advogados, a inspecção directa, na secretaria do tribunal, dos processou eleitoraes e do quaesquer documentos que lhes digam respeito, não estando com vista aos juizes.

§ 4.° O tribunal poderá requisitar do todas as estações officiaes os documentos que entender convenientes e que urgentemente lhe serão remettidos, e no continente poderá mandar proceder a inqueritos, dentro do praso fixado para o julgamento, delegando para esse fim as suas attribuições em magistrados judiciaes, que terão direito de fazer citar testemunhas, nomear peritos e deferir-lhes juramento, corresponder-se com todas as auctoridades e requisitar-lhes as diligencias necessarias para o desempenho da sua commissão. O magistrado ou magistrados delegados vencerão, a titulo de ajuda de custo, a retribuição que lhes for arbitrada pelo tribunal, e que não excederá 4$500 réis por dia.

Art. 98.° O tribunal de verificação de poderes é competente para conhecer da legalidade de todos as operações eleitoraes dos processos que lhe alto affectos e da elegibilidade absoluta e relativa dos deputados a que os mesmos processos respeitam, sem prejuizo do disposto no § 2.° do artigo 100.º

§ 1.° São causas de nullidado as infracções de lei e as faltas de formalidades, que possam influir no resultado geral da votação.

§ 2.° Nos circulos plurinominaes as irregularidades nas operações eleitoraes de uma ou mais assembléas primarias, as quaes influam no resultado da eleição, sómente importam a repetição do acto eleitoral em todo o circulo, quando o numero de eleitores recenseados nos mesmas assembléas exceda um terço dos recenseados ao Circulo, aliás apenas se repetirão os actos eleitoraes na assembléa ou assembléas onde tenham occorrido aquellas irregularidades. Nos circulos uninominaes repetir-se-hão os actos eleitoraes em todo o circulo quando as irregularidades que influam no resultado da eleição affectem as operações de mais de uma assembléa primaria, aliás sómente se repetirá o acto eleitoral na assembléa em que hajam occorrido taes irregularidades.

§ 3.° As decisões do tribunal designarão individualmente todos os cidadãos votados no circulo e o numero de votos obtidos, qualquer que elle seja, e concluirão sempre por declarar valida ou nulla a eleição dos deputados eleitos, ou por declarar a necessidade de repetição dos actos eleitoraes em alguma ou algumas das assembléas, nos casos previstos no paragrapho antecedente.

§ 4.º As decisões do tribunal serão sempre motivadas e d'ellas não haverá recurso.

§ 5.° Os processos definitivamente julgados, depois de registadas as decisões proferidas, serão remettidos á camara dos deputados, dentro de quarenta e oito horas desde o julgamento, se a camara estiver funccionando, ou logo que ao reuna; e as decisões, que determinarem por qualquer motivo a repetição de actos eleitorais, serão immediatamente communicadas ao governo, que, no praso designado no artigo 105.°, contado da data da decisão, convocará aã respectivas assembléas.

§ 6.° O tribunal conhecerá das questões relativas á sua constituição, e organisará o seu regulamento.

CAPITULO VII

Da junta preparatoria, da constituição da comam dos deputados e modo de preencher as vacaturas

Art. 99.° Todos os deputados eleitos deverão concorrer no dia e logar aprasado para a reunião das côrtes geraes.

Art. 100.° Logo que se tenha reunido metade e mais um dos deputados eleitos pelos circulos do continente do reino, não se contando para cada deputado a eleição por mais de um circulo, constituir-se-hão em junta preparatoria, á qual serão presentes todos os processos, com os respectivos julgamentos, enviados do tribunal de verificação de poderes.

§.1.º Os deputados serão proclamados em conformidade com os julgamentos e depois do sorteio exigido pelo artigo 11.°, quando houver de effectuar-se.

§ 2.° Se a elegibilidade de algum deputado eleito for contestada por outro membro da junta preparatoria ou da camara, e os fundamentos da contestação não tiverem sido submettidos ao tribunal de verificação de poderes e por este apreciados, o deputado eleito não será proclamado sem a junta preparatoria ou a camara se haver pronunciado, em escrutinio secreto, ácerca da elegibilidade contestada.

§ 3.° Não podem ser objecto de impugnação os requisitos verificados por decisão dos tribunaes para a inscripção na qualidade de eleitor, excepto se a impugnação for motivada em facto posterior á decisão.

Art. 101.° O deputado eleito por mais de um circulo eleitoral representará o da naturalidade; não sendo eleito por este, o da residencia; no falta d'este, o circulo em que tiver obtido maior numero de votos, e em igualdade de votos, o que a sorte designar.

Art. 102.° O deputado eleito póde livremente renunciar o seu logar de deputado, antes de tomar assento na camara, fazendo-o assim constar por escripto á mesma camara.

Art. 103.° O deputado, depois de tomar assenta na camara, não póde renunciar, o seu logar sem approvação d'ella.

Art, 104.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde ecusar-se a desempenhar as funcções do mesmo logar senão por causa legitima e justificada perante a camara.

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1332 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

§ 1.° Se, contra o disposto n'este artigo, deixar de comparecer ás sessões por quinze dias consecutivos, será primeira e segunda vez convidado por officio do presidente, precedendo para esse fim deliberação da camara.

§ 2.° Se ainda, apesar d'isso, não se apresentar ou não justificar motivo que o impossibilite de comparecer, resolver-se-ha que perdeu o logar de deputado, o qual será declarado vago.

§ 3.° Esta vacatura não poderá ser declarada pela camara sem que, primeiramente, pelo exame de uma commissão, á qual o assumpto seja commettido, se verifique terem-se pontualmente observado todas as solemnidades d'este artigo e seus paragraphos.

Art. 105.° Declarada a vacatura de qualquer logar de deputado ou annullada alguma eleição, nos termos do artigo 11.° ou do § 2.° do artigo 100.°, será este facto immediatamente communicado ao governo, para que mande proceder à eleição supplementar no praso de quarenta dias, d'esde a data da resolução da camara, ao o circulo pertencer ao continente do reino, ou no mais breve praso, que for compatível com os distancias e meios de communicação, se o circulo pertencer ás ilhas adjacentes ou ao ultramar.

§ unico. Nos actos eleitoraes que houverem de repetir-se observar-se-hão as formalidades estabelecidas n'esta lei para a eleição geral de deputados.

CAPITULO IX

Disposições especiaes

Art. 106.º Nas provindas ultramarinas os dogaes da commissão de recenseamento eleitoral serão nomeados pelo conselho de provincia, e o governador escolherá de entre elles o presidente.

§ 1.º Nas mesmas provincias as assembléas primarias serão presididas por cidadãos da livre escolha das commissões de recenseamento.

§ 2.º Continúa em vigor o disposto no artigo 118.° do derreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, e em decretou especiaes serão designadas as contribuições directas das mesma provincs, que deverão levar-se em conta para o cabulo da quantia exigida pelo artigo 1.°, alem das contribuições mencionadas no artigo 25.°

Art. 107.° Os governadores das provincias ultramarinas são auctorisados a fixar, com os indispensaveis intervallos e attendendo ás distancias e meios de communicação, os prasos para as operações de organisação e revisão do recenseamento eleitoral e para os diversos actos das eleições.

Art. 108.° No caso de annullação da eleição de algum circulo do ultramar, será chamado a represental-o o mesmo cidadão, que o representava na legislatura anterior, até que se apresente á camará, devidamente julgado, o processo eleitoral do respectivo circulo.

Art. 109.° As funcções dos deputados pelas provincias ultramarinas cessam logo que finde a legislatura para que foram eleitos ou em que tomaram assento.

§ 1.º No caso, porém, da dissolução da camara, os deputados das provincias ultramarinas continuarão a represental-os unicamente até que seja apresentado á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral dos respectivos circulos.

§ 2.° Quando seja reduzido o numero de circulos das mesmas provincias, serão chamados a represental-as, nos termos do paragrapho antecedente, os deputados da anterior legislatura pela ordem designada no § 1.º do artigo 89.°

Art. 110.° Os governadores civis dos districtos insulanos designarão para os recursos eleitoraes, quando os haja, para os subsequentes actos do recenseamento e para a reunião das assembléas de apuramento os prasos e dias quo forem compativeis com os meios de communicação.

CAPITULO X

Disposições penses, geraes e transitorias

Art. 111.° Os parochos, os encarregados do registo criminal, officiaes do registo civil e escrivães de fazenda, que deixarem de remetter, nos prasos devidos, aos secretarios das commissões de recenseamento eleitoral as relações e informações a que são obrigados por esta lei para a organisação e revisão do recenseamento, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 112.° Os membros das commissões de recenseamento que deixarem de comparecer ás reuniões a que são obrigados ou que, comparecendo, deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis por pada vez que o fizerem.

§ unico. Na mesma pena incorrem todas os pessoas, auctoridades ou funccionarios que deixarem de prestar qualquer esclarecimento ou informação exigido por esta lei para a organisação e revisão do recenseamento eleitoral.

Art. 113.° Os parochos, funccionarios e mais pessoas, a que se referem os dois artigos antecedentes, no caso de prestarem falsas declarações, incorrerão na pena de suspensão temporaria dos direitos politicos e na de prisão ata seis mezes.

§ unico. Incorrerá na pena de suspensão o escrivão de fazenda que omittir o nome de qualquer contribuinte nas relações que é obrigado a fornecer para a organisação ou revisão do recenseamento eleitoral e, no caso de reincidencia, será demittido.

Art. 114.° Os portadores das actas que deixarem de comparecer na assembléa de apuramento no local, dia e hora marcado por esta lei, ou que, comparecendo, ahi deixarem de cumprir as obrigações que esta lei lhes impõe, incorrerão em uma multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 115.° As auctoridades administrativas ou ecclesiasticas que deixarem de comparecer nas assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, para os fins indicados por esta lei, os cidadãos eleitos para vogaes efectivos ou supplentes da mesa, que se recusarem a servir ou cumprir alguma obrigação, que lhes for incumbido, incorrerão no multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 116.° Os presidentes de quaesquer assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento que não comparecerem para presidir ás respectivas assembléas no dia, hora e local competente, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis.

§ 1.º E se, deixando de comparecer por impossibilidade absoluta, não mandarem entregar no mesmo local, ao presidente que a assembléa houver escolhido para o substituir, todos os papeis concernentes á eleição que lhes houverem sido entregues, em virtude de lei, uma hora depois d'aquella a que se refere o principio d'este artigo, incorrerão na multa de 100$000 a 200$000 réis

§ 2.° Serão punidos com a mesmo pena aquelles que começarem ou interromperem os actos eleitoraes antes das horas marcadas n'esta lei.

Art. 117.° As auctoridades que se negarem o passar, dentro do proso de tres dias ou do outro que especialmente estiver fixado, as copias, certidões ou attestados que lhes forem pedidos, para demonstração de algum direito garantido por esta lei, ou que por qualquer modo embaraçarem, ou com qualquer outro pretexto demorarem a passagem d'esses documentos ou entrega de quaesquer outros que lhes hajam sido confiados, incorrerão na multa de 50$000 o 200$000 réis e, soffrerão a pena de suspensão do emprego pelo espaço de seis mezes a um anno.

§ unico. Se d'este procedimento da auctoridade resultar para algum cidadão a perda do exercício do direito eleitoral ou de elegibilidade, a multa será duplicada e a pena será de prisão de seis mezes a um anno.

Art. 118.° O secretario da camara municipal ou da ad

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ministração do bairro que deixar, de cumprir as obrigações prescriptas n'esta lei, incorrera na, multa de 100$000 a 200$000 réis, e no caio de reincidencia, na pena de demissão.

§ unico. Na mesma pena racorrerão os escrivães de direito que não cumprirem as obrigações que por esta lei especialmente lhes incumbem.

Art. 119.° Os juizes, de qualquer ordem ou jerarchia, que deixarem de cumprir, esta lei, as obrigações que ella lhes impõe, incorreção na multa de de50$000 a 100$000 réis e soffrerão a pena de dois a seis mezes de suspensão.

Art. 120.° Todas e quaesquer pessoas particulares ou auctoridades, da quaes, individual ou collectivamente, seja imposta por esta lei alguma obrigação, se deixarem de a cumprir, incorrerão na multa de 40$000 réis a 100$000 réis, quando outra pena lhes não seja comminada por alguma disposição especial d'ella.

Art. 121.° Todos aquelles que se fizerem inscrever a si ou a outros, ou concorrerem para que elles proprios ou esses outros sejam inscriptos no recenseamento, com falso nome ou falsa qualidade, ou encobrindo ou concorrendo para que se encubra uma incapacidade prevista na lei, ou tiverem feito ou concorrido para que se faca a inscripção de um mesmo eleitor em duas ou mais listas do recenseamento, incorrerão na pena de suspensão dos direitos politicos por tempo não inferior a seis annos e na multa de 50$000 a 200$000 réis.

§ unico. Todos aquelles que, sendo encarregados por esta lei de fazer o recenceamento dos eleitores e elegiveis, inscreveram ou deixaram de inscrever indevidamente e com dolo no recenseamento qualquer cidadão, serão punidos com a pena duplicada.

Art. 122.º Todo aquelle que, tendo perdido o direito de votar por algum dos motivos indicados n'esta lei, votar não obstante isso, será punido com a pena de prisão de quinze dias a tres meses e multa de 10$000 a 50$000 réis.

Art. 123.° Todo aquelle que votar em qualquer assembléa eleitoral, quer seja em virtude de uma inscripção obtida illegitimamente pelo modo previsto no artigo 121.º quer seja tomando falsamente os nomes e as qualidades de um outro eleitor inscripto, será punido com a pena de prisão de um mez a um anno e multa do 20$000 a 100$000 réis.

§ unico. Será punido com a mesma pena todo o cidadão que se aproveitar de uma inscripção multipla para votar mais de uma vez.

Art. 124;° Todos aquelles que falsificarem ou concorrerem para que seja falsificado o escrutinio: acceitando listas declaradas illegaes por esta lei ou contando os votos que ellas contiverem; pondo ou consentindo que se ponha nota de descarga em eleitores que não votaram; introduzindo illegalmente listas na urna, tirando ou substituindo as que n'ella tiverem sido legalmente lançadas; trocando na feitura das listas o nome dos votados, ou diminuindo votos a uns, e acrescentando-os a outros no acto de os assentarem; ou falsificando a verdade da eleição, serão punidos, em casos, com a pena de prisão não inferior a dois annos e multa de 200$000 a 1:000$000 réis.

Art. 125.° Incorrerão na pena comminada pelo artigo anterior todos aquelles que por qualquer maneira falsificarem o recenseamento, nos cadernos que forem enviados pelas commissões aos presidentes das assembléas eleitoraes primarias, ou quaesquer outros documentos que por ellas lhe forem remettidos, todos aquelles que falsificarem os cadernos, actas e mais papeis respectivos á eleição, que pelas diversas vias estabelecidas por esta lei devem ser remettidos ás assembléas de apuramento; e, em geral, todos aquelles que falsificarem, concorrerem para que falsifiqui ou consentirem que falsifiqui qualquer documento respectivo ao recenseamento ou ás eleições; e ainda aquelles que deixarem extraviar estes documentos, havendo-lhes sido confiados.

Art. 126.°, Todos os portadores das actas que na assembléa de apuramento, contra a disposição do artigo 87.°, as annullarem, por quaesquer motivos que não sejam o da falta de genuidade e autenticidade expressamente marcados n'esta lei; que deixarem com qualquer fundamento de contar os votos aos cidadãos votados ou de se conformar com as disposições do mesmo artigo em que lhes são taxativas, restricta e expressamente marcadas as suas funcções; ou por qualquer modo adulterarem a verdade da eleição, incorrerão na pena de prisão não inferior a dois annos, na multa de 200$000 réis a 1:000$000 réis inhabilidade para todas as funcções publicas por espaço de seis annos.

Art. 127.° A cada um dos membros da assembléa primaria ou de apuramento que se oppozer ao exacto cumprimento das disposições dos §§ 3.° e 4.° do artigo 54.º dos preceitos do artigo 68.°, dos §§ 1.° e 2.º do artigo 74.º do § unico do artigo 75.°, do § 2.° do artigo 76.° Q do disposto no artigo 90.º será applicada a pena de prisão de quinze dias a seis mezes e multa de 50$000 a 200$000 reis. O maximo da pena será sempre applicado nos mesmos termos ao presidente da assembléa.

Art. 128.º Aquelles que por via de noticias falsas, boatos calumniosos ou quaisquer outros artificios fraudulentos, surprehenderem ou desviarem votos, determinarem ou tentarem determinar um ou muitos eleitores a abater-se de votar, um ou muitos portadores de actas a deixar de cumprir as obrigações que lhes são impostas por esta lei, serão punidos com a multa de 20$000 a 200$000 réis,

Art. 129.° Aquelles que, por vias de facto, violencias ou ameaças contra um eleitor, fazendo-lhe receiar algum damno para a sua pessoa, familia ou fortuna, o determinarem ou tentarem determinar a votar ou abater-se de votar, influírem ou tentarem influir sobre o seu voto, serão punidos cora a pena de prisão de dois mezes a dois annos e multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ 1.° Se as vias da facto o violencias forem taes que mereçam pena maior que o maximo aqui estabelecido, ser-lhes-ha essa pena, applicada.

§ 2.° Se o delinquente for funccionario publico, a pena será de prisão de dois mezes a dois annos e suspensão dos direitos politicos até dois annos.

Art. 130.° Todo aquelle que entrar armado em uma assembléa eleitoral primaria ou de apuramento será punido com a pena de prisão de um a tres mezes e multa da 10$000 réis a 100$000 réis.

Art. 131.° A auctoridade militar, por cuja ordem alguma força armada se apresentar no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidades, sem requisição do respectivo presidente, contra o disposto no artigo 59.º d'esta lei, será punida com a pena de presidio militar até um anno. presidio militar ato um anno.

§ 1.° Nenhuma ordem, vocal auctorisará a infracção do referido artigo.

§ 2.° Nenhuma ordem por escripto relevará o infractor, excepto a original requisição do presidente da mesa.

Art. 132.° Todos aquelles que, por via de tumultos, vozerias ou quaesquer outras demonstrações ameaçadoras, pretenderem ou tentarem perturbar as operações da assembléa primaria ou de apuramento, ou atontarem contra o exercido do direito eleitoral ou contra a liberdade de votar, e bem assim todos aquelles que em tumulto entrarem ou tentarem entrar com violencia na assembléa eleitoral, com o fim de impedir a eleição de qualquer cidadão, ou de impor a de um outro, serão punidos com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multa de réis 100$000 a 500$000.

§ unico. Se os delinquentes forem armados ou se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis.

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Art. 133.° Todos aquelles que, durante a reunião das assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, insultarem ou violentarem a mesa, ou lhe faltarem á devida obediencia, insultarem ou violentarem algum dos membros da assembléa, serão punidos com a pena de prisão de tres mezes a dois tomos e a multa de 50$000 a 500$000 réis.

§ 1.° Se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior, a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis

§ 2.° Se as violencias forem taes, que mereçam pela legislação commum pena maior, ser-lhes-ha essa applicada.

Art. 134.° Aquelle que roubar a uma com as listas recebidas, mas ainda não apuradas, ou roubar algumas listas, será punido com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multa de 100$000 a 500$000 réis.

§ unico. Se o roubo for effectuado em tumulto e com violencia, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis e, se maior pena pela legislação commum couber ás violencias perpetradas, essa deverá applicar-se. .

Art. 135;° Todas as auctoridades administrativas e policiaes que, por negligencia, deixarem de empregar todos os meios á sua disposição para obstarem a que se pratiquem as contravenções e delictos prevenidos por esta lei dentro da área da sua jurisdicção, serão punidas com a pena de demissão ou suspensão do emprego, conforme o grau da culpa.

§ unico. Se o fizerem por malícia, reputar-se-hão cumplices n'essas contravenções ou delictos, e como taes serão punidas com as penas que estiverem comminadas aos próprios delinquentes.

Art. 136.° Todos os magistrados, auctoridades e empregados que nas circumscripções territoriaes, pelas quaes forem respectivamente inelegiveis, espalharem cartas, proclamações ou manifestos eleitoraes, ou angariarem votos, serão punidos com a pena de prisão de um mez a um anno e suspensão de direitos politicos até seis annos.

Art. 137.° Será punida com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro a seis annos, toda a auctoridade, seja qual for a sua classe ou categoria, que no dia das eleições fizer sob qualquer pretexto, e ainda mesmo por motivo de serviço publico, saír do seu domicilio ou permanecer fóra d'elle qualquer eleitor, para que não possa votar.

§ unico. Se, porém, o eleitor for empregado publico imediatamente subordinado a essa auctoridade, não incorrerá ella na pena acima estabelecida, se por motivo de serviço publico, legitimo e indispensavel, e não tomado como mero pretexto, fizer que esse eleitor não possa exercer o seu direito.

Art. 138.° Será igualmente punida com a mesma pena, toda a auctoridade que conduzir, por si ou por intermedio dos seus subordinados, os eleitores ao local da eleição para darem o seu voto ou os impedir ali de comunicarem e tratarem com os outros para accordarem no melhor modo de exercerem o seu direito.

Art. 139.° É prohibido nos administradores de concelho, sob pena de inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro annos e multa de 50$000 a 200$000 réis, nomear cabos de policia quinze dias antes das eleições.

Art. 140.° As auctoridades administrativas ou policiaes, que deixarem de participar aos agentes do ministerio publico as contravenções e delictos previstos n'essa lei, e os agentes do ministerio publico, que deixarem de immediatamente os perseguir, incorrem na pena de demissão e inhabilidade para qualquer emprego publico, por cinco a dez annos alem da responsabilidade que por qualquer omissão ou negligencia lhes caiba para com a fazenda publica.

Art. 141.° Todas as contravenções o delictos, que offenderem as disposições d'esta lei ou o direito eleitoral e o exercicio d'elle, comprehendidos nos diversos artigos d'este capitulo, serão sempre perseguidos perante os tribunaes competentes, pelos respectivos agentes do ministerio publico, e tambem o podem ser por qualquer eleitor inscripto no recenseamento, instaurando-se o processo devido segundo a legislação em vigor.

Art. 142.° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'esta lei proscreve no proso de seis mezes desde que forem commettidos.

§ unico. Sómente prescreve no praso de tres annos o procedimento pelo delicio previsto no artigo 131.° e o procedimento contra as auctoridades administrativas ou policiaes e contra os agentes do ministerio publico que para a punição do mesmo delicto deixarem de cumprir o preceito do artigo 140.°

Art. 143.° Para se perseguir por estes crimes um funccionario de qualquer ordem ou categoria ou qualquer agente da auctoridade publica não é necessaria auctorisação do governo.

Art. 144.° Os processos por estes crimes não suspendem em caso algum as operações eleitoraes nem podem prejudicar o segredo do escrutinio.

Art 145.° A condemnação, quando for pronunciada, não importará nunca a annullação da eleição declarada valida pelo tribunal competente.

Art. 146.° Continuam a ser permittidas todas as reuniões para objectos eleitoraes, tanto publicas como particulares, nos termos das leis e regulamentos respectivos.

Art. 147.° A divisão de circulos eleitoraes fixada pela presente lei começará a vigorar nas eleições geraes para a proxima legislatura. °

Art. 148.° Ficam revogados o decreto de 30 de setembro de 1852, as leis de 23 de novembro de 1859, de 8 de maio de 1878 e de 21 de maio de 1884, e toda a legislação em contrario.

Quadro dos prasos para as operações de recenseamento eleitoral, ao qual se refere o artigo 38.° da presente lei

[ver tabela na imagem]

Operações Datas Prasos

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Mappa de circulos eleitoraes que faz parte da lei d'esta data

[VER TABELA NA IMAGEM]

Numeros Circulos Concelhos Numeros de deputados Numeros Circulos Concelhos Numeros de deputados

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[VER TABELA NA IMAGEM]

Numeros Circulos Concelhos Numeros de deputados Numeros Circulos Concelhos Numeros de deputados

Sala das sessões da commissão, 20 de abril de 1896.=

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A. R. dos Santos Viegas = Cabral Moncada = Adolpho Pimentel = Manuel Fratel = Jayme de Magalhães Lima = Visconde do Banho = Luciano Monteiro = Teixeira de Sousa = Pereira e Cunha = Teixeira de Vasconcellos, relator.

Senhor. - No desempenho do compromisso solemne que tomámos com Vossa Magestade e com o paiz, formulamos o projecto de decreto destinado a remodelar, na sua origem e na sua constituição, a camara dos senhoras deputados da nação portuguesa.

Ocioso se nos afigura, senhor, desenvolver largamente os motivos que, a nosso ver, tomam urgente o indeclinavel a reforma que propomos agora á superior approvação de Vossa Magestade. O regimen parlamentar atravessa, incontestavelmente, um periodo critico em quasi todas as nações da Europa; e, entre nós, factos recentes vieram videnciar defeitos que, n'um largo periodo de mais de dez annos, se haviam successivamente accentuado, provando bem que um vicio organico inquinava o regular funccionamento das nossas instituições parlamentares, obrigando todos os governos, sem distincção de homens ou eo partidos, a assumir faculdades legislativas, repetindo-se, com uma frequencia que encerra um ensinamento, a inobservancia dos preceitos essenciaes da nossa lei fundamental.

Não padece duvida que uma tal anomalia, convertida quasi em norma de administração, por governos das mais varias origens partidarias, compostos de homens do mais diverso caracter e significação politica, provam de um fundo mal que a todos se tem imposto, afastando-os por igual do caminho estrictamente regular e legal, o deixando ao mesmo tempo impassivel o espirito publico perante tão reiteradas usurpações das faculdades legislativas, constitucionalmente attribuidas ás côrtes geraes da nação. Nem os governos, por simples capricho, lançariam todos mão dos mesmos meios anormaes, nem o paiz, por moro indifferentismo, toleraria taes factos sem protesto. No descredito do parlamento, desde a sua origem nos recenseamentos, até á sua constituição desharmonica com as forças vivas do paiz, se encontra a explicação de phenominaes por outro modo incomprehensiveis.

Uma tal situação, Senhor, não póde nem deve prolongar-se. Já o dissemos a Vossa Magestade e ao paiz em documento publico e solemne; reiteramos hoje muito firmemente a nossa afirmação. Se não restabelecermos a força e o prestigio das instituições parlamentares, depurando-as dos seus vicios de origem, identificando-as com a verdadeira representação nacional, arredando de sobre ellas desconfianças que as desacreditem, tornando impossivel a renovação de successos que ao desauctorisem, não será facil restaurar entre nós a normalidade constitucional, e assegurar a fiscalisação salutar e efficaz de que carecem os governos em proveito do paiz.

A legislação eleitoral vigente, inspirada aliás nos mais elevados intuitos, não produziu infelizmente na pratica os resultados que esperavam os seus principaes inspiradores. Precisamente desde que essa legislação vigora é que se repetiram e amiudaram os conflictos no parlamento, e se succederam e multiplicaram os actos dictatoriaes dos governos. Não é por certo fortuita uma tal coincidencia; e, sem entrarmos agora no exame de pormenores, que ao diante separadamente consideraremos, seja-nos licito constatar desde já que, de todos os campos, e nomeadamente do meio d'aquelles que mais alto proclamaram as excellencias da lei eleitoral de 1884, vozes auctorisadas pedem de ha muito, desenganados pela experiencia, uma reforma, que os factos de longe vem mostrando ser na verdade opportuna e necessaria.

O completo descredito das commissões do recenseamento, dando muitas vezes a fraude por base á eleição; a inanidade pratica das candidaturas de accumulação, desatinados, no pensamento do legislador, a consagrar notabilidades nacionaes, o convertidas, na realidade, em mais um instrumento de combinações partidarias, fóra da acção legitima dos proprios eleitores; a deprimente influencia, que, na organisação vigorosa dos partidos, exerceu a representação das minorias, a qual, repercutindo-se mais tarde em conflictos parlamentares, deriva, nos seus inicios, menos do suffragio popular do que de transacções e accordos, que não raro substituiam realmente o proprio acto eleitoral; e, por sobre tudo isto, e acima de tudo isto, o facto capital de ser o nosso parlamento um dos poucos, se não o unico, composto sem sujeição ao principio das incompatibilidades sensata o racionalmente applicado, constituem, a nosso ver, os principaes motivos dos factos politicos que se têem repetido ha annos, e inteiramente legitimam a unanimidade com que os espiritos esclarecidos insistentemente reclamam uma remodelação profunda na nossa legislação eleitoral.

A esta justa aspiração da consciencia publica procurámos corresponder no decreto que sujeitamos á consideração de Vossa Magestade. Não nos inspiramos em propositos egoistas, nem attendemos a considerações facciosos. Tendo em vista os defeitos evidenciados na pratica, as criticas por elles suscitadas, a lição dos paizes mais cultos, o estado dos nossos costumes politicos, e a idyosincrasia do nosso povo, buscámos fazer trabalho serio e util, dando por base á eleição um recenseamento verdadeiro, e transformando o parlamento, na representação legitima e devidamente proporcional dos fundamentaes interesses do paiz, das suas forças vivas, das suas classes productoras, associando assim, de facto e directamente, os elementos primordiaes da nossa vitalidade nacional á marcha dos negocios publicos. Foi o que expozemos a Vossa Magestade e promettemos ao paiz, quando publicámos a primeira providencia extraordinaria resultante da situação politica que nos crearam; á fiel e honrada execução d'esta promessa consagrámos os nossos mais sinceros e diligentes esforços.

Oxalá os resultados praticos da nossa obra correspondam aos intuitos com que a elaborámos, para que possam funccionar com prestigio e utilidade as instituições parlamentares.

I

Um dos pontos a que dedicámos mais solícita attenção foi o que diz respeito á organisação do recenseamento eleitoral. É a base da eleição; falseada ella, tudo o mais vem inquinado de um vicio de origem, que irremediavelmente desacredita a representação nacional. Ora, infelizmente, as commissões de recenseamento tinham caído em completo descredito, a tal ponto que, em muitos concelhos, como é notorio e sabido de todos, quem lograva vencer a eleição das commissões, obtinha, ipso facto, o recenseamento que queria, e, portanto, a vistoria em todas as eleições subsequentes. Era, como bem disse um auctorisado publicista, uma situação verdadeiramente anarchica, a que urgia por termo.

Para este fim procurámos, antes de mais nada, simplificar os elementos de capacidade eleitoral, reduzindo-os aos requisitos de uma quota censitaria ou de saber ler e escrever, alem, é claro, das condições indispensaveis de nacionalidade, idade e domicilio. Não cremos reduzir o eleitorado, eliminando a disposição legal relativa á inscripção dos chefes de familia, que era a porta por onde principalmente entravam a fraude e o abuso. Baixando a quota tributaria, que serve de base ao censo, e conservando o preceito referente aos que sabem ler e escrever, não só compensámos aquella eliminação, mas deixámos assegurada largamente a parte legitima que compete ás classes trabalhadoras na constituição do eleitorado.

O principal fim que tivemos em vista foi, sem restringir o suffragio, nem tão pouco o alargar inconvenientemente, estabelecer as categorias legaes para a inscripções dos eleitores, de maneira a poder demonstrar-se a sua ca-

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pacidade documentalmente, por fórma simples, facil e authentica.

Segundo as nossas leis constitucionaes, a capacidade eleitoral fundava-se no censo, de cuja prova eram sómente dispensados os que fossem habilitados com documentos litterarios. Por diversos diplomas foi regulado o modo de se fazer a respectiva verificação. Com estas bases censiticas estavam, no anno de 1877, recenseados, no continente do reino e ilhas adjacentes, eleitores em numero de 476:120 ou seja cerca de 10 por cento da população, que, no anno immediato, era computada em cerca de 4.700:000 almas. Admittindo a lei de 8 de maio de 1878, mais dois indicadores de capacidade, subio o corpo eleitoral em 1880 ao numero de 844:838 eleitores, e em 1883, ultimo anno de que ha estatistica completa, ao numero de 863:280, ou, aproximadamente, 18 por cento da população. Esta percentagem, que deve ter augmentado de então para cá, não se afasta sensivelmente da do eleitorado allemão com o sufragio universal aos vinte e cinco annos.

A generalisação do suffragio foi uma das consequencias immediatas da lei de 8 de maio de 1878; sendo, porém, variadas as categorias legaes para a inscripção dos eleitores e podendo concorrer em muitos d'elles mais de um titulo de capacidade eleitoral, a verificação d'esta capacidade, que até á data d'aquella lei era quasi exclusivamente referida a documentos officiaes que indicavam a base consitica, tornou-se uma operação sujeita ao arbitrio das commissões de recenseamento, que inscreviam grande numero de eleitores indevidamente, a pretexto de saberem ler e escrever e de serem chefes de familia, deixando porventura de inscrever outros em condições de o deverem ser, e sem que fossem correctivo sufficiente para estes desmandos os recursos para o poder judicial, pela fórma e nas condições em que elles eram permittidos.

Inefficazes se têem mostrado todas as disposições legaes até hoje estabelecidas para obviar a este grave inconveniente, e urge prover de remedio ácerca de um assumpto tão importante para as instituições representativas. Para este effeito duas providencias são indispensaveis: assentar o suffragio n'uma base simples e de facil verificação, o modificar o processo do recenseamento, restringindo as attribuições discricionarias da commissão encarregada de formular este documento, o ampliando as faculdades que para a elaboração d'elle competem actualmente ao poder judicial. A este intento se subordinou, pois, a fixação dos requisitos para a capacidade eleitoral, eliminando-se a categoria dos chefes de familia mas abaixando-se a quota do censo. Segundo os melhores calculos, não se reduzirá assim o eleitorado; mas, tolhe-ne o arbitrio nas entidades recenseadoras, evitando-se as fraudes que d'ella necessariamente derivavam.

Simplificados d'este modo os elementos da capacidade eleitoral, o processo de recenseamento politico deve igualmente simplificar-se, limitando-se quanto possivel a uma estatica, formulada por uma estação official, sobre documentos, que lhe devem ser apresentados, e submettida á fiscalisação da auctoridade publica e dos interessados, perante um poder independente, que haja de corrigir as inexatidões ou irregularidades porventura ainda possiveis. Assim a inscripção pelo censo deve assentar sobre a relação official formulada pelo respectivo escrivão de fazenda, a dos que, sabendo ler e escrever, não estejam já com prehendidos n'aquellas relações, e queiram usar do direito que a lei lhes concede, exclusivamente deve basear-se sobre o requerimento do proprio interessado. Sendo, pois, adstricto a documentos ou informações officiaes de serviço de verificação da capacidade eleitoral, todo o arbitrio havido na inscripção ou na eliminação de um eleitor é facilmente posto a descoberto e, pela irregularidade encontrada, a responsabilidade se poderá impor promptamente a quem ella tocar.

As actuaes commissões de recenseamento, talvez por serem constituidas sob o influxo de paixões partidarias, não têem podido proceder com o desassombro e isenção que é para desejar. Por isso, todos as condemnam, e reclamam a sua substituição em termos que offereçam mais serias e eficazes garantias. Entregar, porem, esto serviço a funccionarios especiaes que durante uma boa parte do anno ficariam inactivos, nem se coaduna com as circumstancias financeiras do momento, nem asseguraria os necessarios requisitos de imparcialidade o independencia, que estes funccionarios dificilmente poderiam ter perante a entidade que os nomeasse e de quem dependessem.

Attribuil-o exclusivamente ás camaras municipaes, ou a subordinados seus, alem de adoecer igualmente d'este ultimo defeito, serviria apenas para dar a estas corporações locaes um caracter politico de que no proprio interesso da administração ellas devem ser isentas.

Constituir uma commissão especial em que estejam representados todos os elementos que melhor possam contribuir para a perfeição do serviço e que, por ser pouco numerosa, mais facilmente possa organisar-se com pessoal habilitado, tal foi o pensamento que nos inspirou. Sendo um dos vogaes nomeado pela camara municipal e outro pela commissão districtal, cuja maioria é electiva, procede indirectamente do suffragio a maioria da commissão do recenseamento; sendo o terceiro vogal escolhido livremente pelo poder judicial, confiando-se-lhe a presidencia da commissão, teve-se em vista contrapor ao espirito de facção, que n'aquellas nomeações podesse ainda reflectir-se, a independencia de um cidadão escolhido pelo representante de um poder, alheio e sobranceiro ás divisões partidarias.

Não foi indifferente ao intuito d'esta organisação o exemplo de nações estranhas, que pelas tradições e affinidades que a ellas nos prendem, melhor deveriam ser consideradas para o estudo d'esta questão. Approximámo-nos da legislação franceza, que entrega as operações do recenseamento a commissões especiaes constituidas pelo presidente do conselho municipal (maire), que é ao mesmo tempo representante do poder central, por um vogal do mesmo conselho, por este designado, e por um delegado do prefeito.

Não tendo, porém, entre nós, na maioria dos concelhos, o presidente da camara o caracter que tem o maire, recorreu-se ao poder judicial para a designação de um dos vogaes da commissão, e confiou-se á commissão districtal, presidida pelo governador civil, a nomeação do vogal, cuja escolha em Erança é do exclusivo arbitrio do perfeito. Não se diga que por esta fórma os juizes terão de manifestar qualquer sympathia partidaria. Não só o poder judicial já tinha uma parto importante, que se amplia agora, na organisação do recenseamento, mas frequentemente se repete que ainda o maior numero é o dos indifferentes, dos que se mantém estranhos aos partidos e ás luctas politicas locaes. Os juizes, como magistrados independentes, escolherão de certo de preferencia entre estes, cuja imparcialidade e desprendimento partidario, serão uma nova garantia da genuinidade dos recenseamentos. Em Lisboa e Porto, onde ha mais varas eiveis do que bairros, será a designação feita pelos presidentes das relações.

As operações do recenseamento attribuidas ás commissões limitam-se á inscripção ou exclusão dos eleitores, em vista do documentos e das informações officiaes, terminando as funcções d'ellas com a authenticação das listas que remunera o resultado dos seus trabalhos. Organisadas em triplicado sobre estas bases as listas dos eleitores, são duas d'estas enviadas ao juiz de direito respectivo. É este quem manda affixar uma d'ellas, ficando a outra patente no cartorio do escrivão ao exame de todos os interessados. Perante o juiz de direito, directamente se interpõem e apresentam as reclamações. Estas modificações julgámol-as importantissimas, já pela maior facilidade e segurança das reclamações, já pelo mais amplo exame dos trabalhos preparatorios da commissão do recenseamento.

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Julgadas pelo juiz as reclamações, para o que póde elle requisitar os documentos que serviram de base á commissão, e pelos tribunaes superiores os recursos ainda interpostos do juiz, o escrivão respectivo organisa as listas definitivas das alterações introduzidas nas elaboradas pela commissão e só então e depois d'isto o secretario d'aquella, em face de umas e outras, procedo á organisação do livro do recenseamento. Finda esta, é enviado o livro ao juiz de direita para o examinar, e rubricar em todas os suas folhas, assignando o termo do encerramento, como já assignára o da abertura, declarando-se n'aquelle o numero de eleitores inscriptos em cada freguezia. Desapparecem d'esta maneira todas as difficuldades que as commissões oppunham quer á acceitação e decisão das reclamações, quer á execução das sentenças dos tribunaes; e a authenticação do livro do recenseamento pelo juiz obstará a muitos viciações, a que até agora estava sujeito. Pelo processo propomos, uma outra vantagem se adquire ainda.

Alem do livro original e da copia, que continuará a existir nos governos civis, um duplicado do recenseamento fica tambem no cartorio do escrivão, que d'elle poderá dar igualmente copias ou certidões a quem as pedir, augmentando-se assim os meios de fiscalisação dos actos eleitoraes.

O recenseamento sómente é renovado de tres em tres annos, periodo normal da duração das legislaturas; nos outros dois, apenas soffre, por addicionamento, as alteraçõea que resultam da revisão effectuada com as formalidades e recursos necessarios. Assim se simplifica em muito o serviço, permittindo, por isso mesmo, uma fiscalisação mais exacta e rigorosa, e se garante á inscripção dos eleitores uma estabilidade que até agora lhe faltava. Como se vê, desde a elaboração inicial do recenseamento até aos ultimos termos das reclamações, simplifica-se o processo, dando-lhe uma base documental, e não de informação como até agora, e concedendo-se garantias sérias a todos os legitimos eleitores. Por esta fórma poderão os recenseamentos ser uma verdade, sem o que o systema representativo fica reduzido a uma ficção.

II

Diminue-se o numero dos deputados, que serão eleitos pelos districtos e por escrutinio de lista.

A reducção no numero de deputados era geralmente reclamada, e a ninguem de certo parecerá inopportuna. O decreto de 18 de março de 1869 já limitára a 107 o numero de deputados, que era de 179 pela lei de 23 de novembro de 1859. Pela lei até agora vigente, os deputados eram 170. Propomos que se reduza a 114 o numero dos deputados pelo continente e pelos ilhas e a 6 os do ultramar, eliminando-se os da accumulação. Relativamente á população legal, apurada pelo censo de 1890, ficará, para o reino e para as ilhas adjacentes, a proporção de 1 deputado por 45:000 habitantes approximadamente, quando a Hespanha tem 1 deputado por 50:000 almas e a Italia 1 por 57:000.

Propomos para a eleição o escrutinio de lista, que não é estranho ás nossas tradições politicas. Até á vigencia da lei de 23 de novembro de 1859, que só permittiu circulos de 1 deputado, o escrutinio de lista dominou com diversos regimens eleitoraes, quer com a eleição indirecta até 1852, quer com a eleição directa, estabelecida pelo primeiro acto addicional, e por igual serviu aos diversos partidos, que com diferentes pensamentos governativos se alternaram ao poder desde a implantação do regimen liberal até ao meiado do corrente seculo.

Já a lei de 11 de julho de 1822, que proscreveu o processo para a eleição da legislatura quo devia começar em 1 de dezembro do mesmo anno, dividiu o continente do reino em 26 circulos ou divisões eleitoraes, cada uma das quaes elegia deputados em numero de 3, 4, 5 ou 9 e, por decreto de 3 de junho de 1884, que accommodou á nova divisão administrativa as circumscripções eleitoraes estabelecidas pelas instrucções de 7 de agosto de 1826, se constituiram os circulos provinciaes, que elegiam os deputados em numero variavel de 4 a 27, segundo a população das provincias. Manteve o decreto de 4 de junho de 1836, referendado por Agostinho José Freire, os circulos provinciaes, e substituiu-os por divisões eleitoraes, com 3, 4, 5, 6 ou 10 deputados, o decreto de 8 de outubro de 1836, referendado por Manuel Passos. Com circulos eleitoraes, elegendo 2, 3, 4, 5, 6, 8 ou 12 deputados, se constituiu o paiz segundo a lei de 9 de abril de 1838; porém, no decreto de 5 de março de 1842, voltou-se aos circulos provinciaes de 2 a 29 deputados, e os circulos provinciaes manteve o decreto de 28 de abril de 1845. O decreto de 27 de julho de 1846, referendado pelo duque de Palmella, que estabelecera circulos de 2, 3, 4, 6, 7,8, e 10 deputados, foi revogado por decreto de 12 de agosto da 1848, que renovou o regimen doa circulos provinciaes com deputados em numero variavel de 2 a 30. O decreto de 30 de setembro de 1852, manteve o escrutinio de lista, em circulos de 2, 3, 4, 6 e 7 deputados.

Agora propomos o escrutinio de lista por districto, desde o minimo de 2 deputados, como por exemplo para Angra, para a Horta, até ao maximo de 14 para Lisboa, tendo por base a população. Preferimos adoptar a divisão, já administrativamente consagrada, dos districtos, a fixar qualquer outra mais ou menos arbitraria, e que alguem podesse suspeitar inspirada por quaesquer interesses ou propositos de facção. Se, de futuro, o parlamento entender que deve modificar a circumscripção eleitoral, elle o fará na sua alta sabedoria; o governo, forçado pelas circumstancias a decretar esta providencia, julgou do seu dever não entrar n'esse caminho, adoptando a eleição por districtos, como de resto se fez em França com os departamentos.

O exemplo da França é, com effeito, muito instructivo n'esta questão do escrutinio de lista. No anno III, em 1815, em 1817, em 1820, em 1830, em 1848, em 1871 e em 1885, esta fórma de eleição foi adoptada n'aquelle paiz e, circumstancia digna de mencionar-se, dos varios regimens que, durante este seculo, têem dominado em França, um unico, o do terceiro imperio, deixou de ter, pelo menos durante algum tempo, o escrutinio de luta. Adoptou-o a republica de 1848; aboliu-o o golpe de estado em 1852; restaurou-o a assembléa nacional em 1871. E um dos seus mais eloquentes apostolos e mais ardentes defensores, o grande e mallogrado tribuno Gambetta, pôde, com verdade, dizer, n'um discurso memoravel, que "em todas as epochas e a qualquer partido que pertencessem, os grandes parlamentares consideraram sempre o escrutinio de lista como sendo, a um tempo, a mais alta expressão da vontade nacional e a mais ampla garantia das minorias legitimas".

Vimos, durante quantos annos vigorou entre nós o escrutinio de lista; não foram aquelles em que brilhou com menos esplendor a tribuna parlamentar, nem a fiscalisação, opposicionista foi então menos activa o efficaz. Desde 1859, porém, até 1884, tivemos o regimen puro dos circulos uninominaes. A opposição chegou a estar reduzida, por vezes, a quatro ou cinco deputados; n'uma occasião nem o chefe do partido opposicionista logrou ir á camara. Foi exactamente na legislatura em que se fez o accordo politico de que resultou a lei eleitoral de 1884, na qual se adoptou um systema mixto de circulos uninominaes e plurinominaes com representação das minorias.

Os resultados praticos d'esta lei já oa apresentámos resumidamente. Não corresponderam á espectativa geral.

Desiludiram as esperanças dos seus proprios auctores.

Ainda no anno passado, n'uma importante reunião politica na segunda cidade do reino, uma palavra auctorisada, e n'este ponto particularmente insuspeita, proclamou bem

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alto a necessidade de se voltar ao regimen eleitoral da lei de 1859. Reconhecendo a exactidão e a procedencia das criticas em que se fundamentava esta condemnação do systema eleitoral vigente, o governo julga preferivel estabelecer o escrutinio de lista, a voltar aos circulos pequenos, uninominaes, que, exacerbando as luctas politicas, dando-lhes um caracter irritante, não só de rivalidade local, mas até de pugna directa e pessoal, encerram a acção e a escolha dos eleitores dentro de limites tão acanhados, que mal se compadecem com a comprehensão geral e superior dos verdadeiros interesses do paiz.

Nos circulos pequenos a pressão das auctoridades póde exercer-se muito mais efficazmente, e por isso foi n'elles que, durante largos annos, floresceu a famosa candidatura official do terceiro imperio francez. Entre nós, todos recordam a que exiguo numero de representantes se viu reduzida a opposição na camara electiva, sem distincção de partidos, durante os ultimos annos da existencia exclusiva aos circulos uninominaes. Ao contrario, as grandes correntes de opinião só podem traduzir-se no escrutinio de lista, e, por isso, se tem visto, em França, serem os partidos da opposição, como ainda ha pouco ali fez o chefe do partido radical, os que propõem este systema eleitoral, esperançados em obter assim a victoria, que não podem arrancar das restrictas e limitadas influencias locaes. A chamada politica de campanario tem a sua legitimidade e corresponde a interesses respeitaveis; convem, todavia, que se exerça na escolha das corporações locaes, que a esses interesses têem particularmente de attender. Para os problemas superiores da vida e da economia da nação, é sem duvida preferivel que eleitores se inspirem todos n'um criterio mais elevado e mais geral.

Não se inutilisam assim as influencias locaes; mas não se dá a cada uma d'ellas em separado uma preponderancia exclusiva, que póde ser nociva para o resultado geral que se procura obter. Da conjuncção harmonica de todas essas forças, que constituem os elementos essenciaes da vitalidade nacional, é que, pelo escrutinio de lista, se obtem a expressão mais generica e mais consentanea com o caracter que deve revestir uma assembléa parlamentar. A logica rigorosa consistiria até, como bem observou um eminente estadista francez, em descobrir e pôr em execução um processo que désse a cada cidadão o direito de intervir na escolha de todos os mandatarios do paiz, pois que, segundo a expressão da constituição de 1791, em França, reproduzida no nosso ultimo acto addicional, os deputados são representantes, não de um circulo, mas da nação. Sendo, porém, irrealisavel na pratica o ideal da unidade do collegio eleitoral, o escrutinio de lista é o que mais se approxima do pensamento que se procurou traduzir na nossa ultima reforma constitucional.

Evidentemente, os programmas definidos e os partidos organisados são, a um tempo, uma necessidade e uma consequencia d'este regimen; mas são tambem, em nosso entender, uma necessidade e uma consequencia, não só da nossa actual situação politica, como da propria essencia do systema representativo. No entretanto, uma individualidade proeminente, que se imponha á consideração do paiz e ao respeito da opinião, obterá sempre muito mais facilmente um logar no parlamento pelo escrutinio de lista do que pelos limitados circulos uninominaes, em que a victoria depende quasi sempre muito menos do prestigio do eleito, do que da omnipotencia de qualquer grande eleitor. A eleição por escrutinio de lista tem um caracter essencialmente politico, de politica geral, no mais amplo e elevado sentido da palavra. Afigura-se-nos singularmente azado para uma demonstração d'essa ordem o actual momento. A todos convem, e por todos os motivos, que o paiz se manifeste não sobre os meritos e defeitos d'este ou d'aquelle candidato, mais ou menos sympathico a esta ou áquella localidade, mas sobre a marcha que mais convem seguir na gerencia dos negocios do estado,

Não consignámos, no projecto de decreto, o principio da representação das minorias, que, aliás, nunca se adoptou entre nós quando, durante largos annos, vigorou o escrutinio de lista, como tão pouco foi jamais applicado em França em identicas circumstancias. Os effeitos da generosa tentativa da lei de 1884 não são de molde para nos convencer a abandonar o systema anterior por tantos annos seguido. Os simulacros de eleição substituindo não raro o acto eleitoral, e lamentaveis factos occorridos no parlamento não constituem, francamente, incentivo para se proseguir n'um regimen que deu taes resultados. Queriam auctoridades insuspeitas substituil-o pelos circulos uninominaes da lei de 1859. Pela nossa parte, reputamos mais conveniente renovar o escrutinio de lista, com que se iniciou, entre nós, o regimen parlamentar moderno, e que é, a um tempo, mais liberal, mais disciplinador dos partidos, mais harmonico com a indole que deve ter o parlamento, e mais conforme com as exigencias da presente conjunctura politica.

III

Entendemos dever incluir na legislação eleitoral disposições referentes não só á inelegibilidade absoluta, mas, tambem á inelegibilidade relativa de certos cidadãos para o logar de deputado; e ainda ás incompatibilidades entre o exercicio de determinados empregos e fracções com o desempenho do mesmo logar. Consigna-se tambem no decreto a prohibição aos deputados, não só durante a legislatura, mas seis mezes depois d'ella terminada, de acceitar qualquer cargo ou commissão retribuida pelo estado.

A inelegibilidade absoluta applica-se, entre outras categorias, aos que ao tempo da eleição servirem em logares de administração ou fiscalisação de emprezas ou sociedades, industriaes ou mercantis, constituidas por contrato ou concessão especial do estado, ou que d'elle tenham recebido privilegios, subsidios ou garantias especiaes; aos que ao tempo da eleição forem concessionarios, empreiteiros ou arrematantes de obras publicas; aos empregados da casa real que estiverem em effectivo serviço ao tempo da eleição; aos empregados das repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos ou bairros, aos directores das alfandegas, e aos chefes das suas delegações ou postos de despacho; aos auditores administrativos e aos secretarios geraes dos governos civis; aos empregados das provincias ultramarinas, do corpo diplomatico e consular e dos serviços das camaras legislativas. São obvios os motivos d'estas disposições, quer pela natureza especial dos empregos que comprehendem, quer pela superior conveniencia de afastar radicalmente do parlamento os que se achem associados a emprezas, cujos interesses, dependendo do governo, possam collidir com os do estado. Pareceu-nos que não eram estas apenas, como até aqui, condições de incompatibilidade, mas sim de inelegibilidade absoluta. N'este sentido, e no de as precisar e ampliar, alterámos a legislação vigente.

Alargaram-se tambem muito as inelegibilidades relativas, declarando-se que não podem ser votados, na area da circumscripção territorial onde exercem as suas funcções, todos os magistrados administrativos, judiciaes e do ministerio publico, as auctoridades militares, os empregados administrativos de nomeação do governo, dos governadores civis ou dos corpos administrativos, os funccionarios fiscaes, policiaes e de justiça, os empregados dos serviços technicos do ministerio das obras publicas, para que d'esta maneira nem soffram os serviços, que a estes funccionarios estão entregues, pela influencia de ambições politicas, nem possam usar esses funccionarios, em proveito proprio, de uma acção que á maior parte d'elles já é vedada por preceito penal, pois que não podem angariar votos, distribuir proclamações ou influir, mesmo sem violencia, no animo dos eleitores.

Esta inelegibilidade subsisto durante ainda seis mezes depois que o empregado abandonou por qualquer motivo

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a sua circumscripção, o que não é mais do que a ampliação, já estabelecida, da inelegibilidade prevista pela lei de 28 de novembro de 1859 para os cargos de confiança politica de que se é exonerado a pedido do proprio interessado.

Alem do que fica exposto o projecto estabeleça o principio absoluto de que o exercicio do logar de deputado é incompativel: 1.º, com o exercicio do logar de juiz de director da 1.ª instancia; 2.º, co a effectividade de serviço dos officiaes do exercito ou da armada, excepto os officiaes generaes; 3.°, com o exercicio do logar de secretario geral, administrador ou director geral, ou director de serviços de qualquer ministerio; 4.°, com o logar de chefe da repartição da contabilidade nos diversos ministerios, ou chefes de repartição e de secção, independentes das direcções; 5.°, com os logares de governador civil e de administrador do concelho ou bairro; 6.°, com os logares de procurador regio perante as relações, seus ajudantes, delegados e sub-delegados e com o logar de juiz municipal.

Os magistrados, officiaes e empregados a que se referem as incompatibilidades dos n.os 1.°, 2.°, 3.° e 4°, pelo facto de prestarem juramento como deputados, deixam de exercer os seus cargos durante a legislatura, não percebendo, no mesmo periodo, ordenado, soldo ou vencimento algum, salvo o subsidio de deputado, se houver sido restabelecido, mas contando-se-lhes o tempo da legislatura como tempo de serviço para todos os effeitos, excepto para o dos tirocinios militares. O presidente da camara, logo que prestem juramento os deputados a que se refere esta disposição, participava o facto aos ministerios competentes, e os chefes das repartições de contabilidade serão responsaveis por qualquer abono que auctorisem em favor dos mesmos deputados.

Assim, pois, nem os juizes de direito de 1.ª instancia, nem os directores geraes das secretarias, nem os officiaes do exercito ou da armada, salvo os generaes, poderão accumular o exercicio do cargo de deputado com os das suas respectivas funcções. Desde que prestam juramento, deixam de fazer serviço activo, e de receber qualquer vencimento como funccionarios do estado até terminar a legislatura. Finda ella, tanto os magistrados como os militares esperarão cabimento para voltarem aos quadros da actividades.

E todos estes funccionarios, tanto civis como militares, e mais todos aquelles cujas funcções não são no seu exercicio incompativeis com o do logar de deputado, e ainda todos os empregados dos corpos administrativos e os de corporações ou estabelecimentos administrativos subsidiados pelo estado, eleitos para o cargo de deputado, não poderão funccionar na camara em numero superior a quarenta.

Se os deputados, n'estas condições, forem mais de quarenta, serão sorteados na camara; os que excederem o numero, ou optam pelo logar de deputado e perdem definitivamente os seus empregos, ou, no caso contrario, repete-se a eleição, não podendo ser eleito pela respectiva circumscripção nenhum funccionario publico.

Com esta disposição, e a que dá vinte togares para os medicos e advogados, como taes collectados, a fim de evitar o defeito de que tanto se queixam em França, em que estas classes pela exclusão do funccionalismo, preponderam excessivamente na camara, estabelece-se a representação proporcional das diversas forças sociaes, sem recorrer ás eleições de classe, tão difficeis de praticar com vantagem. Restricto o numero de deputados a 120, pouco superior, como vimos, ao fixado em 1869, o não inferior ao de outros paizes em referencia á sua riqueza e população, garante-se pelo menos metade da representação ás classes productoras, na proporção para cada uma d'ellas, que o suffragio e a vontade dos eleitores lhes distribuir, fórma a mais racional e exequivel d'essa distribuição.

Não se excluem por completo os funccionarios publicos, não só porque esse principio absoluto em raros paizes é adoptado, mas porque representaria entre nós uma transição demasiado brusca, tanto mais que, segundo as nossas leis constitucionaes, considera-se como um titulo de capacidade eleitoral um emprego inamovivel com uma renda liquida de 400$000 réis. Reduzido, porém, o numero dos funccionarios publicos que podem ser deputados a um maximo de 40, isto é, um terço do numero total, corrige-se salutarmente a anomalia que por exemplo, se dava na camara actual, em que 115 nobre 170 deputados são funccionarios publicos, quer dizer, não só a maioria em relação a todas as outras classes, mas até mais de dois terços.

E, em algumas camaras anteriores, a percentagem ainda era maior.

Sem exageros, que são sempre contraproducentes na pratica, mas sem complacencias com abusos inveterados, suppõe o governo ter fixado preceitos rascaveis para dar á camara electiva o caracter adequado a uma representação exacta do paiz, a uma imagem fiel, um transumpto verdadeiro dos elementos essenciaes da vida nacional, cumprindo assim um dos pontos fundamentaes do seu programra, e attendendo a uma das mais instantes necessidades publicas.

Na nossa opinião, a camara electiva, com a constituição que pretendemos dar-lhe, não póde nem deve deixar de fixar um subsidio para os deputados. Não o fazemos desde já, n'este diploma, porque essa providencia só mais tarde póde produzir effeitos praticos, e convem, portanto, sujeital-a á previa approvação das camaras; mas, sem hesitação, nos compromettemos a apresentar ás côrtes a respectiva proposta de lei. Nem a gratuitidade das funcções de deputado é um principio democratico, nem um tal regimen é rasoavelmente conciliavel com a applicação tão reclamada das incompatibilidades parlamentares.

IV

Ao tribunal de verificação de poderes se entrega o julgamento de todas as eleições. Permittem-se os inqueritos, fixando-se, todavia, disposições e prasos, de fórma que as eleições estejam todas julgadas quando se abrirem as camaras. Assim, não só se afastam os processos eleitoraes dos debates politicos, generalisando-se um dos preceitos mais uteis e salutares da lei de 1884, mas ainda se abrevia o periodo da constituição da camara electiva com vantagem para a apreciação dos negocios publicos.

Pelo que respeita ao processo da eleição e apuramento, codificaram-se as disposições existentes com as alterações apenas que a pratica tem aconselhado para acautelar melhor a boa ordem e a genuidade das operações. Na parte penal poucas são tambem as innovações. Correcoionalisaram-se as penas e harmonisaram-se com a legislação em vigor.

Julgâmos, Senhor, que todas estas disposições são uteis e opportunas, bem como confiamos que da sua fiel e leal execução resultará restaurar-se, com o prestigio e a auctoridade de que carece, o regimen parlamentar entre nós, assegurando assim, como é mister, o regular funccionamento das instituições representativas. Por isso submette-mos confiadamente á approvação de Vossa Magestade o seguinte projecto de decreto.

Paço, em 28 de março de 1895. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = João ferreira Franco Pinto Castello Branco = Antonio de Azevedo Castello Branco = Luiz Augusto Pimentel Pinto = José Bento Ferreira de Almeida = Carlos Lobo d'Avila = Arthur Alberto de Campos Henriques.

Attendendo ao que me representaram os ministros e secretarios d'estado de todas as repartições: hei por bem decretar o seguinte:

CAPITULO I

Dos eleitores

Artigo 1.° São eleitores para cargos politicos e adminis-

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rativos todos os cidadãos portuguezes, maiores de vinte e um annos e domiciliados em territorio nacional, em quem concorram alguma das seguintes circunstancias:

1.º Ser collectado em uma ou mais contribuições directas do estado por quantia não inferior a 500 réis;

2.° Saber ler e escrever.

Art. 2.º Não podem ser eleitores:

1.º Os interdictos, por sentença, da administração de sua pessoa ou de seus bens e os fallidos não rehabilitados;

2.º Os indiciados por despacho de pronuncia com transito em julgado e os incapazes de eleger para funcções publicas, por effeito de sentença penal condemnatoria;

3.° Os condemnados por vadios ou por delicto equiparado, durante os cinco annos immediatos á condemnação;

4.° Os indigentes ou que não tiverem meios de vida conhecidos; e os que se entregarem á mendicidade ou que para a sua subsistencia receberem algum subsidio da beneficencia publica ou particular;

5.º Os creados de servir, nos quaes se não comprehendem os guarda livros e caixeiros das casas de commercio, os orçados da casa real, que não forem de galão branco, e os administradores de fazendas ruraes e fabricas;

6.° As praças de pret do exercito e da armada, e os assalariados dos estabelecimentos fabris do estado.

CAPITULO II

Dos deputados

Art. 3.° Todos os que têem capacidade para serem eleitores são habeis para serem eleitos deputados, sem condição de domicilio ou residencia.

Art. 4.° São absolutamente inelegiveis para o logar de deputado:

1.° Os estrangeiros naturalisados;

2.° Os membros vitalicios da camara dos pares;

3.° Os que, nos termos do artigo 7.° do primeiro acto addicional á carta constitucional, não forem habilitados com um curso de instrucção superior, secundaria, especial ou profissional ou que não tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, provenientes de bens de raiz, capitaes, commercio, industria ou emprego inamovivel;

4.° Os que ao tempo da eleição servirem logares nos conselhos administrativos, gerentes ou fiscaes de emprezas ou sociedades, industriaes ou mercantis, constituidas por contrato ou concessão especial do estado, ou a que por este haja sido outorgado privilegio, subsidio ou garantia de rendimento, salvo os que por delegação do governo representarem n'ellas os interesses do estado;

5.° Os que ao tempo da eleição forem concessionarios, arrematantes ou empreiteiros de obras publicas;

6.° Os empregados da casa real que estiverem em effectivo serviço ao tempo da eleição;

7.° Os auditores administrativos e dos governos civis;

8.° Os empregados das repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos ou bairros; os directores das alfandegas, e os chefes das suas delegações ou postos de despacho;

9.° Os empregados das provincias ultramarinas, os do corpo diplomatico ou consular e os dos serviços das camaras legislativas.

Art. 5.º São respectivamente inelegiveis e não podem ser votados para deputados nas divisões territoriaes, a que respeitar o exercicio das suas funcções:

1.° Os magistrados administrativos, judiciaes e do ministerio publico;

2.° As auctoridades militares;

3.° Os empregados administrativos nomeados pelo governo, pelos governadores civis e pelos corpos administrativos, e os membros electivos das commissões districtaes;

4.° Os funccionarios fiscaes, policiaes ou de justiça;

5.° Os empregados dos serviços technicos dependentes do ministerio das obras publicas.

§ 1.° A inelegibilidade prevista n'este artigo subsiste ainda durante seis mezes, depois que, por qualquer motivo, o funccionario deixou de servir o cargo na sua circumscripção.

§ 2.° A mesma inelegibilidade abrange os substitutos e interinos, que exerçam o cargo em todo ou em parte do tempo decorrido desde a publicação do diploma, que designar o dia da eleição, até á conclusão das operações eleitoraes.

§ 3.° A inelegibilidade prevista n'este artigo não affecta os funccionarios cuja jurisdicção abrange todo o continente do reino e ilhas adjacentes ou tambem as provincias ultramarinas.

Art. 6.° São inelegiveis pelos circulos das provincias ultramarinas os cidadãos designados nos artigos 8.° e 9.°

Art. 7.° O exercicio do cargo de deputado è incompativel:

1.° Com o exercicio do logar do juiz de direito de 1.ª instancia;

2.° Com a effectividade ou qualquer commissão de serviço dos officiaes do exercito ou da armada, excepto os officiaes generaes;

3.° Com o exercicio do logar de secretario geral, director ou administrador geral, ou director de serviços de qualquer ministerio;

4.° Com o exercicio do logar do chefe de repartição de contabilidade dos ministerios ou de chefe de repartição ou secção, independentes das direcções, nos mesmos ministerios;

5.° Com os logares de governador civil e de administrador de concelho ou bairro;

6.° Com os logares de procurador regio perante as relações, seus ajudantes, delegados e sub-delegados e com o logar de juiz municipal.

§ 1.° Os magistrados, officiaes e empregados a que se referem as incompatibilidades dos n.os 1.°, 2.°, 3.° e 4.°, pelo facto de prestarem juramento como deputados, deixam de exercer os seus cargos durante a legislatura, não percebendo, no mesmo periodo, ordenado, soldo de patente, ou vencimento algum, salvo o subsidio de deputado, se houver sido restabelecido, contando-se-lhes como tempo de serviço para todos os effeitos, excepto o de tirocinios para promoção aos officiaes do exercito e da armada, o tempo da legislatura e o mais que decorrer até serem collocados na effectividade de serviço ou nas commissões legaes respectivas.

§ 2." Os funccionarios mencionados nos n.os 5.° e 6.°, logo que prestem juramento como deputados, deixam vago o cargo que estavam exercendo.

§ 3.° O presidente da camara, logo que prestem juramento os deputados a que se refere o presente artigo, participará o facto aos ministerios competentes e os chefes das repartições de contabilidade serão responsaveis por qualquer abono que auctorisem em favor dos mesmos deputados e que lhes não seja devido em virtude das disposições d'este artigo.

Art. 8.° Os magistrados e funccionarios do estado, tanto civis como militares ou ecclesiasticos, os empregados dos corpos administrativos e os de corporações ou estabelecimentos administrativos subsidiados pelo estado, eleitos para o logar de deputado, não poderão funccionar na camara em numero superior a quarenta; os ministros distado não serão comprehendidos n'este numero, durante a legislatura para que forem eleitos, ainda mesmo depois de exonerados, e não lhes são n'essa legislatura applicaveis as disposições do artigo 7.°

Art. 9.° Os medicos e advogados eleitos para o logar de deputado não poderão funccionar na camara em numero superior a vinte, no qual se não comprehendem os que forem ministros d'estado ao tempo da eleição, por todo

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o periodo da legislatura, ainda mesmo depois de exonerados.

§ unico. Os medicos e advogados, que com a sua prosusão exerçam simultaneamente funcção ou emprego mencionado no artigo antecedente, serão computados no numero fixado pelo presente artigo.

Art. 10.° Para os effeitos dos artigos 7.°, 8.° e 9.º os governadores civis dos districtos, depois da proclamação dos deputados na assembléa do apuramento, participarão ao governo os empregou ou profissões dos mesmos deputados, instruindo as participações relativas aos medicos e advogados com as certidões que podérem obter e por onde se mostre que nos ultimos dois annos foram collectados em contribuição industrial pelo exercicio d'estas profissões.

§ unico. As informações mencionadas n'este artigo, conjunctamente com outras que o governo possuir, serão por este communicadas á camara dos deputados.

Art. 11.° Julgados definitivamente todos os processos eleitoraes do continente do reino e dos ilhas adjacentes, e independentemente das eleições supplementares a que por virtude do julgamento haja de proceder se, a mesa provisoria da camara organisará uma relação de todos os deputados na situação prevista pelo artigo 8.°, e outra de todos os mencionados no artigo 9.°, publicando-as na folha official e, dentro de tres dias desde a publicação, poderão os deputados reclamar contra qualquer indevida inscripção ou omissão nas mesmas listas ou contra a elegibilidade de algum dos deputados eleitos n'ellas comprehendidos, sendo as reclamações decididas pela junta preparatoria em igual praso.

§ 1.° Quando os deputados a que respeitem as mesmas listas excederem o numero respectivamente fixado nos artigos 8.° e 9.°, a mesa, em sessão publica da junta preparatoria, procederá a sorteio dos deputados de cada lista para designação dos que até ao numero legal poderão funccionar, e serão annulladas pela junta ou pela camara depois de constituida, as eleições dos deputados não sorteados, excedentes ao mesmo numero, excepto se forem empregados e dentro de oito dias desde a data da sorteio renunciarem ao seu emprego.

§ 2.° Tomará assento na camara o funccionario civil,, militar ou ecclesiastico, o medico ou advogado, que for eleito em eleição supplementar, quando não esteja preenchido o numero respectivamente fixado pelos artigos 8.° e 9.°. alias será pela camará annullada a sua eleição, salvo o disposto na parte final do paragrapho antecedente.

Art. 12.° Perde o logar de deputado:

1.° O que acceitar ao governo titulo, graça ou condecoração, que lhe não pertença por lei;

2.º O que tomar assenta na camara dos pares;

3.° O que perder a qualidade de cidadão portugues;

4.º O que por sentença com transito em julgado incorrer em interdicção ou incapacidade prevista no n.° 1.° e na ultima parte do n.º 2.° do artigo 2.°;

5.° O que acceitar emprego, commissão, serviço ou situação, que o torne absolutamente inelegivel para o logar de deputado;

6.º O que não comparecer a tomar assento na camara na primeira sessão da respectiva legislatura;

7.° O que abandonar o logar, nos termos do artigo 104.º

§ 1.º Todos os deputados que perderem os seus logares, em virtude da disposição do n.° 1.º sómente poderão ser reeleitos passados seis mezes.

§ 2.° Sómente á camara dos deputados compete declarar a perda de logar, em que incorrer algum dos seus membros, fundando-se, salvo nos casos dos n.os 6.° e 7.°, em documento authentico comprovativo do facto que a motivar.

Art. 13.º Nenhum deputado, depois do proclamado na assembléa de apuramento, póde ser nomeado pelo governo, corpos administrativos e corporações ou estabelecimentos administrativos subsidiados pelo estado, durante o tempo da legislatura e ainda durante seis mezes depois que esta findar, para cargo, posto retribuido ou commissão subsidiada, a que não tenha direito por lei, regulamento, escala, antiguidade ou concurso.

§ unico. Exceptuam-se os cargos de ministro d'estado e de conselheiro d'estado, cuja acceitação não importa a perda do logar de deputado e cujo exercicio não é incompativel com este logar, e bem assim as commissões aucturisadas pela camara, sem prejuizo do logar de deputado, nos casos previstos no artigo 33.º da carta constitucional.

CAPITULO III

Do recenseamento eleitoral

Art. 14.° O direito de votar é verificado em cada concelho ou bairro pelo recenseamento eleitoral, no qual se apurará tambem a elegibilidade absoluta para cargos administrativos.

Art. 15.° O recenseamento eleitoral é organisado de tres em tres annos, sendo nos outros sujeito apenas a revisão.

Art. 16.º A idade para a inscripção no recenseamento eleitoral devera completar-se até ao dia 30 de junho do anno em que o recenseamento for organisado ou revisto.

Art. l7.° Os eleitores deverão ser recenseados no concelho ou bairro onde residirem a maior parte do anno; os empregados publicos n'aquelle onde exercerem as suas funcções na epocha do recenseamento e os militares n'aquelle em que na mesma epocha estiver o seu quartel de habitação.

§ unico. O eleitor que em concelho ou bairro differente d'aquelle; onde estiver residindo, for collectado em alguma das contribuições do estado, predial ou industrial, poderá ser inscripto no recenseamento d'esse concelho ou bairro se assim o requerer ás commissões de recenseamento de um e de outro, instruindo o seu requerimento com documento comprovativo da collecta que tiver pago.

Art. 18.º As operações de recenseamento serão iniciadas em cada concelho ou bairro por uma commissão composta de tres vogaes, sendo um nomeado pela commissão districtal de entre os cidadãos domiciliados no concelho ou bairro, elegiveis para cargos administrativos; outro escolhido pela camara municipal de entre os seus membros effectivos ou substitutos; e o terceiro, que será o presidente, officiosamente nomeado pelo juiz de direito da comarca a que pertencer o concelho ou a sua séde, devendo a nomeação ser feita para os commissões dos bairros de Lisboa e Porto pelos presidentes das relações, e para os outros concelhos das comarcas de Lisboa e Porto pelos juizes das respectivas varas civeis, recaindo sempre a nomeação em cidadão domiciliado no concelho ou bairro, elegivel para corgos administrativos.

§ 1.° Pela mesma fórma serão nomeados os substitutos que na falta ou impedimento do respectivo vogal, effectivo serão chamados a fazer as suas vezes.

§ 2.º As nomeações serão feitas annualmente e logo communicadas aos nomeados e ao administrador do concelho ou bairro.

§ 3.° A falta de nomeação pela commissão districtal será supprida pelo governador civil, a de nomeação pela camara será supprida pela commissão districtal e a do juiz ide direito pelo presidente da relação, a quem o governador civil, segundo participação do administrador do concelho, communicará a falta.

§ 4.° O corgo do vogal da commissão é gratuito e obrigatorio.

Art. 19.° O secretario da camara municipal será o da commissão do recenseamento eleitoral do concelho, e o secretario da administração do bairro será o da commissão do mesmo bairro, sendo um e outro coadjuvados em todo o expediente da commissão pelos empregados da secretaria da camara ou da respectiva administração, que a com-

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missão requisitar, e vencendo os secretarios e seus auxiliares a gratificação que a camara lhes arbitrar, sobre proposta da commissão, dentro da verba orçada para esse fim.

§ unico. São despezas obrigatorias da camara municipal todas as que se fizerem com o expediente do recenseamento eleitoral e das eleições, comprehendendo urnas, cofres e mais objectos indispensaveis.

Art. 20.° As commissões de recenseamento funccionam nos paços do concelho ou nas casas da administração dos bairros, devendo a camara fornecer-lhes outras casas quando nos alludidos edificios não possam reunir-se.

Art. 21.° As commissões reunem-se diariamente ás horas que designarem no dia da sua installação, as quaes serão immediatamente publicadas, bem como o local das reuniões, por meio de annuncios.

Art. 22.° Sómente serão validas as deliberações da commissão tomadas por dois votos conformes.

Art. 23.° O administrador do concelho ou bairro assiste ás sessões da commissão e sobre os assumptos sujeitos a deliberação d'ella poderá emittir parecer.

Art. 24.° A commissão não poderá inscrever ou eliminar o nome do nenhum eleitor nem alterar aã circunstancias que a elle respeitem senão por deliberação fundada em documento ou em informação que requisitar do quaesquer estações officiaes.

§ 1.° As exclusões com fundamento nas disposições dos n.º 3.°, 4.°, 5.º e 6.° do artigo 2.° poderão ter por base os esclarecimentos que as auctoridades, funccionarios ou quaesquer pessoas prestem á commissão.

§ 2.° A commissão deverá convocar os parochos e regedores para prestarem informações, que serão reduzidas a termo lavrado pelo secretario e por elles assignado

Art. 25.° A organisação do recenseamento terá exclusivamente por base os seguintes documentos, que até ao decimo dia anterior á data da installação da commissão devem ser enviados ao seu secretario:

1.° Relações por freguezias, organisadas pelo escrivão de fazenda do concelho ou bairro, contendo os nomes de todos os contribuintes que no anno immediatamente anterior foram collectados, nos termos do artigo 1.°, em contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros;

2.° Documentos apresentados pelos interessados provando que, no anno immediatamente anterior e nos termos do artigo 1.°, foram collectados n'outro concelho ou bairro em contribuição designada no numero antecedente, ou foram obrigados ao pagamento de qualquer outra contribuição directa do estado, considerando-se como directas as contribuições assim designadas no orçamento geral do estado;

3.° Requerimentos dos interessados pedindo a propria inscripção no recenseamento, pelo fundamento de saber ler e escrever, quando sejam por elles escriptos e assignados, e reconhecidos por tabellião, nos termos prescriptos no § unico do artigo 2436.° do codigo civil, bastando porém a authentificação pelos chefes dos serviços de que dependam os requerentes, quando estes sejam serventuarios do estado ou dos corpos administrativos;

4.° Uma relação de todos os individuos que no anno anterior incorreram nas incapacidades previstas nos n.os 2.° e 3.° do artigo 2.°, organisada, segundo o ultimo domicilio que constar, pelos encarregados do registo criminal junto dos tribunaes de 1.ª e 2.ª instancia;

5.° Requerimentos de transferencia de domicilio, em conformidade do disposto no § unico de artigo 17.°

§ 1.° A contribuição directa paga por uma sociedade, companhia ou empreza, será attendida para o recenseamento dos socios ou accionistas, em proporção do interesse que cada um provar, por documento authentico, ter na mesma sociedade, companhia ou empreza. A mesma disposição se observará achando-se o casal indiviso, por viverem em commum os membros da mesma familia.

§ 2.° O secretario da commissão, por editaes afixados com quinze dias de antecedencia, tornará publico o praso em que são recebidos os documentos e requerimentos a que se referem os n.os 2.° e 3.°

§ 3.° Todos os documentos a que se refere este artigo serão pelo secretario da commissão classificados e reunidos por freguezias para servirem de base ás operações do recenseamento.

Art. 26.° A commissão, examinando todos os documentos a que se referem os artigos antecedentes, deliberará, ouvido o parocho e regedor respectivo, nos termos do § 2.° do artigo 24.°, sobre a inscripção dos eleitores e sobre a sua elegibilidade para cargos administrativos, e, segundo as resoluções tomadas, o secretario, sob sua responsabilidade, organisará por freguezias uma lista em triplicado de todos os eleitores inscriptos, por elle datada e aasignada, e rubricada pelos membros dá commissão, podendo tambem rubrical-a o administrador do concelho ou bairro.

§ 1.° Quando algum dos contribuintes comprehendidos nas relações do escrivão de fazenda não. deva ser recenseado, nas mesmas relações ou em folha addicional, a commissão lançará nota, declarando o motivo da exclusão, a qual será rubricada pelo parocho ou pelo regedor, se for fundada em informação de um ou de outro.

§ 2.° A commissão poderá mandar avisar qualquer cidadão que haja requerido a sua inscripção por saber ler e escrever, a fim de perante ella formular de novo o seu requerimento, que ficará sem effeito não comparecendo no praso de tres dias.

§ 3.° A lista deverá declarar a respeito de cada eleitor o seu nome, idade, estado, profissão e morada, o fundamento da sua inscripção, nos termos dos n.os 1.° e 2.° do artigo 1.°, mencionando-se no caso do n.° 1.° a collecta respectiva, e se é elegivel para cargos administrativos.

Art. 27.° Dois exemplares das listas de que trata o artigo anterior serão pelo secretario enviados ao juizo de direito da comarca e distribuidos na classe dos recursos eleitoraes, autuando-se o officio de remessa.

§ 1.° O juiz pelos officiaes de diligencias ou por agentes administrativos, que requisitar, fará affixar um exemplar das listas, nas igrejas das freguezias a que respeitarem, e expor a exame e reclamação outro exemplar pelo praso do quinze dias, no tribunal ou no cartorio do escrivão, o que se tornará publico por editaes affixados no concelho ou bairro respectivo, juntando-se ao processo as listas, findo o praso da reclamação, e certidões da affixação d'ellas e dos editaes.

§ 2.° O secretario da commissão exporá tambem a exame, na casa das sessões da commissões, os exemplares das listas em seu poder, fazendo-o constar por editaes, de cuja affixação remetterá certidão para juizo, onde se juntará ao processo do recenseamento.

§ 3.° Das listas affixadas nas igrejas e patentes á reclamação, poderá qualquer pessoa tirar copias e fazel-as conferir e authenticar por official publico, mediante emolumento na rasão de 1 real por cada nome conferido.

Art. 28.° Contra a indevida ou inexacta inscripção de qualquer eleitor, poderá reclamar perante o juiz de direito o proprio interessado, qualquer cidadão do circulo, recenseado como eleitor no anno antecedente, o administrador do concelho ou bairro e qualquer dos vogaes da commissão de recenseamento; e contra a omissão de algum eleitor poderá reclamar o interessado, o administrador do concelho ou bairro e qualquer dos vogaes da mesma commissão.

§ 1.° A reclamação será interposta em requerimento assignado pelo reclamante ou por seu procurador, com a assignatura devidamente reconhecida, e instruido com os documentos que lhe servirem de prova.

§ 2.° As reclamações são autuadas por appenso ao processo de reorganisação do recenseamento, e para o seu julgamento poderá o juiz requisitar da commissão de re-

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censeamento quaesquer documentos que hajam servido de base ás resoluções d'ella e que lhe serão remettidos dentro de vinte e quatro horas.

§ 3.º Se contar qualquer inscripção no recenseamento, fundada no facto de saber ler e escrever, houver reclamação contestando esse facto, o juiz fará intimar o eleitor inscripto, para que no praso de tres dias compareça perante elle para escrever e assignar o que, em prova do facto contestado, lho for ordenado. Não comparecendo será julgada procedente a reclamação.

§ 4.° As decisões dos juizes de direito serão motivadas e os processos das reclamações não serão em caso algum entregues aos reclamantes.

§ 5.° Das eliminações, alterações o addicionamentos ordenados pelo juiz, organisará o escrivão, por freguezias, listas em triplicado, sendo um exemplar affixado na igreja respectiva, ficando outro patente a exame, pelo praso de cinco dias, no cartorio ou tribunal, o que se tornará publico por editaes, e sendo o terceiro junto ao processo judicial do recenseamento. Da affixação das listas e dos editaes, que será feita pelos officiaes de diligencia do juizo ou por agentes administrativos para este fim requisitados, se lavrarão certidões para serem juntas ao processo do recenseamento.

Art. 29.° Das decisões do juiz de direito poderio os reclamantes, o proprio interessado, o administrador do concelho ou bairro e os vogaes da commissão de recenseamento, recorrer para a relação do districto, sendo o recurso interposto perante aquelle magistrado, independentemente de termo, por meio de petição, em que se exponham os seus fundamentos, instruida com os documentos convenientes, podendo ainda juntar-se outros dentro de tres dias, findos os quaes o processo será officialmente expedido para o tribunal superior.

§ 1.º O recurso será distribuido na relação com os feitos da 6.ª classe e o relator o mandará com vista ao ministerio publico, que responderá no proso improrogavel de vinte e quatro horas.

§ 2.° Findo este proso, o escrivão cobrará o feito, fal-o-ha concluso ao relator e este o proporá logo em sessão publica com cinco juizes, sendo a decisão tomada em conferencia por tres votos conformes.

§ 3.° Para o julgamento d'estes feitos poderá haver sessão todos os dias, ainda em tempo de ferias.

Art. 30.° Do accordão da relação podem recorrer para o supremo tribunal de justiça as pessoas designadas no artigo anterior, sendo o recurso interposto independentemente de termo, por meio de petição, que poderá ser instruida com documentos, e dentro de quarenta e oito horas officialmente enviado, sem ficar traslado, aquelle tribunal, onde será decidido sem mais termos que os determinados para o julgamento nas relações nos §§ 1 .º, 2.° e 3.° do artigo antecedente.

§ unico. Não são admissiveis sobre o recenseamento eleitoral outras reclamações ou recursos alem dos estabelecidos n'este decreto.

Art. 3l.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão officiosamente, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes e, em vista das decisões, o juiz mandará cancellar nas listas os nomes dos cidadãos que tiverem sido excluidos e lhes fará addicionar os nomes d'aquelles que deverem inscrever-se de novo ou n'ellas ordenará as alterações que superiormente hajam sido julgadas.

§ 1.° O exemplar das listas, a que se refere o § 5.° do artigo 28.° e que esteve patente a exame, depois de modificado nos termos do presente artigo, será, com a necessaria segurança, remettido pelo escrivão do processo ao secretario da commissão de recenseamento do concelho ou bairro para que, em vista d'elle e da lista geral que ficou em seu poder, proceda á organisação do livro do recenseamento, o qual terá termo de abortara assignado pelo juiz, seguindo-se na inscripção a ordem alphabetica dos nomes em cada freguezia, e agrupando-se ou dividindo-se as freguezias conforme a divisão das assembléas. A respeito do cada eleitor se mencionarão as circumstancias constantes das listas, nos termos do § 3.° do artigo 26.º

§ 2.° O livro assim processado será enviado ao respectivo juiz de direito e, depois de conferida a exactidão pelas listas existentes no cartorio e feitas as rectificações necessarias, será authenticado pelo juiz, que rubricará todas as folhas e assignará o termo de encerramento, declarando-se n'este o numero de eleitores inscriptos em cada freguezia. Este livro ficará sendo para todos os effeitos o recenseamento original, não poderá ser alterado por determinação de nenhuma auctoridade, e será remettido, com a necessario segurança, ao secretario da camara municipal do concelho respectivo.

§ 3.° Das listas archivadas no cartorio, o escrivão. independentemente de despacho, dará sempre, dentro de oito dias, as copias authenticas que lhe forem pedidas. Estas copias não estão sujeitos a sêllo e serão expedidas mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto.

§ 4.° Ao escrivão do processo do recenseamento arbitrará o juiz, ouvida a camara municipal e em visto da respectiva verba orçamental, uma gratificação, que será paga por esta corporação como despeza obrigatoria.

Art. 32.° Organisado o recenseamento pela fórma declarada nos artigos antecedentes, será revisto nos dois annos immediatos, observando-se nas operações de revisão as disposições seguintes e ouvindo-se os parochos e regedores, nos termos do § 2.° do artigo 24.°:

1.º A commissão, tomando por base o recenseamento vigente, que requisitará do competente funccionario, deverá eliminar da lista de cada freguezia:

a) Os fallecidos, sendo o obito comprovado pelas relações que, até ao decimo dia anterior ás operações de revisão, os parochos e officiaes do registo civil devem remetter ao secretario da commissão, relativamente aos obitos occorridos no ultimo anno;

b) Os individuos incursos nas incapacidades previstas nos n.os 2.° e 3.° do artigo 2.°, em vista da relação que, até á mesma data e a respeito do mesmo periodo de tempo, devem remetter ao secretario os encarregados do registo criminal;

c) Os que tiverem mudado o seu domicilio para outro concelho ou bairro, segundo o que constar á commissão, nos termos do artigo 24.°;

d) Os que deverem ser excluidos, em conformidade do disposto no § 1.° do mesmo artigo;

e) Os que no anno immediatamente anterior deixaram de ser collectados, nos termos do artigo 1.°, em contribuição predial, industrial, de renda de casos, sumptuaria ou decima de juros, segundo se mostrar dos relações que para esse effeito serão organisadas pelo escrivão de fazenda e por este enviadas ao secretario da commissão até ao decimo dia anterior ao do começo da revisão.

2.° A commissão addicionará ao recenseamento de cada freguezia:

a) Os cidadãos que attingirem a idade legal, nos termos do artigo 16.°, em vista de relações remettidas pelos parochos e officiaes do registo civil ao secretario da commissão até ao decimo dia anterior ao da sua installação e do que á mesma constar sobre as respectivas collectas de contribuições directas do estado, pelas relações enviadas da repartição de fazendo no corrente anno ou nos dois ultimos;

b) Os que no anno immediatamente anterior forem de novo collectados, nos termos do artigo 1.°, em contribuição predial, industrial, de renda de casas, sumptuaria ou decima de juros, secundo se mostrar das relações que para esse effeito serão organisados pelo escrivão de fazenda

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e por este enviadas ao secretario da commissão até ao decimo dia anterior ao do começo da revisão;

c) Os que deverem recensear-se em vista dos documentos apresentados pelos interessados, nos termos dos n.° 2.° e 3.° do artigo 25.°, ou em vista da transferencia de domicilio auctorisada pelo § unico do artigo 17.°

§ 1.° A inscripção por saber ler e escrever será mantida, sem novo requerimento, nos recenseamentos revistos ou organisados nos annos seguintes.

§ 2.° São applicaveis ás operações de revisão as disposições dos §§ 1.°, 2.° e 3.° do artigo 25.°

Art. 33.° Em conformidade com as deliberações da commissão sobre as eliminações e addicionamentos declarados no procedente artigo, o secretario, sob sua responsabilidade, organisará em triplicado listas, por freguezias, contendo os nomes dos eleitores inscriptos de novo e os nomes dos eliminados, com menção do motivo da eliminação, sendo as listas datadas e assignadas pelo secretario e rubricadas pela commissão.

Art. 34.° Dois exemplares das listas a que se refere o artigo antecedente, serão pelo secretario enviados ao juizo de direito da comarca, para os fins designados no artigo 27.°, observando-se na affixação e publicação das listas, na interposição e julgamento das reclamações e recursos os termos e prasos prescriptos no mesmo artigo e nos artigos 28.° a 30.°

§ 1.° Do supremo tribunal de justiça e da relação, logo que transitem em julgado, baixarão, sem ficar traslado, todos os recursos eleitoraes, e, em vista das decisões, se procederá na conformidade do artigo 31.°; o escrivão do processo remetterá o competente exemplar das listas modificadas ao secretario da commissão do recenseamento, e este lançará em folhas addicionaes ao livro respectivo todas as alterações resultantes da revisão, remettendo-o em seguida ao juiz de direito.

§ 2.° Conferida a exactidão do addicionamento, será este authenticado e encerrado pela fórma declarada no § 2.° do artigo 31.°, e o recenseamento definitivamente revisto será remettido ao secretario da camara municipal.

§ 3.º São applicaveis ás listas e trabalho de revisão as disposições dos §§ 3.º e 4.º do mesmo artigo 31.º

Art. 35.º O secretario da camara municipal é obrigado a guardar e conservar, sob sua responsabilidade, o livro do recenseamento eleitoral e d'elle ou dos addicionamentos remetterá copia authentica ao governo civil, por intermedio do administrador do concelho ou bairro.

§ 1.º Dentro de oito dias e independentemente de despacho, o secretario passará, sem sêllo, todas as certidões que lhe forem pedidas do recenseamento, mediante o emolumento de 5 réis por cada nome transcripto, e conferirá e authenticará, tambem sem sêllo, todas as copias impressas ou litographadas, que para esse effeito lhe forem apresentadas, mediante o emolumento de 1 real por cada nome conferido.

§ 2.° Da copia do recenseamento archivada no governo civil, o secretario geral, nos mesmos termos do paragrapho antecedente e mediante igual emolumento, passará certidões o authenticará, depois de conferidas, as copias impressas ou lithographadas que lhe forem apresentadas.

§ 3.° Todos os documentos que serviram de base ás operações do recenseamento e que não hajam sido requisitados pelo juiz da comarca, nos termos do § 2.º do artigo 28.°, ficarão archivados, sob responsabilidade do secretario da commissão de recenseamento, na respectiva camara municipal ou administração do bairro.

Art 36.° Todo o processo eleitoral, comprehendendo o recenseamento as reclamações, os recursos, os documentos com que a tal respeito só fizerem, o que nos tribunaes judiciaes se ordenar, conforme as disposições d'este decreto e os reconhecimentos de assignaturas das mesmas petições requerimentos ou documentos, é isento do imposto de sêllo e de quaesquer emolumentos ou salarios.

§ unico. Os documentos a que se refere este artigo deverão declarar o fim para que são passados e para nenhum outro poderão utilisar-se.

Art. 37.° Todas as auctoridades, funccionarios e repartições publicas são obrigados a passar impreterivelmente, dentro de tres dias, as copias, certidões e attestados, que lhes sejam requeridos para o effeito do recenseamento eleitoral, das reclamações ou dos recursos sobre o mesmo objecto. A mesma obrigação incumbe aos parochos.

Art. 38.° Os prasos para as diversas operações do recenseamento eleitoral são os fixados nos quadros juntos ao presente decreto.

§ unico. Quando em algum concelho ou bairro as operações do recenseamento se não effectuarem nos prasos legaes, poderá o governo, ouvidos os fiscaes da corôa e fazenda em conferencia, fixar novos prasos, analogos aos designados na lei para a realisação das mesmas operações.

Art. 39.° Só é considerado legal para o acto da eleição o recenseamento eleitoral encerrado no dia 30 de junho, immediatamente anterior ao da mesma eleição, salvo o disposto nos paragraphos seguintes.

§ 1.º O recenseamento organisado immediatamente depois da publicação d'este decreto será valido para todas as eleições que se fizerem depois da data fixada para o sen encerramento até á vigencia do recenseamento revisto no anno seguinte.

§. 2.° No caso de força maior, devidamente comprovada, e na falta de copias authenticas, será considerado legal o recenseamento original ou copia authentica, immediatamente anterior.

CAPITULO IV

Dos circulos eleitoraes, das assembléas primarias e dos actos preparatorios da eleição

Art. 40.° A eleição de deputados é directa e feita pelos circulos eleitoraes, designados no mappa junto a este decreto, elegendo cada circulo o numero de deputados que no mesmo mappa é fixado.

§ unico. A circumscripção dos circulos eleitoraes e o numero de deputados, que devem eleger, só por lei póde ser alterado.

Art. 41.° Continúa vigorando, até que por lei seja alterada, a actual divisão das assembléas eleitoraes, que se reunirão nos edificios que para esse fim estiverem designados.

§ unico. São nullos os actos eleitoraes realisados fóra do recinto legal.

Art. 42.° As assembléas eleitoraes serão convocadas por decreto do governo, que designará o dia em que deve proceder-se á eleição, e no domingo immediatamente anterior ao fixado para este acto, o presidente da commissão de recenseamento, por editaes afixados nos legares do estylo o lidos pelos parochos á missa conventual, tornará publicas as assembleias em que o concelho se divide, os seus limites e os togares de reunião, declarando tambem dia e hora em que as assembléas devem reunir-se.

Art. 43.° As assembléas serão presididas pelos vogaes effectivos ou substitutos da camara municipal e na falta ou impedimento d'elles por cidadãos elegiveis para vereadores, sendo uns e outros designados pela commissão de recenseamento, que para este effeito se reunirá no domingo precedente ao da eleição.

Art. 44.° O presidente da commissão de recenseamento enviará aos presidentes das assembléas eleitoraes, pelo menos dois dias antes do domingo em que deve effectuar-se a eleição, dois cadernos dos eleitores que podem votar nas assembléas, a que elles tiverem de presidir, e cobrará recibo da remessa.

§ 1.° Estes cadernos, que poderão ser impressos ou lithographados, serão a copia fiel do recenseamento original, requisitado do funccionario competente, terão termos de abertura e de encerramento, assignados pela commissão e serão por ella rubricados em todas as suas folhas.

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§ 2.° O administrador do concelho ou bairro tambem rubricar e assignar os mesmos cadernos.

Art. 45.° O presidente da commissão de recenseamento enviará tambem aos presidentes da assembléa, dentro do praso fixado no artigo antecedente, quatro cadernos com termo de abertura e rubricas, na fórma por que acima se dispos, para n'elles se lavrarem as actas da eleição.

CAPITULO V

Da eleição

Art. 46.° No domingo designado por decreto especial do governo para se proceder a eleição, pelas nove horas da manhã, reunidos os eleitores no local competente, lhos proporá o presidente dois d'entre elles para escrutinadores, dois para secretarios e dois para supplentes, convidando os eleitores que approvarem a proposta a passar para o lado direito d'elle e para o esquerdo os que a rejeitarem.

§ 1.° Para a approvação da proposta são necessarias tres quartas partes dos eleitores presentes.

g 2.° Se a proposta do presidente for approvada por menos de tres quartas partes mas por mais da quarta parte dos eleitores presentes, ficará a mesa composta do escrutinador, do secretario e do supplente, que o presidente primeiro indicar na ordem da sua proposta, e dos restantes membros indicados por um eleitor de entre os que rejeita-se n'essa indicação accordar por acclamação a maioria dos eleitores d'esta parte da assembléa. Se esta não concordar, procederá á eleição dos respectivos vogaes por escrutínio secreto em que ella só votará, considerando-se eleitos os que obtiverem a maioria relativa. Servirão de vogaes da mesa d'esta eleição os vogaes que já fazem parte da mesa eleitoral pela proposta do presidente.

§ 3.º Quando a proposta do presidente for rejeitada por tres quartas partes ou por mais de tres quartas partes aos eleitores presentes, os vogaes da mesa serão eleitos por acclamação, sob proposta de um dos eleitores, que a rejeitaram, ou por escrutínio secreto, conforme os casos indicados no paragrapho antecedente. Quando tenha de proceder-se a eleição por escrutínio secreto, a mesa para esta eleição será composta do presidente, de um escrutinador e de um secretario por elle nomeados, cada um de differente lado da assembléa.

§ 4.° A quarta parte do numero dos eleitores presentes, não incluindo o presidente, quando este numero não for multiplo de 4, é a quarta parte do multiplo de 4 immediatamente inferior, sommada com a unidade.

§ 6.° Se em alguma assembléa eleitoral, até duas horas depois da fixada para a eleição, não comparecerem eleitores em numero sufficiente para comporem a mesa, o presidente lavrará ou mandará lavrar auto ou que se declare esta falta e que será assignado por elle, pelo parocho e pela auctoridade administrativa.

Art. 47.° Da formação da mesa só lavrará acta, e o secretario, que a lavrar, a lerá immediatamente á assembléa.

§ unico. Uma relação contendo o nome dos approvados ou eleitos para comporem a mesa, assignada pelo presidente e por um dos secretarios, será logo affixada na porta principal do edificio em que a assembléa estiver reunida.

Art. 48.° A mesa eleita antes da hora fixada no artigo 46.° é nulla e nullos serão todos os actos eleitoraes em que ella interferir.

Art. 49.° Se uma hora depois da fixada para a reunião da assembléa o presidente ainda não tiver apparecido, ou se apparecer e se ausentar antes de constituída a mesa, tomará a presidencia o cidadão que para isso for escolhido pelo maior numero dos eleitores presentes.

§ unico. São nullos os actos eleitoraes presididos por presidente illegitimo.

Art. 50.° Se á mesma hora se não tiverem recebido na casa da assembléa nem os cadernos do recenseamento dos eleitores, nem os cadernos para se lavrarem as actas, que o presidente da commissão de recenseamento devia ter remettido ao presidente da assembléa, a eleição poderá fazer-se por quaesquer copia authenticas do recenseamento, que houverem sido estraladas do livro competente e que qualquer cidadão apresentar, e as actas poderão lavrar-se em cadernos com termo de abertura o rubrica da mesa que assembléa escolher.

Art. 51.° A mesa da eleição será collocada no corpo do edificio, de maneira que todos os eleitores possam por todos os lados ter livre accesso a ella e observar todos os actos eleitoraes.

Art. 52.° Constituída a mesa, serão validos todos os actos eleitoraes que legalmente forem praticados, estando presentes, pelo menos, tres vogaes, sendo o presidente subtituido, nos seus impedimentos, pelo escrutinador eleito ou approvado pela maioria da assembléa, preferindo o mais velho, quando ambos hojam sido eleitos ou approvados pela mesma maioria.

Art. 53. Os parochos e os regedores das freguezias, que constituem a assembléa eleitoral, assistirão á eleição para informar sobre a identidade dos votantes.

§ 1.° Faltando o parodio ou o regedor, a mesa nomeará pessoas idoneas que façam as vezes d'elles.

§ 2.° As mesas eleitoraes não começarão o acto da eleição sem que os parochos e os regedores ou quem os subtituir estejam presentes.

§ 3.° O parocho, ou quem suas vezes fizer, terá logar na mesa ao lado direito do presidente, emquanto se estiver procedendo á chamada da respectiva freguezia.

§ 4.° Se houver uma só assembléa no concelho, assistirá ahi á eleição o administrador respectivo; se houver duas assistirá a uma o administrador, e a outra o seu substituto; se houver mais de duas, ou algum d'elles estiver impedido, escolherá o administrador em exercício pessoa ou pessoas que o representem e em quem delegue as attribuições conferidas por este decreto.

§ 6.° A falta da anotoridade administrativa não impede os actos eleitoraes.

Art. 54.° Ás mesas decidem provisoriamente as duvidas que se suscitarem ácerca das operações da assembléa.

§ 1.° Todas as decisões da mesa sobre quaesquer duvidas ou reclamações, verbaes ou escriptas, serão motivadas.

§ 2.° As decisões serão tomadas á pluralidade de votos. No caso de empate o presidente tem voto de qualidade.

§ 3.° Qualquer eleitor póde apresentar por escripto, com a sua assignatura ou com outras, se todas forem de eleitores do ciruulo, protesto relativo aos actos do processo eleitoral e instruil-o com os documentos convenientes.

§ 4.° O protesto e documentos, numerados e rubricados pela mesa, que não poderá jamais negar-se a recebel-os, com o parecer motivado d'esta ou com o contra-protesto de qualquer outro cidadão ou cidadãos tambem eleitores, se assim o tiverem por conveniente, serão appensos ás actas, mencionando-se n'estas simplesmente a apresentação dos protestos e contra-protestos, o seu numero e o nome do primeiro cidadão que os assignar, bem como os pareceres da mesa nas mesmas condições.

Art. 66.° Nas assembléas eleitoraes não se póde discutir ou deliberar sobre objecto estranho ás eleiçOes. Tudo que alem d'isso se tratar é nullo e de nenhum effeito.

Art. 56.° Aos presidentes das mesas incumbe manter a liberdade dos eleitores, conservar a ordem, regular a policia da assembléa e providenciar para que esta seja livremente accessivel.

Art. 57.° Nenhum indivíduo póde apresentar-se armado nas assembléas eleitoraes e, ao que o fizer, ordenará o presidente que se retire.

Art. 68.º Se o presidente da assembléa eleitoral o julgar conveniente, para a ordem da mesma assembléa; po-
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derá mandar sair do local, onde estiver reunida, todos ou alguns dos individuos presentes, não recenseados.

Art. 59.° A nenhuma força armada é permittido apresentar-se no local onde estiverem reunidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, excepto a requisição feita em nome do presidente.

§ 1.º O presidente consultará a mesa antes de fazer a requisição.

§ 2.° A força só poderá ser requerida quando seja necessario dissipar algum tumulto ou obstar a alguma aggressão dentro do edifício da assembléa ou na proximidade d'elle, no caso de ter havido desobediencia ás ordens do presidente duas vezes repetidas.

§ 3.° Apparecendo a força armada no edifício da assembléa ou na sua proximidade, suspendem-se os actos eleitoraes e só poderá proseguir-se n'elles meia hora depois da sua retirada.

§ 4.° Nas terras em que se reunirem as assembléas eleitoraes, a força armada conservar-se-ha nos quarteis ou alojamentos durante os actos das assembléas.

§ 5.° As disposições d'este artigo e seus paragraphos não comprehendem a força indispensavel para o serviço regular, nem individualmente os militares que estiverem recenseados.

Art. 60.° A nenhum cidadão é permittido votar em mais de uma assembléa.

Art. 61.° A votação é por escrutínio secreto, de modo tal que de nenhum eleitor se conheça ou possa vir a saber o voto.

§ unico. Não serão recebidas listas em papel de cores ou transparentes, ou que tenham qualquer marca, signal designação ou numeração externa.

Art 62.° Os vogaes das mesas votam primeiro que todos os eleitores; e, tendo elles votado mandará o presidente fazer a chamada dos outros, principiando pelas freguezias mais distantes.

Art. 68.º Ninguem póde ser adimittido a votar se o seu nome não estiver inscripto no recenseamento dos eleitores. Exceptuam-se:

1.º O presidente da mesa, que pode votar na assembléa a que presidir, ainda que não esteja ali recenseado;

2 ° O administrador do concelho ou bairro ou seu representante, que podo votar na assembléa que assistir, ainda que n'ella não esteja recenseado;

3.° Os cidadãos que se apresentarem munidos de accordãos das relações ou do supremo tribunal de justiça, mandando-os inscrever como eleitores, e que não foram inscriptos antes do encerramento do recenseamento, devendo juntar-se á acta o documento que apresentarem.

Art. 64.° Nenhum cidadão, qualquer que seja o seu emprego ou condição, póde ser impedido de votar, quando se achar inscripto no respectivo recenseamento, excepto se contra elle se apresentar sentença judicial, passada em julgado que o exclua do recenseamento, ou certidão de despacho de pronuncia, com transito em julgado.

Art. 65.° Ao passo que cada um dos eleitores chamados se approximar á mesa, os dois escrutinadores descarregarão o nome d'elle nos dois cadernos de que só faz menção no artigo 44.°, escrevendo o proprio appellido ao lado do nome dos votantes. O eleitor só então entregará ao presidente a lista da votação, dobrada e sem assignatura, e o presidente a lançará na urna.

8 unico As listas deverão conter um numero de nomes igual ao numero de deputados, que compete ao respectivo circulo eleitoral, e o presidente das mesas assim o annunciará á assembléa antes de acceitar as listas.

Art 60 ° Concluída a primeira chamada, o presidente ordenará uma chamada geral dos que não tiverem votado.

Art 67 ° Duas horas depois d'esta chamada o presidente perguntará se ha mais alguem que pertenda votar, recebendo as listas dos que immediata e successivamente se apresentarem. Recolhida qualquer lista, considerar-se-ha encerrada a votação, quando dentro da assembléa não haja eleitor algum que se apresente a votar.

Art. 68.° Encerrada a votação o presidente fará contar as listas que se acharem na urna e confrontar o seu numero com as notas de descarga postas nos cadernos do recenseamento.

§ unico. O resultado d'esta contagem e confrontação será mencionado na acta e immediatamente publicado por edital affixado na porta principal da casa da assembléa. Do mesmo resultado é a mesa obrigada a certificar qualquer eleitor que o requeira.

Art. 69.° Seguir-se-ha o apuramento dos votos, tomando o presidente successivamente cada uma das listas, desdobrando-a e entregando-a alternadamente a cada um dos escrutinadores, o qual a lerá em voz alta e a restituirá no presidente; o nome dos votados será escripto por ambos os secretarios, ao mesmo tempo que os votos que forem tendo, numerados por algarismos e sempre repetidos em voz alta.

§ unico. O resultado do apuramento de cada dia, até se concluir o escrutinio, será publicado por edital, affixado na porta principal do edificio da assembléa. Do mesmo resultado a mesa é obrigada a passar certidão a qualquer eleitor que a requeira.

Art. 70.° São validas as listas dos votantes, ainda quando contenham nomes de menos ou de mais. N'este ultimo caso não serão contados os derradeiros nomes excedentes.

Art. 71.° As mesas eleitoraes apurarão os votos que recaírem em qualquer pessoa, sem que hajam de verificar se essa pessoa é absoluta ou relativamente inelegível, e sem embargo dos protestos que sobre este assumpto podem sor apresentados, nos termos dos §§ 3.° e 4.° do artigo 54.°, excepto se os votos forem contidos em listas não conformes ao disposto no § unico do artigo 61.° N'este caso serão taes listas declaradas nullas.

§ unico. As listas annulladas por este ou por outro fundamento legitimo não só contam para o calculo da maioria ou para outro algum effeito.

Art. 72.° Ás listas que as mesas declararem viciadas ou nullas serão rubricadas pelo presidente, e juntar-se-hão ao processo eleitoral, sob pena de nullidade das operações de apuramento. A mesma disposição e sob a mesma pena se observará quanto ás listas declaradas validas contra a reclamação de algum dos cidadãos que formarem a assembléa.

§ unico. Os votos que se contiverem nas listas annulladas serão em todo o caso apurados, mas em separado e separadamente escriptos nas actas.

Art. 73.° Se houver duvida sobre a numeração dos votos, ou se o numero total d'elles não for exactamente igual á camara dos que as listas contiverem, e uma quarta parte dos eleitores presentes reclamar a verificação d'elles procedar-se-ha a novo exame ou leitura das listas.

Art. 74.° Á constituição das mesas, a votação, a contagem das listas e o escrutínio são operações eleitoraes que se praticarão sempre antes do sol posto.

§ 1.° Se a votação se não concluir no primeiro dia o presidente da mesa eleitoral mandará pelos dois secretarios rubricar nas costas as listas recebidas, e fal-as-ha depois fechar com os mais papeis concernentes á eleição n'um cofre de tres chaves, das quaes ficará uma na sua mão e as outras na de cada um dos escrutinadores. Este cofre deverá ser soltado pelo presidente e por qualquer dos eleitores presentes que assim o requeira, sendo depois guardado com toda a segurança no mesmo edifício em que se procedeu á votação, em logar exposto á vista e guarda dos eleitores, se vinte d'estes, pelo menos, o exigirem, em presença da assembléa, para se proseguir nos actos eleitoraes.

§ 2.° Não havendo reclamação de qualquer eleitor da assembléa, as listas, em vez de rubricadas uma a uma, poderão ser reunidos em um só masso ou era mais, con-

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forme a capacidade do cofre, onde têem de ser depois encerradas, nos termos d'este artigo, e fachadas por um envolucro de papel lacrado e sellado, no qual os secretarios lançarão as suas rubricas, sendo facultativo a qualquer dos eleitores presentes rubricar tambem o envolucro e imprimir-lhe algum sêllo ou sinete.

§ 3.° A rubrica das listas ou dos massos de listas e seu encerramento no cofre poderão effectuar-se depois do sol posto.

Art. 75.° Terminado o apuramento, uma relação de todos os votados será publicada por edital, affixado na porta principal da casa da assembléa; em presença da mesma serão queimadas as listas que não estiverem no caso declarado no artigo 72.°, e d'estas circumstancias se fará expressa menção na acta.

§ unico. Dos votos que obtiver cada votado a mesa deverá passar sempre certidão, a requerimento de qualquer eleitor.

Art. 76.° Pa eleição se lavrará acta em um dos quatro cadernos de que trata o artigo 45.°, assignada e rubricada pela mesa, e na acta se mencionarão, alem das mais circumstancias relativas á eleição:

1.° Todas as duvidas que Decorrerem e reclamações que se fizerem, pela ordem com que foram apresentadas, e decisão motivada que sobre ellas se tomou, observando-se ácerca dos protestos escriptos o disposto no § 4.° do artigo 54.;

2.° Quantos dias a eleição durou, e quaes as operações eleitoraes effectuadas em cada um d'elles;

3.° O nome de todos os votados e o numero de votos que cada um teve, escripto por extenso;

4.° Os votos annullados e o motivo por que o foram.

5.° A declaração de que os cidadãos que formam a assembléa outorgam aos deputados que, em resultado dos votos de todo o circulo eleitoral se mostrarem eleitos, a todos in solidum e cada um em particular, os poderes necessarios para que, reunidos com os dos outros circulos eleitoraes da monarchia portuguesa, façam, dentro dos limites da carta constitucional e dos actos addicionaes á mesma, tudo quanto for conducente ao bem geral da nação.

§ 1.° As actas poderão ser lithographadas ou impressas nos seus dizeres geraes e a sua redacção poderá realisar-se depois do sol posto.

§ 2.° Terminada a acta, a requerimento de qualquer eleitor, a mesa será obrigada a passar por certidão o numero de votos obtido por qualquer candidato, segundo o que da mesma acta constar.

Art. 77.° D'esta acta tirar-se-hão tres copias authenticas, escriptas nos outros tres cadernos de que trata o artigo 45.º, igualmente assignadas e rubricadas pela mesa.

§ 1.° Uma d'estas copias será logo remettida ao presidente da assembléa de apuramento do circulo eleitoral, com um dos cadernos de que trata, o artigo 44.° e mais papeis relativos á eleição, acompanhados de uma relação escripta por um dos secretarios da mesa, de onde conste especificadamente quaes elles são. A remessa far-se-ha pelo seguro do correio, havendo-o, ou por proprio, que cobrará recibo da entrega.

§ 2.° A outra copia será também logo entregue, com outro dos cadernos de que trata o artigo 44.°, ao administrador do concelho ou bairro, a que a assembléa pertencer, para que tudo remetta com a devida segurança ao administrador do concelho ou bairro da séde do circulo eleitoral, do qual cobrará recibo.

§ 3.° A terceira copia será remettida ao presidente da camara do concelho, a que a assembléa pertencer, para ahi ser archivada.

Art. 78.° Tanto as actas originaes, como as copias a que se refere o artigo antecedente, serão assignadas por todos os vogaes da mesa, effectivos e supplentes, devendo, comtudo, julgar-se validas quando forem assignadas, pelo menos, por tres de entre elles. Se algum deixar de assignar, o secretario mencionará esta circumstancia.

Art. 79.º A qualquer cidadão é permittido pedir o os secretarios das camaras municipaes são obrigados a passar, independentemente de despacho, gratuitamente, sem sêllo e dentro de tres dias, certidões authenticas das actas e mais documentos relativos ás eleições que estiverem guardados nos archivos das respectivas camaras. Todos estes documentos serão, para os effeitos d'este decreto, considerados originaes e authenticos e dar-se-ha inteiro credito a qualquer certidão legal que d'elles se extraia.

Art. 80.° Os dois escrutinadores são os portadores da acta original da respectiva assembléa e apresental-a-hão, no dia designado, na séde do circulo eleitoral.

§ 1.° Quando algum dos escrutinadores tiver motivos que o estorvem de ir á séde do circulo, será substituido pelos secretarios ou pelos supplentes.

§ 2.º Quando as actas originaes, que são entregues aos portadores, como as copias authenticas e mais papeis que, na conformidade do artigo 77.º, são remettidas para a séde do circulo eleitoral, por via do presidente da assembléa e do administrador do concelho ou bairro, serão fechadas e lacradas, e alem d'isso levarão no reverso do sobrescripto os appellidos dos membros da respectiva mesa, postos por letra de cada um.

CAPITULO VI

Do apuramento

Art. 81.° No domingo immediato ao da eleição, pelas nove horas da manhã, reunir-se-hão na casa da camara da séde do circulo eleitoral os portadores das actas de todo o circulo, sob a presidencia do auditor administrativo do districto; proceder-se-ha logo á formação da mesa, conforme o disposto nos artigos 46.° e seguintes, e observar-se-hão todas as mais disposições applicaveis com respeito á formação das mesas das assembléas primarias e ao modo de manter ahi a liberdade e fazer a policia, competindo para este fim ao presidente e mesa das assembléas de apuramento as mesmas attribuições que pelos citados artigos competem aos presidentes e mesma d'aquellas assembléas.

§ 1.° Se o presidente não comparecer á hora fixada n'este artigo, prover-se-ha á sua falta pela fórma indicada no artigo 49.°

§ 2.° O administrador do concelho da séde do circulo ou do bairro onde se reunir a assembléa de apuramento assistirá a todos os actos da mesma assembléa.

Art. 82.° Constituida a mesa, o presidente da assembléa lhe apresentará fachadas e lacradas as copias das actas que, na conformidade do artigo 77.° § 1.°, lhe levem ter remettido as assembléas eleitoraes do circulo; os portadores das actas apresentarão tambem os originaes que lhes tiverem sido entregues, e o administrador do concelho ou bairro da séde do circulo apresentará tambem as outras copias legues que na fórma do § 2.° do mesmo artigo lhe devem ter remettido os administradores dos outros concelhos ou bairros do circulo.

Art. 83.° Feita esta apresentação, nomear-se-hão, pela fórma indicada no artigo 46.° para a formação das mesas das assembléas primarias, aã commissões que se julgarem necessarias para a mais prompta expedição dos trabalhos, e por estas commissões se distribuirão proporcionalmente as actas das diversas assembléas do circulo, de maneira, porém, que o exame das actas de uma assembléa não seja nunca encarregado a uma commissão de que sejam membros cidadãos recenseados na mesma assembléa.

Art. 84.° Estas commissões procederão immediatamente ao exame das actas, que lhes forem distribuidas, e ao apuramento dos respectivos votos. Do resultado darão conta á assembléa.

Art. 85.° Os pareceres das diversas commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa geral dos portadores das actas.

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Art.86.° Approvados ou reformados os pareceres, a mesa procederá immediatamente ao apuramento geral, na conformidade d'elles, a fim de averiguar o numero total de votos que cada um dos cidadãos votados teve em todo o circulo, e sobre isto lavrará um parecer que será tambem lido e approvado ou reformado pela assembléa.

Art. 87.° As funcções das assembléas de apuramento reduzem-se exclusivamente a examinar, pela comparação das actas originaes trazidas pelos portadores, com as copias authenticas subministradas pelo presidente da assembléa e respectivo administrador do concelho ou bairro, e tambem com os cadernos do recenseamento, se aquellas actas originaes são realmente as mesmas que foram confiadas aos portadores pelas mesas, e se os votos que dálias consta haver tido cada cidadão na respectiva assembléa, são realmente os que elles ahi tiveram, e bem assim a apurar esses votos. De maneira nenhuma, porém, deixarão de os contar a qualquer cidadão ou poderão annullar as actas das quaes elles constam, com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, no processo eleitoral, com o fundamento de que algum dos cidadãos votados é absoluta ou relativamente inelegivel ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuidade expressamente especificadas n'este artigo.

§ unico. Quando por qualquer caso imprevisto deixar de ser apresentada á assembléa do apuramento alguma acta original ou alguma das copias a que se referem os artigos antecedentes, far-se-ha o apuramento pelas que apparecerem.

Art. 88.° Concluido o apuramento, escrever-se-ha em dois cadernos, assignados e rubricados pela mesa, o numero de votos que teve cada cidadão.

Art. 89.° Serão considerados como eleitos deputados pelo circulo os cidadãos mais votados em numero igual ao dos deputados que por elle houver a eleger.

§ 1.° Quando dois ou mais cidadãos tiverem o mesmo numero de votos, preferirá:

1.º O que tiver mais tempo de deputado;

2.° O mais velho;

3.° O que a sorte designar.

§ 2.° O nome d'aquelles que soírem eleitos publicar-se-ha por editaes afixados na porta principal da assembléa e o presidente proclamal-os-ha tambem em vez alta diante de toda ella.

Art. 90.° Qualquer eleitor do circulo poderá apresentar protestos, nos mesmos termos determinados para as assembléas primarias, perante a assembléa de apuramento, que será tambem obrigada a receber os protestos ou contra-protestos que as mesas das assembléas primarias não tenham querido acceitar.

§ unico. Se os protestos apresentados nas assembléas de apuramento tiverem por objecto as operações das assembléas primarias, o presidente da assembléa ouvirá immediatamente os cidadãos, que compozeram as mesas das mesmas assembléas, para que informem o que se lhes offerecer acerca dos protestos e a resposta, que derem, será junta ao processo eleitoral.

Art. 91.° Do apuramento se lavrará acta, na qual se declarará o nome dos deputados eleitos, o numero de votos que cada um teve, e como pelas actas das assembléas de todo o circulo eleitoral consta que os eleitores d'elle outorgaram aos cidadãos, que se mostrasse haverem sido eleitos deputados, os poderes de que falia o artigo 76.°

Art. 92.° Da acta do apuramento se entregarão copias, assignadas por toda a mesa, a cada um dos deputados que presentes estiverem; aos ausentes enviar-se-hão com participação official do respectivo presidente.

Art. 93.° A acta de apuramento, conjunctamente com as actas originaes, cadernos e mais papeis, que tiverem vindo das assembléas primarias, serão immediatamente remettidos ao presidente do supremo tribunal de justiça, dando-se logo da remessa conhecimento ao ministro e secretario d'estado dos negocios do reino.

§ unico. As copias authenticas das actas, que houverem sido apresentadas pelo presidente, ficarão guardadas no archivo da camara municipal da séde do circulo, e aquellas que tiverem sido apresentadas pelo administrador do concelho ou bairro da mesma séde serão remettidas ao respectivo governador civil para serem por elle archivadas; excepto no caso em que umas ou outras tenham servido de fundamento para sobre ellas assentar alguma decisão da assembléa de apuramento, porque n'este caso terão o mesmo destino do processo eleitoral, ao qual serão juntas.

CAPITULO VII

Do tribunal de verificação de poderes

Art. 94.° O tribunal de verificação de poderes tem por fim conhecer de todos os processos das eleições de deputados, julgando as reclamações ou protestos apresentados e, independentemente de reclamações ou protestos, declarando validas ou nullas as mesmas eleições.

§ unico. Contra os actos eleitoraes das assembléas primarias ou de apuramento e contra a elegibilidade dos deputados eleitos, qualquer eleitor do respectivo circulo póde apresentar reclamação ou protesto escripto e documentado, perante o presidente do tribunal, até á distribuição do processo eleitoral.

Art. 95.° O tribunal de verificação de poderes será composto:

1.° Feio presidente do supremo tribunal de justiça, que será presidente do tribunal de verificação de poderes, e por tres juizes do mesmo supremo tribunal designados pela sorte;

2.° Por tres juizes da relação de Lisboa, tambem designados pela sorte.

§ 1.° Quando algum dos magistrados, de que tratam os n.os 1.° e 2.° d'este artigo, faltar ou estiver impedido, será chamado, para substituir o presidente, o juiz mais antigo do supremo tribunal e para os restantes juizes, os que lhes forem immediatos em antiguidade. No caso de necessidade poderá recorrer-se, nos mesmos termos, aos juizes da relação do Porto.

§ 2.º O sorteio, a que se referem os n.os 1.° e 2.° d'este artigo, será feito em sessão publica perante o supremo tribunal de Justiça.

§ 3.° O tribunal constituir-se-ha por iniciativa do seu presidente, no dia immediato ao do apuramento da eleição geral de deputados no continente do reino.

Art. 96.° Os processos eleitoraes, contra os quaes não houver protestos ou reclamações, serão julgados no praso maximo de quinze dias, contados desde a sua recepção no tribunal, e os restantes deverão ser julgados no praso maximo de trinta dias contados de igual data.

Art. 97.° As sessões do tribunal de verificação de poderes serão publicas e anteriormente fixadas em hora e dia por aviso do presidente publicado na folha oficial.

§ 1.° As discussões serão oraes.

§ 2.° O dia do julgamento será notificado com tres dias de antecedencia, por aviso publicado na folha official, aos candidatos, que poderão comparecer pessoalmente, fazer-se representar por advogados, ou produzir novos documentos até vinte e quatro horas antes do dia fixado para o julgamento. Se algum processo não poder ser julgado na sessão prefixada, ser-lhe-ha no fim d'esta determinado novo dia de julgamento sem necessidade de outra notificação.

§ 3.° Será sempre facultada aos candidatos, ou aos seus advogados, a inspecção directa, na secretaria do tribunal, dos processos eleitoraes e de quaesquer documentos, que lhes digam respeito, não estando com vista aos juizes.

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§ 4.º No continente o tribunal poderá mandar proceder a inqueritos, dentro do praso fixado para o julgamento, delegando para esse fim as suas attribuições em magistrados judiciaes, que terão direito de fazer citar testemunhas, nomear peritos e deferir-lhes juramento, corresponder-se com todas as auctoridades e requisitar-lhes as diligencias necessarias para o desempenho da sua commissão.

O magistrado ou magistrados delegados vencerão, a titulo de ajuda de custo, a retribuição que lhes for arbitrada pelo tribunal, a qual não excederá 4$500 réis por dia.

Art. 98.° O tribunal de verificação de poderes é competente para conhecer da legalidade de todas as operações eleitoraes dos processos que lhe são affectos e da elegibilidade absoluta e relativa dos deputados a que os mesmos processos respeitam, sem prejuizo do disposto no § 2.° do artigo 100.º

§ 1.° São causas do nullidade as infracções de lei e as faltas de formalidades, que affectem a essencia do acto eleitoral sujeito a julgamento e influam no resultado da eleição.

§ 2.° As irregularidades nas operações eleitoraes de uma ou mais assembléas primarias, as quaes influam no resultado da eleição, sómente importam a repetição do acto eleitoral em todo o circulo, quando o numero de eleitores recenseados no circulo, aliás apenas se repetirão os actos eleitoraes na assembléa ou assembléas onde tenham occorrido aquellas irregularidades.

§ 3.° As decisões do tribunal designarão individualmente todos os cidadãos votados no circulo e o numero de votos obtidos, qualquer que elle seja, o concluirão sempre por declarar valida ou nulla a eleição dos deputados eleitos, ou por declarar a necessidade de repetição dos actos eleitoraes em alguma ou algumas das assembléas, no caso previsto no paragrapho antecedente.

§ 4.° As decisões do tribunal serão sempre motivadas e d'ellas não haverá recurso.

§ 5.° Os processos definitivamente julgados, depois de registadas as de isões proferidas, serão remettidos á camara dos deputados, dentro de quarenta e oito horas desde o julgamento, se a camara estiver funccionando, ou logo que se reuna; e as decisões, que determinarem por qualquer motivo a repetição de actos eleitoraes, serão immediatamente communicadas ao governo, que, no praso designado no artigo 105.°, contado da data da decisão, convocará as respectivas assembléas.

§ 6.° O tribunal conhecerá das questões relativas á sua constituição, e organisará o seu regulamento.

CAPITULO VIII

Da junta preparatoria, da constituição da camara dos deputados e modo de preencher as vacaturas

Art. 90.° Todos os deputados eleitos deverão concorrer no dia e logar aprasado para a reunião das côrtes geraes.

Art. 100.° Logo que se tenha reunido metade e mais um dos deputados eleitos poios circulos do continente do reino, descontando-se os reeleições, constituir-se-hão em junta preparatoria, á qual serão presentes todos os processos, com os respectivos julgamentos, enviados do tribunal de verificação de poderes.

§ 1.° Os deputados serão proclamados em conformidade com os julgamentos e depois do sorteio exigido pelo artigo 11.°, quando houver de effectuar-se.

§ 2.° Se a elegibilidade de algum deputado eleito for contestada por outra membro da camara, e os fundamentos da contestação não tiverem sido submettidos ao tribunal de verificação de poderes e por este apreciados, o deputado eleito não será proclamado sem a junta preparatoria ou a camara se haver pronunciado, em escrutinio secreto, ácerca da elegibilidade contestada.

Art. 101.° O deputado eleito por mais de um circulo eleitoral representará o da naturalidade não sendo eleito por este, o da residencia; na falta d'este, o circulo em que tiver obtido maior numero de votos; e em igualdade do votos, o que a sorte designar.

Art. 102.° O deputado eleito póde livremente renunciar o seu logar de deputado, antes de tomar assento na camara, fazendo-o, assim constar por escripto á mesma camara.

Art. 103.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde renunciar o seu logar sem approvação d'ella.

Art. 104.° O deputado, depois de tomar assento na camara, não póde escusar-se a desempenhar as funcções do mesmo logar senão por cansa legitima e justificada perante a camara.

§ 1.º Se, contra o disposto n'este artigo, deixar de comparecer ás sessões por quinze dias consecutivos, será primeira e segunda vez convidado por officio do presidente, precedendo para esse fim deliberação da camara.

§ 2.º Se ainda apesar d'isso não se apresentar ou não justificar motivo que o impossibilite de comparecer, resolver-se-ha que perdeu o logar de deputado, o qual será declarado vago.

§ 3.° Esta vacatura não poderá ser declarada pela camara, sem que, primeiramente, pelo exame de uma commissão, á qual o assumpto seja commettido, se verifique terem-se pontualmente observado todas as solemnidades d'este artigo e seus paragraphos.

Art. 105.° Declarada a vacatura de qualquer logar de deputado ou annullada alguma eleição, nos termos do artigo 11.° ou do § 2.° do artigo 100.°, será este facto immediatamente communicado ao governo, para que mande proceder á eleição supplementar no praso de quarenta dias, desde a data da resolução da camara, se o circulo pertencer ao continente do reino e ilhas adjacentes, ou no mais breve praso que for compativel com as distancias e meios de communicação, se o circulo pertencer ao ultramar.

§ unico. Nos actos eleitoraes que houverem de repetir-se observar-se-hão as formalidades estabelecidas n'este decreto para a eleição geral de deputados.

CAPITULO IX

Disposições especiaes

Art. 106.° Nas provincias ultramarinas será nomeado pelo governador o vogal das commissões de recenseamento eleitoral, cuja nomeação incumbe no continente do reino á commissão districtal; presidirá á assembléa de apuramento da eleição de deputados nos circulos da séde das relações o respectivo presidente e nos outros o juiz de direito da comarca, preferindo o juiz da 1.ª vara na comarca em que houver mais de uma.

§ 1.° Nas mesmas provincias attender-se-ha, para o calculo da quantia exigida pelo artigo 1.°, a qualquer contribuição directa do estado, alem das designadas no artigo 25.°

§ 2.° Continúa em vigor o disposto no artigo 118.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852.

Art. 107.° Os governadores das provincias ultramarinas são auctorisadas a fixar, com os indispensaveis intervallos e attendendo ás distancias e meios de communicação, os prasos para as operações de organisação e revisão do recenseamento eleitoral e para os diversos actos das eleições.

§ unico. Os governadores civis dos districtos insulanos designarão os dias da installação das commissões de recenseamento para as operações do corrente anno nos concelhos onde, pela demora de communicações, não possam constituir-se na data por este decreto fixada, observando-se subsequentemente os prasos respectivos.

Art. 108.º No caso de annullação da eleição de algum circulo do ultramar, será chamado a represental-o o mesmo

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cidadão, que o representava na legislatura anterior, até que se apresente á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral do respectivo circulo.

Art. 109.° As funcções dos deputados pelas provincias ultramarinas cessam logo que finde a legislatura para que foram eleitos ou em que tomaram assento.

§ 1.° No caso, porém, da dissolução da camara os deputados das provincias ultramarinas continuarão a represental-as unicamente até que seja apresentado á camara, devidamente julgado, o processo eleitoral dos respectivos circulos.

§ 2.° Quando seja reduzido o numero de circulos das mesmas provincias serão chamados a represental-as, nos termos do paragrapho antecedente, os deputados da anterior legislatura pela ordem designada no § 1.° do artigo 89.°

Art. 110.º Continuarão vigorando para as eleições municipaes as assembléas actualmente estabelecidas, excepto nos municipios de Lisboa e Porto, onde serão fixadas no decreto, que determinar a divisão dos circulos para os effeitos do § unico do artigo 43.° do codigo administrativo.

CAPITULO X

Disposições penaes, geraes e transitorias

Art. 111.° Os parochos, encarregados do registo criminal, officiaes do registo civil e escrivães de fazenda, que deixarem de remetter, nos prasos devidos, aos secretarios das commissões de recenseamento eleitoral as relações e informações a que são obrigados por este decreto para a organisação e revisão do recenseamento, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 112.° Os membros das commissões de recenseamento que deixarem de comparecer ás reuniões a que são obrigados ou que comparecendo deixarem de cumprir as obrigações que este decreto lhes impõe, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis por cada vez que o fizerem.

§ único. Na mesma pena incorrem todas as pessoas, auctoridades ou funccionarios, que deixarem de prestar qualquer esclarecimento ou informação exigido por este decreto para a organisação e revisão do recenseamento eleitoral.

Art. 113.° Os parochos, funccionarios e mais pessoas, a que se referem os dois artigos antecedentes, no caso de prestarem falsas declarações, incorrerão na pena de suspensão temporaria dos direitos politicos e na de prisão até seis mezes.

§ unico. Incorrerá na pena de suspensão o escrivão de fazenda que omittir o nome de qualquer contribuinte nas relações que é obrigado a fornecer para a organisação ou revisão do recenseamento eleitoral e, no caso de reincidencia, será demittido.

Art. 114.° Os portadores das actas, que deixarem de comparecer na assembléa de apuramento, no local, dia e hora marcado por este decreto, ou que comparecendo ahi deixarem de cumprir as obrigações que este decreto lhes impõe, incorrerão uma multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 115.° As auctoridades administrativas ou ecclesiasticas que deixarem de comparecer nas assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, para os fins indicados por este decreto, os cidadãos eleitos para vogaes effectivos ou supplentes da mesa que se recusarem a servir ou cumprir alguma obrigação que lhes for incumbida, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis.

Art. 116.° Os presidentes de quaesquer assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, que não comparecerem para presidir ás respectivas assembléas no dia, hora e local competente, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis.

§ 1.° E se, deixando de comparecer por impossibilidade absoluta, não mandarem entregar no mesmo local, ao presidente que a assembléa houver escolhido para o substituir, todos os papeis concernentes á eleição que lhes houverem sido entregues, em virtude d'este decreto, uma hora depois d'aquella a que se refere o principio d'este artigo, incorrerão na multa de 100$000 a 200$000 réis.

§ 2.° Serão punidos com a mesma pena aquelles que começarem ou interromperem os actos eleitoraes antes das toras marcadas n'este decreto.

Art. 117.° As auctoridades que se negarem a passar, dentro de tres dias ou de outro que especialmente estiver fixado, as copias, certidões ou attestados que lhes forem pedidos, para demonstração de algum direito garantido por este decreto, ou que por qualquer modo embaraçarem, ou com qualquer pretexto demorarem a passagem d'esses documentos ou entrega de quaesquer outros que hes hajam sido confiados, incorrerão na multa de 50$000 a 200$000 réis, e soffrerão a pena de suspensão do emprego pelo espaço de seis mezes a um anno.

§ unico. Se d'este procedimento da auctoridade resultar para algum cidadão a perda do exercicio do direito eleitoral ou de elegibilidade, a multa será duplicada e a pena será de prisão de seis mezes a um anno.

Art. 118.° O secretario da camara municipal ou da administração do bairro, que deixar de cumprir as obrigações presencias n'este decreto, incorrerá na multa de réis 100$000 a 200$000, e no caso de reincidencia, na pena de demissão.

§ unico. Na mesma pena incorrerão os escrivães de direito, que não cumprirem as obrigações, que por este decreto especialmente lhes incumbem.

Art. 119.° Os juizes, de qualquer ordem ou gerarchia, que deixarem de cumprir, dentro dos prasos fixados por este decreto, as obrigações que elle lhes impõe, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis e soffrerão a pena de dois a seis mezes de suspensão.

Art. 120.° Todas e quaesquer pessoas particulares ou auctoridades, ás quaes individual ou collectivamente, seja imposta por este decreto alguma obrigação, se deixaram de a cumprir, incorrerão na multa de 40$000 a 100$000 réis, quando outra pena lhes não seja comminada por alguma disposição especial d'elle.

Art. 121.° Todos aquelles que se fizerem inscrever a si ou a outros, ou concorrerem para que elles proprios ou esses outros sejam inscriptos no recenseamento, com falso nome ou falsa qualidade, ou encobrindo ou concorrendo para que se encubra uma incapacidade prevista na lei, ou tiverem feito ou concorrido para que se faça a inscripção de um mesmo eleitor em duas ou mais listas de recenseamento, incorrerão na pena de suspensão dos direitos politicos por tempo não inferior a seis annos e na multa de 50$000 a 200$000 réis.

§ unico. Todos aquelles que, sendo encarregados por este decreto de fazer o recenseamento dos eleitores o elegiveis, inscreverem ou deixarem de inscrever indevidamente e com dolo no recenseamento qualquer cidadão, serão punidos com a pena duplicada.

Art. 122.° Todo aquelle que, tendo perdido o direito de votar por algum dos motivos indicados n'este decreto, votar, não obstante isso, será punido com a pena de prisão de quinze dias a tres mezes e multa de 10$000 a 50$000 réis.

Art. 123.° Todo aquelle que votar em qualquer assembléa eleitoral, quer seja em virtude de uma inscripção obtida ilegitimamente pelo modo previsto no artigo 121.º quer seja tomando falsamente os nomes e as qualidades de um outro eleitor inscripto, será punido com a pena de prisão de um mez a um anno e multa de 20$000 a 100$000 réis.

§ unico. Será punido com a mesma pena todo o cidadão que se aproveitar de uma inscripção multipla para votar mais de uma vez.

Art. 124.° Todos aquelles que falsificarem ou concorrerem para que seja falsificado o escrutínio: acceitando

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listas declaradas illegaes por este decreto ou contando os votos que ellas contiverem; pondo ou consentindo que se ponha nota de descarga em eleitores que não votaram; introduzindo illegalmente listas na urna, tirando ou substituindo as que n'ella tiverem sido legalmente lançadas; trocando na leitura das listas o nome aos votados, ou diminuindo votos a uns, e acrescentando-os a outros no acto de os assentarem; ou falsificando por qualquer modo a verdade da eleição; serão punidos, em qualquer d'estes casos, com a pena de prisão não inferior a dois annos e multa de 200$000 a 1:000$000 réis.

Art. 126.° Incorrerão na pena comminada pelo artigo anterior todos aquelles que por qualquer maneira falsificarem o recenseamento, nos cadernos que forem enviados pelos commissões aos presidentes das assembléas eleitoraes primarias, ou quaesquer outros documentos que por elles lhes forem remettidos; todos aquelles que falsificarem os cadernos, actas e mais papeis respectivos á eleição que peias diversas vias estabelecidas por este decreto devem ser remettidas ás assembléas de apuramento; e em geral todos aquelles que falsificarem, concorrerem para que se falsifique ou consentirem que se falsifique qualquer documento respectivo ao recenseamento ou ás eleições; e ainda aquelles que deixarem extraviar estes documentos, havendo-lhe sido confiados.

Art. 126.° Todos os portadores das actas que na assembléa do apuramento, contra a disposição do artigo 87.° d'este artigo, as annullarem, por quaesquer motivos que não sejam o de falta de genuidade o authenticidade expressamente marcados n'este decreto; que deixarem com qualquer fundamento de contar os votos aos cidadãos votados ou de se conformar com as disposições do mesmo artigo em que lhe são taxativa, restricta e expressamente marcados os suas funcções; ou que por qualquer modo adulterarem a verdade da eleição, incorrerão na pena do prisão não inferior o dois annos, na multa de 200$000 a 1:000$000 réis, e na inhabilidade para todas as funcções publicas por espaço de seis annos.

Art. 127.º A cada um dos membros da assembléa primaria ou de apuramento, que se oppozer ao exacto cumprimento das disposições dos §§ 3.° e 4.° do artigo 54.°, dos preceitos do artigo 68.°, dos §§ 1.º e 2.° do artigo 74.°, do § unico do artigo 75.°, do § 2.° do artigo 76.° e do disposto no artigo 90.°, será applicada a pena de prisão de quinze dias a seis mezes e multa de 50$000 a 200$000 réis. O maximo da pena será sempre applicado nos mesmos termos ao presidente da assembléa.

Art. 128.° Aquelles que por via de noticias falsas, boatos calumniosos ou quaesquer outros artificios fraudulentos, suprehenderem ou desviarem votos, determinarem ou tentarem determinar um ou muitos eleitores a abster-se de votar, um ou muitos portadores de actas a deixar de cumprir as obrigações que lhes são impostos por este decreto, serão punidos com a pena de prisão de um mez a um anno e multa de 20$000 a 200$000 réis.

Art. 129.° Aquelles que por vias de facto, violencias ou ameaças contra um eleitor, fazendo-lhe receiar algum damno para a sua pessoa, familia ou fortuna, o determinarem ou tentarem determinar a votar ou abster-se de votar, influirem ou tentarem influir sobre o seu voto, serão punidos com a pena de prisão de dois mezes a dois annos o multa de 20$000 a 200$000 réis.

§ 1.° Se as vias de facto e violencias forem taes que mereçam pena maior que o maximo aqui estabelecido, serlhes-ha essa pena applicada.

§ 2.° Se o delinquente for funccionario publico a pena será de prisão de dois mezes a dois annos e suspensão dos direitos politicos até seis annos.

Art. 130.° Todo aquelle que entrar armado em uma assembléa eleitoral primaria ou de apuramento será punido com a pena de prisão de um a três mezes, e multa de 10$000 a 100$000 réis.

Art. 131.° A auctoridade militar, por cuja ordem alguma força armada se apresentar no local onde estiverem retinidas as assembléas eleitoraes ou na sua proximidade, sem requisição do respectivo presidente, contra o disposto no artigo 59.° d'este decreto, será punida com a pena de presidio militar até um anno.

§ 1.° Nenhuma ordem vocal auctorisará a infracção do referido artigo.

§ 2.° Nenhuma ordem por escripto revelará o infractor, excepto a original requisição do presidente da mesa.

Art. 132.° Todos aquelles que, por via de tumultos, vozearias ou quaesquer outras demonstrações ameaçadoras, pretenderem ou tentarem perturbar na operações da assembléa primaria ou de apuramento, ou attentarem contra o exercicio do direito eleitoral ou contra o liberdade de votos, e bem assim todos aquelles que em tumultos entrarem ou tentarem entrar, com violencia na assembléa eleitoral, com o fim de impedir a eleição de qualquer cidadão, ou de impor a de um outro, serão punidos com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multa de 100$000 a 500$000 réis.

§ unico, Se os delinquentes forem armados ou se o escrutinio for violado, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000. a 1:00$000 réis.

Art. 133.° Todos aquelles que, durante a reunião das assembléas eleitoraes primarias ou de apuramento, insultarem ou violentarem a mesa, ou lhe faltaram á devida obediencia, insultarem ou violentarem algum dos membros da assembléa, serão punidos com a pena de prisão de tres messes a dois annos, e multa de 50$000 a 500$000 réis.

§ 1.° Se o escrutinio for violado, a prisão não será inerior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis.

§ 2.º Se as violencias foram taes, que mereçam pela legislação commum pena maior, ser-lhes-ha essa applicada.

Art. 134.° Aquelle que roubar a urna com as listas recebidas, mas ainda não apuradas, ou roubar algumas listas, será punido com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e multo de 100$000 a 5:000$000 réis.

§ unico. Se o roubo for efectuado em tumulto e com violencia, a prisão não será inferior a dois annos e a multa será de 200$000 a 1:000$000 réis e, se a maior pena pela legislação commum couber ás violencias perpetradas, essa deverá applicar-se.

Art, 135.° Todas as auctoridades administrativas e policiaes, que por negligencia deixarem de empregar todos os meios á sua disposição para obstarem a que te pratiquem as contravenções o delictos prevenidos por este decreto dentro da área da sua jurisdicção, serão punidas com a pena de demissão ou suspensão do emprego, conforme o grau da culpa.

§ unico. Se o fizerem por malicia reputar-se-hão cumplices n'essas contravenções ou delictos, e como taes serão punidos com os penas que estiverem comminadas nos proprios delinquentes.

Art. 136." Todos os magistrados, auctoridades e empregados que nas circumscripções territoriaes, pelas quaes forem respectivamente inelegiveis, espalharem cartas, proclamações ou manifestos eleitorais, ou angariarem votos, serão punidos com a pena de prisão do um mez a um anno e suspensão de direitos politicos até seis annos.

Art. 137.º Será punida com a pena de prisão de seis mezes a dois annos e inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro a seis annos, toda a auctoridade, seja qual for a sua classe ou categoria, que no dia das eleições fizer, sob qualquer pretexto, e ainda mesmo por motivo de serviço publico, sair do seu domicilio ou permanecer fóra d'elle qualquer eleitor, para que não possa votar.

§ unico. Se, porém, o eleitor for empregado publico immediatamente subordinado a essa auctoridade, não incor-

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rerá ella na pena acima estabelecida, se por motivo de serviço publico, legitimo e indispensavel, e não tomado como mero pretexto, fizer que esse eleitor não possa exercer o seu direito.

Art. 138.° Será igualmente punida com a mesma pena toda a auctoridade que conduzir, por si ou por intermedio dos seus subordinados, os eleitores ao local da eleição para darem o seu voto ou os impedir ali de communicarem e tratarem com os outros para accordarem no melhor modo de exercerem o seu direito.

Art. 139.° É prohibido aos administradores de concelho, sob pena de inhabilidade para todos os cargos publicos por quatro annos, e multa de 50$000 a 200$000 réis, nomear cabos de policia quinze dias antes das eleições.

Art. 140.° As auctoridades administrativas ou policiaes, que deixarem de participar aos agentes do ministerio publico as contravenções e delictos previstos n'este decreto, e os agentes do ministerio publico que deixarem de immediatamente os perseguir, incorrem na pena de demissão e inhabilidade para qualquer emprego publico, por cinco a dez annos, alem da responsabilidade que por qualquer omissão ou negligencia lhes caiba para com a fazenda publica.

Art. 141.° Todas as contravenções e delictos, que offenderem as disposições d'este decreto ou o direito eleitoral e o exercicio d'elle, comprehendidos nos diversos artigos d'este capitulo, serão sempre perseguidos perante os tribunaes competentes, pelos respectivos agentes do ministerio publico, e tambem o podem ser por qualquer eleitor inscripto no recenseamento, instaurando-se o processo devido segundo a legislação em vigor.

Art. 142.° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'este decreto prescreve no praso de seis mezes desde que forem cummettidos.

Art. 143.° Para se perseguir por estes crimes um funccionario de qualquer ordem ou categoria, ou qualquer agente da auctoridade publica, não é necessaria auctorisação do governo.

Art. 144.° Os processos por estes crimes não suspendem em caso algum as operações eleitoraes, nem podem prejudicar o segredo do escrutinio.

Art. 145.° A condemnação, quando for pronunciada, não importará nunca a annullação da eleição declarada valida pelo tribunal competente.

Art. 146.° Continuam a ser permittidas todas as reuniões para objectos eleitoraes, tanto publicas como particulares, nos termos das leis e regulamentos respectivos.

Art. 147.° São extinctas as actuaes commissões de recenseamento, entregando-se ás camaras municipaes respectivas, para serem archivadas, todos os documentos que á data da publicação do presente decreto estiverem em poder d'ellas, e não terão seguimento algum os recursos que na mesma data estiverem pendentes em juizo sobre o recenseamento eleitoral, que era da competencia das alludidas commissões.

Art. 148.° Ficam revogados o decreto de 30 de setembro do 1852, as leis de 23 de novembro de 1859, de 8 de maio de 1878 e de 21 de maio de 1884 e toda a legislação em contrario..

O presidente do conselho de ministros, e os ministros e secretarios d'estado de todas as repartições, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 28 de março de 1896.= REI.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = João Ferreira Franco Pinto Castelo Branco = Antonio d'Azevedo Castello Branco = Luiz Augusto Pimentel Pinto = José Bento Ferreira de Almeida = Carlos Lobo d'Avila = Arthur Alberto de Campos Henriques.

Mappa aos circulos eleitoraes a que se refere o decreto d'esta data

[ver tabela na imagem]

Circulos desiguados pelos seus numeros e pelas suas sédes Area dos circulos Numeros de deputados que elege cada circulo

Paço, em 28 de março de 1896.= João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.

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Quadro dos presos para a organisação do recenseamento eleitoral no corrente anno

[ver tabela na imagem]

Operações Datas Prasos

Quadro dos prasos para as operações do recenseamento eleitoral nos annos futuros

[ver tabela na imagem]

Operações Datas Prasos

Peço, em 28 de março de 1896.= João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se quer que a discussão d'este projecto se faça por capitulos.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler se o capitulo I.

(Leu-se.)

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. João Arroyo: - Considera a discussão do projecto sob dois aspectos: o da convalescença do sr. ministro do reino e o da remodelação do systema eleitoral. No primeiro ponto de vista, congratula-se por ter hoje logar esta discussão; mas com respeito ao segundo não sente igual satisfação.

Estranha a facilidade com que se succedem as reformas eleitoraes. Ha apenas um anno que se promulgou um decreto remodelando profundamente a legislação eleitoral, e já hoje o mesmo sr. ministro do reino está de accordo com a commissão em introduzir alterações importantes n'essa remodelação. D'aqui resulta não poder elle, orador, confiar na efficacia dos discursos que se pronunciem; mas isto não o impedirá de manifestar a sua opinião, fazendo-o, todavia, sem intuitos partidarios, porque, nas circumstancias especiaes em que a actual camara se encontra, devo olhar-se a questão de alto e sem preoccupações politicas.

Em seguida, fazendo a resenha das phases por que tem passado na Europa o direito publico em materia eleitoral, o orador mostra como, entre nós, a lei de 1884 procurou pôr cobro aos abusos, remodelando a legislação anterior no sentido do só adoptar o principio da representação das minorias, o dos circulos plurinominaes nas capitães dos districtos, o das eleições por accumulação, e o do julgamento em um tribunal especial dos processos eleitoraes em que houvesse protestou nas assembléas primarias ou nas do apuramento.

Essa lei vigorou até 1895, e não foi sem magua que elle, orador, a viu deitar por terra, porque com ella vieram á camara opposições que deram exemplos da dedicação mais esforçada, no sentido de produzirem obra efficaz.

Praticaram, porventura, essas opposições alguns excessos; mas eram, incontestavelmente, compostas de homens que honraram as tradições gloriosas dos antigos parlamentares.

Allude o orador aos acontecimentos parlamentares de 1894, acontecimentos que determinaram a dissolução da camara e a remodelação eleitoral, e declara que, se então estivesse no poder, teria seguido diverso caminho d'aquelle que o governo seguiu. Em sua opinião, talvez que um adiamento trouxesse um periodo de tranquillisação, podendo-se depois realisar a sessão de 1895.

Entrando na analyse do projecto, diz que as bases do decreto do governo foram: a eleição por escrutinio de lista, o limito á existencia de certas classes no parlamento, taes como funccionarios publicos, medicos e advogados; o desenvolvimento do numero de elegibilidades, o alargamento do principio das incompatibilidades, e a entrega de processos eleitoraes ao julgamento de um tribunal especial.

Quanto a este ultimo ponto nada dirá, porque está de accordo com a disposição a que allude.

Com relação, porém, ao primeiro ponto - escrutinio de lista - observa o orador que este, sem a representação das minorias, se não fosse o esforço e muito boa vontade por parto de tres homens, teria dado em resultado sair uma camara um tudo nada incommoda, á força de ser favoravel.

Ácerca do limite ponto á existencia de certas classes na camara, acha comprehensivel o facto da applicação absoluta d'este principio, mas não comprehende que se especialisassem duas ou tres classes. No seu entender deveria haver para todos igual representação e iguaes garantias.

Quanto ao alargamento do principio das elegibilidades,

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comprehende que se declarassem incompativeis as funcções parlamentares com a profissão de armas, mas não comprehende que se faça excepção para os officiaes inferiores e para os officiaes generaes, porque, alem de outras rasões, quanto mais alta é a funcção do commando, mais necessaria é a applicação d'aquelle principio.

O mesmo diz a respeito da magistratura. Ou as funcções judiciaes são incompativeis com as funcções parlamentares, e, n'esse caso, deviam ser exultados da camara os juizes de todas as instancias; ou não são, e então não deviam ser excluidos nenhuns.

Ainda com relação á representação do funccionalismo, accentua que nunca viu no parlamento o mais leve desgosto, cansado pelo facto de um director geral discutir com o seu ministro.

O sr. João Franco, na sua ambição de governar, ambição aliás justificada em todo o homem publico, fez-se jacobino, lançando-se abertamente no principio das incompatibilidades, que aliás não applicou em toda a sua amplitude, mas com excepções, que são verdadeiramente odiosas.

Comprehende o principio da incompatibilidade, mas applicado a todos pelo mesmo systema, com o mesmo criterio, com o mesmo rigor; porque, a seu ver, é tão incompativel o director de uma companhia, que uma vez tenha tido contratos com o governo, como o industrial, o commerciante ou o agricultor que no parlamento póde dedicar-se á defeza dos seus proprios interesses.

E assim, se não ha direito a impedir a entrada no parlamento ao industrial, ao commerciante e ao agricultor, como de facto não ha, tambem não ha direito, em nome de um principio jacobino, de lançar suspeições sobre homens que nunca deram motivo para isso.

Quanto á disposição do projecto que entrega o julgamento de todos os processos eleitoraes ao tribunal de verificação de poderes, repete que nada tem a dizer porque está de accordo com elle.

N'este ponto vinha ad hoc cumprir uma promessa que fizera ao sr. presidente do conselho, voltar-se para s. exa., como chefe da situação, lembrar-lhe as tradições do seu partido, as leis eleitoraes por esse partido promulgadas, e mostrar-lhe como é incomprehensivel que um homem novo, tendo a sen lado um outro homem novo, o sr. João Franco, cozesse de parte todas essas reformas, que eram uma gloria do partido regenerador.

Tambem era occasião de contar uma promettida anecdota a s. exa., mas como não está presente, ficará reservada para outra occasião.

O sr. Presidente: - Observo ao orador que já decorreu a hora em que pelo regimento lhe é permittido usar da palavra.

Vozes:- Falle, falle.

O sr. Presidente: - Cumpriu o seu dever, indicando a disposição regimental; mas em vista da manifestação da camara, póde o orador continuar.

O Orador: - Agradece e vae fazer agora, não dirá a mais severa das suas considerações, mas seguramente a mais desagradavel para o governo.

Tem visto que os partidos, no decorrer de longos annos, mudam profundamente as suas opiniões; tem visto homens d'estado, de alto valor, alterarem os programmas que defenderam; mas o que nunca viu, e agora vê pela primeira vez, é um governo que hontem pretendia salvar o paiz, estabelecendo o escrutinio por lista, vir pugnar hoje pelo restabelecimento dos circulos uninominaes, systema obsoleto, que na pratica tão maus resultados deu.

A contradicção é flagrante. Resta saber se houve alguma rasão que a justifique.

A situação dos partidos é a mesma que era ha um anno; a abstenção de um dos ramos da familia monarchica é hoje um facto como era n'esse tempo; a sequencia dos trabalhos parlamentares, se não mostra uma lucta parlamentar á mostra que, mostra que os projectos se discutem e estudam conforme as normas regulares de trabalho; os factos do ordem publica não accusam a mais pequena mudança ou alteração na opinião publica, e, finalmente, nem das corporações administrativas, nem das organisações de classe, nem das individualidades de valor, apparece qualquer indicação que mostre a necessidade de alterar o systema eleitoral decretado em 1895, e a necessidade do voltar desde já, immediatamente e sem demora, aos circulos uninominaes de 1884.

Não basta, portanto, justificar o principio dos circulos uninominaes; é necessario dizer os motivos por que, tão de repente, se poz de parte o escrutinio por lista.

Deseja que, quem lhe responder, lhe diga quaes são as consequencias d'esta reforma.

É uma dissolução parlamentar, ou a continuação da actual camara, depois de feita a reforma eleitoral?

Qualquer d'estas consequencias, deixa, a seu ver, o governo e a camara muito mal feridos e em pessima situação.

Bem sabe que lhe podem objectar que, conservado o numero de circulos e o censo, a reforma não modifica o corpo eleitoral; mas a isso responderá que, com o mesmo numero de circulos e de eleitores, se podem fazer todas as variações na gamma dos systemas eleitoraes, desde o mais absoluto ao mais radical.

Resta-lhe apreciar o projecto actual. N'esse projecto restabelecera-se, como já disse, os circulos uninominaes, e no relatorio sustenta-se a conveniencia do regresso a esse systema.

Não lê os periodicos em que esse assumpto é tratado, porque a camara toda os conhece; mas, em contraposição, oppõe-lhe o que se disse em 1884, por occasião de se estabelecerem os circulos uninominaes.

Relativamente á representação das minorias, não considera essa representação como um favor feito á opposição, mas como condição indispensavel de bom governo, porque não póde haver um bom governo constitucional, sem que uma larga fiscalisação se exerça.

Conclue o orador declarando que um dos melhores serviços que um governo, que queira melhorar o systema parlamentar, póde prestar ao paiz, é comprometter-se a, na opposição, sustentar a verdadeira doutrina, não dando lucta senão quando tiver rasão, e abstendo-se, por completo, do systema até agora seguido, de fazer politica em tudo e por tudo.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. haja revisto as notes tachygraphicas.)

O sr. Magalhães Lima: - Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa um parecer concordando com o da commissão de instrucção primaria e secundaria sobre os decretos dictatoriaes n.os 1 e 2 de 22 de agosto de 1894 que reformaram a organisação do ensino primario e secundario.

A imprimir.

O sr. Presidente: - Participo á camara que se acaba de receber na mesa um officio da camara dos dignos pares do reino acompanhando uma mensagem com a proposição de lei que tem por fim auctorisar o governo a mandar construir uma enfermaria annexa á penitenciaria central de Lisboa para criminosos alienados.

Esta proposição de lei vae ser enviada á commissão de legislação criminal, ouvida a de fazenda.

Mais participo á camara que a commissão de redacção não fez alteração aos projectos n.os 79 e 86.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Considera-se em situação difficil, tendo de responder a um discurso brilhantissimo, como foi o do sr. Arroyo, mas não podendo o sr. ministro do reino, por incommodo de saude, responder a s. exa., corre-lhe a elle, na qualidade de relator, a obrigação de o fazer.

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Fal-o-ha, porém, succintamente, limitando-se aos pontos principaes a que s. exa. se referiu.

Responde, em seguida, a diversas observações do orador precedente.

O illustre deputado tinha terminado o seu discurso, fazendo um appello ao governo para que, quando fosse opposição, não se deixasse levar pela paixão partidaria, e unicamente se inspirasse no interesse do paiz. Pela sua parte crê que este conselho será seguido; mas é certo que nem sempre a rasão tem imperio absoluto sobre as paixões, que tambem exigem para si o direito de expansão.

A suppressão das minorias o das accumulações foi determinada pelos inconvenientes que na pratica tinha dado esse systema, e que são por demais conhecidos para que elle, orador, venha tomar tempo á camara, expondo-os.

Não vê que s. exa. tenha rasão em se revoltar contra o principio das inelegibilidades e incompatibilidades, que não é um principio novo, pois que está estabelecido em varios paizes e que na pratica inconveniente algum apresenta.

Queria s. exa. que ou não houvesse incompatibilidades ou que ellas fossem extensivas igualmente a todas as classes, com o fundamento de que todos ellas são interessadas nas votações parlamentares.

Dirá apenas, a este respeito, quo ao passo que um director de uma companhia póde querer aproveitarão da sua situação de deputado para tratar dos interesses d'essa companhia, o industrial, o commerciante ou o agricultor, embora trate dos interesses da sua industria, trata tambem dos interesses geraes.

Não quer tambem s. exa. a limitação do numero para os empregados publicos e entende que, a estabelecer-se, seja extensiva ás demais classes sociaes. Elle, orador, entende que a limitação faz com que todas as classes possam ter logar no parlamento, o que anteriormente não succedia, pois que antes d'este principio estabelecido, as camaras eram quasi constituidas por uma só classe.

Não quer com isto dizer que as camaras anteriores não servissem com todo o zêlo ou interesses do paiz, mas é incontestavel que o paiz olhava essas camaras com uma certa desconfiança.

Quiz também s. exa. notar grande contradirão entre o projecto que se discute e o decreto de 1895, mas a verdade é que houve apenas uma pequena alteração, não lhe parecendo, por isto, que esta camara, que foi eleita pela lei de 1895, deva ter repugnancia em votar o projecto, tanto mais que essa alteração estava prevista desde que o governo, no relatorio do decreto, logo disse que a camara, na sua primeira reunião, modificaria a lei conforme a pratica o aconselhasse.

Alem d'isso, a modificação que se propõe era necessaria, porquanto; desde que um partido declarava que não queria partilhar as responsabilidades do governo, com uma lei como a que estava em vigor, era obrigação do governo e da camara transigir.

Concluo, dizendo que as clausulas estabelecidas no projecto em discussão, são sufficientes para o tornar uma obra boa. Hoje, organisadas como estão as commissões de recenseamento, toda a falsificação é impossivel, a não ser com cumplicidade da minoria.

(O discurso será publicado quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Teixeira de Sousa: - Mando para a mesa a ultima redacção do projecto n.° 76, relativo a execuções fiscaes.

Foi approvada.

O sr. Salgado de Araujo: - Falta muito pouco tempo para se levantar a sessão, mas serei rapido nas minhas considerações, mesmo porque não tenho thesouros de eloquencia, para exhibir perante os meus collegas; não gastarei, portanto, provavelmente, nem mesmo o tempo que falta.

Fallaram dois illustres parlamentares antigos, mais novos do que eu, mas mais antigos nas lides parlamentares; e portanto, com a proficiencia que lhes dão os seus largos annos de pratica d'estes trabalhos. Eu vou apresentar apenas o resultado do estudo, que posso ter feito n'estes quatro mezes de sessão que temos tido e o resultado das observações realisadas, segundo a minha fraca intelligencia o póde fazer, e que desejo apresentar á consideração do parlamento.

Essa observação tem do- ser procedida apenas do tres ou quatro palavras para fazer o elogio da lei que estamos discutindo. E tenho de fazer essa elogio porque se existe uma divergencia muito grande entre os que trabalham e os que dirigem, a lei eleitoral, que discutimos, veiu trazer o troço de união entre uns e outros.

Esta lei trouxe a convicção ao nosso espirito, e principalmente ao meu, do que quem a formulou, procurava verdadeiramente congraçar os forças do paiz, para as levar a uma consequencia proficua, que nos tirasse da situação a que tinhamos chegado; e que tinha, alem d'isso, a hombridade precisa, para arear com os dificuldades e attritos que se deviam levantar, ao transformar, de font en comble, tudo quanto estava feito, indo ferir interesses que estavam areados o que muitos julgavam até ser verdadeiros direitos, que não queriam ver prostergados.

Não se assuntem v. exas. se me vêem consultar notas que parecem muito grandes, são-me indispensaveis conto certa minucia para avivar-me a memoria, enfraquecida principalmente depois da doença, que me tem tirado algumas das forças que tive outr'ora, mas nem mesmo direi tudo para gostar pouco tempo.

Continuemos: por consequencia, a idéa de que o vida nova, a seriedade e a hombridade eram evidentemente ou fins, que os legisladores tiveram em vista, foi um dos incentivos, que me levaram a acceitar uma cadeira n'esta casa. Se não fosse isto, eu não teria vindo cá, e estou certo, que muitos dos meus collegas, que me ouvem, tambem não. (Apoiados.)

Estabelecido, portanto, este traço de união, vamos a ver o que acontece em virtude d'esta lei.

Acontece, não pela primeira parte, mas pela segunda, que as eleições se fizeram com muita facilidade, e que custaram muito baratas, cousa a que não estavamos acostumados. Isto já era uma vantagem e das mais importantes porque as eleições custavam muito caras não só pelo que se tinha do despender com ellas, mas ainda pelos compromissos quo se tomavam e não só o governo, mas os proprios deputados, que choios de compromissos vinham depois apoquentar os ministros para lh'os satisfazerem. Com esta camara creio que não succedeu isso, pelo menos eu até hoje ainda não pedi nada e espero ir até ao fim nas mesmas condições.

Estas são as vantagens, agora vejamos a difficuldade.

A difficuldade está n'um mal, que se fosse exagerado podia ser um bem.

A difficuldade é a eleição por lista, que dá em resultado não haver os pequenos combates em que uns ou outros, aqui ou alem, podiam vencer e em que o governo combatendo um pouco ás cegas, em guerra de guerrilhas precisava exercer uma força enorme para em toda a parte poder vencer. Apresentando, porém, batalha campal, como é a eleição por districto, o governo com facilidade póde vencer porque dispõe do outros elementos, e isso foi tão reconhecido pela opposição, que não se apresentou a combater, pois sã julgava de antemão vencido.

Ora, sr. presidente, a minha idéa consiste em exagerar este mal, mas dar-lhe correctivos que possam tornal-o um bem, e por consequencia em logar d'estas pequenas batalhas fazer uma grande batalha, a batalha de todos os votos contra todos os votos.

Eu apresentarei uma proposta n'este sentido, que não espero que seja aprovada, mas que desejo fique consi-

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1360 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gnada, porque se não for utilisada d'esta vez, póde ser que mais tarde o venha ser.

Pelo que tenho observado, os governos até agora vencem sempre, por consequencia, devemos partir do principio de que o governo na de vencer e n'esse caso o que precisamos é de ter ao pé dos governos uma opposição, porque isso é uma verdadeira necessidade, não só como representação do paiz, como necessidade para o funccionamento da propria camara.

Um governo, como ha pouco disse o sr. Arroyo, que tivesse uma maioria tão compacta que fosse continuamente da sua opinião, seguramente que não dava vida nenhuma a esta camara, por consequencia, é necessario que haja uma opposição bem organisada, fazendo opposição unicamente quando julgue ter rasão ou quando o governo não tenha cumprido o seu dever. Eu podia trazer exemplos de que os governos têem as maiorias que querem. Fontes realisou as eleições em 1878 com uma enorme maioria o que não o impediu de caír em 1879.

O mesmo estadista mais tarde teve uma eleição em que só deixou entrar na camara 6 deputados progressistas; á sua vez os progressistas, estando no governo em 1886, em 164 deputados tiveram 124. Isto prova que os governos hão de fatalmente vencer; logo havemos de trabalhar debaixo do ponto de vista que o governo ha de ter maioria.

Os remedios que se prescreveram até agora contra estes males foram a representação das minorias e as accumulações, tendo sido estas, como ouvi dizer ao sr. Dias Ferreira, empolgados tambem pelo governo a curto trecho. Os deputados por accumulação eram uns certos individuos que, segundo s. exa. aqui disse, appareciam de um dia para o outro com uma popularidade por esse paiz fóra, que ninguem antes lhes suspeitava.

Tendo-se, portanto, oscillado entre o escrutinio de lista e o circulo uninominal, não temos saldo de um circulo vicioso nem attingido cousa alguma de bom e de verdadeiramente util.

Referindo-me, ainda outra vez, ás incompatibilidades, direi, em contraposição á idéa do sr. Arroyo, que se mostrou receioso da invasão das outras classes no parlamento, que o que se estava dando era o inverso d'isto.

Os politicos é que estão invadindo as instituições lá de fóra, porque uma parte das sociedades de credito, sociedades importantes que tinham contratos com o governo estavam sendo dirigidas por homens publicos, como, por exemplo, a companhia das aguas, onde estava o sr. Arroyo, a companhia de credito predial, os caminhos de ferro, e por ultimo, todas as que dependiam do governo, indo procurar os influentes politicos para poderem obter todas as vantagens de que careciam para bem poderem viver.

Feita esta observação vou dizer ainda um pouco a respeito do diploma em discussão, quanto á representação das diversas classes do paiz.

Esta lei póde dizer- se que estabeleceu a conformação atomica da molecula.

Esta constituição, pois, dá-nos a forma physica, por assim dizer, d'este grande corpo, que se chama sociedade portugueza, mas a esta fórma physica falta-lhe uma cousa especial: a alma. Esta é a orientação politica.

Alem de representar as diversas e variadas manifestações de actividade, as chamadas forças vivas do paiz, era necessario que o parlamento representasse tambem as diversas orientações politicas; isto é, que fossem aqui representados os partidos regenerador, progressista, legitimista, ou qualquer outro. Para obter isto vae apresentar e justificar em poucos minutos a seguinte proposta.

(Leu)

Permitta-me agora a camara que eu exemplifique.

O numero total das listas entradas na urna em todo o reino e ilhas é de 600:000, por exemplo, das quaes a commissão A teve 450:000, a commissão B 120:000, a commissão C 26:000 e a commissão D 4:000. 600:000 votos, divididos por 120 deputados, dá 5:000 votos para cada um. Logo, a commissão D que obteve 4:000 votos, está excluida. A commissão A obteve 450:000, o que é superior a dois terços de 600:000; portanto, só tem direito a nomear dois terços de deputados, ou sejam 80.

Ficam 40 deputados que serão nomeados pelas commissões B e C que obtiveram 146:000 votos. A proporção é como segue:

146:000:40:: 120:000: x - Dá x:=32

146:000:40:: 26:000: x - Dá x = 7

Tem a commissão B direito a nomear 32 deputados.

Tem a commissão C direito a ções a seu favor 1. Total 40.

Assim o eleitor tem toda a certeza de que o seu voto é utilisado. Nas eleições anteriores dizia elle que não ia lá por que nada serviria isso, emquanto que da maneira que eu proponho deve ter toda a vontade de votar, pois tem a certeza que o seu voto utilisa ao seu partido e que póde até, em certos casos, valer um deputado, quando a fracção possa accidentalmente estar tão vizinha da quantidade de votos necessaria para eleger um deputado, que com mais um voto a attinja.

É assim que se chamam os eleitores á urna, e por outro lado, segundo este systema, conhece-se a evolução progressiva ou decrescente dos diversos partidos e fracções politicas; vê-se quantos são os adeptos de tal ou tal partido, quando está na opposição se entende, porque - quando está no governo tem os seus factores especiaes - constatando-se se obteve mais ou menos um voto n'este anno ou nos annos preteritos; vêmos mais ou menos, se as idéas novas vão tomando incremento que as torne em factores apreciaveis.

Por esta fórma dá-se ainda a seguinte circumstancia: as diversas commissões podem eleger logo os seus deputados, sujeitando o numero áquella fórma ou lotação que está na proposta, emquanto que de outro feitio, teremos muitas vezes de recorrer ao sorteio, que póde ser muito prejudicial.

Por exemplo, são eleitos medicos ou advogados, alem de vinte, e adoptando-se o sorteio, sáem para fóra exactamente aquelles que ao partido mais convem, e ficam outros, com que o partido menos se importa. É esse um dos inconvenientes do sorteio, inconveniente que não se dá com esta proposta, porque a commissão póde apresentar a sua lotação de deputados com a proporção estabelecida na lei.

(Leu.)

Tudo aquillo que por esta fórma se não ache adaptado á lei proposta, isso se póde perfeitamente harmonisar, e visto que a hora está a dar, nada mais direi.

(Interrupção.)

A minha consciencia diz-me que ella presta e, ao menos, é alguma cousa nova: não é estabelecer os circulos uninominaes, para depois ir aos pluronimaes, seguindo-se depois o escrutinio de lista para se voltar de novo ao que todos nós já sabemos o que é e aqui mesmo tem sido condemnado.

Mando para a mesa a minha proposta, que v. exa. apreciarão.

Leu-se a seguinte:

Proposta

Substituição:

Artigo 40.° O reino de Portugal com as ilhas adjacentes será representado em côrtes por 120 deputados e as provincias ultramarinas por 6.

Artigo 41.° Constituir-se-hão por iniciativa propria commissões que se denominarão "commissões eleitoras".

§ 1.° A todos os portugueses é licito constituirem e fa-

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serem parte deusas commissões, comtanto que sejam cidadãos elegiveis.

§ 2.° As commissões serão compostas de sete membros, elegendo entre si um presidente e um secretario.

Artigo 42.º São as "commissões eleitoras" que se offerecem ao suffragio geral do paiz, e só ellas terão o direito de nomear deputados na proporção dos votos que cada uma obtiver.

§ 1.° A proporção achar-se-ha sommando o numero total das listas entradas nas urnas eleitoraes no continente e ilhas adjacentes, e dividindo por 120, que é o numero de deputados a eleger.

§ 2.º O quociente d'aquella divisão, desprezada qualquer fracção, representa o numero de votos necessario para nomear um deputado, e as commissões que tenham obtido menos, ficam sem direito a tal nomeação.

§ 3.° Por cada quantidade de votos obtidos igual ao referido quociente, desprezada qualquer fracção, terão as commissões direito a nomear um deputado.

§ 4.° O beneficio das fracções reverterá a favor das commissões que menor numero de deputados tiverem anomear.

Artigo 43.° Nenhuma commissão, seja qual for o numero de votos obtidos, poderá nomear mais do dois terços do numero total dos deputados, ou sejam 80.

§ unico. Dado este caso, o outro terço, ou sejam 40, será dividido pelas outras commissões em proporção.

Artigo 44.° Quando os deputados nomeados pelas commissões forem excluidos por facto de sorteio ou outro, as commissões nomearão immediatamente entre deputado para o substituir. = Salgado de Araujo.

Exemplo

Numero total das listas entradas nas urnas em todo o reino e ilhas adjacentes 600:000

Das quaes a commissão A teve 450:000

A commissão B teve 120:000

A commissão C teve 26:000

A commissão D teve 4:000

600:000

600:000 votos por 120 deputados são 5:000 votos por deputado.

Logo a commissão D, que obteve 4:000, está excluida.

A commissão A obteve 450:000, que é superior a dois terços de 600:000, portanto, só tem direito a nomear dois terços dos deputados, ou sejam 80.

Ficam 40 deputados a serem nomeados pelas commissões B e C, que obtiveram 146:000 votos.

A proporção é como segue:

148:000:40:: 120: x, dá x = a 32

146:000:40:: 26:000: x, dá x = a 7

Tem a commissão B direito a nomear 32 deputados

Tem a commissão C direito a nomear 7 "

E mais das fracções a seu favor 1 "

Total 40 "

Foi admittida e ficou em discussão conjunctamente com o projecto.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada e mais o projecto n.° 87.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Documentos enviados para a mesa n'esta sessão

Representações

De representantes do congresso das sociedades cooperativas do Porto e Villa Nova de Gaia contra as propostas de fazenda.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho e enviada á commissão de fazendo.

Da camara municipal da Gollegã, pedindo que seja modificado o decreto de 4 de janeiro ultimo no sentido de serem partilhados mais equitativamente os encargos que pesam sobre o antigo concelho de Santarem, e de se lhe dar tambem a parte que lhe cabe das dividas activas e outros bens que á data de 25 de novembro de 1895 possuia a referida camara.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho e enviada a commissão de administração publica.

Da camara municipal do concelho de Bouças, districto do Porto, pedindo que o mesmo concelho faça parte do circulo eleitoral do Porto, sendo desligado do concelho de Gondomar, ao qual se acha reunido.

Remettida em officio do governo civil do Porto e enviada á commissão de administrarão publica.

Dos escrivães de direito da comarca de Lisboa, directores da associação de empregados do fôro portuguez, pedindo varias modificações no projecto de lei de 24 do corrente, que altera a tabella judicial em vigor (decreto n.° 2, de 22 de maio de 1895).

Apresentada pelo sr. deputado Mendes Lima e enviada á commissão de legislação civil.

Dos ex-arbitradores da comarca de Valle Passos, representando contra o decreto de 15 de setembro de 1892, que revogou o artigo 37.° do decreto de 20 de julho de 1886 e regulamento de 17 de março de 1887.

Apresentada pelo sr. deputado Carneiro de Moura e enviada á commissão de legislação civil.

De diversos habitantes da freguesia de Freiria, pedindo que esta freguezia fique pertencendo ao concelho de Mafra.

Apresentada pelo sr. deputado Costa Pinto e enviada á commissão de administração publica.

Dos amanuenses apontadores da direcção das obras publicas do districto de Bragança, pedindo que se lhes conceda viajar com o abatimento de 50 por cento nos caminhos de ferro do estado, á similhança do que se pratica com outros funccionarios.

Apresentada pelo sr. deputado Abilio Beça e enviada á commissão de obras publicas.

De differentes ex-officiaes inferiores do exercito ao serviço do ministerio da guerra, pedindo que seja annullada a classificação do ex-musico de 3.ª classe reformado Antonio Xavier de Brito e Silva.

Apresentada pelo sr. deputado Torneira de Sousa, enviada á commissão de guerra e mandada publicar no Diario do governo.

De alumnos do curso do 3.° anno de preparatorios medicos da universidade de Coimbra, pedindo dispensa do exame de allemão até ao 3.° anno daquella faculdade.

Apresentada pelo sr. deputado Teixeira de Sousa e enviada á commissão de instrucção publica e superior.

Justificação de faltas

Cumpre-me declarar a v. exa. que tenho faltado ás ultimas sessões d'esta camara por motivo justificado, = O deputado, Quirino Avelino de Jesus.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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