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Palmella é uma villa que tem 700 fogos, mas em cujas immediações ha differentes aldeias na distancia de 1 até 2 leguas ao norte e poente, as quaes têem tambem approximadamente outros 700 fogos, sendo o total pelas ultimas estatisticas de 1:396 fogos, faltando apenas 4 fogos para 1:400. O augmento da cultura, devido á influencia do caminho de ferro, tem para ali chamado maior população.

Quando se procedeu á reforma da divisão territorial pelo decreto de 24 de outubro de 1855, nenhum concelho com 1:200 fogos foi supprimido no districto de Lisboa, e já se vê que bastava esta circumstancia para se conhecer que estes povos, pelo augmento que têem tido, estavam no caso de reconquistarem (para assim dizer) os seus fóros municipaes.

Mas disse o meu nobre amigo, o sr. Aragão Mascarenhas: «Se todos estes povos formassem um só fóco de povoação, ainda bem, mas estes povos estão a uma distancia de Palmella tão grande como Palmella está de Setubal, e já que se incommodam em ir até aquella villa, bem podem ir até Setubal que lhes fica mais adiante». Mas esta rasão do nobre deputado é na verdade pouco convincente, pois se se incommodam os povos percorrendo uma distancia curta, é uma rasão sufficiente para que essa distancia se prolongue? Não lhes será mais conveniente terem apenas um incommodo como um, percorrendo uma distancia menor, do que terem um incommodo como dois, percorrendo uma distancia maior? E os povos que residem em Palmella não ficariam livres do incommodo de irem a Setubal? Mas s. ex.ª entendeu que não haveria direito a reconstruir estes concelhos senão se os povos formassem um só fóco, um só corpo de população! Não percebo a finura do argumento.

Os povos de Azeitão estão todos mais distantes, porque estão todos na distancia de pouco mais de 2 leguas. O antigo concelho consistia em duas villas que são: Villa Nogueira e Villa Fresca; e seis aldeias que são: Camarate, Pinheiros, Vendas, Aldeia de Irmãs, Aldeia Rica, Aldeia de Oleiros e Coina a Velha. Estes povos occupam uma extensão de 6 kilometros approximadamente, e estão separados de Setubal por duas serras e por uma distancia de mais de 2 leguas. Ora já se vê, que pelo simples facto de estar uma povoação d'esta ordem a uma distancia de mais de 2 leguas de Setubal, se revela um interesse separado e distincto. É preciso olhar para os factos naturaes e aprecia-los como elles devem ser.

Mas, pelo decreto de 24 de outubro de 1855, aggregaram se todos estes povos, e os de Palmella a Setubal, e não se olhou a que todos elles tinham interesses distinctos e separados. Amalgamar assim povos com interesses distinctos, é não só contrariar os principios constitutivos das municipalidades, mas força-los a uma situação inteiramente desagradavel e insustentavel por demasiadamente iniqua.

O sr. deputado Aragão Mascarenhas perguntou se a camara municipal de Setubal tinha sido ouvida sobre o projecto que se discute, e preveniu esta camara, chamando a sua attenção para este objecto, e para que notasse que se pretendia nada menos que desorganisar o concelho de Setubal.

Oh! sr. presidente, eu sou portador de uma representação da camara municipal, a qual, sabendo que o parlamento se occupava deste assumpto, pediu-me para a apresentar nesta occasião, fazendo ver a esta camara qual é a sua opinião a este respeito. Eu não lerei toda a representação á camara para não abusar da sua benevolencia; mas lerei apenas alguns trechos para a camara ver como aquella municipalidade aprecia o projecto de lei que se discute, e cuja approvação ella pede.

Depois de mencionar o inconveniente de amalgamar povos que têem interesses distinctos, diz o seguinte:

«Em Setubal, povoação do litoral, predominam os interesses artísticos, commerciaes e maritimos. Em Azeitão e Palmella, povoações internadas, predominam os interesses agricolas. Setubal, cidade de 17:000 almas, tem necessidades que são desconhecidas n'aquellas povoações ruraes. Tem illuminação publica por meio de gaz, em que annualmente se gastam 3:600$000 réis, sem que aproveite em cousa alguma aquellas povoações; faz annualmente a despeza de 2:500$000 réis com a limpeza das ruas, canos e valias, por bem da salubridade publica, sem que aquell'outros povos tirem d'ahi vantagem. Subsidia um lyceu de instrucção primaria e secundaria, que tambem não aproveita aquelles povos por ficarem distantes; faz despezas com jardins e passeios publicos que aquelles povos não gosam; e em seus poços, suas fontes, seus chafarizes e seus aqueductos póde dizer-se que não bebem os habitantes d'aquellas povoações. Com que direito pois se hão de conservar reunidos em um só concelho povos com interesses tão distinctos? Será justo que os povos de Azeitão e de Palmella contribuam para todas aquellas despezas, sem que possam quinhoar nas vantagens que d'ellas resultam?»

Aqui está, sr. presidente, como a camara menciona a diversidade de interesses que ha n'estas povoações, e como fazendo-se, pelos cofres municipaes, despezas avultadas em beneficio apenas da cidade, contribuem para estas despezas povos que estão arredados, e por consequencia sem poderem gosar das vantagens que d'ellas devem resultar. Houve nunca uma injustiça mais flagrante?

Ora agora se nós por um momento imaginarmos os sacrificios que fazem estes povos quando têem qualquer dependencia da cabeça do concelho, como, por exemplo, uma licença para venda, uma reclamação para tirar um filho do recrutamento, e mil outras dependencias que têem os povos das cabeças do concelho, ver-se-ha que sobre estes cidadãos pésa um tributo indirecto elevadissimo, que onera gravemente aquelles povos, e que se traduz não só na perda do seu tempo, capital preciosissimo, mas nos transportes e mais despezas que são obrigados a fazer emquanto estão fóra de suas casas. E estes inconvenientes, que são dignos de toda a attenção sob o ponto de vista municipal e administrativo, aggravam-se consideravelmente sob o ponto de vista das relações judiciaes.

O nobre deputado, o sr. Aragão Mascarenhas, sem duvida para fazer effeito, disse: «Já ouviram o parecer do sr. ministro da justiça? Querem desorganisar uma comarca? Querem resuscitar dois julgados e os juizes ordinarios? Querem resuscitar essa instituição tão odiosa que o decreto de 24 de outubro de 1855 teve em vista reduzir e cercear?»

Eu, sr. presidente, não sei se os juizes ordinarios são bons ou maus: se são bons, ponhamos onde devem estar; se são maus, não os ponham em parte nenhuma. O que eu digo, sr. presidente, é que se servem em uma parte, tambem servem n'outra. Dêem aos juizes o nome que quizerem, mas é certo que sem justiça local e barata não se satisfazem as necessidades do paiz sob este importante ponto de vista (apoiados).

Disse o nobre deputado: «Querem que a tão curta distancia, para se verificar uma citação, seja necessario uma deprecada?!» Admira-me que o nobre deputado, o sr. Aragão Mascarenhas, que é um jurisconsulto abalisado e um juiz distincto, esquecesse por momentos que dentro da mesma comarca as citações não se fazem por deprecada, fazem-se por simples mandado, visado pela justiça local (apoiados).

Pelo projecto que se discute, sr. presidente, não se pretende desfazer comarca alguma, a comarca fica a mesma; mas se o nobre deputado se preoccupou com a diminuição de interesses que porventura poderiam ter os magistrados que exercessem as funcções de justiça n'aquella comarca, parece-me que s. ex.ª ainda assim apreciou mal os resultados do projecto. Espero convence-lo completamente.

Quando existiam os juizos ordinarios havia em cada um d'elles dois escrivães, e havia tal movimento forense que era sufficiente para lhes dar meios de subsistencia. Mas desde que se supprimiram estes julgados não tem apparecido numero de causas em proporção na cabeça da comarca. Talvez não tenham havido vinte causas no espaço de nove annos, e a rasão é obvia.

Supponhamos que n'um destes julgados ha um homem offendido nos seus direitos de propriedade e quer recorrer aos tribunaes. Tem de fazer uma longa jornada para levar o requerimento a despachar; se tem a fortuna de achar o juiz, e consegue emfim o despacho para a primeira citação, ei-lo em procura de um official de diligencias para ir effectua-la. Não o encontra que queira ir a tão grande distancia pelo preço da tabella judicial; da parte do official apresentam-se sempre mil evasivas, aliás bem conhecidas, para não ir verificar a citação a tão grande distancia e com tão escassa remuneração. Nestas circumstancias que fazer? Vê-se obrigado a gratificar o official de diligencias com uma quantia maior do que a que marca a tabella; e o resultado é que lhe sáe tão cara a justiça, que prefere antes soffrer o vexame do que recorrer aos tribunaes. Isto não póde continuar assim (apoiados).

Eis-aqui a rasão por que aquelles povos estão sendo vexados nos seus direitos, soffrendo muito com este estado de cousas; e não vêem outro melhoramento possivel senão na reconstrucção dos seus concelhos e dos seus julgados.

Já vê portanto o nobre deputado que, bem longe de se diminuírem os proventos dos magistrados judiciaes com a reorganisação dos julgados, pelo contrario hão de augmentar; porque ha de haver maior numero de causas, as quaes, subindo á cabeça de comarca, quer para julgamento, quer por appellação, não desfalcarão aquelles proventos, e ficarão attendidas as commodidades e direitos dos povos.

Ninguem supponha que, reconstruindo-se os concelhos de Palmella e de Azeitão, ficam elles sendo os mais pequenos do districto de Lisboa. Eu tenho aqui a estatistica do numero de fogos de todos os concelhos do districto de Lisboa, e por ella se vê que, ficando o concelho de Palmella com 1:400 fogos, será dos maiores do districto. Maior que o do Seixal, que o de Cezimbra, que o do Barreiro, que o da Moita, que o de Aldeia Gallega do Ribatejo, que o de Alcochete e que o de Grandola, os quaes todos não chegam a ter 1:200 fogos cada um. E maior tambem que os novamente reconstruídos de Souzel e Salvaterra de Magos, os quaes tambem nem chegam a ter este numero de fogos. E o concelho de Azeitão ficará maior que o do Barreiro, que o de Alcochete e que o de Grandola no districto de Lisboa, e que o de Salvaterra no districto de Santarem.

Note porém a camara que, de mais a mais, não é pelo numero de fogos que nos havemos de guiar para a divisão territorial; porque a verdade é que não se póde fixar uma regra certa e invariavel para se poder fazer essa divisão. Isto varia conforme as conveniencias dos povos e suas variadissimas circumstancias. Povoações haverá com maior numero de fogos que, tendo-se em vista outras circumstancias, como, por exemplo, a da grande distancia a que ficam de outros povos, devam por isso formar um concelho separado.

Desenganemo-nos de que a reforma da divisão territorial não se póde fazer em globo. Eu tenho ouvido dizer muita vez nesta camara que essa reforma não se póde fazer a retalho; mas creio que bem analysado este principio, todos se vão convencendo de que no fim de contas não passa de um lindo nada. A reforma da divisão territorial não se póde fazer de um jacto; e não é nenhuma peça de fundição que se perca se for feita de outra maneira; ella deve ser feita em attenção ás differentes condições dos povos e aos differentes requisitos das localidades. Por consequencia hão de modificar-se os principios e as regras que se queiram estabelecer, tantas vezes quantas ellas tenham de ser applicadas.

Alem d'isto a camara tem seguido ultimamente um caminho que está inteiramente de accordo com esta doutrina. Pois não se reconstruiu no Algarve o concelho de Aljezur, no Alemtejo o de Souzel, no districto de Santarem o de Salvaterra de Magos, e no de Lisboa o concelho da Moita? E não se diga agora que não se deve applicar o mesmo principio á reconstrucção dos concelhos de Palmella e Azeitão. Pois donde vem esta justiça, esta jurisprudencia, que manda applicar um principio á reconstrucção de uns concelhos, e manda applicar o principio opposto á reconstrucção de outros concelhos? Seria uma falta de justiça distributiva, que um parlamento liberal, tão distincto como este é, de maneira nenhuma póde praticar. Os povos de que se trata já custearam por seculos as despezas de suas municipalidades.

Já vê pois a camara que estes povos, alem de terem o pessoal necessario, têem tambem os meios sufficientes para terem o seu governo local. E sendo certo que da falta desse governo lhe resultam grandes vexames, eu entendo que se lhe deve applicar o mesmo principio que se tem em vista para reconstrucção de outros concelhos; e confiu muito na rectidão e imparcialidade da camara, que não deixará de dar o seu voto de approvação ao projecto que está em discussão, para se destruirem os effeitos da injusta dependencia em que estão do concelho de Setubal, com o qual não tem homogeneidade de interesses.

Mando para a mesa a representação da camara municipal de Setubal em que se pede a approvação deste projecto de lei; e peço á camara se digne attender a que aquella distincta municipalidade não faria este pedido se elle não fosse da maior justiça e equidade (apoiados).

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que a doutrina deste projecto fique em discussão conjunctamente com a do adiamento. = Annibal.

Foi admittida.

O sr. Vaz Preto: — Mando para a mesa um requerimento, do qual peço a urgencia. É o seguinte (leu).

O sr. José de Moraes: — Pedindo a palavra a favor do adiamento foi só para trazer á lembrança da camara o que ella votou na sessão de 29 de abril de 1862, que vem publicado no Diario de Lisboa n.° 95 do mesmo anno.

Nessa occasião estando em discussão um projecto da commissão de administração publica sobre divisão territorial, judicial e ecclesiastica, um illustre deputado, que se senta ao meu lado direito, propoz um adiamento concebido nos seguintes termos:

«Proponho o adiamento deste projecto de lei e de todos os que tiverem por objecto alterações parciaes na divisão territorial, administrativa, judicial e ecclesiastica. = Sá Nogueira = José de Moraes.»

Este adiamento foi de tal maneira approvado pela camara que, logo que o antecessor de v. ex.ª declarou em discussão aquelle projecto, e o sr. Sá Nogueira se levantou e mandou para a mesa este adiamento, elle foi admittido á discussão, e não houve nenhum sr. deputado que se levantasse para o combater; e apesar de no Diario não vir declarado o numero dos que o approvaram, parece-me concluir que foi approvado unanimemente, porque ninguem levantou a sua voz para protestar contra elle.

Se isto foi assim, para que estamos agora a querer fazer reviver uma questão que a camara já votou? Não sei como é que a camara póde votar esta questão agora sem reconsiderar a votação que fez em 1862!

A camara póde dizer que hoje mudaram as circumstancias (apoiados), porém eu digo que não mudaram, que ellas são as mesmas; que os motivos que então havia em relação a outro projecto para se adiar, são os mesmos que ha hoje para se adiar este.

O illustre deputado, que acabou de fallar n'esta questão, sustentou, que = se a divisão territorial não fosse feita d'esta maneira, nunca se faria; e disse que = o sr. ministro do reino quando se lhe apresentou este projecto, tinha dito que a sua opinião era esta =. Permitta-me o illustre deputado que lhe diga, que acredito que seria essa a opinião do sr. ministro do reino de então; mas procure o illustre deputado a opinião do sr. ministro do reino actual...

O sr. Annibal: — É a mesma.

O Orador: — Diz o illustre deputado que = é a mesma =. Por emquanto não sei isso officialmente, mas se acaso é assim, qual é a rasão por que a commissão, no seu parecer, não declarou que foi de commum accordo com o sr. ministro do reino? Votar-se este projecto d'esta maneira é dar logar a que outros façam tambem a sua reconstrucção, quando a maior parte d'elles não têem o pessoal necessario para a administração municipal; e servindo só para augmentar o numero de empregados publicos, o que ha de fazer com que as attribuições municipaes cresçam em larga escala; e ha de acontecer, como acontece em alguns concelhos, que pagam 40 e 50 por cento addicionaes ás decimas, nem assim têem meios para fazer estradas, e para pagar aos empregados que, em alguns concelhos, estão em atrazo; nem têem meios para pagar á classe desgraçada dos expostos.

A camara póde votar como quizer, mas eu, sem querer ser propheta, digo que este projecto não póde ser lei do paiz.

O sr. Quaresma: — Pedi a palavra, mais para dar uma justificação do procedimento da commissão de estatistica, em referencia á divisão territorial, do que para tratar propriamente da questão, porque ella tem um bellissimo defensor, que é o auctor do projecto.

A commissão de estatistica foi tão cautelosa nas questões sobre divisão territorial, que no anno passado não deu nem um só parecer (apoiados), e vou dizer á camara a rasão d'este procedimento.

Tinha-se apresentado na camara um projecto do sr. Braam-