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O sr. Presidente: — A hora está adiantada, vae passar-se á ordem do dia.

Os srs. deputados que tiverem representações ou requerimentos que mandar para a mesa, queiram faze-lo.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Não está presente o Sr. ministro do reino.

O sr. Presidente: — Por esse motivo tinha tenção de pôr em discussão o orçamento do ministerio da marinha.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Encontraram-se as nossas vontades.

O sr. Guilhermino de Barros: — Mando para a mesa uma representação dos carteiros da repartição do correio de Villa Real, que pedem augmento de vencimento.

O sr. Rojão: — Mando para a mesa um requerimento de quinze sargentos ajudantes, que tambem pedem augmento de soldo.

O sr. Sieuve de Menezes: — Remetto para a mesa um projecto de lei sobre o pagamento de contribuições nas ilhas.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO ORÇAMENTO

Ministerio da marinha

Capitulo 1.° Secretaria d'estado e repartições annexas — 80:501$620 réis.

Foi logo approvado.

Capitulo 2.° Armamento naval — 555:846$980 réis.

O sr. Matos Correia: — A nossa marinha militar tem tido nos ultimos tempos augmento consideravel, no que respeita á parte material. Um numero relativamente grande de navios tem sido construidos; acham-se outros em construcção; e não é natural que este movimento descontinue, sem que circumstancias muito extraordinarias a elle se opponham.

Ao illustre ministro da marinha, que se acha presente, se deve em grande parte o incremento que têem tido as covas construcções; e deve-se ao nobre marquez de Sá da Bandeira a poderosa e efficaz iniciativa (apoiados). S. ex.ª, aproveitando a bem merecida influencia que sempre tem tido nos conselhos da corôa, pôde conseguir que se pozessem á disposição do ministerio da marinha as sommas necessarias para se executarem as primeiras construcções de navios de guerra em harmonia com os systemas actuaes.

Este augmento no material que, a meu ver, está ainda longe de representar o limite em grandeza a que nos convem levar a nossa marinha militar, para bem poder desempenhar os fins a que é destinada, acha-se, não obstante, já em desharmonia com o pessoal existente (apoiados).

O estado maior actual da marinha militar, se houvesse de ser destinado tão sómente ao serviço effectivo no mar, poderia talvez ser sufficiente para guarnecer os navios que já se acham construidos; porém na nossa marinha e em todas as marinhas do mundo os officiaes têem mais applicações. Não são, nem podem ser, destinados tão sómente a formar os estados maiores dos navios armados.

Ha um numero consideravel de estabelecimentos e serviços pertencentes á marinha, que formam parte d'ella, sem os quaes não póde existir, e em que se emprega necessariamente um numero crescido de officiaes. Ha tambem funcções que a ella se ligam com grande utilidade publica, e que carecem de ser desempenhadas por officiaes da armada, como, por exemplo, os trabalhos hydrographicos que, para serem executados com inteira proficiencia, é necessario que os executores reunam o saber do engenheiro aos conhecimentos do homem do mar.

E não acontece isto só no nosso paiz, dá-se em toda a parte aonde ha marinha militar.

A falta de equilibrio que, pelos motivos expostos, se começa a sentir entre o pessoal e o material da armada aggrava-se ainda por effeito de uma circumstancia excepcional. Nos ultimos tempos o numero dos officiaes fallecidos, e dos impossibilitados para continuar no serviço activo, excede muito ao dos individuos que se têem habilitado para os substituir.

Este estado anormal é devido ao systema de estudos e applicações a que são obrigados os aspirantes; o qual pela extensão, alem de outras causas, não permitte que se habilitem em numero sufficiente, nem na idade propria, para se habituarem ao serviço do mar.

Convencido completamente do que acabo de dizer, lembrava ao illustre ministro a importancia e necessidade urgente de se prestar desde já a mais séria attenção á educação dos officiaes da armada (apoiados). Não é no momento de serem precisos os officiaes que elles se hão de formar. Se não se tratar d'este objecto a tempo, acontecerá termos navios e não termos officiaes.

A questão dos navios é uma questão de dinheiro. Se tivermos os meios, e os quizermos applicar a esse fim, poderemos completar o material da nossa esquadra em dois ou tres annos; mas os officiaes necessarios para commandar e guarnecer os navios é que não se formam em igual tempo. Não é uma questão de construcção, é questão de educação, que, ainda quando sabiamente dirigida, occupa necessariamente um numero de annos consideravel.

Lembrava pois ao nobre ministro da marinha, novamente o repito, a conveniencia de se tratar a tempo e muito seriamente da organisação e educação do pessoal.

A escola naval, os cursos preparatorios nos lyceus e escola polytechnica, e a companhia dos guardas marinhas, carecem de ser reformados; é esta uma necessidade que todos sentem e reconhecem, e a que o nobre ministro já prestou homenagem, pedindo ao poder legislativo a auctorisação necessaria para proceder ás reformas. S. ex.ª apresentou tambem á commissão de marinha um projecto de reforma feito pela commissão consultiva, declarando por esta occasião que o apresentava como base da reforma que desejava effectuar. Aproveito esta occasião para chamar a attenção da camara sobre todos estes objectos, cuja gravidade ella devidamente aprecia e tomará em consideração.

Alem da insufficiencia pelo numero, que já se começa a sentir, e de que tenho occupado a attenção da camara, ha ainda em todas as classes do pessoal da armada imperfeições de organisação a que é necessario attender, e procurar remediar no sentido da effectividade do serviço e das legitimas aspirações dos individuos que se votam ao serviço do paiz na penosa e arriscada carreira da milicia maritima. Não pretendo entrar agora no exame desenvolvido d'este assumpto importante, limitar-me-hei a citar tão sómente como exemplo o numero dos officiaes generaes, o qual, ainda quando estes officiaes se achassem constantemente promptos, o que não é possivel, não chegaria para desempenhar todos os serviços a que são chamados, em virtude da legislação vigente. Nós temos apenas um vice-almirante, um chefe de esquadra, e quatro chefes de divisão; e o numero de applicações é, quando menos, o dobro.

Limito as minhas observações, com relação ao capitulo que se acha em discussão, ás indicações que tenho apresentado; tanto por não cansar a attenção da camara, como porque o meu objecto é tão sómente fazer sentir a urgencia de se tratar seriamente do pessoal da armada, e de chamar a attenção do nobre ministro da marinha sobre este ramo importantissimo, direi mesmo capital, do serviço naval.

O sr. Camara Leme: — O illustre deputado que me precedeu, meu antigo amigo, de certo mais competente do que eu n'estas materias, já me preveniu até certo ponto no que tinha a dizer. Primeiro que tudo tenho a louvar o nobre ministro pela solicitude que tem empregado nos negocios da repartição a seu cargo; mas desejo chamar tambem a sua attenção para o pessoal da marinha, a que necessariamente ha de ser preciso attender-se, como espero, o numero dos nossos navios de guerra for augmentando, como creio que é intenção de s. ex.ª

Desejo igualmente chamar a sua attenção para a classe de navios que se devem mandar construir. Segundo a minha opinião, não me parece de grande conveniencia continuar a mandar construir navios de uma escala media, para assim dizer, porque para as provincias ultramarinas são precisos navios talvez mais pequenos do que os de lote que temos mandado construir, como são a corveta Sá da Bandeira e outros. Parecia-me mais conveniente que se construissem navios de bateria coberta, que nos podessem servir ao mesmo tempo de navios de guerra e de transporte para o ultramar, porque, no caso de uma necessidade urgente do transportar um corpo de tropa para o ultramar, não temos navio nenhum que possa fazer essa conducção; porque os que se tem construido são apenas de tres, quatro ou cinco dias de carvão, e não podem fazer estas viagens longas para a Africa com a desejada rapidez.

Por consequencia chamo a attenção do nobre ministro sobre a conveniencia de construir navios d'este lote, que possam servir de navios de guerra, e ao mesmo tempo de transporte quando a necessidade do serviço assim o exigir.

Pelo que respeita ao pessoal dos officiaes de marinha, já o illustre deputado que me precedeu disse o que era preciso.

Desejava tambem lembrar a s. ex.ª a conveniencia de attender ao systema das machinas que se mandam fazer em Inglaterra applicadas aos navios de guerra, porque me consta que ha modernamente umas machinas extremamente economicas, que foram apresentadas creio que na ultima exposição de Londres, e que seria talvez convenientissimo estudar esta questão de combustiveis para os navios de guerra, procurando machinas que consumam menos carvão; porque consumindo menos podem, com uma maior porção de carvão, alongar os seus dias de viagem, o que effectivamente é uma grande economia. De certo que o illustre ministro, com a solicitude que tem mostrado pelos negocios a seu cargo, ha de ter muito a peito este assumpto.

Pelo que respeita á escola naval, tambem o sr. Matos Correia a ella se referiu, e o nobre ministro já apresentou uma organisação que a commissão está a estudar attentamente. Este negocio é importantissimo, porque da escola naval é que sáem os engenheiros para as nossas construcções navaes, e mesmo seria bom que não acontecesse o que, segundo me consta, teve logar em Inglaterra com um navio feito no nosso arsenal, o qual teve de se desmanchar...

O sr. Ministro da Marinha: — Não é exacto.

O Orador: — E sendo assim a despeza de construcção foi uma despeza inutil. Não sei se é exacto, refiro-me apenas a boatos que correm por ahi. Por conseguinte, sendo verdade isto, é para lamentar que se fizesse uma construcção no arsenal, e que em Inglaterra fosse preciso desmanchar.

Limito aqui o que tinha a dizer, e espero ouvir as explicações do nobre ministro.

O sr. Cyrillo Machado: — (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Camara Leme: — Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra.

A imprimir.

O sr. Ministro da Marinha: — Procurarei responder aos illustres deputados que me precederam, e pediram explicações ao governo. Resumirei quanto poder; mas ainda que me exprima com mais alguma largueza, estes assumptos são bastante importantes, e valem bem todo o tempo que se lhes dedique (apoiados). Estimo muito a occasião que me é dada de poder expor a rasão de varios factos d'esta administração.

Mas antes de tudo, permitta-me v. ex.ª e a camara que aos tres oradores que me precederam agradeça a extrema benevolencia com que me honraram. Só lhes direi que todo o meu desejo é ser util ao meu paiz (apoiados). Diligencio apenas satisfazer o meu dever, e basta ser dever para n'isso não haver merito. Não me julgo impeccavel; não o é ninguem; se lo hei eu menos que todos; mas sinceramente posso asseverar que o meu maior empenho, o meu mais firme cuidado é acertar. Isso diz-m'o a consciencia (apoiados). Sem mais preambulos, vamos aos factos. O primeiro illustre deputado que se occupou do assumpto — armamento naval, o sr. Matos Correia, cuja competencia n'estas materias ninguem n'esta casa e fóra d'ella desconhece (apoiados), referiu-se á desproporção que, segundo a opinião de s. ex.ª, existe entre o quadro actual dos officiaes e o actual numero de navios de guerra.

É possivel que essa desigualdade exista, ou antes é possivel que existisse se podesse effectuar-se um armamento simultaneo de todos os actuaes navios. Seja me licito porém observar, como s. ex.ª sabe, que não sendo possivel o armamento simultaneo, porque emquanto alguns navios estão em serviço outros estão em reparos e em concerto, essa desproporção desapparece. O que é indispensavel é previni-la para o futuro. Quando se faz o calculo do material existente, calcula-se logo o numero de vasos de guerra que ha de entrar em serviço effectivo e o dos supprimentos que hão de revesar esses e alternar com elles, emquanto as reparações, sempre necessarias, se effectuam. Por consequencia, não pelo numero total de navios, mas pelo numero de navios em serviço, se ha de avaliar o pessoal. Ver-se ha pois que a desproporção não é tal como póde talvez afigurar-se.

Concordo em que será necessario augmentar a classe dos officiaes generaes. Mas o nobre deputado reconhecerá tambem que seria inopportuna uma ampliação no quadro em presença de um deficit de pessoal habilitado. Porque (e aqui é occasião de me referir ao que mencionou o illustre deputado, o sr. Cyrillo Machado) a deficiencia que se nota no quadro das respectivas classes de segundos tenentes, guardas marinhas e aspirantes de 2.ª classe, resulta de não poderem entrar n'estas classes senão individuos successivamente habilitados para ellas. Não se apresentando estes, o que provém, não da actualidade, mas de causas anteriores, já se vê que os logares superiores dos quadros não podem ser preenchidos senão diminuindo as classes subalternas, que já com rasão se têem por diminutas.

Conheço a vantagem, direi a urgente necessidade de augmentar o numero dos officiaes generaes, não só pelo serviço que têem de prestar no mar, mas ainda em terra em diversas commissões, como secção respectiva do supremo conselho de justiça militar, intendencias, etc.; sei n'este ponto as difficuldades com que luto; mas aquella deficiencia, inherente á indispensavel necessidade das habilitações, nem me parece que possa ser attribuida á actual administração (apoiados), nem de certo se remedeia recrutando as classes superiores á custa das inferiores, sem ter ainda n'estas substituições promptas (apoiados). O mal ficaria o mesmo, porque o pessoal não augmentaria, e só as despezas se aggravavam (apoiados). Habilitemos primeiro, depois ampliaremos (apoiados).

Seguramente o pessoal do estado maior é o mais importante, porque é o elemento da sciencia pondo em acção aquellas machinas que têem de lutar com os mais temiveis elementos, dando vida e intelligencia a poderosos agentes. Ha porém ainda outras classes do pessoal da marinha que merecem tambem a mais seria attenção. A respeito d'estas classes é mais facil e mais prompto o remedio, porque não precisam de tão longa preparação. Com relação a essas já o governo provou, penso, que desejava empregar toda a sua solicitude em reorganisar a totalidade do pessoal. Effectuando-se logo o mais immediatamente possivel seguiu-se a natural indicação pratica.

Esta camara sabe que se votou ainda o anno passado a reforma do quadro dos officiaes marinheiros, classe essencial nos navios, como intermediaria entre o pensamento director e a acção das tripulações. São elles, por assim dizer, o braço, como o estado maior é a cabeça.

Era necessario crear algumas vantagens para estes individuos, já no exercicio activo, já quando pelo cansasso de serviço se inhabilitassem. Era necessario acabar o arbitrio nas respectivas promoções, abrir-lhes a perspectiva de remunerações justas, preparar-lhes um futuro, para que os homens impossibilitados de continuar no serviço do mar tivessem uma esperança e não o total abandono e a miseria.

Não sei se ha ainda quem o ignore ou dissimule. Não o ignora de certo a camara e o paiz, e bem o aprecia o illustre deputado. Quando se falla em pessoal da armada parece entender-se apenas os officiaes de patente. Não o digo pelo illustre deputado, digo-o pelos que ás vezes tratam destes assumptos mostrando-se-lhes inteiramente alheios. Os officiaes de patente estão de certo á frente do pessoal da armada, ninguem o contesta; mas não se resume n'elles o pessoal maritimo. Sem elles não se navegaria; mas elles sem as outras classes tambem não navegariam. Faço esta ponderação para demonstrar a injustiça com que, não o illustre deputado, mas outros, arguem o governo de descurar o pessoal, referindo-se exclusivamente a esta classe, que aliás não tem sido descurada, sem recordarem o que se tem passado ácerca das mais, aliás uteis e dignas de interesse, para quem desde o seculo passado, a bem dizer, senão havia podido olhar.

Da reforma que cito tem resultado concorreram pretendentes aos logares de officiaes marinheiros, pelo que espero ver este quadro brevemente preenchido, com um pessoal experimentado e moralisado, o que não é menos importante para as tripulações e para o serviço, continuando a ser cumprida a nova lei, como o está sendo, com severo escrupulo.

Ha ainda a classe dos fieis, que estava mal remunerada, e a que portanto era urgente attender, porque é sabida a perniciosa influencia que os abusos d'esta classe podem exercer. Outra reforma respectiva a essa classe foi votada o anno anterior.