O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1159

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
Francisco José Machado

SUMMARIO

Não houve correspondencia. - Teve segunda leitura uma nota do sr. Alfredo Brandão, renovando a iniciativa do projecto de lei n.° 80-A, apresentado pelo sr. Pedroso dos Santos em sessão de 3 de março de 1879, annexando a freguezia de Louriçal do Campo ao concelho de Castello Branco. - O sr. Dantas Baracho refere-se ás declarações feitas pelo sr. ministro da fazenda n'uma sessão e pelo sr. presidente do conselho n'outra, ácerca da apresentação de medidas para melhorar a situação agricola do paiz, procurando ver n'ellas uma contradicção que de modo nenhum podia conciliar. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda.- O sr. Dantas Baracho replica, e o sr. ministro da fazenda confirma o que disse, tornando o a explicar. - O sr. Serpa Pinto refere-se aos deputados que furam e aos que deixaram de ír, da commissão nomeada para assistir á missa campal pelas melhoras de El-Rei, e pergunta ao sr. ministro da fazenda se estava determinado a fazer com que o orçamento fosse discutido este anno. Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. Moraes Carvalho apresenta, uma representação da camara municipal de Marco de Canavezes, com respeito á linha ferrea do valle do Tamega, justificando-a com algumas observações. - O sr. Ferreira de Almeida nora que, pertencendo á commissão do orçamento, ainda ato hoje não sabia onde e quando aquella commissão se tivesse reunido, porque não recebêra aviso; chama a attenção do sr. ministro da marinha para o facto de estarem alguns portos, onde appareciam muitas vezes questões por causa da pesca, sem capitão de porto, e apresenta alguns requerimentos, pedindo informações ao governo. Responde-lhe o sr. ministro da marinha. - O sr. Eduardo de Abreu apresentou uma representação dos primeiros aspirantes addidos da direcção telegrapho postal de Coimbra, pedindo que lhes soja concedido o augmento de vencimento por diuturnidade de serviço. - O sr. Alfredo Pereira apresenta outra do mestre, contramestre e alguns musicos da banda de infantaria n.º 6, pedindo que sejam melhoradas as condições da sim reforma. - Os srs. José de Azevedo Castello Branco e Alves Matheus apresentam requerimentos do interesse particular. - O sr. Ruivo Godinho apresentou uma justificação da sua falta a algumas sessões, e tambem a declaração de que, se estivesse presente quando se votou o projecto dos tabacos, tel-o-ía rejeitado. - O sr. presidente do conselho de ministros apresentou as seguintes propostas de lei: para que as praças transferidas do exercito para as guardas municipaes sejam obrigadas a servir n'estas por espaço de tres annos, a contar dos respectivos alistamentos nas mesmas guardas; transferindo do concelho de Sobral de Monte Agraço para Villa Franca de Xira as freguezias de S. Miguel das Cardosas e de Nossa Senhora da Salvação da Arruda; auctorisando o governo, na parte que dependa da sancção legislativa, a fazer no regulamento, approvado por decreto de 12 de novembro de 1874, ao modificações que forem necessarias para melhor organização e execução dos serviços de sanidade maritima, não podendo, comtudo, augmentar a respectiva despeza; para que as disposições da carta de lei de 18 de julho de 1885, contidas nos artigos 173.° e 174.°, e respectivos paragraphos, sejam applicaveis ao serviço geral dos incendios do municipio do Porto com as modificações que vem marcadas.

Na ordem do dia continua a discussão do projecto n.° 254, de 1887, com referencia ao caminho de ferro e porto de Mormugão, na India. - Usa da palavra o sr, José de Azevedo Castello Branco, contra. Responde-lhe o sr. Augusto Montenegro, relator. - A requerimento do sr. Castro Monteiro, que foi approvado, é prorogada a sessão até se votar o projecto. - Falla depois, contra, o sr. José Novaes, e não havendo mais ninguem inscripto foi approvado o projecto, depois de haver sido rejeitada a proposta de adiamento do sr. Fuschini. - A substituição do sr. Pedro Victor ficou prejudicada. - Foi approvado um requerimento do sr. Franco Castello Branco, para que todos os documentos lidos pelo sr. José de Azevedo Castello Branco, durante o seu discurso, fossem publicados como appendice a sessão de hoje. - No fim da sessão foram approvados sem discussão os seguintes projectos: n.° 33, approvando o contrato provisorio para a illuminação a gaz da villa da Povoa de Varzim; n.º 35, approvando, na parte que carece de sancção legislativa, o contrato celebrado pela camara municipal de Vianna do Castello para a illuminação da cidade por meio do gaz carbonico. - Em consequencia de um officio do juiz de direito da sexta vara da comarca de Lisboa, concedeu-se licença no sr. deputado Augusto Fuschini para poder comparecer no mesmo juizo no dia 24 do corrente, pelas onze horas na qualidade de vogal de um conselho de familia de que faz parte.

Abertura da sessão - Ás duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada 67 srs. deputados, São os seguintes: - Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Alfredo Brandão, Oliveira Pacheco, Gomes Neto, Moraes Sarmento, Hintze Ribeiro, Augusto Pimentel, Santos Crespo, Miranda Montenegro, Lobo d'Avila, Conde de Castello de Paiva, Estevão de Oliveira, Feliciano Teixeira, Francisco de Barros, Castro Monteiro, Francisco Machado, Francisco de Medeiros, Pires Villar, João Pina, Cardoso Valente, Franco de Castello Branco, Vieira de Castro, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, Correia Leal, Joaquim da Veiga, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Avellar Machado, Barbosa Colen, José Castello Branco, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Ruivo Godinho. Abreu Castello Branco, Vasconcellos Gusmão, José de Napoles, José Maria de Andrade, Oliveira Matos, Rodrigues de Carvalho, Julio Graça, Julio Pires, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Manuel José Vieira, Marianno do Carvalho, Martinho Tenreiro, Miguel da Silveira, Miguel Dantas, Pedro. Victor, Dantas Baracho, Vicente Monteiro e Estrella Braga.

Entraram durante a sessão os srs.: - Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Antonio Castello Branco, Campos Valdez, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Guimarães Pedrosa, Antonio Maria de Carvalho, Mazziotti, Fontes Ganhado, Jalles, Pereira Carrilho, Barão de Combarjúa, Bernardo Machado, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Madeira Pinto, Mattoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Freitas Branco, Firmino Lopes, Almeida e Brito, Francisco Mattoso, Lucena e Faro, Soares de Moura, Severino de Avellar, Gabriel Ramires, Guilherme de Abreu, Candido da Silva, Baima do Bastos, Izidro dos Reis, Santiago Gouveia, Rodrigues dos Santos, Alfredo Ribeiro, Silva Cordeiro, Alves do Moura, Dias Ferreira, Elias Garcia, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Barbosa de Magalhães, Pinto Mascarenhas, Santos Moreira, Abreu e Sousa, Julio do Vilhena, Lopo Vaz, Luiz José Dias, Manuel Espregueira, Manuel d'Assumpção, Brito Fernandes, Pinheiro Chagas, Marcai Pacheco, Marianno Prezado, Pedro Monteiro, Visconde de Monsaraz e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Sousa e Silva, Baptista de Sousa, Antonio Candido, Ribeiro Ferreira, Antonio Ennes, Pereira Borges, Tavares Crespo, Barros e Sá, Simões dos Reis, Augusto Fuschini, Augusto Ribeiro, Victor dos Santos, Conde de Fonte Bella, Elvino de Brito, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Góes Pinto, Francisco Beirão, Fernandes Vaz, Francisco Ravasco, Frederico Arouca, Guilhermino de Barros, Sá Nogueira, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Souto Rodrigues, Dias Gallas, João Arroyo, Menezes Parreira, Alves Matheus, Oliveira Valle, Joaquim Maria Leite, Oliveira Martins, Jorge de Mello (D.), Jorge O'Neill, Ferreira Galvão, Pereira de Matos Laranjo, Guilherme Pacheco, Ferreira Freire Alpoim, José Maria doa Santos, José de Saldanha (D.), Simões Dias, Santos Reis, Mancellos Ferraz Matheus de Azevedo, Pedro de Lencastre (D.), Sebastião Nobrega, Visconde da Torre, Visconde de Silves e Wenceslau de Lima.

69

Página 1160

1160 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Acta - Approvada.

Não houve correspondencia.

Segunda leitura

Renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 80-A, apresentado em sessão de 3 de março de 1879. = O deputado, Alfredo Cesar Brandão.

Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de estatistica.

A renovação refere-se ao seguinte:

Projecto do lei

Senhores. - Segundo as prescripções do decreto de 15 de abril do 1809, os habitantes da freguezia do Louriçal do Campo, concelho de S. Vicente da Beira, haviam, em 1877, requerido a sua annexação, para todos os effeitos, ao concelho de Castello Branco; antes, porém, do seu requerimento obter despacho definitivo pelo ministerio competente, promulgou-se o codigo administrativo, approvado pela lei de 6 de maio de 1878, o qual, no artigo 8.°, torna dependente de determinarão do poder legislativo a pretendida annexação.

As rasões do justiça e de conveniencia, allegadas pelos cidadãos peticionarios, são hoje as mesmas, se não mais imperiosas.

E com Castello Branco que os moradores do Louriçal do Campo estão em maior contacto. É ahi a séde da sua comarca, do sua districto e do seu bispado. As necessidades e relações do commercio, entre as povoações vizinhas, para ali os conduzem quotidianamente.

Quanto mais que, a troco de um imposto municipal, menos gravoso, podem aquelles moradores alcançar maior somma de beneficios, fazendo parte do concelho de Castello Branco, do que á custa de maiores sacrificios em S. Vicente da Beira.

As despezas obrigatorias, hoje a cargo dos municipios, demandam a necessidade de circumscripções largas, ricas e populosas.

Por isso, tenho a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E annexado, para todos os effeitos administrativos, ao concelho de Castello Branco, a freguesia do Louriçal do Campo, que actualmente faz parte do concelho de S. Vicente da Beira.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 3 de março de 1879. = O deputado, Antonio Pedroso dos Santos.

REPRESENTAÇÕES

Da camara municipal do concelho do Marco de Canavezes, pedindo que do projecto das linhas ferreas ao norte do Mondego não seja excluida a linha ferrea do Tamega.

Apresentada pelo sr. deputado Moraes Carvalho, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do governo.

Dos primeiros aspirantes da direcção telegrapho-postal de Coimbra, pedindo que lhos soja contado como aspirantes o tempo que estiveram addidos desde 1880 a 1886.

Apresentada pelo sr. deputado Eduardo de Abreu e enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

Do mestre, contramestre e musicos de infanteria n.° 6, pedindo que soja melhorada a reforma aos musicos do exercito.

Apresentada pelo sr. deputado Alfredo Pereira e enviada á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro, pelo ministerio da marinha, copia do ultimo relatorio da inspecção passada aos estabelecimentos fabris dependentes do ministerio da marinha. = J. B. Ferreira de Almeida.

Requeiro, pelo ministerio dos estrangeiros, um exemplar, ou a sua distribuição na camara, do relatorio já impresso na imprensa nacional, do consul de Shangae, Coelho de Carvalho; copia de uma petição dirigida a Sua Magestade por Vong King Ling Panta de Fokieu e director das minas do Kaiping e do officio de remessa d'essa petição dirigida pelo consul de Shangae em maio de 1885; copia de um projecto de convenção consular entre Portugal e a China enviado pelo consul de Shangae ao governo, em fevereiro de 188o; copia de um officio do consul de Shangae acerca dos antigos bens das commissões portuguezas em Pekin e enviado ao governo em 1884; copia dos officios do consul de Shangae, enviados era 1884 o que; tratam da extincção do consulado e da linha ferrea de Cantão para a costa. = J. B. Ferreira de Almeida.

Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

Do primeiro official reformado da administração militar, Thomás da Rocha Pinto, pedindo lhe seja applicada a lei de 2á de julho de 1887.

Apresentado pelo sr. deputado Ferreira de Almeida e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

Do escrivão de direito do segundo officio e privativo do tribunal do commercio da comarca do Peso da Regua, Antonio Gomes Carneiro, pedindo que na reforma, judiciaria se introduzam modificações tendentes a melhorar lhe a situação.

Apresentado pelo sr. deputado José de Azevedo Castello Branco, enviado á commissão de legislação civil e mandado publicar no Diario do governo.

De Francisco Lopes Gonçalves, intendente de pecuaria ao serviço no ministerio das obras publicas, pedindo que os vencimentos dos intendentes e vice-intendentes de pecuaria sejam equiparados aos que recebem os agronomos chefes e subalternos.

Apresentado pelo sr. deputado Alves Matheus e enviado á commissão de fazenda, ouvida a de agricultura.

DECLARAÇÃO DE VOTO

Declaro que, se estivesse presente quando se votou o projecto do governo sobre os tabacos, teria votado contra. = Ruivo Godinho.

Para a acta.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

Declaro que tenho faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Ruivo Godinho. Para a secretaria.

O sr. Baracho: - Sr. presidente, pedi a palavra por estar presente o sr. ministro tia fazenda, a quem eu desejo dirigir-me. Ha dias perguntei a s exa., se tinha idéas de apresentar algumas medidas que tivessem por fim melhorar a situação agraria, e a crise que atravessa o paiz, do, que tanto estão soffrendo os agricultores.

S. exa. disse então que tinha a idéa de apresentar uma proposta de lei, relativa aos bancos agricolas, e que tinha tambem idéa de apresentar uma proposta do lei relativa aos cereaes e ao alcool.

Página 1161

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1161

Poucos dias depois o meu illustre amigo e correligionario o sr. José Novaes, perguntou ao sr. presidente do conselho se tinha sido procurado por uma commissão, que lhe pedia a acção e interferência de s. exa. nas medidas tendentes a beneficiar a agricultura.

O illustre presidente do conselho disse que effectivamente se tinha tratado da questão agricola, mas que se não havia tomado resolução alguma a esse respeito.

Por conseguinte eu desejo saber qual das opiniões prevalece, se a de s. exa. só a do sr. presidente do conselho.

Eu lamento mais uma voz não ver presente o sr. presidente do conselho, porque eu desejava pedir lhe a fineza de dar explicações sobre este assumpto, e para que s. exa. repetisse a sua opinião, e as palavras com que respondeu ao meu amigo o sr. José Novaes, porque a opinião do sr. ministro da fazenda já destoou completamente do que disse o sr. presidente do conselho. (Apoiados.)

Eu não desejo fazer politica em questões agricolas, o que desejo é saber se o governo tem tenção de apresentar algumas medidas, tendentes a combater a triste situação agraria.

Pelo que disse o sr. presidente do conselho, quando respondeu ao sr. José Novaes, vejo que se não tem tratado d'isso, ou se tem tratado tão superficialmente, que se não assentou nos meios e pela fórma, como se ha de combater a crise agricola do paiz.

Desejo portanto, que o sr. ministro da fazenda responda abatas duas perguntas, para se saber o que prevalece, se são as opiniões claramente manifestadas por s. exa., ou se são as ambiguidades do sr. presidente do conselho. (Apoiados.)

Peco a v. exa. que me reserve a palavra para depois de s. exa. fallar.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho):- Se o sr. presidente do conselho estivesse presente, demonstraria que não seria facil encontrar-me em contra dicção com s. exa. a respeito de uma questão em que ternos estado completamente de accordo.

Houve reunião do conselho de ministres, em que se discutiu a questão agricola, a proposito da representação do congresso agricola e combinou se apresentar á camara algumas propostas; mas entre resolvei-as e tel-ás completamente promptas para as apresentar, ha differença. - Combinou-se apresentar propostas sobre o credito agricola sobre os cereaes e mais questões que se prendem com esta questão, e sobre o alcool.

Eu tive a honra de ser encarregado de apresentar as bases d'essas propostas de lei e hontem - esta novidade não podia o sr. presidente do conselho dar mais cedo - e hontem foram approvadas era conselho do ministros as bases da proposta relativamente a cereaes, e portanto ha de brevemente ser apresentada á camara.

Na reunião de conselho de ministros tratou-se das propostas relativas ao credito agricola e ao alcool, mas não se discutiu hontem alguma cousa a respeito do credito agricola, porque essa questão prende com a questão juridica e o sr. ministro da justiça, como s. exa. sabe, estava ausente de Lisboa por motivo de serviço publico. Mas, repito, as bases relativas aos cereaes foram approvadas e serão apresentadas a camara.

O sr. Dantas Baracho: - Agradeço as explicações dadas pelo sr. ministro da fazenda, e digo mais, que são conformes precisamente com o que s. exa. aqui disse, seguramente ha quinze dias; mas não estão de accordo com a explicação do sr. presidente do conselho relativamente ao mesmo assumpto, quando interpellado pelo meu amigo o sr. José Novaes. (Apoiados.)

Folgo de registar as declarações do sr. ministro e, prestando homenagem ao caracter de s. exa., creio que ha de traduzir em factos as suas declarações.

Mas lamento mais uma vez que o sr. presidente do conselho, com a leviandade com que constantemente aqui se apresenta, não soubesse responder por aquillo que se tratou em conselho de ministros.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - E simplesmente para dizer ao illustre deputado que os seus queixumes são injustissimos.

O que o illustre presidente do conselho disso, estava de accordo com que eu disse á camara.

Em conselho de ministros resolveu-se em principio apresentar á camara um certo numero de propostas, mas essas propostas não estavam discutidas.

O sr. Dantas Baracho: - V. exa. indicou aqui quaes eram essas propostas que tencionava apresentar, e poucos dias depois o sr. José Novaes perguntava ao sr. presidente do conselho o que havia a esse respeito, e s. exa. declarava terminantemente que não havia nada.

O Orador: - O que o sr. presidente do conselho declarou foi que não estava ainda approvada nenhuma proposta, e de facto na sessão em que s. exa. respondeu ao sr. José Novaes já estava decidida a apresentação de algumas propostas de lei relativas a assumptos agricolas; mas o que não estava era tomada resolução definitiva sobre nenhuma d'ellas, por isso que só hontem á noite foram approvadas as bases da primeira, a dos cereaes.

O sr. Serpa Pinto: - Como não vejo nenhum dos meus collegas que fez parte da commissão encarregada de representar hoje a camara na missa campal, venho dar parte de que a commissão ali foi; e aproveito esta occasião para dizer que, se fui ali, foi como militar; mas reclamo agora, fazendo notar a v. exa. sr. presidente, o que já disse a este respeito.

Quando a camara decidir assistir a qualquer acto a que v. exa. vá, eu da melhor vontade o acompanharei; não me causarei a isso; mas tenho a dizer a v. exa. que da commissão de hoje apenas a opposição ali foi, e da maioria só appareceu o sr. Abreu e Sousa, que é official do exercito.

Como militares fomos nós sós.

Contra isto reclamo eu; já outro dia, a respeito da commissão do Porto, eu disse isto, e peço a v. exa. tome estas minhas palavras em consideração, não me nomeando para mais commissões, porque eu digo a v. exa. que farei como os collegas da maioria que não foram lá.

Aproveito a occasião de estar com a palavra e de ver presente o sr. ministro da fazenda para perguntar a s. exa. se está resolvido a responder á pergunta que hontem aqui foi feita pelo meu bom e prestante amigo o sr. Arouca ao st. ministro dos negocios estrangeiros; quer dizer, se s. exa. está determinado ou não a fazer discutir este anno o orçamento. Não obstante o sr. Arouca mostrar claramente que é necessario que a camará discuta este anno o orçamento, eu espero que s. exa. me fará a honra de dizer qual é a sua intenção.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Respondo, por consideração pelo illustre deputado, porque eu entendo que os ministros têem obrigação de dar conta dos seus actos e das suas palavras, mas não das suas intenções. Aprendi isto com o sr. Hintze Ribeiro, que é um bom mestre.

Eu prometti á camara que o parecer sobre o orçamento seria brevemente apresentado, depois hei de empenhar todos os meus esforços para que elle seja discutido. Mas s. exa. sabe que os acontecimentos não dependem dos homens e que a minha obrigação é trabalhar para que um facto se realise, mas não dependo da minha vontade que elle se effectue.

O sr. Moraes Carvalho: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Marco de Canavezes com respeito á linha do valle do Tamega.

V. exa. sabe que o governo no anno passado mandou estudar as linhas de ferro da rede ao norte do Mondego e que entre ellas está a do valle do Tamega.

Ultimamente espalhou-se nos jornaes a noticia de que esta linha deixou

Página 1162

1162 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de sor comprehendida no projecto, os povos do concelho de Marco de Canavezes, sobresaltados com esta noticia representam ao parlamento, protestando desde já contra a exclusão d'esta linha da rede ao norte de Mondego e opportunamente, se por acaso esse projecto for remettido á commissão e entrar em discussão, eu farei considerações que espero convencerão a camara da necessidade d'esta linha, porquanto é uma das mais importantes.

Mando para a mesa a representação e peço a v. exa. o obsequio de consultar a camara, sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo. Foi auctorisada a publicação.

O sr. Ferreira de Almeida: - Já hontem d'este lado da camara se interpellou o governo acerca da apresenta cão do orçamento, respondendo o sr. ministro dos negocio: estrangeiros que brevemente seria apresentado á camara respectivo parecer. Interpellando hoje novamente o sr. Serpa Pinto ao sr. ministro da fazenda sobre o mesmo assumpto, s. exa. responde que espera que a commissão de orçamento dê era breve o seu parecer.

Sr. presidente, eu quero crer que isto seja assim, mas desejo dizer a v. exa. e á camara que, tendo a honra d pertencer á commissão do orçamento, não sei quando, onde por que fórma ella se tenha reunido até hoje. Das outras commissões a que pertenço, e são a dos negocios estrangeiros, a de marinha e a do ultramar, todas têem reunido e me têem convidado, assistindo ás reuniões, corno é meu de ver. Mas a do orçamento, é possivel que se tenha reunido onde e quando, não sei. É possivel que, por inspiração de algum Espirito Santo orçamentologista, venha a apparecer aqui o tal parecer da commissão sem eu partilhar d'essa inspiração.

Dito isto, passo a tratar do assumpto para que pedi a palavra, mandando para a mesa o requerimento do sr Thomás da Rocha Pinto, que pede para ser considerada a sua tarifa ou reforma pela lei moderna e não pela antiga por isso que foi reformado depois de estar já approvada em côrtes a nova lei de tarifas.

Confio que a commissão ou commissões que toem do apreciar esta petição a tomarão na consideração que merece e lhe farão a devida justiça.

Mando igualmente para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos, pelo ministerio da marinha. (Leu)

Mando ainda um outro requerimento, pedindo esclarecimentos pelo ministerio dos negocios estrangeiros. Este requerimento diz respeito a assumptos que se relacionam com os nossos interesses na China. (Leu).

Como vejo presente o sr. ministro da marinha, aproveito a occasião de estar com a palavra para chamar a attenção de s. exa. sobre um ponto que me parece importante, relativo á pasta que lhe está confiada.

Está sem capitão do porto a capitania de Caminha. Esta, assim como a de Villa Real de Santo Antonio, hão duas capitanias de alta importancia, ate politica, por causa das relações de pesca com a Hespanha.

Em Villa Real de Santo Antonio, está actualmente um primeiro tenente; em Caminha, que me conste, não ha capitão do porto official de marinha. É certo que, na ausencia do capitão do porto é o chefe da delegação da alfandega que tem a sou cuidado o serviço que compete ao capitão do porto; mas penso que uma capitania de porto d'esta categoria carece de um funccionario proprio, especial, e até de notoria capacidade, não só por causa das questões propriamente maritimas, mas por aquellas que se possam suscitar sobre a exploração da pesca no rio Minho, por causa dos conflictos que de ordinario se levantam entre os pescadores do urna e outra magem.

Alem d'estas ha mais algumas capitanias sem capitães de porto. Já ouvimos ha dias os srs. deputados da maioria reclamam a este respeito, por isso que ás capitanias de porto está confiada não só a policia local, mas tambem a direcção de soccorros que seja possivel prestar por occasião de desastres maritimos com os insignificantes recursos de que dispomos. Uma d'essas reclamações teve logar por occasião dos desastres occorridos na barra da Figueira e o mesmo succedeu com respeito a Caminha.

Por essa occasião o governo providenciou, nomeando immediatamente um official de marinha capitão de porto da Figueira deixando porém Caminha, de muito maior importancia, sem ser servida.

Devo lembrar que era de uso haver tambem em Cascaes um official encarregado de vigiar o serviço de barra e de soccorros; e que esta delegação de capitania tem estado por diversas vezes a cargo de officiaes, que trataram com notavel desvelo, não só o serviço dos pilotos da barra, mas tambem tudo quanto diz respeito a aprestos para acudir aos desastres maritimos.

Na costa do Algarve ha tambem capitanias sem capitão de porto.

Como v. exa. e a camara sabem, na costa do Algarve estuo constantemente em acção interesses extraordinarios na questão de pesca, não só dos armadores entre si, mas dos pescadores portuguezes com os pescadores hespanhoes, que se aventuram a vir pescar por vezes nas nossas aguas, contra os direitos estabelecidos.

Peço pois ao exmo. ministro da marinha que, quando não queira fazer obra pelas considerações que acabo de fazer, se informe devidamente e providenceie, como é de necessidade, não só sob o ponto de vista politico, mas material. E isto que por agora se me offerece dizer.

O sr. Ministro da Marinha (Henrique de Macedo): - Eu tomarei na devida e merecida consideração as indicações que o sr. deputado acaba de fazer-me.

S. exa. sabe tão bem, ou melhor do que eu, que ha um certo numero de commissões destinadas aos officiaes da armada, por exemplo, algumas capitanias de portos, que não estão preenchidas senão interinamente por aquelles a quem a lei marca esta interinidade; mas não é por falta de vontade do ministro, nem da administração superior da armada, que não estão preenchidas estas commissões; é pelo facto já reconhecido pelo proprio ministro em documentos publicos, por exemplo na portaria nomeando uma commissão para estudar a reorganisação dos quadros da armada, porque o numero de officiaes dos quadros da armada não é já hoje sufficiente para as actuaes necessidades do serviço.

S. exa. sabe que somos forçados, bem contra as conveniencias do serviço e contra os desejos do ministro e dos funccionarios superiores que o acompanham, a ter nos navios da armada um menor numero de officiaes do que aquelle que demanda a sua lotação.

O que desejo com esta resposta, não é negar ao illustre deputado que tenha rasão nas suas allegações, é demonstrar que não é culpa propriamente do ministro, nem a falta de desejo do que o serviço esteja bem organisado, que dá logar a esta falta.

No entanto, dentro dos limites possiveis, farei todos os esforços para preencher no maio breve praso todas as capitanias de portos que s. exa. acaba de indicar, aquellas onde o serviço é mais importante e delicado. Refiro-me á capitania do porto de Caminha, onde ha as questões das pescas, e as do Algarve, onde tambem ha essas questões.

O sr. José Castello Branco: - Mando para a mesa um requerimento de um escrivão da comarca da Regua, pedindo e apresentando as suas exposições contra a nova reforma judicial que o sr. ministro da justiça pretende fazer.

Visto esta representação vir redigida em termos cortezes e trazer considerações de algum peso, peço a v. exa. que consulte a a camara se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.

Foi approvada a publicação.

Página 1163

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1163

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 254 de 1887, auctorisando o governo a pagar a garantia de 6 por cento sobre o capital de £ 60:000, ene for levantado pela "West of India Guaranteed Railway Company Limited" na conformidade do artigo 21.° do contrato de 18 de abril de 1881.

O sr. José de Azevedo Castello Branco; - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão logo que, sejam restituídas as notas tachygraphicas.)

Leu-se na mesa o seguinte:

Officio

Illmo. e exmo. sr. - Por conveniencia do serviço publico, tenho a honra de solicitar da camara dos senhores deputados, a que v. exa. tão dignamente preside, a necessaria auctorisação para o sr. deputado Augusto Fuschini poder comparecer n'este juizo, no dia 24 do corrente, por onze horas, na qualidade de vogal de um conselho de familia, de que faz parte.

Deus guarde a v. exa. Lisboa, 20 de abril de 1888. - Illmo. e exmo. sr. presidente da camara dos deputados. = O juiz de direito da 6.ª vara, Agostinho José da Fonseca Pinto.

Foi concedida a licença.

O sr. Franco Castello Branco: - Regueiro a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se permitte que estes documentos, que foram lidos pelo sr. José de Azevedo Castello Branco, sejam publicados no appendice á sessão de hoje no Diario da camara.

Foi approvado o requerimento.

O sr. Miranda Montenegro: - Não era minha intenção entrar de novo n'este debate; mas o muito respeito e consideração que tributo ao orador que acaba de fallar, obrigam-me a fazer mais algumas considerações, fine eu prometto serão breves, mesmo porque reconheça a situação difficilima em que me encontro, tendo de tratar de novo um assumpto já largamente desenvolvido e, por assim dizer, discutido em todos os pontos em que podiam apresentar-se objecções.

Poucas são essas objecções. E eu preciso dizer que ellas foram por completo apresentadas pelo sr. Julio de Vilhena; e os oradores, que o seguiram, quasi pouco mais fizeram do que repetir as que se haviam apresentado ao projecto, embora o tenham feito com aquella elegancia do estylo, com aquelles primores de eloquencia que eram de esperar do seu grandissimo talento.

Estas objecções, porém, já tiveram cabal e completa resposta, e por isso eu muito ligeiramente toco os pontos a que se referiu o illustre deputado que acabou de fallar.

O assumpto é facil de comprehender, e expõe-se em duas palavras, que eu repetirei, não obstante a camara já ter conhecimento d'elle.

Em 1881 garantiu o governo o juro de 6 por cento ao capital que se julgasse necessario como addicional para a construcção do porto de Mormugão e do caminho de ferro atravez da India. Estabeleceu-se como unica condição que a necessidade do capital addicional fosse justificada com os orçamentos das obras para se pedir ao parlamento a respectiva auctorisação.

O que resta unicamente saber é se a companhia cumpriu as disposições do contrato, apresentando o seu orçamento, e se por consequencia o governo devia ou não ter apresentado esta proposta á camara.

Que ella a cumpriu não lia duvida, porque o orçamento foi apresentado; resta unicamente saber as condições d'esse orçamento; mas antes d'isso responderei a alguns outros argumentos e alvitres que foram apresentados aqui.

O sr. Pedro Victor propunha a revisão do contrato, e que o governo mandasse immediatamente por engenheiros esse terminar as obras por administração...

O sr. Pedro Victor: - Eu não propuz a rescisão do contrato.

O Orador: - Mas lembrou-a.

O sr. Pedro Victor: - Não lembrei, disse apenas que, desde o momento em que havia uma pendencia de difficil resolução entre o governo e a companhia, quando não houvesse outro meio para a resolver, se poderia fazer o que muitas vezes se faz no continente; e o governo mandar proceder por administração ás obras, e depois mandar para a arbitragem a resolução da questão.

O Orador: - Pois o que é que se está fazendo na India?

Na India, em logar do governo incumbir alguns engenheiros portuguezes de fazer a construcção, contratou com uma companhia ,fazer justamente essa construçção, com a attribuição d'ella pagar como entendeste aos seus engenheiros e mais pessoal, e levantar os capitães como julgasse conveniente. É isto o que se está fazendo.

(Interrupção.)

Mas isso hoje não se póde fazer, porque o caminho está construído e em - exploração, e essa exploração pertence á companhia por noventa e nove annos.

O sr. Pedro Victor : - Eu referi-me á epocha em que o sr, Barros Gomes teve essas difficuldades.

(Interrupção do sr. ministro da marinha.)

O Orador: - Mas ha mais alguma cousa, é que quando o governo não garanta a companhia o capital que ella entender que é sufficiente, temos o artigo 26.° do contrato, que diz:

(Leu.)

E preciso notar, que se a garantia offerecida pelo governo não for julgada sufficiente pela companhia...

(Leu.)

A companhia é que julga.

Quando se desse um caso d'estes o governo tinha de pagar, não só a importancia total despendida, mas mais 10 por cento; e esses 10 por cento são muito superiores ao duplo ou ao triplo das £ 50:000 que hoje se pedem n'este; caso a vantagem que tinhamos era de pagarmos mais.

Mas o sr. José de Azevedo Castello Branco, assim como o sr. Pedro Victor, disseram que nós não estavamos discutindo o contrato de 1881, querendo talvez fazer sentir que não lhes foi muito agradavel que eu fizesse a exposição d'esse contrato.

Ora eu declarei logo, que o projecto do governo era a consequencia natural e legitima d'esse contrato; era, portanto, necessario que a camara conhecesse as condições do contrato, para fundamentar a sua opinião e saber o que votava; e, por isso, não podia deixar de me referir a elle e apresentar as circumstancias em que elle foi feito. (Apoiados.)

Diz o sr. José de Azevedo: era 1880 pediu a companhia para lhe serem garantidas £ 550:000 e o parlamento recusou a garantia das £ 50:000, por entender que não estavam justificadas no orçamento conforme a lei. E s. exa. leu, e muito bera, o que lhe convinha do parecer apresentado n'essa occasião: mas, se s. exa. lesse mais para diante, veria que, alem das rasões que s. exa. apresentou, dizia-se que a reducção e eliminação das £ 50:000 não representava senão um adianento de encargos. Logo o parlamento e a commissão estavam convencidos de que era um adiamento e que este encargo se havia de pagar posteriormente.

A paginas 3040 o sr. relator da commissão diz que quando a companhia vier demonstrar que não póde abrir o caminho de ferro á exploração sem o levantamento d'aquella quantia, não haverá parlamento que, estudando bem as condições do contrato, não approve a garantia correspondente.

Os illustres deputados leram o que lhes conveiu, mas é necessario que leiam o resto.

Em vista das declarações feitas quando aquella proposta

Página 1164

1164 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

aqui foi approvada, ficou, de alguma maneira, convencida a companhia de que, quando apresentasse outro orçamento nas mesmas circumstancias, o seu pedido devia ser garantido.

Agora dá-se essa circumstancia.

Tanto o sr. Aguiar como o sr. Ricci disseram que a companhia não tinha capitães para continuar com os trabalhos, e que tinha de os suspender, o que não queria dizer que ella não tinha credito.

Ella o que não podia era levantar capitães com a garantia do governo portuguez, porque não tinha auctoridade para isso; mas com o seu credito levantou-os.

A companhia, em vista do seu contrato, e confiando na probidade e na honradez do governo, com quem contra tara, logo que viu apresentar a proposta ao parlamento, levantou as quantias como credito pessoal, emquanto que até ali tinha difficuldade em levantar esse capital, por não ter probabilidades de que lhe seria garantido.

Portugal, havendo tomado uns certos compromissos, não podia agora faltar a elles, e os illustres deputados da opposição, no logar do governo, de certo procederiam como o governo procedeu. Logo que lhe tivessem honrado a firma, pagavam.

Quer o illustre deputado que façamos a liquidação geral e que paguemos depois. É singular!

Já hontem mostrei que a camara de 1885 recusou uma proposta do sr. Elvino de Brito, na qual se dizia o seguinte:

(Leu.)

S. exas. em 1885 não queriam regulamentos de fiscalisação, nem liquidação; hoje querem liquidação e entendem que só depois da liquidação é que se deve pagar, quando a demora do pagamento só importava um augmento de encargos.

De maneira que, longe de se diminuir a despeza, ella tinha de se aggravar.

O illustre deputado o sr. José de Azevedo Castello Branco fez a leitura de differentes documentos, a alguns dos quaes já eu hontem me referi, e por elles se vê claramente que o engenheiro fiscal nota algumas duvidas quanto ao orçamento; mas essas mesmas verbas que elle contesta, diz que o faz pela falta de documentos e da medição. Elle suppõe que nas terraplenagens deve ter havido despezas inferiores; suppõe que nos tunneis, longe de haver augmento, haveria economia, o que devia conhecer-se logo que se fizessem as medições, mas isto não é mais do que uma asserção gratuita.

Elle não diz que nas terraplanagens e nos tunneis, fazendo-se a medição ha de por força achar-se uma economia, diz que suppõe que isso succederá, e portanto é uma conjectura e nada mais.

Quanto ás outras contestações feitas pelo sr. Mousinho de Albuquerque, eu já hontem aqui disse que elle as fizera como homem de bem que é, e, como homem que preza a sua dignidade e o seu bom nome como engenheiro, assentam ellas especialmente em não ter os projectos, e é essa a principal base da contestação.

A companhia não lhe mandou os projectos, e portanto elle só diz que em uma liquidação futura poderá haver alguma reducção, mas não assevera.

Mas vejamos mais.

Eu tive o trabalho insignificante de gastar alguns minutos em examinar quaes os pontos que o sr. Mousinho acceitava por completo o quaes os que elle contestava.

Ora o sr. Mousinho acceita por completo as verbas relativas aos edificios, aos telegraphos, ás edificações no porto, e ao material, que elle não contesta, nem pôde contestar, que está inutilisado porque se inutilisou no serviço do porto.

Ora eu chamo a attenção da camara para este ponto. Todas estas verbas importam em 387:963 rupias, que em dinheiro portuguez corresponde a 105:185$200 réis. Não
mettendo em conta os tunneis, que são contestados, nem as economias que se accusam; mas acceitando metade da importancia das terraplenagens e das obras correntes, teremos a metter em conta mais 82:435$200 réis, vê se que estas duas verbas sommam 237:620$400 réis.

Só a parte que o sr. Mousinho acceita como exacta no orçamento, e metade d'aquillo em que põe algumas duvidas, já importa em mais do que as £ 50:000.

Não vejo, portanto, que haja o menor inconveniente em se approvar esto projecto, cuja importancia é inferior áquella que resulta das informações do engenheiro fiscal.

Eu podia alongar me em mais considerações ; mas francamente não desejo tomar muito tempo á camara, mesmo porque, como já disse, os argumentos apresentados reduzem-se unicamente ao orçamento, á maneira como elle foi feito e á legalidade ou não legalidade da lei.

Quanto ao orçamento, ainda mesmo admittindo que não está exacto, já mostrei que a parte não contestada é superior ás £ 50$000, para que se pede a garantia.

Só acaso formos hoje rescindir o contrato, ou se não dermos á companhia a garantia indicada no artigo 26.° do contrato, que diz que, se ella for considerada insufficiente pela companhia, teremos de tornar conta do caminho, e pagar, não só todas as importancias gastas até hoje, mas um addicional de 10 por cento, e 10 por cento hoje sobre o que se tem gasto na India sobe acima de 600:000$000 réis. Por consequencia, entre dois males, quando mesmo se admitta que o outro é um mal, prefiro acceitar este acceitar a proposta do governo, que não ha fundamento algum para ser rejeitada.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bera.

O sr. Castro Monteiro (para um requerimento): - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se quer prorogar a sessão até se votar o projecto.

Consultada a camara foi approvada a prorogação até se votar o projecto.

O sr. José Novaes: - (O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)

A proposta de adiamento do sr. Fuschini foi rejeitada.

O projecto foi approvado.

A proposta de substituição do sr. Pedro Victor ficou prejudicada.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Luciano de Castro): - Mando para a mesa quatro propostas de lei.

Leram-se na mesa as seguintes quatro propostas de lei:

l.ª Para que as praças transferidas do exercito para as guardas municipaes sejam obrigadas a servir n'estas por espaço de tres annos, a contar dos respectivos alistamentos nas mesmas guardas.

2.ª Transferindo do concelho do Sobral de Monte Agraço para Villa Franca de Xira as freguezias de S. Miguel das Cardosas e do Nossa Senhora da Salvação da Arruda.

3.ª Auctorisando o governo, na parte que dependa da sancção legislativa, a fazer no regulamento, approvado por decreto de 12 de novembro de 1874, as modificações que forem necessarias para melhor organisação e execução dos serviços de sanidade maritima, não podendo, comtudo, augmentar a respectiva despeza.

4.ª Para que as disposições da carta de lei de 18 de julho do 1885, contidas nos
artigos 173.° e 174.º e respectivo paragraphos, sejam applicaveis ao serviço geral dos incendios do municipio do Porto com as seguintes modificações:

1.° O maximo da despeza d'este serviço será de réis 40:000$000 annuaes;

2.° O subsidio do thesouro publico será de 12 por cento da quantia consignada pela camara ás despeza d'aquelle serviço;

3.° A contribuição sobro as companhias e agencias seguradoras será de 6:666$666 réis.

Ás propostas vão adiante a pag. 1172.

Página 1165

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1165

O sr. Presidente: - Vae ler se o projecto n.º 35.

Leu se na mesa e é o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 35

Senhores. - A vossa commissão de administração publica foi presente o projecto de lei apresentado pelos srs. deputados Manuel Affonso Espregueira e Ernesto Julio Goes Pinto, concernente á approvação. na parte em que dependo de sancção legislativa, do contrato celebrado provisoriamente entre a camara municipal do concelho de Vianna do Castello e o cidadão francez Augusto Laverré, para a illuminação a gaz carbonico da mesma cidade. E porque do exame do referido contrato resulta que a sua realisação importa a satisfação de uma reconhecida necessidade publica e um importante melhoramento local, e que nas suas disposições cautelosamente se acham garantidos os legitimos interesses d'aquelle municipio, é a vossa commissão de parecer, ouvido o governo, que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É approvado, na parte em que carece de sancção legislativa, o contrato celebrado entre a camara municipal de Vianna do Castello e o cidadão francez Augusto Laverré, para ,a illuminação d'esta cidade por meio do gaz carbonico, já approvado por deliberação tomada pela commissão executiva da junta geral d'aquelle districto, em sessão de 16 de junho de 1887, e reduzido a escriptura publica em 4 do julho do mesmo anno.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, em 13 de abril de 1888. = E. J. Coelho = Albano de Mello = Julio Cesar de Faria Graça = Henrique de Sá Nogueira de Vasconcellos - José de Saldanha Oliveira e Sousa = A. Simões dos Reis = J. Simões ferreira.

Traslado da escriptura de contrato que entre si fazem a camara municipal d'este concelho de Vianna do Castello, representada pelo seu vice-presidente, servindo de presidente, o exmo. sr. Luiz de Andrade e Sousa, e o subdito francez Augusto Laverré, residente na cidade do Porto.

Saibam quantos virem este publico instrumento de escriptura de contrato para o estabelecimento da illuminação publica d'esta cidade da Vianna do Castello, por meio de gaz carbonico, que, sendo no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1887, aos 4 dias do mez de julho, n'esta mesma cidade de Vianna do Castello e secretaria da camara municipal, onde eu, Adriano Filgueiras de Amorim, secretario e tabellão privativo da mesma, na conformidade do disposto no n.° 4.° do artigo 160.° do actual codigo administrativo, oitava, perante mim e as testemunhas d'este instrumento ao diante mencionadas e no fim assignadas, compareceram de uma parte, como primeiro outorgante, o exmo. sr. Luiz de Andrade e Sousa, na qualidade de vice-presidente, servindo de presidente d'esta camara, como representante da mesma e executor da sua deliberação constante da acta da sua sessão de 23 de junho proximo findo e nos termos do consignado no n.° 4.° do artigo 123.º do citado codigo, e da outra parte Augusto Laverré, subdito francez, casado, sui juris, proprietario e negociante, morador na cidade do Porto á rua de S. Francisco, n.° 5. E pelo primeiro outorgante, o exmo. sr. Luiz de Andrade e Sousa, foi dito que, tendo a camara que representa reconhecido a conveniencia de estabelecer n'esta cidade a illuminação polo meio de gaz carbonico, em substituição da actual illuminação feita a petroleo, depois de previo concurso e satisfeitas as demais formalidades legaes, foi preferida a proposta apresentada pelo segundo outorgante, Augusto Laverré, por ser a mais vantajosa, ficando-lhe portanto adjudicado o estabelecimento e fornecimento da illuminação publica d'esta cidade; por meio de gaz carbonico, pelos preços constantes da alludida proposta e com as condições adoptadas pela camara, em sessão de 17 do março d'este anno e, por isso, em nome da mesma camara e como seu representante, estava justo e contratado com o segundo outorgante em firmar por este instrumento e na melhor fórma e via do direito o contrato definitivo para o estabelecimento da mencionada illuminação publica pela maneira seguinte:

l.ª Elle, segundo outorgaste, Augusto Laverré, ou a empreza que elle organisar, obriga-se a fornecer o gaz preciso para a illuminação publica e particular d'esta cidade, tanto nas praças, ruas, travessas e mais logares publicos actualmente existentes, como nas praças, ruas, travessas, etc., que de futuro &e abrirem, desde a ponte de S. Vicente, ao nascente da cidade, até ao sitio denominado da Cancella de Ancora, ao poente, e desde S. João de Arga, ao norte, até á extrema dos caes da cidade, junto ao rio Lima, incluindo a ponte metallica e suas avenidas, se a camara assim o entender.

2.ª Para este fim o segundo outorgante fará construir á sua custa os edificios, gazometros e mais apparelhos necessarios para a fabricação e deposito do gaz, e igualmente á sua custa fornecerá e collocará toda a tubagem, columnas, consolos e candieiros para a illuminação publica, sendo tudo propriedade sua emquanto durar o contrato.

3.ª O local para a construcção dos edificios, para a fabricação e deposito do gaz, será escolhido pelo segundo outorgante, ou empreza por elle organisada, de combinação e accordo com a camara, sendo o terreno necessario para a mesma construcção adquirido pelo segundo outorgante á sua custa, por titulo livre e allodial.

4.ª A fórma externa dos edificios fica sujeita á approvação da camara, sendo a respectiva planta apresentada na fórma do que dispõe o artigo 80.° do codigo de posturas, e satisfazendo-se ás mais prescripções do mesmo codigo e ás leis e regulamentos de saude publica.

5.ª Se a acquisição do terreno, a que se refere a condição 3.ª, se não poder effectuar por accordo entre o segundo outorgante e o respectivo proprietario, a camara dará os passos necessarios paia a instrucção e andamento do processo da expropriação por utilidade publica, ficando, porém a cargo do segunda outorgante as despezas que com isso se fizerem.

6.ª A canalisação do gaz pelas praças, ruas, viellas, etc., será feita em tubos de ferro fundido, com a capacidade e solidez necessarias e devidamente experimentados, com assistencia da camara ou de pessoa competentemente por ella commissionada para esse fim. Estes tubos serão assentes a uma profundidade nunca inferior a Om,60 abaixo do nivel das ruas, e sem prejuizo dos canos geraes da cidade, e dos das aguas potáveis, tanto publicas como particulares.

7.ª Os tubos parciaes de conducção de gaz para os edificios publicos ou particulares, e bem assim para os candieiros da illuminação publica, serão de ferro maleavel ou chumbo, com a necessaria solidez, e poderão aquelles ter na parte exterior dos mesmos edificios uma torneira, que só poderá ser fechada no caso de incendio.

8.ª Para o assentamento da tubagem, tanto geral e permanente, como particular e provisoria, terá o segundo outorgante direito de levantar o pavimento das praças, ruas, travessas, etc., e de fazer nas mesmas as precisas escavações, conservando, porém, nas ditas praças, ruas, travessas etc., quanto possivel, o espaço livre para o transito publico, e repondo tudo no estado em que se achava antes de effectuados aquelles levantamentos e escavações.

9.ª Se, depois de effectuada a canalização do gaz na fórma das condições anteriores, for necessario em qualquer ponto da cidade alterar a mesma canalisação em consequencia de obras municipaes ou particulares a effectuar, será o segundo outorgante obrigado a fazer essas alterações, sendo indemnisado pelo dono das obras que as motivaram.

10.ª Os candieiros da illuminação publica serão collocados em columnas ou consolos de ferro fundido, segundo as

Página 1166

1163 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

indicações dadas pela camara, podendo nas praças que a camara designar ser aquellas columnas ou consolos substituidos por candelabros.

11.ª A camara compete indicar onde devem ser collocados os candieiros dentro do perimetro constante da condição l.ª, sendo essa collocação feita do fórma que a somma das distancias não exceda á media de 45 metros de um a outro candieiro, sendo o numero minimo d'estes de 250.

Quando a camara queira augmentar o numero de candieiros em logares já illuminados, ou levar a illuminação a novos locaes dentro do perimetro marcado na condição l.ª, o segundo outorgante fica obrigado a collocar os candieiros requisitados, mas não poderá ser obrigado a collocar mais de 5 candieiros em cada mez.

Quando a camara queira mudar qualquer candieiro do local era que se achar para outro, fica o segundo outorgante obrigado a fazer estas mudanças á custa da camara, que não poderá exigir mais de 5 um cada mez.

12.ª A camara escolherá um dos typos de columnas e consolos em uso nas. principaes cidades em que ha illuminação a gaz. Para esto fim deverá, o segundo outorgante apresentar os respectivos desenhos, ficando archivado aquelle que for escolhido, não podendo o typo adoptado alterar-se senão por accordo entre a camara e o segundo outorgante.

13.ª Os candieiros da illuminação publica serão feitos com a precisa solidez, todos numerados, e terão os vidros da parle superior dos mesmos de vidro coalhado branco.

14.ª Tanto os candieiros como as columnas e consolos serão pintados, pelo menos, de tres em tres annos, pela fórma por que o são em Lisboa e Porto, e á custa do concessionario, conservando se sempre em bom estado.

15.ª Os bicos da illuminação publica darão todos uma luz uniforme, em fórma de leque, com as mesmas dimensões da da cidade de Lisboa. Nas noites de luar claro, desde o nascer até ao occasião da lua, poderão os candieiros ter metade da luz estipulada n'esta condição; mas, quer em um quer em outro caso, a pureza e a força photometrica do gaz não será inferior á da illuminação de Lisboa.

16.ª O gaz para a illuminação, tanto publica como particular, será obtido pela distillação unica o exclusiva do carvão de pedra, empregando se no fabrico os apparelhos mais aperfeiçoados para purificar o gaz.

17.ª Os candieiros da illuminação publica estarão accesos desde o occaso até ao nascer do sol, sendo permittida uma tolerancia de vinte minutos para accender e apagar toda a illuminação, e bem assim todo o servido do accender, apagar, limpar e numerar os candieiros e candelabros e o da conservação destes será tudo feito por conta e á custa do segundo outorgante.

18.ª Logo que os candieiros e candelabros da illuminação publica attinjam o numero de trezentos e cincoenta ou d'ahi para cima, ficará por esse facto o concessionario obrigado a fazer um abatimento não inferior a 2,5 por cento no preço animal de todos e cada um d'elles.

19.ª O gaz consumido na illuminação dos edificios, passeios e jardins, tanto municipaes como particulares, será regulado por metro cubico, conforme a indicação de contadores devidamente afilados, devendo o gaz que se consumir nos jardins, passeios o edificios municipaes, que forem illuminados somente parte da noite, ter o abatimento no seu preço em favor da camara na rasão de 20 por cento do da adjudicação.

20.ª Quando a camara ou qualquer particular pretender levar a effeito qualquer illuminação extraordinaria, será o preço e condições da mesma regulado de accordo entre o pretendente e o segundo outorgante, sem contravenção das condições do presente contrato e na certeza de que taes illuminações se não poderão realisar quando d'ellas resulte prejuizo para a illuminação publica, e será avisado o segundo outorgante com quarenta e oito horas de antecipação.

21.ª Tanto á camara como aos particulares fica garantido o direito de mandarem fazer as canalisações, dentro dos seus predios, como e por quem lhes convier, o bem assim o de adquirirem os contadores e mais apparelhos pela fórma que julgarem mais conveniente. O segundo outorgante, porém, não será obrigado a fornecer o gaz para estes estabelecimentos sem que por si ou por intermedio do seu engenheiro verifique o estado de solidez e capacidade, tanto da canalisação como dos mais apparelhos. Tanto a camara e os particulares como o segundo autorgante poderão fazer verificar a exactidão dos contadores, sendo esta verificação feita á exista de quem for achado em falta, e, não se dando esta, á custa de quem requerer aquella verificação.

22.ª A proposta do segundo outorgante acceita pela camara, que o primeiro outorgante representa, é referente ao periodo de vinte e cinco annos, e tal será a duração do presente contrato; e dentro d'este periodo terá o segundo outorgante o direito exclusivo do fornecimento do gaz, tanto para a illuminação publica como para a particular.

23.ª Se um anno antes de terminar o contrato, nem a camara nem o segundo outorgante declararem por escripto que o consideram terminada, ficará o mesmo vigorando por mais tres annos e assim successivamente, até que uma ou ambas as partes façam a competente declaração na fórma acima indicada.

24.ª Terminado o contrato pela fórma da condição anterior a camara tomará conta dos edificios de fabricação e deposito do gaz, da canalisação, candieiros e mais apparelhos e ainda da materia prima que sejam encontrados na fabrica e pagará ao segundo outorgante, ou empreza que o represento, o preço que por peritos se verificar valerem aquelles objectos na occasião um que forem adquiridos pela camara.

25.ª Para a avaliação constante da condição anterior, a camara nomeará dois peritos e um supplente e o segundo outorgante outros tantos, não podendo nem uns nem outros ser empregados ou dependentes da camara ou do segundo outorgante. Os quatro peritos farão a avaliação de tudo, e, havendo divergencia, um dos supplentes tirados á sorte decidirá, tendo de se conformar com qualquer das opiniões que motivarem o empate, e d'essa decisão não haverá recurso algum.

26.ª Qualquer contestação que possa haver entre a camara e o segundo outorgante ou empreza que o represente, com relação á interpretação e execução do contrato, será sempre resolvida pela fórma estabelecida na condição anterior.

27.ª Todos os apparelhos, machinismo, contadores, tubos, tijolos refractarios, carvão e tudo mais que for importado com destino á fabricação do gaz será isento de toda e qualquer contribuição municipal, emquanto vigorar o presente contrato.
Da mesma isenção gosarão os vernizes, coice, aguas ammoniacas, ou outro qualquer producto obtido da fabrica por a distillação do carvão de pedra e tambem durante o tempo do contrato.

28.ª A camara fica garantido o direito de por si, ou por pessoa do sua confiança, examinar a pureza do gaz, sua densidade e tudo mais que respeita á illuminação, para o que o segundo outorgante, ou empreza que o represente, facultarão todos os meios, sob pena de perderem da prestação que a camara lhes tiver a pagar a parte correspondente ao tempo por que embaraçarem aquelle exame.

20.ª Se qualquer incidente de força maior e imprevisto tornar necessaria a substituição temporaria da illuminação a gaz, pela de petroleo ou azeite, será o segundo outorgante, ou empreza que o represente, obrigado a participar á camara esse incidente e a justifical-o perante ella no praso de vinte e quatro horas.
As despezas resultantes d'esta substituição serão feitas á custa do segundo outorgante, e o preço da illuminação durante essa substituição não poderá exceder a 40 réis por candieiro e por noite.

Página 1167

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1167

30.ª A illuminação pela fórma das presentes condições estará definitivamente concluida dentro do dezoito mezes, a contar da data de hoje.

31.ª Logo que uma terça parte dos candieiros, a que se refere a condição 11.a, estiverem collocados em condições de poderem funccionar, poderá o segundo outorgante fazel-os accender e começar a receber a competente prestação proporcional ao numero de candieiros que se accenderem em cada noite.

32.ª Quando de futuro e findo o contrato a camara resolver illuminar a cidade de Vianna do Castello por outro systema ou meio de illuminacão; seja elle qual for, o segundo outorgante, ou empreza que o represente, terá a preferencia em igualdade de circumstancias.

33.ª O segundo outorgante, na sua qualidade de estrangeiro, renuncia e resigna todos os privilegios que lhe pertencem, ficando para todos os effeitos sujeito ás leis do paiz em tudo que disser respeito ou se ligar com o presente contrato.

34.ª As faltas ou omissões na execução deste contrato ficara sujeitas ás multas seguintes: 80 réis por noite e por candieiro da illuminação publica que, por falta ou desleixo do segundo outorgante ou dos seus empregados, estiver apagado; 40 réis por noite e cada candieiro que não estiver accesso ou for apagado antes das horas marcadas na condição 17.º; 40 réis por noite e cada candieiro que não estiver devidamente limpo; 40 réis por noite em cada candieiro que não tiver a luz marcada na condição 15.ª

35.ª Deixará de haver applicação de multas nos seguintes casos: quando o segundo outorgante, em consequencia de casos de guerra, bloqueio, pirataria ou qualquer outro de força maior, não poder obter o carvão necessario para fabricar o gaz. N'estas excepções não só comprehende a elevação do custo do carvão ou dos fretes do mesmo, que não pode ser allegado como attenuante de qualquer falta.

36.ª A imposição das multas julga-se justificada quando duas pessoas, que não sejam empregados ou dependentes da camara, attestem a existencia da falta em virtude da qual a multa foi imposta. As multas que se considerem legalmente impostas serão deduzidas no primeiro pagamento que a camara tiver de fazer ao segundo outorgante, depois d'aquella imposição.

37.ª O segundo outorgante mostrou, pelo recibo passado pelo thesoureiro d'esta camara, que n'este acto apresentou, ter entrado no cofre municipal com a quantia de 1:500$000 réis, cuja quantia será transferida para a caixa, geral de depositos, nos termos da condição 34.ª das condições sido adoptadas para a adjudicação do presente contrato.

38.ª O segundo outorgante perderá o direito a todo o deposito se dentro de seis mezes, contados da presente data, não der principio ás obras necessarias para a sua effectiva realisação. Para esse effeito a camara passará immediatamente o competente precatorio, dando entrada no cofre do municipio a quantia depositada.

39.ª Logo que o segundo outorgante tenha n'esta cidade matames ou tenha effectuado conatrucções de valor superior ao deposito, poderá requerer e ser-lhe-ha concedido o levantamento do tres quartas partes do referido deposito. A restante quarta parte só poderá ser levantada depois de definitivamente estabelecida a illuminação na fórma das presentes condições.

40.ª Em todos os casos tanto as construcções effectuadas, como os materiaes existentes nesta cidade, são hypotecca especial e garantia da fiel execução das condições do contrato e ficarão pertencendo á camara quando o segundo outorgante, ou empreza por elle organisada, abandonarem a illuminação durante o tempo do contrato.

41.ª O segundo outorgante, ou empreza por elle organisada, obriga se a fornecer o gaz preciso para a illuminação publica e particular, nos termos da primeira condição, pelos preços seguintes; cada candieiro de illuminação publica e por cada anno 15$900 réis, e por cada metro cubico de gaz, quer para a illuminação publica quer para a particular, 64 réis.

42.ª O custo de gaz consumido em cada mez com a illuminação dos candieiros publicos e com as dos estabelecimentos municipaes, será pago pela camara no praso de um mez.

43 .ª Se durante o praso da concessão a camara ou o segundo outorgante acharem conveniente mudar de systema de illuminação, poderão fazel-o por accordo mutuo.

44.ª Para todos os effeitos d'este contrato será considerada n'esta cidade a residencia do segundo outorgante, ou empreza que o represente, promptificando-se a responder nos tribunaes d'ella. Assim o disseram e reciprocamente acceitaram e outorgaram, do que dou fé.

E eu, Adriano Filgueiras de Amorim, secretario da camara municipal e tabellião privativo d'ella, escrevi este instrumento que os outorgantes vão assignar com as testemunhas a todo este acto presentes, Francisco Lopes Guimarães, casado, negociante, estabelecido á praça da Rainha, d'esta cidade, e Antonio de Moraes Cerqueira Lima, solteiro, de maior idade, guarda livros do banco agricola e industrial viannense, todos de mim reconhecidos pelos proprios, assim como os outorgantes, do que dou fé, depois de ser a todos lido por mim, que o escrevi e assigno em publico e rajo. - Assignados sobre um sello de estampilha do valor de quinhentos reis, assim inutilisados: "Quatro de julho de mil oitocentos oitenta e sete" - Luiz de Andrade e Sousa - Augusto Laverré - Francisco Lopes Guimarães - Antonio de Moraes Cerqueira Lima. - (Logar do signal publico.) - Em testemunho de verdade - O tabellião privativo da camara, Adriano Filgueiras de Amorim.

Está conforme a propria escriptura lavrada no livro de notas n.° 2 d'esta camara, ao qual me reporto. Vianna do Castello, 10 de janeiro de 1888. E eu Adriano Filgueiras de Amorim, secretario da camara municipal, a subscrevi e assigno em publico e raso. - (Logar do signal publico.) - Em testemunho de verdade = O tabellião privativo da camara, Adriano Filgueiras de Amorim.

Adriano Filgueiras de Amorim, secretario da camara municipal do concelho de Vianna do Castello.

Certifico, por ordem do exmo. presidente d'esta camara, que em sessão de 17 de março de 1887 deliberou a mesma camara abrir concurso por trinta dias, a contar da publicação do ultimo annuncio no Diario do governo, para o recebimento de propostas relativas á illuminação da cidade por meio de gaz carbonico ou de electricidade, as quaes deveriam ser apresentadas e abertas no dia seguinte ao termo do declarado praso, adoptando-se para este concurso as mesmas condições que para igual concurso foram approvadas em sessão camararia de 25 de novembro de 1885.

Outrosim certifico que, em sessão de 7 de maio de 1887, foram abertas as propostas dos tres unicos concorrentes, Augusto Laverré, Alfred Harrison & Ca. e Diniz da Costa Santiago de Carvalho e Sousa, nomeando a camara uma commissão composta de tres vereadores para emittir parecer ácerca de qual das propostas devia ser preferida, sendo, o referido parecer apresentado e discutido em sessão de 21 do indicado mez de maio, e approvado pela camara, ficando adjudicado o fornecimento da illuminação a gaz carbonico ao proponente Augusto Laverré pelos preços constantes da sua proposta, resolvendo-se que se proseguisse nos ulteriores tramites legaes para que só tornasse definitivo este contrato.

Outrosim certifico, que em data de 7 de junho, com o n.° 121, foi por esta camara dirigido á commissão executiva da junta geral deste districto o officio abaixo transcripto, acompanhado dos documentos a que o mesmo se refere:

"N.° 121. - Illmo. e exmo. sr. - Tenho a honra de passar ás mãos de v. exa., por copia, as tres propostas unicas

69 *

Página 1168

1168 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

apresentadas no concurso para adjudicação da illuminação d'esta cidade por meio de gaz carbonico, e bem assim da parte da acta em que tal adjudicação se fez, e das demais em que se tratou d'este assumpto, a fim de poder ser apreciada devidamente por essa commissão a legalidade deste contrato; e para que se torne com brevidade effectivo, rogo a v. exa. se digne declarar a esta camara se essa commissão usa ou não do direito de suspensão que lhe confere o artigo 121.° do codigo administrativo.

"Deus guarde a v. exa. Vianna do Castello, 7 de junho do 1887. - Illmo. e exmo. sr. presidente da commissão districtal delegada da junta geral. - O vice-presidente da camara, Luiz de Andrade e Sousa."

Outrosim, certifico que em 21 do referido mez de junho deu entrada, n'esta secretaria um officio da commissão executiva da junta geral d'este districto do teor seguinte:

"Carimbo da junta geral do districto de Vianna do Castello. - N.° 115. - Illmo. sr. - A commissão districtal, a quem foi presente o processo de adjudicação da illuminação publica da cidade de Vianna do Castello, por meio de gaz carbonico, enviado com officio de v. sa., n.° 121, de 7 do corrente mez, resolveu em sessão de 16 do referido mez declarar á camara da sua presidencia, em satisfação ao mesmo officio, que não usa da faculdade de suspensão ácerca da adjudicação de que se trata. O que communico a v. sa. para os fins convenientes.

"Deus guarde a v. sa. Vianna do Castello, 18 de junho do 1887. - Illmo. sr. presidente da camara municipal de Vianna do Castello. - O presidente da commissão districtal, José Augusto de Sousa Pinto."

Outrosim, finalmente, certifico que em sessão camararia de 23 do citado mez de junho do anno proximo findo, em que se deu conta do officio acima transcripto, deliberou a camara encarregar o sr. presidente de assignar a competente escriptura de contrato para o estabelecimento da illuminação d'esta cidade por meio de gaz carbonico, a qual foi lavrada em 4 de julho do mesmo anno.

Passo o referido na verdade, e aos proprios livros das actas das sessões da camara e mais documentos existentes nesta secretaria me reporto.

Vianna do Castello, 17 de janeiro de 1888. E eu, Adriano Filgueiras de Amorim, secretario da camara, o subscrevi e assigno. = Adriano Filgueiras de Amorim.

Senhores.- A camara municipal de Vianna do Castello contratou a illuminação da cidade por meio de gaz com Augusto Laverré, que foi o concorrente que offereceu a proposta mais vantajosa no concurso publico a que se procedeu. Este contrato foi celebrado com todas as solemnidades legaes, e contém disposições vantajosas para o municipio, permittindo obter-se sem grandes sacrificios um grande beneficio para a cidade, satisfazendo-se a uma reconhecida necessidade publica.

Entende a camara municipal que, para maior garantia dos interesses que lhe estão confiados, e indispensavel a approvação do parlamento na parte que depende de sancção legislativa para o referido contrato, e por isso temos a honra de submetter a vossa apreciação o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° É approvado o contrato celebrado em 4 de julho de 1887 entre a camara municipal de Vianna do Castello e o cidadão francez Augusto Laverré, para a illuminação a gaz carbonico da cidade de Vianna, segundo as condições constantes do mesmo contrato.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 18 de janeiro de 1888. = O deputado, E. J. Goes Pinto = O deputado, Manuel Affonso Espregueira.

Foi approvado sem discussão.

Leu-se o projecto n.º 33.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 33

Senhores. - Á vossa commissão de administração publica foi presente o projecto de lei n.° 27-E, apresentado pelo sr. deputado Santos Moreira, com o fim de ser approvado o contrato provisorio para a illuminação a gaz da villa da Povoa de Varzim, celebrado entre a camara municipal d'aquella villa e Alfred Harrison, aos 20 de fevereiro proximo passado.

Aquelle contrato importa um melhoramento notavel que vae satisfazer uma necessidade reconhecida e reclamada ha muito n'aquella villa.

E tendo a commissão examinado o referido contrato provisorio, achando-o em devida forma, é por isso de parecer que seja approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É approvado o contrato provisorio para a illuminação a gaz da villa da Povoa do Varzim, feito aos 20 de fevereiro do corrente anno, entre a camara municipal da dita villa e Alfred Harrison, com as condições constantes do referido contrato, que faz parte d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 6 do abril de 1888. = Eduardo José Coelho = Conde de Castello de Paiva = Conde de Villa Real = José de Saldanha Oliveira e Sousa = Julio Cesar de Faria Graça = Joaquim Simões Ferreira = Antonio Simões aos Reis, relator.

Sessão ordinaria de 9 de janeiro de 1888

Aos 9 de janeiro de 1888, n'esta villa da Povoa de Varzim e sala das sessões da camara municipal, estando presentes os vereadores Gonçalves Cascão, Martins Ferreira, Ferreira Terroso, Costa Marques e Leandro, faltando apenas, e por motivo justificado, o vereador Sá Vieira, foi pelo presidente da mesma, José Ferreira do Valle, aberta a sessão pelas dez horas da manhã; e, lida e approvada a acta em minuta da sessão anterior, foi apresentada a correspondencia seguinte:

Deliberações. - Propoz o presidente que fosse nomeada e encarregada uma commissão de estudar e confrontar as varias propostas que teem sido dirigidas por differentes emprezas a esta camara, para dotar esta villa com o importantissimo melhoramento da illuminação a gaz, e que a mesma fosse composta dos seguintes cavalheiros d'esta villa: José Fernandes da Silva Campos, Agostinho José da Silva e Oscar Grim Braga. O que unanimemente foi approvado. E não havendo mais nada a tratar encerrou-se a sessão pelas onze horas da manhã. De tudo se lavrou a presente acta em minuta, que todos vão assignar depois de lida por mim, José Antonio de Castro Alves, secretario da camara municipal, que a escrevi. - José Ferreira do Valle - José Gonçalves Cascão - Manuel Martins Ferreira - Antonio José Ferreira Terroso - Francisco da Costa Marques - Manuel Moreira Leandro. Nada mais continha a acta em minuta que para aqui mandei fielmente transcrever e vae novamente pelos mesmos vereadores ser assignada, depois de lida por mim, José Antonio de Castro Alves, secretario da camara municipal, que a subscrevo. José Ferreira no Valle - José Gonçalves Cascão - Manuel Martins Ferreira - Antonio José Ferreira Terroso - Francisco de Costa Marques - Manuel Moreira Leandro.

Está conforme n'esta parte. = O secretario, José Antonio de Castro Alves.

Sessão ordinaria de 18 de janeiro de 1888

Aos 16 de janeiro de 1888, n'esta villa da Povoa de Varzim o sala das sessões da camara municipal, estando presentes os vereadores Gonçalves Cascão, Martins Ferreira, Ferreira Terroso e Costa Marques, faltando por mo-

Página 1169

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1169

tivo justificado os restantes vereadores, foi pelo presidente da mesma, José Ferreira do Valle, aberta a sessão pelas onze horas da manhã; e, lida e approvada a acta em minuta da sessão anterior, foi apresentada a correspondencia seguinte:

Deliberações. - Foi lido o parecer elaborado pela commissão nomeada na ultima sessão, sobre as propostas até hoje apresentadas a esta camara para illuminar a gaz esta villa.

A commissão, confrontando os termos das diversas propostas, em numero de quatro, apresentadas por diffarentes emprezas, e comparando-as sob o ponto de vista economico e das garantias offerecidas, termina por aconselhar a camara a adoptar do preferencia ás outras a proposta apresentada por Alfred Harrison. Em vista do parecer da commissão e verificando a camara, pelo exame comparativo a que procedeu das referidas propostas, ser effectivamente a de Hariison relativamente mais vantajosa que qualquer das outras, e em absoluto perfeitamente acceitaveis os lermos e condições constantes da mesma proposta, deliberou acceitar a proposta de Alfred Harrison para illummar a gaz esta villa, para o que auctorisou o presidente a assignar o contrato provisorio o a promover tudo o mais que fosse necessario para levar a effeito este importantissimo melhoramento ha, muito reclamado pela grandeza e importancia d'esta populosa villa.

E não havendo mais nada a tratar, encerrou-se a sessão pela uma hora da tarde. De tudo se lavrou a presente acta em minuta, que todos vão assignar, depois de lida por mim; José Antonio de Castro Alves, secretario da camara municipal, que a escrevi.- José Ferreira do Valle - José Gonçalves Cascão - Manuel Martins Ferreira - Antonio José Ferreira Terroso - Francisco da Costa Marques. - Nada mais continha a acta em minuta que para aqui mandei fielmente transcrever e vae novamente pelos mesmos vereadores ser assignada, depois de lida por mim, José Antonio de Castro Alves, secretario da camara municipal, que a subscrevo.- José Ferreira do Valle - José Gonçalves Cascão - Manuel Martins Ferreira - Antonio José Ferreira Terroso - Francisco da Costa Marques.

Está conforme n'esta parte. = O secretario, José Antonio de Castro Alves.

Senhores. - A vossa commissão nomeada para dar parecer sobre as quatro propostas das emprezas que concorreram á iiluminação a gaz d'esta villa, tendo-as examinado bem e detidamente, julga que deve ser approvada a do engenheiro Alfred Harrison.

Na proposta de Alexandre Pomarede estabelece-se o preço do metro cubico de gaz para os estabelecimentos municipaes a 66 réis; ha proposta de La Rosa & Blasco, a 65 réis; na de John Clark e João Flores, mas só para os estabelecimentos municipaes d'onde a camara não aufira lucros, 50 réis; na de Alfred Harrison, 50 réis para todo e qualquer estabelecimento municipal.

Na proposta de Alexandre Pomarede o preço do metro cubico de gaz para as illuminações extraordinarias é de 66 réis; na de La Rosa & Blasco e de John Clark e João Flores não se falla de illuminações extraordinarias; o preço do metro cubico do gaz para estas illuminações é de 60 réis na proposta de Alfred Harrison.

Na proposta de Alexandre Pomarede o preço do metro cubico de gaz para usos mercantis e domesticos é de 80 réis; na de La Rosa & Blasco e John Clark e João Flores, 70 réis; na de Alfred Harrison, 70 réis.

Alfred Harrison, na condição 26.º, offerece-se a fornecer gaz para os estabelecimentos do estado, institutos de beneficencia e de ensino publico, a 60 réis por metro cubico, e, não havendo esta excepção nas propostas dos outros concorrentes, é claro que este gasto deve ser taxado pelo preço estabelecido para os particulares, que nas propostas de La Rosa & Blasco e de John Clark e João Flores é de 70 réis e na do Alexandre Pomarede de 80 réis.

Na proposta de Alexandre Pomarede o preço do fornecimento de gaz para a illuminação de cada candieiro destinado ás vias publicas é de 15$000 réis annuaes; La Rosa & Blasco não propõem preço annual; John Clark e João Flores pedem 14$000 réis annuaes, mas tres noites antes da lua cheia, em noites de lua cheia e tres noites depois da lua cheia, não mandarão accender os candieiros a não ser que a noite esteja nublada, e basta que se não accendam apenas tres noites por mez para o preço annual já exceder o de 15$000 réis; na proposta de Alfred Harrison, 10$000 réis.

La Rosa & Blasco offerecem-se para illuminar as vias publicas a 65 réis por metro cubico de gaz; John Clark e João Flores, a 60 réis; Alfred Harrison, a 50 réis. Alexandre Pomarede não faz proposta neste sentido.

Alexandre Pomarede, La Rosa & Blasco e John Clark e João Flores pedem terreno grátis á camara para o gazometro e edificiob annexos; Alfred Harrison não faz esto pedido, entendendo-se d'esta omissão, que o comprará.

La Rosa & Blasco e John Clark e João Flores querem o exclusivo d'esta industria por cincoenta annos; Alfred Harrison, por quarenta; Alexandre Pomarede propõe trinta e cinco annos; mas esta insignificante differença, sem importancia alguma real, não compensa, nem de leve, o excesso dos seus preços sobre os preços offerecidos por Alfred Harrison, que é do 6 réis nas illuminações extraordinarias, de 10 réis no preço do metro cubico de gaz para os particulares, de 16 réis nas illuminações dos edificios municipaes, e de 20 réis para os estabelecimentos do estado, institutos de beneficencia e de ensino publico.

John Clark e João Flores marcam a distancia de 40 metros entre os candieiros; Alfred Harrison, 45 metros, e quando a collocação de um candieiro poder aproveitar, á illuminação de uma rua transversal, mais 5 metros, o que pode dar a economia de alguns candieiros, nos duzentos e trinta e cinco que o municipio precisa estabelecer.

Finalmente, quando as condições da proposta de Alfred Harrison não são mais vantajosas para o municipio, que as dos outros proponentes, são pelo menos iguaes, e portanto a vossa commissão é de parecer que deve ser approvada a proposta d'este engenheiro.

Sómente entendemos dever fazer uma observação, que de certo achareis justa: Alfred Harrison offerece-se entregar a camara a quantia de 6:000$000 réis nominaes como garantia de execução do contrato, quando o contrato definitivo for assignado; mas não dá garantia nenhuma á camara até essa data.

Propomos então que, no acto da assignatura do contrato provisorio, o proponente preste a caução de 1:000$000 réis nominaes em inscripções do governo portuguez, ou o seu equivalente em moeda metallica, caução que só poderá ser levantada quando fizer o deposito de 6:000$000 réis.

Povoa de Varzim, 14 de janeiro de 1888. - José Fernandes da Silva Campos - Oscar Grim Braga - Agostinho José da Silva.

Está conforme. = O secretario da camara, José Antonio de Castro Alves. -
Escriptura de contrato para a illuminação a gaz hydro-carbonico da villa da Povoa de Varzim, que faz a camara municipal a Alfred Harrison, representante de uma empreza ingleza em 20 de fevereiro de 1888.

Saibam os que este publico instrumento de escriptura de contrato para a illuminação a gaz hydro-carbonico, desta villa, virem que no anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1888, aos 20 dias do mez de fevereiro do dito anno, n'esta villa da Povoa de Varzim, paços do concelho e sala das sessões da camara municipal, aonde eu secretario e tabellião privativo da camara me achava, aqui

Página 1170

1170 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

estavam presentes, de uma parte o sr. presidente da mesma o sr. José Ferreira do Valle, competentemente auctorisado pela camara em sessão ordinaria de 16 janeiro do corrente anno para, em nome da mesma camara, assignar este instrumento, e da outra o sr. P. M. Street como procurador de Alfred Harrison pessoa por mim reconhecida e pelas testemunhas no fim d'este instrumento declaradas e assignadas, logo pelo primeiro outorgante, na presença das mesmas testemunhas, foi dito que, tendo a camara pela sua deliberação approvado a proposta para a illuminação a gaz apresentada por Alfred Harrison, elle com os poderes conferidos pela mesma camara a ía reduzir a contrato, e pelo segundo outorgante foi declarado que, em nome do seu representado, se obrigava a executar a referida proposta, como n'ella se contém, a qual é do teor seguinte:

Condições da proposta para a illuminação a gaz da Povoa de Varzim

1.ª A companhia é obrigada a fornecer todo o gaz que lhe for competentemente requisitado para a illuminação permanente das vias publicas e estabelecimentos municipaes da villa e para as demais illuminações em geral, estabelecendo e conservando á sua custa as fabricas e material necessario.

§ 1.° O local do gazometro e edificios annexos será escolhido pela companhia, de accordo com a camara e sob approvação da auctoridade sanitaria.

2.ª Dezoito mezes depois de ser assignado o contrato definitivo, as fabricas, canalisações e demais utensilios devem estar completos e promptos a fornecer o gaz para a villa.

§ 1.° Em caso de força maior, a camara concederá o praso conveniente para o acabamento das obras.

§ 2.° Quando todas as obras estiverem promptas serão examinadas pela camara. Se houver algum defeito será remediado immediatamente, sob pena de multa.

3.ª A camara tem a faculdade de nomear um fiscal que superintenda nas obras.

4.ª A companhia fará á sua custa todas as despezas de fabricação, purificação e distribuição de gaz para o que se obriga a levantar e conservar, a expensas suas, todos os gazometros, apparelhos e mais material preciso, que ficará sendo propriedade da companhia.

§ unico. Se no fim do periodo por que ha de durar este contrato a camara quizer adquirir as fabricas, officinas, canalisação, etc., serão estas cedidas á camara e por esta pagas á companhia pelo valor que for arbitrado pelos peritos nomeados para fazeram a louvação.

5.ª A companhia poderá executar na via publica todos os trabalhos necessarios para collocar, substituir e concertar a sua canalização, sujeitando-se ás prescripções e ordens camararias que lhe forem dadas para garantia e segurança do transito publico, e para o prompto restabelecimento e concerto do pavimento das vias publicas.

§ unico. A companhia obriga-se a tomar todas as precauções para evitar alguma avaria ou prejuizo aos encanamentos actualmente assentes ou a quaesquer outras obras ou construcções publicas ou particulares durante a collocação de tubos ou canos.

6.ª A camara promette todos os seus bons officios para remover quaesquer difficuldades levantadas entre a companhia e os particulares, especialmente nos casos em que, para a collocação dos tubos ou para outros trabalhos, seja preciso atravessar ou devassar-lhes as propriedades. Quando estas difficuldades se não podarem resolver amigavelmente, a camara empregará todo o seu valimento para que as obras sejam declaradas de utilidade publica e urgente.

7.ª Feita uma escavação será collocado o cano e o pavimento posto no seu estado primitivo. Se esta condição não for cumprida ou se o trabalho ficar mal feito, a camara poderá mandar fazer de novo aquelle serviço, sendo a despeza paga pela companhia.

8.ª Os candelabros ou candieiros e braços necessarios á illuminação das vias publicas serão fornecidos e collocados pela companhia á sua custa, serão feitos de chapa de cobre e assentarão sobre braços ou columnas de ferro fundido, conforme os modelos já empregados e constituirão propriedade da companhia.

9.ª A camara cede gratuitamente á companhia o uso dos candieiros da illuminação actual, com seus braços e columnas para serem accommodados á illuminação a gaz á custa da companhia.

§ unico. No fim do contrato todo este material voltará para a camara sem indemnisação alguma para a companhia.

10.ª Se a camara ou a companhia resolverem alterar a fórma dos candieiros, braços ou candelabros, ou estabelecer logo modelos para serviços especiaes, poderão fazel-o precedendo accordo entre as duas partes, fixando-se n'essa occasião a despeza a fazer por parte da camara com a renovação do material.

11.ª Todos os candieiros collocados nas vias publicas, largos e praças, serão numerados, e tanto elles como os seus supportes serão pintados uma vez, pelo menos, em cada periodo de dois annos.

§ unico. Em todos os largos e praças, e nas ruas de dez metros de largura, pelo menos, em que os passeios tenham a largura minima de 1m, 50, serão os candieiros assentes sobre columnas.

12.ª A companhia obriga-se a illuminar, em harmonia com a 1.ª condição, qualquer via nova, ou outra já existente, mas ainda não illuminada, correspondendo um candieiro a 45 metros de canalisação linear geral.

§ unico. É permittida a tolerancia até 5 metros a mais na canalisação linear, quando a collocação de um candieiro possa aproveitar a illuminação de uma rua transversal, continuando a seguir-se, para os candieiros immediatos, o principio de um candieiro para 45 metros de canalisação linear.

13.ª A camara poderá de futuro, a expensas suas, alterar a collocação dos candieiros, sob a fiscalisação gratuita da companhia.

14.ª Quando a camara queira illuminar alguma estrada ou ruas fóra da povoação, a companhia collocará os candieiros e fornecerá o gaz nas condições precedentes, comtanto que a quantidade de candieiros requisitada não seja inferior a vinte, e que a rua ou estrada não fique mais de 1:400 metros distante do ultimo candieiro da villa.

15.ª O serviço de accender, apagar, limpar, numerar e pintar os candieiros da illuminação publica será feito pela companhia e a expensas suas.

16.ª Os candieiros das vias publicas estarão accesos desde o ocaso até ao nascer do sol.

§ 1.° É permittida á companhia uma tolerancia de meia hora no tempo gasto em accender e apagar os candieiros.

§ 2.° O tempo da illuminação e extincção do gaz será determinado pela camara n'uma tabella elaborada no principio de cada anno.

§ 3.° Durante as noites de luar claro, os candieiros das vias publicas serão illuminados a meia luz.

17.ª A canalisação e distribuição do gaz será feita em tubos de ferro fundido, do capacidade sufficiente para satisfazer as exigencias publicas e particulares, e serão examinados por pessoa competente escolhida pela camara.

18.ª Quando forem requisitados pela camara illuminações especiaes, todos os canos, apparelhos, etc., que seja preciso collocar, serão fornecidos pela companhia, mas á custa da camara. Estas illuminações devem ser requisitadas por escripto com antecedencia de vinte e quatro horas.

§ unico. O preço do metro cubico de gaz para estas illuminações extraordinarias será de 60 réis.

18.ª A O preço do metro cubico de gaz consumido nos edificios municipaes será de 50 réis.

19.ª A camara garante á companhia o numero minimo

Página 1171

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1171

de 235 candieiros, destinados á illuminação das vias publicas.

§ 1.° O preço annual do fornecimento de gaz para a illuminação de cada candieiro será de l5$000 réis.

§ 2.° Quando a camara quizer augmentar o numero d'estes candieiros o preço da illuminação de cada um será o mesmo indicado.

§ 3.° Se a camara preferir pagar por metro cubico o gaz consumido na illuminação das vias publicas, o preço ao metro cubico d'este gaz será de 50 réis.

20.ª A camara póde impor á companhia as multas seguintes, que lhe serão deduzidas nos pagamentos:

I. De 200 réis por noite e por candieiro publico que não for acceso por negligencia dos empregados da companhia;

II. De 100 réis em cada candieiro que for acceso depois do tempo determinado, ou apagado antes.

21.ª A companhia não incorre em penalidade:

I. Quando algum candieiro deixe de ser acceso em predio vedado por tapumes, ou em consequencia de obras na respectiva canalisação;

II. Quando algum candieiro for apagado por effeito de temporal, ventania, ou malevolencia;

III. Caso de força maior, devidamente comprovado.

22.ª A companhia será prevenida por escripto, no dia immediato á falta que se lhe imputar, das deducções que a camara julgar dever fazer, apresentando-lhe n'essa occasião a camara as provas da falta, para que ella a conteste, querendo, no praso de dez dias, contados do recebimento da prevenção, sob a comminação de se haver por confessa.

§ unico. As provas virão de duas testemunhas que não tenham sido empregados da camara nem da companhia.

23.ª A camara obriga-se, emquanto durar este contrato, a não lançar tributo nenhum sobre a producção, distribuição ou consumo do gaz, assim como sobre o carvão ou outras materias primas que possam ser empregadas n'esse fabrico.

Serão igualmente isentos de direitos municipaes todos os materiaes usados na construcção e reparo dos diversos edificios e apparelhos necessarios ao fabrico, distribuição e consumo do gaz, e os contadores, estufas, apparelhos ou machinismo preciso para o consumo particular.

24.ª Se, por caso de força maior, a illuminação publica for parcial ou totalmente interrompida, a companhia a substituirá immediatamente e a expensas suas, emquanto durar a interrupção, pela de azeite ou petroleo.

§ unico. A camara cede á companhia, durante o praso d'este contrato, os depositos dos candieiros existentes.

25.ª A companhia observará na construcção das obras os regulamentos especiaes e geraes com relação á saude e segurança publica, empregando todos os apparelhos e methodos mais approvados.

26.ª Alem da illuminação das vias publicas e estabelecimentos camararios, a companhia é obrigada a fornecer todo o gaz requisitado para a illuminação dos edificios onde funccionarem as repartições e estabelecimentos do estado, repartições dos corpos administrativos, institutos de beneficencia, caridade e ensino publico.

§ 1.° O gaz para os estabelecimentos mencionados é fornecido pelo preço de 60 réis por metro cubico.

§ 2.° O pagamento da illuminação das vias publicas e dos estabelecimentos municipaes é feito em prestações mensaes, pagas dentro dos primeiros quinze dias seguintes ao mez vencido e será garantido pelos rendimentos municipaes.

27.ª A companhia é obrigada a fornecer o gaz que lhe for requisitado pelos particulares para usos domesticos e industriaes, tanto diurnos como nocturnos, em todas as epochas do anno, para o que conservará a conveniente pressão em toda a rede da sua canalisação.

§ 1.° O preço do metro cubico de gaz para os usos domesticos, mercantis e industriaes é de 70 réis.

§ 2.° A companhia poderá reduzir o preço marcado na anterior condição em favor de uma determinada industria, comtanto que a concessão se estenda a todos os estabelecimentos da mesma industria.

28.ª O volume de gaz consumido será determinado por contador approvado pela camara e pela companhia e devidamente afferido pela repartição competente.

29.ª O consumidor de gaz poderá comprar o contadora quem lhe convier, uma vez que esteja aferido legalmente, ou alugal-o á companhia, que será obrigada a fornecel-o pelos preços mensaes seguintes: contadores para duas luzes, 130 réis; para tres, 150 réis; para cinco, 180 réis; para dez, 280 réis; para vinte, 400 réis; para trinta, 500 réis; para cincoenta, 600 réis; sendo os contadores de maior numero de luzes, alugados pelo preço ajustado com a companhia em contrato particular.

30.ª A indicação dos contadores obrigará ao pagamento do gaz que mostrarem ter por elle passado, quando não haja reclamação, tanto do consumidor como da companhia, tres dias depois da contagem ter sido apresentada ao consumidor.

§ unico. Alem da aferição official obrigatoria podem os consumidores e a companhia exigir quantas quizerem, recaindo as despezas sobre quem tiver exigido a aferição.

31.ª O inquilino que deixar um predio é obrigado a participar a mudança á companhia para que a sua responsabilidade cesse com a contagem do gaz consumido.

32.ª A companhia obriga-se a fazer e reparar á sua custa as canalisações precisas, desde o tubo geral das ruas, travessas, praças e largos, e mais vias publicas, até á casa de qualquer consumidor de dentro da villa; fóra da povoação, e não estando em execução a condição 14.ª, as despezas da collocação dos canos e outros trabalhos serão pagas pelo consumidor.

33.ª Na extremidade de cada canalisação externa das casas será collocada uma torneira a impedir a entrada do gaz em caso de incendio, de reparações internas e de falta de pagamento.

34.ª A canalisação interior das casas deve ser feita debaixo da inspecção da camara. Approvado o trabalho, a companhia fornecerá o gaz immediatamente.

35.ª A companhia só poderá ser obrigada a fornecer gaz aos consumidores que garantam o consumo de um anno, pelo menos, e poderá suspender o fornecimento de gaz ao consumidor que não pagar o que tiver consumido.

36.ª Nenhum piqueteiro será admittido a introduzir o gaz nas casas particulares, sem estar devidamente auctorisado e considerado pela camara como artista competente.

37.ª A camara garante á companhia o fornecimento exclusivo do gaz para a illuminação da villa da Povoa de Varzim, tanto publica como particular (incluindo todas as industrias a que o gaz é applicado) pelo espaço de quarenta annos, a contar do dia em que for tornado obrigatorio por lei o contrato celebrado entre as duas partes.

§ 1.° Findo aquelle praso cada uma das partes poderá denunciar o contrato e rescindil-o, prevenindo a outra com um anno de antecedencia.

§ 2.° Se nenhuma das partes usar da faculdade do paragrapho antecedente, considerar-se-ha prorogado por periodos de cinco annos, podendo ambas as partes no fim de cada periodo usar do direito de rescisão, com o aviso previo de um anno.

§ 3.° No caso que a camara não deseje renovar o contrato e entenda pôr a concurso o fornecimento de gaz, dará em igualdade de circumstancias a preferencia á companhia.

38.ª Todas as questões que possam suscitar-se entre as duas partes contratantes sobre os direitos de cada uma e sobre a execução das presentes condições, serão decididas por um tribunal arbitrai que julgará a appellação.

§ 1.° O tribunal constará de cinco membros, que não

69 **

Página 1172

1172 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

sejam nem tenham sido empregados da camara nem da companhia.

§ 2.° Cada uma das partes nomeará dois arbitros de reconhecida competencia nas questões a tratar, que serão pagos pela parte que os nomear.

§ 3.° Os quatro arbitros nomearão um quinto, que presidirá ao julgamento, e, no caso de empate, resolverá a questão.

§ 4.° No caso de os quatro arbitros não poderem escolher o presidente, será o tribunal presidido pelo juiz de direito.

39.ª Se durante o periodo de quarenta annos se descobrir algum systema de illuminação superior ao do gaz e a camara quizer adoptal-o, sómente o fará de accordo com a companhia.

40.ª Logo que este contrato for approvado pelo governo, a companhia depositará a quantia de 6:000$000 réis em inscripções ou o seu equivalente em metal, deposito que será retido pela camara, como garantia ao cumprimento das obrigações contrahidas como segurança de quaesquer multas em que a companhia possa incorrer.

§ 1.° Durante o tempo em que o deposito de 6:000$000 réis estiver em poder da camara, a companhia tem direito a receber os juros das inscripções; se o deposito, porém, for em metal, não receberá juros nenhuns.

§ 2.° Á caução será devolvida á companhia logo que mostre que os edificios, fabricas, etc., estão devidamente construidos e concluidos, e a illuminação estabelecida satisfactoriamente.

§ 3.° Levantada a caução, constituirão hypotheca especial ao pagamento á camara pelos damnos causados pela companhia ao municipio, todos os estabelecimentos e material da companhia.

41.ª O domicilio da companhia é para todos os effeitos legaes na villa da Povoa de Varzim.

42.ª Se a companhia quizer transferir este contrato, devo apresentar á camara o nome da pessoa, pessoas ou companhias a quem propoz o trespasse, e todos os encargos desta concessão. Estas pessoas ou companhia serão reconhecidas pela camara como os primeiros concessionarios, se a camara as julgar pessoas competentes e idoneas.

43.ª Fica expressamente declarado que o contrato definitivo deve ser assignado quando a camara estiver legalmente auctorisada, e mais se declara que esta concessão principia a vigorar desde a data de tal assignatura.

44.ª As clausulas d'este contrato poderão a todo o tempo ser augmentadas ou alteradas, se as partes contratantes assim o julgarem de mutuo interesse. Alfred Harrison dará mais todas as garantias que lhe forem exigidas e fará, de accordo com a camara e sob sua approvação, um regulamento de obrigações mutuas, baseado nos regulamentos das emprezas do mesmo género existentes em Portugal.

Povoa de Varzim, 23 de julho de 1887. - Por procuração, de Alfred Harrison, Perey Miller Street.

É o que se contem na dita proposta, que fielmente para aqui trasladei da propria, a que me reporto.

E sendo presente o thesoureiro d'esta camara municipal, Narciso Baptista Carneiro, pelo dito Perey Miller Street, procurador de Alfred Harrison, lhe foi entregue a quantia de 570$000 réis em metal correspondente a uma inscripção de 1:000$000 réis, como caução ao cumprimento do contrato provisorio, condição imposta pela commissão nomeada para dar o seu parecer sobre as propostas de illuminação a gaz e approvada pela camara; e de como o dito thesoureiro a recebeu e d'ella ficou entregue, assigna a presente escriptura. E de como assim o disseram, estipularam e acceitaram, do que dou fé, vão assignar este instrumento as testemunhas presentes: padre Francisco Leite de Moraes e Candido Augusto Landolt, casado, ambos d'esta villa, depois de lhes ser lido por mira, José Antonio de Castro Alves, secretario e tabellião privativo d'esta camara, que a subscrevi e assigno em publico e raso. E vae sellado este instrumento com o sêllo respectivo. - O presidente, José Ferreira do Valle. - Por procuração de Alfred Harrison, P. M. Street - Padre Francisco Leite de Moraes - Candido Augusto Landolt - O thesoureiro da camara, Narciso Baptista Carneiro. - Em testemunho de verdade. - Logar do signal publico. - O tabellião privativo, José Antonio de Castro Alves. - Logar das estampilhas devidamente inutilisadas do valor de 500 e 300 réis.

O qual instrumento vae conforme ao original do proprio livro de notas, com o n.° 5. Povoa de Varzim, era ut retro. Eu, José Antonio de Castro Alves, secretario e tabellião privativo da camara municipal, a subscrevo e assigno em publico e raso. Em testemunho de verdade. = O tabellião privativo, José Antonio de Castro Alves.

Districto do Porto. - Commissão districtal, delegada da junta geral - Repartição da junta geral - N.° 4 - Illmo. sr. - Em vista dos documentos que acompanharam o officio que v. sa. me expediu em 28 de fevereiro ultimo, entrado nesta secretaria no dia immediato sob n.° 141 e pedidos pelo meu officio n.° 3, de 17 do referido mez, resolveu a commissão districtal de minha presidencia, em sessão de 5 do corrente mez, não usar do direito de suspensão sobre a deliberação tomada pela camara na semana finda em 4 de fevereiro, pela qual resolveu acceitar a proposta de Alfred Harrison para lhe ser adjudicada a illuminação a gaz da villa da Povoa de Varzim, visto ser esta proposta a que maiores vantagens offerece.

Deus guarde a v. sa. Porto, 8 de março de 1888. - O presidente, Columbano Pinto Ribeiro de Castro. - Illmo. sr. presidente da camara municipal da Povoa de Varzim.

Está conforme. = O secretario, José Antonio de Castro Alves.

N.° 27-E

Artigo 1.° É approvado, na parte que carece de sancção legislativa, para que possa tornar-se definitivo, o contrato provisorio feito aos 20 de fevereiro ultimo, entre a camara municipal da villa da Povoa de Varzim e Alfred Harrison, para a illuminação da dita villa por meio do gaz, com as condições constantes do referido contrato, o qual faz parte d'esta lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos deputados, 22 de março de 1888.= O deputado pela Povoa de Varzim, José de Sousa Santos Moreira.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é o projecto de lei n.° 14.

Está levantada a sessão.

Eram quasi seis horas da tarde.

Propostas de lei apresentadas pelo sr. ministro do reino n'esta sessão

Proposta de lei n.° 40-D

Senhores. - Por decreto de 10 de fevereiro de 1887, foi transferida a sede do antigo concelho da Arruda para a villa de Sobral de Monte Agraço. Acontece, porem, que as freguezias de S. Miguel das Cardosas e de Nossa Senhora da Salvação da Arruda, do novo concelho de Sobral de Monte Agraço, preferem ser annexadas ao concelho de Villa Franca de Xira, o que é tambem aconselhado pela proximidade, em que se acham d'esta villa, e pela estreiteza de relações commerciaes, que com ella manteem.

N'estas circuinstancias pois, e em harmonia com os preceitos, que devem reger a divisão territorial para os effeitos administrativos, e com a vontade assim das mencionadas, como das restantes freguezias do concelho, tenho a

Página 1173

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1173

honra de submetter á vossa illustrada consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° São transferidas do concelho do Sobral de Monte Agraço para o de Villa Franca de Xira as freguezias de S. Miguel das Cardosas e de Nossa Senhora da Salvação da Arruda.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 12 de abril de 1888.= José Luciano de Castro.

A commissão de administração publica.

Proposta de lei n.º 40-E

Senhores. - Para satisfazer ás exigencias de uma boa organisação dos serviços de sanidade maritima nomeou o governo, pela portaria de 16 de setembro de 1887, uma commissão que actualmente se tem occupado da sua tarefa, encarregando-a de rever o regulamento approvado e mandado executar por decreto de 12 de novembro de 1874 a fim de propor as modificações, que n'elle julgasse conveniente introduzir em harmonia com os progressos da sciencia medica e com a experiencia colhida durante a sua execução.

Não estando, porém, ainda concluidos os trabalhos da referida commissão, e sendo de toda a conveniencia que não se façam esperar as providencias que se mostrarem convenientes n'este ramo do serviço publico, julga o governo que deve antecipadamente pedir ás côrtes a necessaria auctorisação para as modificações do actual regulamento, que d'ella dependem, pondo-lhe todavia a claesula de não augmentar a despeza agora descripta no orçamento do estado.

Tenho, pois, a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É auctorisado o governo, na parte que dependa da sancção legislativa, a fazer no regulamento approvado por decreto de 12 de novembro de 1874 as modificações que forem necessarias para melhor organisação e execução dos serviços de sanidade maritima, não podendo comtudo augmentar a respectiva despeza.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 12 de abril de 1888.= José Luciano de Castro.

Á commissão de saude publica.

Proposta de lei n.° 40-F

Senhores.- Determinam os artigos 173.° e 174.º da lei organica do municipio de Lisboa, de 18 de julho de 1885, que o maximo das despezas com o serviço geral do incendios n'este municipio, seja de 60:000$000 réis annuaes, contribuindo o thesouro publico com o subsidio de réis 8:000$000 e as companhias e agencias seguradoras, com a contribuição annual de 10:000$000 réis.

Da organisação d'este serviço advieram para a capital resultados vantajosos, e portanto é de justiça e conveniencia que os poderes publicos, deferindo ao pedido da camara municipal do Porto, tomem resoluções analogas ás dos citados artigos da lei organica do municipio de Lisboa com relação á cidade do Porto, onde o estado tambem possue importantes edificios, e onde, alem de outras rasões ponderosas, é grandemente interessado, assim como o são as companhias e agencias seguradoras, em que se estabeleça uma boa organisação do serviço de incendios.

A dotação d'este serviço na cidade do Porto, segundo o respectivo orçamento ordinario para o corrente anno, é apenas de 15:212$800 réis, que a camara promette elevar desde já, em orçamento supplementar, a 20:000$000 réis, convem, porém, auxiliar o municipio para que esta serviço possa ser devidamente dotado e estabelecido.

Reconhecida a conveniencia e necessidade de providencias legislativas no sentido indicado, resta precisar qual deva ser o maximo das despesas do municipio da cidade do Porto com o serviço geral dos incendios, qual o subsidio do estado e qual a contribuição que deva ser imposta ás companhias e agencias seguradoras n'aquella cidade.

Calculando que a população do Porto seja dois terços da de Lisboa, e partindo d'esta base, determina-se proporcionalmente que aquelle maximo deva ser de 40.000$000 réis, e que as ditas companhias e agencias devam contribuir com a quantia annual de 6:666$666 réis.

O subsidio do thesouro, calculado pela mesma proporção, deveria ser de 5:333$333 réis; é, porém, de attender, que elle não deve ser calculado simplesmente pela mesma proporção, por não traduzir esta realmente a differença entre os valores dos estabelecimentos que o estado possuo n'uma e n'outra cidade, e que, portanto, forçoso é recorrer a um arbitrio, quanto possivel rasoavel e equitativo; sendo alem d'isto, mais conveniente que este subsidio, em vez de ser determinado em quantia fixa, seja de percentagem sobre as quantias que a camara consignar às despezas do serviço que se trata.

A percentagem de 12 por cento das quantias que pela camara forem consignadas, parece rasoavel, pois, dará desde já um subsidio de 2:400$000 réis, e não póde em caso algum eleval-o a mais de 4:800$000 réis.

Taes são os motivos pelos quaes temos a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° As disposições da carta de lei de 18 de julho de 1885, contidas no artigo 173.° e no artigo 174.º e respectivos paragraphos, são applicaveis ao serviço geral dos incendios do municipio do Porto com as seguintes modificações:

1.° O maximo da despeza d'este serviço será de réis 40:000$000 annuaes;

2.° O subsidio do thesouro publico será de 12 por cento da quantia consignada pela camara ás despezas d'aquelle serviço;

3.º A contribuição sobre as companhias e agencias seguradoras será de 6:666$666 réis.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 21 de abril de 1886. = José Luciano de Castro.

Á commissão de administrarão publica, ouvida a de fazenda.

Proposta de lei n.° 40-G

Senhores. - Ás praças que se alistaram nas guardas municipaes de Lisboa e Porto eram obrigadas á servir por espaço de cinco annos pela respectiva legislação especial anterior á ultima lei do recrutamento dos exercitos de terra e de mar.

Mui importantes alterações, fez porém, n'este assumpto a lei de 12 de setembro de 1887, que de facultativo, ou dependente de contrato, como era o referido serviço, o tornou obrigatorio, estatuindo no § unico do artigo 72.° que o ministerio da guerra determine annualmente o contingente com que as divisões militares poderão contribuir para as guardas municipaes. Para este mesmo fim exige o § unico do artigo 47.° do regulamento de 29 de dezembro de 1887, que o ministerio do reino, em vista da proposta do commandante geral das guardas municipaes, indique ao da guerra o numero de praças, que tenham pelo menos um anno de serviço, que for mister para se preencher o alludido contingente.

A manifesta necessidade de ter completo o effectivo das guardas municipaes e a difficuldade, com que de ha muito se luctava para o conseguir, tornou, sem duvida, preferivel este systema. Não ficaram, porém, da mesma sorte ga-

Página 1174

1174 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

rantidas as exigencias e especialidade do serviço policial, que requerem que este seja prestado por mais largo tempo que o do exercito, como tambem acontece com o da marinha.

Como a citada lei não contenha expressamente disposição especial a este respeito, tem se entendido que as praças do exercito, que se transferirem para os corpos da guarda municipal, não são obrigadas a servir ali por mais tempo, que o indispensavel para completarem o tempo ordinario do serviço militar, o que tornará tão limitada o permanencia d'essas praças nas guardas municipaes, que quasi se pode dizer, que serão despedidas do serviço, quando acabarem de n'elle se instruir, e mais aptas estiverem para o desempenhar.

N'estas circumstancias, pois, é de incontestavel necessidade e justiça que se atteadam e conciliem quanto possivel assim as exigencias do serviço, como os interesses dos individuos, que sejam chamados a prestal-o.

N'este intuito parece de todo o ponto conveniente, que a obrigação de serviço na guarda municipal seja pelo mesmo espaço de tempo que se acha estabelecido para o exercito, e que por isso que a natureza especial d'aquelle serviço exclue os soldados bisonhos, exigindo-se para o respectivo alistamento que tenham no exercito determinado tempo de serviço, lhes seja este largamente descontado no que tiverem de permanecer na reserva.

É evidente que o serviço policial muito lucrará com taes providencias, em que aliás só contemplam tambem os interesses das praças que o hão de desempenhar, e parece deverem-se ainda acrescentar com a de se permittir que sejam admittidas nas guardas municipaes as praças da primeira reserva que dêem garantia de bom desempenho, e que se obriguem a servir por determinado tempo, ficando por esto facto dispensadas do que lhes faltar nas reservas, e com a de se readmittirem as praças casadas que assim o requeiram e mereçam, o que tudo facilitará o preenchimento dos quadros com voluntarios aptos para o serviço.

Por estes fundamentos pois, temos a honra de submetter á vossa illustrada consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º As praças transferidas do exercito para as guardas municipaes, são obrigadas a servir n'estas por espaço de tres annos, a contar do respectivo alistamento nas mesmas guardas.

Art. 2.° Só podem ser transferidas para as guardas municipaes as praças, que no exercito hajam, servido dez a doze mezes, sendo do infanteria, ou doze a quinze mezes, sendo de cavallaria e estando umas e outras devidamente instruidas nas suas armas.

§ 1.° Serão de preferencia transferidas para as guardas municipaes as praças que assim o requeiram, e tenham servido no exercito por tempo igual ou superior ao que, n'este artigo se exige para a transferencia.

§ 2.° O tempo que tiverem de serviço no exercito as praças transferidas para as guardas municipaes, será em dobro diminuido d'aquelle, que hajam de permanecer na reserva.

Art. 3.° Poderão ser admittidos a servir nos guardas municipaes por tres annos os individuos, que, tendo completado o serviço do exercito sem nota, se achem na primeira reserva, e não tenham mais de trinta e cinco annos de idade.

Aos individuos, que servirem nos termos d'este artigo será dispensado o serviço das reservas.

Art. 4.° É permittida a readmissão das praças das guardas municipaes casadas, que assim o requeiram, e satisfaçam ás restantes condições legaes.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 16 de abril de 1888. = José Luciano de Castro.

Á commissão de guerra.

Por deliberação da camara publica-se o seguinte:

Illmo. e exmo. sr. - Tenho a honra de communicar a v. exa. que tendo continuado no exame detalhado do novo orçamento supplementar encontro muitas verbas cuja importancia excessiva não pode admittir-se sem esclarecimentos precisos. Não é facil fazer este trabalho em pouco tempo e com o pessoal que aqui tenho, em cuja grande maioria é tal a falta de habilitações e experiencia, que se lhe não pode entregar qualquer trabalho de confiança. E este o motivo por que só pouco a pouco tenho podido enviar a v. exa. a minha informação que desejo seja bem detalhada, a fim de que v. exa. possa bem ver quanto é inexacto, e até inverosimil, o novo orçamento supplementar apresentado. Na mala de hoje envio a v. exa. um trabalho especial sobre o orçamento dos tunnois; tenho bastante adiantado um trabalho analogo sobre as terraplenagens o estou tambem organisando um outro sobre o material em ser (plant); ficam-me restando para desenvolver os orçamentos relativos ás obras de arte e edificações. Nos capitulos restantes não ha necessidade de entrar em detalhes, pois são insignificantes as differenças.

Não sendo, porém, possivel enviar hoje a v. exa. todos os esclarecimentos que possuo e estou reunindo para demonstrar cabalmente os erros do novo orçamento, e até mesmo alguns, e importantes, do que foi approvado em 1885, enviarei, comtudo, uma informação generica com respeito a cada um dos capitulos do novo orçamento.

CAPITULO I

Estudos e primeira installação

Aqui nada ha a dizer; a despeza conservou-se a mesma.

CAPITULO II

Terraplenagens

O enorme augmento apresentado neste capitulo não tem justificação alguma; e pelas medições, classificação de trincheiras e distribuição de terras, está-se vendo que longe de haver o augmento de 2-04-015, haverá talvez uma economia igual, ou maior ainda do que esta cifra, logo que seja feita a medição exacta do trabalho executado e se lhe appliquem os verdadeiros preços que lhe correspondem, tanto pelo que respeita á natureza do terreno escavado, como ás distancias a que foi transportado, e isto mesmo sem entrar em linha de conta com os enormes erros que se commetteram na distribuição das terras, antes de eu tomar posse d'este logar, erros que já não me foi possivel impedir, porque não só estavam já expropriadas muitas terras cuja expropriação se podia ter evitado, como tambem pela circumstancia de terem já sido lançadas a deposito muitas terras que vantajosamente poderiam ter sido aproveitadas para aterros. Sobre este capitulo ha immensas considerações a fazer, por isso lhe destino um relatorio especial, que terei a honra de submetter á esclarecida apreciação de v. exa. logo que se tenha concluido o trabalho a que se tem estado a proceder no campo, e que espero fique prompto esta semana ou quando muito na seguinte.

Têem-se já encontrado enormes differenças em algumas trincheiras nos Ghates, sobre tudo. Está tambem perfeitamente averiguado que as terras que foram aproveitadas das trincheiras para fazer os aterros figuram no orçamento duas vezes, e pela importancia dos preços (quasi sempre superiores tanto aos que nos pagamos nas obras publicas, como aos de linhas analogas na India) vê-se bem que estes preços comprehendem os transportes.

Creio que isto seria mais do que sufficiente para rejeitar o orçamento proposto nesta, parto; preciso, porém, pôr bem em evidencia este erro, pois é enorme a differença causada por elle, e a companhia de certo procurará defen-

Página 1175

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1175

der-se aqui, onde é facil haver questões, por isso que, durante a fiscalisação anterior, nenhum elemento se colheu do trabalho, e estabeleceu-se o precedente de consentir o desperdício das terras de trincheiras, expropriando ao lado da linha todas as terras para aterros.

Logo que cheguei acabei com tal systema, e não só deixei de expropriar muitas terras pedidas, das annullei até alguns contratos já feitos, devendo notar a v. exa. que todas as vezes que isto se deu, excepto uma, foi de accordo com os engenheiros da companhia. Apenas uma vez o sr. Sawyer fez questão; a base da sua argumentação, porém, creio nem se póde tomar a serio, pois este engenheiro diz que a distancia de 220 metros deve ser considerada extraordinaria !!...

Logo na primeira conferencia forcei o sr. Sawyer a fazer declarações n'este sentido, e elle não póde deixar de concordar que a companhia era obrigada a aproveitar as terras de trincheiras, sempre que isso fosse mais economico, do que o custo da expropriação sommado com os do transporte e da escavação.

É esta uma das indemnisações a que entendo o nosso governo tem todo o direito.

Para avalial-a, porém, é preciso pessoal e tempo, e até hoje ambos estes elementos têem faltado; tenho tido, como v. exa. sabe, o quadro da fiscalisação sempre incompleto; encontrei o pessoal auxiliar sem a menor noção dos seus deveres, sem theoria nem pratica; caiu-me gravissimamente doente um dos chefes de secção que dahi trouxe commigo; não me forneceram nem meios materiaes nem moraes que pedi ao governo local; e tive de me occupar das obras publicas que encontrei n'um abandono muito comparavel áquelle em que estavam os serviços do caminho de ferro.

Desculpe-me v. exa. estas reflexões, talvez inopportunas, porque, por parte do governo da metropole, eu tenho recebido sempre todo o auxilio que tenho solicitado; outro tanto, porém, não me tem succedido aqui, porque os governos locaes, não tendo quem consultar competente sobre o assumpto, dão ouvidos á companhia que me apresenta, já se vê, (é systema muito conhecido) como caprichoso e theorico; e nestas condições resolvem pelo lado economico apparente e pelo lado diplomatico, pois o engenheiro da companhia tem sempre o cuidado de apresentar uma ameaça pendente, que com uma certa desculpa, aterra os que são completamente estranhos a esta ordem de estudos, que, se não demandam um talento robusto, não deixam, comtudo, de exigir o conhecimento perfeito dos principies sanccionados pela experiencia, e, n'este caso, mais ainda, o das mil tricas com que as grandes emprezas procuram sempre illudir os incautos, lisonjeando-os, e simulando admirar a sua perspicacia para os chamar ao seu voto.

Creio que me ha de ser necessario em breve alongar as considerações que sobre este ponto tenho a fazer, pois as suas consequencias começam a manifestar-se num ultimo decreto que tenho presente.

Collocado n'estas circumstancias, vejo-me forçado a entrar em muitos detalhes para affirmar de um modo bem positivo e categorico a minha opinião.

Terminando o que sobre este capitulo tenho a dizer a v. exa., repetirei o que sempre tenho dito.

Caso se dê ao artigo 21.° do contrato a interpretação que a companhia lhe dá, e que lhe permitte a mais completa liberdade de acção sem a mínima responsabilidade, e ficando assim a empreitada da construcção fora das leis estabelecidas em toda a parte para regular a materia, a unica maneira de resolver a questão será proceder no fim da construcção a uma liquidação geral, avaliando uma a uma todas as obras executadas, com a devida auctorisação, e applicando aos seus metrados os preços de uma serie que se estabeleça de commum accordo entre as duas partes contratantes, para o que não ha a menor difficuldade visto que temos duas linhas logo a seguir á nossa na Índia britanica, construídas na mesma epocha, e temos os nossos preços das obras publicas, que têem a sancção da pratica, pois todas as construcções têem sido arrematadas em hasta publica e cumpridos os contratos.

Não me parece que a companhia possa airosamente negar se a isto, e nós nada temos a pedir, pois ella não póde apresentar preços superiores aos que tem dado; portanto, só poderemos baixar, visto que em regra os preços da West India Portuguese Railway são superiores a tudo quanto até hoje se tem visto na India, e creio até que em toda a parte.

Já se vê que ha casos, excepcionaes que podem ter determinado em um ou outro ponto preços especiaes, mas claro está que a confrontação que proponho só póde ter logar entre elementos perfeitamente homogeneos.

Este systema, que deve ser empregado em todos os trabalhos, é nas terraplenagens indispensavel, pois os effeitos das chuvas torrenciaes do paiz podem determinar variações nos cubos de grande importancia.

É esta uma das rasões por que as terraplenagens apparecem muito sobrecarregadas no orçamento, porque a companhia faz os seus calculos nos Gathes, sobretudo com tal segurança que a leva a um exagero enorme.

Só no fim de tudo o passado o primeiro inverno sobre as terraplenagens que estão ainda por concluir se póde saber ao certo o custo executado.

Para bem mostrar a v. exa. como isto é vulgar nos caminhos de ferro da India, bastará citar o que se passou no ultimo inverno, que deu logar a um tal desabamento n'uma trincheira que obrigou a um corte supplementar para dar o talude estavel de mais de 800:000 pés cubicos.

Não é provavel que isto succeda em mais ponto algum, nem aqui mesmo teria suecedido, se os engenheiros da companhia tivessem attendido às indicações que opportunamente lhes foram feitas pela fiscalisação; pois não era difficil a qualquer engenheiro experiente prever este desabamento, e em fevereiro foi d'isso avisada a companhia, mas não fez caso da advertencia, e depois o inverno veiu confirmar a minha opinião, fazendo desabar numa só noite um cubo tal que interceptou a passagem dós comboios durante mais de cinco mezes.

Na região dos Ghates dá-se o contrario e em grande escala; os cubos com que se conta no orçamento são muito superiores aos que realmente terão de se executar.
Na mala seguinte terei a honra de enviar a v. exa. o resultado das ultimas medições a que procedeu ultimamente o chefe de secção, Pedro Mousinho, que aqui tenho demorado de accordo com s. exa. o governador geral, para completar este trabalho, que, embora simples, exigo desembaraço, e os empregados subalternos que tenho não o tem, e o chefe de secção Almeida Campos tem-me sido indispensável aqui para colleccionar e confrontar todas as notas colhidas na epocha anterior por elle, e para me auxiliar na organisação do serviço de exploração.

CAPITULO III

Balastro e vias

Ha uma economia importante.

CAPITULO IV

Tunneis

Remetto um trabalho especial, mappas de preços e outros documentos.

CAPITULO V

Obras de arte

Apparece uma enorme differença sem que se tenha auctorisado trabalho algum addicional. Nunca o sr. Sawyer propoz coisa alguma n'este sentido, nem enviou projecto algum modificado.

CAPITULO VI

Não tem importancia.

Página 1176

1176 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

CAPITULO VII

Ha economia.

CAPITULO VIII

Tem aqui logar a mesma observação que fiz sobre as obras de arte, e agora ainda reforçada pela circumstancia do sr. Sawyer me ter declarado no seu officio n.° 5 de 18 de janeiro ultimo que nenhuma rasão tinha para suppor que esta verba fosse angmentada.

O sr. engenheiro da companhia diz agora que o augmento provem de casas para operarios.

A differença porém só por si é mais do que a importancia total gasta n'este genero de construcções na linha W. D. L. da linha britannica para a construcção de 81 milhas, quando a nossa tem apenas 52.

Creio que sobre este capitulo bastará esta consideração.

Comtudo, como muitas edificações deverão ser arrendadas como diz o proprio sr. Sawyer, por aqui não terá logar augmento algum.

CAPITULO IX

Telegrapho

É tambem a despeza na nossa linha quatro vezes maior do que a da linha ingleza a que acima me referi.

CAPITULO X

Material circulante

É regular, attendendo ao grande esforço de que necessita a tracção dos Ghates. O custo porém só pode saber-se pelos contratos feitos em Londres.

CAPITULO XI

Administração

É tambem superior em quasi dois laks 2-00-000 de rupias a da mesma linha ingleza que é muito mais extensa.

Capitulo á parte - Material (Plant.)

Figura alem d'estas verbas 2-93-130 rupias dadas aos contratadores Thompson Dixon & Ca. na liquidação que se lhe fez; esta verba compõe-se de tres partes: uma pertencente ao capitulo especial (plant.) material em ser, outra foi arbitrada pela avaliação dos materiaes de construcção de que a companhia tomou posso, e a terceira pelas construcções auxiliares.

A 1.ª verba foi .... 85-239
A 2.ª .... 40-050
E a 3.ª .... 1-08-141

Tudo isto deveria concorrer para a baixa de preços, e pelo contrario deu effeitos oppostos; os preços augmentaram em muitos trabalhos. Alem de todos os outros que tenho apresentado parece-me este argumento digno de consideração.

Resta-me agora informar sobre o capitulo especial (plant.) material em ser.

A avaliação directa das verbas que entram n'este capitulo é muito morosa e difficil; o material, estando disseminado por toda a linha, arrecadado nos armazens, inutilisado algum e nos estaleiros e trabalhos accessorios, seria longo proceder á verificação do seu inventario; informarei por isso pelo processo que tenho empregado, em condições analogas, por comparação com linhas em condições comparaveis, e continuarei a tomar o orçamento da Jejury Division na W. D. L., que é, como já disse, muito mais extensa, pois tem mais de vez e meia o desenvolvimento da nossa.

O capitulo correspondente n'esta linha apresenta a verba de 1-40-850, ao passo que a nossa, depois de deduzidas as verbas que realmente lhe não pertencem e que devem passar para o porto, e as machinas para os tunneis, (que não ha na linha ingleza) importa em 4-59-585; isto o, mais de tres vezes a verba orçada na linha da India inglesa. Sem entrar nos detalhes d'este capitulo, pelos motivos que tive já a honra de expor a v. exa. notarei comtudo duas verbas que são de um exagero inverosimil.

(a) O custo de vias portateis que figura com 1-28-137, o que me parece impossivel, e por isto estou verificando este ponto. Na linha ingleza W. D. L. no orçamento nem figura esta verba, o que me leva a crer que ella é incluida nos preços dos transportes, onde, como já tive a honra de dizer a v. exa., devia ir tambem a nossa, por isso que não só os preços de terraplanagens são em geral muito elevados, como tambem alguns contratos parciaes mostram que a companhia recebe aluguer dos tarifeiros pelos carris e wagonetes do que se servem.

A outra verba exagerada é a de conservação, que sobe a 79:669 rupias, e nos orçamentos inglezes não figura.

Esta verba deve tambem ser cortada, pois entra de certo na avaliação das despezas com os trabalhos, e pelos contratos de tarefas vê-se tambem que a companhia exigo aos tarefeiros a reparação do material que lhe fornece e que depois teem de entregar.

Por hoje nada mais se me offerece acrescentar; tenho elementos para melhor desenvolver a minha informação, mas não me sobra, o tempo para os grupar e confrontar por forma a chegar a conclusões irrefutaveis, como já fiz nos tunneis, e estou concluindo nas terraplenagens.

Irei mandando mais elementos, pois chegarão ainda a tempo de serem avaliados antes que a questão tenha de ser apresentada em côrtes.

Terminando, direi que me parece conveniente que o governo portuguez não porca este ensejo que se lhe offerece para fazer rectificar todo o orçamento no fim das obras, pois com isso nada tem a perder, porquanto a companhia não pode exigir mais do que o que tem apresentado, e tudo leva a crer que as differenças em nosso favor devem ser consideraveis.

Deus guarde a v. exa. Secretaria de inspecção da fiscalisação do caminho de ferro e porto de Mormugão, 29 de dezembro de 1886. - Illmo. e exmo. sr. conselheiro director geral do ultramar. = O engenheiro inspector, Fernando Luiz Mousinho de Albuquerque.

Memorandum relativo ao augmento de preços de escavação em tunneis, apresentado pelo sr. engenheiro Sawyer no ultimo orçamento supplementar de 1884-1887.

A fim de melhor se poder ajuizar o assumpto de que me occupo n'este memorandum, pareceu-me conveniente expor a v. exa. as principaes circumstancias que se teem apresentado durante a construcção dos tunneis.

Começarei por apresentar as opiniões emittidas antes do começo dos trabalhos pelos dois engenheiros que estudaram a questão.

No sou relatorio, datado de 3 de setembro de 1881, diz o sr. engenheiro Xavier Cordeiro:

"O preço dos tunneis é de 7$456 réis por metro cubico comprehendendo o revestimento, tanto no orçamento do sr. Sawyer como no do sr. Bayby, o que corresponde a réis 125$260 por metro corrente para uma só via e 186$400 réis para os de duas vias. No Great indian peninsular railway o preço da esccavação somente ora do 6 rupias por jarda cubica ou 2$982 réis por metro cubico, preço este que está em harmonia com os precedentes. Attendendo que os tunneis são todos de pequena extensão, são admissiveis estes preços."

Vê-se, portanto, que o sr. engenheiro Sawyer propunha, e o sr. engenheiro Xavier Cordeiro, que tinha colhido informações sobre as linhas da India britannica, acceitava o preço de 6 rupias por jarda cubica.

Página 1177

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 117?

É esta a primeira phase do orçamento.

Depois d'isto fez-se o contrato com a companhia Thompson Dixon e fixou-se o preço de 7 rupias por jarda cubica para a escavação em tunneis. Este preço é igual ao que se adoptou, e que ainda se conserva na Southern maharatha railway, na secção que vem ligar com a nossa. A empresa Thompson pouco, ou mesmo quasi nada, fez nos tunneis, por isso nenhuma consideração se me offerece apresentar com respeito a este periodo.

Rescindido o contrato com o emprezario Thompson Dixon, a companhia concessionaria começou a trabalhar por sua conta, e no seu orçamento de 1884 conserva ainda o preço de 7 rupias para os tunneis.

Em maio de 1885 o sr. engenheiro da companhia apresenta já no orçamento o preço da escavação em tunneis 17-2-8 e propõe para o trabalho que resta a fazer 14-0-00 para todos os tunneis, excepto os dois mais brandos os n.ºs 7 e 10, onde conserva o preço de 7 rupias. Foram estes os preços apresentados com o orçamento de 1885.

No novo orçamento apresentado agora pelo mesmo engenheiro o preço da execução dos tunneis eleva-se a uma media de 20-6-2. É inverosimil um tal acrescimo, e é isso o que me parece poder provar a v. exa., servindo-me das proprias cifras e declarações do auctor do orçamento.

Nos doze mezes que decorrem entre março de 1884 e março de 1880, epocha em que foi apresentado o ultimo orçamento supplementar approvado, vê se, por um perfil de avançamento dos tunneis que me foi dado pelo sr. engenheiro Sawyer, pouco depois da minha chegada aqui, que os trabalhos executados na escavação em tunneis se distribuem pelo modo seguinte:

Mappa n.° 1:

Galerias 1:925

Alargamento 306

Stross 1:176

Total 3:407

Este trabalho, diz o sr. engenheiro Sawyer a paginas 17 do seu orçamento de 1885, que lhe ficou por um preço medio de 17-2-8, e em vista d'este resultado, e calculando que no anno seguinte a relação entre a escavação a executar em galerias e em alargamentos e stross diminuia consideravelmente, propõe para os trabalhos a executar o preço medio de 14 rupias para os tunneis em rocha dura e conserva o preço do 7 rupias para os tunneis brandos, o 7.° e 10.º O sr. Sawyer chegou, como se vê, a este resultado depois de mais de um anno de experiencia.

Examinando agora o novo orçamento supplementar, encontram um preço de execução muito superior.

No orçamento apresentado este anno encontra se no capitulo I «construcção da linha», o artigo 4.° «tunneis», designando o trabalho executado até á data do orçamento, em galerias, alargamentos e stross os seguintes numeros:

Galerias de arrancamento 9:345

Alargamentos e atroas 18:492

27:837

Para o trabalho das galerias dá o sr. Sawyer o preço de 35 rupias, e para o restante 13, e propõe para os trabalhos que ha ainda a fazer, 30 rupias para a galeria e 12 rupias para os alargamentos e stross.

Estes preços dão, para os trabalhos executados de abril de 1885 a abril de 1886, um custo medio de execução de 20-6-2, e para os trabalhos ainda a executar 12-14-0.

Comparando o preço de execução 20-6-2 dos trabalhos feitos na quadra de 1885-1886 com os que se executaram em igual periodo do anno anterior, nota-se uma enorme differença para mais n'aquelles. Esta differença é (20-0-2)- (17-8-8)= 3-3-6.

Não vejo motivo algum que possa justificar este augmento, bem pelo contrario todas as declarações do sr. engenheiro Sawyer, todas as circumstancias do trabalho e todos os dados colhidos pela fiscalisação desde que me foi possivel organisal-a de um modo regular, que foi em dezembro do anno passado, mostram da uma maneira que me parece incontestavel que um tal augmento não podia ter logar.

Apresentarei primeiramente a v. exa. as declarações do proprio engenheiro que elaborou o orçamento. O sr. Sawyer orçou primeiro os tunneis a 6 rupias, depois deu-os a 7 á empreza Thompson Dixon, e quando se liquidou com esta empreza deu-se um facto que me parece digno de reparo. Para o citar, permitia me v. exa. que aqui transcreva as proprias palavras do sr. engenheiro Sawyer.

No memorandum que acompanhou o seu orçamento de 1884, documento n.° l, diz o sr. engenheiro da companhia, referindo-se aos tunneis:

«With regard n.° 8 (artigo tunnci&). I have adhered to the contract rate and hope that the work may be done for this sum. We have however no data just now to go upon mrs. Manning who have had a good deal of expenence in Ceylon, tendered for this work at rupiecs 9 per cubic yard insted of rupiees 7 but as the cost of the machinery is estimated for under the item plant I. Fhink the work should be done for the rate put down.»

Por aqui se vê bem que o sr. engenheiro Sawyer ainda em maio de 1884 achára regular o preço de 7 rupias a jarda cubica, e n'esta epocha s. exa. devia conhecer perfeitamente a natureza da rocha, por isso que um dos tunneis mais rijos tinha já trabalhos executados, e era justamente o tunnel n.° 2, que não só é o mais duro, como tambem o mais insalubre, e isto se vê bem nos perfis de avançamento que enviei a v. exa., pois é n'este tunnel que se nota uma marcha mais lenta. Apesar d'isto o sr. engenheiro da companhia não attendeu a proposta de 9 rupias que lhe faziam empreiteiros experimentadas, e preferiu construir por sua conta. Os resultados d'este modo de proceder vêem-se no orçamento seguinte, onde, em vez de 9 rupias, apparecem 17-2-8, quasi o dobro, para o preço medio do trabalho feito, e propõem-se 14 para o restante.

Custa realmente a crer que um engenheiro que se acha á testa de trabalhos d'esta ordem commetta erros tão grosseiros; o que deixo exposto, porém, são verdades garantidas pela sua propria assignatura.

Admittindo, porém, o preço de 14 rupias, que já foi approvado superiormente, para os trabalhos que havia a fazer desde abril de 1885 até á conclusão dos tunneis, vejamos uma outra declaração que me faz o sr. Sawyer no seu officio n.° l1 de 26 de janeiro, cujo original tenho a honra de passar ás mãos de v. exa.

N'este officio, documento n.° 2, propõe o sr. engenheiro da companhia a substituição de duas trincheiras em rocha muito dura nos Ghates por dois pequenos tunneis.

Citei já este officio a v. exa., repito-o hoje aqui, porque desejo reunir todos os argumentos em que me fundo para combater n'esta parte o novo orçamento suplementar.

Em fins de janeiro, portanto, o proprio sr. Sawyer diz que os tunneis mais difficeis lhe custam em media 13-8-0 a jarda cubica.

Note v. exa. que este preço é apresentado pelo sr. engenheiro da companhia dois mezes apenas antes do seu orçamento supplementar, isto é, depois de um anno e dez mezes de experiencia. Creio que em taes condições já se não podia errar muito.

Ficam expostas as opiniões do sr. engenheiro Sawyer até janeiro de 1886.

Vejamos agora os preços que apresentou em abril.

Como disse a v. exa. o preço medio de execução que figura no orçamento que estou informando para a escavação em tunneis desde o começo até abril do corrente anno é: 20-6-2 e os trabalhos a que só refere este preço são:

Página 1178

1178 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

isto é a relação n'esta epocha entre os trabalhos em galeria e os do alargamento stross è representada pela expressão 9:345: 18:492 ou proximamente 0,51.

Por consequencia affirmando o sr. engenheiro Sawyer no seu orçamento de 1885 que o trabalho executado em escavação nos tunneis lhe tinha ficado por um preço medio do 17-2-8, e dizendo agora no seu novo orçamento que o custo medio se elevou a 20-6-2, confessa que o trabalho do 1885 pura 1886 lhe ficasse mais caro, o que é inteiramente inverossimil.

Por mais que tenha procurado explicar um tal resultado, declaro a v. exa. que o não tenho conseguido; pois não só se não encontram nas condições do trabalho mais deficientes, mas ato tudo parece n'esta epocha ter facilitado o andamento dos tunneis.

Em primeiro logar, na epocha de 1884-1885 os trabalhos em galeria foram em muito maior proporção; depois o numero de machinas que estiveram em serviço foi tambem maior, alem disso, como o sr. Sawyer diz no seu relatorio de 188», o cholera apparecêra n'aquelle anno nos Ghates e por isso encareceu e difficultou o trabalho, ao passo que no periodo de 1886 não houve epidemia alguma que causasse transtorno; acresce ainda a maior experiencia do pessoal, que de certo só aperfeiçoou no sou mister, e ainda a maior facilidade de transportes tanto de pessoal como de material por estar já aberta uma parte de linha entre Sanvordem e a base dos Ghates.

Poderia dizer se que internando-se mais os tunneis a natureza da rocha tivesse variado e se apresentasse muito mais resistente. Tambem posso afirmar a v. exa. que ainda esta circumstancia é favoravel aos trabalhos de 1886, pois que, não só se não deu tal circumstancia, mas até o tunnel mais brando, que é o n.º 10, não tinha eido atacado em 1885, e fim 1886 fez-se ahi muito trabalho, o que devia contribuir para o abaixamento da media geral.

Posso provar isto a v. exa. enviando as amostras da rocha encontrada a differentes distancias das bocas que tenho obtido desde que aqui estou, mas o exame dos perfis que tenho mandado a v. exa. mostra bem que o trabalho, longo de ter sido demorado por novas difficuldades que tivessem apparecido, apresenta, pelo contrario, em quasi todos os tunneis uma, tendencia para melhorar, pois o seu avançamento medio, ou se conservou o mesmo, ou augmentou um pouco.

Posto isto, permitta-me v. exa. que exponha aqui algumas considerações que julgo conveniente apresentar para melhor intelligencia do que deixo dito.

Os tunneis dos Ghates foram todos atacados, pelo methodo conhecido pela denominação de methodo belga.

Este systema consiste em abrir primeiramente uma galeria na parte superior e media do tunnel, com as dimensões de 2m,5X2m,5, são estas as dimensões geralmente adoptadas, n'esta galeria, a que só chama galeria do avançamento trabalham quatro parelhas de mineiros, segue-se-lhe o alargamento que vem a ser a escavação das porções lateraes que restam para formar o calote do tunnel, e depois a stross, que é a escavação a fazer na parte inferior.

É ponto assento por todas as praticas que o custo da perfuração da galeria é pelo menos duplo do do alargamento e o preço do stross varia entre 1/3 e 1/4 do da galeria.

Admittindo a hypothese mais favoravel para o sr. engenheiro da companhia, tomo como assente que o alargamento custa, metade da galeria o a stross 1/2, e vou applicar ao trabalho feito em galerias no orçamento do 1885 o preço de 35 rupias que o sr. Sawyer diz terem-lhe custado em 1886 quando já tinha mais machinas em serviço e o trabalho mais bem organisado.

N'este caso teremos:

Galeria, 1:935X35 = 67:725.

Isto é, só o trabalho em galerias importaria em mais do que a importancia total que dá o orçamento, que é apenas de 58:522.

Couclue-se d'aqui que o custo das galerias até abril de 1885 foi muito interior a 35 rupias.

Adoptando sensivelmente as relações que acima ficaram estabelecidas, e applicando os preços aos cubos executados, vê se que os preços em numeros redondos quo mais se approximam são:

24 rupias para o custo da jarda cubica em galeria.

12 rupias para a alargamento.

8 rupias para a stross.

pois que vem:

1:935 X 24 46:440

306 X 12 1:062

1:176 X 8 9:408

57:510

que differe pouco da importancia 58:522 rupias do orçamento. Vê-se portanto que o preço das galerias até abril do 1885 foi 24 rupias proximamente.

Como v. exa. vê, tornando por base os preços de execução apresentados polo sr. engenheiro Sawyer em 1885 e admittindo as relações estabelecidas pelos praticos de l, 1/2; 1/3 entre os preços de perfuração em galeria, de alargamento e do stross, chega-se para os trabalhos em galeria a um preço de 24 rupias proximamente a jarda cubica, e o sr. engenheiro Savyer pretende agora no seu novo orçamento que se lhe admitta o preço de 35 rupias que apresenta como custo médio de igual trabalho na quadra de 1885 a 1886.

Já disse a v. exa. que não vejo circumstancia alguma que podesse causar uma tal differença, pelo contrario, concorriam para baixar a media todas as circumstancias que resumidamente vou mencionar.

1.° Maior numero de perfuradoras no trabalho;

2.° Maior experiencia do pessoal;

3.° Maior facilidade nos transportes do pessoal e material;

4.º Augmento do superintendentes especiaes que expressamente vieram de Inglaterra, e ainda hoje aqui estão em numero não inferior a vinte e dois, apesar de estarem concluídos quasi todos os tunneis.

5.º Maior proporção dos trabalhos mais faceis (alargamentos e stross) como bem mostra o mappa respectivo que com este memorandum tenho a honra de passar ás mãos de v. exa.;

6.º Maior proporção de trabalho de escavação em rocha branda, pois que o tunnel n.° 10 só foi atacado n'esta quadra e o seu custo é muito menor, como bem mostra o avançamento da galeria respectiva.

Ha uma unica circumstancía que poderia ter concorrido para a elevação do preço; vem a ser a maior distancia das bocas dos tunneis; isto, porém, que é importante em tunneis extensos, não tem aqui valor algum, pois o maior dos tunneis tem apenas 254 metros e ha alguns de 60 metros. Tenho até aqui apresentado a. v. exa. os argumentos que me forneceu a comparação dos orçamentos e as opiniões do seu proprio auctor.

Passarei agora a submetter á esclarecida apreciação de v. exa. os resultados deduzidos dos elementos colhidos no local da obra pelos empregados da fiscalisação.

Para maior clareza reuni em dois mappas n.ºs II e III que junto a este memorandum envio tambem a v. exa.

Os preços a que chego n'estes mappas devem ser bastante superiores aos reaes, por isso que supponho sempre

Página 1179

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1179

que se utilisaram todos os dias do mez, o que realmente não succedia; supponho tambem que os turnos estavam sempre completos, o que nem sempre acontecia; tomo a secção media de é metros quadrados e ella era em geral um pouco superior, arredondei todas as verbas parciaes aproximando as por excesso, e finalmente acrescento ainda ao custo real uma enorme verba para administração, que sem duvida é comprehendida no orçamento gera! na fortissima verba destinada a esse fim.

São estas as rasões por que digo que os preços assim obtidos são superiores aos reaes.

Alem d'isto exclui dos mappas o tunnel n.° 10 por ser o mais brando. Entrando com este tunnel o preço deve baixar consideravelmente por isso que elle é muito mais brando e é um dos maiores. Ha ainda no tunnel n.º 7 uma parte facil que tambem custou muito menos e que exclui igualmente.

Em resumo, o custo real da galeria em tunneis foi muito inferior ás 35 rupias que o sr. Sawyer apresenta no orçamento, e creio que houve nos calculos algum engano, pois como tenho mostrado, tudo leva a crer que elle de modo algum deveria exceder o de 1885, que foi do 24, e que está em harmonia com o preço dos mappas, visto que este está exagerado.

Para concluir e mostrar bem a v. exa. todas as considerações em que me baseio, vou apresentar ainda a v. exa. os resultados a que se chega pelo exame dos contratos.

São quatro os contratos originaes que junto a este memorandum e referem-se aos tunneis n.ºs 2, 3, 4, 5 e 7.

No contrato n.° 52-B, que se refere ao tunnel n.° 2, que é, como já disso a v. exa. é como v. exa. pode verificar no avançamento marcado no respectivo perfil, o mais arduo de todos elles, vê se que a galeria d'este tunnel foi dada por contrato a 29-2-3, as dos tunneis 3 e 4 a 25-11-1, a do tunnel 5 a 23-9-2, a do tunnel 7 a 38-9-2; vê-se porem que este preço foi motivado pelo empenho que houve em alcançar rapidamente a sua perfuração e o contrato só durou oito semanas. Vê-se portanto que o preço regular oscilla entre 23-9-2 e 29-2-3, e isto nos tunneis perfurados A mão, pois a companhia nos que perfura á machina trabalha por conta propria.

Á primera vista parecerá que o preço dos contratos é superior ao de exccução de 80, pois este foi de 24 rupias sensivelmente, e a media dos tres contratos que tomei dá 26-7: ha porem circumstancias que procurei conhecer que explicam esta illusão, e bem pesadas todas cilas mostrarão de certo que, longe de ser maior o preço dos contratos, é bastante menor e a differença deve ainda chegar para o pagamento das pequenas despezas de administração e fiscalisação, que ficam ainda a cargo da companhia. O que vou expor é colhido por informações officiosas a que tenho sido obrigado a recorrer, porque o sr. engenheiro se tem negado a dar-me esclarecimentos, que julgo ser obrigado á dar-me, desde que, não respeitando a leu a do contrato, dá tarefas á porta fechada, dando conhecimento d'ellas á fiscalisação só passados mezes; e isto mesmo só o tem feito depois de muito instado. Alem de que os contratos enviados não tendo os cubos a que se referem, pouco dizem.

Por informações particulares, mas dignas do fé, sei que a companhia negoceia com estes pequenos tarefeiros no fornecimento de materiaes, e em alguns parece que o negocio só aproxima muito de usura; na dynamite paroco que a companhia a vende aos tarefeiros a 1-8-0, quando segundo elles affirmam se encontra no mercado de Bora-baym a 0-12-0, e portanto posta nos Ghates poderá quando muito ficar a 0-14-0; só aqui ha uma differença superior a 2 rupias no preço da jarda cubica pois que são 5 a 6 fupias de dynamite proximamente que se gastam para a execução de 1 metro cubico em galeria. Alem d'isto dizem que a companhia se faz pagai- do transporte em caminho de ferro, do material que fornece aos contratadores.

Uma outra circumstancia se dá a favor da companhia nos contratos.

A companhia fixa a secção da galeria, e estabelece nas condições do contrato que não paga trabalho algum alem d'aquella, mas como é impossivel cortar ajusta, e o tarefeiro cortando a menos obrigam o a chegar a secção, previne-se, e com receio de ficar áquem das dimensões, corta sempre um pouco mais largo, a companhia vem portanto á lucrar esta differença. Observou-se com effeito em todos os tunneis que a secção de galeria era quasi sempre superior á, secção normal estabelecida de 7 jardas.

Creio ter demonstrado até á evidencia que o preço de execução apresentado no ultimo orçamento supplementar, e mesmo o proposto, são inacceitaveis.

Resumindo as rabões em que fundamento a minha opinião pela ordem da sua importancia, temos:

1.° O preço da 35 rupias para galeria é inacceitavel por ser muito superior áquelle por que se executou na quadra anterior quando todas as circumstancias eram menos favoraveis ao trabalho;

2.° Porque é muito superior ao preço de execução que se deduziu pelos elementos colhidos com o maximo cuidado durante a construcção;

3.° Porque é tambem muito superior ao preço dos contratos, logo que se attendam todas as circumstancias;

4.° A adopção do preço de 25 rupias para galeria é a que me parece rasoavel.

Este preço está em harmonia com o preço de execução em 1885, com as propostas do sr. Sawyer em janeiro, pois estas são mais elevadas, mas tambem tudo levava a crer que os dois tunneis a que se referiam deviam ser dos peiores, e alem d'isso sendo muito curtos, as despezas de installaçilo eram divididas por pequenos cubos. O preço medio correspondente a 25 rupias, dado pela formula empirica a que me tenho referido

257 + 12-5-6 + 8-6-35 = 48 n

em que n é o preço medio e 7-6 e 35 as secções de galeria, alargamento e stross; e 48 a secção total do tunuel é

n = 11-7-8

este preço é ainda bastante superior áquelle que foi proposto ao sr. Sawyer pelos empreiteiros de Ceylão (9 rupias) e que elle rejeitou por entender que havia de conseguir maior economia; mas, attendendo á natureza da rocha que era alguns tunneis, é bastante dura e á insalubridade do clima pode admittir-se.

Adoptando este preço ou, para arredondar, o do 12 rupias a jarda cubica, o custo total dos tunneis viria a ser:

85:651 X 12 = 1.027:812

em logar de

1.311:891

Isto pelo que respeita á escavação.

Quanto ao revestimento não pisão por emquanto informar completamente a v. exa. pois é possivel que o tunnel 10 não tenha de ser todo revestido. Só depois de todo aberto se poderá ver bom o que ha a fazer.

Nada mais se me offerece dizer a v. exa. sobre este assumpto, sobre que me alarguei, não só por serem de todo inacceitaveis as novas exigencias da companhia, como tambem porque na imprensa seria de Bombaim começam a apparecer artigos sobre a nossa linha, chamando a attenção para o seu custo fabuloso, em comparação Com outras linhas da India, e a fiscalisação entendo que tem por dever impedir quanto possivel a continuação dos abusos que deram logar a este resultado,

Página 1180

1180 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Se á companhia se dá a liberdade de trabalhar e administrar a seu bei prazer sem prestar contas á fiscalisação senão depois de tudo feito, e não lhe fornecendo os esclarecimentos que se lhe pedem, nem attendendo ás observações que se lhe fazem, de certo não será ainda este o ultimo orçamento supplementar e d'esta fórma não vejo modo de os impedir.

O que fiz e o que consegui da companhia creio que nos punha perfeitamente a coberto do perigo dos orçamentos supplementares. Não auctorisei construcção alguma que não fosse essencial, e todas as que se fizeram, depois que aqui estou, me declarou o sr. engenheiro da companhia que estavam comprehendidas nas verbas approvadas em 1885; não consenti elevação de preços, nem tão pouco me foram propostas e preparei-me, tomando todos os elementos do trabalho para informar com conhecimento de causa qualquer proposta que n'esse sentido fosse feita. Não se fez proposta alguma e os augmentos que se apresentara agora são derivados de contratos particulares, que eu ha muito declarei ao sr. engenheiro Sawyer que não tinham valor algum sem que fossem sanccionados pela fiscalisação.

Concordo perfeitamente que a companhia tenha plena liberdade de contratar com os seus tarefeiros, mas é preciso que se sujeite aos preços da serie, e embora n'um ou no outro contrato exceda os preços médios, conserve no conjuncto a, media fixada.

Não conheço legislação alguma sobre este assumpto que permitia uma tal liberdade de acção, completamente separada da responsabilidade dos actos praticados. O sr. Sawyer cita em abono d'este modo de proceder o uso seguido na India ingleza; foi, creio eu, com este argumento que convenceu a s. exa. o ex-governador geral o sr. conselheiro Ferreira do Amaral, pois era este o argumento que s. exa. oppunha á minha interpretação do contrato.

Tenho presente um orçamento supplementar feito na India ingleza; foi apresentado pelo sr. coronel J. G. Lindsay, engenheiro em chefe da linha Southern Maratha Railway, e refere-se á porção da linha denominada West Deccan Line.

É bem diverso o systema empregado ali do que emprega o sr. Sawyer. Em primeiro logar apresentam-se para cada especie de obras os seus orçamentos especiaes o serie de preços á parte, entrando em varios detalhes sobre custo de transporte, etc. N'este ponto o orçamento de 1886 do sr. Sawyer não está mau, mas o de 1885 é uma verdadeira embrulhada, não se fizeram distincções n'um grande numero de capitules, o é isto que tem dificultado muito a sua comparação com o de 1886.

No orçamento inglez a que me refiro todos os augmentos são perfeitamente justificados n'um curto relatorio que precede o orçamento.

O sr. Sawyer escreve tambem um memorandum onde alguma cousa diz, sobre os acrescimos, mas cousa alguma justifica. Não é este o processo inglez. Em cada um dos capitulos se justificam os augmentos ou diminuições, e pelo que ali vejo não me parece que seja permittido variar os preços da serie sem previa auctorisação do governo e sem a mais cabal justificação, e parece-me mesmo que nem isto se faz, mas apenas se mudam os preços que por qualquer circumstancia se veja estarem mal applicados; assim por exemplo, muda-se o preço a uma trincheira que no projecto podia ser classificado erradamente, mas vae-se buscar o novo preço á serie approvada, isto é, rectifica-se o orçamento segundo os dados colhidos na execução das obras, mas sem alterar a base fundamental, a serie de preços.

Alem d'isto as differenças são pequenas, em geral, e umas compensam outras, não são elevações de custo como as nossas, que ellas só por si chegariam bem para a construcção do grande parte da linha.

Inspecção da fiscalisação do caminho de ferro e porto de Mormugão, 29 de dezembro de 1886. = O engenheiro inspector, Fernando Luiz Mousinho de Albuquerque.

Illmo. e exmo. sr. - Nos meus officios n.os 413, 4G4, 471 e 472 de 1886 e n.os 3, 4, 5, 8 e 10 do corrente anno, prestei a v. exa. as informações que se me offereceram sobre o novo orçamento supplementar. Fui forçado a interromper este trabalho por circumstancias que v. exa. bem póde apreciar.

Em primeiro logar, eu contava com a demora aqui até março do conductor Pedro Mousinho de Albuquerque a fim de concluir o trabalho de medição de terraplenagens, que tinha começado na secção dos Ghates e de iniciar o novo chefe de secção que veiu substituil-o, o major Caldas Xavier, que, por ser inteiramente alheio a estes trabalhos precisava nos primeiros tempos ter a seu lado um funccionario que conhecesse já a secção.

N'este sentido, me dirigi ao exmo. conselho governativo e a s. exa. o governador geral, mas infelizmente a lei oppunha-se ás minhas pretensões, e o conductor Mousinho teve de retirar immediatamente, por isso que, corno já tive a honra de participar a v. exa., a exma. junta da fazenda não se julgou auctorisada a abonar ao referido conductor nem mesmo os seus vencimentos durante o tempo em que esteve servindo nos Ghates.

O novo chefe de secção Caldas Xavier, embora tenha a melhor vontade, pouco ou nada pôde fazer, desconhecendo inteiramente o serviço que lhe compete c eu não tenho tempo disponivel para o ensinar e dirigir como convinha. Tenho pela minha parte feito todo o possivel, e depois que elle aqui está fui já duas vezes à secção dos Ghates com demora.

Vejo-me forçado a dizer isto a v. exa. para me desculpar das muitas faltas que ha e de que eu como chefe sou o unico responsavel perante v. exa. e perante o governo local, que, não conhecendo as difficuldades com que tenho a luctar, poderão accusar-me de descuidado ou de falta de methodo.

Dito isto, e para não fatigar mais a v. exa. com a exposição das difficuldades cora que me vejo e que v. exa. de certo sabe avaliar, passarei a expor a v. exa. o que hoje se me offerece dizer-lhe em resposta ao telegramma de s. exa. o ministro datado de 26 do fevereiro do corrente anno.

Permitta-me v. exa. que, antes de entrar no exame das questões que dizem respeito á minha gerencia fiscal, lhe apresente uma apreciação generica do novo orçamento supplementar.

Necessito fazer esta analyse, porque s. exa. o ministro e v. exa. estarão do certo perplexos em vista das informações inteiramente contradictorias dadas por s. exa. o sr. ex-governador Amaral e por mim sobre este assumpto, e como eu tenho a certeza de que tudo quantos, exa. o sr. conselheiro Amaral informou no seu relatório é plenamente convicto, preciso provar antes de tudo que s. exa. não tinha conhecimento perfeito da questão que tratava, pois as suas considerações são todas fundadas nas accusações que me fazia o sr. engenheiro Sawyer e na analyse de alguns pontos que, em conversa puramente particular, eu procurei explicar-lhe, mas que vejo s. exa. não chegou a comprehender.

Muito desejava apresentar desde já a v. exa. a refutação , dos argumentos de s. exa. o ex-governador geral; não quero porém hoje affastar-me mais do objectivo principal d'este: officio, reservando-me para o fazer, caso v. exa. entenda que eu tenho deixado de satisfazer ao programma de fiscalisação a que me obriguei, e que creio ter cumprido tão completamente quanto me permittiam os poucos recursos que tenho tido ao meu dispor.

Dito isto, como preambulo, passo á analyse do orçamento, e em seguida á critica dos documentos que hoje j tenho a honra de passar ás mãos de v. exa. para esclarecer as informações que tenho dado sobre o novo orçamento, que classifico do falso, inverosimil e prejudicialissimo, tanto aos nossos interesses como aos da propria companhia que o apresentou.

Página 1181

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1181

Pelo que s. exa. o ex-governador geral disse no seu discurso de entrega do governo ao exmo. conselho governativo que o ía substituir, parece me s. exa. não tomou completo conhecimento do orçamento supplementar, e como é provavel que tivessse informado que s. exa. o ministro no mesmo sentido, é este o primeiro ponto que tenho a tratar hoje, pois sem que elle fique perfeitamente assente não é possivel formar juizo.

Os augmentos apresentados no novo orçamento provém como já tive a honra de dizer a v. exa., de duas causas:

1.° O augmento nas quantidades do trabalho executado e a executar;

2.° A variação para mais nos preços de unidade de trabalho.

Alem d'isto estes augmentos provem de dois periodos, que preciso distinguir:

a) O periodo decorrido até abril de 1885, anterior á minha chegada á India;

b) O periodo da minha gerencia fiscal, que começou em dezembro de 1885.

Para simplificar, porei de parto agora o primeiro período, com o qual talvez nada tenha, embora eu até hoje te nhã entendido, que não sómente me cumpro analysar o que se tem passado no meu tempo, mas ainda o que se passou na epocha anterior, por isso que em trabalhes d'esta ordem ha uma ligação ininterrupta entre os diversos factos, que mais ou menos directamente derivam de outros anteriores ou vão influir em occorrencias futuras, embora muitas d'estas lhes parecem inteiramente alheias.

Não é possivel pois sujeital-os a classificações chronologicas convencionaes de natureza alguma.

Os augmentos do orçamento de l886 nascem dos erros commettidos em 1885, como estes já tem de 1884, do mesmo modo que todos elles vem do começo, como sem grandes difficuldades provarei a v. exa., se entender que assim seja conveniente proceder.

Feita a destrinça dos dois periodos tratarei hoje unicamente d'aquelle que me diz respeito, e aguardarei as ordens de v. exa. para me occupar ou não dos periodos anteriores.

Não poderei deixar de apresentar um ou outro facto que de tal fórma se relacione com a questão, que me cumpre tratar, que omittil-a seria lançar a obscuridade sobre os pontos que mais esclarecidos precisam ser.

No mappa comparativo dos dois orçamentos, de 1885 c 1886, documento n.° l, vê-se que um dos capitulos em que se dá o augmento é:

1.° Terraplanagens.

N'este capitulo apresenta o novo orçamento supplementar, um augmento enorme nada menos de 2-04-10, isto é, 81:606$000 réis ou por kilometro 976$000 réis.

O custo das terraplanagens era já espantoso no orçamento de 1885, e por isso, logo que aqui cheguei, tratei de ver pessoalmente qual o motivo de tão avultada verba.

Percorrendo a pé toda a parte em construcção, notei que se tinham desprezado enormes cubos das trincheiras que, com vantagem, poderiam ter sido aproveitados nos aterros vizinho ; era vista d'isto pedi ao sr. engenheiro Sawyer me fornecesse a distribuição de terras do projecto, o não alcançando este documento por isso que aquelle engenheiro me declarou que a distribuição se fazia á maneira que a construcção proseguia, tive de me limitar e analysar as distribuições parciaes que succcssivamente me íam sendo apresentadas sempre que a companhia pedia terreno para emprestimos, e firmei, logo que tive occasião opportuna, a doutrina a seguir. No orneio da companhia n.° 29 de 8 de março do l986, documento n.° 2, encontrará v. exa. alguma cousa a este respeito, mas mais definitivamente ficou assente esta materia na acta da primeira conferencia que teve logar a 17 do junho de 1886.

Ahi lê-se. "O sr. engenheiro Sawyer declarou que a distribuição do terras tem sido feita no discurso da construcção e que os terrenos necessarios para os emprestimos eram pedidos pela companhia á medida que íam sendo precisos para os aterros; reconhecendo que á fiscalisação cabe o direito de os conceder ou não segundo as circumstancias, podendo exigir o transporte das terras das trincheiras, sempre que este não fosse superior ao custo dos emprestimos."

Em vista d'isto, vê-se bem que a companhia se compremettia a aproveitar as terras das trincheiras, sempre que isso fosse mais economico do que recorrer aos emprestimos.

Analysando o orçamento supplementar, não se vê isto. No capitulo terraplenagens as tetras de trincheiras são contadas na sua totalidade nas escavações, sem que nos aterros se faça a deducção dos que foram aproveitados; é d'aqui em grande parte do que provem o excessivo custo das terraplanagens.

No seu officio de informação no orçamento supplementar de 1884, documento n.° 3, já o meu dignissimo antecessor o sr. Xavier Cordeiro suspeitava isto.

Creio que os documentos que cito são sufficientes para elucidar esta questão; comtudo a organisação do perfil de ataque a que se está procedendo melhor provará o que deixo dito.

Não tem sido possivel até hoje fazer um trabalho completo n'este sentido; o cubo total de terraplanagens n'uma linha ferrea é sempre um ponto difficil de definir, na elaboração dos projectos parte-se sempre de hypotheses que nem sempre se realisam e as variações que é necessario introduzir nos calculos de volumes para satisfazer ás condições de estabilidades dos taludes são, mesmo na Europa, causa de enormes differenças, e muito mais aqui, onde os terrenos são muito mais traiçoeiros e as chuvas tão copiosas que ás vezes cáe n'um unico dia tanta agua sobre o solo como a que cáe em Portugal em todo um anno. Para que v. exa. veja bem quanto isto é exacto, citar-lhe-hei o que aqui se passou o inverno passado com o desabamento de uma só trincheira.

A companhia tinha dado a uma trincheira que se appresentava em rocha um talude quasi vertical; mais tardo nos pés do talude appareceu terreno falso; o engenheiro encarregado julgou sufficiente consolidar o talude com um revestimento de pedra secca, mandei-o prevenir de que um tal expediente de nada serviria, e que, nas condições em que se apresentava o terreno, era indispensavel taludar mais a trincheira.

Não quiz o engenheiro da companhia seguir esta indicação e as primeiras aguas do inverno fizeram desabar os taludes. O cubo que depois foi necessario remover para eisobstruir a linha foi de 30:228 jardas cubicas, segundo se vê da propria planta que a companhia mais tarde enviou a esta inspecção, documento n.° 4.
Por aqui póde v. exa. bem ajuizar quanto é difficil prever coma antecedencia o verdadeiro cubo de terraplagens a executar.

Agora, mas sómente agora, é que este trabalho se póde fazer em toda a linha por isso que as terraplanagens de secção dos Ghates não permittiam ver bem qual o talude em que deveriam ficar, e como alguns são enormes qualquer differença na inclinação dos taludes influe notavelmente no cubo total, e como o preço é alto, a influencia no orçamento é tambem muito sensivel.

É este o motivo por que sempre tenho dito a v. exa. que o melhor modo de se estabelecer o custo definitivo da linha, visto que o contrato não é a preço unico, é proceder no fim da construcção a uma medirão contradictoria de todas as obras.

Tenho fallado sobre este assumpto mais de uma vez com o sr. engenheiro em cheio e agente da companhia, e pelo seu officio n.° 24 de 31 do janeiro de 1887, parece-me que este engenheiro está inteiramente resolvido a admittir

Página 1182

1182 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

este modo de proceder, que nas condições actuaes é o unico rasoavel e que evite qualquer questão, (documento n.° 5.) O que deixo dito refere-se apenas ás quantidades de trabalho que do orçamento de 1885 para 1886 appresentaram as variações que abaixo apresento.

Terraplanagens:

Orçamento do 1885 - Jardas cubicas Orçamento do 1886 - jardas cubicas

Cubos totaes de escavações 3.240:952 3.263:592

Cubos totaes de aterros 4.644:773 4.972:604

ouve portanto em escavações um augmento de 22:640 jantas cubicas ou l7.953 500 metros cubicos e em aterro 327:831 jardas cubicas ou 259:970 metros cubicos.

O sr. Sawyer, no seu memorandum que acompanha o orçamento supplementar de 1886, não justifica este augmento, nem tão pouco submetteu a apreciação da fiscalisação as alterações ao projecto que lhe dão origem (documento n.° 6.)

Em vista d'isto, não me parece que á companhia assista o direito de exigir do governo portuguez o augmento de capital addicional, correspondente a este capitulo, sem que seja verificada pela fiscalisação a necessidade d'elle; o isto, como já disse a v. exa., só póde ver-se ao certo no fim dos trabalhos, depois que as chuvas tenham caído sobre as terraplanagens, e se fixem definitivamente os taludes em que devem ficar.

Comtudo, posso desde já asseverar a v. exa., que ha duplicações do volumes em muitos pontos, e em muitos outros furam calculados volumes excessivos no orçamento, como era natural, visto que com o tempo poderia reconhecer-se a necessidade de grandes taludes, e a companhia tratou de prevenir essa hypothese.

É quanto se me offerece dizer a v. exa. sobre as qualidades de trabalhos apresentados no orçamento, não podendo ainda hoje remetter lhe o perfil completo, onde tudo se poderá ver mais claramente, porque se lhe estão lançando as ultimas notas que ainda na somma passada fui tomar á secção dos Ghates, com o chefe da respectiva secção, que, corno já disse a v. exa.; por sor a primeira vez que vê trabalhos d'este genero, se prende com a menor difficuldade. Isto nada admira, é o que succedo a todos, e bem preferivel é proceder com prudencia, como elle tem feito, a lançar se ás cegas, como muitas vezes succede aos que se deixam arrastar pelo atrevimento da ignorancia, o que tem sempre graves consequencias, sobretudo na presença de estrangeiros, sempre dispostos a aproveitar todas as faltas dos fiscaes, para os empregarem como arma na defeza das suas exigencias.

Nada é para estranhar que a companhia procuro sempre pedir mais capital ao governo, não foi de certo para outro fim que ella redigiu o artigo 21.° do contrato, onde não poz duvidas em limitar o capital do primeiro orçamento que apenas tinha a garantia de 5 por cento, para augmentar depois os capitaes addicionaes que vencem a 6 por cento. O procedimento da companhia é natural, á fiscalisação incumbe averiguar se são justas e legaes as pretensões apresentadas.

N'este ponto entendo que não são justas nem legaes, e resumindo direi porque:

1.° Não são justas, porque as terraplenagens que figuram no orçamento são em parte duplicadas, e alem d'isto os taludes com que foram calculadas muitas trincheiras, são superiores áquelles com que realmente hão de ficar.

2.° Não são legaes, porque aã alterações de que poderiam provir os augmentos, não foram em tempo opportuno submettidas á apreciação da fiscalisação.

Isto, como disso, pelo que respeita a quantidades de trabalho. Vejamos agora o que se nos apresenta relativamente á alteração nos preços approvados.

Para entrar na analyse d'esta parte, considero approvados os preços do 1885, embora na regia portaria que approva o orçamento tivesse havido, segundo me parece, o maior cuidado em não estabelecer este perigosissimo precedente; pois em nenhum dos considerandos vejo que a variação da serie primitiva fosse admittida; mas como o orçamento foi sanccionado, a companhia poderá talvez dizer que o foi em todas as suas partes. Posto isto, passarei á analyse dos preços de 1885, o comparal-os-hei com os novos do orçamento ultimamente apresentado, e depois com os dos rectificados que me teem sido enviados.

Autos da analyse dos preços de que vou occupar-me, permitta-me v. exa. que chame a sua attenção para a parte do memorandum que acompanha o orçamento em que se pretende justificar o augmento exigido no capitulo terraplenagens.

Diz o sr. engenheiro Sawyer, a pag. 3 do seu memorandum:

"As duas verbas seguintes, nas quaes ha um consideravel acrescimo, são terraplenagens, pontes e aqueductos que excedem a 4 laks.

"A maior parte d'este é nos Ghates, e principalmente por terem de se pagar preços mais elevados.

" Os preços excessivos nas escavações em rocha constituem a maior parte do augmento de terraplenagens nos Ghates "

E quanto o sr. Sawyer diz para justificar o augmento proposto no orçamento para o capitulo terraplenagens.

Como v. exa. vê, nem uma palavra sobre o augmento dos cubos a executar, o que leva a crer que elle proprio suppõe que não vinha a ser necessario um cubo tamanho; e isto mesmo se deprehende do orneio, que sob o n.° 24 me dirigiu em 31 de janeiro ultimo, (documento n.° 5).

Não analysei aqui este documento, reservando-me para o fazer depois, visto que se refere, não sómente a terraplenagens, mas a todas as outras obras do porto e da linha.

O sr. engenheiro Sawier pretende justificar o augmento dos preços das escavações nos Ghates, pela natureza da rocha e poios preços mais elevados dos operarios n'esta região.

Não me parece que estas rasões sejam satisfactorias. Em primeiro logar, como por vezes tenho dito a v. exa., a rocha da trincheira dos Ghates está á vista, e, portanto, desde o começo dos trabalhos os engenheiros da companhia deviam contar com ella e nos preços medios que estabeleceram, entrar com isto em linha de couta; depois já era 1885 havia muitos trabalhos feitos em rocha, e portanto a experiência dever-lhes-ia já ter indicado o custo d'este genero de trabalhos; alem d'isto a constituição das rochas que formam os contrafortes dos Ghates para o lado da nossa India não devo ser muito diversa da que se encontra nas encostas da mesma cadeia na India britannica, e eu vejo que os preços que ahi se estabelecem para as escavações em rocha são bastante inferiores aos que o sr. Sawyer propõe no orçamento supplementar.

Os preços apresentados em 1885 para as terraplenagens dos Ghates, são l rupia e 8 annás e l rupia e 8 annás; os de 1886 são l rupia e 2 rupias. Sendo, porém, este ultimo preço para maior quantidade.

Ha, portanto, uma differença importante.

Poder-se-ía dizer que a parte a executar ultimamente era mais difficil do que a que se tinha feito até á organisação do orçamento de 1885. Isto é em parto assim.

A companhia tem com effeito deixado para o fim os trabalhos mais difficeis; isto, porém, e um gravissimo erro da administração, cujas consequencias me parece não devem recair sobre o governo portuguez, pois que este, quando approvava os preços que se apresentavam, era considerando-os como medios, e se os de agora são mais elevados a companhia tinha já recebido a compensação nos trabalhos mais faceis que executara.

Apresenta o sr, Sawyer em sua defeza os preços dos

Página 1183

SESSÃO DE 21 DE ABRIL DE 1888 1183

contratos com os tarefeiros, ao que tenho respondido sempre que estes contratos não têem valor algum logo que não sejam, sanccionados pela fiscalisação; alem d'isto tenho-lhe tambem observado que, não designando elles as quantidades de trabalhos a que se applicam, é possivel ajuizar dos preços medios de execução.

No orçamento rectificado da direcção West Dehan Line que liga com a nossa secção dos Gattes, e que por isso atravessa contrafortes da mesma constituição geologica, os preços apresentados no orçamento supplementar são os que constam do documento n.° 7.

Vê-se ahi que os preços oscillam entre 10-02-05 a 1-12-02 sendo 00-02-05 para a terra e á-12-02 para a rocha muito dura.

Na serio dos preços da linha, que igualmente se approxima da nossa, pertencente á companhia Sauthera Maharatha Railway, os preços das terraplanagens são 11 annás e 2 réis, preço medio, isto é 355 réis. Como se vê, os preços das escavações em linhas que estão em condições inteiramente analogas á nossa são inferiores aos preços que propõe o sr. engenheiro Sawyer. Não vejo, portanto, motivo algum que possa justificar o augmento proposto.

Alem do que deixo exposto, um argumento mais frisante se me offerece apresentar a v. exa., sobre o preço de execução d'esses trabalhos.

No certificado relativo aos meãos de abril, maio, junho, julho, agosto e setembro, documento n.° 8, e no dos mezes de outubro e novembro, documento n.° 9, encontra-se no preço da execução das trincheiras das Ghates 3-2-0 e 1-9-8; o primeiro d'estes preços, porém, vem acompanhado de uma nota, e tendo eu pedido explicações ao sr. engenheiro da companhia sobre o augmento inesperado d'aquelle trabalho, recebi em resposta o officio n.º 23 de 28 do janeiro findo, documento n.° 10, onde o sr. engenheiro Sawyer declara que todos os preços que vem acompanhados d'aquella nota são derivados de despezas feitas anteriormente á epocha em que tomei posse d'este logar. O sr. Sawyer não diz que despezas sejam estas, e eu direi francamente a v. exa. que não vejo em que fossem applicadas essas verbas nem tão pouco o motivo porque foram omittidas nos certificados anteriores.

Como isto rigorosamente não pertence ao periodo da minha gerencia, e não me sobra o tempo para me occupar de assumptos estranhos, embora inteiramente relacionados com o que estou tratando, limito-me a apresentara v. exa, estas considerações, aguardando as ordens que v. exa. haja por conveniente enviar-me, caso julgue necessario que me occupe do estudo do orçamento na parte que se refere ao periodo anterior á minha chegada.

Não quero com isto dizer que não tivesse colhido elementos para entrar n'esta questão, pois desde que cheguei tratei, não sómente de evitar a apresentação de uni novo orçamento supplementar, mas ainda de reduzir o que se tinha apresentado anteriormente, que, como creio ter provado, tem erros importantes, e alem d'isso procurei tambem alcançar os dados necessarios para que o governo portuguez obtivesse da companhia indemnisações a que me parece ter direito.
Não me tom sido possivel até hoje pôr era andamento os trabalhos feitos n'este sentido, pois, como v. exa. sabe, tenho estado quasi sempre sem pessoal que possa auxiliar-me efficazmente, e alem dos trabalhos propriamente da fiscalisação, ha agora os das obras publicas, que n'esta quadra, estão sendo feitos com um desenvolvimento muito superior ao que têem tido, e para o qual o pessoal se não achava preparado.

Contava já com esta dificuldade quando saí de Lisboa, e por issso pedi auctorisação para empregar o pessoal superior do caminho do ferro em alguns trabalhos de obras publicas, o que infelizmente me não tem sido possivel até hoje, pois tenho estado quasi sempre sem elle.

Desculpo v. exa. estas considerações entranhas á questão que estou tratando; nuas vejo-me forçado a apresental-as para que me sejam relevadas algumas faltas que necessariamente me hão de ter sido attribuidas.

Como mais de uma voz tenho tido occasião de dizer a v. exa., tenho pedido muitos esclarecimentos ao sr. engenheiro em chefe e agente da companhia, que este me não tem enviado, classificando de exigencias. É possivel que o sr. Sawyer tenha rasão, mas eu sei que os orçamentos supplementares que as companhias constructoras de linhas garantidas pelo governo na India britannica são obrigadas a apresentar os seus orçamentos devidamente esclarecidos, e não como o que o sr. Sawyer apresenta, que é em muitos pontos obscuro, e deixa de fornecer elementos essenciaes para a sua completa apreciação.

Na mala seguinte continuarei na analyse do orçamento e terei a honra de enviar a v. exa. todos os documentos que me for possivel coordenar.

Deus guarde a v. exa. Secretaria da inspecção e fiscalisação do caminho de ferro em Mormugão, 9 de março de 1887. - Illmo. e exmo. sr. conselheiro director geral do ultramar = O engenheiro inspector, Fernando Luiz Mousinho de Albuquerque.
Redactor = Rodrigues Cordeiro.

Página 1184

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×