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SESSÃO NOCTURNA DE 11 DE JULHO DE 1890 1169

O sr. Cancella: - Com a guarda municipal?! V. exa., permitta-me que lhe diga, não leu o relatorio.

O Orador: - Li, sim, senhor, e foi por tel-o lido que digo isto. Se o não lesse não tinha esta orientação de idéas que estou expondo.

Agora o que s. exa. mo poderá dizer é que eu não entendi o que li, e talvez não seja a primeira vez que tal me succeda, e queira Deus não seja a ultima. Mas isso é outra cousa. O que é facto é que o relatório do sr. ministro da fazenda gerou em mim a convicção da necessidade do imposto dos 6 por cento, porque o sr. ministro teve a rara qualidade de confessar abortamento ao paiz o estado das suas finanças.

E o partido progressista não tem do que se queixar que s. exa. dissesse a verdade, porque da verdade não deve ninguem receiar quando tem a certeza de que praticou actos bons. Quem sabe? Talvez o illustre ministro não podesse dizer tudo! - o tempo se encarregará de o provar.

O talento mais lucido não póde seguir um raciocinio extenso de caracter abstracto, ou mesmo concreto, mas da ordem mathematica, sem o emprego dos symbolos convencionaes desta sciencia, pois que só assim materialisa e fixa a marcha do espirito. Logo, para que estão a fallar em verbas, que toem, pela sua grandeza, effeitos espectaculosos para quem as ouve? É realmente perder o tempo, porque dos espectadores presentes ficam reduzidos a uma porção insignificante os que podem acompanhar a marcha de um raciocinio de algarismos exposto sómente por palavras. (Apoiados.)

Dizem que o sr. ministro achou o deficit, exagerado, de 3.400:000$000 réis! Eu não acredito que elle se servisse de bases falsas para achar resultados da mesma natureza, e vir dizer-nos que se deve mais do que realmente se deve; assim como não acredito que, pelos processos de calculo empregados pela opposição, ainda os mais engenhosos, se chegue a tornar pequeno aquillo que realmente é grande! (Apoiados.)

Podem deduzir a existencia dos saldos e diminuir o deficit á vontade no papel, que elle ficará grande na realidade; e como materia tangivel desapparecerá aquillo que só a habilidade pessoal póde crear n'um debate apaixonado.

Mas vamos seguindo a nossa ordem de argumentos para não nos desorientarmos.

O sr. ministro da fazenda achou o deficit de réis 3.400:000$000; mas o que fez, quaes foram os elementos de que se serviu?

Todos fazem justiça ao talento de s. exa., e póde ficar e. exa. certo de que digo isto com o maior desassombro. (Apoiados.)

Não estou á altura de entrar n'uma questão financeira desta sublimidade; para mim as noções financeiras são simplicissimas: «Quem tem 10 e gasta 5, fica com 5; quem tem 5 e gasta 10, deve 5.» (Riso.)

Isto é positivo e verdadeiro.

Vi que, em finanças, ha despezas ordinarias e despezas extraordinarias, e esta casuistica de orçamento logico, na minha simplicidade de homem da provincia, impressionou-me; cheguei a julgar que o extraordinario se não gastava! (Riso.) «Deficit ordinario, tanto; deficit extraordinario, tanto. E então o que quer dizer este extraordinario? Não se gasta nada?!»

Mas comecei a ver que se gasta, não só com o deficit ordinario, mas com o deficit extraordinario, e que nós é que pagâmos isto tudo!

É então simplesmente um modo de escripturação. Completamente de accordo; comprehendo. Mas o facto é que o contribuinte tem de pagar tudo.

Para determinar o deficit ordinario serviu-se o sr. ministro do deficit do orçamento de 11 de janeiro de 1890, e conseguiu-o introduzindo-lhe a diminuição de receitas e o augmento de despezas. E assim chegou á fixação definitiva do deficit ordinario em 3.400:000$000 réis, numero redondo.

E como tenta s. exa. extinguil-o?

Parece-me que s. exa. se serviu de tres elementos: primeiro, o augmento provavel das receitas publicas; segundo, as economias realisadas nos diversos ministerios; o terceiro, as propostas de fazenda que trouxe ao parlamento. (Apoiados.)

Isto era rasoavel.

Nas despezas extraordinarias, foi forçado, em vista das circumstancias, a gastar. E é uma pena que assim succeda, porque gastar, ainda que bem applicado o, dinheiro, sem o ter, é uma economia perigosa, embora seja da moda.

As economias (reducções de despeza) podiam ser maiores, se não fosse a declaração formal feita por s. exa., de que o que entra para o orçamento não sáe! (Riso.) Desde que isto é assim, s. exa. não póde deixar de lançar, como complemento, o imposto addicional.

Foi exactamente o que fez.

Mas diz-se: «que o addicional não é bom, não satisfaz, e é um expediente vulgar!»

Tambem não trato das sublimidades fiscaes, não me convem taes sublimidades, porque quasi sempre se transformam n'um recrutamento partidario.

As sublimidades transformam-se sempre num largo quadro de empregados; para serem, agora, regeneradores, daqui a pouco progressistas, depois tornarão a ser regeneradores; e quem sabe se em tempos que estão um pouco distantes, não serão tambem republicanos ?!... (Riso.)

Convençam-se todos que no nosso paiz ha a doença moral do ministerialisno. Não ha governo que não se veja abarrotado de correligionarios. Tambem escusado será dizer que, quando vae para a desgraça, poucos o conhecem; o que não admira porque é sempre o effeito lógico da nossa politica morbida, symbolisada na palavra ministerialismo! (Riso.)

Ainda tenho uma outra noção sobre credito, que me escapava. O illustre ministro da fazenda me corregirá, se eu estou em erro.

Disseram que s. exa., fallando verdade, tinha praticado um erro financeiro, pelo qual podia correr muito perigo o credito do paiz. Eu entendo justamente o contrario. Para mim o credito tem duas bases: 1.°, o valor moral do individuo a quem se empresta, provado pelo desdobramento da sua capacidade de trabalho e da sua probidade; 2.°, aquillo que elle possue em bens proprios.

S. exa., dizendo a verdade, não prejudicou o primeiro elemento do credito, pelo contrario, reforçou-o, nem destruiu o segundo. Aonde 5 que se deu assim cabo do credito? Em cousa alguma. O que isto fez foi com a franqueza deixar mal feridos esses ardis financeiros que tendem sempre a encobrir, quanto possivel, ao contribuinte a maneira como lhe pedem alguma cousa. Mas nunca podem illudir a quem empresta; é uma ficção que não passa do quem não quer reflectir, pois que
quem empresta sabe muito bem a quem e como vae emprestar. (Apoiados.)

Assim s. exa. fallando, o que fez francamente, conforme o sou nome, prejudicou o paiz? Não o prejudicou; pelo contrario, eu estou convencido que lhe fez um grande beneficio. (Apoiados da direita.)

Voltando á questão do addicional tambem não estou de accordo quando ouço que esse addicional lançado por s. exa. não tem uma significação tão completa como medida financeira, como devia ter; e porque? Se em 1882, em cireumstancias parecidas, o grande vulto, o estadista mais notavel d'estes ultimos tempos, o sr. Fontes Pereira de Mello, (Muitos apoiados.) teve necessidade de proceder assim, não será o sr. ministro da fazenda actual completamente logico, imitando um dos maiores homens de estado da politica portugueza, e começando por onde elle acabou, depois