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Discurso que devia lêr-se a pag. 12, col. 2.ª lin. 53, da sessão n.° 1 d'este vol.

0 sr. Moraes Carvalho: — Difficil é a minha posição, disse hontem o exímio orador que acaba de fallar; difficil é a minha posição, repito eu hoje. O digno deputado expressava um sentimento de modestia; eu infelizmente expresso um sentimento de verdade. Depois da brilhante estreia que a camara vem de presencear, depois do discurso frisante e substancioso que esta camara acaba de ouvir, eu, sr. presidente, conscio de minha inferioridade, e sabedor de que não sou revestido de dotes oratorios, entro a susto e com receio no campo da discussão; embora, hei de cumprir o meu dever, e anima-me, sr. presidente, a lembrança de que não deixa de ser honroso ser vencido por um tão illustre adversario, como e o sr. Gaspar Pereira da Silva. (Toses: — Muito bem.)

Sr. presidente, a resolução que esta camara tomou de mandar imprimir todos os documentos attinentes ao credito mobiliario foi sem duvida mui sensata, porque sem elles difficil, se não impossivel, seria avaliar conveniente e justamente a questão que agora nos occupa. E por esta occasião seja-me permittido chamar a attenção do nobre ministro das obras publicas sobre uma pratica que se diz existir no seu ministerio, e que julgo altamente prejudicial aos interêsses do paiz. Sr. presidente, linha sido publicado no Diario do Govêrno o decreto da concessão do credito movel, todos ambicionavam saber quaes eram as suas condições, e não era possivel consegui-lo; foi mister que um jornal d'esta capital traduzisse de um jornal estrangeiro esses estatutos, (O sr. Sampaio: — Apoiado.) para que o publico os conhecesse. (Apoiados.) Sr. presidente, queriam os homens competentes (e não competentes) combinar esses estatutos com os da companhia união commercial; buscavam-se estes na collecção da legislação e em toda a parte, e não se encontravam. Eu, sr. presidente, ouvi aqui dizer a um illustre cavalheiro e meu amigo, deputado pelo Porto, chefe de uma das repartições daquelle ministerio, que a pratica ali seguida e constante era de se mandarem imprimir no boletim official daquelle ministerio os estatutos de qualquer companhia auctorisada, e no Diario do Governo os decretos das concessões; não me parece que esta pratica lenha sido sempre seguida naquelle ministerio; mas seja embora constante, digo que é inconveniente e prejudicial aos interesses nacionaes. Os estatutos das companhias, sr. presidente, estabelecem os direitos e obrigações dos associados entre si, e estabelecem os direitos e obrigações dos associados para com terceiros. Por consequencia o publico deve sabe-los, e o illustre ministro não póde desconhecer, e decerto não desconhece que um dos primeiros elementos do systema liberal, do systema constitucional, ca publicidade. (O sr. Passos (Manuel): — Muito bem.) Este principio póde ler limitações talvez em negociações pendentes, mas nunca a respeito de factos consummados. Portanto é necessario que s. ex.ª providenceie, para que de hoje avante, quando o ministerio approve uma companhia, trate de dar ao publico o conhecimento das suas condições, fazendo publicar os estatutos respectivos.

Sr. presidente, quanto á questão que ora nos occupa, respeitante ao credito mobiliario, eu sinto profundamente ler de afastar-me em parte da opinião emittida pela illustre commissão no seu parecer. As reflexões que vou fazer, nem V. ex.° as creia, nem a camara, como acto de opposição acintosa. (Apoiados.) O sr. Passos (Manuel): — Muito bem.)

Sr. presidente, esses sentimentos não se albergam no meu coração; opposição acintosa nunca a soube fazer, nunca a hei de fazer. (O sr. Passos (Manuel): — Muito bem.) Eu respeito todos os homens, tributo amisade e consideração a muitos e ale admiração a alguns, mas a nenhum hypotheco o meu voto; esse, sr. presidente, puro e livre tal qual m'o dita a minha consciencia pertence á minha patria. (O sr.

Passos (Manuel): — Muito bem.) Nunca pretendi nem precisei de definir a minha posição n'este logar; não a definirei, sou hoje o que fui hontem e o que hei de ser ámanhã. Permitta-me a camara, para melhor comprehender todo o alcance do meu pensamento, que eu refira e addicione um dito de um illustre deputado, respeitavel sacerdote e meu amigo, que em uma das sessões da junta preparatoria, pretendendo mostrar os seus sentimentos de tolerancia para com todos os partidos, disse = que se Lucifer tivesse um partido, desejava ver aqui os seus representantes; e eu agora acrescento, que se fosse possivel que esses representantes existissem aqui; se fosse possivel que esses representantes ascendessem ao poder, e se fosse possivel que elles, por uma aberração da sua essencia maligna, trouxessem aqui propostas, que sem offender os principios de justiça, fossem uteis aos interesses da minha patria, havia de apoia-las. (Apoiados.), I

Sr. presidente, duas são as principaes questões que hoje nos devem occupar. Na concessão do credito mobiliario obraria o govêrno dentro da esphera legal; e bastará a approvação d'elle, ou será necessario a confirmação do podér legislativo para que esse estabelecimento funccione? Primeira questão. Na concessão do credito mobiliario, attenderia o governo a Iodas as conveniencias publicas e exigiria as garantias que se costumam exigir para estabelecimentos de tal ordem? Segunda questão. Tratarei de cada uma em separado.

Sr. presidente, o codigo commercial no artigo 546.º estabelece o principio de que nenhuma companhia entre nós se póde estabelecer sem auctoridade do governo e sem a confirmação da sua instituição. E esta disposição parece-me que responde a uma observação do meu amigo que acaba de fallar, a respeito do que se estabelece em Hespanha, onde, segundo, disse, não é precisa de fórma alguma essa auctorisação, pois que a legislação estrangeira não póde prevalecer á nossa, assim como esse mesmo facto que o illustre deputado referiu, mostrando a existencia de legislações encontradas, responde ao principio que expendeu.de que a legislação commercial era cosmopolita e geral para todos. Eu associo-me aos seus desejos, se são meros desejos, mas se exprimem o facto da uniformidade legislativa, digo que não e exacto, porque em muitas partes ha differença de legislações. (Apoiados.) A lei de 16 de abril de 1850, no artigo 5.°, concede o estabelecimento de quaesquer bancos, mas acrescenta, que não poderão funccionar sem a confirmação do podér legislativo. É esta, sr. presidente, a legislação, e a unica legislação pela qual nós havemos de guiar-nos n'esta questão. Será o credito mobiliario, além de uma companhia, tambem um banco? Ou não será mais que uma companhia sem attribuições bancarias? Se é isto, estou de accordo com o meu amigo, de que bastava a confirmação do govêrno, ainda que fosse uma companhia organisada de novo e não uma transformação do credito movel. Mas dada a outra hypothese, a resolução é diversa.

Sr. presidente, eu julgo que se não póde duvidar de que a companhia união commercial desempenhava funcções bancarias; estou persuadido d'isso, no que vou de accordo com o meu nobre amigo que acabou de fallar e com os illustres cavalheiros, membros da commissão, que redigiram o parecer. A companhia linha a faculdade de descontar letras, a companhia tinha a faculdade de receber dinheiros em deposito, e a companhia tinha a faculdade de emprestar sôbre penhores; temos, por consequencia, sr. presidente, que a companhia excercia as funcções de banco de desconto, de banco de emprestimo e de banco de deposito. Estas attribuições tambem se acham concedidas ao credito mobiliario nos differentes numeros do artigo 4.° dos seus estatutos. Poderia aqui entrar a questão, sr. presidente, se as condições

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