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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
nar n'essa apreciação e resolução. A responsabilidade do governo está na resolução que adopta (apoiados).
Então para que quer o illustre deputado as respostas fiscaes? É para lançar sobre o empregado fiscal a responsabilidade do que aconselha?
Vozes: — Não, senhor.
O Orador: — Não, senhor?! Então o que é?
Quer a camara que lhe conte um facto? Houve um ministro que mandou um documento d'esta natureza á camara, esse documento tornou-se publico, e isso deu em resultado um ataque á pessoa do empregado que tinha tido uma certa opinião!
(Sensação.)
Podem negar isto? Pois então querem se repitam excessos d'estes? (Apoiados.) Não ha força nenhuma que me obrigue a faltar a um dever. Entendo que não devo mandar taes documentos á camara, não os mando, faça ella o que quizer (apoiados. — Vozes: — Muito bem.)
Digo mais, que desde o momento em que houver um ministro que tiver a fraqueza de se prestar a exigencias d'esta natureza, não ha nenhum empregado fiscal que informando confidencialmente, não estremeça de ver esse documento no dia seguinte entregue á publicidade (apoiados); e em questões graves, em questões de interesse de terceiro compromettido, é necessario attender muito seriamente a isto (apoiados).
Os principios são estes. O governo responde pelas resoluções que adopta. (Vozes: — Muito bem.)
O governo póde conformar-se e póde deixar de se conformar com os conselhos dos seus empregados. Esses empregados não têem responsabilidade senão para o governo (apoiados); não pelos conselhos que dão, porque entende-se que aconselham segundo a sua consciencia. Mas a responsabilidade do ministro começa no momento em que resolveu a questão, e quando se conforma com a resposta fiscal, nem por isso deixa de ter intacta toda a responsabilidade do acto (apoiados).
Eu vejo que o illustre deputado já tem o officio do ministerio da fazenda, mas não importa, já dei ordem para se mandar a copia.
O sr. Mariano de Carvalho: — O officio já cá o tenho.
O Orador: —Já eu o mandei?
O sr. Mariano de Carvalho: — V. ex.ª não, mandou-o o ministerio da fazenda.
O Orador: — Pois eu o mandarei do ministerio do reino...
O sr. Mariano de Carvalho: — Não é preciso.
O Orador: — Pois então não tenho nada a mandar, porque emquanto á resposta fiscal, declaro a v. ex.ª e á camara solemnemento, que entendo que póde haver inconveniente para o serviço publico na remessa de similhantes documentos.
Sempre que se têem pedido esses documentos, tem sido com a condição de —não havendo inconveniente— e quem é o juiz da conveniencia ou inconveniencia de mandar taes documentos é o governo. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)
O sr. Rodrigues de Freitas— Mando para a mesa a seguinte moção (leu).
Para fundamentar esta proposta, bastam-me as palavras do sr. presidente do conselho, que acaba de negar o nosso direito de um modo notavel e altamente inconveniente...
Uma voz: — Não nega.
O Orador: — Não nega? Não é outra cousa o dizer s. ex.ª que não nos manda os documentos que o nosso regimento diz que podemos pedir.
O sr. marquez d'Avila e de Bolama está provavelmente enganado ácerca do sentido das nossas palavras, aliás s. ex.ª não responderia como respondeu.
(Havia susurro n'um dos lados da camara.)
O sr. Presidente: — Peço attenção.
O Orador: — Até estou costumado a ver que não se admittem á discussão propostas fundadas em artigos da carta
constitucional, não estranho portanto o susurro do um dos lados da camara...
O sr. Presidente: — O sr. deputado não tem direito a censurar as resoluções da camara.
O Orador: — V. ex.ª está enganado. A maioria resolveu que a minha proposta fosse admittida, e por isso não estou censurando, estou louvando a resolução da camara. Se v. ex.ª quer que eu me mantenha fiel ao regimento, ordene aos srs. deputados d'aquelle lado da camara (o lado direito) que se mantenham fieis a elle; aliás, quando me interromperem, hei de responder aos seus ápartes.
Debaixo d'esta questão politica, apparentemente pequena, está uma questão importante; e apparece a prova de que temos aqui (apontando para as cadeiras dos srs. ministros) os representantes legitimos do partido conservador; não digo bem, do partido reaccionario; porque o partido conservador respeitava a carta constitucional; e os homens que seguem a politica do gabinete querem que a revoguemos e que adoptemos principios inferiores aos que se acham consignados n'ella.
O sr. Alves Passos (ironicamente): — Que horror!...
O Orador: — Horror?! Certamente. Eu nunca suppuz que os cavalheiros que se acham n'estes logares fossem levados a praticar perante a camara similhante attentado. Não é sómente para horror o praticar crimes que possam ser punidos pelo codigo penal (apoiados); tambem horrorisa serem estes (os srs. ministros), os homens que pretendem, n'esta difficil conjunctura, dirigir os negocios publicos, e quem sabe se resistir á onda revolucionaria (apoiados)!
(Apartes de varios srs. deputados.)
Interrompam-me emquanto estou defendendo a carta constitucional; interrompam-me o maior numero de vezes para eu lhes provar que não têem rasão alguma, (apoiados), e para manifestarem que não ousam defender de outra sorte as doutrinas do governo.
Dizia eu que o sr. presidente do conselho está perfeitamente enganado sobre as nossas idéas emquanto á responsabilidade do governo pela publicação de qualquer portaria. S. ex.ª disse-nos: «Quereis obrigar o governo a ser conforme com o parecer do procurador geral da corôa?» Não é essa a questão. A questão que se trata, e seria conveniente que v. ex.ª tivesse chamado á ordem o sr. presidente do conselho. (Riso do sr. presidente do conselho e de alguns deputados do lado direito da camara.)
O sr. presidente do conselho ri-se e outro dia admirou-se de que a camara se risse quando s. ex.ª chamou praça publica ao parlamento portuguez! (Apoiados.)
Ri-se s. ex.ª, porque talvez lhe communica o seu espirito faceto o sr. Carlos Bento.
Riu-se agora s. ex.ª, e ha poucos dias, desmentindo as suas tradições democraticas, nos chamou praça publica! (Apoiados.)
Riu-se o sr. presidente do conselho; riu-se o que injuriou esta camara; injuriou-a aquelle que se devia lembrar que os homens como eu, como s. ex.ª e como tantos outros, que nascem humildes, têem ainda maior obrigação de suspeitar aquelles que representam o povo. Mas eu não me riu, porque esta questão é grave (apoiados); é seria (apoiados).
(Apartes de differentes srs. deputados.)
Principarei de novo o meu discurso até que os cavalheiros que não querem impugnar-me com a sua palavra continuem a impugnar-me com o seu riso ou ápartes.
Dizia eu que o sr. presidente do conselho estava inteiramente enganado a respeito da opinião de alguns deputados.
Ninguem n'esta casa discute se o sr. presidente do conselho deve ou não conformar-se com o parecer do procurador geral da corôa, o que dizemos é que s. ex.ª deve manda-lo. É innegavel o ser ás vezes necessario que o governo não apresente em publico certos documentos; mas o regimento 'd'esta casa não se oppõe a que os membros do executivo indiquem essa necessidade, que o parlamento