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SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 1888

Presidencia do exmo. sr. José Maria Rodrigues de Carvalho

Secretarios os exmos. srs.

Francisco José de Medeiros
Francisco José Machado

SUMMARIO

Um officio do ministerio dos negocios estrangeiros, dando conhecimento dos agradecimentos do governo allemão peias manifestações de sentimento que tiveram logar em Portugal pelo fallecimento do barão de Sehmidthals. - Representações das juntas de parochia e habitantes de algumas freguezias do antigo concelho da Arruda, apresentada pelo sr. Julio de Vilhena e mandada publicar no Diario do governo. - Requerimento de interesse publico mandado para a mesa pelo sr. Bandeira Coelho e outro de interesse particular apresentado pelo sr. João Pinto. - Justificações de faltas dos srs. D. José de Saldanha, Baptista de Sousa, Sá Nogueira e Oliveira Valle. - O sr. D. José de Saldanha manda para a mesa um projecto do lei. - O sr. Bandeira Coelho, por parte da commissão de guerra, apresenta um requerimento para ser informado pelo governo. - O sr. Dantas Baracho insta pela presença do sr. ministro do reino e declara o assumpto sobre que pretende interropal-o. Responde o sr. ministro da fazenda. - Apresenta um projecto de lei o sr. Alfredo Pereira. - Considerações do sr. Julio de Vilhena acerca das representações que mandou para a mesa.- Apresentam projectos de lei os srs. Silva Cordeiro e Ruivo Godinho. - O sr. Francisco Machado chama a attenção do sr. ministro da guerra para um facto que reputa attentatorio da disciplina do exercito. - O sr. Frederico Arouca refere-se de novo á questão agricola e dirige algumas perguntas ao governo. Responde o sr. ministro da fazenda. - O sr. Arroyo estranha, como o sr. Arouca, a não comparencia do sr. ministro das obras publicas, insta pela remessa do uns documentos, reclama a presença do sr. ministro da justiça c participa que a deputação encarregada de assistir ás exequias celebradas no Porto cumpriu a sua missão. Responde o sr. ministro da fazenda quanto á ausencia do sr. ministro das obras publicas. - O sr. Franco Castello Branco responde a algumas das observações do sr. ministro da fazenda e chama a attenção do governo para o facto de não se entregarem aos empregados do estado os recibos dos direitos de mercê. Responde o sr, ministro da fazenda. - O sr. Arouca protesta contra as phrases do sr. ministro da fazenda, que attribue a tactica parlamentar ás suas instancias para a comparencia do sr. ministro das obras publicas. Indica os assumptos sobre que pretende interrogal-o.

Na ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 14, reorganisando a administração das caixas geral do depositos e economica portugueza. - Enceta o debate contra o projecto o sr. Ferreira de Almeida. Responde-lhe o sr. Baptista de Sousa na qualidade de relator, e a este o sr. Moraes Carvalho, que combate largamente o projecto, ficando ainda com a palavra reservada para a sessão seguinte. - Dá-se conta da ultima redacção dos projectos de lei n.os 254, de 1887, 33 e 35. - Presta juramento o sr. Guerra Junqueiro.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 50 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Brandão, Mendes da Silva, Alfredo Pereira, Oliveira Pacheco, Moraes Sarmento, Augusto Pimentel, Miranda Montenegro, Augusto Ribeiro, Lobo d'Avila, Madeira Pinto, Francisco de Barros, Castro Monteiro, Fernandes Vaz, Francisco Machado, Sá Nogueira, Pires Villar, João Pina, Cardoso Valente, Franco de Castello Branco, João Arroyo, Teixeira de Vasconcellos, Sousa Machado, Alfredo Ribeiro, Correia Leal, Alves Matheus, Silva Cordeiro, Simões Ferreira, Jorge de Mello (D.), Amorim Novaes, José Castello Branco, Ferreira de Almeida, Eça de Azevedo, Ruivo Godinho, Figueiredo Mascarenhas, José de Napoles, José Maria de Andrade, Barbosa de Magalhães, Rodrigues de Carvalho, José de Saldanha (D.), Santos Moreira, Julio Graça, Julio de Vilhena, Bandeira Coelho, Manuel José Correia, Marianno de Carvalho, Marianno Prezado, Martinho Tenreiro, Miguel Dantas, Dantas Baracho e Estrella Braga.

Entraram durante a sessão os srs.: - Guerra Junqueiro, Moraes Carvalho, Serpa Pinto, Anselmo de Andrade, Alves da Fonseca, Sousa e Silva, Baptista de Sousa, Campos Valdez, Antonio Centeno, Antonio Villaça, Ribeiro Ferreira, Guimarães Pedrosa, Tavares Crespo, Antonio Maria de Carvalho, Barros e Sá, Hintze Ribeiro, Santos Crespo, Bernardo Machado, Conde de Castello de Paiva, Conde de Villa Real, Eduardo de Abreu, Eduardo José Coelho, Feliciano Teixeira, Mattoso Santos, Fernando Coutinho (D.), Freitas Branco, Firmino Lopes, Almeida e Brito, Francisco Beirão, Francisco Mattoso, Francisco de Medeiros, Lucena e Faro, Soares de Moura, Severino de Avellar, Frederico Arouca, Gabriel Ramires, Guilhermino de Barros, Candido da Silva, Santiago Gouveia, Vieira de Castro, Rodrigues dos Santos, Joaquim da Veiga, Oliveira Valle, Oliveira Martins, Alves do Moura, Avellar Machado, Ferreira Galvão, Barbosa Colen, Elias Garcia, Abreu Castello Branco, Ferreira Freire, Oliveira Matos, José Maria dos Santos, Simões Dias, Abreu e Sousa, Lopo Vaz, Mancellos Ferraz, Vieira Lisboa, Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel d'Assumpção, Manuel José Vieira, Brito Fernandes, Marçal Pacheco, Miguel da Silveira, Pedro Monteiro, Pedro de Lencastre (D.), Pedro Victor, Vicente Monteiro e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Albano de Mello, Antonio Castello Branco, Antonio Candido, Antonio Ennes, Gomes Neto, Pereira Borges, Mazziotti, Fontes Ganhado, Jalles, Pereira Carrilho, Simões dos Reis, Augusto Fuschini, Victor dos Santos, Barão de Combarjúa, Conde de Fonte Bella, Elvino de Brito, Elizeu Serpa, Emygdio Julio Navarro, Góes Pinto, Estevão de Oliveira, Francisco Ravasco, Guilherme de Abreu, Sant'Anna e Vasconcellos, Casal Ribeiro, Baima de Bastos, Izidro dos Reis, Souto Rodrigues, Dias Gallas, Menezes Parreira, Joaquim Maria Leite, Jorge O'Neill, Pereira de Matos. Dias Ferreira, Laranjo, Pereira dos Santos, Guilherme Pacheco, Vasconcellos Gusmão, Alpoim, Pinto Mascarenhas, Santos Reis, Julio Pires, Manuel Espregueira, Pinheiro Chagas, Matheus de Azevedo, Sebastião Nobrega, Visconde de Monsaraz, Visconde da Torre, Visconde de Silves e Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Ministerio dos negocios estrangeiros. - Direcção politica. - Lisboa, 20 de abril de 1888. - Illmo. e exmo. sr.- Tenho a honra de communicar a v. exa. que o sr. encarregado de negocios da Allemanha ao transmittir-me em nota de 18 do corrente os agradecimentos de Sua Magestade o Imperador da Allemanha e do governo allemão pelas manifestações de sentimento que tiveram logar em Portugal por occasião do fallecimento do barão de Schmidthals, enviado extraordinario e ministro plenipotenciario de Sua Magestade o Imperador da Allemanha, n'esta côrte, me pede ser o Interprete junto da camara dos senhores deputados, do cordeal acolhimento d'esse governo pelas demonstrações de pesar que deu n'essa conjunctura. - Deus guarde a v. exa. - Illmo. e exmo. sr. presidente da camara dos senhores deputados. = Barros Gomes.

Á secretaria.

REPESENTAÇÕES

Das juntas de parochia das freguezias da Arruda dos vinhos e de S. Miguel das Cardosas, e de proprietarios e

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moradores d'esta ultima e da de Nossa Senhora da Salvação, pedindo que a villa da Arruda dos Vinhos torne a ser cabeça de concelho, sendo-lhe de novo annexadas aquellas freguezias.

Apresentadas peio sr. deputado Julio de Vilhena, enviadas á commissão de administração publica e mandadas publicar no Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Por parte da commissão de guerra, roqueiro que seja remettido ao governo o requerimento de Elisa Chaves Soares Folkihée.

Sala da commissão de guerra, em 23 de abril de 1888.= Luiz de Mello Bandeira Coelho, secretario.

Mandou-se expedir.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR

De D. Julia Carlota Garcia Moreira da Serra, filha do fallecido major do exercito de Africa Occidental Julio Augusto da Serra, pedindo uma pensão.

Apresentado pelo sr. deputado João Pinto e enviado á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

Tomo a liberdade de participar a v. exa. e á camara que não me foi possivel comparecer ás sessões de 20 e 21 do corrente mez. = O deputado, José de Saldanha Oliveira e Sousa.

Por motivo justificado não pude comparecer ás duas ultimas sessões. = Antonio Baptista de Sousa.

Declaro que por motivo justificado faltei á sessão de 21 do corrente. = Sá Nogueira.

Declaro que tenho faltado a algumas sessões, por motivo justificado. = Dr. Oliveira Valle. Para a secretaria.

O sr. D. José de Saldanha: - Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa uma justificação da, não comparencia á sessão de 21 do corrente.

Approveito a occasião do estar com a palavra para enviar tambem para a mesa um projecto de lei. Abstendo-mo n'esta occasião de fazer quaesquer considerações, limito-me a fazer a leitura do projecto, que é o seguinte:

"Artigo 1.° Os fornecimentos de fardamento para o exercito, guarda fiscal, guardas municipaes, armada real, e estabelecimentos de caridade, ou asylos, sustentados ou subsidiados pelo estado, serão feitos com pannos fabricados de lãs exclusivamente nacionaes.

"Art. 2.° Para os fins do artigo 1.° deverão as estações officiaes competentes adoptar typos de pannos fabricados de lãs exclusivamente nacionaes.

"Art. 3.° Os novos typos, ou padrões, a que se refere o artigo 2.°, deverão ser fabricados nas fabricas nacionaes, e examinados e classificados por uma commissão composta de industriaes nacionaes, de technicos ao serviço do estado e de officiaes ao serviço do exercito e de marinha, escolhidos entre os que estiverem em effectivo serviço nos corpos do exercito ou da armada.

"§ unico. A commissão será composta de quinze ou nove membros, entrando cada uma das tres classes indicadas na organisação da commissão, com igual numero de membros.

"Art. 4.° Os fornecimentos serão pagos á medida que forem feitos.

Art. 5.° As arrematações a que se refere este projecto de lei serão feitas parcialmente, e não em globo, para o exercito, para a guarda fiscal, para as guardas municipaes e para a armada real.

"Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrario."

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 23 de abril de 1888. = Os deputados, José de Saldanha Oliveira e Sousa = Alfredo Cesar Brandão.

O Orador (continuando): - O illustre deputado o sr. Alfredo Brandão dignou-se assignar conjunctamente commigo este projecto.

O sr. Bandeira Coelho (por parte da commissão de guerra.): - Mando para a mesa um requerimento do Elisa Chaves Soares Folkihée; que foi presente á mesma commissão, e peço que seja remettido ao governo para o informar.

Mandou-se expedir.

O sr. Baracho: - Sr. presidente, o meu fim e pedir ao sr. ministro da fazenda, que se digne communicar ao sr. ministro do reino, que eu preciso que s. exa. compareça n'esta camara, antes da ordem do dia, o mais breve possivel, a fim de lhe dirigir uma pergunta sobre um facto que eu reputo grave.

Como não desejo causar a menor surpreza, e pelo contrario desejaria que s. exa. viesse habilitado a responder á interpellação, devo declarar que cila versa sobre a maneira impossivel e absurda como a administração dos hospitaes civis de Lisboa está fazendo a contagem do tempo de serviço, para o effeito da promoção, aos facultativos do banco.

Não faço agora considerações a este respeito, esporando para quando estiver presente o sr. ministro do reino.

Mas permitta-se-me que insista em que considero este assumpto importante e grave, por isso que, a prevalecer a opinião da administração dos hospitaes civis, a genuidade dos concursos tornar-se-ía em letra morta.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Declaro ao illustre deputado que eu prevenirei o meu illustre collega do reino, de que s. exa. o deseja interpellar, explicando-lhe o assumpto, visto s. exa. ter tido a delicadeza de o dizer.

O sr. Alfredo Pereira: - Sr. presidente, mando para a mesa um projecto de lei, assignado tambem pelo sr. Madeira Pinto, modificando o § unico do artigo 98.° do decreto com força de lei de 28 de julho de 1886 n'este sentido:

A disposição d'este artigo applica-se, tanto aos empregados que continuarem no serviço da direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes, como áquelles que forem collocados em qualquer serviço publico.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Julio de Vilhena - Mando para a mesa tres representações que ha dias tenho em meu poder, contra a proposta de lei, de que já havia noticia, e que foi apresentada polo sr. ministro do reino na ultima sessão para serem transferidas duas freguezias do concelho de Sobral de Monte Agraço para o de Villa Franca de Xira.

Uma d'essas representações é dos habitantes da freguezia de Nossa Senhora da Salvação, outra da junta de parochia da mesma freguezia e a outra da junta de parochia da freguesia de S. Miguel das Cardosas.

Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que ellas sejam publicadas no Diario do governo.

Mando tambem para a mesa uma proposta, de que não peço urgencia, o que deve ser remettida á commissão de administração publica. Não faço agora considerações algumas em abono d'esta proposta, confiando que a commissão procederá convenientemente n'este negocio.

Em 1869, quando estava em vigor um decreto do sr. bispo de Vizeu, podia-se mudar uma freguezia de um concelho para outro, a pedido dos habitantes d'essa freguezia; mas não se decidia essa petição, sem se mandar ali um administrador de concelho verificar se effectivamente as

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assignaturas eram authenticas e se a petição dirigida no governo representava a vontade d'esse povo.

Estou convencido de que o parlamento não quererá que hoje se proceda de uma maneira differente, e espero por consequência que a commissão do administração publica trate de verificar, pelos meios ao seu alcance, a autenticidade da assignatura dos individuos que pediram a transferencia das duas freguezias a que se referem as representações.

É n'este sentido a minha proposta.

Foi approvada a publicação das representações.

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que a illustre commissão de administração publica, antes do se pronunciar ácerca da proposta do governo, que transfere do concelho do Sobral do Monte Agraço ws freguezias de S. Miguel das Cardosas e de Nossa Senhora da Salvação da Arruda, proceda, pelos moios que julgar convenientes, á verificação da authenticidade das assignaturas de quaesquer petições que no sentido da proposta tenham sido dirigidas ao governo e sirvam de fundamento á mesma proposta. = Julio de Vilhena.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Silva Cordeiro: - Mando para a mesa um projecto do lei, determinando que os ordenados dos secretarios das camaras municipaes nunca sejam inferiores a 600$000 réis, nos concelhos de primeira ordem, a 500$000 réis nos de segunda, e a 360$000 réis nos de terceira.

Esto projecto tem o mesmo pensamento de uma representação que subiu a esta camara, dos secretarios das camaras municipaes do districto de Braga, pedindo que se fixasse o minimo dos seus ordenados.

Sr. presidente, nada acrescentarei por agora em defeza d'este projecto, por isso que no relatorio que o precede se diz o sufficiente para mostrar a justiça que lhe assisto. Limitar-me-hei pois defendei-o, se vier á discussão com parecer favoravel e este for impugnado.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Ruivo Godinho: - Sr. presidente, mando para a mesa um projecto de lei tendente a reorganizar os quadros das secretarias dos governos civis com excepção das de Lisboa, Porto o Funchal.

O projecto é concebido nos seguintes termos:

(Leu.)

É esto o projecto, que tenho a honra de mandar para a mesa: peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se consente que elle, depois de admittido á discussão, seja publicado no Diario do governo.

Se o projecto lograr entrar em discussão, terei occasião de o sustentar, mas peço licença á camara para fazer já uma observação.

Quem tiver lembrança de que eu pugno constantemente pela economia, póde notar que eu apresento um projecto de lei, que produz um pequeno augmento do despeza, por isso julgo dever dizer que sou pela economia, mas ainda sou mais pela justiça, que é um dever.

Eu não quero que se gaste de mais mas desejo, que se pague condignamente a quem trabalha; e que se faça só o que é necessario e se não criem trabalhos desnecessarios para haver occasião ou pretexto do dar pingues remunerações aos amigos, e desejo sobre tudo que acabe a grande desigualdade que ha na remuneração aos empre-pregados do estado de uns para outros ministerios e até no mesmo ministerio.

É verdade que proponho um pequeno augmento no ordenado dos empregados dos governos civis, mas, obedecendo ao principio de que cada um deve trabalhar segundo a remuneração que tem, reduzo o quadro, e por isso pequeno é o augmento de despeza, e este mesmo desappareceria se a fixação dos quadros dos funccionarios se não fizesse isoladamente em cada um dos ministerios, e ao contrario se combinassem uns com os outros.

D'esta maneira era muito facil dar a todos os empregados uma remuneração justa, e acabar com muitas desigualdades, que ha principalmente de ministerio para ministerio, como já disse; porque ao passo que ha empregados em alguns ministerios que são lautamente remunerados, acontece que outros estão quasi na miseria!

Se compararmos, por exemplo, os empregados actuaes das alfandegas cora os do ministerio do reino, notâmos uma differença enorme: os empregados da alfandega, sem habilitações litterarias quasi nenhumas, estão, em virtude da ultima reforma, recebendo avultadissimos ordenados, ao mesmo tempo que no ministerio do reino e no da justiça, empregados com habilitações litterarias, com cartas de bacharel, estão ganhando uma insignificancia.

Um delegado do procurador regio, com as suas cartas de bacharel, com muito trabalho o muita responsabilidade, tem de ordenado 300$000 réis annuaes; no ministerio do reino e nomeadamente nos governos civis, ha muitos empregados em identicas circumstancias; o ao mesmo tempo ha empregados da alfandega com habilitações litterarias e com pouco trabalho, que ganham l:000$000 réis, ou perto d'isso, e mais do que isso!

No proprio ministerio da fazenda existem desigualdades repugnantissimas: no passo que na alfandega ha os pingues ordenados, a que acabei de me referir, estão por exemplo os escripturarios dos escrivaes de fazenda a trabalhar dia e noite e a ganhar l00$000 réis mensaes, sujeitos a redacções para direitos de mercê, e para a caixa de aposentações, apesar de não terem direito a aposentação!

Estas desigualdades é que offendem; principalmente se attendermos a que podiam desapparecer, se na organisação dos serviços houvesse unidade de pensamento, e se os diversos ministerios não organisassem os quadros dos empregados sem combinação de uns com os outros, e o mesmo ministerio não organisasse um ramo de serviço sem attençção a outro.

Por um systema contrario ao que se tem seguido, podia chegar-se a fazer desapparecer taes desigualdades sem augmento de despezas, porque os que toem a mais podiam ceder aos que têem de menos, e receberem todos conforme o seu trabalho e responsabilidade.

Aqui está, sr. presidente, a rasão por que eu apresento este projecto, sem me contradizer nas idéas que tenho manifestado, e muito estimaria que elle concorresse ao menos para que outros mais competentes do que eu olhassem para a organisação verdadeiramente anarchica do nosso funccionalismo, e tratassem de remediar tantas injustiças como as que se estão vendo todos os dias.
São estas as considerações que por ora julguei dever fazer; mas, já que estou com a palavra, permitta-me v. exa. a camara que aproveite a occasião para fallar n'outro assumpto.

Em 25 de janeiro d'este anno mandei para a mesa um requerimento, pedindo uma nota das gratificações dadas aos differentes empregados sem lei que as auctorise, e pedindo copia do corpo de delicto do processo Hersent.

Até hoje, isto é, passado mais de dois mezes, ainda estes documentos me não foram enviados, nem ao menos se ne dá uma rasão que desculpe tanta demora.

Declaro a v. exa. e á camara que insisto no pedido, e protesto contra este procedimento insolito do governo, que tão mal corresponde aos deveres do seu cargo e, tanto concorre para o desprestigio do poder.

Realmente, sr. presidente, pedirem-se documentos e illudirem-se os pedidos com a demora ou com a falta absoluta da remessa dos documentos pedidos é inadmissivel I
E dizem que se faz propaganda de descredito em roda do ministerio! Quem a faz são os srs. ministros com o seu procedimento.

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A opinião publica preoccupa-se com certo facto, de que tem noticia, pedem-se os documentos, que a podem esclarecer, o governo não os dá; a consequencia natural é desconfiar da rectidão do procedimento do governo, que devia ser o primeiro interessado cm esclarecer os seus actos.

Tambem insisto, sr. presidente, no requerimento que fiz a pedir copia da syndicancia feita a alguns actos de commissario de policia de Castello Branco, e que tambem ainda me não foi enviada.

Não está presente o sr. ministro do reino, a cuja pasta pertence este assumpto, por isso rogo a v. exa. se digne fazer-lhe constar, que eu insto pela remessa d'aquelle documento, porque, como s. exa. sabe, tendo eu sido accusado de fazer insinuações, preciso que s. exa. me diga quem é que faz ou fez insinuações.

Tenho dito.

Foi auctorisada a publicação do projecto de lei, que ficou para segunda leitura.

O sr. Francisco José Machado: - Sr. presidente pedi a, palavra a fim de chamar a attenção do sr. ministro da guerra, para um facto que eu reputo grave para a disciplina militar, e que é contrario a todas as leis e regula mentos em vigor.

No extracto da ultima sessão d'esta camara, menciona-se que o mestre, contramestre e tres musicos de l.ª classe de infanteria é, assignaram uma representação, pedindo melhoria de reforma, e isto é uma infracção da disciplina militar.

Sr. presidente, o que estes militares fizeram é nada menos que uma manifestação collectiva, o que está prohibido por todas as leis militares, e o que tem sido por differentes vezes advertido pelos diversos ministros da guerra.

Sr. presidente, a disciplina militar é a base fundamental da constituição do exercito; perdida ella ou afrouxada, mal se comprehende como elle possa continuar a subsistir. E portanto necessario evitar, por todos os meios, que os militares de todas as graduações se afastem dos seus deveres, e deixem de cumprir o que as leis lhes impõem.

Sr. presidente, as leis militares mandam que todo o militar deve contentar-se com a paga que lhe dão. Verdade seja que o direito de petição está consignado no § 28.° do artigo 145.° da carta constitucional, mas estes militares a que me refiro, se queriam exercer o direito de petição, deviam fazel-o, tendo em vista as leis que lhe cumpria executar e respeitar, e nunca fazerem uma manifestação collectiva.

Sr. presidente, tenho toda a confiança no sr. ministro da guerra e por isso espero que s. exa., quando tiver conhecimento do facto que aqui aponto, ha de cumprir o seu dever, castigando estes militares que fizeram uma manifestação collectiva, o que lhe é defezo por todas as leis e regulamentos.

É necessario reprimir as primeiras tentativas para que o exemplo não alastre e não haja depois de se adoptarem medidas mais violentas.

Sr. presidente, quando o bravo militar o sr. Luiz Quilinan escreveu uma carta repellindo as affrontas que Jacob Bright nos dirigiu no parlamento inglez, foi tal o enthusiasmo que esse facto produziu nos seus camaradas do exercito, que todos elles o felicitaram pela sua decisão e bravura.

Estas felicitações eram de um caracter exclusivamente particular, pois não obstante quiz ver-se n'esse enthusiasmo uma manifestação collectiva, e no parlamento e na imprensa de todas as cores politicas se pediu ao ministro da guerra de então, providencias para que tal manifestação não continuasse, assim como severo castigo para os militares que tinham felicitado o seu bravo camarada.

N'essa occasião achei demasiada susceptibilidade; hoje que reflicto no caso com o espirito mais despreoccupado, acho que tinham rasão os que entendiam que o exercito não deve em caso algum manifestar-se pró nem contra qualquer acontecimento.

O exercito é um machinismo muito delicado, regulando-se por leis especiaes que é necessario acatar e fazer cumprir. As manifestações collectivas não podem, sob protesto algum, permittir-se, e o mestre de infanteria 6 commetteu uma grave falta e deu um pernicioso exemplo aos seus subordinados, convidando-os a dirigirem ao parlamento uma representação collectiva.

Repito, tenho toda a confiança no sr. ministro da guerra, e por isso espero que, quando s. exa. tiver conhecimento d'este facto, ha de proceder como lhe cumpre.

Sr. presidente, tenho advogado sempre os interesses das classes inferiores do exercito, tenho, quer no parlamento, quer na imprensa, procurado por todos os moios ao meu alcance, advogar-lhe os seus interesses, e tenciono continuar a fazel-o, mas desejo que não se afastem dos seus deveres militares, e quando o façam, recebam logo devido correctivo, para que o mal se não alastre.

Sr. presidente já que estou com a palavra, permitta-me v. exa. que me refira a uma noticia que li no Jornal do commercio de que o sr. ministro da guerra ía fazer uma alteração nos uniformes, supprimindo o casaco ou a jaqueta das praças de pret, de modo que seja unicamente usado um d'aquelles artigos, assim como ía supprimir o dolman para os officiaes, ficando estes só com o casaco.

Não sei se o facto annunciado pelo jornal a que me refiro é ou não verdadeiro, mas estimo que o seja, porque os uniformes militares, tanto das praças de pret como dos officiaes, ficam por um preço tão elevado, que é necessario e urgente fazel-o reduzir.

Isto dará, não só uma economia para o official, cujo dispendio com os uniformes é superior ás suas posses, como para o thesouro, pois que as praças de pret não podem pagar o uniforme no tempo que servem, ficando a fazenda onerada, alem d'ellas soffrerem maiores descontos durante os tres annos que são obrigadas a servir.

Sr. presidente, a illustre commissão que foi encarregada de formular o plano de uniformes, que está em vigor, parece que foi muito propositadamente procurar os artigos de mais elevado preço para tornar os uniformes carissimos.

Parece que se preoccupou muito com a elevação de preços, pois que poz de parte muitos dos artigos então usados, que eram mais solidos, mais baratos, mais elegantes e de maior duração.

Refiro-me, por exemplo, ás charlateiras, espada, etc. etc. Posso afiançar a v. exa. que todos os militares desejariam voltar outra vez a usar muitos dos artigos que foram sem vantagem alguma substituidos.

Por isso estimava que o illustre ministro da guerra adoptasse quaesquer providencias tendentes a tornar os uniformes mais economicos.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Pedi a palavra simplesmente para dizer ao illustre deputado que communicarei ao sr. ministro da guerra as considerações que s. exa. acaba de fazer, o estou certo de que o meu collega ha de providenciar no sentido de ser mantida a disciplina e a boa ordem no exercito.

O sr. Frederico Arouca: - Começou por perguntar mesa se já tinham vindo os documentos que requererá, relativamente ás despezas feitas com as quintas onde se estabeleceram as escolas agricolas.

O sr. Primeiro Secretario: - Informou que ainda ião tinham vindo.

O Orador: - Não podia prescindir d'esses documentos, porque era indispensavel saber-se quanto custava a instrucção agricola em Portugal.

Sem elles não se podia apreciar o que o governo tinha eito com respeito á questão agricola. Dissera o sr. ministro da fazenda, da primeira vez, que

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fallára como ministro, que nunca faria parte de um ministerio que não tratasse a serio da questão agricola, porque a questão agricola não se limitava á elevação dos direitos sobre os cereaes. E agora o que se via era que, desejando alguns deputados fazer perguntas ao sr. ministro das obras publicas sobre esta questão, s. exa. não apparecia na camara, e, quando se pediam documentos, o governo não os mandava.

A paciencia tinha limites, e podia ser que em breve elle, orador, pedisse os documentos de uma fórma menos agradavel para o governo.

Desejava pedir ao sr. ministro das obras publicas explicações sobre o inquerito agrícola o saber se o inquerito estava terminado ou se tinha sido interrompido, e n'este caso se o fora estando o paiz em socego, ou se o tinha sido por o para estar desassocegado.

No entretanto, havia largas semanas que s. exa. não comparecia antes da ordem do dia.

Constava-lhe que o inquerito estava sendo feito de uma maneira differente d'aquella que primitivamente fora ordenada pelo governo, quer dizer, de uma maneira que não podia dar resultados em que se podesse ter confiança.

Isto era importante.

Não pedia ao sr. ministro da fazenda que communicasse estas observações ao sr. ministro das obras publicas; seria isso inutil; queixava-se apenas da ausencia do sr. Emygdio Navarro.

Desejava tambem que o sr. ministro da fazenda perguntasse ao sr. ministro da guerra se era verdade que, como lhe constava, s. exa. tinha mandado para Vendas Novas instrucções dispensando officiaes e soldados de cumprirem o preceito da confissão.

Isto era grave, porque, sendo a religião catholica, apostolica, romana, a religião do estado, parecia-lhe que o governo não podia dar taes instrucções.

Se se tinham dado estas instrucções, desejava a presença do sr. ministro da guerra para lhe pedir algumas explicações.

Tambem lhe constava que a commissão encarregada de examinar os theatros e dar parecer sobre as suas condições, no sentido de se garantir a vida dos espectadores, procedêra á inspecção do theatro da Trindade e fôra de opinião que o salão não podia funccionar ao mesmo tempo que o theatro.

Desejava saber se ella dera ou não parecer n'este sentido, e, no caso negativo, pedia que o governo mandasse á camara copia do mesmo parecer.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Pelo que respeita ao sr. ministro das obras publicas, eu communicarei ao meu collega o que s. exa. disse, não obstante o illustre deputado significar o desejo contrario.

Posso affirmar que o sr. ministro das obras publicas não tem vindo a esta camara, ha duas ou tres sessões, antes da ordena do dia, porque se está discutindo na camara dos dignos pares, cujas sessões se abrem mais cedo do que n'esta camara, um assumpto importante, que e a interpellação sobre o caminho de ferro do Algarve, e que tem tomado largas proporções. (Apoiados.)

Tambem communicarei ao sr. ministro da guerra as observações do sr. Arouca, pelo facto de serem dispensados de cumprirem o preceito quaresmal os officiaes e soldados que foram para Vendas Novas, e eu espero que as explicações do meu collega hão do bastar para satisfazer os sentimentos religiosos do illustre deputado, e que são os de toda a camara. (Apoiados.)

Quanto á ultima questão, a da inspecção ao theatro da Trindade, ou não posso dar' promenores a esse respeito, porque o assumpto não corre pela minha pasta; mas communicarei ao sr. ministro do reino a pergunta do illustre deputado.

Sobre este ponto, o que apenas sei, por ouvir dizer, é que a commissão encarregada da inspecção dos theatros fôra de opinião de que não podiam funccionar conjunctamente o salão como theatro; mas creio que com clausulas, sendo uma d'ellas que se abrisse uma determinada porta, não sei qual.

Voltando depois a commissão ao theatro, e vendo que a porta se abrira ou n'essa occasião, ou um pouco antes, se dividiram então os pareceres dos membros da commissão, opinando uns que o salão podia funccionar conjunctamente com o theatro, e outros que não.

É o que me consta.

Em todo o caso, torno a repetir, este assumpto não corre pela minha pasta, e, por isso, não tenho informações minuciosas.

Communicarei, portanto, ao sr. ministro do reino o que o illustre deputado deseja saber, e estou persuadido que o meu collega virá á camara dar as explicações que s. exa. pede.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Arroyo: - As considerações feitas pelo sr. ministro da fazenda obrigam-me a acrescentar mais alguma cousa ás palavras que eu tencionava proferir, relativamente á ausencia do sr. ministro das obras publicas.
Parece-me que as rasões apresentadas pelo sr. ministro da fazenda, para justificar essa ausencia, não podem lograr satisfazer a camara. (Apoiados.)

Se n'estes ultimos dias, o sr. ministro das obras publicas tem estado empenhado na discussão da interpellação, na camara dos dignos pares, sobre a concessão de novas linhas ferroas na parte sul do paiz, é tambem verdade que desde o começo da sessão legislativa, e não de algumas sessões a esta parte, não logrâmos ver s. exa. aqui occupando o seu logar, senão rarissimas vezes, e depois de se entrar na ordem do dia.

Portanto, a defeza apresentada pelo sr. Marianno de Carvalho, se é perfeitamente acceitavel no sentido de ficar sempre bem a s. exa., e ser proprio do seu coração magnanimo defender qualquer dos seus companheiros nas lides ministeriaes, é todavia totalmente inacceitavel, quando nós pensâmos que a ausencia do sr. Emygdio Navarro não data de algumas sessões a esta parte, mas sim do principio da sessão legislativa. (Apoiados.)

E não é porque na pasta de s. exa. não haja tantissimas questões que na realidade chamam a attenção, não só dos membros que compõem a opposição parlamentar, mas de to-todos os nossos collegas n'esta casa.

Assim, a censura do sr. Arouca é perfeitamente justificada, (Apoiados) e a ausencia do sr. Emygdio Navarro é até mais para estranhar, partindo de um cavalheiro que antes de ser ministro tinha um amor tão profundo ás cadeiras d'esta camara, e que depois de ter alcançado uma pasta, não sei que especie de molestia lhe deu, cujas manifestações externas se transformam n'uma aversão constante á cadeira que s. exa. occupa.

Não sei quaes são as causas, não quero analysal-as, limito-me unica e simplesmente a frisar este facto e a mostrar como é justificada a queixa do sr. Arouca.

O sr. ministro da fazenda, quando, relativamente a uma pergunta d'aquelle illustre deputado e meu collega, fallou em sentimentos religiosos, frisou que eram os de um deputado, e eu entendo que deviam ser tambem os sentimentos de s. exa. e de toda a camara.

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu disse de toda a camara, e, como sou membro d'ella, estou tambem incluido.

O Orador: - S. exa. tem obrigação de ser tão bom catholico como nós, (Apoiados.) porque deve prestar homenageai á carta. A nossa lei fundamental diz que a religião do estado é a catholica, apostolica, romana e nós, re-

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presentantes de um paiz catholico, apostolico, romano, somos portanto realmente catholicos. (Apoiados.)

Dito isto, para que fique bem assentado que o catholicismo do sr. ministro da fazenda não deve ser inferior ou superior ao do qualquer collega n'esta casa, eu vou pedir lhe que transmitia ao seu collega da justiça o pedido que faço, para que s. exa. venha a esta camara n'um dos proximos dias, a tempo do me ser possivel dirigir a s. exa. duas simples perguntas, uma sobre assumpto que dependi muito especialmente da sua pasta, e a outra com relação a um assumpto que é mais da responsabilidade de todo o ministerio, do que exclusivamente de s. exa.

Antes de me sentar, e relativamente ao ponto em que o meu amigo o sr. Arouca acaba de tocar, a falta do remessa dos documentos, relativos ás medidas preventiva nos theatros, direi a s. exa. que se conforme com a minha sorte. (Riso.)

Logo depois da tremenda catastrophe que enlutou Porto, no mez de março, eu pedi que, pelo ministerio do reino, me fossem enviados os pareceres da commissão no meada para propor medidas preventivas contra os incendios nos theatros, e a nota das medidas tomadas pelas auctoridades em apoio, ou contrarias ás indicações d'essa commissão; mas, apesar de eu ter insistido por essa remessa, mesmo na presença do sr. ministro do reino, até ao presente ainda não foi satisfeito esse pedido.

V. exa. sr. presidente, comprehende o sentimento de delicadeza que me leva a não tratar aqui este assumpto sem ter os documentos á vista. (Apoiados.) V. exa. com prebende que as responsabilidades de qualquer auctoridade n'este assumpto são por tal fórma melindrosas, que nenhum membro d'esta camara se póde atrever a discutil-as sem documentos; (Apoiados.) e é esta a rasão por que me tenho abstido de examinar a questão e de dizer o que penso acerca d'ella.

Contudo, não quero incommodar de novo a mesa, e n'isto não vae desrespeito para com v. exa.; se o ha não parte de mim. (Apoiados.)

Não peço a v. exa. que inste pela remessa doa documentos a que alludo, porque julgo o pedido absolutamente inutil. Os documentos só vêem quando os ministros os querem mandar. (Apoiados.)

Dito isto, eu volto-me para o meu amigo o sr. Arouca, e digo-lhe que não lastime a sua sorte, porque tem collegas na desgraça. (Riso.)

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Agradeço ao illustre deputado o modo como fez o elogio da magnanimidade do meu coração; mas devo dizer que a respeito do sr. Navarro não foi magnanimidade, mas justiça. (Apoiados.)

O meu collega tem aqui vindo mais de uma vez antes da ordem do dia; (Apoiados.) o em breve o illustre deputado terá o prazer de o ver n'esta camara todos os dias, porque se vae aqui tratar de uma discussão importante que lhe diz respeito.

É uma velha tactica das opposições pedirem geralmente a comparencia dos ministros que não estrio presentes. (Apoiados.)

Quando cata presente o ministro da fazenda. pede-se a presença do ministro da justiça; quando está presente o ministro da justiça pedem a do ministro da fazenda. (Apoiados )

E uma tactica já muito usada, e eu tambem já usei d'ella. (Riso.)

Agradeço igualmente no illustre deputado o ter aproveitado a opportunidade para afervorar os meus sentimentos religiosos; mas devo dizer que n'este ponto não ora preciso, porque eu, referindo me ao sr. Arouca, disse : "os sentimentos religiosos do illustre deputado são os de toda a camara". (Apoiados.)

Ora eu pertenço á camara, e portanto eram tambem os meus. (Apoiados.)
finalmente, com relação á falta de remessa de documentos, eu pela minha parte direi que não mando documentos) quando quero, mas mando-os quando posso e o mais depressa que posso.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa o parecer da commissão de administração publica sobro o meu projecto alterando um artigo do codigo administrativo.

A imprimir.

O sr. Franco Castello Branco: - Realmente não comprehendo o sr. Marianno de Carvalho. S. exa. nota que, quando está presente o ministro da fazenda, nós pedimos o ministro da justiça. Mas o que queria que fizessemos?

É claro que quando está presente o sr. ministro da fazenda, nós não temos que pedir a sua comparencia. (Apoiados.)

Com relação ao sr. ministro das obras publicas, ou a outro qualquer ministro, reclama-se a sua presença por que ha questões com elles a tratar, e que convem discutir o mais rapidamente possivel. (Apoiados.)

Não se trata de uma tactica parlamentar; a questão provem de não se mandarem á camara todos os documentos relativos a actos de administração praticados pelo governo.

Esta é que e a pedra de escandalo entre o governo e a opposição.

V. exa. sabe que nós levantamos aqui antes da ordem do dia um grande numero de questões de administração que na imprensa foram ia tratadas, e algumas d'ellas por uma maneira desagradavel para o ministerio. Pedem-se documentos a esse respeito, e nada mais natural do que este pedido da opposição; mas o que succede?

Com relação ao sr. ministro da fazenda, desde o principio da sessão que o sr. Arrojo pede uma relação de todos os escrivães de fazenda que estão addidos, e das collocações que se lhes deu ultimamente; isto ha quatro mezes e, todavia, até agora ainda não houve tempo de organisar essa relação!

No entanto, o sr. ministro da fazenda, instado de novo pelo sr. Arroyo em uma das primeiras sessões d'este mez, declarou à bout de resource que esses documentos seriam enviados no dia seguinte. São decorridos quinze dias depois que o sr. ministro da fazenda prometteu solemnemente fazer essa remessa, e taes documentos ainda não vieram!

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Peço licença para declarar que eu não disse que mandava os documentos no dia seguinte, mas sim que os mandava brevemente. O equivoco foi do Diario da camara.

(Pequena pausa.)

Agora mesmo acabam de me informar que essa relação já está concluída, c por isso envial-a-hei a s. exa. com a maxima brevidade.

O Orador: - S. exa. sabe que é isso o que se lê no Diario da camara. O sr. Arroyo fez referencia ao facto, e eu tambem; mas o que me parece é que, desde o momento em que sejam enviados a esta camara todos os documentos pedidos, nós poderemos, em logar de discutir as questões a que elles se referem, reclamar a presença dos ministros; mas, emquanto não forem enviados, não podemos deixar de reclamar e insistir pela presença dos membros do governo.

Vou agora tratar muito rapidamente do ponto para que pedi a palavra.

N'uma das sessões transactas chamei a attenção do sr. illustre da fazenda para o facto de não se entregarem aos empregados, que pagam direitos de mercê, os respectivos talões d'esse pagamento. Isto dá-se especialmente desde que o pagamento dos ordenados e outros vencimentos dos empregados do estado deixou de se effectuar pela thesou-

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SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 1888 1191

raria do ministerio da fazenda para ser effectuado pelo banco emissor.

O sr. ministro da fazenda nessa occasião prometteu-me fallar a esse respeito com o director geral do ministerio da fazenda, por onde corre esse negocio, e tomar as providencias necessarias a tal respeito.

Não sei só s. exa. as tomou; mas o que é certo é que desde fevereiro até hoje ainda não foram entregues aos interessados os conhecimentos dos descontos que pelos direitos de mercê tem soffrido nos seus ordenados.

Não sei se depois que este serviço passou para cargo do banco emissor, se poderá fazer como até aqui; mas que se faça por essa forma ou por outra, não é essa a questão; o que eu desejo é que o sr. ministro da fazenda tome qualquer providencia regulamentar á este respeito.

Todos sabem que os diplomas ou cartas de nomeação dos empregados publicos terminam pela seguinte maneira, que e uniforme:

"Fica obrigado ao pagamento da quantia de ... de direitos de mercê, devendo, logo que esteja realisado o mesmo pagamento, apresentar este diploma na secretaria do negocios da fazenda, para nos termos do regulamento de 28 de agosto de 1860, se exarar n'elle a necessaria quitação, sem a qual não terá inteira validade.

"Desde, etc."

Ha, pois, como v. exa. vê, uma lei que determina que os empregados publicos, logo que tenham pago todos os direitos de mercê, apresentem na direcção geral das contribuições directas os conhecimentos relativos ás differentes prestações pagas, a fim do serem examinadas e poder ser passada a quitação, se estiverem em termos.

Ora, é evidente que, não tendo sido até agora entregues os documentos, não poderão elles ser examinados nem passada á quitação; e se assim continuar a fazer-se, será impossivel dar execução á lei.

Torna-se, pois, urgente tomar uma providencia que obste ao que se está praticando. É impossivel dar execução á lei e sairmos d'estas difficuldades, sem que se tome uma providencia para evitar por um lado, que os empregados paguem direitos de mercê alem do que devem, porque não sabem quando cessara as deducções que soffrem, e por outro lado para se poder satisfazer ao preceito da carta de lei de 11 de agosto de 1860.

Torno a chamar a attenção do sr. ministro da fazenda sobre este assumpto e a pedir-lhe que, tomado um expediente qualquer, o faça publicar no Diario do governo para conhecimento de todos os interessados.

E para que eu não tenha de tornar a fallar n'este assumpto, espero que s. exa. me diga, se lhe parecer isso conveniente, qual a resolução que tenciona tomar a este respeito.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado que já dei instrucções na secretaria para só resolver o assumpto a que s. exa. se referiu.

Tem havido difficuldades na transição; mas o sr. director geral da contabilidade, de accordo com o da thesouraria, está tratando de remediar essas difficuldades, e em breves dias conto poder participar a resolução deste negocio.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Frederico Arouca: - Não podia deixar do protestar contra as phrases do sr. ministro da fazenda, que attribuiam a uma tactica parlamentar as suas instancias para que o sr. ministro das obras publicas comparecesse antes da ordem do dia.

Appellava para o sr. presidente.

O sr. presidente que dissesse se elle, orador, não tinha os differentes vezes pedido a palavra para quando s. exa. estivesse presente.

Se esta fôra a tactica do sr. Marianno de Carvalho, não era a sua.

Pedia a presença do sr. ministro das obras publicas, porque desejava .saber as rasões por que se gastava dinheiro com professores que não sabiam ensinar e com quintas que não serviam para os fins a que eram destinadas.

Se tivesse logrado ver o sr. ministro das obras publicas na camara, talvez tivesse evitado que se vendesse, o pinhal da Azambuja.

Havia uma lei que mandava que as matas que tivessem uma certa extensão, fossem vendidas, e achava isto um bom principio de administração, um bom principio de economia; mas o pinhal da Azambuja poderia conservar-se, porque estava muito perto do pinhal das Virtudes, e os guardas que vigiam um; podiam vigiar o outro.

Apesar d'isto, elle fôra vendido por 6:000$000 réis.

Queria ainda perguntar ao sr. ministro das obras publicas qual a rasão por que, tendo gasto muito dinheiro em comprar reproductores estrangeiros, estabelecia agora para a exposição agricola e pecuaria premios somente para cavallos exclusivamente nacionaes, e não os estabelecia para os productos dos cruzamentos.

E queria ainda perguntar-lhe por que era que o sr. Elvino de Brito, director geral da agricultura, tinha apresentado no congresso agricola, que era uma reunião particular, o resultado do inquerito agricola, e na camara ainda se não tinha dito uma palavra a este respeito.

Tinha estas e outras questões a tratar; e portanto, quando requisitava a presença do sr. ministro, não o fazia para usar de uma tactica parlamentar.

Protestava por isso contra estas phrases do sr. ministro da fazenda.

(O discurso será publicado em appendice a esta sessão quando s. exa. o restituir.)

ORDEM DO DIA

Discussão do projecto de lei n.° 14

Leu-se. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 14

Senhores. - A vossa commissão de fazenda examinou cuidadosamente a proposta ministerial n.° 9-E, que tem por objecto: melhorar a administração das caixas geral de depositos e economica portuguoza, creadas respectivamente pelas leis de 10 de abril de 1876 e de 26 de abril de 1880; estabelecer, a contar do levantamento do capital, e mais para evitar complicação de serviço, do que para procurar lucros, aliás attendiveis, a prescripção dos juros dos depositos feitos na primeira d'aquellas caixas; e alargar as operações ainda da caixa geral de depositos por fórma que a um tempo fossem por novos meios bem servidos interesses publicos ou do estado e facultadas vantagens aos particulares o pessoas moraes, duplo fim a que visam aquellas duas instituições economicas e de administração publica, e a que, já depois das leis que as crearam entre nos, têem attendido, para a primeira as leis de 1 de abril de 1880, 22 de março de 1881, e de 1 de julho de 1885, e para a segunda a lei de. 15 de julho de 1880.

Approvado desde logo pela vossa commissão o pensamento, a que obedeceu, a proposta, e que demasiadamente justifica o relatorio, que a precede, foram em seguida pela discussão das suas providencias especiaes introduzidas na mesma proposta, e de accordo com o governo, algumas modificações que a fizeram converter no, em parte differente, projecto de lei, que temos a honra de submetter á vossa apreciação.

Se o serviço da caixa economica foi considerado annexo ao da caixa geral de depositos e este já por sua vez o era do da junta do credito publico, hoje, reorganisado, como

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se acha, o serviço da divida publica pelo decreto de 15 de dezembro de 1887 publicado cm virtude da auctorisação concedida ao governo pela lei de 29 de julho do mesmo anno, tom aquella junta perante a nova direcção geral e o governo somente attribuições fiscaes e consultivas com respeito ás funcções, que n'ella antes eram principaes, e deixaram assim propriamente de ser accessorias as da administração das duas referidas caixas.

De rasão e, pois, que á qualidade ou cargo de governador ou chefe do conselho de administração das mesmas duas caixas se subordine a de membro e presidente da junta do credito publico, que o governo tinha de nomear e escolher.

A sua inamobilidade é condição da sua independencia, que por suas funcções é especialmente util garantir perante os varios governos, que só succedam no poder.

Igual proposito determinou a vossa commissão a ligar ás funcções de director geral da contabilidade publica a presidencia do conselho fiscal.

Acresce ainda a conveniencia para o serviço, de ficar existindo, quer na administração quer na fiscalisação, um elemento estavel, que, representando o poder central, imprima unidade aos trabalhos, e torne pela experiencia faceis e promptas as funcções e seguros e efficazes os resultados.

Ficando sendo tres em vez de quatro os vogaes do conselho fiscal, teve a percentagem sobre os lucros annuaes da caixa geral de depositos a dividir entre elles de ser de l 1/2 era vez de 2 por cento.

Para todos os membros da junta do credito publico, porém, cessa a gratificação de 400$000 réis concedida pelo artigo 87.° do decreto de 17 de agosto de 1881, e cessa para o presidente tambem a de 600$000 réis arbitrada pelo § 4.° do artigo 7.° do decreto de 15 de dezembro de 1877.

Tendo a caixa geral de depositos arrecadado n'um decennio incompleto, segundo o relatorio da gerencia de 1885 a 1886, quantias superiores a 30.400:000$000 réis; effectuado operações de credito em importencia approximada de 12.000:000$000 réis; pago todos os seus encargos e capitalisado, com 120:183$730 réis de juros de inscripções averbados ao fundo de amortisação, lucros liquidos na importancia de 596:798$205 réis, que produziram em titulos do novo fundo do 3 por cento 1.177:850$000 réis, estando ainda por capitalisar a quantia de 81:000$000 réis, e havendo-se installado a caixa nas ilhas adjacentes somente cm 2 de janeiro de 1886 por força do decreto de 21 de novembro de 1885, e sendo por outro lado de cerca de réis 90:0004000 os lucros liquidos annuaes da caixa geral de depósitos, embora a caixa economica, que tem precisado de supprimentos feitos por aquella (de cujo phenomeno não é aqui occasião de tratar, e que, aliás, foi proficientemente apreciado já no relatorio do projecto convertido na lei de 15 de julho de 1885), possa começar a ser productiva por se achar hoje estabelecida nas sédes de todos os districtos do continente e em via de sel-o em todas as comarcas; conhece-se de prompto, que para o trabalho e responsabilidade, que importam, a administração e fiscalisação das duas caixas bem merecem ser dotadas como vão no projecto.

Uma boa cautela se acrescentou, qual foi a das percentagens nunca poderem ser consideradas para effeito algum senão como vencimentos de exercicio.

Emquanto ao artigo da proposta, que do modo imperativo dispunha que as misericordias, casas pias, hospitaes, asylos o todos os outros estabelecimentos ou instituições similhantes do continente do reino, em cuja administração superintenda o estado, depositassem na caixa geral de depositos todos os seus capitães em papeis de credito, a vossa commissão, como o sr. ministro da fazenda já declarou na camara, resolveu substituil-o por outro que tornasse apenas facultativo o deposito d'esses papeis.

Reconheceu-se que, sendo boa a providencia como regra, haveria necessidade de lhe fazer excepções consoante algumas circumstancias, que não eram susceptíveis da formula precisa de textos legislativos.

Mas é de esperar, que, permittidos taes depositos, não deixem de os promover as administrações dos estabelecimentos, que não tenham proveito especial a oppor á vantagem, quando comprehendida sem suspeitas, da, guarda, cobrança e vencimento de juros, que a proposta e o projecto lhes concedem.

Sendo, porém, os depósitos facultativos, tornou-se preciso, por causa da legislação existente, determinar que a caixa não póde, nem recusar-se ao seu recebimento, nem cobrar por causa d'elles qualquer percentagem a titulo cie commissão.

Pelos motivos que temos exposto, c explicadas as modificações importantes, que a proposta ministerial soffreu, sendo as outras, ou de simples redacção, ou de conveniente desenvolvimento de preceitos lá consignados, é a vossa commissão de parecer, de accordo com o governo, que a mesma proposta seja convertida no seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° A administração das caixas geral de depositos e economica portugueza ficará pertencendo, com a responsabilidade do respectivo serviço, a um conselho composto de um governador e dois vogaes.

§ 1.° O governador será de livre nomeação do governo e terá a categoria e mais vantagens dos directores geraes do ministerio da fazenda, excepto o vencimento de exercicio.

§ 2.° Ao cargo de governador fica annexo, não só o de membro da junta do credito publico, que, segundo a legislação existente, teria de ser nomeado pelo governo, mas o de presidente da mesma junta.

§ 3.° Os dois vogaes do conselho de administração serão os dois membros da junta do credito publico eleitos pelas camaras legislativas, e servirão por tres annos.

§ 4.° O substituto do governador será o vogal eleito pela camara dos senhores deputados.

Art. 2.° Junto do conselho de administração haverá um conselho fiscal composto do director geral da contabilidade publica, que será o presidente, e de dois vogaes, que serão os dois membros da junta do credito publico eleitos pelos juristas.

Art. 3.° Dos lucros annuaes da caixa geral de depositos serão divididos 21/2 por cento igualmente entre o governador e os dois vogaes do conselho de administração, e 11/2 por cento entre o presidente e os dois vogaes do conselho fiscal por meio de senhas de presença.

§ unico. Estas percentagens nunca para effeito algum poderão ser consideradas senão como vencimentos de exercicio.

Art. 4.° O governador, apesar de ser membro e presidente da junta do credito publico, ficará tendo, por todas as suas funcções, somente os proventos, que lhe são concedidos por estalei, e os mais membros d'aquella junta, que são vogaes do conselho de administração e do conselho fiscal, deixarão de perceber a gratificação de 400$000 réis por anno pelo serviço da caixa geral de depositos.

Art. 5.° O conselho de administração, alem d'uma reunião por semana, terá, por convocação do governador ou pedido do conselho fiscal, todas as mais que o serviço exigir.

§ unico. As funcções do governador são, todavia, incessantes, e a elle incumbe especialmente cumprir e fazer executar as deliberações do conselho de administração.

Art. 6.° Similhantemente o conselho fiscal, além de duas reuniões cada mez, terá, por convocação do seu presidente ou pedido do conselho de administração, todas as mais que o serviço exigir.

Art. 7.° Gessam de ser exigireis e revertem a favor dos lucros da caixa geral de depositos os juros em divida dos depositos existentes ou que venham a existir na mes-

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SESSÃO DE 25 DE ABRIL DE 1888 1193

ma caixa, que não forem devidamente reclamados no praso de cinco annos a contar da data do levantamento dos depositos.
Art. 8.° É auctorisada a caixa geral de depositos a receber em todas as suas delegações depositos destinados á compra de titulos da divida publica portugueza, acções e obrigações da companhia geral do credito predial e acções e obrigações do banco de Portugal.
§ 1.° Os papeis de credito, a que se refere este artigo, serão comprados em praça por intermedio de corretores de numero.
§ 2.° Pelo encargo da compra, averbamento e remessa d'esses papeis de credito cobrará a caixa geral de depositos a commissão de l por milhar do preço da compra.
Art. 9.° As misericordias, casas pias, hospitaes, asylos e todos os outros estabelecimentos ou instituições similhantes do continente do reino, em cuja administração superintenda o estado, poderão, querendo, depositar na caixa geral de depositos todos os seus capitães em papeis de credito, não podendo a caixa nem recusar-se no recebimento de taes depositos nem cobrar por causa d'elles qualquer percentagem a titulo de commissão.
§ 1.° A caixa geral de depositos procederá á cobrança nas epochas devidas dos juros d'esses papeis de credito, lançando a sua importancia em conta corrente aberta a cada estabelecimento depositante, dando a este immediata communicação da cobrança para que possa ser levantado o seu producto pelos interessados.
§ 2.º A caixa geral de depositos abonará o juro annual de 3,6 por cento pelos dinheiros d'esta proveniencia, liquidado pela fórma prescripta no artigo 25.°, e salva sempre a disposição do artigo 21.° do decreto de 11 de fevereiro de 1886 relativamente aos depositos na caixa economica portugueza.
Art. 10.° A caixa geral de depositos é a administradora de todas as heranças, a cuja arrecadação se proceda pelos juizos do continente e ilhas adjacentes, e a que se refere o artigo 691.° do codigo do processo civil, pertencendo-lhe n'essa qualilidade a retribuição respectiva.
§ unico. Esta disposição vigorará para a comarca de Lisboa desde a publicação da presente lei. Para as outras comarcas será posta em vigor á proporção que se organisar convenientemente o serviço.
Art. 11.° O quadro das caixas geral de depositos e economica portugueza é augmentado com mais um primeiro official, ficando a administração da caixa auctorisada a admittir mais um fiel de thesoureiro e até oito empregados temporarios com o vencimento de 800 réis por cada dia de serviço util e effectivo.
Art. 12.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução d'esta lei.
Art. 13.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 17 de fevereiro de 1888. - A. Fonseca =Elvino de Brito = Fernando Mattoso Santos =Marianno Presado=0liveira Martins = Vicente R. Monteiro = Gabriel José Ramires = Carlos Lobo d'Avila = Antonio Eduardo Villaça =A. Baptista de Sousa, relator.

N.º 9-E

Artigo 1.° O serviço da administração das caixas geral de depositos e economica portugueza será confiado a um conselho de administração, composto de um governador e dois vogaes, que por todo elle serão responsaveis.
§ 1.° O governador será o presidente da junta do credito publico, que terá a categoria e mais vantagens dos directores geraes do ministerio da fazenda, excepto vencimentos.
§ 2.° Os dois vogaes serão eleitos para servirem por tres annos, um pela camara dos dignos pares do reino e outro pela camara dos senhores deputados da nação portugueza.
§ 3.° Na falta ou impedimento do governador servirá o vogal eleito pela camara dos senhores deputados como vice-governador.
Art. 2.º Junto da administração da caixa geral de depositos servirão como conselho fiscal os quatro vogaes da junta do credito publico, presididos pelo mais velho.
Art. 3.° A remuneração dos tres membros do conselho de administração consistirá em uma percentagem de 2 1/2 por cento sobre os lucros annuaes da caixa geral de depositos, repartidos igualmente por todos; a dos membros do conselho fiscal em uma percentagem de 2 por cento sobre os mesmos lucros, dividida igualmente por meio de senhas de presença.
Art. 4.° O conselho de administração reune-se pelo menos uma vez cada semana; o conselho fiscal pelo menos duas vezes cada mez.
§ unico. Ao governador incumbe cumprir e fazer executar as deliberações do conselho de administração.
Art. 5.° Cessam de ser exigiveis e revertem a favor dos lucros da caixa geral de depositos os juros em divida dos depositos existentes ou que venham a existir na mesma caixa, que não forem devidamente reclamados no praso de cinco annos, a contar da data do levantamento dos depositos.
Art. 6.° É auctorisada a caixa geral de depositos a receber em todas as suas delegações depositos destinados á compra de titulos da divida publica portugueza, acções e obrigações da companhia geral de credito predial e acções e obrigações do banco de Portugal.
§ 1.° Os papeis de credito a que se refere este artigo serão comprados em praça por intermedio de corretores de numero.
§ 2.° Pelo encargo da compra, averbamento e remessa desses papeis de credito cobrará a caixa geral de depositos a commissão de l por milhar do preço da compra.
Art. 7.º As misericordias, casas pias, hospitaes, asylos e todos os outros estabelecimentos ou instituições similhantes do continente do reino, em cuja administração superintenda o estado, depositarão na caixa geral de depositos todos os seus capitães em papeis de credito.
§ l.º A caixa geral de depositos procederá á cobrança nas epochas devidas dos juros d'esses papeis de credito, lançando a sua importancia em conta corrente aberta a cada estabelecimento depositante, dando a este immediata communicação da cobrança para que possa ser levantado o seu producto pelos interessados.
§ 2.° A caixa geral de depositos abonará o juro annual de 3,6 por cento pelos dinheiros d'esta proveniencia, liquidado pela fórma prescripta no artigo 25.° do decreto de 11 de fevereiro de 1886 relativamente aos depositos na caixa economica portugueza.
Art. 8.° A caixa geral de depositos é a administradora de todas as heranças, a cuja arrecadação se proceda pelos juizos do continente e a que se refere o artigo 69l.° do codigo do processo civil.
§ unico. Esta disposição vigorará para a comarca de Lisboa desde a publicação da presente lei. Para as outras comarcas do continente será posta em vigor á proporção que se organisar convenientemente o serviço.
Art. 9.° O quadro das caixas geral de depositos e economica portugueza é augmentado com mais um segundo official, ficando a administração da caixa auctorisada a admittir mais um fiel de thesoureiro e até oito empregados temporarios com o vencimento de 800 réis por cada dia de serviço util e effectivo.
Art. 10.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução da presente lei.
Art. 11.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio dos negocios da fazenda, 31 de dezembro de 1887.=Marianno Cyrillo de Carvalho.
O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.
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O sr. Ferreira de Almeida: - Por muito que possa parecer extraordinario que eu entre na discussão d'este projecto, faço-o, não só por dever do cargo, mas para que não pareça que constitue um proposito especial o occupar-me sómente das questões coloniaes e maritimas com que até agora tenho principalmente occupado a attenção da camara.
Tentou-me alem d'isso a viagem por estas novas provincias da publica administração (Riso.), o facto de ser este projecto um dos mais extraordinarios que se tem apresentado á apreciação do parlamento, por tudo que n'elle se contem, no que realisa, e no que ha de ter como consequencias.
O projecto pretende reorganisar a caixa geral de depositos e economica portugueza, quando tem apenas em vista servir amigos com um favoritismo até agora desconhecido. (Apoiados.}
Isto que se apresenta á discussão parlamentar não é a reorganização da instituição bancaria dependente do estado e chamada caixa geral de depositos, é sim uma caixa forte de escandalos; (Riso.) complemento de outros, feitos sombra de auctorisações parlamentares.
A lei que organisou o banco emissor, auctorisava o governo, pelo artigo 2.°, a reformar o serviço da divida publica dentro e fóra do paiz, por fórma que, dada toda a necessaria segurança aos credores do estado, se reduzissem as despezas!
Pois, sr. presidente, foi com esta auctorisação, que se reformou a divida publica, e foi por causa da reforma da divida publica, que se apresenta agora este novo projecto da reforma da caixa geral de depositos, que contém treze artigos, dos quaes um auctorisa a elaboração dos regulamentos e outro declara revogada a legislação em contrario; e ficando onze, referem-se sete d'estes ao pessoal, e os outros quatro á gerencia da caixa, no que diz respeito á prescripção do juros, á faculdade concedida ás irmandades e outras instituições para depositarem na caixa os seus titulos, auctorisando a caixa a ser corrector na compra de determinados fundos, e finalmente sobre a arrecadação e administração dos bens de heranças.
Como v. exa. e a camara vêem, são onze artigos propriamente doutrinarios, dos quaes sete dizem respeito a pessoal e só quatro a materia propriamente administrativa, de uma necessidade e urgencia contestavel, para que se formulasse similhante projecto de lei.
A auctorisação para a creação do banco emissor, reformando a administração da divida publica sem prejuizo para os credores do estado, dentro e fóra do paiz, determinou a reforma da junta do credito publico, deixando os individuos que formavam a junta n'uma posição ridicula com respeito á divida publica, e duvidosa, com respeito á caixa geral de depositos, como claramente se vê pelo projecto que se discute, quando diz o seguinte:
(Leu.)
Como v. exa. vê é o proprio parecer que se encarrega de dizer, que este projecto tem principalmente em vista assegurar os logares convenientemente remunerados aos membros da junta, que eram gerentes da caixa de depositos.
Para dar já a nota geral d'estas differentes reformas, que se encadearam entre si, devo dizer a v. exa. que a tal auctorisação do artigo 2.°, que dizia respeito ao banco emissor, e com a condição de que seriam reduzidas as despezas, traz nada mais, nada menos, do que o augmento de despeza superior a 23:000$000 réis por anno.
É assim que a reforma de que se trata, traz um augmento de despeza, superior a 4:000$000 réis. A reforma a junta, transformada em repartição da divida publica, produziu um augmento geral. E a creação da famosa agencia financial do Rio de Janeiro, importa só por si em réis 15:000$000 annuaes! (Apoiados.)
O decreto que creou esta agencia financial, diz que dos lucros das transações effectuadas pela thesouraria, etc., se hão de tirar os encargos, mas prevendo já que esses lucros não cheguem para a sua extraordinaria dotação, acrescenta: «liquidando-se opportunamente qualquer differença que houver».
Temos, pois, uma serie de operações, não sei se bem ou mal combinados, porque, algumas já deram consequencias fataes, por ter endoudecido um empregado por causa de uma preterição de collocação, a que se julgava com direito. (Apoiados.) e importando o augmento de despeza em réis 23:000$000, quando se promettia fazer reducções. (Apoiados.)
Como disse, o projecto tem treze artigos, dos quaes onze doutrinarios e d'estes sete para o pessoal. Os seis primeiros dizem respeito á organisação do pessoal administrativo da caixa e conselho fiscal, e o 11.° trata de augmentar o quadro do pessoal subalterno com mais um primeiro official, um fiel e oito empregados temporarios. Mas o mais notavel é, que emquanto no parecer da commissão se trata largamente da situação dos antigos membros da junta, da sua collocação, e até das suas melhorias, dando-lhes a permanencia que d'antes não tinham, nada se diz para justificar o augmento de pessoal subalterno. (Apoiados.)
Havendo ainda de notavel, que emquanto o governo propunha o augmento de um segundo official, a commissão transforma-o em primeiro, sem mais explicações. (Apoiados.)
Mais um official, um fiel e oito amanuenses temporarios! Para que? Nada se diz! (Apoiados.)
Devo dizer a v. exa. e á camara, que me surprehende tanto mais este augmento de pessoal, quando vejo concederem-se licenças a empregados da caixa, para estarem fóra, distrahidos em outros serviços. Logo é porque não fazem lá falta, e se não fazem falta não ha rasão alguma para se augmentar o quadro. (Apoiados.)
Este artigo 11.°, como os seis artigos primeiros eram consequencia forçada, fatal, necessaria, e política da reforma da repartição chamada da divida publica. (Apoiados.)
Analysemos, porém, o projecto em discussão, e a camara permittir-me-ha que seguidamente analyse a reforma da repartição da divida publica, por isso que sendo, na minha opinião, a causa determinante do projecto, e sendo perfeitamente legitimo que no parlamento se apreciem, e tomem contas ao governo da maneira como usa das auctorisações parlamentares, aproveite o ensejo de ligar estas duas questões, que de mais a mais têem entre si uma relação intima. (Apoiados.) Comecemos pelo conselho do administração.
Antigamente a caixa geral de depositos era administrada por todos os membros da junta do credito publico em conselho; veiu agora o governo e propoz, que em vez dos cinco membros da junta que formavam esta especie de conselho de administração, houvessem sete!
Parece mesmo que antecipadamente estava sendo arrastado para este numero cabalistico da doutrina enrista, que foi ha pouco assumpto de referencia parlamentar. (Riso.)
Á commissão não lhe agradou o numero sete, recordava-lhe naturalmente os sete peccados mortaes, e reduziu-o a seis. Ficou, por consequencia, a proposta do governo, de tres vogaes do conselho de administração e quatro vogaes do conselho fiscal, a ter, segundo a transformação feita pela commissão, tres vogaes no conselho de administração e tres no conselho fiscal.
Ora, ha n'isto uma cousa curiosissima que vou referir, e em que ia apostar, que alguns deputados da maioria teriam vontade de me apoiar; e é, que emquanto o projecto do governo introduz dois individuos estranhos aos antigos membros da junta do credito publico, que deviam ser eleitos pela camara dos dignos pares e pela camara dos senhores deputados, a commissão alterando a proposta do governo, e esta fórma de nomeação, manteve um só logar, e naturalmente para evitar ciumes entre as camaras dos dignos pares e dos senhores deputados, escolheu um terceiro! O

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eterno tercius! Quer a camara saber quem a commissão escolheu para o conselho? O director geral de contabilidade publica!
Estou convencido de que o director geral da contabilidade publica, que faz parte d'esta camara e d'esta commissão, se estivesse presente, se levantaria a protestar contra este augmento de despeza, que não se justifica por principio algum, com a mesma isenção com que se levanta sempre a protestar contra todos os outros augmentos, que lhe não dizem respeito; porque nós ainda estamos todos lembrados, quando se tratou do augmento das tarifas militares, que foi elle um, dos que mais se pronunciou contra aquelle augmento; e comtudo é fóra de toda a duvida, que aquella medida, era de toda a justiça, e tinha toda a rasão de ser. (Apoiados.}
Ha aqui uma inspiração do Divino Espirito Santo, talvez, d'aquelle mesmo que inspira os pareceres da commissão de orçamento, a que não tenho logrado assistir! (Riso.) Para dar um certo tom do gravidade ao projecto e ao trabalho da commissão resolveu esta fazer uma economia na proposta do governo, que dispunha que houvesse sete membros, tres do conselho de administração com a percentagem de 2 1/2 por cento sobre os lucros da caixa geral de depositos, e quatro do conselho fiscal com uma percentagem de 2 por cento sobre os mesmos lucros. O que fez a commissão? Tirou um vogal e em vez dos 2 por cento para o conselho fiscal estabeleceu-lhe l 1/2 por cento! E, para não haver duvidas sobre o caso, para que o director geral da contabilidade publica e membro da commissão de fazenda não se insurgisse, disse naturalmente a commissão: não podemos fazer nada de melhor, do que resolver, que em logar dos dois membros novos, eleitos pelas camaras legislativas, seja elle, quem occupe esse logar, elle o fiscal suppremo de todas as despezas.
Se o novo projecto tivesse tido em vista manter a situação anterior dos cinco membros da junta, que já estavam collados n'aquella administração, dando-lhe mesmo uma fórma nova na sua distribuição, por um conselho de administração composto do um governador e vice-governador, e por um conselho fiscal composto dos tres restantes membros da junta, seria descupavel sob o ponto de vista da conservação das antigas funcções e attribuições que tinham junto da administração da caixa muito embora com um aspecto diverso na apparencia, mas nos resultados o mesmo; havendo apenas de exquisito que os tres chamados membros do conselho fiscal tivessem, como têem no projecto, uma superioridade fiscalisadora sobre os membros do conselho de administração, em que é presidente, o mesmo presidente da junta, que ali superintende sobre todos elles.
Entretanto eu transigiria com esta anomalia extraordinaria, porque a final representava a conservação do statu quo. E já que não podemos alcançar o cumprimento da promessa do governo, consignada no artigo 2.° da lei que organisou o banco emissor, relativa á reducção das despezas, ao menos não se augmentassem. (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, não só se passa de cinco para seis membros, mas até as gratificações, que eram abonadas pela caixa geral de depositos, foram melhoradas.
Diz o relatorio que precede o projecto, que se devem calcular os lucros liquidos da caixa geral de depositos em 90:000$000 réis por anno, emquanto que no orçamento de previsão para este anno os mesmos lucros são calculados em 88:700$000 réis; ha, pois, uma differença, mas que não vale a pena discutir. O governo e a commissão, em logar de manterem as gratificações antigas, porque as desejam melhorar, mascaram-n'as, substituindo-as por uma percentagem sobre os lucros. Isto realmente é bom, porque estimula a trabalhar, com a perspectiva de que a percentagem possa produzir mais. Mas o peior é que se os ucros forem os mesmos que até aqui, a percentagem traduz-se n'uma gratificação maior, do que aquella, que por esse trabalho recebiam.
O presidente e vogaes da junta do credito publico recebiam, a titulo de gratificação, 400$000 réis annuaes por terem a seu cargo a administração da caixa geral de depositos; na hypothese peior de que os lucros não sejam de 90:000$000 réis, como demarca a commissão, nem de réis 88:700$000, como estabelece o orçamento, mas só de réis 88:000$000, as gratificações de 400$000 réis são substituidas para tres dos membros da junta por 733$000 réis, ou mais 333$000 réis por anno a cada um!
Por seu lado os membros do conselho fiscal, que tinham igualmente 400$000 reis pela antiga organisação, passam a ter l l/1 por cento sobre os taes lucros liquides, quo, computados no minimo de 88:000$000 réis, dá a cada um 433$000 réis por anno, ou mais 33$000 réis que antigamente.
É claro que se os lucros forem como o governo e a commissão calculam, as gratificações crescerão na mesma proporção, avolumando de uma fórma extraordinaria; e isto é um dos primeiros objectivos d'este projecto. (Apoiados.}
E aqui está como a famosa promessa de reducção das despezas se cumpre!
Mas ha mais, sr. presidente.
Estes 433$000 réis, que é o minimo que podem receber os membros do conselho fiscal, considerados como vencimentos de exercicio, são abonados por meio de senhas de presença nas reuniões que o conselho tiver; e estabelecendo o projecto que deverão ter regularmente duas reuniões por mez, ou vinte e quatro por anno, aquella percentagem representa uma retribuição de mais de quatro libras por uma ou duas horas de serviço!
Parece-mo que ficam famosamente remunerados. (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, pela anterior organisação o presidente da junta e presidente do conselho da administração da caixa tinha uma certa mobilidade, podendo ser substituido dentro de uns certos periodos. Agora, porém, com este projecto fica radicado ali!
Comprehendo que o governo, que tem sido tão desvelado, de certa epocha para cá, em attender os seus amigos politicos, e por isso não lhe quero mal, procure dar todos os testemunhos de consideração a um dos seus mais prestimosos correligionarios, como é o sr. conde de Restello, ao qual não obstante a sua posição social, não será do certo desagradavel ficar in perpetuum com 1:000$000 réis da junta e mais os setecentos e tantos mil réis da caixa, susceptiveis de acrescimo.
Comprehendo tambem que ao sr. director geral da contabilidade publica, depois de congraçado com os membros mais importantes da actual situação politica, receba d'ella igualmente todos os testemunhos de consideração que julguem dever dispensar-lhe; mas ainda por cima, este bolo de festa, ficando da mesma fórma in perpetuum n'esta instituição com mais de 400$000 réis, como já demonstrei, é que me parece de mais.
O que é triste, sr. presidente é que tenha de pagar este brodio o pobre contribuinte já sobrecarregado de impostos.
O que é triste é que o governo, tendo promettido reduzir as despezas, as augmenta em mais 23:000$000 réis só n'estas prebendas!
Se o governo, tendo promettido a redução das despezas, as augmenta em 23:000$000 réis, naturalmente, se prometesse manter as despezas que havia, tel-as-ia augmentado em 60:000$000 réis ou mais.
Disse eu que este projecto da caixa1 geral de despositos era filho da transformação da junta do credito publico, na direcção geral da divida publica: e comquanto esta seja lei do estado, em virtude de uma auctorisação parlamentar, como o projecto em discussão, joga com ella, estando a ligação, por assim dizer, umbilical no artigo 11.°, vou analysar a reforma da junta do credito publico para de-

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pois apresentar as observações que tenho a fazer com relação a este famoso artigo 11.º e complementares da analyse do projecto.
Como disse, o governo fez uso da auctorisação consignada no artigo 2.° da lei do banco emissor, e reformou a junta do credito publico, creando a direcção geral da divida publica, em que o antigo contador geral passando a ser independente da junta, o a ficar em inteira e intima dependencia do ministro da fazenda, aquella ficou com as funcções de simples chancella ás ordens do governo. A organisação do banco emissor mandava que o pessoal da thesouraria passasse a servir no banco, por isso que todos os pagamentos que se faziam pela junta, passavam a cargo do mesmo banco; mas o pessoal não só não foi transferido, mas o que é peior, e que exactamente nas vesperas em que se fazia a reforma da junta de credito publico, mettia-se mais um fiel para uma vacatura que se dava, por uma fórma um pouco extraordinaria, o que logo analysarei.
No santo proposito de reduzir a despeza fez-se nem mais nem menos, do que o seguinte.
Os vencimentos do ouvidor, que eram de 900$000 réis, passaram a ser de 1:200$000 reis, não se sabe porque, nem para quê, quando as funcções continuavam as mesmas. O pessoal da secretaria, que antigamente se compunha de dois chefes e tres primeiros officiaes, passou a ser de dez, n'este digno intento de reduzir as despezas. Augmentaram-se mais dois.
Um sr. deputado: - É sempre assim.
O Orador: - Ha ainda mais: o serviço do cartorario, que anteriormente era desempenhado por um segundo official, passa a ser desempenhado agora por um empregado especial, creando-se assim um logar a mais. Mas com este caso o nepotismo excede tudo quanto possa imaginar-se.
Este segundo official passou a cartorario, quando lhe competia, por antiguidade, a promoção a primeiro official. É verdade que passando a ser cartorario, tem uma pequena melhoria, mas ainda assim, inferior ao vencimento do primeiro official. Mas como era preciso esse logar de primeiro official, para um amigo, e o segundo official em questão não pertencia ao grupo politico do governo, ou á cotterie da junta, e digo cotterie, porque tambem nas secretarias ha já as cotteries, foi lançado á margem com um fingido simulacro de favor, quando só houve injustiça e preterição de direitos.
Na antiga organisação, ha um porteiro e uns continuos, a nova organisação não falla nem no porteiro, nem nos continuos; de modo que é natural perguntar por que lei ficam existindo aquelles logares, como vencem esses empregados não comprehendidos nos quadros da nova organisação?
E como se tudo isto não bastasse, sr. presidente, porque se carecia de mais um logar de primeiro official para as respectivas promoções de segundos officiaes e de amanuenses, passou-se a adido um official, sem que elle esteja comprehendido em disposição de lei alguma para ser collocado em similhante situação.
Tudo isto, sr. presidente, revela precipitação, ignorancia ou falta de attenção no que se faz, e que se traduz n'estes factos que acabo de apontar, apesar das extraordinarias gratificações abonadas por serviço extraordinario. (Apoiados.)
E tão extraordinarias são essas gratificações que, tendo ha perto de dois mezes instado pela remessa da respectiva nota, ainda até hoje cá não vieram; tal é o peso d'ellas que tanto custam a transportar até aqui! (Riso.)
Ora, sr. presidente, como senão fosse bastante augmentar os quadros da junta de credito publico, para servir os amigos, fazendo-se as promoções com manifesta injustiça e preterição de direitos legitimos e perfeitamente definidos, fez-se mais, quiz-se impor a reforma a alguns, que n'um caso se tornou effectiva.
Quando se deu aquelle extraordinario caso de apparecer na caixa geral de depositos um cheque falso, substituindo uns papeis de credito que serviam de caução a um emprestimo, quiz-se lançar a responsabilidade d'esta troca ao thesoureiro da caixa o sr. Cupertino, quando este funccionario apenas tinha confiados á sua guarda dinheiro ou notas, e nunca os titulos de qualquer especie que serviam para caucionar os emprestimos da caixa: o antigo thesoureiro desgostoso pediu a sua reforma.
Segundo a lei, o thesoureiro da caixa é nomeado pelo governo, sob proposta da junta; o a junta pondo de parte um antigo empregado o sr. Carlos Alberto Leite, que exercia as funcções do fiel na caixa de depositos, propoz o sr. José Peixoto do Almeida Sobrinho, primo do director da divida publica, e que exercia na junta o logar de fiel.
Diz-se, não sei se é verdade, que o sr. Alberto Leite se desgostou por tal maneira, que adoecera perdendo a rasão!
(Sensação.)
Abstenho-me de fazer quaesquer commentarios, por considerações de uma ordem especial, que por agora reservo para mim. Aprecie cada um como melhor ou peior lhe parecer estes casos, e veja-se como o nepotismo não hesita diante de consideração nem sentimento algum.
Parece que por um condão extraordinario, de alguns dos homens que se sentam n'aquellas cadeiras, são as personalidades que mais guerrearam, as que, depois no governo, mais têem rodeado de todas as considerações e de todas as attenções, como que penitenciando-se assim dos aggravos feitos, como se tivessem sido injustos ou exagerados.
É assim que o sr. conselheiro Barros e Sá que tivera do partido progressista quando opposição, uma guerra dura, accusando-o de dispor de todos os logares da administração publica em proveito dos parentes e dos adherentes, tem agora preponderância manifesta junto do sr. ministro da fazenda, para continuar collocando os mesmos parentes e adherentes, lá foi um primo para o logar de thesoureiro, deixando-se de parte o antigo fiel, que exercia as suas funcções com zêlo e cuidado! E o que é mais, é que se destina para o logar de fiel, que vae ser orçado pelo artigo 11.° do projecto em discussão, um servente da caixa Manuel Rollão Martins, que dizem foi em tempo creado do mesmo conselheiro Barros o Sá! Nomeiam-se por consequencia, parentes e adherentes a despeito das investidas antigas. É uma penitencia completa (Riso.-Apoiados.)
Agora vae a camara comprehender tambem por que rasão um dos nossos collegas, o sr. Julio Pires, faltando uma vez n'esta casa, e exaltando os merecimentos do sr. ministro da fazenda, merecimentos que eu não contesto, mas que não exalto, não só porque s. exa. dispensa os meus elogios, mas porque me não julgo com auctoridade para taes criticas, disse, que os louvores feitos não constituiam memorial para alguma pretensão que não tinha, que não devia favores a s. exa. e antes, pelo contrario; e s. exa. firmava esta declaração com todo o sentimento de justiça que lhe assistia, porque fóra maltratado um seu parente, um cunhado, por uma fórma injusta e immerecida.
Como a camara vê, a famosa promessa de redacção na despeza com os serviços da divida publica tem-se traduzido em reformas prematuras do pessoal, no alargamento dos quadros, e ainda dando-lhe addidos!
Antigamente gritava a opposição progressista, e eu acompanhava-a n'essa gritaria (Riso.) que os empregados publicos eram muitos, e que já havia dobradiças nas repartições. Agora as dobradiças são prohibidas por causa da questão de segurança no caso de incendio; (Riso.} mas ha bailéus. (Riso.) V. exa. não sabe talvez o que é um bailéu? Pois eu lh'o explico.
No tempo em que se fazia a escravatura, os navios levavam uma porção de madeira para lá fóra fazerem uma segunda coberta, de maneira que desdobrando, por assim dizer os pavimentos, accommodavam mais gente. O bailéu no caso sujeito são os addidos. (Riso.)

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Na organisação da repartição da divida publica, quando se trata dos addidos, diz-se:
(Leu.)
Havia um empregado que, sem pertencer a nenhuma d'estas agencias financiaes sem estar nas condições d'este artigo foi addido, e continuou fazendo serviço na junta, porque era necessario crear mais um logar para emfim chegar a mais um irmão da confraria, ou, digo, a mais um partidario dedicado. (Riso.}
Poder-me-hão responder que o facto do ser passado a addido foi por esse funccionario não sor bastante zeloso no serviço; mas no regulamento que trata do serviço interno da repartição da divida publica encontro lá apenas tres ordens de castigos - a admoestação, a suspensão e a demissão. Passar por correcção um empregado a addido, é castigo, mas para o contribuinte, que é quem paga a differença. (Riso-Apoiados.}
Parecerá que eu discuto a organisação actual da divida publica; mas, como v. exa. e a camara vêem, eu já liguei o que havia entre uma cousa e outra, demonstrando quaes as rasões de uma dedicação partidaria extrema, que determinaram a apresentação d'este projecto, tendo em vista radicar n'um logar perpetuo o logar de presidente da junta de credito publico que era amovivel, (Apoiados.) melhorar-lhe os vencimentos e os dos outros vogaes, e dar tambem um bolo ao director geral da contabilidade publica (Riso) pela sua dedicação ao actual regimen; (Apoiados.) fazendo pareceres da commissão do orçamento sem que a commissão saiba como: pelo menos eu não sei. (Riso).
Demonstrado, fica portanto, quanto ha de extraordinariamente espantoso, se é possivel a gente espantar-se já com alguma cousa, que se viesse trazer á camara um projecto que tem onze artigos, dos quaes apenas quatro é que têem um caracter de administração, sem nenhuma justificação de urgencia, nem de necessidade; (Apoiados.) sobretudo desde que de imperativa passa a ser facultativa a prescripção das misericordias, hospitaes e asylos depositarem na caixa geral de depositos todos os seus papeis de credito.
Quatro artigos serviram para mascarar sete, pouco habilmente, porque, sendo a mascara menor que o mascarado deixou ver as feições dos protegidos. (Apoiados.)
Em conclusão, este projecto traz um augmento de despeza superior a 4:000$000 réis por anno. . .
Uma voz: - Só?
O Orador: - O que se vê, ou o que eu vejo. (Apoiados.)
Quatro contos por anno sem rasão nenhuma de necessidade publica que o justifique.
Este projecto tem evidentemente por fim radicar era determinados logares individuos que tinham perdido esta situação, porque o parecer diz claramente, quando se refere ás funcções d'estes individuos, que, deixaram de ser accessorias ás da administração das duas referidas caixas ás que exerciam na junta.
Por consequencia, era necessario arranjar uma maneira de deixarem de ser accessorias para serem principaes. (Apoiados.)
E finalmente, este projecto serve, pelo artigo 11.°, para dar reparação a um acto não illegal, porque a junta tem o direito de propor o thesoureiro, mas injusto em relação ao individuo preterido, creando-lhe um logar do official na caixa onde já é fiel.
E se isto não é assim, então o governo e a commissão acceitarão uma proposta para que os empregados de que trata o artigo 11.° sejão nomeados por concurso, feito unicamente entre os empregados pertencentes á repartição respectiva. (Apoiados.)
Como creio que outros membros da oppssição poderão tratar d'este assumpto debaixo de outros pontos de vista e melhor do que eu, limito por aqui as considerações que tinha a fazer.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Baptista de Sousa: - Sr. presidente, embora o illustre deputado, que encetou este debate, o sr. Ferreira de Almeida, se servisse das palavras do relatorio, que precede o projecto que se discute, para favorecer o seu proposito de hostilisar o pensamento, que dictou o mesmo projecto, eu como relator sinto-me lisonjeado com a reproducção feita por s. exa., porque assim se mostrou, que a commissão de fazenda e eu em especial procedemos tão lealmente, com tanta sinceridade, sem intuitos reservados, que dissemos quanto aos illustres deputados da opposição convinha saber, expondo com franqueza, sem reticencias, o nosso pensar, e habilitando assim v. exa., como outros membros da minoria, a poderem discutir este projecto com perfeito conhecimento dos motivos que a commissão teve para o adoptar e julgar digno da approvação da camara. (Apoiados.)
Mas s. exa., lendo parte do relatorio, não só achou util para o seu proposito deixar no escuro alguns periodos ou passagens do mesmo relatorio, como tirou da parte que lêra consequencias ao sabor dos seus desejos, visto que se inscreveu contra o projecto c tinha de combatel-o.
Inculcou s. exa. que este projecto, conforme o proprio relatorio não occulta, obedece á necessidade, deixe-se-me assim exprimir, de emendar os defeitos, com que necessariamente ficara a instituição da junta de credito publico, depois da reforma do serviço da divida publica, por decreto de l5 de dezembro do anno passado.
Eu sou até um pouco mais claro, me parece, do que o illustre deputado, confessando que o projecto trata de aproveitar em beneficio ou melhoramento da administração das caixas geral do depositos e economica portugueza, e da responsabilidade do respectivo serviço, a actividade ou a força productiva dos vogaes da junta de credito publico, depois que por aquelle decreto foram reduzidas as suas funcções, ou passou para a nova direcção geral, que elle creou, o trabalho da omissão, inscripção, conversão, amortisação e averbamento dos titulos da divida publica.
Cerceadas, e muito bem, as attribuições da junta, ou antes transferidas para outra entidade, de modo a ser mais curial c mais harmonicamente organisado o serviço da divida publica, porque as exigencias de hoje não eram as mesmas a que attendêra a lei de 8 de junho de 1843, era de necessidade do bom governo, a qual s. exa. por mais que quiz não pôde contestar, regular melhor e assegurar nos seus resultados as funcções com que a junta ficava relativamente ás duas caixas.
S. exa. podia muito bem ter discutido em tempo a vantagem de se reformar o serviço da divida publica, para mostrar que não se deveria vir a promulgar o decreto de 15 de dezembro de 1887; mas depois d'elle ser um facto, e o parlamento haver dado auctorisação ao governo para proceder como procedeu, o illustre deputado não podia rasoavelmente contestar a necessidade de fundir em novos moidos a organisação e as funcções da junta do credito publico. (Apoiados.)
Mas s. exa. tratou de demonstrar que o serviço da divida publica foi organisado contrariamente ás promessas feitas pejo governo e até ás declarações ou preceitos consignados na lei de 29 de julho de 1887.
Permitta-me, porém, o illustre deputado lembrar-lhe que não tem relação alguma um assumpto com o outro.
S. exa., lendo o artigo 2.° d'essa lei, que obrigava o governo na reforma dos serviços de divida publica a reduzir as despezas, o ligando o projecto, que se discute, com tal artigo, concluiu que a promessa do governo não foi cumprida, que o preceito da lei não é observado, porque este projecto vem augmentar as despezas.
Mas que tem este projecto, que traia de reformar a administração da caixa geral de depositos e da caixa economica, com o diploma que organisou o serviço da divida publica?! (Apoiados.)
Pois a caixa geral de depositos e a caixa economica

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1198 DIABIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

desempenham funcções de serviço de divida publica? (Apoiados.)
Pois a lei organica da caixa geral de depositos de 10 de abril de 1876 e a da caixa economica de 26 de abril de 1880, e as leis posteriores de l de abril de 1880, 22 de março de 1881, e l de julho de 1885, ampliativas da primeira, e de 15 de julho, de 1885, ampliativa da segunda, dão a qualquer d'essas duas instituições economicas funcções de serviço da divida publica?! (Apoiados.)
Por fórma alguma. (Apoiados.)
Portanto, discutir ou apreciar se o governo, apresentando a proposta convertida no presente projecto, obedeceu ou não a um preceito consignado no artigo 2.º da lei de 29 de julho de 1887, é deslocar a questão. (Apoiados.)
Eu podia, sr. presidente, dispensar me de acceitar a controversia nos termos em que s. exa. a estabeleceu, se não fôra a consideração pessoal que lhe devo tributar, e a ponderação, sempre para attender, de augmento do despeza, em que s. exa. insistiu, e que calculou, segundo me parece, em 5:000$000 réis.
Esse facto tem importancia absoluta e o devo considerar, independentemente da falta de connexão entre o projecto e o disposto na lei de 29 de julho de 1887.
O augmento de despeza, porém, não monta áquella quantia.
S. exa. parece ter esquecido que os vogaes da junta do credito publico recebem hoje, cada um dos cinco, réis 1:000$000: 600$000 réis como vogaes da junta, a titulo de gratificação que lhe fôra dada já pela lei de 1843, que é propriamente a sua lei organica, e que lhe foi mantida pelo artigo 7.°, § 4.° do decreto de 15 do dezembro de 1887, e 400$000 reis tambem como gratificação concedida pelo artigo 87.° do decreto de 17 de agosto de 1881, pelo serviço da administração da caixa geral de depositos.
Posto isto, estabeleço-se no artigo 4.° do projecto, que o governador, apesar de ficar sendo membro e presidente da junta do credito publico, ficará tendo, por todas as suas funcções, sómente os proventos que lhe são aqui concedidos, e que os mais membros d'aquella junta, que são vogaes do conselho de administração e do conselho fiscal, deixarão de perceber a gratificação de 400$000 réis por anno pelo serviço da caixa geral de depositos.
Sendo assim, é facil de ver a quanto monta a despeza.
Pelo artigo 3.°, 2 1/2 por cento dos lucros annuaes da caixa são divididos igualmente entre o governador e os vogaes do conselho de administração, e l 1/2 entre o presidente e os vogaes do conselho fiscal.
Ora, calculando os lucros em 90:000$000 réis, como tambem fez o sr. Ferreira de Almeida, e embora com o reparo de que no orçamento eram computados em réis 88:700$000; e servindo-me, como digo no parecer em nome da commissão de fazenda, do relatorio da gerencia de 1885 a 1886, onde se affirma e mostra que os lucros são, em verdade, de cerca de 90:000$000 réis...
Uma voz: - Ha de ser de mais.
O Orador: - Isso é para outra questão, suponho bem. Tratando d'ella, poderia sustentar-se que, quer os lucros sejam superiores quer inferiores, o projecto é justo até por oppostas rasões, por mais singular e contradictorio que o caso pareça.
E direi até já, sr. presidente, porque me importa menos a unidade e ordem do discurso do que o esclarecimento prompto da verdade no aproveitamento de um incidente, que, consistindo a retribuição variavel dos dois conselhos n'uma percentagem dos lucros, a grandes ou pequenos lucros corresponderá reciproca e proporcionalmente maior ou menor trabalho, sem que, por certo, haja a esperar um maximo, que importe prodiga largueza, ou um minimo, que importe mesquinha dotação, ainda que alguma concorrencia venha a fazer ás caixas o banco emissor pelas operações que lhe permitte a lei, que o creou, de 29 de julho ultimo. (Apoiados.)
Acrescentarei, sr. presidenta, que, sendo bancarias as funcções desempenhadas pela caixa geral de depositos e economica, talvez não haja banco que, dando tanto proveito e trabalho, retribua com tão pouco os seus corpos gerentes. (Apoiados.)
Para avaliar o trabalho, cuidados e responsabilidade, lembre-se a camara de que n'um decendio incompleto, segundo o relatorio a que já alludi, a caixa geral de depositos arrecadou quantias superiores a 30.400:000$000 réis; effectuou operações de credito em importancia approximada de 12.000:000$000 íeis; pagou todos os seus encargos e capitalisou com 120:183$730 réis de juros de inscripções averbadas ao fundo de amortisação, lucros liquidos na importancia de 596:798$205 réis, que produziram em titulos do novo fundo de 3 por cento 1.177:850$000 réis, estando ao tempo por capitalisar a quantia de 81:000$000 réis, e tendo se a caixa installado nas ilhas adjacentes sómente em 2 de janeiro de 1886 por força do decreto de 21 de novembro de 1885. (Vozes: - Muito bom.)
Continuando agora, sr. presidente, na ordem do considerações, que interceptei por um desvio a que fui obrigado, reconheço, sim, que ha augmento de despeza, mas não no montante que lhe attribuiu o illustre deputado, que hoje abriu a discussão, e meu amigo, o sr. Ferreira de Almeida.
Até agora a despeza com o pessoal de administração era de 5:000$000 réis, como me parece já ter dito.
Pelo projecto, calculando-se cm 90:000$000 réis os lucros da caixa geral de depositos, sem attenção á economica, que tem vivido infelizmente de supprimentos, e de cujo phenomeno, como já diz o parecer, não é occasião de tratar, tendo aliás sido perficientemente apreciado no relatorio do projecto convertido na lei de 15 de julho de 1880, acontece que d'esses 90:000$000 réis os 4 por cento a distribuir, 2 l/2 pelo conselho de administração e l 1/2 pelo conselho fiscal, montam a 3:600$000 réis, sendo 2:250$000 réis para divisão igual entre os vogaes do primeiro e presidente ou governador, ou sejam 750$000 réis para cada um, e 1:350$000 réis para divisão por meio de senhas de presença entre os vogaes do segundo e seu presidente, ou sejam 450$000 réis para cada um, não se dando o caso de desigualdade.
Ha a acrescentar l:000$000 réis, ordenado de categoria do governador, que fica considerado director geral, excepto quanto a ordenado de exercicio, mas cujas funcções ficam tambem incessantes segundo o § unico do artigo 5.°, e mais quatro vezes 600$000 réis por se conservar a gratificação primitiva para os quatro vogaes da junta, eleitos dois pelas camaras legislativas e dois pelos juristas na fórma da legislação existente.
A despeza com os dois conselhos fica, pois, sendo de l:000$000 réis, mais 750$000 réis para o governador; réis 600$000, mais 750$000 réis para cada um dos dois vogaes do conselho de administração; de 450$000 réis para o presidente do conselho fiscal; e de 600$000 réis, mais 450$000 réis para cada um dos dois vogaes do conselho fiscal, o que tudo somma 7:000$000 réis.
E como a despeza até hoje era de 5:000$000 réis, segue-se que ha um augmento apenas de 2:000$000 réis, (Apoiados) menor em 50$000 réis do que o da proposta ministerial, e que terá compensação como direi.
O sr. Ferreira de Almeida: - Pedia licença ao illustre deputado para fazer uma observação. V. exa. diz que o augmento de despeza no conselho de administração é de 2:000$000 réis; mas pedia-lhe que attendesse ao que diz o artigo 11.°, em que se estabelece a creação de mais um logar de primeiro official, mais um fiel de thesoureiro, e a creação de oito empregados temporarios com o vencimento de 800 réis, por dia, o que tudo sommado dá um augmento de 5:000$000 réis.

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SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 1888 1199

O Orador: - Parecia-me melhor que o illustre deputado aguardasse as minhas observações a este respeito.
Fica assente que é de 2:000$000 réis sómente o excesso de despeza dos dois conselhos sobre a dotação actual dos cinco vogaes da junta de credito publico. (Apoiados.)
Mas pelo artigo ll.° do projecto e o quadro do pessoal das caixas augmentado com um logar de primeiro official, e, portanto, eu concordo ainda com o respectivo augmento de despeza, mas com mais nenhum creado pelo projecto.
É certo que a administração da caixa de depositos fica auctorisada a admittir mais um fiel de thesoureiro, e até oito empregados temporarios se precisar d'elles, não se lhe impondo a obrigação de gastar dinheiro com esse pessoal todos os dias, mas só nos dias de serviço util e effectivo. Devo ainda dizer que se o pessoal é preciso, então a despeza é justificadissima.
Quer houvesse quer não o projecto, se os empregados extraordinarios ou temporarios não podem ser dispensados, pelo serviço das caixas, a que estão ligados momentosos interesses do thesouro, de corporações publicas e particulares, exigirem pessoal alem do que está encartado e entra, no quadro legal, nenhum ministro deixaria de auctorisar a despeza, e nenhum parlamento deixaria de a approvar. (Apoiados.)
Agora se os empregados não forem precisos, então a administração não os nomeará, o a despeza não só fará, pois, na economia do projecto, dá-se a circumstancia de que quanto maior for o pessoal, menores serão os proventos para a administração e fiscalisação, por isso que esses proventos tem de sair dos lucros, depois de deduzidas as despezas, e nas despezas estão comprehendidos os ordenados dos empregados. (Apoiados.}
Ora como os conselhos de administração e fiscal, se pouparem despezas, augmentam lucros, e com elles a percentagem que lhes toca, o estimulo dos mesmos conselhos pelo lado do interesse monetario os impede naturalmente de nomear mais empregados. (Apoiados.)
Aqui está, sr. presidente, como o artigo 11,° não póde ser tomado em consideração para se argumentar com elle a favor do augmento de despeza, porque; ou o augmento d'ahi derivado é em qualquer caso inevitavel, ou não chega a effectuar-se, se realmente os empregados não são precisos. (Apoiados.)
Tratando geralmente do projecto, o sr. Ferreira de Almeida disse, que elle visava principalmente a favorecer amigos e apaniguados, porque o maior numero dos seus artigos respeitava ao pessoal (incluindo, aliás, n'esse numero artigos que tratam do exercicio das funcções) e só quatro artigos, para disfarçar o proposito do favor politico, que dictára a proposta e o projecto, é que respeitavam a actos de administração, que seriam uteis, mas que não eram urgentes: e assim s. exa. considera como primeiro dos artigos concernentes a actos de administração o artigo 5.° da proposta, e que é o 7.° do projecto, e diz que estabelece a applicação da lei civil commum para tornar prescriptiveis os juros ao cabo de cinco annos.
Devo observar que a lei civil não era aqui applicavel de modo algum, porque, se o fosse, s. exa. combateria muito bem a introducção d'este artigo no projecto por legislar o que já estava legislado.
Se se podesse applicar contra o credor do juros a prescripção de cinco annos, a começar desde que os mesmos juros fossem sendo successivamente exigiveis, como seria por direito commum, então os lucros da caixa geral de depositos seriam enormissímos, e essa machina de desamortisação da divida publica fundada adquiriria força prodigiosa. (Apoiados.)
S. exa. esqueceu-se de notar que o artigo diz, que a prescripção d'estes cinco annos começa a correr desde que for levantado o capital em deposito.
Embora d'este artigo não adviesse o proveito de l real para a caixa geral de depositos, com tudo a introducção d'elle no projecto era uma necessidade de boa administração.
Existe na caixa geral de depositos um grandissimo numero de pequenas contas de juros, correspondentes a depositos extinctos, porque o capital já foi levantado.
Essas contas embaraçam e complicam o serviço, e os juros permanecem ali verdadeiramente abandonados, porque, dependendo o levantamento do um precatorio judicial, visto não se permittirem lá depositos voluntarios de dinheiro, a despeza a fazer com elle era maior do que a importancia dos juros a levantar. (Apoiados.)
As dividas de deposito não são prescriptiveis pelas regras geraes de direito, porque ao detentor falta sempre a qualidade do possuidor em nome proprio, e por isso o artigo 7.° do projecto era indispensavel como excepção a consignar. (Apoiados.)
E se o fim immediato da proposta e projecto a este respeito foi antes o de simplificar o serviço do que o de procurar lucros, nem, por isso, é de desprezar este effeito, que felizmente se offerece de por si.
Segundo as informações, que obsequiosamente accedeu a prestar-me um distincto empregado superior da administração da caixa geral de depositos, talvez o augmento de despeza, a que dá logar este projecto, seja suficientemente compensado com o lucro derivado d'esta prescripção que se estabelece no artigo 7.° (Apoiados.)
Emquanto ao artigo 8.° disse s. exa., que era de pouca importancia, fazer da caixa geral de depositos corretor para comprar titulos da divida publica portugueza, acções e obrigações da companhia geral de credito predial e acções e obrigações do banco de Portugal, recebendo uma percentagem de l por milhar pelo encargo da compra, averbamento e remessa d'esses papeis de credito.
O que é certo, porém, é que cousa similhante estava já na nossa legislação, não para a caixa geral de depositos, mas para a caixa economica portugueza. Que rasão ha para não conceder á caixa geral de depositos aquillo que foi concedido á caixa economica portugueza, e que todavia já com manifesta vantagem de menores e interdictos a mesma caixa do depositos está tazendo a pedido judicial ?! (Apoiados.)
O artigo 37.° da carta de lei de 26 de abril de 1880 auctorisou qualquer depositante a exigir que a administração central da caixa economica se encarregue de converter a totalidade do credito d'elle ou uma fracção do seu credito liquidado, na parte em que a importancia d'essas quantias o permitta, em fundos publicos portuguezes; e o artigo 9.º da lei de 15 de julho de 1885 dispõe, que aquella faculdade concedida aos depositantes poderá tambem compreender as acções e obrigações de qualquer banco ou companhia nacional, bem como todos os titulos de credito omittidos pelo estado.
A providencia do projecto traz a vantagem da commissão para a caixa; concorre para manter alta a cotação dos fundos publicos, que é uma cousa importantissima, embora á opposição convenha por vezes dizer o contrario; e dá-se emprego a capitães quo de outra maneira estariam improductivos ou retirados do movimento economico do paiz. (Apoiados.)
(Interrupção.)
Nas provincias encontra se menos dinheiro do que em Lisboa, mas mais dinheiro sem applicação do que em Lisboa.
O sr. Franco Castello Branco: - É necessario ir buscal-o. (Riso.)
O Orador: - E porque não possa aproveitar a milhares de contos, mas apenas a centenares não se segue que não seja uma disposição util. Cada um de nós conhece na provincia pessoas com capitães estagnados ou fora da circulação. Alem d'isso, como o nobre ministro dá fazenda expõe no seu luminoso relatorio, como todos os seus escriptos, os bons resultados da proposta e projecto n'esta parte

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acham-se já demonstrados, sendo desnecessario reproduzir os factos, que ahi se lêem.
Emquanto ao artigo 9.° disso s. exa. que menor importancia ainda tinha, visto que a commissão tornou facultativa a disposição que na proposta do governo era obrigatoria.
V. exa., sr. presidente, e a camara hão de estar lembrados do que já por vezes se tem dito, antes da ordem do dia, a proposito da disposição que vinha consignada na proposta do governo, e das apprehensões e queixas que chegaram até ao parlamento, suppondo ou querendo suppor que todos os seus capitães ficariam entregues á guarda do estado, do qual desconfiavam mais do que dos seus thesoureiros.
Houve uma representação, que foi presente á commissão, da santa casa da misericordia da cidade do Porto, representação tão bem fundamentada, que foi por essa principalmente que o governo e a commissão conheceram varios motivos, que podiam ser adduzidos contra a disposição preceptiva da proposta, e que merecem toda a consideração.
Ha tambem outra representação, que tenho aqui, de uma irmandade de Braga. Essa, porém, é que ninguem de certo attenderia, nem da maioria, nem da opposição, porque só insurge contra a proposta, que tornava obrigatoria para todas as confrarias, irmandades, casas pias, hospitaes e mais estabelecimentos e corporações similhantes, o depositarem na caixa geral de depositos todos os seus valores em titulos de credito, bem como se insurge contra o projecto que deixou facultativa e não obrigatoria a disposição!
Diz a irmandade de Nossa Senhora a Branca, da cidade de Braga, na sua representação, que protesta contra a imposição do deposito em papeis de credito, porque similhante exigencia e sobremodo atentatoria do atreito das gentes! (Riso.) está aqui escripto com todas as lettras; e quo tambem protesta contra a simples permissão ou faculdade de depositos, porque admitte a possibilidade de vir a haver corporações administrativas, que pela sua ingenuidade entreguem esses capitães e se acobertem depois com essa lei, que as irresponsabilisa perante os interessados. (Riso.)
No mesmo caso, porém, não está a representação da santa casa da misericordia da cidade do Porto, e, embora abuse da paciencia da camara, devo referir-me a ella, para explicar um periodo do relatorio, que me estava a pesar não ter bastante clareza, como era do dever de lealdade, para com os illustres deputados que tivessem de discutir o projecto.
(Leu.)
Lembra-se a camara das rasões com que o sr. ministro da fazenda, no relatorio que precede a sua proposta, a defendêra na parte a que responde a representação.
Nas condições em que se encontra a santa casa da misericordia do Porto, e admittindo-se a possibilidade de ellas serem, ou outras similhantes, communs a outras corporações, reconheceu-se, como diz o parecer, que, sendo boa a providencia como regra, haveria necessidade de lhe fazer excepções consoante algumas circumstancias, que não eram susceptiveis da formula precisa de textos legislativos.
Por mim, pessoalmente, resolvi-mo logo a transigir com o proprio erro ou com a especulação politica que já se fazia no Minho, permittindo apenas, mas não coagindo as irmandades e outras corporações, em cuja administração superintenda o estado, a fazerem aquelles depositos.
Já se presta um beneficio com a mesma permissão, porque, como diz o parecer, é de esperar que, permittidos taes depositos, não deixem de os promover as administrações dos estabelecimentos, que não tenham proveito especial a oppor á vantagem, quando comprehendida sem suspeitas, da guarda, cobrança o vencimento do juros, que a proposta e o projecto lhes concedem. (Apoiados.)
Aqui está, sr. presidente, a explicação do artigo 9.°, que o illustre deputado sr. Ferreira de Almeida julgou de somenos importancia, mas que teve a bastante para até antes do projecto estar dado para ordem do dia haver por vezes occupado a attenção do parlamento.
Foi, porém, mister, como no parecer se reconheço, completar a disposição, depois de ter sido convertida de obrigatoria em facultativa; e a essa necessidade obrigava a legislação existente.
Pouco importava permittir a estas instituições de piedade e beneficencia, que confiassem á caixa geral de depositos a guarda e administração dos seus papeis de credito, se a caixa se recusasse a recebel-os, como muito bem podia fazer em vista da disposição do artigo 6.º da lei de 10 do abril de 1876, e da segunda parte do artigo 3.° do regulamento de 6 de dezembro do mesmo anno. Aquelle artigo 6.° da lei que, permittindo á caixa geral de depositos receber depositos em dinheiro com o juro de 2 por cento effectivo em titulos de divida consolidada, ou em quaesquer outros papeis de credito, que lhe fossem voluntariamente offerecidos por qualquer pessoa, corporação ou associação legalmente constituida, fôra assim uma tentativa para o estabelecimento de uma caixa economica com caracter official, parece que não chegou a ter execução alguma, e veiu a final, a ser expressamente revogado pelo artigo 45.° da lei de 26 de abril de 1880, que creou a caixa economica, salva a parte relativa aos depositos voluntarios em papeis de credito.
Era, portanto, preciso para a efficacia do beneficio dizer-se na lei, que, se o deposito dos papeis de credito era voluntario para a corporação depositante, não era voluntaria, como até aqui, mas obrigatorio para a caixa geral de depositos. (Apoiados.)
A esta vantagem, foi necessario acrescentar uma outra de não menos importancia, que consiste em prohibir á caixa, alem da recusa, a deducção do uma percentagem, o, titulo de commissão, de 1/2 por cento ao anno sobre a importancia dos juros ou dividendos, que competirem aos mesmos titulos, e que ella tinha direito e obrigação de fazer e de levantar em seu proveito, segundo tambem a legislação existente, ou cm conformidade com o § 6.° do artigo 6.° da lei do 10 de abril de 1876. Portanto, a disposição do projecto da commissão, alterando a proposta do governo, não teve só em vista converter em facultativo o que se propunha obrigatorio, com relação aos depositos dos titulos de credito das confrarias o estabelecimentos de beneficencia na caixa geral de depositos: acrescentou duas providencias sem as quaes ou a faculdade podia ser irrisoria ou a utilidade para os mesmos estabelecimentos viria a ser reduzida.
Com relação ao artigo 10.° não me lembro que fosse feito algum reparo, e a sua conveniencia por si mesmo se justifica.
Referiu-se o illustre deputado, sr. Ferreira de Almeida, á alteração feita pelo projecto sobre a maneira de constituir os dois conselhos de administração e fiscal, para pôr em relevo a differença, que se tornara sensivel, com respeito ao governador, a cujo cargo fica annexo o de presidente da junta de credito publico.
Effectivamente até hoje o presidente da junta era amovivel, assim como os outros vogaes da mesma junta, pois que, sendo o presidente escolhido pelo governo entre os cinco vogaes, incluindo aquelle que o proprio governo nomeia, todos elles, o nomeado, os dois que são eleitos pelas camaras e os dois que são eleitos pelos juristas, exerciam as suas funcções limitadas a certo tempo, embora podessem ser reconduzidos por quem respectivamente os investira nos cargos.
Pelo projecto o governador, sendo de livre nomeação do governo e tendo a categoria e mais vantagens dos directores geraes do ministerio da fazenda, excepto o vencimento de exercicio, fica, sem duvida, inamovivel.
E como o actual presidente da junta é o sr. conde de Restello, o illustre deputado foi assim levado a dizer, que

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o projecto tinha sobrescripto ou importava um favor áquelle cavalheiro e digno par do reino.
Sr. presidente, quando se cria alguma instituição publica, já de ordinario apparece a suspeição politica a proposito dos funccionarios a nomear, porque sem pessoal não póde fazer se o serviço correlativo. (Apoiados.}
A opposição acredita bem, que os nomeados não serão escolhidos no seu partido.
Se fosse possivel uma lei tão extravagante, que obrigasse o poder executivo a prover os empregos só era adversarios politicos, nenhum governo cairia pela lucta partidaria. (Riso.)
Muito maior é a suspeita, quando apenas se intenta a reforma de qualquer serviço.
E é até facil procurar n'essa suspeita motivos que na verdade das cousas faltariam para a impugnação.
Assim póde haver sempre assumpto de debate. (Apoiados.)
Mas, francamente, sr. presidente, não esperava que tal acontecesse agora, porque o actual presidente da junta do credito publico teve, é verdade, a primeira nomeação de um governo progressista, mas teve tambem uma segunda nomeação de um governo regenerador.
O sr. Franco Castello Branco: - Agora para se evitarem duvidas fica atarraxado. (Riso.)
O Orador: - Já as não havia, porque tal zelo e competencia mostrou no exercicio das suas funcções, que não lhe falta a confiança nem d'aquelles que o nomearam, nem d'aquelles que por nova nomeação o conservaram no cargo.
O sr. Frederico Arouca: - Mas, como parece que os, partidos augmentaram, não se sabe se continuará a merecer essa confiança.
O Orador: - Não sei se os partidos augmentaram. Isso é com s. ex.ªs (Apoiados.)

Sei, sim, que os dois ramos, em que se dividiu o partido regenerador, dizem que seguem as tradições do illustre estadista Fontes Pereira de Mello, cuja memoria e espirito a ambos preside, e que foi de um governo dirigido por Fontes Pereira de Mello, que o sr. conde de Restello teve a nomeação, que o conservou no cargo, para que anteriormente tinha sido nomeado, e que tem exercido a contento de todos, porque s. exa. embora progressista dedicado e valioso, vê no serviço publico sómente o interesse do paiz. (Apoiados.)
Por consequencia qualquer dos ramos, em que se dividiu o partido regenerador, repito, não póde deixar de acceitar como bom um facto, que está consagrado pelo justissimo assenso dos partidos monarchicos da politica militante.
Outro reparo pessoal fez o illustre deputado, o sr. Ferreira do Almeida, e é o que diz respeito ao presidente do conselho fiscal, o qual pelo projecto deve ser o sr. director geral da contabilidade publica.
Esqueceu-se s. exa. de ler a parte do relatorio que justifica esta disposição do projecto, que alterou a proposta do governo.
Diz assim o relatorio ou parecer:
«A sua inamobilidade (a do governador) é condição da sua independencia, que por suas funcções é especialmente util garantir perante os varios governos, que se succedam no poder. Igual proposito determinou a vossa commissão a ligar ás funcções de director geral da contabilidade publica a presidencia do conselho fiscal. Acresce ainda á conveniencia para o serviço de ficar existindo, quer na administração quer na fiscalisação, um elemento estavel, que, representando o poder central, imprima unidade aos trabalhos, e torne pela experiencia faceis e promptas as funcções e seguros, e efficazes os resultados.»
Se estas rasões não têem valor, o melhor seria talvez combatel-as, em vez de se lançar suspeição sobre os intentos d'esta parte do projecto sem se attender aos motivos francos e explicitamente expostos no relatorio. (Apoiados.)
D'este se vê, sr. presidente, que apenas se teve em vista melhorar ou aperfeiçoar um serviço publico, embora com elle se possa relacionar um interesse pessoal do sr. Carrilho, que, aliás, o não promoveu por modo algum. Mera coincidencia no momento, e que, de certo, por melindre nenhum devia frustar o melhoramento a fazer. Mais nada. (Apoiados.)
O illustre deputado, o sr. Carrilho, que não está presente, é hoje o director geral, e competentissimo, d'aquella repartição, mas póde não sel-o ámanhã. Ha de, pelo menos, vir um dia em que o não seja, porque todo o homem é mortal.
Quando o não for, ou nos seus impedimentos, o cargo de director geral da contabilidade publica, assim como o do presidente do conselho fiscal, ha de ser exercido por quem substituir o sr. Carrilho.
Eis a rasão por que o illustre deputado, a quem tenho a honra de responder, não vê n'este projecto, declarar-se com relação ao presidente do conselho fiscal, o mesmo que se declara com relação ao presidente do conselho de administração.
Para este o projecto diz que será seu substituto o vogal eleito pela camara dos senhores deputados, emquanto que para o outro nada diz, porque não é preciso, pois lá tem na ordem hierarchica, no quadro dos funccionarios a que pertence, quem o substitua.
Aquelle que por lei, o substituir, é o que por lei será presidente do conselho fiscal. (Apoiados.)
Ha, pois, motivos unica e absolutamente impessoaes para justificar a alteração que n'esta parte o projecto fez á proposta do governo.
Ligar n'este assumpto os factos com as pessoas é, embora em boa fé, sacrificar ao desejo do hostilisar a situação, aproveitando tudo que póde parecer servir de algum prestimo para o ataque.
O sr. Arroyo: - Isso é defeza.
O Orador: - Mas então, se o sr. Ferreira de Almeida é que defendeu o projecto, eu sento-me, porque nada tenho a fazer, se não é á sua argumentação, que tenho de dar resposta.
O illustre deputado não póde attender ao pensamento impessoal, a que o projecto obedece, entretido como estava a dar alimento á paixão politica.
Desculpar-me-ha agora o sr. Ferreira de Almeida, se eu não o acompanho no resto das considerações, que s. exa. apresentou á camara.
Para lhe mostrar a muita consideração que lhe presto, e que cumpri os deveres de cortezia escutando-o, vou mostrar, sr. presidente, que tomei nota das suas observações.
Eu ouvi-lhe fallar em varios empregados e n'outras pessoas, como por exemplo, os srs. Camara Leme, Leite e Julio Pires; ouvi-lhe fallar em certas relações de parentesco de consanguinidade e de affinidade, quando s. exa. informava a camara de que uns eram primos e outros cunhados; e ouvi-lhe fallar era gratificações, bailéus e addidos.
Ora o illustre deputado não terá certamente que estranhar, que eu não responda a esta parte do seu discurso, que seria talvez de muita vantagem antes da ordem do dia, ou ainda n'uma interpellação para pedir quaesquer explicações ao nobre ministro da fazenda, que, certamente as daria satisfactorias, sobre o modo porque têem sido providos os empregos, a que o sr. Ferreira de Almeida alludiu. (Apoiados)
A proposito d'este projecto, que eu tive a honra de relatar, parece-me que não têem taes considerações cabimento absolutamente algum.
De resto, eu até não tenho a honra de conhecer algumas das pessoas de quem s. exa. fallou, e nem eu nem a camara temos obrigação de conhecer os factos, de que a s. exa. approuve occupar-se. (Apoiados.)
Dito isto, tenho justificado, a meu ver, o projecto na sua

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generalidade, e defendido as disposições d'elle, a que mais directamente se referiu o illustre deputado, e meu amigo, o sr. Ferreira de Almeida. (Vozes:-Muito bem.)
O sr. Franco Castello Branco: - Mas qual é a rasão por que o governo pedia um segundo official, e v. exa. concede um primeiro?
O Orador: - Se v. exa. me perguntar até qual o motivo pelo qual se admitte a possibilidade da precisão de varios empregados temporarios, que sejam admittidos pela administração da caixa, digo, que não sei, e que apenas recebi informações n'esse sentido de quem pelo especial conhecimento do respectivo serviço m'as podia prestar com segurança.
O governo, por informações que recebeu depois da proposta apresentada, viu a conveniencia de ser nomeado um primeiro official em vez de um segundo.
Eu bem sei que, pela minha parte, a informação particular não é argumento que possa satisfazer, e por isso estava eu aqui a procurar entre os meus papeis um que tive o cuidado de trazer commigo, mas não encontro, para com boa auctoridade responder ao illustre deputado.
É um numero do Jornal do commercio, em que fazendo-se a apreciação da proposta de lei logo em seguida á sua apresentação, o articulista, que é conhecido muito bem de toda a opposição, e que o illustre deputado respeita como chefe, dizia, que por falta do conhecimento da vida intima da direcção da caixa geral de depositos e economica portugueza não podia com imparcialidade discutir se o alargamento do quadro do pessoal obedecia ou não a uma necessidade.
No mesmo caso estou eu, e estarão todos que não tenham interferencia immediata nas funcções que aquelle pessoal é chamado a desempenhar.
Acceito o facto, vindo de uma informação segura, porque foi o proprio sr. Pinto Basto, director da caixa, que viu a grandissima necessidade de augmentar o pessoal e a grandissima conveniencia d'esse pessoal ser extraordinario e temporario, como diz o projecto, e com vencimento fixo e igual para se desviar qualquer suspeita a que o contrario poderia dar logar.
Pessoal n'essas condições já tinha sido admittido na installação da caixa geral de depositos dando excellente resultado o seu serviço.
O sr. Franco Castello Branco: - Então foi o sr. Pinto Basto que lhe disse que era preciso?
O Orador: - Disse-me que era grande a necessidade de augmentar lá o pessoal.
O sr. Franco Castello Branco: - O que eu desejo é saber a rasão por que o governo pedia um segundo official e a commissão propõe um primeiro. O sr. Pinto Basto é que lhe disse que era preciso?
O Orador: - Disse-me em conferencia particular, que lhe pedi, e de que não sei bem se podia fazer uso aqui; (Vozes:- Póde. Póde.) mas de que me sirvo porque foi sobre serviço publico, embora em meu obsequio pessoal, e porque desejo condescender com o illustre deputado, que era, urgentissima a necessidade do augmento do pessoal e sobre tudo de um ajudante de thesoureiro, o que com relação a este eu tive ao tempo occasião de verificar por uma circumstancia casual.
(Interrupção do sr. Franco Castello Branco.)
Estas são as minhas informações particulares. O governo teve outras que o determinaram a apresentar o artigo 9.° da proposta, que depois, com accordo do mesmo governo, a commissão converteu no, em parte differente, artigo 11.° do projecto.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
Deu-se conta da ultima redacção dos projectos de lei n.ºs 254, 35 e 33.
O sr. Moraes Carvalho: - Impugna o projecto.
(O discurso será publicado em appendice a esta sessão, guando s. exa. o restituir.)
O sr. Presidente: - Acha-se nos corredores da camara o sr. Guerra Junqueiro. Convido os srs. Antonio Centeno e Antonio Maria de Carvalho a introduzil-o na sala, a fim de prestar juramento.
Foi introduzido e prestou juramento.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Redactor = S. Rego.

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