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1360 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

repetindo as palavras do filho pródigo, de que falia o evangelho: - Surgam, et ibo ad patrem meum, e depois na applicação e intelligencia dos princípios, tal como a igreja os considera, ella os acompanhará e mostrará então que é amiga do verdadeiro progresso, da civilisação e da liberdade.
E esta ultima proposição é de todo o ponto verdadeira. Vou proval-o, e condensando as minhas idéas, affirmarei que a igreja favorece, sustenta e vigorisa a rasão e as conquistas da sciencia, e os verdadeiros progressos de toda a verdadeira civilisação.
Accusa-se a igreja de que é inimiga da civilisação, porque é inimiga da sciencia, porque é inimiga do progresso e tambem da liberdade. Accusa-se a igreja de ser inimiga da civilisação, de perseguir e crear inimigos, quando a igreja tratou sempre de poupar o sangue aos seus inimigos I e dar aos sectários della o heróico alento de o derramarem puro e generoso. Sim, srs. deputados, puro e generoso, repito; porque puro e generoso é o sangue, com que se lançam os primeiros fundamentos dos povos, que mais tarde hão de figurar de um modo distinctissimo no mappa das nações civilisadas.
Sangue generoso e puro é aquelle que, caindo, gota a gota, sobre terra, por tanto tempo infecunda, veiu produzir mais tarde milhões de martyres, que eram outros tantos cidadãos úteis, obedecendo á lei e respeitando a auctoridade aqui e alem, onde a cruz fazia desapparecer o brilho das meias-luas musulmanas.
Haja vista ao que entre nós succedeu em 1145, de que é monumento augusto, uma epopeia escripta em mármore e granito, a igreja de Nossa Senhora dos Martyres, em Lisboa, e que eu tenho a honra de dirigir.
O sr. Costa Pinto: - E de que eu sou parochiano. (Riso.)
O Orador: - E por estes e outros factos que eu entendo que a igreja não póde deixar de ser respeitada e engrandecida. É por isto que eu desejo que se respeite a crença do povo portuguez, dos nossos constituintes, que aqui nos mandaram para tratar, não questões religiosas, mas outros assumptos, que nada toem com aquellas.
Diga-me o illustre deputado se póde porventura contestar-se que a universidade, a que o illustre deputado pertence, é uma instituição ecclesiastica protegida e alimentada pela igreja?
Quem creou outras universidades estabelecidas em paizes estrangeiros?
Póde o ilustre deputado negar que o pensamento da creação desses grandes centros do saber humano foi concepção puramente catholica realisada pelos Papas, pelo episcopado e clero catholico?
Quem proclamou a trindade de princípios, de que tanto se usa, e de que tanto se abusa - liberdade, igualdade e fraternidade?
Não respondo eu, mas responde por mim quem mais auctoridade tem, aquelle celebre escriptor, que se chama João Jacques Rosseau, insuspeito no que affirmar ácerca da igreja catholica. Sabe a camara o que elle diz? Leia-se a sua terceira carta na montanha, e lá verá o seguinte:
«Não sei por que attribuem á philosophia os princípios dessa bella moral de nossos livros; não, essa moral dulcíssima, esses grandes princípios, antes que fossem philosophicos, foram christãos, foram extrahidos do santo Evangelho. »
Pode porventura o illustre deputado deixar de admittir o que em phrase elegante disse Renan, que tambem não é suspeito de certo, e que, apesar de ser livre pensador, quando entrou para a academia franceza a occupar o logar vago pela morte de Cláudio Bernard, referindo-se às doutrinas do catholicismo affirmava «que não é permittido qualifical-as de estreitas, visto como n'ellas se tem achado á larga génios eminentes»?
Não commento. A camara julgará, e sobre este incidente nem mais uma palavra direi.
Antes de terminar desejo referir me a uma proposição aventada aqui pelo exímio estadista o sr. Júlio de Vilhena, quando proferiu o seu excellente discurso, a que já me referi.
Ha outros pontos d'esse discurso, que eu desejaria tratar, mas que em outra occasião farei, especialisando agora aquelle que foi apresentado por occasião do «aparte» feito por um distincto talento, parlamentar conhecido, e argumentador dos mais rigorosos, que eu conheço, o sr. Marcai Pacheco, único de todos os illustres deputados, que me acompanhou na ordem de idéas, que expuz á camara.
Quando o illustre deputado o sr. Júlio de Vilhena argumentava ácerca da não existência do placet na Itália, onde deviam ser conhecidas as intenções da igreja, dizia s. exa. «que lá havia o poder temporal a conquistar, e foi isto o que quiz conseguir Caveur, dando em troca o placet!»
Que desejará s. exa. que dêem em Portugal? Proceda-se a louvação, e nós compraremos esta regalia de ser livre a igreja no exercico de um direito, em que especialmente lucra o estado. Triste direito, triste princípio de ordem, e de administração publica este que póde trocar-se ou comprar-se!
A igreja, porém, não trocará nem venderá o que faz parte da sua vida, e é inherente á sua constituição.
Queria s. exa. a reforma do § 14.° do artigo 75.° da carta, visto que essa reforma tem a seu favor os grandes nomes dos deputados constituintes de 1820, e apresentando as restricções contidas nos diplomas, que conferiram o mandato áquelles, diz que lá se lhes impunha nada deliberar «que fosse menos liberal». Eu acceito o principio em toda a sua extensão. Applique-se ao caso sujeito, e a conclusão será a suppressão do § 14.° do artigo 75.° da carta constitucional, e então far-se-ha luz, que illumine os cidadãos portuguezes, que abrilhante os princípios de liberdade e que o sr. Júlio de Vilhena tanto exaltou no seio da representação nacional, e a reforma da carta conterá um principio, que abona a rectidão, a imparcialidade, a assistência do bom critério da escola liberal, ciando a cada instituição o exercido libérrimo dos direitos, que lhe são próprios.
Mas ha outra proposição, a que não posso deixar de referir-me. E aquella, em que se diz, que os bispos e padres são funccionarios públicos do estado.
Sabe o illustre deputado, que eu respeito os seus talentos, que admiro a sua illustração, que sou o primeiro a dar testemunho do seu alto merecimento; mas parece-me que a sua proposição envolve um erro de doutrina, que póde ser ao sabor das massas populares, mas que é uma opinião arrojada, porque os bispos não são commissarios de alta policia moral, nem as suas funcções se reduzem e limitam simplesmente a corresponder-se com o ministerio dos negócios ecclesiasticos e de justiça, a celebrarem pontificaes ou a baptisarem este ou aquelle principe.
Isto é muito, mas é pouco para a elevada missão, que os bispos têem de desempenhar.
Os bispos foram creados pela igreja para a mesma igreja; foram creados pela igreja para formarem e dirigirem as consciências dos povos nos principies do justo e do bom.
(Interrupção do sr. Correia Barata.)
Folgue o illustre deputado com este principio, porque eu tambem folgo de o manifestar bem alto.
É por esta rasão, que os bispos não podem ser demitti-dos; e não o podem ser, porque, apresar de ser, o Rei quem os escolhe, não é do Rei que elles recebem o seu poder; é de uma auctoridade estranha, e a elle superior. Um empregado publico podo demittir-se, um bispo não póde ser demittido, porque a investidura da sua auctoridade, sendo reconhecida pela lei, não é esta quem lha dá. Vem-lhe de Deus, e o bispo, que só julgasse dependente no espiritual de qualquer auctoridade humana, seria um impostor, e não