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SESSÃO DE 28 DE ABRIL DE 1885 1367

Discurso proferido pelo sr. deputado Avelino Calixto, na sessão de 27 de abril, e que devia ler-se a pag. 1331, col. 1.ª

O sr. Avelino Calixto: - Leio e mando para a mesa a minha proposta de emenda ao artigo 1.º do projecto, que diz o seguinte:
(Leu.)
Em poucas palavras desejo expor á camara as rasões que tive para apresentar esta emenda, que, afinal, segundo o espirito do artigo, e segundo a redacção do respectivo parecer, me parece deve entender simplesmente com a redacção da lei.
Ha duas affirmações claras n'este artigo.
1.ª Os pares e deputados são representantes da nação.
2.ª Não são representantes, nem do Rei, que os nomeia, nem dos circulos que os elegem.
Devo acreditar, que, nem da parte da commissão, nem dos auctores do projecto, houve a intenção de separar na lei o que racionalmente póde e deve andar ligado.
Vejo no respectivo parecer, quaes as rasões que levaram os auctores do projecto a redigir o artigo d'esta fórma, as quaes vou ler, para não ser accusado de menos leal, na exposição dos factos.
(Leu.)
Evidenceia-se, pois, que o pensamento do projecto, assim como a da commissão, é que effectivamente o deputado sendo apresentante desinteresses do seu circulo, deve primar no seu animo a consideração dos interesses geraes da nação. E agora, a proposito de uma duvida levantada pelo illustre deputado, o sr. Almeida Pinheiro, sobre se o deputado deve ser considerado representante da nação, só no exercicio das suas funcções, ou considerado individualmente e fóra d'esse exercicio, devo declarar, que me parece que o deputado é representante da nação de direito e facto no exercicio das suas funcções, e só de direito quando fôra d'ellas.
Não alongarei a discussão da emenda que apresento a este artigo, porque observo que o digno relator da commissão, que vejo presente, mostra conformar-se com o meu pensamento, ficando pois as divergencias reduzidas á simples redacção do artigo.
Para mim, sr. presidente, a efficacia e a magestade da lei fundam-se principalmente na bondade intrinseca dos seus principios que enuncia na clareza e nitidez das suas formulas.
As solemnidades externas que a tornam effectivas, se forem desacompanhadas d'aquelles requisitos intrinsecos, podem coagir o subdito, mas não insinuar-lhe a consciencia. D'aqui as naturaes resistencias, os subterfugios para illudir a sua applicação.
Este artigo em discussão apresenta pelo menos o defeito da fórma, o que é um perigo para a intelligencia da lei, e sua applicação aos factos.
Bem sei que quem ler o artigo primeiro do projectoi, e logo a parte respectiva do parecer, não resta duvida ácerca do pensamento da lei, mas como na constituição vae apenas inserido o artigo e não a parte do parecer, que commenta, é evidente que a simples leitura da lei levanta a duvida, o que é um defeito grave.
Na ultima parte d'este artigo de uma attenção absoluta de fórma negativa.
Ninguem ignora que todos os juizos de espirito se resolvem em affirmações, embora as fórmas de significação sejam ás vezes negativas.
Affirma-se grammaticalmente que os deputados não são representantes dos circulos que os desçam.
Devo dizer, que por esta fórma se carencia uma verdade e um principio que nem é justificado pelos principaes da sciencia moderna de direito publico, e muito menos póde ter verdade politica e effectiva.
A distincção entre os interesses geraes e locaes de um paiz é uma verdade verificada completamente na philosophia de direito, e na sciencia de direito e administrativo.
Se nem sempre, na pratica, é facil extremar bem os dois grupos pela enorme complexidade e solidariedade que os liga, é facto, que hoje, principalmente na ordem dos interesses geraes, muitas funcções estão devidamente classificadas n'esta categoria, e constituem o objectivo da centralisação governamental, assim como os interesses locaes pertencem á descentralisação administrativa.
Na gerencia da administração publica superior, a regra está em harmonisar os interesses geraes com os interesses das localidades.
Se um deputado não representa o seu circulo, como poderá legitimamente promover os interesses locaes, da satisfação dos quaes resulta o desenvolvimento geral?
Se no espirito do deputado deve primar a consideração do interesse geral, isto não é mais do que um salutar preceito, que todo o representante da nação deve impor-se, para harmonisar dois pensamentos, que jamais devem hostilisar-se.
Mas d'aqui a negar que o deputado represente o circulo que interessa, vae uma distancia incommensuravel.
E até esta camara caracterisa-se principalmente pelo elemento individual mais egoista, pertencendo principalmente á segunda camara o tornar effectivo o pensamento da unidade superior do interesse nacional.
E é tão palpitante esta verdade que ainda mesmo, que o preceito fosse imposto rigorosamente pela lei, não havia meio de a tornar effectiva. As cousas são o que são. O deputado continuaria sempre a representar o circulo que o elegeu, de que é procurador e protector nato, pelo facto de mandato.
Entendo, pois, que a redacção deve ser reformada, no sentido da minha emenda.
Por esta fórma a lei ficará mais clara.
Sr. presidente, as leis claras só podem prejudicar os que pretendem evitar o seu cumprimento ou sophismar-lhe o sentido.
E a este proposito aproveito a occasião para alludir a uma asserção n'esta casa, ha poucos dias pelo illustre deputado da maioria, o sr. Arroyo.
s. exa. defendendo a desnecessidade da reforma, a que se refere o artigo 8.º do projecto, allegava, que o ficar a lei mais clara não era argumento que convencesse, porquanto os jurisconsultos eram os primeiros a sophismar e obscurecer o sentido das leis mais claras.
Devo dizer, que uma affirmação d'estas, proferida solemnemente e com entono rhetorico, no seio da representação nacional, na qual estão representadas todas as classes de jurisconsultos, desde o mais humilde dos advogados, a que tenho a honra de pertencer, até ao mais humilde illustrado e integerrimo juiz, não póde ser ouvida sem protesto de uma classe, que assim vê o seu nome no pelourinho da execreção publica.
Devo dizer a v. exa. que ainda ha jurisconsultos n'este paiz, que não trocam a sua dignidade de homem de bem pelo sophisma da lei que póde datisfazer um capricho ou um sordido interesse. Ha ainda jurisconsultos, que respeitam e fazem respeitar a lei, como lhes cumpre, a despeito de quaesquer considerações.
Eu se fosse permittido chamar s. exa. a uma reconvenção, eu poderia mostrar-lhe e com exemplo da sua propria casa, que ha alguns jurisconsultos, que iniciam a sua vida juridica sophismando a lei e defendendo a sua propria violação.
Refiro-me á defeza do srtigo 8.º do projecto. Espero que todos os homens de bem, para honra da classe, me hão de acompanhar n'este protesto.