SESSÃO N.° 72 DE 6 DE MAIO DE 1896 1551
explosivos, a que os inglezes chamam bombas de grande capacidade explosiva!
Este navio de combate não está hoje, portanto, á altura das necessidades da guerra maritima.
Resta dizer que a guerra maritima tem hoje como factores essenciaes a força defensiva dos navios, a sua velocidade, o seu raio de acção e os seus meios de ataque, e o couraçado não tem velocidade, pois deita apenas 7 ou 8 milhas, não tem raio de acção, tem pouquissima capacidade para carvão; a sua artilheria é de grosso calibre, tem uma rasoavel couraça, mas faltam-lhe todos os aperfeiçoamentos modernos.
Estudando o projecto, tratei de ver quaes os navios que o governo vae agora adquirir com estes 2:800 contos de réis e os que se prepara para adquirir com os 6:200 contos de réis restantes do emprestimo de 9:000 contos de réis.
Pretende o governo adquirir uma marinha exclusivamente colonial, uma marinha exclusivamente de combate, ou ambas as cousas ao mesmo tempo?
O meio que eu tinha para fazer esta averiguação era estudar a proposta do sr. ministro e o relatorio da commissão de marinha.
Eu poderia, se quizesse crear embaraços, perguntar pelo parecer da commissão de fazenda, mas, não pergunto, não só porque não quero crear embaraços, mas porque, emfim, se a commissão não dou parecer sobre o projecto, como estrictamente devia, deu-o todavia sobre um outro que com elle se prende.
Poderia, com fundada rasão, baseando-me na letra e no espirito do regimento, oppor-me á discussão do projecto por não vir acompanhado do alludido parecer, mas não quero.
Vamos ver, porém, pelos relatorios do sr. ministro da marinha e do meu amigo o sr. Adolpho Pimentel, illustre relator da commissão de marinha, se o que só quer adquirir é uma marinha de combate ou uma marinha colonial.
Vamos primeiro ao relatorio do sr. ministro da marinha.
(O orador fez a leitura de varios periodos do relatorio, acompanhando-os de ligeiros commentarios que não foi possivel reproduzir.}
Este relatorio está muitissimo bem escripto, tem apenas um defeito (e não ha obra humana que não o tenha), não diz claramente se querem constituir uma marinha de combate ou uma marinha colonial.
Tambem não diz por que se prefere o typo Yoshino para cruzador, nem porque se pretendem duas canhoneiras torpedeiros typo Onix, e um rebocador de alto mar.
Tirado este defeito, o mais está primorosamente escripto. E não digo isto por ironia. Talvez eu fosse um pouco ironico na apreciação dos diversos periodos; mas, como estylo, o relatorio é primoroso, e por isso felicito o sr. ministro da marinha.
Então, como o relatorio do sr. ministro não me esclareceu nada sobre os motivos d'aquella especie de navios, voltei-me para o relatorio da commissão e disse, se elle é redigido por pessoa tão illustrada, e eu não quero fazer epigramma, e portanto não direi tão competente, porque o sr. relator é competente em muita cousa, mas em marinha de guerra, está como o nosso couraçado, o Pimpão, está em relação ás modernas construcções, o meu amigo o sr. Adolpho Pimentel, e a sua muita illustração vae dizer-me que marinha de guerra vamos nós construir com os 2:800 contos de réis proximos e os 6:200 contos de réis remotos, tudo em oiro, e que, se Deus quizer, ha de ser gasto tudo nos precisos termos do regulamento da lei de contabilidade publica.
Vamos a ver o que o sr. Adolpho Pimentel, no seu eloquentissimo relatorio, diz a este respeito. Fui ao relatorio e vi que elle diz: «que é necessario termos marinha de guerra», de accordo; «que os nossos marinheiros fizeram cousas valiosissimas em todos os tempos; e hão de continuar a fazer, tambem de accordo; «que temos importantes possessões na Asia, na Oceania e principalmente na Africa, e que apesar d'isso, somos a nação mais desprovida de forças navaes», corrente; «que - aqui parece-me que o sr. relator claudicou - la noblesse noblige»; porque os francezes dizem: noblesse oblige e não la noblesse oblige; (Riso.) «que temos obrigação de nos mostrar á altura das nossas heroicas e gloriosas tradições», muito bem, corrente, todos de accordo; «que não podemos rivalisar com as nações maritimas de primeira ordem, mas sempre podemos arranjar alguma cousa».
Agora segue-se uma phrase tão primorosamente escripta que peço licença para notal-a, porque raras vezes apparece um conceito tão levantado e escripto em tão primoroso portuguez. É o seguinte: «Se hoje já não dominamos os mares, como outr'ora, se já não podemos voltar a ser a primeira potencia naval do mundo», repare agora a camara: «como guando os cachopos e os recifes de receio e medo se faziam pequenos para não serem avistados das nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravettas, que, impavidas, sulcavam os mares, desafiando os ventos e as tempestades...»
Isto é muito bem pensado e muito bem escripto. Os cachopos a fazerem-se pequenos de medo para não serem avistados pelas nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravellas! Eu felicito o sr. relator, (Apoiados.} e devo dizer que em primores de rhetorica poucas cousas tenho visto como esta. Ha muitos relatorios que estão á altura d'este como idéas, mas como estylo, é de primeira ordem.
Mas, emfim «se já não podemos voltar a ser a primeira potencia naval do mundo, como quando os cachopos e os recifes do receio e medo só faziam pequenos para não serem avistados das nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravellas que, impavidas, sulcavam os mares, desafiando os ventos e as tempestades, devemos, comtudo, ter uma marinha de guerra que possa levar o prestigio da nossa bandeira e o auxilio dos nossos canhões ás nossas vastas e importantissimas colonias». N'isto está tudo do accordo, e eu tambem. Que «a armada portugueza depois de devidamente organisada, não pôde ter a louca pretensão de despertar receios».
Também é, infelizmente, uma triste verdade e bom é reconhecel-a, o que é mais do que o principio da sabedoria, é quasi o fim. Finalmente, a commissão «não duvida da vossa approvação á proposta do governo, porque igualmente não duvida do vosso patriotismo» e é verdade porque a camara é patriotica, tanto como o governo e a propria commissão. «Igualmente nada nos diz quanto aos typos de navios escolhidos, porque tal incumbencia melhor compete e mais convenientemente será desempenhada por uma commissão de technicos, parecendo á vossa commissão melhor e sobretudo mais prudente não determinar já no projecto quaes os typos escolhido». Mas, se é marinha de combate ou colonial, quaes as rasões porque se escolheram os typos a que se refere a commissão, isso é que ella não disse.
Se das palavras da commissão nada fiquei concluindo, ainda que seja fraca a agudeza do meu espirito, pela longa pratica parlamentar devo ter ao menos um tal ou qual discernimento para procurar nas disposições taxativas de um projecto, ou do relatorio que o precede, alguma elucidação sobre o ponto de vista que me interesse concluir. O sr. ministro da marinha propõe um cruzador typo Yoshino, navio protegido, de uma velocidade relativamente grande, armado com canhões de tiro rapido, portanto, não é um navio colonial.
É um navio que póde acudir a uma colonia em circumstancias apertadas, mas de estação, de serviço colonial, não é seguramente um cruzador d'esta especie. O que é, é um navio de combate, e tanto que o Yoshino, ou algum