1552 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
dos seus parentes proximos, na recente batalha do Yalu venceram os couraçados chineses.
Alem d'este propõe tambem o sr. ministro duas canhonhairas torpedeiros, typo Onyx, que não são nem podem ser navios coloniaes, como logo mostrarei á camara.
Eis em resumo as minhas rasões, que logo desenvolverei e apoiarei, não com a minha auctoridade, que é alheia ao assumpto, mas com a auctoridado do mais competente marinheiro dos tempos modernos.
A canhoneira typo Onyx é de 810 toneladas, pouco mais ou menos, e para adquirir uma velocidade de 19 ou 20 milhas e o raio de acção conveniente, tem de sacrificar á machina e ao alojamento do carvão todo o espaço disponivel, faltando-lhe, por consequencia, alojamentos para poder servir como navio colonial. Alem d'isso, sendo um navio do aço, não forrado do cobre, navegando nos mares tropicaes, como são os que banham a maior parte das nossas colonias, dentro em pouco estará impossibilitado de servir, pelo estado a que ficará reduzido o seu fundo.
Os navios indicados n'este projecto são, um cruzador typo Yoshino, navio do grande velocidade, de grande raio de acção, protegido com couraça de aço, com artilheria do tiro rapido, e as canhoneiras-torpedeiras typo Onyx, que não são, manifestamente, navios coloniaes. Logo, não sendo os primeiros elementos que vamos adquirir navios coloniaes, o ministerio da marinha o que quiz foi arranjar uma esquadra de combate, e quando fallo do ministerio da marinha, distingo o ministro, porque s. exa., que é um jurisconsulto distincto, um homem de talento, e a cujas qualidades eu presto homenagem, não é um navegador, nem pretende sel-o, e simplesmente só levou pelo quoelhe disseram as estações technicas. Não é, portanto, s. exa. quem eu hei de censurar nem combater.
Trata-se de um cruzador typo Yoshino, que é um navio de combato; do canhoneiras-torpedeiros, que são tambem navios de combate e que por modo nenhum são navios do navegação colonial; logo o que se vae começar a organisar é uma esquadra de guerra.
Vendo isto, disse commigo; vou para a camara dar uma batalha naval» contra o sr. ministro e o sr. relator e aqui vem dizer o motivo por que eu perdi o receio d'esta batalha.
Eu disse commigo, quando peguei no projecto: o relator é o sr. contra-almirante Ferreira Marques, que pelo seus relevantes serviços, patriotismo e conhecimentos d'este negocio, seguramente deve ter sido o escolhido para relatar o projecto, mas quando li o relatorio, comecei a desconfiar de que me enganara, porque o sr. Ferreira Marques foi sempre um distincto e valente official de marinha mas nunca me constou que tivesse qualidades de estylista. S. exa. é muito mais capaz do affrontar as furias do mar revolto e as balas inimigas do que o debater-se contra os escolhos da grammatica ou os recifes da rhetorica; portanto, disse commigo, o relatorio não é de s. exa., e chegando ao fim vi que não me enganei, que elle era do nosso estimado collega o sr. Adolpho Pimentel. Disse então com estes dois illustres nautas vou bem. O sr. ministro da marinha foi aos Açores algumas vezes, mas ou já foi mais longe, já passei o Guardafui e o cabo da Boa Esperança; o sr. Adolpho Pimentel creio que tem navegado muitas vezes no caminho de ferro para o Porto e Braga.
O sr. João Arroyo: - Já foi a Cacilhas.
O Orador: - Ainda n'esse caso eu lhe levo vantagem porque vou quasi todas as semanas ao Barreiro, que é um pouco mais longe, ainda que viajar em caminhos de ferro portuguezes não é menos perigoso do que dobrar o cabo dos Aromas.
Com estes dois illustres nautas, disse eu, vou dar um batalha naval em regra, mas unicamente ha de ser simulada, porque somos amigos e é conveniente que não haja destroços de navios, agonisantes que gemam, feridos que gritem, nem o estridor de balas verdadeiras. Para dar a batalha naval precisâmos definir os campos.
Como nos combates da esquadra azul contra a esquadra vermelha, na Inglaterra, nas manobras que todos os annos se realisam no mar do norte, onde ha sempre um jury composto de um presidente, almirante, e tres ou quatro vogaes, contra-almirantes, que decide e aprecia os resultados obtidos n'aquellas manobras; como n'essas batalhas, em que, embora não haja feridos, ha comtudo vigor a vida; como n'esses combates, lembrei-me, naturalmente, de tambem dar uma batalha naval tomando o sr. contra-almirante Ferreira Marques, para occupar o logar de presidente do jury e os seus collegas da commissão para e de vogaes, que n'este caso ficam sendo os taes quatro contra-almirantes. (Riso.}
É perante elles que vou dar a minha batalha naval o portem-se v. exa. como só portarem, tenho a convicção de que fico vencedor.
Eu com isto estou a ver mas é se defendo, quanto posso, os 2:800 contos, que vejo tão perdidos, como só fossem para o fundo do mar. Defendo-os o melhor que posso, porque se é mau não ter esquadra, ainda é peior gastar-se dinheiro em esquadras que não ficam, e depois não ter dinheiro para comprar esquadras que devem ficar, porque se gastou mal quando o havia.
Vamos então a ver, primeiro, se este projecto corresponde, ao monos, ao pensamento inicial de se adquirir uma esquadra de guerra, que se não poder impor-se ás primeiras potencias maritimas, pelo menos, nos permitta sustentar o nosso logar no concerto ou desconcerto, como quizerem, das potencias europêas, e depois, veremos só precisando-se de uma esquadra de guerra, os navios que por este projecto se vão adquirir satisfazem ás condições necessarias para serem ao menos o inicio de uma esquadra de guerra.
Agora, peço ao meu illustre amigo o sr. contra-almirante Ferreira Marques, que vá vendo como ponho a minha esquadra em linha de ataque e como faço uso da minha estrategia.
Note s. exa. que do uso de uma estrategia habil, resultam brilhantes victorias. Não viu s. exa., á ultima hora, como ella produziu aquelles embaraços na questão do caminho de ferro do Pungue? Não viu s. exa. como ella deixou o sr. ministro dos estrangeiros desnorteado? S. exa. verá se tenho rasão ou não.
V. exa. permittir-me-ha que me dirija algumas vezes ao sr. contra-almirante Ferreira Marques, não só porque me dirijo ao meu juiz, como pela muita consideração o respeito que s. exa. me merece pelo seu caracter honrado e pelos seus serviços ao paiz. Permitta-me, pois, v. exa. que faça a côrte ao meu juiz. (Riso.} Eu não estou a dizer nada que assim não seja, e não quero tomar tempo á camara, só não contava-lhe agora uma anecdota.
Vozes: - Conte, conte.
O Orador: - V. exa. instam, então lá vae.
As galerias não estão esmaltadas de senhoras, por isso conto.
Ha um nosso antigo collega, que é muito dado ao culto das damas. Já não esta, porém, no verdor dos annos, em que nós tudo sacrificâmos, os mais caros interesses, muitas vezes até a seriedade, para grangear o agrado das damas; por isso quando elle quer fazer a côrte a uma dama, faz com que algum amigo seu diga a essa dama por meios ardilosos que o pretendente tem ordens sacras, que não usa d'ellas, mas que as tomou em tempo. O pretendente põe-se do alcatéa, e se lhe perguntam se é certo elle ter ordens sacras, não desmente ou desmente fracamente, de maneira que não dá a entender que sim nem que não. D'isto conclue: se a dama continua a dar-me attenção vou em bom caminho, se me volta as costas desdenhosa, escuso de perder mais tempo. (Riso.)
Ora, ou espero que a minha côrte ao nosso illustre collega o sr. Ferreira Marques seja pelo menos tão feliz como