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N.º 72

SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1896

Presidencia do exmo. Sr. Antonio José da Costa Santos

Secretarios - Os exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Eduardo Simões Baião

SUMMARIO

Approvada a acta, tiveram segunda leitura dois projectos de lei. - Os srs. presidente, Mello e Sousa e Manuel Vargas participaram ter lançado alguns requerimentos na caixa de petições. - Os srs. Mello e Sousa, Côrte Real, Barbosa de Mendonça, Sousa Avides, Santos Viegas e Marianno de Carvalho mandaram para a mesa representações. - O sr. ministro dos negocios estrangeiros apresentou uma proposta do lei, o sr. Sousa Avidos um projecto de lei e os srs. Teixeira de Sousa, e Marianno do Carvalho pareceres. - Foram approvadas duas propostas, uma apresentada pelo sr. Teixeira de Sousa e outra pelo sr. Marianno do Carvalho. Igualmente foram approvados dois pareceres, um apresentado pelo sr. Baião e outro pelo sr. Boavida, e com dispensa do regimento o projecto n.º 57. - Prestou juramento, como deputado, o sr. Wenceslau de Lima. - O sr. Marianno do Carvalho trocou explicações com o sr. ministro dos negocios estrangeiros ácerca do caminho de ferro do Pungue.

Na ordem do dia entrou em discussão, e foi approvado, depois de usarem da palavra os srs. Marianno do Carvalho e ministro da marinha, o projecto de lei n.º 108. Igualmente foi approvado o projecto de lei n.º 98, depois de trocadas breves explicações entre os srs. Marianno de Carvalho e Magalhães Lima, e ficou pendente o projecto de lei n.º 125, tendo usado da palavra sobre elle o sr. João Arroyo.

Abertura da sessão - As duas horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada, 51 srs. deputados. São os seguintes: - Aarão Ferreira de Lacerda, Adolpho da Cunha Pimentel, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Adriano da Costa, Antonio de Almeida Coelho de Campos, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio d'Azevedo Castello Branco, Antonio Barbosa de Mendonça, Antonio de Castro Pereira Côrte Real, Antonio Hygino Salgado de Araujo, Antonio José Boavida, Antonio José da Costa Santos, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Antonio Velloso da Cruz, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Conde de Anadia, Conde de Pinhel, Diogo de Macedo, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jayme de Magalhães Lima, João Lopes Carneiro de Moura, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Rodrigues Ribeiro, José Adolpho de Mello e Sousa, José Eduardo Simões Baião, José Freire Lobo do Amaral, José Gil Borja Macedo e Menezes (D.), José Teixeira Gomes, Julio Cesar Cau da Costa, Luiz Maria Pinto do Soveral, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel de Bivar Weinholtz, Manuel Bravo Gomes, Manuel Francisco Vargas, Manuel Joaquim Fratel, Manuel José de Oliveira Guimarães, Manuel Pedro Guedes, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Polycarpo Pecquel Ferreira dos Anjos, Quirino Avelino de Jesus, Romano Santa Clara Gomes, Theodoro Ferreira Pinto Basto, Thomas Victor da Costa Sequeira, Visconde do Banho e Visconde da Idanha.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Agostinho Lucio e Silva, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio José Lopes Navarro, Carlos de Almeida Braga, Conde de Villar Secco, Eduardo Augusto Ribeiro Canal, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Rangel de Lima, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Faculto José Maria do Couto, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jayme Arthur da Costa Pinto, Jeronymo Osorio de Castro Cabral e Albuquerque, João Ferreira Franco Pinto Castello-Branco, João José Pereira Charula, João Marcellino Arroyo, Joaquim do Espirito Santo Lima, José Coelho Serra, José Dias Ferreira, José Joaquim Aguas, José Joaquim Dias Gallas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Gomes da Silva Pinheiro, José dos Santos Pereira Jardim, Licinio Pinto Leite, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz de Mello Correia Pereira Medello, Manuel Joaquim Ferreira Marques, Visconde do Ervedal da Beira, Visconde de Palma de Almeida, Visconde de Tinalhas e Wenceslau de Sousa Pereira de Lima.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Augusto da Madureira Beça, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alfredo de Moraes Carvalho, Antonio Candido da Costa, Augusto Dias Dantas da Gama, Augusto Victor dos Santos, Bernardino Camillo Cincinnato da Costa, Conde de Tavarede, Conde de Valle Flor, Diogo José Cabral, Francisco José Patricio, Ignacio José Franco, João Alves Bebiano, João Maria Correia Ayres de Campos, João da Mota Gomes, Joaquim José de Figueiredo Leal, José Antonio Lopes Coelho, José Bento Ferreira de Almeida, José Correia de Barros, José Marcellino de Sá Vargas, José Mendes Lima, José Pereira da Cunha da Silveira e Sousa Junior, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luís Filippe de Castro (D.), Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Luiz de Sampaio Torres Fevereiro, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Visconde de Leite Perry e Visconde de Nandufe.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Participo á camara que me foram remettidos, e deitei na caixa de petições, quatorze requerimentos de officiaes do exercito, pedindo que o limite de idade para a reforma seja reduzido de trinta e cinco a trinta annos.

Consta-me que está nos corredores da sala, para prestar juramento, o sr. Wenceslau de Lima.

Convido os srs. deputados Adolpho Pimentel e Pereira e Cunha a introduzirem-n'o na sala.

Foi introduzido, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Presidente: - Participo á camara que a commissão de redacção não fez alteração alguma aos projectos de lei n.ºs 92, 108 e 122.

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1540 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

EXPEDIENTE

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - A camara municipal de Villa Real de Santo Antonio celebrou em 7 de agosto do 1885 um contrato de illuminação a gaz para a mesma villa, no sentido de dotar a capital do municipio com um melhoramento material, por todos os municipes julgado indispensavel e vantajoso ás necessidades publicas e locaes.

Entre as condições d'esse contrato encontra-se uma, a 17.ª, pela qual a camara municipal se obriga a requerer ao parlamento a necessaria auctorisação para que os materiaes importados do estrangeiro, precisos para a installação da fabrica do illuminação a gaz, passou isentos dos direitos de entrada a que são obrigados pela legislação vigente. Em virtude da referida condição foram, pela companhia concessionaria, importados os materiaes indispensaveis á installação da fabrica, ficando garantidos os respectivos direitos com fiança prestada nos annos de 1886 e 1887 na delegação aduaneira de Villa Real de Santo Antonio por Sebastião Ramires.

A camara dos senhores deputados dirigiu a camara de Villa Real uma representação documentada, pedindo para que a companhia outorgante seja relevada do pagamento de direitos dos materiaes importados, concessão que o parlamento tem auctorisado em casos iguaes, não só em annos anteriores, mas já n'esta legislatura.

Parecendo-me de toda a justiça que a representação municipal seja attendida no seu requerimento, tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação, esperando merecer a vossa approvação, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisado o governo a conceder a isenção de direitos de entrada de todo o material destinado á installação da illuminação a gaz para Villa Real de Santo Antonio, em virtude do contrato celebrado entre a camara municipal da mesma villa e os concessionarios Centeno, Gomes & C.ª

§ 1.° Esta isenção é exclusivamente applicavel aos materiaes, importados e caucionados com fiança, com destino e applicação á montagem e installação da fabrica de illuminação a gaz.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 2 de maio de 1896. = O deputado pelo Algarve, Agostinho Lucio.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - O decreto n.° 2, de l de dezembro de 1892, pelo qual foi reorganisado o quadro geral do pessoal technico dos serviços de obras publicas e minas, posto que inspirado nos melhores preceitos da technica geral dos referidos serviços, e ainda mais nas condições economicas da occasião e boas normas administrativas, é certo que no seu exercicio tem mostrado a necessidade de ser modificado n'algumas disposições dispersas pelos seus artigos o paragraphos. E como aquelle diploma é uma consequencia lpgica das largas auctorisações concedidas ao governo pela lei chamada do salvação publica, a de 26 de fevereiro do 1896, e, como tal, lei do paiz, por isso tenho a honra de submetter á vossa sabia consideração o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É alterado o decreto n.° 2, de l de dezembro de 1892, pelo qual foram reorganisados os serviços technicos de obras publicas o minas, segundo as bases annexas a esta lei e que d'ella fazem parte.

Art. 2.° É o governo auctorisado a formular um só diploma, introduzindo no citado decreto n.° 2; de l de dezembro de 1892, as modificações que constem das bases d'esta lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 4 de maio de 1896. = Adriano Monteiro.

Lido na mesa, foi admittido e enviado a commissão de obras publicas.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Sr. presidente, mando para a mesa uma proposta de lei approvando, a fim de ser ratificada, a convenção, assignada em Lisboa a 7 de dezembro de 1894, entre Portugal e a França para o estabelecimento de communicações telegraphicas entre os estações europêas do Oceano Indico, do canal de Moçambique e a ilha de Madagascar, assim como o protocollo addicional á dita convenção, assignada na mesma capital a 28 de abril de 1896.

Foi enviada á commissão de negocios externos e internacionaes, e a publicar no Diario do governo.

O sr. Mello e Sousa: - Mando para a mesa uma representação de cambistas e negociantes de papeis ou titulos de credito n'esta praça, pedindo que sejam promulgadas as disposições legislativos necessarias para que o beneficio, estatuido no artigo 534.° do codigo civil, seja extensivo aos que fazem commercio habitual de compra e venda do titulos ou papeis de credito ao portador.

Aproveito a occasião de estar com a palavra para declarar a v. exa. que lancei na caixa um requerimento documentado do juiz de direito de 1.ª classe, em commissão no contencioso fiscal junto á alfandega de Lisboa, José da Cunha d'Eça Azevedo, pedindo que lhe seja abonado o terço desde que completou os vinte annos de serviço.

Como me parece de toda a justiça esta pretensão, espero que a commissão, a que ella for submettida, estudado o assumpto, dê parecer favoravel, por isso que, pelos documentos juntos, está provada a legalidade do pedido.

A representação vae publicada, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Côrte Real: - Mando para a mesa uma representação da associação dos operarios chapeleiros de S. João da Madeira, pedindo uma lei de protecção para a industria da chapeleria, em que o governo fique auctorisado a decretar providencias conducentes ao mesmo fim.

N'este centro fabril trabalham ordinariamente cerca de 1:200 operarios, e quem ler esta representação não poderá deixar de contristar-se com a situação affictiva em que elles se encontram.

Espero, pois, que a camara, e o governo tomem na devida consideração o pedido feito por estes operarios.

A representação vae publicada, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Barbosa de Mendonça: - Mando para a mesa uma representação do syndicato agricola de Felgueiras, solicitando toda a protecção para o fabrico e venda da aguardente de vinho n'este anno.

Não me parece necessario encarecer a importancia do assumpto, porque o governo e a camara conhecem perfeitamente o estado precario dos lavradores que, não tendo podido vender os seus vinhos, forçosamente os têem de destinar á caldeira.

Mando tambem uma representação da camara de Felgueiras, pedindo sejam modificadas algumas das disposições do regulamento dos serviços hydraulicos.

As representações vão publicadas, por extracto, no fim da sessão.

O sr. Simões Baião (por parte da commissão de legislação civil): - Mando para a mesa o parecer da mesma commissão sobre um additamento feito na camara dos dignos pares á proposição de lei enviada d'esta camara, que só refere a casas arrendados a mezes,

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SESSÃO N.° 72 DE 5 DE MAIO DE 1896 1541

Como o additamento não altera em nada a essencia do projecto, a commissão concordou com elle.

Peço a v. exa. se digne de consultar a camara sobre se dispensa o regimento a fim d'este parecer entrar immediatamente em discussão.

Assim se resolveu e é lido o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 129

Senhores: - As vossas commissões de fazenda e legislação civil reunidas examinaram attentamente o additamento feito pela camara dos dignos pares do reino no projecto de lei n.° 54, approvado por esta camara, e que tende a regular o processo nas acções do despejo de predios urbanos arrendados por periodo inferior a seis mezes, e attendendo a que aquelle additamento tem apenas em vista introduzir n'aquelle projecto disposições justas relativas ao pagamento de contribuição de renda de casas, são de parecer que deve ser approvado o referido projecto de lei com o additamento mencionado, para assim subir á sancção regia.

Sala das sessões, 5 de maio de 1896. = Visconde de Ervedal da Beira = Adolpho Pimentel = José Teixeira Gomes = C. Mancada = Victor dos Santos - Motta Veiga = L. Monteiro = Barbosa de Mendonça = José Gallas == Marianno de Carvalho = Visconde do Banho = Jayme de M. Lima = José Lobo = Polycarpo Anjos = Teixeira de Vascencellos = M. Fratel = Teixeira de Sousa = Simões Baião.

Projecto de lei n.° 60

Artigo 1.° No processo de despejo de predios urbanos arrendados por mez ou por um periodo de mezes inferior a seis, observar-se-hão as disposições da presente lei, e, nos casos não prevenidos por ella, recorrer-se-ha ás disposições correlativas do codigo do processo civil.

§ unico. As mesmas disposições se observarão quando o arrendamento for por um periodo de seis a doze mezes, mas o seu preço não exceder a quantia do 50$000 réis, mantendo-se todavia, n'este caso, as disposições dos artigos 1625.° e 1626.° do codigo civil.

Art. 2.° O senhorio que não queira a renovação do contrato avisará, por si ou por seu procurador, na presença de testemunhas, o arrendatario para pôr escriptos seis dias antes de findar o praso do arrendamento.

Art. 3.° O arrendatario, a quem não tiver sido feito o aviso a que se refere o artigo antecedente, e quizer a renovação do arrendamento, será obrigado a pagar a renda correspondente ao contrato renovado no mesmo praso de seis dias indicado n'aquelle artigo, salvo estipulação em contrario.

Art. 4.° O arrendatario, a quem tiver sido feito o aviso a que se refere o artigo 2.°, será obrigado a pôr escriptos no praso indicado no mesmo artigo.

Art. 5.° Se o arrendatario não pagar a renda ou não pozer escriptos, nos termos dos artigos 3.° e 4.°, o senhorio, por meio de requerimento assignado por si ou por seu procurador, fal-o-ha citar, para que effectue o despejo até ao ultimo dia do arrendamento.

§ 1.° No requerimento indicará o requerente as testemunhas para prova da sua allegação, não podendo exceder o numero de tres.

§ 2.° O juiz de direito da comarca ou vara onde for situado o predio, que será o competente para conhecer da causa, mandará logo por seu despacho proceder á citação, designando no mesmo despacho o cartorio por onde esta deve correr sem dependencia de provia distribuição.

§ 3.° A citação será feita no praso de vinte e quatro horas a contar do despacho que a tiver ordenado, e verificar-se-ha na pessoa do arrendatario, ou de qualquer familiar, ou ainda na de algum vizinho, quando aquelles estejam ausentes ou não sejam encontrados, affixando-se n'este caso uma nota da citação na porta do predio arrendado.

Art. 6.° A citação não será accusada em audiencia, e se o arrendatario não deduzir qualquer opposição ao desejo, no praso de vinte e quatro horas, a contar da citação, observar-se-ha o disposto no artigo 499.° § 3.° do codigo do processo civil.

§ 1.° No caso contrario, será a opposição deduzida por meio de simples requerimento, que será apresentado pela parte, ou seu procurador, no cartorio do escrivão, e junto aos autos, independentemente de despacho, com quaesquer
documentos que se exhibam e com o rol das testemunhas em numero não excedente ao fixado no § 1.º do artigo anterior.

§ 2.° Quando a opposição se fundar no pagamento da renda só poderá provar-se com o recibo do senhorio.

Art. 7.° Pelas onze horas da manhã do dia seguinte, ou do immediato, se aquelle for santificado, proceder-se-ha ao julgamento da causa, independentemente de quaesquer intimações, comprehendidas as das testemunhas, que as artes deverão apresentar n'aquelle acto.

Art. 8.° O juiz, depois de examinadas as provas, decidirá verbalmente, condemnando, ou absolvendo, em conformidade com ellas e com o direito applicavel.

Do tudo se formará um auto, em que resumidamente se declare o objecto do pedido, os nomes das partes e a decisão do juiz, escrevendo-se n'elle, por extracto, os depoimentos das testemunhas, se as partes não prescindirem do recurso.

§ unico. Este auto servirá de sentença para todos os effeitos.

Art. 9.° O senhorio que requerer o despejo do predio com o fundamento na falta de pagamento da renda, e que for vencido na causa, será considerado litigante de má fé, condemnado em multa de quantia igual á renda do mesmo predio correspondente a um mez, e bem assim na indemnisação de que falla o artigo 126.° do codigo do processo civil.

§ unico. Na mesma pena será condemnado o arrendatario que se oppozer ao despejo, quando seja considerado litigante de má fé.

Art. 10.° Confessado ou julgado o despejo, deverá o arrendatario despejar o predio no dia em que termine o arrendamento, e, se o não fizer, proceder-se-ha ao despejo por mandado do juiz, observando-se, na parte applicavel, as disposições dos artigos 504.° e 505.° do codigo do processo civil.

§ unico. No caso do doença grave do arrendatario ou de alguma pessoa de familia, comprovada por attestado de medico, jurado e reconhecido, sobreestar-se-ha no despejo pelo tempo que o medico indique ser indispensavel para que não perigue com a mudança a vida da pessoa enferma.

Art. 11.° O arrendatario a quem não convenha a renovação do contrato, será obrigado a pôr escriptos no mesmo praso de seis dias indicado o artigo 2.° d'esta lei.

§ unico. Se o arrendatario, tendo posto escriptos no caso d'este artigo, não despejar o predio no dia em que findar o arrendamento, proceder-se ha nos termos do artigo 502.° do codigo do processo civil, e tanto n'este caso como no do artigo 10.° a ordem de despejo será cumprida no improrogavel praso de vinte o quatro horas.

Art. 12.° O processo a que se refere a presente lei póde instaurar-se e proseguir em todos os seus termos durante as ferias e nos dias feriados que não forem santificados.

Art. 13.° Pela presidencia ao auto a que se refere o artigo 8.°, inquerito de testemunhas e respectivo julgamento levarão os juizes de direito 800 réis, igual quantia o escrivão, e metade o official de diligencias.

Aos restantes termos e actos do processo serão applicaveis as respectivas disposições da tabella dos emolumentos e salarios judiciaes.

Art. 14.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 22 de abril de 1896. = Antonio

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1542 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

José da Costa Santos, presidente = Amandio Eduardo da Motta Veiga, deputado secretario = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario.

N.º 123-A.

Additamento feito pela camara dos pares do reino á proposição de lei da camara dos senhores deputados, que regula o processo de despejo de inquilinos de predios urbanos arrendados a mezes

Artigo 14.º Nas casas arrendadas a mezes deverá o proprietario, segundo a legislação em vigor, apresentar na respectiva repartição de fazenda a relação dos seus inquilinos.

§ 1.° Quando a casa ou apartamento depois de começado o semestre, vier a vagar o estiver com escriptos, deverá o proprietario, ou seu procurador, prevenir por escripto no praso de tres dias o respectivo escrivão de fazenda, a fim de lhe ser annullada a contribuição predial respectiva ao tempo que a casa estiver devoluta.

§ 2.º Todo o proprietario, que sonegar o ter arrendado a casa ou apartamento declarado no decorrer do semestre como devoluto, pagará uma multa dupla do valor da renda por que tiver estado alugada a casa ou apartamento.

O artigo 14.° passa a ser o artigo l5.°

Palacio das côrtes, em 2 de maio do 1896. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa = Jeronymo da Cunha Pimentel - Visconde de Athouguia.

Fui approvado sem discussão.

O sr. Antonio José Boavida: - Por porte da com missão do ultramar mando para a mesa o parecer relativo á reforma do ex-missionario da Guiné portugueza, Marcellino Marques de Barros.

Sr. presidente, este projecto foi approvado já nas duas casas do parlamento, porém, a camara dos dignos pares fez-lhe uma alteração de redacção no intuito de aclarar as suas disposições.

A commissão do ultramar acceita esta alteração e, por isso, poço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que seja dispensado o regimento, a fim de poder entrar já em discussão.

Assim se resolveu e é lido o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 128

Senhores: - O projecto de lei n.° 49, elaborado pela vossa commissão do ultramar, de accordo com o governo, foi approvado sem discussão na primeira parte da ordem do dia da sessão de 15 de abril ultimo.

A camara dos dignos pares do reino, conformando-se com o parecer n.° 50 da respectiva commissão do ultramar, approvou tambem o referido projecto de lei, fazendo uma pequena alteração na sua redacção, a fim de tornar mais claros as suas disposições.

A vossa commissão acceita esta modificação, e é de parecer que o projecto de lei seja redigido pela fórma seguinte:

«Artigo 1.° É relevado o ex-missionario e vigario geral da Guiné portugueza, o conego honorario Marcellino Marques do Barros, para o effeito da sua reforma, da falta de tempo de serviço no ultramar, designado no artigo 94.° dos estatutos do collegio das missões ultramarinas, approvados por decreto de 3 de dezembro de 1884.

«Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.»

Sala das sessões da commissão do ultramar, em 5 de maio de 1896. = Rangel de Lima = Marianno de Carvalho = Jayme da Magalhães Lima - J. Coelho Serra - Manuel Joaquim Ferreira Marques = Conde de Valle Flor = Joaquim Simões Ferreira Dias = Carlos Draga = J. Cunha da Silveira - Antonio José Boavida, relator = Tem voto do sr.: Abilio Beça.

Projecto de lei n.° 41

Artigo 1.° É relevado ao ex-missionario e vigario geral da Guiné portugueza, o conego honorario Marcellino Marques de Barros, para o effeito da sua reforma, o tempo de serviço no ultramar, designado no artigo 94.° dos estatutos do collegio das missões ultramarinas, approvados por decreto de 3 de dezembro de 1884.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 15 de abril de 1896. = Antonio José da Costa Santos, presidente = José Eduardo Simões Baião, deputado secretario = Abilio de Madureira Beça, deputado vice-secretario.

N.º 122-B

Alterações feitas pela camara dos pares do reino á proposição de lei da camara dos senhores deputados, que releva o conego honorario Marcellino Marques de Barros, da ra o effeito da reforma, da falta de tempo de serviço no ultramar

Artigo 1.°:

Assim redigido:

É relevado o ex-missionario e vigario geral da Guiné portugueza, o conego honorario Marcellino Marques de Barros, para o effeito da sua reforma, da falta de tempo de serviço no ultramar, designado no artigo 94.° dos estatutos do collegio das missões ultramarinas, approvados por decreto de 3 de dezembro de 1884.

Palacio das côrtes, em 2 de maio de 1896. = Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa = Jeronymo da Cunha Pimentel = Visconde de Athouguia.

Foi approvado sem discussão.

O sr. Manuel Vargas: - Parecendo-me inteiramente justificados alguns requerimentos que acabei de lançar na caixa de petições e de que são signatarios diversos officiaes inferiores de infanteria n.° 23, pedindo o abono de 80 réis diarios para rancho aos não arranchados, recommendo-os á attenção da respectiva commissão, confiando que esta não lhe recusará o justo deferimento.

O sr. Cabral Moncada: - Por parte da commissão de fazenda peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que se dispense o regimento a fim de poder entrar já em discussão o projecto de lei n.° 57.

Dispensado o regimento, foi posto á discussão.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 57

Senhores. - A vossa commissão de fazenda, sendo-lhe presente a representação dirigida a esta camara por Luiz Maria Teixeira de Figueiredo, official chefe da extincta direcção geral dos telegraphos e pharoes, tendo-a examinado detidamente, convencida da procedencia das considerações e argumentos produzidos pelo reclamante, e as quaes offerecemos como aqui reproduzidas, tem a honra vos apresentar, do accordo com o governo, o seguinte

Artigo 1.° É applicavel a Luiz Maria Teixeira de Figueiredo, ex-chefe da repartição technica e do material da extincta direcção geral dos telegraphos e pharoes, actualmente addido á direcção geral dos correios, telegraphos o pharoes, o disposto no artigo 7.° e § 2.° do decreto n.° l e 17 do julho de 1886.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 13 de abril de 1896. = Adolpho Pimentel = Teixeira de Sousa - Teixeira de Vasconcellos = Mello Sousa = Manuel Fratel = Adriano da Costa = José Lobo = Marianno de Carvalho = Luciano Monteiro = C. Mancada.

Senhores deputados da nação portugueza: - Luiz Maria Teixeira de Figueiredo, official chefe da extincta direcção

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SESSÃO N.º 72 DE 6 DE MAIO DE 1896 1543

geral dos telegraphos e pharoes do reino, addido á direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes, no desejo de ver devidamente esclarecidos os termos em que deva ter logar a sua aposentação - attentas as circumstancias excepcionaes em que se encontra - vem solicitar a vossa attenção para as rasões que, em abono da sua, justiça, passa a expor:

a) Contar cerca do quarenta e oito annos de serviço, sendo sete no exercito e os restantes no ministerio das obras publicas;

b) Ser o unico empregado existente do quadro do pessoal superior da extincta direcção geral dos telegraphos e pharoes do reino;

c) Sendo alferes do infanteria, despacho que obteve por se achar habilitado com o respectivo curso, foi compellido a pedir a sua demissão, em 1869, quando era tenente graduado.

As rasões que levaram o supplicante a tomar essa resolução encontram justificação nos factos que passa a enumerar.

A organisação da direcção geral dos telegraphos do reino, de 30 de dezembro de 1864, estatuia que fossem applicaveis aos empregados superiores do serviço telegraphico as disposições consignadas nos artigos 16.°, 17.°, 18.° e 19.° do decreto de 3 de outubro do referido anno, que organisou o corpo de engenharia civil e seus auxiliares; e no artigo 33.°, prescrevia que os directores telegraphicos fossem graduados em engenheiros subalternos de l.ª classe, percebendo os vencimentos correspondentes.

Em virtude d'esta disposição foi o ordenado do categoria d'esses empregados fixado em 60$000 réis mensaes, ao qual mais tarde foi addicionada a gratificação de réis 12$500.

Publicado o decreto com força de lei de 30 de outubro de 1868, que derogou o citado decreto de 3 de outubro de 1864, é expresso nos artigos 10.° e 16.° do primeiro d'estes decretos o seguinte:

«Artigo 10.° Os officiaes de infanteria, que foram classificados como engenheiros no extincto corpo de engenheria civil, são considerados em commissões activas, e continuarão a ser empregados no ministerio das obras publicas.

«Os officiaes de infanteria e de cavallaria ao serviço do ministerio das obras publicas, não classificados engenheiros, serão todos considerados em commissões activas no mesmo ministerio, até que entrem nas vacaturas dos quadros das suas armas, por lhes caber promoção, ou por conveniencia do serviço publico.

«Artigo 16.° Os vencimentos dos officiaes em serviço no ministerio das obras publicas, que foram classificados engenheiros, a que se refere o artigo 10.°, serão iguaes aos vencimentos dos officiaes do corpo de engenheiros, tanto em serviço activo como de residencia.»

Em vista do que fica transcripto, e sendo o supplicante director telegraphico, parece ser devidamente auctorisada a convicção em que estava julgando garantida, a todos os respeitos, a sua situação, visto como os citados artigos 10.° (l.ª parte) e 16.° lhe definiam de um modo positivo essa situação.

Publicada em 8 de abril de 1869 uma nova organisação do serviço telegraphico, apparece consignada no artigo 72.° d'essa organisação a disposição seguinte:

«Os officiaes de infanteria, que actualmente servem na direcção dos telegraphos, emquanto permanecerem no mesmo serviço, nos termos do artigo 10.° do decreto com força de lei de 30 de outubro de 1868, vencem os soldos das suas patentes e mais as gratificações do 10$000 ou 5$000 réis, segundo forem chefes de repartição ou de secção.

O citado artigo 10.° tinha duas partes distinctas:

A primeira referia-se aos officiaes de infanteria que foram classificados engenheiros, e a segunda aos que o não foram.

Os officiaes commissionados na direcção geral dos telegraphos tinham sido classificados engenheiros subalternos e l.ª classe em 1864, classificação que o alludido decreto com força de lei de 30 de outubro de 1868, não só não derogou, como sustentou na doutrina exposta nos artigos 10.° e 16.°

Assim, pois, parece ao supplicante que não se recommenda como acto legal a applicação da disposição inserida no mencionado artigo 72.°, da qual resultou descer o seu vencimento do 72$500 a 33$000 réis!

Uma reducção superior a 54 por cento nos vencimentos de um empregado publico, quando esses constituam a somma de todos os seus proventos, não carece de ser commentada para pôr em evidencia o desequilibrio financeiro que deve produzir.

E juntando a esta poderosissima consideração outra não menos importante e de igual verdade, qual a de ser causa unica de tamanho cataclysmo o facto do supplicante ser official do exercito, isto explica e de sobra justifica o pedido de demissão!

Abona esta affirmativa o facto da reducção indicada não ser consequencia necessaria da eliminação do cargo, que supplicante exercia, porquanto aquelle ficou subsistindo com as mesmas attribuições e igual lotação; simplesmente para fruir os proventos inherentes era preciso não ser militar.

É uma verdade irrefutavel que tendo o ministerio, organisado em seguida ao movimento militar de 19 de maio e 1870, revogado desde logo a disposição exarada na segunda parte do já citado artigo 10.° do decreto de 30 de outubro de 1868, todos os officiaes de infanteria e de cavallaria, ao serviço do ministerio das obras publicas, continuaram - ao abrigo do disposto na organisação do exercito de 23 de fevereiro de 1864 - a serem graduados nos postos que por escala lhes foram pertencendo.

Quer isto dizer, que só o supplicante não tivesse sido victima de uma errada interpretação da lei, teria do mesmo modo que todos os seus camaradas, em igualdade de circumstancias, continuado a ser graduado nos gostos militares; o hoje que já tem generaes de brigadas mais modernos (por ter assentado praça em infanteria, porque só fosse de cavallaria ha mais de um anno que era general de divisão), teria a sua reforma garantida em general de divisão com o ordenado de 130$000 réis mensaes.

Para exemplo bastaria citar o tenente coronel Chaby, que estava na inspecção de pesos e medidas, e o general de brigada Galvão, ambos reformados em generaes de divisão.

d) Á objecção que porventura se possa apresentar estranhando que só o supplicante se julgasse compellido a pedir a demissão, é licito dizer, que de todos os officiaes de infanteria e de cavallaria, ao serviço do ministerio das obras publicas (telegraphos, pesos e medidas e estradas), os unicos que tinham posição definida, e como taes vencimentos fixados por lei, eram os commissionados no serviço dos telegraphos e pharoes; todos os mais venciam o soldo da patente e uma gratificação arbitraria, auctorisada por portaria ou despacho ministerial.

e) Obtida a demissão por decreto de novembro de 1869, outro decreto da mesma data nomeia o supplicante official chefe da direcção geral dos telegraphos e pharoes, logar no qual se encartou, pagando os respectivos direitos de mercê.

Convém saber-se que a lei de 8 de abril de 1869, que creou o logar do official chefe, definindo o que seja esse cargo na hierarchia burocratica, designa-lhe as attribuições de inspector do serviço externo ou de chefe de repartição. É assim que por despacho ministerial de junho de 1872 foi o supplicante encarregado da inspecção dos serviços telegraphico e de pharoes; e em 1874, por fallecimento do engenheiro Everard, nomeado chefe da repartição technica e do material, no desempenho do qual

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cargo se achava quando teve logar a reforma de 7 de julho de 1880.

f) Tendo ficado addido por effeito d'esta reforma, apresentou immediatamente um requerimento, no qual pedia ao declarasse se a exclusão havida a seu respeito, negando-se-lhe ingresso no quadro effectivo do pessoal superior da nova direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes, tinha como rasão de ser qualquer acto contrario á dignidade de homem de bem que lhe podesse ser attribuido.

Ao encontro d'este requerimento veiu uma portaria declarando haver o supplicante servido com intelligencia, probidade e zêlo.

Outros documentos, firmados pelos engenheiros Valentim do Rego e Castanheira das Neves, classificam de irreprehensivel esse serviço.

g) For despacho ministerial de abril de 1881, foi o supplicante mandado apresentar ao director geral dos correios, telegraphos e pharoes, a fim de ser aproveitado o seu serviço na conformidade da lei e do regulamento telegrapho-postal.

Não havendo repartição vaga, cuja direcção podesse assumir, ficou o supplicante ás ordens do director geral; e por determinação do qual tem sido incumbido do desempenho de diversos serviços, os quaes, segundo a organisação que vigorou até 1892, eram da competencia do chefe da 4.ª repartição.

h) O facto do supplicante ter sido chamado para serviço effectivo, como fica dito, parece que deveria ter como consequencia immediata o aquinhoar das vantagens que aos demais chefes do repartição da mesma direcção fossem concedidas.

Não succedeu, porém, assim.

Em 1884, tendo sido equiparados os vencimentos dos chefes do repartição da direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes aos dos empregados de igual categoria das outras direcções geraes, o vencimento do supplicante e o de dois outros seus collegas, em identica situação (pertencentes á extincta direcção dos correios), não partilharam d'essa melhoria, sob pretexto da falta do verba no orçamento respectivo.

Tendo os interessados levado a sua pretensão ás camaras, o projecto de lei n.° 125, approvado na camara dos senhores deputados, na sessão de 8 de julho de 1885, punha termo a essa injusta excepção.

Este projecto não logrou, porém, entrar em discussão na camara dos dignos pares do reino, o que equivale dizer que o vencimento do supplicante, e o dos dois outros seus collegas (um já fallecido), continuaram a ser os mesmos.

O odioso d'esta excepção importa para o supplicante, alem da perda pecuniaria, a bem amarga consideração resultante do seguinte facto:

Individuos que, sendo praças de pret, tiveram passagem para o corpo telegraphico em soldados, em datas muito posteriores áquella em que o snpplicante para ali tinha ido no posto de alferes, e que sempre occuparam logares de categoria inferior, esses individuos, tendo sido guindados pela reforma do 1880 aos primeiros logares da direcção geral, estão recebendo 1:280$000 ou 990$000 réis, emquanto que o supplicante apenas recebe o vencimento que tinha, anteriormente a essa reforma, ou sejam 870$000 réis.

As considerações que acabam de ser expendidas, espera o supplicante, terão produzido no vosso animo a convicção intima de que elle soffre as consequencias de uma gravissima injustiça, para a qual não concorreu directa ou indirectamente; porquanto não serve mal quem desempenha os deveres do seu cargo com intelligencia, probidade e zêlo, como affirma a portaria que fica citada; testemunho garantido em termos não menos positivos por aquelles que, durante annos, suuperintenderam directa e immediatamente no serviço do supplicante, os quaes attestam ser irreprehensivel esse serviço.

Assim, pois, não podendo ter seguimento, em virtude de decretos ultimamente publicados com respeito a accesso ao generalato, o requerimento que o supplicante tinha submettido na anterior sessão legislativa á consideração dos srs. deputados, solicitando, em vista das rasões que allegava e casos julgados que citava, lhe fosse annullada a demissão pedida, a fim de ser graduado nos postos que por escala lhe tivessem pertencido, achando-se, portanto, essa pretensão prejudicada em presença das rasões ditas: espera o supplicante que a sua aposentação civil, quando haja de ter logar, se realise em condições, em que a adversidade que tanto o tem perseguido, em vez de ter em parte a devida reparação, não soffra novo aggravamento, sendo mais uma vez postergada a justiça e a equidade a que tem jus.

Para tal conseguir espera o supplicante que lhe serão garantidas as disposições consignadas no artigo 7.° do decreto de 17 de julho de 1880, aproveitando-lhe o exarado no § 2.° da citado artigo.

Pelo preceituado n'este artigo os directores geraes e os chefes de repartição das secretarias d'estado, que á data da organisação da caixa nacional do aposentações (lei de l5 de julho de 1885) contassem tres annos de exercicio n'esses cargos, e, pelo menos, quinze do serviço, têem a a sua aposentação com o ordenado de 1:200$000 réis os primeiros o 1:100$000 réis os segundos.

Sendo certo que o artigo 9.° do alludido decreto de 17 de julho de 1886 prescreve que, para effeito do aposentação, só seja contado o vencimento principal que o empregado tenha no acto da aposentação; e não sendo menos exacto, que não tendo sido extensiva ao supplicante a disposição que, sobre melhoria do vencimento, aproveitou aos seus collegas, parece effectivamente ser este o lado vulneravel da sua pretensão.

Mas, a esta objecção, quando suggerida, responde de modo terminante o § 2.° do artigo 7.° do mencionado decreto nos termos seguintes:

«No caso de um empregado ter sido transferido por conveniencia do serviço, e não por castigo, para logar de vencimento inferior, dentro da mesma categoria, regulará o vencimento do logar mais rendoso exercido, ao menos, durante cinco annos.»

Recapitulando

A pretensão do supplicante justifica-se, a seu juizo, como acto de reconhecida justiça em presença das rasões seguintes:

l.ª Receber, com toda a legalidade, 72$500 réis mensaes, e por uma forçada interpretação da lei ser esse vencimento reduzido a 33$000 réis.

2.ª Que garantindo-lhe o artigo 16.° do dito decreto com força de lei de 30 de outubro de 1868 o vencimento que tinha, por lhe aproveitar a parte primeira do artigo 10.° do dito decreto, não podia esse vencimento ser reduzido, invocando-se para isso o mesmo artigo 10.°

3.ª Acceitando, mesmo que fosse questionavel, apesar de bem claramente definida, a classificação de engenheiro garantida ao supplicante na parte primeira do referido artigo 10.°, e só lhe fosse applicavel a parte segunda do mesmo artigo, não seria de justiça e de equidade que lhe fossem conservados os vencimentos, que lhe estavam garantidos por carta de lei, aguardando-se o caso da sua promoção a capitão, para então declarar por qual dos serviços optava, principio garantido na organisação do exercito de junho de 1864?

É evidente que, se por tal modo se tivesse procedido, nunca o supplicante teria tido occasião de, sequer, pensar em se demittir; visto como os effeitos da segunda parte do artigo em questão duraram, apenas, o tempo preciso para unicamente serem desfavoraveis ao supplicante.

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4.ª Se o facto da demissão foi a causa dos transtornos que advieram, á sua vida publica, é verdade irrefutavel que esse facto não póde de nenhum modo ser attribuido a leviandade ou capricho da sua parte, mas só e unicamente á applicação errada de um preceito de lei que lhe não dizia respeito.

5.ª Não se tendo demittido, é positivo que ha mais do dois annos que tinha a sua reforma garantida em general de divisão, com o ordenado de 130$000 réis mensaes.

6.ª Demittido e nomeado chefe de repartição, paga os competentes direitos de merco, e envida todos os esforços possiveis para o bom desempenho dos deveres do seu cargo.

Dizem documentos officiaes que conseguiu plenamente o seu desideratum, mas, realisada a juncção dos correios, telegraphos e pharoes, apparece collocado na classe dos addidos.

Porventura será acto de justiça excluir um empregado do logar a que tinha direito, reconhecendo-se, officialmente, que esse empregado, é, não só intelligente, probo o zeloso, senão tambem que o seu serviço é irreprehensivel?

7.* O ministro que sanccionou este acto, sendo inquerido a tal respeito pelo cavalheiro que n'essa occasião geria os negocios da pasta da marinha, respondeu «elle nada perde, porque lhe são conservados os vencimentos que recebia».

Esta asserção deixou, todavia, de ser a expressão da verdade, de 1884 em diante, porquanto os seus collegas passaram a ter 1:280$000 réis e o supplicante continuou a receber 870$000 réis.

8.ª Que sendo uma verdade indiscutivel, que entre aquelles a quem a reforma de 1880 tanto favoreceu, alguns ha que entraram para o serviço telegraphico em praças de pret, quando já o supplicante ali estava no posto de alferes, e que sempre occuparam logar do categoria inferior - seria uma iniquidade que esses individuos tivessem uma aposentação mais vantajosa que a que o supplicante poderá auferir sendo-lhe negada a justiça e equidade que solicita.

Fará exemplificar bastará citar o caso seguinte:

Um primeiro official, ultimamente aposentado com o ordenado de 900$000 réis, entrou para o serviço telegraphico em 1860; e quando teve logar a reforma de 1880, que o elevou a primeiro oficial, era telegraphista de 3.ª classe, com 240$000 réis de ordenado.

9.ª Haver exercido de facto e de direito o logar do chefe de repartição de 1873 a 1880, e de 1881 a 1892, comquanto não fosse investido n'esse cargo, pela simples rasão de não o haver vago, é comtudo fóra de duvida que todos os trabalhos de que foi incumbido eram da competencia do chefe da quarta repartição.

10.ª Finalmente, que o deferimento da sua pretensão - ser aposentado com 1:100$000 réis de ordenado, como a lei de 15 de julho de 1885 garante a todos os chefes de repartição, que n'aquella data contassem tres annos de exercicio n'esse cargo - sobre ser um acto de reconhecida justiça, não constituo, pelas rastos excepcionaes que a recommendam, nenhum precedente que possa ferir ou auctorisar direitos de outrem.

Lisboa, 6 de janeiro de 1896. - E. R. M. ==Luiz Maria Teixeira de Figueiredo.

O sr. Teixeira de Sousa: For parte da commissão de fazenda, mando para a mesa o parecer sobre a proposta de lei n.º 125, relativa á cunhagem da prata e omissão de estampilhas postaes commemorativas da celebração do quarto centenario da partida da expedição que descobria a India.

Mando tambem para a mesa outro parecer das commissões de administração publica e de fazenda sobre a proposta do lei n.° 115-C, actorisando o governo a despender até á quantia de 1:500$000 réis para soccorrer as familias victimadas pelo incendio no villa de Montalegre em 12 do abril ultimo.

Igualmente mando para a mesa a seguinte proposta para que peço a urgencia.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que de preferencia a todos, os demais projectos de lei sejam discutidos os seguintes, pela ordem que n'esta proposta vae indicada:

N.° 103 - Acquisição de navios.

N.° 98 - Caixa geral de depositos.

N.° 125 - Celebração do centenario da India.

N.° 127 - Soccorros ás familias de Montalegre.

N.° 112 - Codigo de justiça militar.

N.° 113 - Emendas á proposta relativa ás baterias de montanha.

N.° 74 - Applicações do codigo de justiça militar ás provincias ultramarinas.

N.° 126 - Navegação para as ilhas adjacentes.

N.° 120 - Levadas na ilha da Madeira.

N.º 124 - Fiscalisação das manteigas. = Teixeira de Sousa.

Considerada urgente foi approvada.

O sr. Sousa Avides: - Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos empregados dos telegraphos e correios do Porto; e outra dos apontadores e amanuenses da direcção das obras publicas do districto do Porto, pedindo que lhes sejam extensivas as garantias exaradas no decreto de l de fevereiro de 1893 e suas instrucções.

Mando mais para a mesa um projecto de lei, considerando para todos os effeitos como primeiro official, com os vencimentos estabelecidos na tabella n.° l annexa ao decreto de 30 de dezembro de 1892, o logar de chefe da quinta repartição «serviços diversos» da camara municipal do Porto.

A representação vae publicada por extracto no fim da sessão e o projecto ficou para segunda leitura.

O sr. Santos Viegas: - Manda para a mesa uma representação dos tabelliães das comarcas de Aveiro, de Vagos e da Anadia.

A representação, vae publicada por extracto no fim da sessão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mando para a mesa, por parte das commissões reunidas de fazenda e de marinha, o parecer sobre a proposta de lei que approva a organisação da escola naval e a da instrucção dos officiaes da armada e da marinha mercante.

Peço a v. exa. se digne mandar imprimir com urgencia este parecer.

Como pedi a palavra por parte das commissões, pergunto a v. exa. se me consente que continue no uso da palavra, a fim de mandar para a mesa uma representação e dirigir umas perguntas aos srs. ministros dos estrangeiros e da marinha, perguntas que foram já por mim annunciadas.

O sr. Presidente: - Póde v. exa. continuar no uso da palavra.

O Orador: - Em primeiro logar mando para a mesa uma representação dos empregados da caixa geral de depositos a respeito de um projecto de lei submettido ao exame d'esta camara.

Em segundo logar, mando para a mesa uma proposta para ella poder ser auctorisada a gratificar os empregados da camara que tenham prestado bons serviços, e para a qual como v. exa. comprehende peço a urgencia.

Agora vou referir-me a outra questão.

A questão do caminho de ferro do Fungue e do procedimento do governo, desde o anno de 1893 até ao presente, n'este gravissimo negocio, podia dar logar a uma

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longuissima discussão; mas como já tive as responsabilidade de governo, sei tambem quaes podem ser as responsabilidades dos ministros em negocios que prendem com as relações internacionaes.

Depois de que eu levantei esta questão na camara, o governo mandou um despacho á nossa legação em Londres para que começassem as negociações com o governo inglez para se chegar a um accordo previsto com o segundo contrato do empreiteiro Van Laun. Estão, portanto, creio, entaboladas negociações com o governo inglez.

Se o ar. ministro dos negocios estrangeiros me diz que não ha inconveniente em que eu trate a questão na camara com a largueza que ella merece, tratal-a-hei n' esses termos; se o sr. ministro dos negocios estrangeiros me diz, pelo contrario, que ha inconvenientes de ordem diplomática em que a questão tome agora esse desenvolvimento, limitar-me-hei a fazer a s. exa. tres ou quatro perguntas para as quaes desejo uma resposta tanto quanto possivel clara.

Se v. exa., sr. presidente, o consente, para abreviar os trabalhos da camara, dará a palavra ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, querendo elle responder, reservando-m'a a mim para fallar em seguida ás considerações de s. exa.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. ministro dos negocios estrangeiros.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz do Soveral): - Sr. presidente, agradeço ao illustre deputado o sr. Marianno de Carvalho a facilidade que me de para a discussão d'este assumpto e deve dizer a s. exa. que achando-se effectivamente pendentes negociações com o governo inglez, achava mais opportuno discutir este incidente n'outra occasião. Em todo o caso estou prompto a responder ás perguntas de s. exa.

0 sr. Marianno de Carvalho: - Sr. presidente, devo dizer em boa e chã verdade que podia fallar de assumptos que com estes se prendem e que sendo muito anteriores ao entabolarem-se essas negociações e a ellas estranhos, de modo nenhum as perturbariam; mas como não quero n'um assumpto, que póde trazer graves desgostos, ficar com responsabilidades, accedo á indicação do sr. ministro dos negocios estrangeiros e limito-me a ler vagarosamente os perguntas que desejo fazer.

1.ª Oppoz-se o governo inglez ou negou-se a atar negociações para se celebrar o accordo previsto no contrato da companhia de Moçambique com Van Laun em fevereiro de 1892?

Como e quando se manifestou essa opposição ou negação.

2.ª Como e por que consentiu o governo portuguez que empreiteiros inglezes, em territorio portuguez, construissem um caminho de ferro, telegrapho, estradas, etc., sem que o mesmo governo tivesse conhecimento official do traçado e mais condignos de taes obras, consentindo que esses empreiteiros e os seus empregados recebessem instrucções, ordens e indicações dos representantes da South Africa em Salisbury e Bulawayo?

Porque foi que o governo, sem approvar o traçado, sem seu consentimento, sem ter conhecimento d'esse traçado, consentiu que em territorio portuguez, empreiteiros inglesas construissem um caminho de ferro, telegrapho, estradas, etc..?

3.ª Como e porque consentiu o governo portuguez que em territorios nacionaes só explorem caminhos de ferro e telegraphos sem condições de segurança e fóra da sua acção fiscalisadora por empreiteiros e agentes estrangeiros que da South Africa recebem ordens e instrucções e aos quaes, ha pouco tempo, foram encontradas armas de guerra?

A quarta e ultima pergunta refere-se ao seguinte:

Se o governo inglez alguma vez ou em algum diploma duvidou do direito do governo portuguez em approvar os traçados e projectos de caminho de ferro no territorio da Beira, de fiscalisar a execução dos projectos approvados, de approvar as tarifas nos limites aos tratados e contratos e de fiscalisar a exploração dos mesmos caminhos de ferro e telegraphos?

No tratado anglo-luso de junho de 1891 obrigava-se o governo portuguez a construir um caminho de ferro, segundo as condições estabelecidas n'esse tratado.

Essas condições eram as seguintes: construir o caminho de ferro que ligasse o mar com a esphera de influencia britannica, que o traçado d'esse caminho de ferro seria estabelecido de accordo entre os governos portuguez e inglez, que o governo portuguez apresentaria os estudos no praso de seis mezes e finalmente que havendo desaccordo sobre o modo financeiro de se construir o caminho de ferro, os dois governos aubmetteriam á arbitragem de uma terceira potencia a escolha da companhia que o devia construir.

Nada mais consta do tratado que se refira á construcção d'esse caminho de ferro.

A companhia de Moçambique entregou os estudos ao governo antes do praso de seis mezes e foram remettidos ao governo inglez. Depois, a mesma companhia fez um accordo, em setembro de 1891, com um empreiteiro chamado Van Laun para elle construir o caminho de ferro. Este accordo foi approvado por alvará do governo portuguez, alvará que nunca foi publicado na folha official. A seguir, em fevereiro de 1892, por motivos que não quero dizer, em virtude do desejo e recommendação do sr. ministro dos negocios estrangeiros, esse contrato foi modificado por um segundo accordo com o empreiteiro Van Laun. Esse accordo diz, logo no artigo 1.°, que a extensão do caminho de ferro seria concordada entre os governos portuguez e inglez e que os projectos são da approvação do governo portuguez.

São estes os unicos diplomas officiaes que conheço, e em nenhum d'elles está posto em duvida o direito soberano de Portugal sobre caminhos de ferro a construir no seu territorio, de approvar os objectos definitivos das obras, exercer fiscalisação na sua construcção e exploração, e approvar as tarifas, comtanto que sejam inferiores ás estabelecidas para os caminhos de ferro do Cabo da Boa Esperança.

Desejo, pois, saber, se ha algum diploma, ou qualquer manifestação do governo inglez pelo qual se entenda que, por qualquer fórma, estava cerceado o direito do governo portuguez de poder exercer a sua acção fiscalisadora na construcção e exploração de caminhos de ferro construidos em territorios absolutamente portuguezes.

Eis as quatro perguntas que desejava dirigir ao sr. ministro dos negocios estrangeiros.

Peço a v. exa. que me reserve a palavra no caso de precisar de usar d'ella novamente.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz do Soveral): - Em primeiro logar cumpre-me declarar no illustre deputado, o sr. Marianno do Carvalho, que não ha diploma nenhum em que o governo inglez consigne a sua opposição ás condições de fiscalisação na construcção, exploração e fixação de tarifas do caminho de ferro da Beira.

Permitta-me v. exa., sr. presidente, que defina em breves traços a origem dos contratos de Van Laun.

Pelo artigo 14.° do tratado de junho de 1891 o governo portuguez obrigou-se a construir um caminho de ferro de via ordinaria, que ligasse o porto da Beira com a fronteira do Winterland inglez.

O governo portuguez, de que fazia parte o sr. Marianno de Carvalho, querendo dar prompta execução a esse tratado, dirigiu-se á companhia de Moçambique, que no artigo 18.° da sua carta organica tinha assumido o encargo de construir esse caminho de ferro A companhia

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luctava n'essa epocha com graves difficuldades financeiras e era obvio que não o podia construir. Foi n'essa occasião que surgiu o empreiteiro Van Laun.

Devo declarar, e isto é uma indiscrição que se póde attribuir á minha inexperiencia parlamentar, que eu nunca approvei o contrato Van Laun, pois nunca gostei de intermediarios, que não; servem senão para difficultar as questões e occultar a origem dos capitães. O empreiteiro Van Laun fez o primeiro contrato, que foi approvado pelo governo de que s. exa. fazia parte e com elle dirigiu-se ás praças de Londres e Paris, mas não encontrando recursos, necessario era que a companhia se promptificasse a construir o caminho de ferro. Como a companhia o não podia fazer, foi necessario modificar esse contrato para se encontrarem esses recursos.

Durante o tempo das negociações trocaram-se entre a legação de Londres e o ministerio dos estrangeiros centenares de telegrammas que não foram communicados a s. exa. porque são de natureza confidencial. Eu ainda hoje vi n'um jornal, que não sei se tem ligação com o illustre deputado, mas que é muito lido n'este assumpto, citar alguns despachos e feitas accusações ao ministro de Portugal era Londres citando uma phrase de s. exa. na qual diz que tinha medo da companhia South Africa.

S. exa. que já teve a honra de se sentar n'estas cadeiras, e em horas bem angustiosas, sabe que muitas vezes aos mais valentes se confrange o coração quando vêem diante de si problemas internacionaes que podem fazer subverter não só a ordem, mas até a existencia das nacionalidades.

Se eu podesse trahir os meus deveres profissionaes o ler alguns d'aquelles centenares de telegrammas que tanto abonam os habitos preguiçosos da chancellaria de Sua Magestade em Londres, v. exa. encontraria muitas vezes applicada a mesma expressão - medo.

Seja como for, as negociações continuaram, trocaram-se muitos telegrammas de que s. exa. não tem conhecimento e não se chegou a accordo pela rasão muito simples de que quando o governo inglez estava disposto a celebrar o contrato, a companhia da Beira ameaçava parar absolutamente com as obras e não fazer o caminho de ferro.

Ora, v. exa. sabe perfeitamente o effeito que produziria na Europa o não se construir aquelle caminho de ferro quando n'aquella occasião a Machonalandia era o centro de todas as attenções e que seria um desastre não deixarmos absolutamente concluido aquelle importantissimo melhoramento.

No actual estado das negociações, devo dizer a s. exa., que nós já teriamos chegado a um accordo com o governo inglez se eu não tivesse visto, n'um projecto de accordo que me foi submettido, entre muitas cousas boas, diga-se a verdade, um artigo, que me não parece ter bastante em conta os direitos soberanos incontestaveis da corôa portugueza n'aquella região.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Marianno de Carvalho: - Responderei ao sr. ministro dos negocios estrangeiros tão brevemente quanto s. exa. faltou e direi simplesmente o preciso para rectificar um facto.

Em primeiro lugar consigno a declaração de que não ha diploma nem manifestação nenhuma de vontade do governo inglez, de cercear o direito soberano de Portugal, de approvar os projectos do traçados de caminhos de ferro em territorio portuguez, de fiscalisar a construcção d'esses caminhos de ferro, de fiscalisar a sua exploração e de approvar as tarifas, comtanto que ellas sejam inferiores ás do caminho de ferro do Cabo da Boa Esperança. D'isto, fatalmente conclue, que se se deixou que agentes inglezes construissem, em territorio portuguez, um caminho de ferro, cujo traçado o governo portuguez. não conhece. officialmente, que não sabe como é construido, ou antes sabe que é pessimamente construido; que se esses agentes receberam instrucções da South Africa para que a construcção do caminho de ferro de Bulawayo a Port-Salysbury, chegasse até á fronteira e até perto de Chicomo; que se essa construcção foi contratada pela South Africa com o empreiteiro Van Laun o que se depois a exploração do caminho de ferro não tem sido fiscalisada pelo governo portuguez, nem as tarifas foram á sua approvação, a responsabilidade é toda do governo portuguez, pois não houve intervenção alguma estranha, pela qual, perante o direito da força, se visse obrigado a ficar do braços cruzados diante de tudo isto.

E consignado isto, não digo mais nada, lembrando apenas que as negociações pendentes, só começaram depois que levantei a questão n'esta camara.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Nunca se interromperam.

O Orador: - Então n'esse caso obriga-me v. exa. a ler todos os documentos, de onde se prova que não existiam.

(Sobre este ponto travou-se um dialogo entre o orador e o sr. ministro dos negocios estrangeiros, que não póde ser percebido.)

O Orador: - As instrucções para as negociações foram escriptas em 29 de fevereiro d'este anno e n'ellas se diz, como anteriormente se dizia, que não havia accordo nenhum. Ás indicações do ministerio da marinha diziam a mesma cousa.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz de Soveral): - Não estava accordado, mas havia negociações.

O Orador: - Mas o officio expedido em 29 de fevereiro, dá claramente a entender que não havia negociações nenhumas.

Alem d'isso ha outro equivoco da parte de s. exa.

S. exa. interveiu effectivamente nas negociações no periodo de 1891, e n'esse periodo, em que as relações de Portugal e Inglaterra eram extremamente tensas, comprehendo que tivesse medo, porque eu, que estava em Lisboa, medo tinha tambem, não tenho duvida em confessal-o. Não é d'isso, porém, que se trata.

Em 4 de fevereiro de 1893 lavrou o sr. ministro dos estrangeiros de então, o sr. Ferreira do Amaral, um despacho ministerial, que foi communicado á legação em Londres, mandando abrir as negociações. Esta communicação foi feita para Londres em 6 do mesmo mez, e cinco dias depois a legação de Londres, onde estava o sr. Cyrillo Machado, perguntava de que accordo é que se tratava, porque de nada sabia.

(Interrupção do sr. ministro dos negocios estrangeiros, que não foi percebida.)

O sr. Cyrillo Machado que estava servindo de ministro plenipotenciario em Londres é que em 9 de fevereiro de 1894, perguntava espantado de que é que se tratava.

(Interrupção do sr. ministro dos negocios estrangeiros, que não foi percebida.)

Então se s. exa. insiste, acrescento que, mais tarde, estando o sr. Soveral em Londres e indo d'aqui um despacho instando pelas negociações e perguntando se não haveria lá algum documento sobre este negocio, a resposta foi, e essa é do sr. Soveral, que na legação de Londres não havia documento nenhum que no ministerio dos estrangeiros não existisse e que não linha aberto negociações porque nunca tinha recebido instrucções do ministerio dos estrangeiros.

Essas instrucções, nunca recebidas em Londres, até fins de 1894 ou principios de 1895, só foram mandadas transmittir Aquella legação em 29 de fevereiro do anno em que estamos, e o que é mais, é que no dia 4 do abril de 1894, o sr. ministro dos negocios estrangeiros recebia do nosso consul no Cabo da Boa Esperança im telegramma em que só dizia isto: (South Africa tratou com o empreiteiro G. Pauling a construcção do caminho de ferro até Chimoio.

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Os trabalhos vão começar immediatamente». O governo sabia, portanto, em Lisboa, no dia 4 de abril de 1894 que era a South Africa que contratava a construcção do caminho de ferro sem que o governo portuguez soubesse cousa nenhuma. Em 28 do mesmo mez se lembrou o sr. ministro dos estrangeiros de mandar um telegramma para o ministerio da marinha e o ministerio da marinha nunca mais pensou um similhante cousa.

Isto é o que consta e eu não quero entrar mais na questão porque o sr. ministro dos estrangeiros me disse que era inconveniente a discussão d'este assumpto n'este momento. Fica, porém, consignado que o governo inglez só não oppoz nem impoz ao governo portuguez sobre a maneira do fiscalizar a construcção do caminho de ferro, e que, se essa fiscalização se não fez porque o governo portuguez não quiz, por motivos que eu agora não quero discutir.

(O orador não revia ou notas tachygraphicas.)

A proposta mandada para a mesa pelo sr. Marianno de Carvalho é a seguinte:

Proposta

Proponho que a mesa fique auctorisada a gratificar todos os empregados d'esta camara a exemplo do que se tem feito em annos anteriores, e a gratificar igualmente os praticantes de tachygraphia sem vencimento. = Marianno de Carvalho = Teixeira de Vasconcellos = Teixeira de Sousa = Santos Viegas.

Considerada urgente, foi approvada.

O sr. Presidente: - Participo á camara que a commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto de lei n.° 57.

Vae passar-se á

ORDEM DO DIA

PROJECTO DE LEI N.° 103

Senhores: - Á vossa commissão de marinha foi presente a proposta do governo para ser auctorisado a applicar á acquisição de navios de guerra, nos quaes se comprehenderão um cruzador typo Yoshino, duas canhoneiras-torpedeiras typo Onyx e um rebocador de alto mar, até á quantia do 2.800:000$000 réis, do producto da emissão complementar das obrigações de tabacos.

Ninguém por certo desconhece a alta conveniencia, mais do que isso, a indispensabilidade da existencia de marinha de guerra para as nações coloniaes.

Graças aos ousados esforços e inexcedivel intrepidez dos nossos bravos marinheiros, e á arrojadissima tentativa maritima, tão brilhantemente iniciada por esse benemerito infante portuguez, que por sem duvida, mais do que gloria da terra que lhe foi berço e que tão extraordinariamente engrandeceu, é, podemos asseveral-o sem receios de serio desmentido, um vulto collossal na historia do seu tempo, Portugal, armando os seus navios e guarnecendo-os do marinheiros tão destemidamente valentes para a travessia do alto mar, como cuidadosamente pacientes para a navegação costeira, alcançou, por mares nunca d'antes navegados, estender o seu dominio e levar a luz da civilisação ás mais distantes regiões, ás mais longinquas plagas.

Hoje, com importantes possessões na Asia, na Oceania e principalmente na Africa, onde os nossos dominios são tão extensos como valiosissimos, somos, forçoso é confessal-o, em que pese aos nossos brios patrioticos, a nação mais desprovida de forças navaes, contentando-nos apenas de recordar os heroicos feitos dos nossos maiores, e de apresentar a nossa arvore genealogica, aliás nobilissima, que nos dá como representantes legitimas dos mais arrojados marinheiros do mundo.

Mas, senhores, la noblesse oblige. Se nos queremos mostrar dignos das honrosas tradições que herdámos, tentemos tambem continuar essas tradições para que nossos filhos se não envergonhem dos paes, e procurem apenas fazer reviver a memoria dos avós.

Se, em verdade, não podemos rivalisar com as nações maritimas de primeira ordem, sustentemos, ao menos, o logar que nos compete entre as de segunda. Lembremo-nos de que de entre estas nenhuma possue nem mais, nem melhores colonias.

Se hoje já não dominâmos os mares, como outr'ora, se já não podemos voltar a ser a primeira potencia naval do mundo, como quando os cachopos e os recifes de receio e medo se faziam pequenos para não serem avistados das nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravellas, que, impavidas, sulcavam os mares, desafiando os ventos e as tempestades, se já infelizmente não podemos voltar a ser o que fomos, devemos comtudo ter uma marinha de guerra que, coadjuvando poderosamente a defeza das nossas costas, possa levar o prestigio da nossa bandeira e o auxilio dos nossos canhões ás nossas vastas e importantissimas colonias.

E se a armada portugueza, depois de devidamente reorganisada, não pôde ter a louca pretensão de despertar receios ou incutir pavores ás das mais poderosas nações, póde, todavia, impor-lhes respeito. A nossa situação geographica e a situação das nossas colonias, o auxilio de alguns cruzadores de magnifico armamento e celeridade, e estes servidos por marinheiros portuguezes, que em valor e audacia ninguem excede, são circumstancias muito attendiveis e que por certo se imporão ao respeito das nações.

A vossa commissão de marinha não duvida da vossa approvação á proposta do governo, porque igualmente não duvida do vosso patriotismo. Nada vos diz ácerca dos recursos pecuniarios, porque para a reorganisação da nossa marinha de guerra já esta camara n'uma das suas ultimas sessões approvou a applicação do producto da emissão complementar das obrigações dos tabacos. Igualmente nada vos diz quanto aos typos de navios escolhidos, porque tal incumbencia melhor compete e mais convenientemente será desempenhada por uma commissão de technicos, parecendo á vossa commissão melhor, e sobretudo mais prudente, não determinar já no projecto quaes os typos escolhidos.

A vossa commissão aconselha e confiadamente espera que approveis a proposta do governo n.° 50-B, convertendo-a no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a applicar á acquisição de navios de guerra até á quantia de 2.800:000$000 réis do producto da emissão complementar das obrigações dos tabacos.

§ unico. O governo escolherá os typos dos navios a adquirir, depois de ouvir as estações officiaes e uma commissão de technicos para esse fim nomeada, e só fará a adjudicação em concurso.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de marinha, 25 de abril do 1896. = Luiz Osorio = José Ferreira Cunha da Silveira = Romano de Santa Clara = Teixeira de Sousa = Manuel Joaquim Ferreira Marques = Teixeira de Vasconcellos = Adolpho Pimentel, relator.

N.º 50-B

Senhores: - Desnecessario é, por certo, encarecer-vos a importancia da marinha de guerra, como elemento de defesa nacional, para quem, como nós, alem de uma extensa fronteira maritima na metropole, possue, ainda hoje, um dos mais vastos imperios ultramarinos, espalhado pela Africa, Asia e Oceania.

As nossas tradições mais gloriosas, e a nossa alevantada e nobre missão historica, prendem-se intimamente com esta instituição militar, em que fomos singularmente grandes, temidos, e respeitados,

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 figura lendaria do infante D. Henrique, que ostenta, no mais eminente grau, todo o espirito de temereria aventura, e o providencial destino, da nossa raça, devemos as frotas disciplinadas e audazes, que, depois de aportarem aos Algarves d'alem mar, se engolpharam, com assombro do mundo inteiro, no oceano tenebroso, e foram, sobre o mysterio das ondas, em busca do Preste Johão das Indias.

A escola de Sagres deu-nos os melhores marinheiros, arrojados navegadores do mar alto, e pacientes prescrutadores da arriscada navegação costeira. Ferestrello, Zarco, Tristão Voz, Gil Eannes, Fernão do Magalhães, Bartholomeu Dias, Alvares Cabral, e tantos outros, são nomes aureolados de imperecivel gloria, que bastam para solidamente fundamentar o mais nobre orgulho de um povo.

Durante o seculo XVI, seiscentos e noventa navios redondos dobraram o Cabo da Boa Esperança, duzentos naus de linha sulcaram os mares das Indias, e, apesar da titanica grandeza d'este esforço, nunca deixaram de cruzar, no nosso extenso litoral, poderosos esquadras de protecção, e ainda tivemos vasos de guerra para brilhantes ostentações do nosso poderio maritimo, como a esquadra de D. Martinho Castello Branco, de dez naus, dois galeões, e quatro goles reaes, que conduzia D. Brites, a desposar o duque de Saboya, e a armada de Antonio, de Saldanha, de vinte galeras, e quatro galeões, entre os quaes se contava o celebre S. João, com 366 bocas de fogo, e com talhamar de aço, que rompia, como rompeu, a todo o panno, a cadeia do porto da Golêta, e deu a Carlos V a victoria de Tunis.

Formidavel poder maritimo foi então o nosso!

No seculo XVII atravessa-se uma phase de estacionamento, mas logo no seguinte, sob a iniciativa fecunda e a acção energico de Martinho de Mello, opera-se uma profundo remodelação, e realisam-se notaveis progressos.

A bandeira portugueza volta o tremular, respeitada, e altiva, no tôpo dos mastros das nossos armadas, e reconquistamos o nosso logar como potencia maritima, com quem era mister contar-se.

No bloqueio de Malta, e nos cruzeiros da Sicilia, demos da nosso força naval valioso demonstração, pelo esquadra do marquez de Niza, onde as naus Principe Real, Rainha de Portugal, Affonso de Albuquerque e S. Sebastião, as corvetas Andorinha e Benjamim, e os brigues Falcão e Gaivota, mantiveram em devida altura as honrosas tradições dos nossos maiores.

Ainda em 1807, ao passo que seguiam para o Brazil oito naus de linha, quatro fragatas, e sessenta navios de transporte, ficavam tristemente ancoradas no Tejo as naus S. Sebastião, Maria I, Princeza da Seira, Vasco da Gama, e as fragatas Phenix, Amazona, Perola, Tristão e Venus! Se relembrâmos, senhores, estas epochas aureas do nosso poderio maritimo, tão sómente o fazemos para accentuar bem, pelo frisante contraste com o nossa desoladora situação actual, a imprescindivel e inaddiavel urgencia de mettermos hombros á patriotico empreza da reconstituição da nosso marinha de guerra. Não nos illudâmos, nem nos desalentemos. Não vamos suppor, mais uma vez, com o pensamento de fugirmos a sacrificios financeiros, que podemos continuar a manter-nos dignamente nas relações internacionaes do mundo moderno, e defender, como é impreterivel dever de honra nacional, os nossos vastos dominios ultramarinos, com os escassos, para não dizer nullos, elementos de guerra naval, que possuimos, e que, dia a dia, deperecem.

Não caiâmos tambem, em desalentada inacção, succumbidos sob o peso do encargo, quo se nos impõe.

São poucos os nossos recursos, e luctãmos com difficuldades de toda a ordem, bem o sabemos; mas a lucta não é senão a vida, e o valor está em vencer com pouco, ou morrer com honra.

Da coragem dos nossos bravos marinheiros não descremos por um só momento, e não fazemos mais do que render justo e merecido preito aos heroicos descendentes dos maiores heroes da nossa historia. Que todos elles saberão morrer, na hora do perigo, dando o ultimo tiro, e soltando o ultimo brado de saudação á patria, é ponto de fé, dogma santo da pura religião, do brio e decoro militar, que todos professam com devotado zêlo e singular rigor.

Cabe, porém, aos governos dar-lhes os meios, quando não de vencer, de morrer, ao menos, combatendo pela patria, por quem dão a vida.

Não póde deter-nos o passo, nem suspender por um momento o nosso proposito, a consideração tão falsa, como vulgar e repetida, de que, por maiores que sejam os sacrificios, e por melhores que sejam os desejos e esforços, não poderemos, nunca, ter elementos de poder naval, que bastem, para nos defrontarmos com as grandes potencias maritimas.

Falsissima orientação é esta, infelizmente tão espalhada pelos que, perante um grande mal do patria, antes preferem achar um simulacro de argumento, com que justifiquem a sua inacção, do que arcar de frente com as difficuldades, e luctar por demovel-as.

Se houvesse visos de procedencia em tal raciocinio, desarmariam os pequenas nações os seus arsenaes de guerra, cessariam as suas construcções navaes, annullariam as suas esquadras, porque nenhuma d'ellas, de per si, poderia bater-se, em toda a sua força, com as poderosas esquadras inglezas.

Nas relações internacionaes, cada povo vale pelo que é, na proporção dos seus recursos, e dos seus meios de ataque, ou de defeza. Não se hesito, quasi nunca, n'uma violencia, quando, de antemão, se sabe da impossibilidade de resistir quem se vão hostilisar. Vacilla-se, e quasi sempre se recua, ante uma acção abusiva de força, quando, antecipadamente, se tem a certeza de que o abuso ha de encontrar resistencia, firme no direito que se defende, e heroica pelo dever de honra, que se impõe.

Não póde ser pretensão nosso disputar primasias ás grandes nações da Europa; mas cumpre-nos, por dignidade, e por interesse proprio, não nos distanciarmos d'aquellas de quem deveramos estar ao par, senão que preceder até, em armamento naval.

É, infelizmente, com mágua profunda, muito embora, é forçoso confessal-o, os mappas comparativos dos marinhas de guerra dos diversos paizes, que offerecemos á vossa ponderação, o reflectido exame, são de molde a convencer-nos, ao primeiro golpe de vista, de que, muito nos distanciámos, em atrazo, de quem, deveramos estar distanciados pelo avanço.

E tantos são os que nos tomaram a dianteira, que vamos atrás de todos.

A compenetração absoluta d'esta tão triste como indiscutivel verdade, traz comsigo, logicamente associada, a adhesão completo á patriotico empreza, que o governo teve a honra do submetter á vossa apreciação, na proposta de lei n.° 9, das medidas de fazenda, que, firmemente o cremos, ha de merecer o vosso mais vivo applauso.

For virtude d'essa providencio, um fundo especial, relativamente importante, se constitue, cercado de cautelas e garantias, para, rigorosa applicação do seu destino legal, qual é, - a reconstituição da nossa marinha de guerra.

Como, porém, de longa data é reconhecida a urgencia de acudir a esta instante necessidade do governo, e se tenham lá feito importantes trabalhos preparatorios, que muito convem aproveitar, e ainda porque, acima de tudo, mister é não perder mais tempo, vimos, desde já, solicitar a vossa auctorisação para que, da quantia realisada pelo emissão complementar das obrigações dos tabacos, posso o governo applicar, até á importancia de 2.800:000$000 réis, na acquisição de navios de guerra, comprehenden-

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de-se n'estes um cruzador, typo Yoshino, duas canhoneiras; torpedeiros, typo Onix, e um rebocador do alto mar.

É este o fim da presente proposta de lei, consequencia da n.° 9 das de fazenda, para só poder, sem mais delongas, dar começo á reconstituição da nossa marinha de guerra.

Esperâmos, senhores, que outorgueis a auctorisação pedida, que, mais uma vez, affirmará o vosso patriotismo, e a alta comprehensão, que possuiu, dos mais importantes interesses e das mais altas conveniencias do paiz.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a applicar á acquisição de navios de guerra, nos quaes se comprehenderão um cruzador, typo Yoshino, duas canhoneiras-torpedeiros, typo Onix, e um rebocador de alto mar, até á quantia de 2.800:000$000 réis, do producto da emissão complementar das obrigações dos tabacos.

2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 11 do abril de 1896. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro. = Jacinto Candido da Silva

O sr. Marianno de Carvalho: - Sr. presidente, a altissima importancia d'este projecto do seu simples enunciado se deduz. A marinha do guerra nacional, tanto a de combate como a colonial, chegou ao ultimo grau de decadencia a que podia chegar.

Temos ainda alguns navios que a custo navegam, mas não conheço maior prova de coragem e de valor, do que a que dão os officiaes da nossa armada, quando embarcam n'esses navios para fazerem a travessia de mares verdes e procellosos, que vapores um bom estudo do conservação têem difficuldade em percorrer.

Embarcar n'esses navios no estado em que se encontram, no Índia, que oxalá elle possa arastar-se sem um grande desastre até ao termo da sua viagem; na Teho, que navegando com a pôpa podre, depois de ter encalhado á saída de Quelimane, foi mandada dobrar o cabo Guarda fui em grande monção; na Zaire, no estado em que estava este navio, quando eu andei a bordo d'elle; arriscar-se a viagem á India do Vasco da Gama, que não foi construido para viagem do longo curso, tudo isso são provas do coragem que fazem a admiração dos estrangeiros, e com que os proprios inglezes, a uma fragil concha, chamem o homem do mar portuguez, como que querendo talvez dizer que valentes hão de ser os homens de mar que em taes chavecos se atrevem a navegar.

A importancia d'este projecto não se póde negar, e não ha ninguem, a começar por mim, que não vote a construcção de navios de guerra, com tanto que se saiba que navios são, para que são destinados, como são escolhidos e se estão em harmonia com as necessidades do paiz e com as suas forças financeiras.

Todas as nações que têem portos maritimos precisam de marinha de guerra, mas a composição d'essa marinha varia conforme essas nações são ou não coloniaes. Se não são a sua marinha de guerra é só para affirmar a sua força militar nos mares europeus. É o caso da Grecia, da Suissa, da Dinamarca, da Norwega, da Russia, enfim de todas as nações que não têem colonias. O outro, é o caso das nações que, tendo colonias, precisam ter uma marinha de guerra para affirmar a sua força militar no mundo e manter a communicação com as suas colonias.

Pergunta-se, tem Portugal no momento presente os navios de guerra absolutamente indispensaveis para a sua marinha colonial?

A resposta é facil dal-a. Não tem. A costa de Moçambique é um ninho de contrabando e escravatura. Digo isto, sem vergonha para as auctoridades coloniaes, porque não ha navios sufficientes com as condições nauticas necessarias para navegar no canal de Moçambique.

No canal de Moçambique, que não é o mar das Patas, em Angola corre-se o risco dos cyclones extraordinariamente, e ordinariamente todos os dias se affronta a violencia da monção um que a corrente é de 5 a 6 milhas por hora contra as quaes tem de luctar um triste navio que ás vozes não deita 4 milhas.

Na epocha em que eu tive o prazer do percorrer aquella provincia, e lastimar o que seja administração colonial portugueza, de que ha pouco citei um pequeno exemplo, quanto á gravidade das circumstancias m'o permittia, estava lá a corveta Rainha de Portugal, em tão pessimas condições de estabilidade e altissima guinda que foi necessario diminuil-a, porque a cada momento corria o risco de fazer da quilha portaló. Essa corveta estava fundeada em Lourenço Marques, concertada a pedra e cal, e em tal estado, que não podia fazer um cruzeiro para impedir o contacto com a terra de navios cheios de tuberculosos. Estava tambem a Zaire com a cunha dos mastros aluida, o fundo em estado impossivel e o lema a desfazer-se a cada momento, e estava tambem a pobre Tejo, com Apupa podre, tendo encalhado á saida de Quelimane.

Como a costa de Moçambique e toda cortada de bahias, calhetas, angras e rios onde os pangaios arabes navegam como lhes apraz, empregando-se principalmente no commercio occulto e criminoso da escravatura, as nossas auctoridades não os podem reprimir, porque não têem força, e porque a navegação com estes navios, que pela sua demasiada grandeza não podem acolher-se aos portos da conta, em occasião de mais mau tempo o pela sua falta de condições de navegação, não podem resistir aos ventos das monções e se torna difficil.

O que digo da costa de Moçambique, digo, em menor proporção, da costa de Angola, porque os mares ali são mais calmos e ainda porque ha abundancia do portos, calhetas, angras e rios, em que os navios podem recolher-se do mesmo modo que na costa de Moçambique.

Poderia dizer cousa similhante, mas em proporções ainda menores, porque a sua extensão é menor, da Guiné. Macau, Cabo Verde e S. Thomé estão em condições especiaes, e se não dispensam o auxilio da marinha colonial, pelo menos não são tão exigentes como as provincias de Angola e Moçambique.

Isto passava-se um 1890, e de então para cá a situação da nossa marinha de guerra não tem senão peiorado, porque se não têem feito novas construcções e os navios que já n'aquella epocha estavam doentes e fracos, peioraram com o decurso de mais seis annos!

É facto incontestavel e incontestado, que com a extrema destreza e habilidade dos nossos officiaes, e com algum esforço da parte dos ministros, se podia ter navios em condições de se poder acudir ás necessidades das colonias.

É claro que, dizendo isto, não ataco a gerencia do sr. ministro, que está ha meia duzia do dias no ministerio, nem a do seu antecessor, que pouco tempo lá esteve; refiro-me á situação geral, que provém, naturalmente, da nossa situação economica e financeira.

Não temos, portanto, marinha colonial, e os poucos barcos que nos restam, não só não estão em estado de poder durar largo tempo, como mesmo não são actualmente sufficientes para as necessidades coloniaes, nem um numero, nem em qualidade.

Temos, em compensação, marinha de combate?

Temos o couraçado, mas s. exa. sabem, que o couraçado, que é um bom navio para a sua classe, nunca fui senão um guarda costas relativamente fraco. Não foi, na epocha em que se construiu, destinado ao alto mar, e sobretudo não está á altura dos progressos modernos da estrategia e da tactica naval, da construcção dos navios modernos, e do aperfeiçoamento dos canhões, tanto dos de grande calibre como dos de tiro rapido e dos modernos

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explosivos, a que os inglezes chamam bombas de grande capacidade explosiva!

Este navio de combate não está hoje, portanto, á altura das necessidades da guerra maritima.

Resta dizer que a guerra maritima tem hoje como factores essenciaes a força defensiva dos navios, a sua velocidade, o seu raio de acção e os seus meios de ataque, e o couraçado não tem velocidade, pois deita apenas 7 ou 8 milhas, não tem raio de acção, tem pouquissima capacidade para carvão; a sua artilheria é de grosso calibre, tem uma rasoavel couraça, mas faltam-lhe todos os aperfeiçoamentos modernos.

Estudando o projecto, tratei de ver quaes os navios que o governo vae agora adquirir com estes 2:800 contos de réis e os que se prepara para adquirir com os 6:200 contos de réis restantes do emprestimo de 9:000 contos de réis.

Pretende o governo adquirir uma marinha exclusivamente colonial, uma marinha exclusivamente de combate, ou ambas as cousas ao mesmo tempo?

O meio que eu tinha para fazer esta averiguação era estudar a proposta do sr. ministro e o relatorio da commissão de marinha.

Eu poderia, se quizesse crear embaraços, perguntar pelo parecer da commissão de fazenda, mas, não pergunto, não só porque não quero crear embaraços, mas porque, emfim, se a commissão não dou parecer sobre o projecto, como estrictamente devia, deu-o todavia sobre um outro que com elle se prende.

Poderia, com fundada rasão, baseando-me na letra e no espirito do regimento, oppor-me á discussão do projecto por não vir acompanhado do alludido parecer, mas não quero.

Vamos ver, porém, pelos relatorios do sr. ministro da marinha e do meu amigo o sr. Adolpho Pimentel, illustre relator da commissão de marinha, se o que só quer adquirir é uma marinha de combate ou uma marinha colonial.

Vamos primeiro ao relatorio do sr. ministro da marinha.

(O orador fez a leitura de varios periodos do relatorio, acompanhando-os de ligeiros commentarios que não foi possivel reproduzir.}

Este relatorio está muitissimo bem escripto, tem apenas um defeito (e não ha obra humana que não o tenha), não diz claramente se querem constituir uma marinha de combate ou uma marinha colonial.

Tambem não diz por que se prefere o typo Yoshino para cruzador, nem porque se pretendem duas canhoneiras torpedeiros typo Onix, e um rebocador de alto mar.

Tirado este defeito, o mais está primorosamente escripto. E não digo isto por ironia. Talvez eu fosse um pouco ironico na apreciação dos diversos periodos; mas, como estylo, o relatorio é primoroso, e por isso felicito o sr. ministro da marinha.

Então, como o relatorio do sr. ministro não me esclareceu nada sobre os motivos d'aquella especie de navios, voltei-me para o relatorio da commissão e disse, se elle é redigido por pessoa tão illustrada, e eu não quero fazer epigramma, e portanto não direi tão competente, porque o sr. relator é competente em muita cousa, mas em marinha de guerra, está como o nosso couraçado, o Pimpão, está em relação ás modernas construcções, o meu amigo o sr. Adolpho Pimentel, e a sua muita illustração vae dizer-me que marinha de guerra vamos nós construir com os 2:800 contos de réis proximos e os 6:200 contos de réis remotos, tudo em oiro, e que, se Deus quizer, ha de ser gasto tudo nos precisos termos do regulamento da lei de contabilidade publica.

Vamos a ver o que o sr. Adolpho Pimentel, no seu eloquentissimo relatorio, diz a este respeito. Fui ao relatorio e vi que elle diz: «que é necessario termos marinha de guerra», de accordo; «que os nossos marinheiros fizeram cousas valiosissimas em todos os tempos; e hão de continuar a fazer, tambem de accordo; «que temos importantes possessões na Asia, na Oceania e principalmente na Africa, e que apesar d'isso, somos a nação mais desprovida de forças navaes», corrente; «que - aqui parece-me que o sr. relator claudicou - la noblesse noblige»; porque os francezes dizem: noblesse oblige e não la noblesse oblige; (Riso.) «que temos obrigação de nos mostrar á altura das nossas heroicas e gloriosas tradições», muito bem, corrente, todos de accordo; «que não podemos rivalisar com as nações maritimas de primeira ordem, mas sempre podemos arranjar alguma cousa».

Agora segue-se uma phrase tão primorosamente escripta que peço licença para notal-a, porque raras vezes apparece um conceito tão levantado e escripto em tão primoroso portuguez. É o seguinte: «Se hoje já não dominamos os mares, como outr'ora, se já não podemos voltar a ser a primeira potencia naval do mundo», repare agora a camara: «como guando os cachopos e os recifes de receio e medo se faziam pequenos para não serem avistados das nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravettas, que, impavidas, sulcavam os mares, desafiando os ventos e as tempestades...»

Isto é muito bem pensado e muito bem escripto. Os cachopos a fazerem-se pequenos de medo para não serem avistados pelas nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravellas! Eu felicito o sr. relator, (Apoiados.} e devo dizer que em primores de rhetorica poucas cousas tenho visto como esta. Ha muitos relatorios que estão á altura d'este como idéas, mas como estylo, é de primeira ordem.

Mas, emfim «se já não podemos voltar a ser a primeira potencia naval do mundo, como quando os cachopos e os recifes do receio e medo só faziam pequenos para não serem avistados das nossas poderosas naus, valentes galeões e destemidas caravellas que, impavidas, sulcavam os mares, desafiando os ventos e as tempestades, devemos, comtudo, ter uma marinha de guerra que possa levar o prestigio da nossa bandeira e o auxilio dos nossos canhões ás nossas vastas e importantissimas colonias». N'isto está tudo do accordo, e eu tambem. Que «a armada portugueza depois de devidamente organisada, não pôde ter a louca pretensão de despertar receios».

Também é, infelizmente, uma triste verdade e bom é reconhecel-a, o que é mais do que o principio da sabedoria, é quasi o fim. Finalmente, a commissão «não duvida da vossa approvação á proposta do governo, porque igualmente não duvida do vosso patriotismo» e é verdade porque a camara é patriotica, tanto como o governo e a propria commissão. «Igualmente nada nos diz quanto aos typos de navios escolhidos, porque tal incumbencia melhor compete e mais convenientemente será desempenhada por uma commissão de technicos, parecendo á vossa commissão melhor e sobretudo mais prudente não determinar já no projecto quaes os typos escolhido». Mas, se é marinha de combate ou colonial, quaes as rasões porque se escolheram os typos a que se refere a commissão, isso é que ella não disse.

Se das palavras da commissão nada fiquei concluindo, ainda que seja fraca a agudeza do meu espirito, pela longa pratica parlamentar devo ter ao menos um tal ou qual discernimento para procurar nas disposições taxativas de um projecto, ou do relatorio que o precede, alguma elucidação sobre o ponto de vista que me interesse concluir. O sr. ministro da marinha propõe um cruzador typo Yoshino, navio protegido, de uma velocidade relativamente grande, armado com canhões de tiro rapido, portanto, não é um navio colonial.

É um navio que póde acudir a uma colonia em circumstancias apertadas, mas de estação, de serviço colonial, não é seguramente um cruzador d'esta especie. O que é, é um navio de combate, e tanto que o Yoshino, ou algum

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dos seus parentes proximos, na recente batalha do Yalu venceram os couraçados chineses.

Alem d'este propõe tambem o sr. ministro duas canhonhairas torpedeiros, typo Onyx, que não são nem podem ser navios coloniaes, como logo mostrarei á camara.

Eis em resumo as minhas rasões, que logo desenvolverei e apoiarei, não com a minha auctoridade, que é alheia ao assumpto, mas com a auctoridado do mais competente marinheiro dos tempos modernos.

A canhoneira typo Onyx é de 810 toneladas, pouco mais ou menos, e para adquirir uma velocidade de 19 ou 20 milhas e o raio de acção conveniente, tem de sacrificar á machina e ao alojamento do carvão todo o espaço disponivel, faltando-lhe, por consequencia, alojamentos para poder servir como navio colonial. Alem d'isso, sendo um navio do aço, não forrado do cobre, navegando nos mares tropicaes, como são os que banham a maior parte das nossas colonias, dentro em pouco estará impossibilitado de servir, pelo estado a que ficará reduzido o seu fundo.

Os navios indicados n'este projecto são, um cruzador typo Yoshino, navio do grande velocidade, de grande raio de acção, protegido com couraça de aço, com artilheria do tiro rapido, e as canhoneiras-torpedeiras typo Onyx, que não são, manifestamente, navios coloniaes. Logo, não sendo os primeiros elementos que vamos adquirir navios coloniaes, o ministerio da marinha o que quiz foi arranjar uma esquadra de combate, e quando fallo do ministerio da marinha, distingo o ministro, porque s. exa., que é um jurisconsulto distincto, um homem de talento, e a cujas qualidades eu presto homenagem, não é um navegador, nem pretende sel-o, e simplesmente só levou pelo quoelhe disseram as estações technicas. Não é, portanto, s. exa. quem eu hei de censurar nem combater.

Trata-se de um cruzador typo Yoshino, que é um navio de combato; do canhoneiras-torpedeiros, que são tambem navios de combate e que por modo nenhum são navios do navegação colonial; logo o que se vae começar a organisar é uma esquadra de guerra.

Vendo isto, disse commigo; vou para a camara dar uma batalha naval» contra o sr. ministro e o sr. relator e aqui vem dizer o motivo por que eu perdi o receio d'esta batalha.

Eu disse commigo, quando peguei no projecto: o relator é o sr. contra-almirante Ferreira Marques, que pelo seus relevantes serviços, patriotismo e conhecimentos d'este negocio, seguramente deve ter sido o escolhido para relatar o projecto, mas quando li o relatorio, comecei a desconfiar de que me enganara, porque o sr. Ferreira Marques foi sempre um distincto e valente official de marinha mas nunca me constou que tivesse qualidades de estylista. S. exa. é muito mais capaz do affrontar as furias do mar revolto e as balas inimigas do que o debater-se contra os escolhos da grammatica ou os recifes da rhetorica; portanto, disse commigo, o relatorio não é de s. exa., e chegando ao fim vi que não me enganei, que elle era do nosso estimado collega o sr. Adolpho Pimentel. Disse então com estes dois illustres nautas vou bem. O sr. ministro da marinha foi aos Açores algumas vezes, mas ou já foi mais longe, já passei o Guardafui e o cabo da Boa Esperança; o sr. Adolpho Pimentel creio que tem navegado muitas vezes no caminho de ferro para o Porto e Braga.

O sr. João Arroyo: - Já foi a Cacilhas.

O Orador: - Ainda n'esse caso eu lhe levo vantagem porque vou quasi todas as semanas ao Barreiro, que é um pouco mais longe, ainda que viajar em caminhos de ferro portuguezes não é menos perigoso do que dobrar o cabo dos Aromas.

Com estes dois illustres nautas, disse eu, vou dar um batalha naval em regra, mas unicamente ha de ser simulada, porque somos amigos e é conveniente que não haja destroços de navios, agonisantes que gemam, feridos que gritem, nem o estridor de balas verdadeiras. Para dar a batalha naval precisâmos definir os campos.

Como nos combates da esquadra azul contra a esquadra vermelha, na Inglaterra, nas manobras que todos os annos se realisam no mar do norte, onde ha sempre um jury composto de um presidente, almirante, e tres ou quatro vogaes, contra-almirantes, que decide e aprecia os resultados obtidos n'aquellas manobras; como n'essas batalhas, em que, embora não haja feridos, ha comtudo vigor a vida; como n'esses combates, lembrei-me, naturalmente, de tambem dar uma batalha naval tomando o sr. contra-almirante Ferreira Marques, para occupar o logar de presidente do jury e os seus collegas da commissão para e de vogaes, que n'este caso ficam sendo os taes quatro contra-almirantes. (Riso.}

É perante elles que vou dar a minha batalha naval o portem-se v. exa. como só portarem, tenho a convicção de que fico vencedor.

Eu com isto estou a ver mas é se defendo, quanto posso, os 2:800 contos, que vejo tão perdidos, como só fossem para o fundo do mar. Defendo-os o melhor que posso, porque se é mau não ter esquadra, ainda é peior gastar-se dinheiro em esquadras que não ficam, e depois não ter dinheiro para comprar esquadras que devem ficar, porque se gastou mal quando o havia.

Vamos então a ver, primeiro, se este projecto corresponde, ao monos, ao pensamento inicial de se adquirir uma esquadra de guerra, que se não poder impor-se ás primeiras potencias maritimas, pelo menos, nos permitta sustentar o nosso logar no concerto ou desconcerto, como quizerem, das potencias europêas, e depois, veremos só precisando-se de uma esquadra de guerra, os navios que por este projecto se vão adquirir satisfazem ás condições necessarias para serem ao menos o inicio de uma esquadra de guerra.

Agora, peço ao meu illustre amigo o sr. contra-almirante Ferreira Marques, que vá vendo como ponho a minha esquadra em linha de ataque e como faço uso da minha estrategia.

Note s. exa. que do uso de uma estrategia habil, resultam brilhantes victorias. Não viu s. exa., á ultima hora, como ella produziu aquelles embaraços na questão do caminho de ferro do Pungue? Não viu s. exa. como ella deixou o sr. ministro dos estrangeiros desnorteado? S. exa. verá se tenho rasão ou não.

V. exa. permittir-me-ha que me dirija algumas vezes ao sr. contra-almirante Ferreira Marques, não só porque me dirijo ao meu juiz, como pela muita consideração o respeito que s. exa. me merece pelo seu caracter honrado e pelos seus serviços ao paiz. Permitta-me, pois, v. exa. que faça a côrte ao meu juiz. (Riso.} Eu não estou a dizer nada que assim não seja, e não quero tomar tempo á camara, só não contava-lhe agora uma anecdota.

Vozes: - Conte, conte.

O Orador: - V. exa. instam, então lá vae.

As galerias não estão esmaltadas de senhoras, por isso conto.

Ha um nosso antigo collega, que é muito dado ao culto das damas. Já não esta, porém, no verdor dos annos, em que nós tudo sacrificâmos, os mais caros interesses, muitas vezes até a seriedade, para grangear o agrado das damas; por isso quando elle quer fazer a côrte a uma dama, faz com que algum amigo seu diga a essa dama por meios ardilosos que o pretendente tem ordens sacras, que não usa d'ellas, mas que as tomou em tempo. O pretendente põe-se do alcatéa, e se lhe perguntam se é certo elle ter ordens sacras, não desmente ou desmente fracamente, de maneira que não dá a entender que sim nem que não. D'isto conclue: se a dama continua a dar-me attenção vou em bom caminho, se me volta as costas desdenhosa, escuso de perder mais tempo. (Riso.)

Ora, ou espero que a minha côrte ao nosso illustre collega o sr. Ferreira Marques seja pelo menos tão feliz como

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a do caso que acabo de contar á camara, e entro na materia outra vez.

Se eu dispozesse as minhas baterias em linha de combate, como se usava nas antigas batalhas, e quizesse representar os diversos navios da minha esquadra, podia considerar, por exemplo, que o sr. Adolpho Pimentel, meu illustre amigo e relator do projecto, era um cruzador-torpedeiro, que o sr. ministro da justiça podia ser considerado um cruzador de combate que o joven sr. ministro da guerra, joven no cargo, que não na idade, que ainda assim é menor que a minha, se podia julgar como um cruzador guarda-costas, que o sr. ministro da marinha podia ser tomado como uma elegante canhoneira colonial, que o sr. ministro dos estrangeiros póde tomar-se muito bem como escola de moços e que finalmente o sr. ministro das obras publicas sempre, e recentemente, podia bem comparar-se ás gentis, corvetas de outr'ora. Compararia a presidencia a um couraçado inglez de grande lotação, julgaria os tachygraphos torpedeiros e os redactores como canhoneiras caça-torpedeiros, pois nos caçam os erros grammaticaes pondo ás vezes outros de sua lavra, e julgar-me-ia em Trafalgar.

Cingir-me-hei, porém, ao assumpto.

Vamos adquirir uma esquadra de combate. Nós sempre fomos uma pequena força para grandes esforços. Ora, para ver só os navios que se pretendem comprar correspondem ás exigencias da moderna estrategia e da tactica naval poderia dirigir-me nos srs. ministro da marinha o relator, e perguntar-lhes que especie de estrategia naval entendem s. exa. que deve empregar uma nação como a nossa, que não póde ter uma esquadra poderosa; Estabelecida essa estrategia qual será a tactica a seguir, porque conforme for a estrategia e a tactica assim hão de ser os navios.

Se um general se encontrar com muita infanteria, pouca cavallaria e pouca artilheria, manifestamente o plano de operações não será o mesmo do que se tiver forças rasoaveis de infantaria, as necessarias de cavallaria e muita artilheria. O plano de combate ha de necessariamente variar conforme a maneira como estiver composta a divisão ou o corpo do exercito.

Que tencionam s. exas. fazer? Querem dar as classicas batalhas navaes que antigamente só davam com as alterosas naus de tres pontos, em que os navios se formavam em linha compacta, procurando assim resistir aos fogos e aos embates do inimigo, ou proferem s. exa. o systema moderno dos ataques brancos em que o almirante Teguetoff tão brilhantes provas deu e tão bons resultados tirou na batalha de Lyssa, ou finalmente, preferem o combate a distancias determinadas em que se aproveita a superior velocidade do navio e a maior força de canhão de tiro rapido? Se preferem o antigo plano de batalha então hão de comprar navios de 14:000 ou 15:000 toneladas, que deitam 17 a 18 nós, com poderosissimos couraçados armados de esporões, uma esquadrilha de torpedeiros; se, pelo contrario, s. exa. se inclinam para a modernissima tactica naval prevista em França pelo almirante Fournier, preferindo o systema dos ataques bruscos aos combates de fogo a distancia, então hão de preferir os grandes cruzadores, munidos de canhões de tiro rapido.

Eu não sei se o sr. ministro da marinha ou o sr. relator me saberão responder. Se soubessem, eu iria mais longe e dirigir-lhe-ia algumas perguntas.

Se s. exa. querem os antigos combates do esquadra, vão procurar navios com couraças, que vão até 60 centimetros de espessura, mas se querem os combates a distancia, aproveitando velocidades superiores e fogo rapido, e n'estes ha dois systemas, o systema moderno, mas já antigo, da couraça completa, de protecção aos navios, e o systema modernissimo já experimentado, das bombas de grande capacidade explosiva, quasi segredo dos inglezes. N'este caso hão de adquirir os cruzadores repidos, inteiramente couraçados, mas para se conseguir este couraçamento completo, com grande velocidade, precisâmos ter...

{Interrupção que não foi ouvida.)

Então qual é a espessura de couraça que s. exa. querem?. Que especie de manobra querem iniciar na nossa esquadra para se bater com esses navios de grande couraça, e de grande velocidade?

Não se sabe nada. Nós sabemos que o governo e a commissão querem bater-se, querem uma esquadra de combate, (até ahi vemos nós os suas aspirações generosas e boas), mas como, é que não se sabe. E como não sabemos, vemo-nos em grandes embaraços para apreciar a qualidade dos navios que nos, propozeram.

Temos o typo Yoshino. É o cruzador protegido, de 4:150 toneladas com 350 pés de comprimento, 46 metros do largura, da força de 15:000 cavallos, podendo deitar 23 milhas, e accumulando 1:000 toneladas de carvão. Este navio monta 4 peças de e pollegadas de fogo rapido, 8 de 4,7 tambem de fogo rapido e 22 igualmente de fogo rapido. Este navio fez as suas provas na batalha de Yalu, a que já má referi, mas segundo as auctoridades maritimas mais competentes, podendo citar como taes é contra-almirante Fournier e o lord do almirantado, bem conhecidos pela sua alta competencia e illustração, o typo Yoshino já não está em condições de satisfazer completamente.

Este navio foi construido em epocha recente, não recentissima, mas anteriormente ao facto, ainda pouco conhecido n'outros paizes, conhecidissimo já em Inglaterra, e começado a conhecer na Allemanha e na Italia, da descoberta das bombas de grande capacidade explosiva.

O emprego d'estas perigosissimas armas do guerra que não são destinadas a furar couraças expessas, mas a penetrar nas partes menos defendidas dos navios, pela desordem que causam a bordo, destruindo os machinas, inutilisando todos os meios de manobras e desimando as tripulações, obrigam a pôr hoje de parte o typo Yoshino, que, por ser protegido incompletamente, não satisfaz ás necessidades de um navio de combate.

Está provado, que quando o navio disponha de facilidade de manobra, e de velocidade superior á do navio inimigo, basta uma couraça de 160 milimetros, porque a facilidade da manobra e a velocidade permittem que o navio não receba o fogo inimigo sento em anglo superior a 40° á normal do casco, e n'este caso os canhões mais potentes para romper couraças, não podem expelir projecteis que não sejam desviados logo pelo recochote, e desde que o angulo exceda a 60º, qualquer que seja a força dos canhões, não lhe podem causar damno.

Os navios de couraçamento completo, para não perderem na sua velocidade precisam de ser de grande tonelagem.

O Depois de Phomme francez, que é um cruzador de grande velocidade e de couraçamento incompleto, para ter o couraçamento completo conservando a mesma velocidade e o mesmo raio de acção precisa de chegar a 8:200 toneladas. Este é que é um navio de combate; mas o Yoshino já hoje não é navio de combate, e ainda menos o é o que se quer comprar, porque não é o Yoshino o que se quer comprar, é um cruzador typo Yoshino, mas typo Yoshino reduzido, isto é, um cruzador que se approxima do typo Nueve Julio, da republica argentina, a bordo do qual eu já estive em Cabo Verde.

O Nueve Julio é de muito menos poder do que o Yosshino; tem 354 pés de comprimento, a sua machina é de força inferior á do Yoshino, o seu couraçamento é mais fraco, tem uma velocidade normal reconhecida nas experiencias superior áquelle, mas accommoda menos carvão e por consequencia tem um raio de acção pouco menor. Se o Yoshino já é um typo insufficiente de navio de guerra, o que nós queremos comprar é insufficientissimo. Se nós

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queremos começar por uma marinha de combate, não devemos, portanto, começar por aqui.

Se o que nós queremos comprar é um intermedio entre o Yoshino e o Nueve Julio, isso vae custar-nos muito approximadamente 1:700 contos de réis, o que, para não ser nem navio de combate, nem navio colonial, é demasiado caro, e não é navio colonial nem navio futuro de combate, porque o navio futuro de combate ha de ser um cruzador de couraça espessissima até á linha de fluctuação, e mais fraca para cima por causa das bombas explosivas, ou então ha de ser uma canhoneira de grande velocidade.

Passemos ás canhoneiras-torpedeiros, typo Onyx, que representam o maximo erro, que póde praticar uma nação que tem pouco dinheiro para começar a ter marinha de guerra.

Km primeiro logar será a canhoneira-torpedeiro, typo Onyx, um navio colonial? Manifestamente, claramente, indiscutivelmente, não é. E eu digo os motivos porque não é.

Primeiro porque as canhoneiras typo Onyx não são forradas de cobre, e sendo navios de aço deterioram-se rapidamente no mar, enchendo-se de incrustações que lhes tiram a velocidade, aggravando-se sobre tudo esse mal nos mares coloniaes, onde ainda mesmo os navios forrados de cobre em pouco tempo estão n'estas condições.

Em segundo logar, por uma rasão que já disse, e é que sendo navios para uma pequena tonelagem, apenas 810 toneladas, tudo se sacrificou á velocidade, ao possivel raio de acção, e por conseguinte ao espaço para a machina e para as provisões de carvão, sendo absolutamente privados de alojamento que um navio destinado a estações coloniaes exige.

Finalmente o navio é todo elle uma machina delicadissima, que a cada instante está exigindo os maiores cuidados e grandes reparações. Basta dizer a v. exa. que o typo Onyx foi lembrado na Inglaterra em 1890 e depois do 1892 mais nenhum se construiu.

As canhoneiras d'esse typo acompanhando as esquadras inglezas em evolução no mar do norte, com todos os meios do reparação e com pessoal competentissimo o escolhido, depois de cinco dias de manobras, 30 por cento d'ellas estavam inutilisadas. Calculem por isto v. exa. o que acontecerá quando mandarmos um navio do typo Onyx para as nossas colonias, não tendo em Moçambique um arsenal, como deviamos ter, que era essencialissimo para a nossa marinha e até um meio de receita para as nossas colonias e quando desde Bombaim até ao Cabo da Boa Esperança não ha arsenal para navios de guerra, nem mercantes. Não tendo docas de reparação em Lourenço Marques, nem Loanda, nem em Mossamedes, nem na bahia dos Tigres, nem em Pemba, o que seria do typo Onyx dentro em pouco tempo? 30 ou 40 por cento dos navios estavam inutilisados.

Serão navios de combate? Tambem não são, pois estão para esse effeito absolutamente condemnados. Na marinha ingleza estão condemnados pelos factos e pela apreciação dos homens mais competentes. Pelos factos, porque pensando-se em construir navios d'este typo em 1890, foram effectivamente mandados construir sete, que estavam concluidos em 1892, mas depois d'isso a Inglaterra não mandou construir mais nenhum. E porque? Porque nas evoluções feitas pelas esquadras azul contra a esquadra vermelha se provou que o typo Onyx não era util como navio de combate.

Os inglezes, como disse a v. exas., pararam em 1892; já lá vão, portanto, quatro annos, e v. exas. sabem quanto, nos tempos modernos, vale um ou dois annos nos progressos da arte de navegação. Pois tendo a Inglaterra construido sete d'esses navios, todos do mesmo typo, depois d'isso não mandou construir mais nenhum.

Estes navios tinham por fim principalmente caçar torpedos e destruir torpedos inimigos navegando não isolados, mas ao abrigo das grandes esquadras e para seu serviço.

Ora, nós ainda não temos esquadra, mas vamos já comprar navios que não servem senão as acompanhar e defender, isto é, ainda não temos esquadra, mas vamos tratar já da sua protecção.

Porque foi que os inglezes abandonaram este typo de navios? Dil-o o relatorio do lord do almirantado inglez que eu vou ler n'uma má traducção portugueza que fiz do seu excellente inglez.

(Leu.}

O sr. Presidente: - Peço licença para observar a v. exa. que é decorrida a hora regimental durante a qual é permittido a qualquer sr. deputado usar da palavra.

O Orador: - Como tenho ainda quinze minutos de tolerancia concedidos pelo regimento para terminar o meu discurso, farei diligencia por concluir dentro d'elles o que me resta a dizer, embora se me conte o tempo que devia pertencer ao almirante inglez.

Os grupos das esquadras azues e vermelhas eram designados pelas letras A, B, C.

Porque é que o sr. ministro propoz a escolha do typo Onyx?

Agora vou concluir rapidamente em um quarto de hora o que tenho a dizer. V. exa. vão gastar mais 6:200 contos de réis em fazer uma esquadra de combate ou colonial. Mas onde estão os arsenaes? Será o arsenal de Lisboa onde na sua doca não cabe o cruzador Yoshino nem nenhum cruzador de dimensões rascaveis? Será o nosso Tejo, a respeito do qual se fazem os mais phantasticos devaneios, que nos vão custando as mais phantasticas despezas sobre a hypothese de uma phantastica defeza, que é quasi absolutamente impossivel para a nossa nação, com as nossas forças?

Um illustre official inglez que aqui esteve ha tempo, vendo o Tejo disse: mas como querem defender o Tejo com as fortalezas da margem norte, quando a largura do rio e a sua profundidade ao sul permitte perfeitamente, que uma esquadra de couraçados, possa passar e encostar-se ao sul, onde embora a attinjam mil balas, já não são capazes de lhe romper as couraças, mesmo com as poças mais modernas? Ems e collocando a 2:000 metros de distancia, já não ha projectil que rompa a couraça.

Dizia este official, que para defender o Tejo é necessario fortificar as duas margens desde a torre de S. Julião da Barra até ao pontal de Cacilhas, fazendo com que o Tejo seja uma perfeita abobada de fogo, o que com os cruzadores, com as obras da torre do Bugio, etc., não importará em menos de 15:000 a 20:000 contos de réis.

Quando os nossos combates navaes forem nas colonias, com a China, ou com outra qualquer potencia naval, em Angola, na India, em Macau, onde prover ás reparações dos estragos dos navios em combate; onde reparar as avarias que nos combates modernos são enormes e extraordinarias; em que arsenaes, em que docas; se nós não temos nada d'isso?!

Ora aqui está a rasão porque eu digo que só empenhem unicamente em ter uma marinha colonial, aquella que principalmente nos é necessaria, e que se não vão metter em aventuras de comprar uma divisão de combate, sem ter arsenaes, nem portos fortificados, nem pessoal, nada absolutamente.

Eis aqui a minha batalha naval, que foi, e é, unicamente ferida, no intuito de declinar a minha responsabilidade, em que os dinheiros do estado não se appliquem em mais um erro, como foi a compra do Vasco da Gama, da Affonso de Albuquerque, da famosa corveta Hanak e quasi todas as compras de navios que infelizmente temos feito e quo para pouco mais de nada nos têem servido.

Parece-me que tenho concluido, antes de acabar o meu

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quarto de hora, embora intercalado pela intervenção do lord do almirantado inglez.

Vozes; - Muito bem.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): - Vou responder em breves palavras ao brilhante discurso do illustre deputado, não de certo em todas as suas partes, porque s. exa. mostrou taes conhecimentos e tão profunda competencia e estado da materia em discussão, que com certeza é para sentir, que não faço parte da commissão technica, encarregada da escolha dos navios a adquirir.

Como s. exa. sabe, este assumpto é para mim um assumpto technioo, completamente desconhecido, e pelos muitos afazeres da pasta de que estou encarregado, tive necessariamente de soccorrer-me da competencia, de seriedade e de aptidão especial dos officiaes da armada real, que já encontrei constituídos n'uma commissão, especialmente incumbida de o estudar, e dar parecer sobre elle; por consequencia, poucas considerações poderei fazer, mas o que desde já digo ao illustre deputado, é que de certo s. exas. não teria alongado tanto as suas considerações, se em tivesse tido tempo de o orientar sobre as intenções, ou providencias que têem de se tomar, acerco do organisação da nossa marinha de guerra, cuja solução está commettida a uma commissão technica que funcciona regularmente na secretaria a meu cargo.

Esta commissão foi nomeada para apreciar as propostas apresentadas por diversas casas constructoras para o execução do fornecimento ao estado dos tres navios de guerra de que falla o projecto. Eu, porém, entendi que á commissão de technicos se devia commetter uma missão mais larga, que era especialmente estudar a organisação da nossa marinha de guerra, sob o ponto de vista colonial e sob o ponto de vista de combate, como defeza da nossa existencia territorial, e necessidade da nossa representação.

O problema foi posto d'esta fórma e a solução d'elle confiada, como disse, a uma commissão de technicos, que deve ver qual será e como deve ser constituida a nossa marinha colonial e a nossa, marinha de guerra, duas marinhas distinctas, com condições de existencia differentes, e a que é por igual necessario acudir.

No relatório que precede o projecto e ao qual tão amaveis referencias dirigiu o illustre deputado, claramente se diz que, como nação pequena que somos, não devemos ter a pretensão de luctar com grandes potencias, mas que temos, comtudo, o indeclinavel dever de adquirirmos alguns elementos maritimos de poder militar sufficiente para que, quando não possamos repellir um acto de violencia, possamos ao menos protestar e fazer hesitar, e muitas vezes hesitam, nas grandes potencias, quando as pequenas têem meios, não de resistir, mas pelo menos de protestar e defender até um certo limite a sua neutralidade ou o seu direito de soberania.

Isto não é um facto absolutamente indifferente, e s. exa. que tantas vezes tem gerido os negocios publicos, no exercicio das mais altas funcções do estado, sabe perfeitamente que muitas vezes a simples existencia de elementos militares de um certo valor evita um acto de violencia, que se praticaria havendo a certeza de que não podia ser repellido, mas que se evita quando ha a convicção de que se vae encontrar uma resistencia, que se póde dominar muitos vezes é certo, mas que perturbaria a paz geral.

Sr. presidente, que nós não podemos ter pela insuficiencia dos nossos recursos os meios necessarios, os elementos precisos para nos defendermos energicamente contra a invasão de uma esquadra poderosa, allemã, ingleza ou russa é manifesto, mas entre este facto e a certeza de poder entrar impunemente pela nossa barra de Lisboa e caminhar sem um vislumbre de resistencia vão um grande passo.

Se não podemos attingir a inexpugnabilidade que tanto seria para desejar para efficacia da defeza nacional, podemos ter, todavia, os elementos de combate precisos para que quando se pretenda exerceer sobre nós qualquer violencia, só saiba que essa violencia ha de encontrar, a coadjuvar-nos, fornecendo todos os meios de acção, o patriotismo do paiz.

A constituição, portanto, de uma marinha de guerra não é uma pretensão fatua, nem uma veleidade sem fundamento politico, sem alcance internacional e até mesmo sem valor para a nossa economia nacional.

Se se podesse calcular quantas indemnisações, quantas violencias, quantas prepotencias nos têem sido impostas o temos soffrido para afastar ameaças imminentes que poderiam trazer desastrosos effeitos para o paiz, e se tivessemos em attenção que a maior porte d'essas ameaças ficariam sem effeito ou poderiam encontrar nos governantes serenidade de animo bastante para lhe resistir quando houvesse os meios de acção precisos porá fazer suspender um ataque imminente, esse calculo, traduzido em meios financeiros, representaria por certo um enorme sacrificio em desfavor ao thesouro, e é exactamente como um meio de evitar a repetição d'essas violencias, que a marinha de guerra tem uma poderosa influencia na economia nacional e nas finanças do estado.

Figuremos um facto. Um paiz ameaça-nos de uma expropriação, ou de um acto violento que importa sempre diminuição do nossa riqueza nacional. Temos meios de resistir-lhe? Se temos, podemos fazel-o, amimando que estamos dispostos a declarar-lhe a guerra, empenhando-nos n'uma lucta, embora possamos sair vencidos, e esse davia certo que paiz, que pretende espoliar-nos, hesitará certamente ante a declaração de uma guerra, cujos resultados; embora seguros para elle, n'um momento restricto, examinando a questão sob um ponto de visto mais largo das relações internacionaes, póde occasionar graves complicações nas relações diplomaticas d'esse paiz com outras potencias da Europa.

Toda a gente sabe que se se podér entrar impunemente no Tejo, sem haver um navio de guerra ou uma peça de artilheria capaz de suspender o ataque de um navio estrangeiro, as ameaças serão faceis de fazer e igualmente faceis do executar; mas tal não succederá se houver quaesquer meios de resistencia a oppor-lhe.

Se a marinha colonial é indispensavel para a policia das costas e para a affirmação da nossa soberania perante os povos gentilicos das regiões que nós avassallámos e em que exercemos soberania, não ha duvida nenhuma tambem em que a marinha militar tem uma alta importancia, pois representa para a nosso dignidade e até para a nossa economia, como acabei de demonstrar n'um singelo exemplo, um, elemento de alto valor.

É absolutamente indispensavel que saiamos d'este desanimo, d'este desalento, que nos tem tolhido o passo por diversas vezes. É preciso que a camara saiba, que não é uma innovação a tentativa da reconstituição da nossa marinho de guerra; diversas tentativas se têem feito, têem-se elaborado projectos, muitissimos concursos se têem aberto e a final quando se pretende realisar a adjudicação da construcção e de acquisição de navios, surgem difficuldades, levantam-se embaraços, umas vezes independentemente da vontade dos governantes e devido a causas superiores, outros vezes por disputas e questões que surgem e fazem desviar os attenções do objecto principal. O facto, porém, é que desde a acquisição do couraçado Vasco da Gama até hoje, nada temos feito em relação á reconstituição do nossa marinha de guerra, chegando ao lastimoso estado, que o illustre deputado descreveu com cores tão vivas e eloquentes, que eu me abstenho de demonstrar, porque é um facto de verificação directa.

O governo, ao tratar do questão da acquisição de navios, podia ter começado effectivamente por adquirir navios sob o ponto de vista de policiamento das nossas cos-

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tos e da affirmação da nossa soberania perante os povos indigenas, mas a verdade é que, se para o policiamento das costas e para o serviço colonial temos poucos navios, alguns entretanto temos, emquanto que sob o ponto de vista da marinha de guerra propriamente dita apenas temos um navio, e esse já perfeitamente demodé, como o illustre deputado reconheceu.

N'estas circumstancias, pareceu-me que era mais urgico acudir á marinha militar ao que á marinha propriamente colonial, mesmo porque esta se vae dia a dia melhorando.

Como o illustre deputado presenciou e apreciou, com superior criterio, nas colonias, a marinha militar de mais valor, a que mais efficazes, melhores e mais uteis serviços ali póde prestar, são as pequenas lanchas a vapor, pois são estas unicamente as embarcações que podem entrar nos pontos, que demandem pequeno calado de agua.

Essas pequenas lanchas, tripuladas com pequeno numero de marinheiros e facilmente manobraveis, prestam grandes serviços n'esses pontos e d'ellas temos adquirido grande numero e estamos constantemente a adquirir, conforme, as exigencias as vão reclamando.

De resto, não se póde fazer a discriminação entre marinha de combato e marinha colonial com um caracter tão absoluto como s. exa. deseja. A marinha militar não é destinada exclusivamente á defeza do nosso extenso litoral europeu, assim como tambem não é exclusivamente destinada ao combate com grandes esquadras.

Nós não podemos ter a pretensão de ser um paiz essencialmente militar. Devemos procurar por todas as fórmas evitar um conflicto pelas armas, conflicto em que naturalmente não teriamos elementos que nos garantissem uma boa solução, mas o que nós temos, principalmente, é necessidade de poder manter a nossa neutralidade no caso de conflicto entre as grandes potencias.

N'um paiz como o nosso, que tem portos a que affluem navios de guerra de muitas nações e onde ha grandes interesses internacionaes em lucta, é da mais alta conveniencia poder o governo dispor do um navio de grande velocidade com grande poder militar, que possa impor-se pelo respeito e manter a neutralidade das aguas onde estiver representando a nação, cuja soberania é mister fazer respeitar. Esta missão que pertencerá marinha militar propriamente dita, não é missão do marinha colonial; tem e ser desempenhada por navios que disponham do um certo raio de acção e de uma grande velocidade para poderem deslocar se rapidamente de um para outro ponto, consoante as necessidades do serviço, e que tenham um poder militar capaz de se fazer respeitar, ainda pelos mais poderosos navios de guerra.

Nós, obedecemos principalmente á orientação de que alem de uma marinha militar propriamente dita, com o objectivo da defeza das nossas costas e portos, e alem de uma marinha colonial tambem com o objectivo principal de policia, fiscalisação e manutenção da nossa soberania nos vastos e extensos territorios ultramarinos que possuimos, temos tambem a desempenhar a funcção especialistas da manutenção da nossa neutralidade e do respeito pela nossa soberania, perante os navios de grandes potencias estrangeiras.

Sem entrar em considerações de alta estrategia e tactica de guerra naval e attendendo simplesmente a esse serviço a que todos os dias temos que satisfazer, afastando para longo o pensamento do uma batalha em que houvessemos de empenhar-nos, para só attender a uma necessidade diario reconhecida por quem gere a pasta da marinha, que desejando, como me tem succedido, ter a cada momento prompto um navio que, dispondo do grande velocidade, podesse sor enviado com rapidez a um ou outro ponto, onde pela sua simples presença e pelo poder militar de que dispozesse, podesse fazer respeitar o assegurar a soberania nacional, manter e defender o nosso direito e a nossa neutralidade, pergunto ou se para desempenhar
todas estas funcções de uma altissima importancia não satisfará o espirito critico do illustre deputado, a sua orientação, o seu provado saber technico, os navios que a commissão de technicos submetteu á apreciação do governo, que sobre o parecer d'essa commissão elaborou a presente proposta de lei?

Parece-me que tanto o cruzador como as canhoneiras do typo Onyx, que não é mais que um pequeno cruzador, que serve tambem para o lançamento de torpedos, corresponde exactamente ao fim que se tem em vista, e s. exa. sabe melhor do que eu, que o facto de se dizer que serão do typo Onyx, não quer dizer que os navios a adquirir sejam precisamente modelados conforme esse typo, sem nenhum melhoramento, sem nenhum additamento, sem nenhuma modificação. Designe-se um typo, mas isso não representa nas suas minudencias e especialisações tudo quanto possa vir a adquirir-se.

Para abrir um concurso para a construcção de navios de guerra havia dois processos a seguir, ou se havia de organisar um caderno do encargos determinando-se precisamente o que se queria, a determinação dos navios, a sua velocidade, o seu raio de acção, o seu poder militar, o seu movimento, emfim, todas as condições, desde a mais generica até á mais especial, e pedir a respeito d'este caderno do encargos o preço ás casas constructoras, e para isso era necessario inventar um typo de navios, ou então o governo e a commissão haviam de ir aos typos já conhecidos e experimentados, e escolher de entre elles aquelles que entendesse mais apropriados ao fim que se tivesse em vista.

Ora, inventar um typo de navio moderno, ou mesmo alterar fundamentalmente as condições de construcção até agora conhecidas, é a resolução de um dos mais difficeis problemas de construcção naval que podia dar-se, e em que podia chegar-se a um bom resultado, ou a um resultado absolutamente nullo, isto é, adquirir-se um navio que não satisfaça a nenhuma das condições exigidas, porque o problema resulta da combinação entro todos os elementos que constituem um navio, como são o seu comprimento, a sua altura, a sua capacidade, o seu poder militar, raio de acção, etc. Este problema, como v. exa. muito bem sabe, é de uma altissima difficuldade, e quando qualquer constructor inventa e apresenta um typo de construcção novo, não pôde ter a certeza de que na pratica esse invento satisfaça á solução que elle pretendia achar.

Ora, como nós não podemos estar a fazer experiencias, porque não temos pratica nem sciencia de construcção, porque ninguem ia inventar um typo de navios d'esta ordem, ou haviamos de organisar um caderno de encargos, ou haviamos de ir pedir esse caderno a qualquer casa constructora e, confiados na sua probidade, escolhermos um certo typo que represente o problema já resolvido, experimentado e garantido pela pratica, introduzindo-lhe as modificações que se entendessem. Foi este o processo que a commissão technica entendeu seguir, e foi n'estes termos que o concurso se abriu.

O que é certo é que as propostas apresentadas introduzem no typo Yoshino melhoramentos importantes e alterações fundamentaes com relação á velocidade do navio, ao seu poder defensivo «e de ataque, ao seu raio de acção e á sua capacidade para o alojamento da guarnição. Resolvido o problema, é claro que a questão se resume em encontrar solução a respeito de uma ou de outra circumstancia mais especial, que já não é o conjuncto total em que possa haver duvidas. Depois de haver um typo escolhido, é facil mesmo corrigir os defeitos -introduzir-se os melhoramentos necessarios. Essa proposto, apresentada á commissão technica, veiu acompanhada de diversos melhoramentos sob varios pontos de vista, que são tambem um elemento importante de apreciação para a commissão, que ella ha de considerar como entender, na organisação do programma para a escolha dos navios,

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Agora permitta-me o illustre deputado dizer-lhe que a canhoneira, typo Onyx, não é propriamente um destroyer.

(Interrupção ao sr. Marianno de Carvalho gue não se ouviu.}

A canhoneira destinada a defender a nossa esquadra contra os torpedeiros inimigos não é propriamente um destroyer. Não posso agora descrever detalhadamente os exercicios feitos pelas esquadras francezas, em que a tactica seguida foi esta. Os couraçados traziam uma flotilha de destroyer, contra-torpedeiros, para defendel-a dos ataques dos torpedeiros, e por outro lado atacava os couraçados uma flotilha de torpedeiros, commandada por uma canhoneira, typo Onyx.

Qual é a rasão da necessidade do navio? O destroyer é um barco que não pôde, mesmo no alto mar, desenvolver a sua velocidade, pois basta que haja um pequeno temporal para se embaraçar, e em breve pôr em risco a sua propria segurança o a da guarnição.

Qual é a rasão por que uma esquadra ou flotilha de torpedeiros deve ser commandada par uma canhoneira, typo Onyx? Se os torpedeiros avançam, e são presentidos pela esquadra, ella lança immediatamente os caça-torpedos, os destroyers, que têem um grande poder militar contra o torpedeiro que não tem couraça o se o alcança, este é immediatamente afundado. O torpedeiro foge, por consequencia, do destroyer, não se bate com elle; e, para lhe cobrir a retaguarda, e defendel-os dos ataques do destroyer, é que apparece a canhoneira-torpedeiro, que se impõe a este ultimo, porque tem poder militar muito superior e, embora não tenha a velocidade do destroyer, tem velocidade sufficiente para acompanhar o torpedo e para lhe cobrir a retirada. Aqui tem o illustre deputado qual é o destino especial que se dá a estes navios.

O cruzador tem por fim fazer a nossa representação nos portos coloniaes, mas não se conserva ali permanentemente porque não é navio de estação.

As canhoneiras, typo Onyx, uma d'ellas será destinada a chefe de um grupo do torpedeiros e a outra o navegar nas costas do paiz, accumulando com a sua funcção militar, propriamente dita, em tempo de paz, a acção de fiscalisação, e v. exa. comprehende bem os excellentes resultados que d'essa fiscalisação se podem tirar.

Eis as rasões, summariamente expostas, que levaram o governo a apresentar á camara a sua proposta de lei, que depois foi convertida no projecto que se discute.

Devo ainda declarar que o projecto da commissão, sem approvar nem reprovar os typos dos navios a adquirir, deixou ao governo a plena liberdade da escolha, baseando-se simplesmente no modello que partiu da commissão technica.

O que posso garantir á camara é que na escolha d'estes typos, que primitivamente tinha sido fixada, assim como a proposito de qualquer alteração que n'ella se julgue conveniente fazer, em vista de nova orientação, é que a applicação do dinheiro destinado á compra dos navios ha de ser feita com todo o cuidado e zêlo, tendo sempre em vista os maiores interesses do paiz, orientando-me, é claro, na opinião dos technicos e competentes, que para este effeito o governo nomeou por considerações de superior conveniencia.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Marianno de Carvalho: - Não levarei mais do que tres ou quatro minutos em responder a s. exa. o sr. ministro da marinha, porque não desejo prolongar o debate.

A camara está sufficientemente esclarecida, e eu não teria dito grande parte das cousas que disse se não tivesse aprendido a ler em pequeno; mas como aprendi, li que o governo propunha a acquisição do navios de guerra nas condições que constam d'este projecto.

Effectivamente, a commissão não approva nem reprova manifestamente esta idéa; por consequencia, o que eu podia deprehender é que o governo tem na mente isto que está aqui escripto; mas vem agora o sr. ministro da marinha e diz que com o typo Onyx se póde fazer um navio que não seja exactamente o Onyx, mas que tenha 1:000 ou 1:200 toneladas, e que satisfaça aos fins desejados. Se isso é assim, então não dissesse que era o typo Onyx o escolhido, porque o typo Onyx está condemnado. A Inglaterra não construiu senão sete navios d'esse typo e de 1892 para cá não construiu mais nenhum. A Italia, a Allemanha, a Russia, a França, nenhum d'estes paizes escolheu esse typo para construir navios.

(Interrupção do sr. ministro da marinha que não se ouviu.)

Então já não é o mesmo typo Onyx, porque o typo Onyx é um typo perfeitamente definido.
O Onyx é um navio da força de 3:548 cavallos, não tem grande velocidade, mas note v. exa. que navios de pequena lotação podem deitar grande velocidade desde que se sacrifique todo o seu espaço disponivel á machina e deposito do carvão. Se v. exa., porém, nos dá um navio de 12 ou 15 milhas, não é typo Onyx. Typo Onyx é o que tem a velocidade tal, a força do tal, que só um andamento tal e o conjuncto d'estes elementos é que constitue o typo.

Parece-me que já lucrámos alguma cousa com esta discussão; é que o sr. ministro da marinha já está um pouco menos apaixonado pelo seu Yoshino e pelo seu Onyx. Ninguem faz mais alto conceito das qualidades de seriedade de s. exa. de que ou, mas não se me dá do apostar que quem propoz o typo Onyx foi a casa Barroux, ou outra similhante.

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): - O typo foi escolhido pela commissão de technicos, e esta é que fez um telegramma-circular ás casas constructoras pedindo informações.

Devo notar que n'essas propostas vem introduzidos melhoramentos importantes e consideraveis.

O Orador: - Mas o que eu noto não são aperfeiçoamentos, são reducções ou attenuações.

Quanto a empregar o typo Onyx como navio guarda-costas, incumbindo-lhe o serviço de fiscalisação aduaneira, eu peço licença para dizer que nunca se ha de fazer similhante cousa, nem se devo fazer. O typo Onyx & um typo delicadissimo, que está a cada momento carecendo de reparações e arranjos, que custa 50:000 libras, e ninguem vae empregar um navio n'estas condições no serviço de fiscalisação.

O sr. Ministro da Marinha (Jacinto Candido): - Eu não quero o navio para fazer fiscalisação; o que disse foi que podia ás suas funcções militares juntar as de fiscalisação.

O Orador: - E eu digo a v. exa. que pôde comprar o typo Onyx; mas o que nenhum ministro da marinha, nem nenhum conselho do almirantado consente, é em empregar um navio delicado, e que custa carissimo, no serviço da fiscalisação da costa do Algarve ou do Porto. Nem a Inglaterra, nem nenhum paiz, emprega navios d'estes como navios de fiscalisação.

Emquanto á defeza de Lisboa direi apenas uma cousa. Se qualquer nação estrangeira estivesse disposta a enxovalhar-nos, não ora pelo facto de nós termos dois, tres ou quatro cruzadores do typo Yoshino que ella havia de recuar.

A primeira cousa em que todo e qualquer governo deve pensar é em não se atrever a defender uma cidade, como Lisboa, quando não houver os meios sufficientes para isso.

Póde-se arriscar um navio no alto mar para salvar a honra da bandeira de uma nação; póde-se arriscar um exercito; mas o que não se arrisca é uma cidade inteira

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que, com os meios a que eu me referi, não póde ser completamente defendida.

O que eu digo é que para defeza das nossas colonias não bastam as pequenas lanchas que se estão fazendo, porque essas servem só para a policia dos rios e, quando muito, dos portos. Para a policia das costas, e isso deponde da colonia de que se trata, do que precisâmos é de outra cousa que o sr. ministro não tem, e que um cruzador carissimo não lhe dá; precisâmos de ter navios parecidos com as nossas antigas corvetas, embora em melhores condições nauticas, que tragam a bordo 400 ou 500 homens, de modo que, havendo navios distribuidos pelas nossas possessões, quando seja preciso mandar outra expedição a Moçambique ou á India, não haja necessidade de mandar contingentes do tropas da metropole, custando 2:000 contos de réis. Mandava-se reunir, por exemplo, no navio ancorado em Moçambique uma parte dos homens que estivessem a bordo do navio estacionado em Angola, e tinha-se logo 600 ou 700 homens de desembarque, o que os pobres chavendo de hoje não lhe dão. Os elementos que é preciso ter, portanto, para compor a nossa marinha colonial, são navios de lotação necessaria para deposito de guarnições e pequenos navios costeiros, que não são as lanchas do que s. exa. fallou.

Tenho concluido, porque não desejo tomar mais tempo á camara.

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

Posto á votação o artigo 1.º foi approvado, e seguidamente o resto do projecto.

O sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto n.º 98.

Leu-se na mesa a do teor seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 98

Senhores: - A vossa commissão de fazenda examinou, como lhe cumpria, as propostas de lei n.ºs 34-N, 34-0 e 34-P, que se referem á organisação da caixa geral de depositos, á creação da caixa de aposentações para trabalhadores assalariados, e á instituição do monte de piedade nacional, e do seu exame vos vem dar conta, tendo retinido em um só diploma os tres referidos projectos. A administração commum e a identidade de fins e aspirações das tres instituições que se propõem reger, davam a essas propostas uma tão estreita dependencia que a commissão, do accordo com o governo, julgou dever discutil-as conjunctamente e reduzil-as a um unico projecto de lei.

A commissão é de parecer que essas propostas merecem a vossa approvação; examinadas nos seus fundamentos e traços geraes revelam uma bem pensada tentativa para satisfazer necessidades que importam altamente á boa ordem social de toda a nação civilisada. Dar ao operario meio facil o seguro de fazer provisão para a velhice o crear um peculio que a si ou aos seus possa valer em momentos difficeis, libertal-o da usura, podendo soccorrel-o sob a garantia dos seus estreitos bens, com um proposito de caridade estreme, sem uma ganancia cruel, deixando que esses bens produzam tudo o que podem produzir em beneficio dos seus possuidores, collocar ao mesmo tempo não só estas instituições, mas os bens dos menores e os capitães da caixa economica em condições do independencia e de administração que, pondo-os ao abrigo das vicissitudes do thesouro publico, lhes assegurem todos os beneficios da protecção do estado, taes são os pensamentos que presidiram á elaboração das propostas que vimos discutindo, e que, traduzidas em leis, como agora só apresentam, por certo não podem deixar de merecer o vosso inteiro applauso.

Poderiamos esperar legitimamente que tão altas e provadas necessidades sociaes fossem satisfeitas por iniciativa particular? Dados os costumes nacionaes, seria uma imprudencia; é conhecida a inercia do nosso povo quando se cuida do instituições d'esta natureza. E, n'essas condições, ao estado cumpria tentar alcançar pelos seus meios o que por outra via se mostra duvidoso, e a solução não podia ser outra senão aquella que o governo propõe e que esta commissão acceita.

Não precisâmos alongar-nos em considerações que justifiquem essas propostas; importaria uma repetição do que vem dito no relatorio que as precede, em que com inteira clareza foram apresentadas as suas rasões fundamentaes. Mas devemos dar-vos conta das breves modificações que julgámos conveniente fazer-lhes.

A mais importante foi a que se refere a excluir das transacções da caixa geral as operações do seguros. A difficuldade de determinar de um modo efficaz a liquidação das perdas dos objectos segurados e outras considerações economicas, que por muito evidentes seria ocioso enumerai1, tornavam impossivel á commissão resolver sobre ponto tão grave com a promptidão que os trabalhos parlamentares reclamam e indicavam e seu afastamento da discussão n'este instante.

Julgou ainda a vossa commissão conveniente alterar o systema da cobrança da contribuição patronal, deixando que pelo estado seja adiantada annualmente á caixa geral até que a somma dos adiantamentos represente l por cento da somma das contribuições directas, liquidando-se então por cobrança no anno immediato. É de suppor que a importancia do imposto seja tão pequena nos primeiros annos que, fóra do systema que adoptámos, a cobrança annual representaria para todas as repartições publicas respectivas um trabalho que a cifra realisada não justificava.

As restantes modificações que fizemos ás propostas quasi só reduzem a alterações de redacção. Por isso nos dispensamos de as apontar, certos, como estamos, de que o vosso esclarecido criterio saberá vel-as o julgal-as, sem mais explicações da nossa parte.

Por todos estes motivos o pelos domais que constam das mencionadas propostas, a vossa commissão de fazenda, de accordo com o governo, tem a honra do submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Caixa geral de depositos e instituições de previdencia

CAPITULO I

Organisação dos serviços da caixa geral de depositas e instituições de providencia

Artigo 1.° A caixa geral de depositos e instituições de previdencia abrange os serviços relativos a:

Caixa geral de depositos;

Caixa economica portugueza;

Caixa de aposentações a trabalhadores assalariados;

Monte de piedade nacional.

Art. 2.° A administração superior da caixa geral de depositos o instituições de providencia incumbe a um administrador geral, que superintenderá em todos os serviços que lhe são commettidos.

§ unico. O actual director da caixa geral de depositos o economica portugueza fica sendo o administrador geral da caixa geral do depositos e instituições de providencia.

Art. 3.º Os serviços da caixa geral de depositos e instituições de providencia serão divididos em quatro repartições:

Contabilidade;

Caixa geral do depositos;

Caixa economica portugueza;

Caixa de aposentações e monte de piedade.

Em cada repartição haverá um chefe de serviços, e o demais pessoal que vae designado na tabella annexa a esta lei, com os vencimentos que ahi lhes são fixados.

§ unico. Os actuaes chefes de repartição da caixa geral de depositos e economica portugueza ficam sendo che-

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fes dos serviços respectivos na caixa geral de depisitos e instituições de previdencia.

Art. 4.° Os chefes de serviços, presididos pelo administrador geral, formarão o conselho de administração da caixa geral de depositos e instituições de previdencia. Este conselho funccionará mediante convocação do presidente, na qual se indicará o fim da reunião, devendo a convocação fazer-se quando o mesmo presidente a julgue necessaria, ou quando lhe for requerida por qualquer dos chefes de serviço; fará annualmente os relatorios dos actos de administração e contas da caixa; proporá ao governo as providencias que julgar convenientes, e poderá ser ouvido pelo governo ou pelo administrador geral sobre quaesquer assumptos referentes a essa instituição, especialmente sobre as modificações ou melhoramentos que pareça conveniente introduzir nos seus serviços.

Art. 5.° Haverá um conselho fiscal formado pelo presidente da junta do credito publico, que será o presidente, pelos directores geraes da contabilidade, da thesouraria e do commercio e industria, e pelo presidente da camara de commissão e industria.

§ 1.° O disposto n'este artigo só terá execução, quanto á presidencia, quando cessem as funcções do presidente que foi nomeado em virtude do decreto de 30 de dezembro de 1892 e que para todos os effeitos é mantido no exercicio do seu cargo.

§ 2.º O conselho fiscal terá as suas reuniões na séde da caixa geral de depositos e instituições de previdencia; assistirá o administrador geral ou chefe do serviço que for por elle designado; e fará as vezes de secretario o empregado da caixa que o mesmo administrador geral indicar.

Art. 6.° Ao conselho fiscal compete:

1.° Dar parecer sobre os relatorios dos actos de administração e contas da caixa, e bem assim sobre quaesquer providencias que o conselho de administração entenda dever propor ao governo;

2.° Propor, de sua propria iniciativa, as medidas que julgue convenientes para o melhor funccionamento da caixa;

3.° Dar parecer sobre todos os assumptos ácerca dos quaes o governo o queira ouvir.

§ unico. As funcções do conselho fiscal não dão direito a vencimento algum.

Art. 7.° Na cidade do Porto haverá uma delegação especial da caixa geral de depositos e instituições de providencia. Os serviços d'esta delegação ficarão a cargo de um chefe de serviços, e de demais pessoal do quadro que para ali for designado, nos termos dos regulamentos. Fóra de Lisboa e Porto são delegações da caixa geral de depositos e instituições de previdencia os cofres ou delegações da thesouraria do ministerio da fazenda.

CAPITULO II

Caixa geral de depositos

Art. 8.º A caixa geral de depositos arrecadará nos seus cofres, ou nos das suas delegações, todos os depositos em dinheiro, valores de oiro, prata, pedras preciosas e papeis de credito, que pela legislação actual lhe pertence guardar.

Art. 9.° Todos os depositos entrarão na caixa por meio de guias, passadas pelas auctoridades judiciaes ou administrativas, ou pelos directores e chefes das repartições que os ordenarem, declarando se n'ellas quem tem auctoridade para pedir o seu levantamento.

Art. 10.° O levantamento dos depositos effectuar-se-ha por meio de precatorio legal no praso de dez dias, a contar da sua apresentação na séde da caixa. Os precatorios que derem entrada nas delegações da caixa serão immediatamente remettidos á sua séde.

Art. 11.° O levantamento dos depositos só poderá ser reclamado nos cofres onde os mesmos depositos houverem sido efectuados. Quando, porém, não haja inconveniente para o serviço, o administrador da caixa poderá auctorisar o levantamento por cofre diverso d'aquelle onde se fez o deposito.

Art. 12.° A caixa geral de depositos abonará o juro de 2 por cento ao anno a todas as quantias em dinheiro que, em cumprimento do artigo 8.°, derem entrada nos seus cofres, ou nos das suas delegações pelo tempo que n'elles se conservarem alem de sessenta dias. Esse juro será calculado desde aquelle praso até o dia, inclusive, em que se apresentar o precatorio legal de levantamento.

§ unico. Os depositos de dinheiro em oiro poderão ser considerados como depositos de objectos, se assim se declarar nas respectivas guias, e n'este caso não vencem juro algum.

Art. 13.° Deixam de ser exigiveis, e revertem a favor dos lucros da caixa, os juros em divida, existentes ou que venham a existir na mesma caixa, que não forem devidamente reclamados no praso de tres annos, a contar da data do levantamento total dos depositos.

Art. 14.° O estado assegura, contra todos os casos de força maior ou fortuitos, a restituição dos depositos» effectuados na caixa geral de depositos ou suas delegações, em conformidade com a presente lei.

§ unico. O thesouro proverá a caixa geral de depositos dos fundos necessarios para occorrer de prompto a todos os encargos da mesma caixa.

Art. 15.° Nenhum tribunal, auctoridade, repartição publica ou funccionario poderá ordenar ou auctorisar depositos nos termos do artigo 8.°, fóra da caixa geral de depositos ou das suas delegações, sob pena de nullidade do deposito e de responsabilidade por perdas e damnos dos funccionarios que contravierem a esta disposição.

Art. 16.° São operações da caixa geral de depositos para applicação de fundos:

— adiantamentos de juros de quaesquer titulos de divida publica fundada que não estejam immobilisados perpetua ou temporariamente;

- emprestimos a curto praso sobre penhor dos mesmos titulos;

- emprestimos ao thesouro publico, nos termos e com as condições que regularem para a divida fluctuante do mesmo thesouro;

- emprestimos a corporações administrativas;

- compra de titulos da divida publica;

- desconto de letras de desamortisação e de marinha;

- adiantamentos de vencimentos a funccionarios publicos por conta do thesouro;

- emprestimo de fundos ao monte de piedade nacional;

- e as operações em conta de subsidios devidos por lei e descriptos no orçamento geral do estado como encargo regular e effectivo do thesouro, precedendo auctorisação especial do governo.

§ 1.° O juro, praso e demais condições das operações serão determinados segundo as circumstancias do mercado.

§ 2.° É auctorisada a caixa geral de depositos para reembolso dos seus creditos vencidos e não pagos, tanto de capital como do juros, e se assim convier aos seus interesses, não só a cobrar directamente, quando a pagamento, os juros dos titulos que garantam esses creditos, mas tambem a vender os proprios titulos.

Art. 17.° A caixa geral de depositos continuará a desempenhar os serviços relativos aos fundos de viação municipal, de instrucção primaria e desamortisação nos termos da legislação em vigor, e os demais, constantes d'esta lei ou que de futuro lhe forem encarregados.

Art. 18.° Fica auctorisada a mesma caixa a receber, em todas as suas delegações, depositos voluntarios, ainda mesmo de conta particular, destinados á compra de titulos de divida publica portugueza, acções o obrigações do

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banco de Portugal, acções e obrigações da companhia geral de credito predial portuguez, ou de outra qualquer sociedade anonyima de responsabilidade limitada, que tenham cotação na bolsa.

§ unico. Pelo encargo da compra, averbamento e remessa d'esses papeis de credito cobrará a caixa a commissão de l por cento sobre o valor do capital empregado.

Art. 19.° As misericordias, hospitaes, asylos e mais estabelecimentos de beneficencia, sobre cuja administração o governo exerce fiscalisação, poderão depositar na caixa geral de depositos os seus capitães, ou sejam em dinheiro, ou em papeis de credito. A caixa procederá, nas epochas respectivas, á cobrança dos juros ou dividendos dos papeis de credito depositados, lançando a sua importancia um conta do depositante, e por este, e pelo das quantias depositadas em dinheiro, abonará a caixa aos depositantes o juro liquidado nos termos e pela taxa estabelecidos para os depositos feitos na caixa economica portugueza.

Art. 20.º Quando, por qualquer operação ou serviço a cargo da caixa, esta haja de comprar papeis de credito que, em virtude de outra operação ou serviço, tenha para vender, ou vice-versa, a caixa poderá realisar directamente a compra o venda pela cotação do dia, cobrando a respectiva corretagem. Em todos os demais casos, a compra ou a venda será sempre realisada em praça, por intermedio de corretores de numero.

Art. 21.° Dos lucros auferidos pela caixa geral de depositos sairão as despezas da administração da caixa geral de depositos e instituições de providencia. O saldo constituirá fundo da caixa e será applicado ao desenvolvimento das suas operações.

CAPITULO III

Caixa economica portugueza

Art. 22.° A caixa economica portugueza continuará a reger-se pelos preceitos consignados na lei de 26 de abril de 1880 e na lei de 15 de julho de 1885, salvas as modificações estabelecidas na presente lei.

Art. 23.° A caixa economica portugueza continuará a abonar aos seus depositantes o juro de 3,6 por cento ao anno.

§ 1.° Fica, porém, auctorisado o governo, sobre proposta da administração da caixa geral de depositos e instituições do previdencia, ouvido o seu conselho fiscal, a alterar esta taxa de juro, entre os limites de 2 e 4 por cento ao anno, quando assim o reclame a justa conveniencia da instituição.

§ 2.° Qualquer alteração na taxa de juro será fixada pelo ministro da fazenda em decreto fundamentado.

§ 3.° A caixa economica portugueza poderá receber de cada depositante até um l conto de réis em cada anno economico, mas a totalidade do deposito não poderá exceder 3 contos de réis.

Art. 24.° A liquidação e capitalisação de juros é feita annualmente no dia 30 de junho de cada anno, e a respectiva escripturação dos juros capitalisados será tambem lançada annualmente por todo o mez de julho nas cadernetas dos depositantes, salvo impossibilidade justificada pelo chefe do serviço e reconhecida pelo administrador geral.

§ unico. As fracções de juros inferiores a 5 réis, encontradas, na liquidação annual do juros, em cada uma das contas correntes, revertem a favor dos lucros da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

Art. 25.° Os fundos da caixa economica portugueza não serão centralisados em cofre especial, nem geridos em separado dos da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

§ unico. Na escripturação da caixa geral de depositos e instituições de previdencia terão conta especial os depositos feitos na caixa economica portugueza, não havendo, comtudo, logar ao abono, que a caixa geral de depositos
fazia á caixa economica, do juro de 5 por cento ao anno pelas quantias depositadas em conta d'este, nos termos do artigo 12.° da lei de 15 de julho de 1885.

Art. 26.° Nas freguezias pertencentes á area administrativa em que estiver installada alguma delegação da caixa economica portugueza ou da caixa de aposentações a assalariados, poderá essa delegação promover a propaganda em favor da pequena economia, organisando commissões de pessoas idoneas, ou dirigindo-se para esse fim ao parocho, regedor ou professor de instrucção primaria da respectiva localidade.

CAPITULO IV

Caixa de aposentações para trabalhadores assalariados

Art. 27.° É creada uma caixa de aposentações para os trabalhadores assalariados de ambos os sexos, a qual fica sob a administração da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

Art. 28.° Esta instituição tem por fim crear pensões para os trabalhadores que se inscreverem como pensionistas da caixa, nas condições previstas por esta lei e respectivos regulamentos.

Art. 29.° São admittidos a inscrever-se como pensionistas todos os que forem portuguezes, tenham mais de quinze annos de idade, adquiram meios de subsistencia trabalhando por conta de particulares, mediante ordenado, remuneração ou salario, e não hajam direito a outra aposentação concedida pelo estado, por corporação do estado, ou por estabelecimento particular que conceda aposentações reconhecidas e approvadas pelo estado.

Art. 30.° A inscripção na caixa de aposentações é facultativa. Todos os trabalhadores que quizerem inscrever-se terão que pedir na séde ou delegação da caixa a sua inscripção, acompanhando o pedido de documentos que provem estar nas condições do artigo anterior.

§ unico. A caixa de aposentações tem a sua séde em Lisboa, na caixa geral de depositos; as delegações d'esta são tambem delegações d'aquellas.

Art. 31.° A todos os trabalhadores que forem inscriptos será entregue uma, caderneta nominativa, como titulo da sua admissão.

Art. 32.° O fundo da caixa de aposentações é constituido: pelas quotas mensaes dos pensionistas, e por uma equivalente importancia, saída dos lucros liquidos do monte de piedade, e completada, quando estes não cheguem, por uma contribuição patronal, nos termos dos artigos 38.° e 39.° da presente lei.

Art. 33.° Os pensionistas entregarão na caixa, ou nas delegações da caixa, as suas quotas; cada pensionista poderá fazer entrega de uma quota por mez; se, porém, preferir entregar mais de uma quota ao mesmo tempo, poderá fazel-o por conta dos mezes seguintes. Cada quota será lançada na respectiva caderneta.

Art. 34.° Para que se torne effectivo o direito do pensionista á aposentação, é necessario: que tenha entrado com quatrocentas e vinte quotas; que tenham decorrido os mezes a que essas quotas respeitam; o que haja completado cincoenta e cinco annos de idade.

Art. 35.° As quotas com que houver contribuido o pensionista que fallecer, haja ou não entrado no goso da aposentação, revertem a favor da viuva, e dos seus filhos ou herdeiros legitimados.

§ unico. O direito d'estes herdeiros ás quotas prescreve, todavia, quando não seja reclamado dentro dos tres annos seguintes ao fallecimento de pensionista.

Art. 36.° Todo o pensionista que, antes ou depois de gosar da aposentação, adquirir meios que lhe permittam viver independentemente dos beneficiou d'esta instituição, assim o deverá declarar á caixa que, verificando ser exacta a declaração, lhe restituirá as quotas com que houver contribuido, e o eliminará da lista dos pensionistas.

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§ 1.° O pensionista que não fizer aquella declaração dentro de um anno, a contar da data em que a devia fazer, perde o direito ás quotas.

§ 2.° Entende-se que se verifica a hypothese d'este artigo sempre que o pensionista venha a estar sujeito á contribuição patronal.

Art. 37.° Apurada, no fim de cada anno, a importancia das quotas entradas, e as dos lucros liquidos do monte de piedade, e verificando-se ser esta inferior, a administração da caixa enviaá á direcção geral das contribuições directas a indicação precisa da differença, a fim de ser lançada e cobrada como contribuição patronal.

Art. 38.° O estado garante a contribuição patronal. Recebida em qualquer anno a indicação a que se refere o artigo antecedente, o estado entrará logo com a sua importancia nos cofres da caixa, e desde que o seu desembolso attinja l por cento das contribuições predial, industrial e sumptuaria, ordenará o respectivo lançamento e cobrança, no anno seguinte, por addicionamento proporcional ás mesmas.

§ unico. Sobre a contribuição patronal não recairá addicional algum.

Art. 39.° São isentos de contribuição patronal, pelos seus respectivos impostos, os contribuintes cuja collecta de contribuição predial, industrial ou de rendas de casas seja inferior a 5$000 réis: e bem assim aquelles que tenham constituido ou venham a constituir, em beneficio dos seus trabalhadores, nas condições do artigo 3.°, caixas de aposentação, comtanto que as subvenções que annualmente derem para essas caixas não sejam inferiores ás collectas de contribuição patronal, a que aliás estariam sujeitos.

Art. 40.º A caixa geral de depositos e de instituições de previdencia administrará os fundos da caixa de aposentações de fórma a tornal-os productivos, nos termos das operações que lhe são proprias. Poderá tombem fazer emprestimos a qualquer pensionista da caixa de aposentações, ao juro de 5 por cento ao anno, até o limite da somma das quotas com que o mesmo pensionista tenha entrado na caixa, se mostrar que por doença ou falta de trabalho está temporariamente privado de meios de subsistencia.

§ 1.° Estes contratos não serão feitos por praso superior a seis mezes, mas até ao dia do seu vencimento poderão ser reformados por igual ou menor praso, e assim successivamente, se o pensionista pagar os juros respectivos.

§ 2.a Quando o devedor até o dia do vencimento não pague ou não reforme o contrato, perde todos os direitos inherentes ás quotas, que lhe houverem sido abonadas por emprestimo.

Art. 41.° O pensionista que antes do entrar no goso da aposentação mostrar impossibilidade permanente de trabalhar terá direito ou á restituição das quotas com que houver contribuido, ou a uma pensão annual, equivalente ao dobro do juro do capital d'essas quotas, apurado nos termos da liquidação dos depositas da caixa economica portugueza.

§ unico. Verificada a primeira hypothese d'este artigo, cessam os direitos estabelecidos no artigo 9.°

Art. 42.° A quota mensal dos pensionistas é fixada na importancia de 250 réis, e a aposentação na importancia de, 55$800 réis.

§ unico. As quotas e as pensões não podem ser penhoradas ou arrestados.

Art. 43.° A quota fixada no artigo anterior vigorará por dez turnos: no fim d'este praso, e só, posteriormente, em cada periodo de cinco annos, poderá ser alterada.

Art. 44.° Se em resultado das alterações previstas no artigo antecedente se estabelecer quota superior á fixada no artigo 42.°, os pensionistas da caixa de aposentações poderão pedir, no praso de tres mezes depois da alteração, a entrega das quotas com que hajam contribuido, acrescidas com os juros, liquidados pela fórma por que se liquidam os dos depositos da caixa economica. Igual direito terão os pensionistas, sempre que por outro motivo sejam alteradas os condições d'esta lei.

Art. 45.° As quotas e a contribuição patronal de que se trata não poderão em caso algum ser destinadas a fim diverso do estabelecido n'esta lei. As despezas de administração e gerencia da caixa de aposentações ficarão a cargo da caixa geral de depositos e instituições de previdencia.

CAPITULO V

Monte de piedade nacional

Art. 46.° É estabelecido um monte de piedade nacional sob a administração da caixa geral de depositos e de instituições de previdencia.

Art. 47.° O monte de piedade nacional tem o seu estabelecimento central na séde da caixa geral de depositos e instituições do previdencia; e terá em Lisboa e nos centros mais populosos do paiz as succursaes que se mostrarem necessarias.

§ unico. As delegações especiaes da caixa geral de depositos e instituições de previdencia serão tambem delegações do monte de piedade nacional.

Art. 48.° As operações do monte de piedade nacional consistem unicamente em emprestimos a juro modico, sob caução de objectos depositados na mesma instituição, com excepção de quaesquer papeis de credito.

§ unico. Os contratos de emprestimo serão feitos pelo praso maximo de seis mezes; não poderão ser de quantia inferior a 100 réis, nem conter fracção d'esta quantia.

Art. 49.° A taxa dos juros é variavel para as diversas especies de penhores; será fixada pela administração da caixa geral de depositos e instituições de previdencia, e não poderá elevar-se a mais de 7 por cento ao anno, sem expressa auctorisação do governo.

Art. 50.° Quando o contrato não for distratado ou reformado na data do seu vencimento, poderá o penhor ser vendido em leilão publico, sem dependencia de aviso ou qualquer formalidade.

§ 1.° Se o producto dos objectos vendidos em leilão não for bastante para o pagamento do emprestimo a que serviam de penhor e bem assim dos respectivos juros e mais despezas, não poderá a differenças ser, por outra fórma, exigida ao mutuario.

§ 2.° Se o producto do leilão exceder o que for devido por capital, juros e mais despezas, ficará em deposito o excedente para ser entregue ao mutuario ou ao seu representante legal.

§ 3.° Este excedente denomina-se bonus; não vencerá juros pelo tempo que estiver depositado, e, não sendo reclamado no praso de um anno, reverte a favor do monte de piedade.

Art. 51.° Os documentos que forem exigidos pelo monte de piedade para instruir as suas transacções serão isentos de sêllo.

§ unico. A correspondencia, marcada com o carimbo da administração do monte de piedade nacional, não é sujeita a sêllo postal.

Art. 52.° Nenhum emolumento, gratificação ou retribuição de qualquer natureza, poderá ser recebido do mutuario, alem do juro, premio de seguro e despezas previstas n'este decreto e nos regulamentos da instituição.

Art. 53.° Os empregados do monte de piedade nacional, que tiverem a seu cargo, directamente, os serviços de emprestimo, de avaliação e arrecadação de penhores, prestarão caução em dinheiro ou titulos da divida publica.

§ unico. A importancia das cauções a prestar será fixada pela administração do monte de piedade nacional, segundo a responsabilidade do respectivo serviço.

Art. 54.° O monte de piedade nacional terá os avalia-

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dores necessarios para as differentes especies de penhores, e os fieis de armazens que forem indispensaveis.

§ 1.° Os avaliadores vencerão uma percentagem sobre a importancia da quantia mutuada, e que será paga quando o emprestimo se distratar.

§ 2.° Se os objectos vendidos em leilão não produzirem a importancia do emprestimo com os respectivos juros e mais despegas, responderá o avaliador pela differença que houver.

§ 3.° O serviço dos leilões e a percentagem devida por este serviço serão regulados pela administração.

Art. 55.° O capital necessario para o regular funccionamento do monte de piedade nacional será fornecido pela caixa geral de depositos e instituições de previdencia, nos termos que forem annualmente determinados pelo governo, sobre proposta fundamentada da mesma caixa.

Art. 56.° Os lucros liquidos das operações do monte de piedade nacional serão applicados á sustentação da caixa do aposentações para os trabalhadores assalariados, nos termos da lei reguladora d'essa instituição; havendo sobras, applicar-se-hão aos emprestimos a que se refere o artigo seguinte.

Art. 57.° O monte de piedade nacional poderá acceitar legados, donativos, ou quaesquer subsidios de particulares ou collectividades destinados a emprestimos caucionados, mas gratuitos, feitos a pessoas pobres, nos termos que os regulamentos prescreveram.

§ 1.° A importancia d'esses legados, donativos ou subsidias não poderá, em caso algum, ter outra applicação, e é isenta do pagamento do contribuição de registo.

§ 2.° Se os emprestimos, a que se refere o presente artigo, não forem distratados nem reformados no seu vencimento, e por isso se houver de proceder á venda do penhor em leilão, será o producto d'essa venda, liquido das despezas respectivas, applicado a outros emprestimos da mesma especie.

CAPITULO VI

Disposições geraes

Art. 58.° A nomeação do pessoal da caixa geral de depositos e instituições de providencia será feita pelo ministro da fazenda nos termos seguintes:

- o logar de administrador geral, por nomeação do governo;

Os de chefes de serviços, por concurso documental, proferindo, em igualdade de circumstancias de tempo de serviço e habilitações litterarias os primeiros officiaes da caixa que tenham servido, com notoria competencia;

Os de primeiros e segundos officiaes, de entre os da classe immediatamente inferior, alternadamente por concurso e por proposta do administrador geral, baseada na antiguidade e no bom serviço prestado;

Os do amanuense, alternadamente por concurso por provas escriptas, tendo preferencia os concorrentes habilitados com o curso do commercio do 1.° ou 2.° grau.

§ unico. Emquanto existirem os actuaes temporarios, os vagas do amanuenses serão n'elles providas por antiguidade quando acompanhada do bom serviço.

Art. 59.° Os empregados actuaes não serão prejudicados nos seus direitos adquiridos quanto a categoria o vencimentos, tanto do actividade como de aposentação.

Art. 60.° O administrador geral tem a seu cargo a inspecção de todos os serviços da caixa; tomará as providencias convenientes para o seu bom desempenho, e despachará todos os processos relativos aos assumptos dependentes da mesma instituição.

§ 1.° O administrador geral é responsavel por todos os despachos que proferir. Poderá ouvir, quando o julgar conveniente, sobre os negocios que lhe forem affectos, a procuradoria geral da corôa e fazenda.

§ 2.° O administrador geral só poderá ser exonerado ou demittido do exercicio das suas funcções nos termos e pela fórma por que o podem ser os vogaes do tribunal de contas.

§ 3.° Nos seus impedimentos, será o administrador geral substituido pelo chefe de serviços mais antigo ou pelo que for indicado pelo governo.

Art. 61.° Os chefes de serviços são responsaveis pela informação dos processos que tenham de submetter a despacho e pela execução d'estes. Compete-lhes fiscalisar e dirigir os serviços das suas repartições, informar o administrador geral, e exercer todas as attribuições que os regulamentos especializarem.

Art. 62.° O demais pessoal é responsavel pela execução dos serviços que respectivamente lhe forem confiados.

Art. 63.° São applicaveis aos empregados da caixa geral de depositos e instituições de previdencia os disposições concernentes aos empregados das direcções geraes do ministerio da fazenda, emquanto não forem elaborados os regulamentos especiaes para execução d'este decreto.

Art. 64.° Para o desempenho dos novos serviços attribuidos á caixa geral de depositos e instituições de previdencia, serão nomeados os empregados especiaes que as necessidades de serviço reclamarem, em harmonia com os respectivos regulamentos. Esta nomeação será feita pelo governo sob proposta do administrador geral da caixa.

§ unico. Os empregados, a que se refere este artigo, serão despedidos do serviço quando não satisfaçam devidamente ás suas obrigações, e pela mesma fórma por que são nomeados.

Art. 6õ5.° Perante todos os tribunaes e repartições publicas, a caixa geral de depositos o instituições de previdencia, gosará da isenção de sellos e custas nos mesmos termos em que a tem a fazenda nacional.

Art. 66.° O governo publicará os regulamentos necessarios para execução d'esta lei.

Art. 67.° Fica revogada a legislação em contrario.

Quadro do pessoal da caixa geral de depositos e instituições de previdencia e respectivos vencimentos,

[ver tabela na imagem]

Vencimento de categoria Vencimentos de exercicio

Adolpho Pimenta = José Lobo = Teixeira de Sousa = Mello e Sousa - Adriano da Costa = Polycarpo Anjos - Teixeira da Vasconcellos = Manuel Fratel = Dantas da Gama = Jayme de Magalhães Lima.

N.º 34 - N

Caixa de aposentações a trabalhadores assalariados

É de ordem social a proposta de lei n.° 12. Tem por objecto uma instituição de providencia, tão util nos fins a que visa, que oxalá se torne praticamente de largo alcance. E, ao mesmo tempo, um incitamento á economia individual, um amparo que se abre aos que do seu esforço tiram mais escassos proventos.

Na sua generalidade, são as classes trabalhadoras constituidas por individuos que, não possuindo propriedade ou capitaes seus passam a vida assalariados á industria, ao com

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mercio, á agricultura ou aos labores domesticos. Chegado o termo da sua energia, vem a velhice encontral-os tão pobres como na mocidade, tendo a menos o recurso do trabalho para debellar os assaltos da miseria.

No decorrer da existencia, fatalmente se approxima o trabalhador d'esse futuro de infortunio, se uma acautelada previsão e não leva a economisar, sobre o producto do seu trabalho, o sufficiente para mais tarde se sustentar a si e
aos seus.

A caridade, tão nobre pelo sentimento que a determina, e tão expontanea no caracter piedoso do povo portuguez, não é, nem póde ser, solução bastante no problema do pauperismo.

Estimular o espirito de previdencia nas classes pobres, dotando-as com uma instituição que, sob a protecção do estado, garanta a rigorosa administração das suas economias, tornando productivos os seus esforços individuaes, tal é o fim a que tende a proposta de lei que submetto a vossa approvação.

Para que, alem dos beneficios materiaes, essa instituição possa desempenhar a sua alta missão moralisadora, incutindo, por meio do exemplo e do interesse, habitos de economia nas classes operarias, é necessario que, longe de se impor como uma extorsão fiscal, se abra livremente a todos os que quiserem capitalisar, para a velhice, as pequenas sobras dos seus salarios.

Á livre iniciativa do operario se deve deixar a sua entrada para a caixa de aposentações: a convicção e não a coacção o deve levar a fazer obra de previdencia e economia na sua vida de trabalho, para que adquira direito ás vantagens e garantias, que assim lhe ficam asseguradas. É a sua contribuição voluntaria, representada por uma quota mensal, diminuta, sobra o que a sua propria actividade produz durante os annos de validez, que lhe constitue direito a uma garantia de subsistencia quando a velhice o impossibilitar.

A considerações especiaes é, todavia, forçoso attender n'este assumpto.

Embora a aposentação do operario seja reduzida, como deve ser, ao indispensavel para as despezas elementares da vida, a somma das quotas, necessariamente exiguas, com que póde contribuir durante os annos de trabalho, e os respectivos juros accumulados pela administração da Caixa, representarão sempre um capital muito inferior, ao necessario para produzir o rendimento correspondente á pensão de aposentado. E a isto accresce que não seria justo, n'uma instituição d'esta ordem, fazer sempre reverter, a favor dos contribuintes que sobrevivem, o capital constituido pelas prestações dos que vão fallecendo.

Seria cruel que quando a morte de um operario deixa os seus ao abandono, paralysando o braço que os alimentava, a outros coubesse o producto das economias que representaram sacrificios communs da familia, ficando esta reduzida á minoria.

D'aqui dimana o outro fim, que com a creação d'esta instituição se pretende alcançar: a conservação das economias do trabalhador, não só como meio de acudir á invalidez da velhice, mas ainda como formação de um peculio que elle possa eventualmente levantar, se justificados accidentes da vida lhe tornarem isso necessario, ou, em caso de morte, deixar como herança á sua viuva e filhos ou herdeiros legitimarios, o que mais do que tudo lhe deve ser estimulo e satisfação.

E assim que, no tocante á receita formada pela quotisação dos operarios, o papel da Caixa se reduz ao de simples administradora d'esses quotas, que continuam a ser propriedade do pensionista, capitalisando-lhe os respectivos juros até chegar o periodo da aposentado. D'este modo, os juros accumulados entram na receita que tem de fazer face ás despezas das pensões; mas a somma das quotas fica em poder da caixa, para, em determinados casos, ser entregue ao proprio operario, ou aos seus herdeiros.

São estes os intuitos da proposta que faço: moralisação das classes trabalhadoras, estimulando-lhes o espirito de economia pelas vantagens que d'ahi lhes resultam; garantia de subsistencia na velhice aos que consumiram a vida n'um trabalho honrado; guarda e deposito das economias do pobre, de fórma a constituir-lhe um peculio, a que se possa soccorrer quando necessitado, ou que lhe seja disponivel a favor da sua familia mais proxima.

Abrindo-lhes assim uma clareira de esperança nos horisontes da vida, e pacificando-lhes o coração amargurado pela perspectiva da materia, a sociedade attrahe e anima as classes menos afortunadas, interessando-as na manutenção da ordem, base e garantia de todo o progresso social.

Evidente é, comtudo, que para realisar as aspirações que se contêem no pensamento d'esta instituição, absolutamente insufficientes são os meios fornecidos pela quotisação dos operarios.

Dada a relativa exiguidade dos salarios, que são o recurso exclusivo do operario, a sua quota terá de ser diminuta, não podendo nunca constituir por si só, nem ainda com a accumulação de juros, um capital que se approxime do necessario para assegurar uma pensão, embora reduzida ás strictas exigencias da vida.

Aos encargos da Caixa de Aposentações, e, em tanto quanto representarem em cada anno as quotas entradas n'essa Caixa, proponho, pois, que se destinem os lucros que se apurarem de uma outra instituição a que me vou referir: o Monte de Piedade Nacional.

São duas fundações que se devem amparar. Nem o Monte de Piedade, tão justificado como correctivo á usura, póde dar melhor applicação aos seus lucros, que o de subsidiar as classes trabalhadoras.

Mas talvez esses lucros não bastem; e os encargos da Caixa de Aposentações, rigorosamente calculados, não podem ficar a descoberto.

Para supprir a deficiencia que ainda possa haver, justo é que se recorra a uma contribuição patronal.

Agricultando os campos, explorando as minas, movimentando as fabricas, impulsando o commercio, emprega-se a vida dos trabalhadores em valorisar a propriedade, a industria, o capital alheio. Quando a idade ou a doença lhes faz cair dos braços os instrumentos do trabalho, alguma cousa ficou da sua obra que merece contemplação, para que uma vida de labor não tenha por desfecho inevitavel a fome, ou por unico recurso a esmola.

Não assenta esta contribuição em um principio novo. É o que ha muito o estado pratica, subsidiando a aposentação dos seus empregados, embora durante o serviço activo lhes satisfaça os vencimentos.

Para que o subsidio á Caixa se torne effectivo, é necessario que o operario concorra com a sua propria economia.

Uma differença ha, porém, na applicação que têem estes dois elementos de receita. As quotas do operario constituem um deposito, cuja propriedade lhe pertence, que por isso lhe será restituido se o reclamar, que passará mesmo, á sua morte, aos seus herdeiros mais chegados; é o juro d'essas quotas que, capitatisado, entra como funcção da pensão de aposentação. A equivalencia das quotas, fornecida pelos lucros do Monte de Piedade, e eventualmente supprida pela contribuição patronal, é toda ella destinada ás pensões de aposentação; constitue um fundo necessario ao movimento da propria Caixa, de que o operario não póde dispor, que nem levanta quando quer, nem transmitte quando morre; reverto de uns para outros pensionistas.

Tal é, nos seus traços substanciaes, a instituição que proponho.

Relativamente ao capital fornecido pelo operario, é,

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não só uma caixa de aposentações, mas tambem de subsidios e economias; no que se refere á applicação dos lucros do Monte de Piedade e da contribuição patronal, é exclusivamente uma caixa de aposentações, a cujo favor revertem as pensões dos operarios que fallecerem.

Essas pensões foram fixadas na importancia que pareceu necessaria para constituir um auxilio indispensavel na velhice do operario, e praticamente possivel, attendendo aos calculos a que se procedeu sobre as tábuas de immortalidade da Caisse nationale des retraites, fazendo-se a capitalisação á taxa de 5 por cento ao anno, e tendo-se em consideração que nem sempre o producto das quotas será devolvido por herança.

Podem circunstancias economicas, como as fluctuações da taxa do juro durante a capitalisação, e as leis ainda mal estudadas que regulam a mortalidade no nosso paiz, fazer variar as condições financeiras d'esta instituição, de fórma a determinarem a necessidade de alterações na importancia das quotas ou das pensões agora fixadas; por isso na proposta se consignam disposições que permittem corrigir, em dados periodos, o quantitativo e a proporção dos elementos que constituem as receitas, e os encargos d'esta fundação.

No regimen de liberdade que se estabelece, os direitos dos pensionistas ficam, porém, sempre a salvo.

Póde bem ter defeitos a instituição que lembro; se n'ella reconhecerdes, porém, uma aspiração generosa e justa, com a vossa illustração a aperfeiçoareis.

PROPOSTA

Artigo 1.° É creada uma Caixa de Aposentações para os trabalhadores assalariados de ambos os sexos, a qual fica sob a administração da Caixa Geral de Depositos o Instituições de Previdencia.

Art. 2.° Esta instituição tem por fim crear pensões para os trabalhadores que se inscreverem como pensionistas da caixa, nas condições previstas por esta lei e respectivos regulamentos.

Art. 8.° São admittidos a inscrever-se como pensionistas todos os que forem portuguezes, tenham mais dequinze annos de idade, adquiram meios de subsistencia trabalhando por conta de particulares, mediante ordenado, remuneração ou salario, e não hajam direito a outra aposentação concedida pelo Estado, por corporação da Estado, ou por estabelecimento particular que conceda aposentações reconhecidas e approvadas pelo Estado.

Art. 4.° A inscripção na Caixa de Aposentações é facultativa. Todos os trabalhadores que quiserem inscrever-se, terão que pedir na séde ou delegação da Caixa a sua inscripção, acompanhando o pedido de documentos que provem estar nas condições do artigo anterior.

§ unico. A Caixa de Aposentações tem a sua séde em Lisboa, na Caixa Geral de Depositos; as delegações d'esta são tambem delegações d'aquella.

Art. 5.° A todos os trabalhadores que forem inscriptos será entregue uma caderneta nominativa, como titulo da sua admissão.

Art. 6.° O fundo da Caixa de Aposentações é constituido: pelas quotas mensaes dos pensionistas, e por uma equivalente importancia, saida dos lucros liquidos do Monte de Piedade, e completada, quando estes não cheguem, por uma contribuição patronal, que recairá, sobre todas as pessoas que tenham alguem ao seu serviço, mediante, ordenado, salario ou qualquer remuneração.

Art. 7.° Os pensionistas entregarão na caixa, ou nas delegações da caixa, as suas quotas; cada pensionista poderá fazer entrega de uma quota por mez; se, porém, preferir entregar mais de uma quota ao mesmo tempo, poderá fazel-a por conta dos mezes seguintes. Cada quota será lançada na respectiva caderneta.

Art. 8.° Para que se torne effectivo o direito do pensionista á aposentação, é necessario: que tenha entrado com quatrocentas e vinte quotas; que tenham decorrido os mezes a que essas quotas respeitam; e que haja completado cincoenta e cinco annos de idade.

Art. 9.° As quotas com que houver contribuido o pensionista que fallecer, haja ou não entrado no goso da aposentação, revertem a favor da sua viuva, e doa seus filhos ou herdeiros legitimarios.

§ unico. O direito d'estes herdeiros ás quotas prescreve, todavia, quando não seja reclamado dentro doa tres annos seguintes ao fallecimento do pensionista.

Art. 10.° Todo o pensionista que, antes ou depois de gosar da aposentação, adquirir meios que lhe permitiam viver independentemente dos beneficios d'esta instituição, assim o deverá declarar á Caixa, que, verificando ser exacta a declaração, lhe restituirá as quotas com que houver contribuido, e o eliminará da lista dos pensionistas.

§ 1.° O pensionista que não fizer aquella declaração dentro de um anno, a contar da data em que a devia fazer, perde o direito ás quotas.

§ 2.° Entende-se que se verifica a hypothese d'este artigo sempre que o pensionista venha a estar sujeito á contribuição patronal.

Art. 11.º Apurada, no fim de cada anno, a importancia das quotas entradas, e as dos lucros liquidos do Monte de Piedade, e verificando-se ser esta inferior, a administração da Caixa enviará á direcção geral das contribuições directas a indicação precisa da differença, a fim de ser lançada e cobrada como contribuição patronal.

Art. 12.° O estado garante a contribuição patronal. Recebida, em qualquer anno, a indicação a que se refere o artigo antecedente, entrará logo com a sua importancia nos cofres da Caixa, e ordenará o lançamento e cobrança, no anno seguinte, por addicionamento proporcional ás contribuições predial, industrial, sumptuaria e de rendade casas.

§ unico. Sobre a contribuição patronal não recairá addicional algum.

Art. 13.° São isentos do contribuição patronal, pelos seus respectivos impostos, os contribuintes cuja collecta de contribuição predial, industrial ou de renda de casas, seja inferior a 5$000 réis; e bem assim aquelles que tenham constituido ou venham a constituir, em beneficio dos seus trabalhadores, nas condições do artigo 3.°, caixas de aposentação, comtanto que as subvenções que annualmente derem para essas caixas não sejam inferiores ás collectas de contribuição patronal, a que aliás estariam sujeitos.

Art. 14.° A Caixa Gorai de Depositos e de Instituições de Previdencia administrará os fundos da Caixa de Aposentações do fórma a tornal-os productivos, nos termos das operações que lhe são proprias. Poderá tambem fazer emprestimos a qualquer pensionista da Caixa de Aposentações, ao juro de 5 por cento ao anno, até o limite da somma das quotas com que o mesmo pensionista tenha entrado na caixa, só mostrar que por doença ou falta de trabalho está temporariamente privado de meios do subsistencia.

§ 1.° Estes contratos não serão feitos por praso superior a seis mezes, mas até o dia do seu vencimento poderão ser reformados por igual ou menor praso, e assim successivamente, se o pensionista pagar os juros respectivos.

§ 2.° Quando o devedor até o dia do vencimento não pague ou não reforme o contrato, perde todos os direitos inherentes ás quotas, que lhe houverem sido abonadas por emprestimo.

Art. 15.° O pensionista que antes de entrar no goso da aposentação mostrar impossibilidade permanente de trabalhar terá direito: ou á restituição das quotas com que houver contribuido; ou a uma pensão annual, equivalente ao dobro do juro do capital d'essas quotas, apurado nos termos da liquidação dos depositos da Caixa Economica. Portugueza.

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§ unico. Verificada a primeira hypothese d'este artigo, cessam os direitos estabelecidos no artigo 9.°

Art. 16.° A quota mensal dos pensionistas é fixada na importancia de 250 réis, e a aposentação, na importancia de 55$800 réis. .

§ unico. As quotas e as pensões não podem ser penhoradas ou arrestadas.

Art. 17.° A quota fixada no artigo anterior vigorará por dez annos; no fim d'este praso, e só, posteriormente, em cada periodo de cinco annos, poderá ser alterada.

Art. 18.° Se em resultado das alterações previstas no artigo antecedente se estabelecer quota superior á fixada no artigo 18.°, os pensionistas da Caixa de Aposentações poderão pedir, no praso de tres mezes depois da alteração, a entrega das quotas com que hajam contribuido, acresci das com os juros, liquidados pela fórma por que se liquidam os dos depositos da Caixa Economica. Igual direito terão os pensionistas, sempre que per outro motivo sejam alteradas as condições d'esta lei.

Art. 19.° As quotas e a contribuição patronal de que se trata não poderão em caso algum ser destinadas a fim diverso do estabelecido n'esta lei. As despegas de administração e gerencia da Caixa de Aposentações ficarão a cargo da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia.

Art. 20.° O governo fará os regulamentos necessarios para a execução da presente lei.

Art. 21.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 16 de março de l896. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.* 34-C

Monte de Piedade Nacional

Como vedes, intimamente relacionada com a proposta anterior está a fundação de um Monte de Piedade Nacional, que não só constitue, economicamente, uma fonte de receita para obtemperar aos encargos da Caixa de Aposentações aos Trabalhadores Assalariados, mas em si proprio encerra a vantagem de ser, para as classes pobres, um correctivo á usura.

Se pela creação da caixa de aposentações se garante ao trabalhador previdente a subsistencia na invalidez, com o estabelecimento de um Monte de Piedade, cujas operações se realisem sobre a caução de bens mobiliarios, e só com o premio indispensavel ao aproveitamento dos capitães mutuados, abre-se-lhe, para as crises transitorias de falta de trabalho ou de doença, um recurso, que, pelas suas moderadas condições, lhe será, em muito, valioso.

Vinculando estas duas instituições pela reversão dos lucros de uma para outra, o estado realisa um duplo beneficio ás classes menos abastadas; ao mesmo tempo, dá margem a que a piedade particular exerça a sua nobre acção, dotando o Monte de Piedade com fundos especiaes para emprestimos gratuitos a individuos, que de maior contemplação necessitem.

Vem de longe, dos fins, da idade média, dos alvores da renascença, que abriu a epocha moderna do capitalismo, a creação dos montes de piedade.

Foi em Pérouse, na Italia, no final do seculo XV, que se organisou o primeiro -monte de pietà - como um anteparo ás demasias da usura.

A instituição progrediu, generalisou-se, e no começo do seculo XVI, nas mais importantes cidades italianas, funccionavam, sob a protecção dos religiosos, os montes de piedade.

Entraram em lucta os interesses feridos, procurando lançar desfavor sobre o caracter moral d'estes institutos, o que não obstou a que, approvados no concilio de Latrão, definitivamente os auctorisasse uma bulla de Leão X, em 1515. Na propria Roma se creou então um monte de piedade, sob a protecção do Chefe da Igreja, cujas bases serviram de modelo a outros, e que a breve trecho alcançou um grau de prosperidade, até então desconhecido em estabelecimentos similares.

Generalisou-se depois esta instituição nos Paizes Baixos; ahi, a despeito dos mesmas luctas, desenvolveram-se os montes de piedade, pondo em evidencia os beneficios que produziam.

Seguiu-se a França, e pouco a pouco, sem embargo das difficuldades suscitadas, em toda a Europa se foram organisando estes estabelecimentos de economia social, com o caracter moralisador que verdadeiramente têem.

Não é só pela sua acção directa que os montes de piedade beneficiam a situação das classes trabalhadoras; é tambem pela influencia que exercem sobre a taxa do juro nos contratos de emprestimo sobre penhores, concorrendo, para que baixem a condições mais moderadas.

Já o decreto com força de lei de 30 de dezembro de 1892 alludiu á creação, entre nós, de um Monte de Piedade Nacional; não especificando, porém, os bases em que deveria assentar essa instituição, deixou esteril a idéa.

A supprir essa ommissão vem a proposta que faço. Por ella se acrescentam ás operações, já auctorisadas, para emprego do capital entrado na Caixa Geral de Depositos os emprestimos do Monte de Piedade Nacional. Para evitar as difficuldades que poderiam surgir da immediata e arbitraria determinação do capital a mutuar pelo Monte de Piedade Nacional, pareceu-me conveniente deixar a sua fixação ao prudente alvedrio da administração respectiva, que successivamente proporá ao governo o que mais consentâneo for com a prosperidade dos estabelecimentos officiaes, cujos interesses lhe cumpre zelar.

O fim humanitario e justo que se procura alcançar com esta proposta, o exemplo animador que resulta do progressivo desenvolvimento, e estabilidade de instituições similares em quasi todas as nações da Europa, e, finalmente, a realisação de um innegavel beneficio para as classes menos afortunadas, sem encargos directos para o thesouro, nem exigencia de sacrificios especiaes aos particulares, dão-me a esperança de que a approvareis, e de que nos seus proficuos resultados corresponderá o Monte de Piedade Nacional ao elevado intuito em que a sua creação se inspira.

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° É estabelecido um Monte de Piedade Nacional sob a administração da Caixa Geral de Depositos e de Instituições de Previdencia.

Art. 2.° O Monte de Piedade Nacional, tem o seu estabelecimento central na séde da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia; e terá em Lisboa e nos centros mais populosos do paiz as succursaes que se mostrarem necessarias.

§ unico. As delegações especiaes da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia serão tambem delegações do Monte de Piedade Nacional.

Art. 3.° As operações do Monte de Piedade Nacional consistem unicamente em emprestimos a juro modico, sob canção de objectos depositados na mesma instituição, com excepção de quaesquer papeis de credito.

§ unico. Os contratos de emprestimo serão feitos pelo praso maximo de seis mezes; não poderão ser de quantia inferior a 100 réis, nem conter fracção d'esta quantia.

Art. 4.° A taxa dos juros é variavel para as diversas especies de penhores; será fixada pela administração da Caixa Geral do Depositos e Instituições de Previdencia, e não poderá elevar-se a mais de 7 por cento ao anno, sem expressa auctorisação do governo.

5.° Quando o contrato não for distratado ou reformado na data do seu vencimento, poderá o penhor ser vendido em leilão publico, sem dependencia de aviso ou qualquer formalidade.

§ l.° Se o producto dos objectos vendidos em leilão

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não for bastante para o pagamento do emprestimo a que serviam de penhor, o bem assim dos respectivos juros o demais despezas, não poderá a differença ser, por outra fórma, exigida ao mutuario.

§ 2.° Se o producto do leilão exceder o que for devido por capital, juros o mais despezas, ficará em deposito o excedente para ser entregue ao mutuario ou ao seu representante legal.

§ 3.° Este excedente denomina-se bonus; não vencerá juros pelo tempo que estiver depositado, e, não sendo reclamado no praso de um anno, reverte a favor do Monte de Piedade.

Art. 6.° Os documentos que forem exigidos pelo Monte de Piedade para instruir as suas transacções serão isentos de sêllo.

§ unico. A correspondencia, marcada com o carimbo da administração do Monte de Piedade Nacional, não é sujeita a sêllo postal.

Art. 7.° Nenhum emolumento, gratificação ou retribuição de qualquer natureza poderá ser recebido do mutuario, alem do juro, premio de seguro e despezas previstas n'este decreto e nos regulamentos da instituição.

Art. 8.° Os empregados do Monte de Piedade Nacional, que tiverem a seu cargo, directamente, os serviços de emprestimo, de avaliação e arrecadação de penhores, prestarão canção em dinheiro ou titulos da divida publica.

§ unico. A importancia das cauções a prestar será fixada pela administração do Monte de Piedade Nacional, segundo a responsabilidade do respectivo serviço.

Art. 9.° O Monte de Piedade Nacional terá os avaliadores necessarios para as differentes especies de penhores, bem como os leiloeiros e fieis de armazens, que forem indispensaveis.

§ 1.° Os avaliadores vencerão uma percentagem sobre a importancia da quantia mutuada, e que será paga quando o emprestimo se distratar.

§ 2.° Se os objectos vendidos em leilão não produzirem a importancia do emprestimo com os respectivos juros e mais despezas, responderá o avaliador pela differença que houver.

§ 3.° Os leiloeiros terão uma percentagem sobre o producto dos objectos vendidos.

Art. 10.° O capital necessario para o regular funccionamento do Monte de Piedade Nacional será fornecido pela Caixa Geral do Depositos e Instituições de Previdencia, nos termos que forem annualmente determinados pelo governo, sobre proposta fundamentada da mesma Caixa.

Art. 11.° Os lucros liquidos das operações do Monte de Piedade Nacional serão applicados á sustentação da Caixa de Aposentações para os Trabalhadores Assalariados, nos termos da lei reguladora d'essa instituição; havendo sobras, applicar-se-hão aos emprestimos a que se refere o artigo seguinte.

Art. 12.° O Monte de Piedade Nacional poderá acceitar legados, donativos, ou quaesquer subsidios de particulares ou collectividades, destinados a emprestimos caucionados, mas gratuitos, feitos a pessoas pobres, nos termos que os regulamentos prescreverem.

§ 1.° A importancia d'esses legados, donativos ou subsidios não poderá, em caso algum, ter outra applicação.

§ 2.° Só os emprestimos, a que se refere o presente artigo, não forem distratados nem reformados no seu vencimento, e por isso se houver de proceder á venda do penhor ou leilão, será o producto d'essa venda, liquido das despezas respectivas, applicado a outros emprestimos da mesma especie.

Art. 13.º Fica o governo auctorisado a decretar os regulamentos necessarios para a execução d'esta lei.

Art. 14.° É revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 16 de março de 1896. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.* 34-P

Caixa geral de depositos e instituições de previdencia

A Caixa Geral de Depositos, organisada por lei de 10 de abril de 1876 para concentrar sob a garantia do estado os capitães cujo deposito é legalmente obrigatorio, e pela sua collocação prudente e segura lhes dar vida e reproducção lucrativa, veiu preencher uma grave omissão na economia social portugueza.

O estado anomalo em que anteriormente a essa lei se achava um tão importante ramo de serviços, trazia consideravel prejuizo a individuos e estabelecimentos a que o estado deve protecção. Disseminados por differentes cofres publicos, como os depositos de Lisboa e Porto e as caixas dos orphãos, ou entregues a simples depositarios particulares, em virtude da lei ou por despacho judicial, esses capitães, pelos riscos e abusos a que estavam sujeitos, ficavam inertes, esterilisada a sua força productiva de lucros, n'uma verdadeira aberração anti-economica.

Para obviar a todos esses inconvenientes, se fundou a Caixa Geral de Depositos, a exemplo de instituições similares que no estrangeiro funccionavam regularmente, com manifesto proveito para os depositantes.

Organisada sob a garantia do estado, com uma administração autonoma, a Caixa progrediu successivamente, pondo era evidencia as suas vantagens, a ponto de novos e importantes ramos de serviço serem addicionados aos que constituiam a sua primordial esphera de funcções.

O deposito e administração dos fundos de viação municipal, da Caixa Economica Portugueza, da instrucção primaria e da desamortisação, a guarda e recebimento de juros dos capitães e dos titulos pertencentes a estabelecimentos sobre que o estado exerce fiscalisação, e finalmente a compra de papeis de credito por conta de particulares, formam o quadro das principaes attribuições que lhe têem sido confiadas posteriormente á sua creação.

Desprendendo-a da acção directa do governo, como administradora e detentora de bons particulares, dotando-a como uma thesouraria independente para a recepção dos depositos, entregando a sua gerencia á Junta do Credito Publico com inteira liberdade na applicação dos seus fundos, dentro das operações fixadas na lei, para logo a organisação que se deu á Caixa Geral de Depositos attrahiu a confiança do publico. Em França, a organisação da Caisse des depôts et consignations foi mais longe, abrangendo a faculdade de nomear e demittir livremente o pessoal, e dando maior amplitude, ainda, ás operações a realisar.

O progressivo augmento de serviços, determinado pela creação de novas funcções, tornou necessario modificar a organisação primitiva. Para evitar as confusões de serviços, foram estes divididos por differentes repartições; para se alcançar a rapidez e uniformidade indispensaveis na resolução dos negocios foi a administração da Caixa deferida a um só administrador, junto do qual se formou um conselho, destinado a garantir, pela sua acção fiscal, os interesses confiados á instituição.

É esta, na sua essencia, a actual constituição da Caixa Geral de Depositos.

Uma modificação importante lhe fez, porém, o decreto de 15 de dezembro do 1887, supprimindo os cofres proprios da Caixa, que juntou aos do thesouro.

Não me parece que fosse de vantagem esta medida, que nem aproveita ao thesouro, nem ao credito que, por si, deve ter a Caixa Geral de Depositos.

Diminuindo as garantias de independencia d'esta instituição, mais a sujeitou ás oscillações do credito publico, fazendo-lhe perder, em muito, a natureza particular das funcções que exercia, a confiança especial que assim grangeára.

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Quando em 1891 appareceram os symptomas mais graves da crise financeira que o paiz tem atravessado, ao passo que alguns bancos e estabelecimentos commerciaes sustavam os seus pagamentos ou os retardavam, aproveitando-se da moratoria, geral concedida pelo governo, a Caixa satisfez sempre e promptamente á todas as exigencias dos seus depositantes. Apezar d'isso, os depositantes da caixa economica correram, em avultado numero, a levantar os seus depositos, receiando talvez que fossem absorvidos pelas instantes necessidades do thesouro; e ainda até hoje não attingiram esses depositos a importancia a que anteriormente haviam chegado.

No interesse da instituição se me afigura, pois, conveniente reattribuir á caixa os seus cofres proprios, para que tenha a devida, autonomia de acção.

As novas instituições, da Caixa de Aposentações a Trabalhadores Assalariados e do Monte de Piedade Nacional, tendo por objecto a conservação e aproveitamento de capitães particulares, entram de molde, como a Caixa Economica, já creada, na funcção e área de attribuições da Caixa Geral de Depositos. Impõem, todavia, a necessidade de uma reforma de serviços adequados ao regular implemento d'essas diversas attribuições. Assim, confiadas a repartições especiaes, e uniformisada a administração superior de todos esses serviços, de caracter essencialmente similhante, deve conseguir-se importante melhoria na organisação de uma instituição, a que se commettem funcções do tanto interesso para o paiz.

A classificação e divisão dos serviços, adoptada na proposta que apresento, deriva da natureza particular de cada um d'elles.

São estabelecidas quatro repartições: da Caixa Geral de Depositos; da Caixa Economica Portugueza; do Monte de Piedade Nacional e Caixa de Aposentações a Trabalhadores Assalariados; da contabilidade geral de todas as repartições.

Cada repartição será dirigida por um chefe de serviços com attribuições perfeitamente determinadas.

A direcção superior da Caixa é confiada a um administrador geral que, pela propria organisação e destrinça dos serviços, poderá n'elles superintender, apurando as normas e providencias a adoptar para o seu bom funccionamento, e tornando de prompto effectivas as responsabilidades que haja a impor.

A constituição do antigo conselho fiscal é tambem completamente alterada. O decreto de 30 de dezembro de 1892 dava-lhe attribuições tão indefinidas, que pequena acção podia exercer sobre o desenvolvimento d'esta instituição. Na proposta que faço, procuro obviar a esses inconvenientes, especificando as attribuições que competem ao conselho, e dando-lhe uma organisação que, não só pela competencia dos seus membros, como pela categoria official que lhes é propria, seja uma garantia de bom desempenho dos serviços, e uma salvaguarda prudente dos largos interesses que lhes estão inherentes.

E tambem areado o conselho de administração da Caixa. Composto pelo administrador geral e pelos chefes dos serviços das differentes repartições, que mais directo conhecimento têem das operações da Caixa, compete-lhe a elaboração dos relatorios e contas da gerencia, bem como formular as medidas que convenha propor aos poderes superiores para o successivo aperfeiçoamento dos serviços. Por esta fórma, sem se quebrar a indispensavel unidade da administração, torna-se mais regular e harmonica a organisação da Caixa.

O alargamento dos trabalhos da Caixa Geral de Depositos, provenientes das novas instituições, é de grande alcance, e, todavia, apenas augmenta o quadro do pessoal existente com mais um chefe de serviços. Está despeza, porém, que, aliás, não affecta o orçamento geral do Estado, porque sue dos lucros da Caixa, é compensada pela nova composição do conselho fiscal, cujos membros ficam todos exercendo gratuitamente as suas funcções.

As classes menos abastadas do paiz, cujos interesses tanto reclamam solicitude dos poderes publicos, ficam assim dotadas com duas instituições, ambas beneficentes, e de acção correlativa, sem que com isso se aggrave a situação do thesouro.

São estas as linhas geraes da reforma e organisação que proponho para os serviços da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia. Estabelecendo-se regras precisas sobre a applicação dos seus fundos, que constituem uma parte consideravel da fortuna publica, em operações de inteira segurança; consolidando-se o seu credito pela creação de cofres independentes; assente a divisão dos trabalhos em bases racionaes e justas; remodeladas as condições de uma fiscalisação effectiva e real; ampliada a sua acção benefica aos que mais necessitam da protecção do estado, - a Caixa Geral do Depositos e Instituições de Previdencia creio ficará em condições de satisfazer devidamente a missão que lhe compete na economia financeira do paiz.

PROPOSTA DE LEI

CAPITULO I

Organisação dos serviços da Caixa Geral de Depositos e Instituições do Previdencia.

Artigo 1.° A Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia abrange os serviços relativos a:

Caixa Geral de Depositos;

Caixa Economica Portugueza;

Caixa de Aposentações a Trabalhadores Assalariados;

Monte de Piedade Nacional.

§ unico. A organisação da Caixa de Aposentações a Trabalhadores Assalariados e a do Monte do Piedade Nacional são reguladas por leis especiaes.

Art. 2.° A administração superior da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia incumbe a um administrador geral, que superintenderá em todos os serviços que lhe são commettidos.

Art. 3.° Os serviços da Caixa Geral de Depositos o Instituições de Previdencia serão divididos por quatro repartições:

Contabilidade;

Caixa Geral de Depositos;

Caixa Economica Portugueza;

Caixa do Aposentações e Monte de Piedade.

Em cada repartição haverá um chefe do serviços, e o demais pessoal que vae designado na tabella annexa a esta lei, com os vencimentos que ahi lhes são fixados.

§ unico. Os actuaes chefes de repartição da Caixa Geral de Depositos e Economica Portugueza ficam sendo chefes dos serviços respectivos na Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia.

Art. 4.° Os chefes de serviços presididos pelo administrador geral formarão o conselho de administração da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia. Este conselho funccionará mediante convocação do presidente, na qual se indicará o fim da reunião; fará annualmente os relatorios dos actos de administração e contas da Caixa; proporá ao governo as providencias que julgar convenientes, e poderá ser ouvido pelo governo ou pelo administrador geral sobre quaesquer assumptos referentes a essa instituição, especialmente sobre as modificações ou melhoramentos que pareça conveniente introduzir nos seus serviços.

Art. 5.° Haverá um conselho fiscal formado pelo presidente da Junta do Credito Publico, que será o presidente, pelos directores geraes da contabilidade, da thesouraria e do commercio e industria, e pelo presidente da camara de commercio e industria.

§ unico. O conselho fiscal terá as suas reuniões na séde

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da Caixa Geral de Depositos e Instituições do Previdencia; assistirá o administrador geral ou chefe do serviço que for por elle designado; e fará as vezes de secretario o empregado da caixa que o mesmo administrador geral indicar.

Art. 6.° Ao conselho fiscal compete:

1.° Dar parecer sobre os relatorios dos actos de administração o contas da Caixa e bem assim sobre quaesquer providencias que o conselho de administração entenda dever propor ao governo;

2.° Propor, de sua propria iniciativa, as medidas que julgue convenientes para o melhor funccionamento da Caixa;

3.° Dar parecer sobre todos os assumptos ácerca dos quaes o governo o queira ouvir.

§ unico. As funcções do conselho fiscal não dão direito a vencimento algum.

Art. 7.° Na cidade do Porto haverá uma delegação especial da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia. Os serviços d'esta delegação ficarão a cargo de um chefe de serviços e de demais pessoal do quadro que para ali for designado, nos termos dos regulamentos. Fóra de Lisboa o Porto são delegações da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia os cofres ou delegações da tbesouraria do ministerio da fazenda.

CAPITULO II

Caixa Geral de Depositos

Art. 8.° A Caixa Geral do Depositos arrecadará nos seus cofres, ou nos das suas delegações, todos os depositos em dinheiro, valores de oiro, prata, pedras preciosas e papeis do credito, que pela legislação actual lhe pertence guardar.

Art. 9.° Todos os depositos entrarão na Caixa por meio de guias, passadas pelos auctoridades judiciaes ou administrativas, ou pelos directores e chefes das repartições que os ordenarem, declarando-se n'ellas quem tem auctoridade para pedir o seu levantamento.

Art. 10.° O levantamento dos depositos effectuar-se-ha por meio de precatorio legal no praso de dez dias, a contar da sua apresentação na séde da Caixa. Os precatorios que derem entrada nas delegações da Caixa serão immediatamente remettidos á sua séde.

Art. 11.° O levantamento dos depósitos só poderá ser reclamado nos cofres onde os mesmos depositos houverem sido effectuados. Quando, porém, não haja inconveniente para o serviço, o administrador da Caixa poderá auctorisar o levantamento por cofre diverso d'aquelle onde se fez o deposito.

Art. 12.° A Caixa Geral de Depositos abonará o juro de 2 por cento ao anno a todas as quantias em dinheiro que, em cumprimento do artigo 8.°, derem entrada nos seus cofres, ou nos das suas delegações, pelo tempo que n'elles se conservarem alem do sessenta dias. Esse juro será calculado desde aquelle praso até o dia, inclusive, em que se apresentar o precatorio legal de levantamento.

§ unico. Os depositos de dinheiro em oiro poderão ser considerados como depositos de objectos, se assim se declarar nas respectivas guias, e n'este caso não vencem juro algum.

Art. 13.° Deixam de ser exigiveis, e revertem a favor dos lucros da Caixa, os juros em divida, existentes ou que venham a existir na mesma Caixa, que não forem devia mente reclamados no praso de tres annos, a contar da data do levantamento total dos depositos.

Art. 14.° O estado assegura, contra todos os casos de força maior ou fortuitos, a restituição dos depositos, effectuados no Caixa Geral de Depositos ou suas delegações, em conformidade com a presente lei.

§ unico. O thesouro proverá a Caixa Geral do Depositos dos fundos necessarios para occorrer de prompto a todos os encargos da mesma Caixa.

Art. l5.° Nenhum tribunal, auctoridade, repartição publica ou funccionario poderá ordenar ou auctorisar deposito nos termos do artigo 8.°, fóra da Caixa Geral do Depositos ou das suas delegações, sob pena de nullidade do deposito e de responsabilidade por perdas e damnos dos funccionarios que contravierem a esta disposição.

Art. 16.° São operações da Caixa Geral do Depositos para applicaçao de fundos:
- adiantamentos de juros do quaesquer titulos de divida publica fundada que não estejam immobilisados perpetua ou temporariamente;

- emprestimos a curto praso sobre penhor dos mesmos titulos;

- emprestimos ao thesouro publico nos termos o com as condições que regularem para a divida fluctuante do mesmo thesouro;

- emprestimos a corporações administrativas;

- compra de titulos da divida publica;

- desconto do letras de desamortisação e de marinha;

- adiantamentos do vencimentos a funccionarios publicos por conta do thesouro;

- emprestimo de fundos ao Monte de Piedade Nacional;

- operações do seguros;

- e os operações em conta de subsidios devidos por lei e descriptos no orçamento geral do estado como encargo regular e effectivo do thesouro, precedendo auctorisação especial do governo.

§ unico. O juro, praso e demais condições das operações serão determinados segundo as circunstancias do mercado.

Art. 17.° A Caixa Geral do Depositos continuará a desempenhar os serviços relativos aos fundos de viação municipal, de instrucção primaria e desamortisação, nos termos da legislação em vigor, e os demais, constantes d'esta lei ou que do futuro lhe forem encarregados.

Art. 18.° Fica auctorisada a mesma Caixa a receber, em todas as suas delegações, depositos voluntarios, ainda mesmo de conta particular, destinados á compra de titulos de divida publica portugueza, acções e obrigações do Banco de Portugal, acções e obrigações da Companhia Geral de Credito Predial Portuguez, ou de outra qualquer sociedade anonyma de responsabilidade limitada, que tenham cotação na bolsa.

§ unico. Pelo encargo da compra, averbamento e remessa d'esses papeis de credito, cobrará a Caixa a commissão de l por cento sobre o valor do capital empregado.

Art. 19.° As misericordias, hospitaes, asylos e mais estabelecimentos de beneficencia, sobre cuja administração o governo exerço fiscalisação, poderão depositar em Caixa Geral de Depositos os seus capitães, ou sejam em dinheiro, ou em papeia de credito. A Caixa procederá, nas epochas respectivas, á cobrança dos juros ou dividendos dos papeis de credito depositados, lançando a sua importancia em conta do depositante, e por este, e pelo das quantias depositados em dinheiro, abonará a Caixa aos depositantes o juro liquidado, nos termos e pela taxa estabelecidos para os depositos feitos na Caixa Economica Portugueza.

Art. 20.° Quando, por qualquer operação ou serviço a cargo da Caixa, esta haja de comprar papeis do credito que, em virtude de outra operação ou serviço, tenha para vender, na vice-versa, a Caixa poderá realisar directamente a compra e venda, pela cotação do dia, cobrando a respectiva corretagem. Em todos os demais casos, a compra ou a venda será sempre realisada em praça, por intermedio de corretores de numero.

Art. 21.° Dos lucros auferidos pela Caixa Geral de Depositos sairão as despezas da gerencia da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia. O saldo constituirá fundo da Caixa e será applicado ao desenvolvimento das suas operações.

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CAPITULO III

Caixa economica portugueza

Art. 22.° A Caixa Economica Portugueza continuará a reger-se pelos preceitos consignados na lei de 26 de abril de 1880 e na lei de 15 de julho de 1885, salvas as modificações estabelecidas na presente lei.

Art. 23.° A Caixa Economica Portugueza continuará a abonar aos seus depositantes o juro de 3,6 por cento ao anno.

§ 1.° Fica porém auctorisado o governo, sobre proposta da administração da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia, ouvido o seu conselho fiscal, a alterar esta taxa de juro, entre os limites de 2 e 4 por cento ao anno, quando assim o reclame a justa conveniencia da instituição.

§ 2.° Qualquer alteração na taxa do juro será fixada pelo ministro da fazenda em decreto fundamentado, e só começará a vigorar dentro de um praso não inferior a seis mezes depois da publicação do respectivo decreto na folha official.

Art. 24.° A liquidação e capitalisação de juros é feita annualmente no dia de 30 de junho de cada anno, e a respectiva escripturação dos juros capitalizados será tambem lançada annualmente por todo o mez de julho nas cadernetas dos depositantes, salvo impossibilidade justificada pelo administrador da Caixa.

§ unico. As fracções de juros inferiores a 5 réis, encontradas, na liquidação animal de juros, em cada uma das contas correntes, revertem a favor dos lucros da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia.

Art. 25.° Os fundos da Caixa Economica Portugueza não serão centralisados em cofre especial, nem geridos em separado dos da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Providencia.

§ unico. Na escripturação da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia, terão conta especial os depositos feitos na Caixa Economica Portuguesa, não havendo, comtudo, logar ao abono, que a Caixa Geral de Depositos fazia á Caixa Economica, do juro de 5 por cento ao anno, pelas quantias depositadas em conta d'este, nos termos do artigo 12.° da lei de 15 de julho de 1886.

Art. 26.° Nas freguezias pertencentes á area administrativa em que estiver installada alguma delegação da Caixa Economica Portugueza ou da Caixa de Aposentações a Assalariados, poderão organisar-se commissões de propaganda em favor da pequena economia.

§ unico. Estas commissões serão compostas do parocho, que será o presidente, do regedor e do professor de instrucção primaria.

CAPITULO IV

Disposições geraes

Art. 27.° A nomeação do pessoal da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia será feita pelo ministro da fazenda nos termos seguintes:

O logar de administrador geral, por nomeação do governo, que deverá recair em individuo que tenha carta de um curso superior, ou tres annos de effectivo serviço como empregado superior da mesma Caixa;

Os de chefes de serviços, por concurso documental, só podendo a nomeação recair em individuo que tenha carta de um curso superior, ou tres annos de effectivo serviço de primeiro official na Caixa, com notoria competencia;

Os de primeiros e segundos officiaes, de entre os da classe immediatamente inferior, alternadamente por concurso e por proposta do administrador geral baseada na antiguidade e no bom serviço prestado;

Os de amanuense, alternadamente por concurso documental, tendo preferencia os concorrentes habilitados com o curso do commercio do 1.° ou 2.° grau, e por proposta temporarios da caixa, tendo em vista a sua assiduidade e competencia no serviço.

§ unico. Os temporarios actuaes serão mantidos emquanto as necessidades do serviço o exigirem, e poderão ser despedidos pelo administrador geral quando não sejam necessarios ou não mostrem aptidão para o serviço.

Art. 28.° Os empregados actuaes não serão prejudicados nos seus direitos adquiridos quanto a categoria e vencimentos, tanto de actividade como de aposentação.

Art. 29.° O. administrador geral tem a seu cargo a inspecção de todos os serviços da Caixa; tomará as providencias convenientes para o seu bom desempenho, e despachará todos os processos relativos aos assumptos dependentes da mesma instituição.

§ 1.° O administrador geral é responsavel por todos os despachos que proferir. Poderá ouvir, quando o julgar conveniente, sobre os negocios que lhe forem affectos, a procuradoria geral dacorôa e fazenda.

§ 2.º O administrador geral só poderá ser exonerado ou demittido do exercicio das suas funcções nos termos e pela fórma por que o podem ser os vogaes do tribunal de contas.

§ 3.° Nos seus impedimentos, será o administrador geral substituido pelo chefe de serviços mais antigo ou pelo que for indicado pelo governo.

Art. 30.° Os chefes de serviços são responsaveis pela informação dos processos que tenham de submetter a despacho e pela execução d'estes. Compete-lhes fiscalisar e dirigir os serviços das suas repartições, informar o administrador geral, e exercer todas as attribuições que os regulamentos especialisarem.

Art. 31.° O demais pessoal é responsavel pela execução dos serviços que respectivamente lhe forem confiados.

Art. 32.° São applicaveis aos empregados da Caixa Geral de Depositos e instituições de Previdencia as disposições disciplinares concernentes aos empregados das direcções geraes do ministerio da fazenda, emquanto não forem elaborados os regulamentos especiaes para execução d'este decreto.

Art. 33.° Para o desempenho dos novos serviços attribuidos á Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia, serão nomeados os empregados especiaes que as necessidades do serviço reclamarem, em harmonia com os respectivos regulamentos. Esta nomeação será feita pelo governo sob proposta do administrador geral da Caixa.

§ unico. Os empregados, a que se refere este artigo, serão despedidos do serviço quando não satisfaçam devidamente ás suas obrigações, e pela mesma fórma por que são nomeados.

Art. 34.º O governo publicará os regulamentos necessarios para execução d'este decreto.

Art. 35.° Fica revogada a legislação em contrario.

Quadro do pessoal da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia e respectivos vencimentos

[ver tabela na imagem]

Vencimentos de categoria Vencimentos de exercxicio

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 16 de março de 1896. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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1570 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Adolpho Pimentel: - Peço a v. exa. que consulto a camara sobre se permitte que a discussão do projecto se faça por capitulos.

Consultada a camara, resolveu affirmativamente.

Entrou em discussão o capitulo 1.°

O sr. Magalhães Lima: - Mando para a mesa as seguintes

Propostas

Artigo 5.° Onde se lê «do commercio e industria» leia-se «director da estatistica geral e commercial.

§ 1.° Onde se lê «for» leia-se «foi».

Artigo 6.° (§ unico) Acrescente-se «salvo o disposto no § 1.° do artigo 5.°».

Artigo 54.° (§ 3.°) O serviço dos leilões e a percentagem devida por esse serviço serão regulados pela administração.

Artigo 58.° Onde se lê «os de amanuense alternadamente» deve ler-se «os de amanuense por concurso, etc.», eliminando-se assim a palavra «alternadamente». = Jayme de Magalhães Lima.

Foram admittidas.

O sr. Marianno de Carvalho: - Eu proporia uma emenda ao projecto se o sr. ministro da fazenda ou a commissão a acceitasse, aliás é escusado fazel-a.

No ultimo artigo do projecto, eu fallo já n'isto porque naturalmente terei de retirar-me mais cedo, falla-se na promoção dos empregados e diz-se que os chefes de repartição serão nomeados por concurso, podendo abranger os primeiros officiaes que tenham tres annos de serviço ou pessoas habilitadas com um curso superior, bachareis em direito, ou não sei que, tendo a preferencia os empregados da repartição.

Se não me engano, pelo regimen actual, os logares de chefes de repartição tanto da junta de credito publico, como da caixa geral do depositos eram providos por concurso, ou antiguidade, não me lembro bem, de entre os primeiros officiaes.

Agora diz-se que o podem ser entre os primeiros officiaes que tenham tres annos de serviço, ou entre os estranhos quando tenham um curso superior.

Ora eu desejaria propor uma transacção.

Quando eu fui ministro da fazenda, da primeira vez, da vez feliz, fiz uma reforma da secretaria da fazenda, e se não me engano, a começar dos segundos officiaes e d'ahi aos primeiros e chefes de repartição, adoptei o seguinte: dois terços das promoções pertenciam aos empregados da secretaria, sendo um terço, por antiguidade, e um terço, por concurso, e no terço restante é que podiam, em virtude do concurso, sor promovidos estranhos.

Emquanto á caixa geral do depositos, se não se poder obter mais, contentava-me com obter que metade das promoções fosse para os empregados, por antiguidade ou concurso, como se entendesse, e que a outra metade fosse para estranhos, comtanto que tivessem as habilitações sufficientes.

Só a illustre commissão e o governo acceitam a minha emenda, formulo-a e mando-a para a mesa, se não, dispenso-mo d'isso. ,

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

O sr. Magalhães Lima (relator}: - Não posso concordar com as considerações feitas pelo illustre deputado, o sr Marianno de Carvalho, pois me pareço que o projecto tal qual está redigido, satisfaz plenamente, e entendo que não é justo, nem rasoavel que a caixa geral do depositos fique n'uma situação inteiramente fechada e que ali não sejam admittidos a concurso os empregados de outras secretarias, que melhores serviços tenham.

Se bem comprehendi o que o sr. Marianno de Carvalha disse, s. exa. queria referir-se principalmente aos chefes de serviço e aos primeiros e segundos officiaes. Ora o projecto estabelece a este respeito, que os chefes de serviço sejam nomeados por concurso documental, preferindo-se em igualdade de circumstancias os primeiros officiaes da caixa, que tenham servido com notoria competencia. Assim ficam resalvados os direitos dos officiaes da caixa de depositos, e creio que o projecto, como está redigido, satisfaz completamente a toda a justiça que d'elle se póde exigir. (Apoiados.}

(O orador não reviu as notas tachygraphicas.)

Foi approvado o capitulo l.º e seguidamente os restantes capitulos do projecto, assim como as propostas que o sr. relator apresentou aos artigos 5.º, 54.º e 58.° do projecto.

O sr. Presidente: - A commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto n.° 103.

Vae entrar em discussão o projecto n.° 120, respeitante ao centenario da India.

Leu-se na meta, e é do teor seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 125

Senhores: - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei da iniciativa do governo referente a cunhagem de prata e emissão de estampilhas postaes, commemorativas da celebração do quarto centenario da partida da expedição que descobriu a India.

A commissão approva-a e applaude-a.

Um conjuncto de deploraveis circumstancias tornou o nosso Portugal, de grande que foi, grande em riqueza material e grande em feitos heroicos, n'um paiz que precisa de fazer os esforços mais intelligentes, aturados e patrioticos para se levantar do abatimento em que se tem encontrado. É mais critico do que nunca para nós o actual momento historico, não porque se não veja claramente que o paiz caminha a passos largos para a sua rehabilitação financeira e economica, para retomar o seu logar na consideração das nações estrangeiras, mas porque mal nos iria se interrompessemos essa serie do denodados esforços e sacrificios, se não aproveitassemos, emfim, a influencia benefica dos nossos recentes triumphos.

Parecia que viviamos pela historia; precisâmos de attestar ao mundo que vivemos pelos factos, pelo resurgimento de antigas forças, graças ás quaes descobrimos novos mundos, levando-lhes a civilisação e cobrindo-nos de gloria immorredoura.

Emquanto a patria se mostra agradecida áquelles que tão alto levantaram o nome portuguez nas recentes campanhas de Africa, praticando feitos que echoaram no mundo inteiro, é preciso que ella se não esqueça dos que passaram, do que passou, não só como homenagem a essa brilhantissima pleiade de dominadores que levaram a civilisação a todas as partes do mundo, com assombro da Europa inteira, mas para que sirvam de exemplo aos que vivem e que tão notavel papel têem ainda a desempenhar.

Commemorar o centenario da partida da expedição de D. Vasco da Gama é uma divida sagrada da patria áquelles que, affrontando a furia dos «mares nunca d'antes navegados», engrandecendo-se a elles com as mais invejaveis das glorias, engrandeceram o seu paiz.

Mas não é só sob este ponto de vista que deveremos olhar a commemoração do centenario.

Sem esquecer que novos incitamentos ella produzirá, já não diremos para alargar os nossos dominios, mas para a salvaguarda de tão importantes interesses coloniaes; sem pôr de parte a circumstancia de que mais nos levantará ao conceito do mundo a historia viva do incomparavel papel que no passado representámos, devemos dizer que ainda sob o ponto de vista economico do paiz muito haverá a lucrar em que a commemoração que se projecta seja grandiosa, á altura do acontecimento que a determina.

For estes motivos merece a nossa completa approvação

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SESSÃO N.º" 72 DE 5 DE MAIO DE 1896 1571

a proposta de lei do governo, a qual voa apresentâmos no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado:

1.° A mandar cunhar e fazer emittir até á quantia de 500 contos de réis de moeda de prata especial e commemorativa da celebração do quarto centenario da partida de D. Vasco da Gama para o descobrimento da India, applicando o producto liquido d'esta operação ás despezas a fazer com a solemnisação d'esta data gloriosa da historia portugueza;

2.° A mandar fabricar e emittir estampilhas postaes commemorativas do mesmo centenario e cujo producto liquido, deduzida a parte correspondente á media do rendimento postal ordinario nos ultimos cinco annos, em praso identico ao que for designado para a circulação d'essas estampilhas, igualmente se applicará á solemnisação a que n.º 1.° d'este artigo;

3.° A, por conta das receitas liquidas, que se apurarem nos termos dos n.ºs 1.° e 2.° d'este artigo, adiantar e entregar á commissão nomeada por decreto de 15 de maio de 1894 até á quantia de 50 contos de réis, a fim de occorrer ás despezas inherentes á missão que lhe foi incumbida.

§ unico. O governo regulará por decreto os termos em que usar d'esta auctorisação, e ás côrtes dará conta do uso que d'ella fizer.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Marianno de Carvalho = Manuel F. Vargas = Adriano da Costa = Jayme de Magalhães Lima = Teixeira de Vasconcellos = Polycarpo Anjos = José Lobo = Adolpho Pimentel = Manuel Fratel = Cabral Mancada = Luciano Monteiro = Costa Simões Baião = Pereira e Cunha = Lopes Navarro = Teixeira de Sousa, relator.

N.º 124-A

Senhores: - Devendo realisar-se no proximo anno de 1897, aos 8 de julho, a celebração nacional do quarto centenario da partida de Lisboa da expedição commandada pelo illustre almirante D. Vasco da Gama, e tendo sido nomeada já, por decreto de 15 de maio de 1894, uma grande commissão encarregada de preparar, organisar e dirigir essa grande festa portugueza commemorativa de tão alto e glorioso feito, como a do descobrimento da India, e sendo necessario habilitar a mesma commissão com os recursos indispensaveis para o esplendor da commemoração patriotica que se projecta, tem o governo a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º E o governo auctorisado:

1.° A mandar cunhar e fazer emittir até á quantia de 500 contos de réis de moeda de prata especial e commemorativa da celebração do quarto centenario da partida de D. Vasco da Gama para o descobrimento da India, applicando o producto liquido d'esta operação ás desposas a fazer com a solemnisação d'esta data gloriosa da historia portugueza;

2.° A mandar fabricar e emittir estampilhas postaes commemorativas do mesmo centenario, e cujo producto liquido, deduzida a parte correspondente á media do rendimento postal ordinario nos ultimos cinco annos, em praso identico ao que for designado para a circulação d'essas estampilhas, igualmente se applicará á solemnisação a que se refere o n.° 1.º d'este artigo;

3.° A, por conta das receitas liquidas, que se apurarem nos termos dos n.ºs 1.° e 2.° d'este artigo, adiantar e entregar á commissão nomeada por decreto de 15 de maio de 1894 até á quantia de 50 contos de réis, a fim de occorrer ás despezas inherentes á missão que lhe foi incumbida.

§ unico. O governo regulará por decreto os termos em que usar d'esta auctorisação, e ás côrtes dará conta do uso que d'ella fizer.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Presidencia do conselho de ministros, aos 6 de maio de 1896. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Jacinto Candido da Silva = Arthur Alberto de Campos Henriques.

O sr. Arroyo: - Fez varias considerações sobre o projecto em discussão, que não poderam ser ouvidas na mesa dos tachygraphos.

O sr. Presidente: - Como está a dar a hora eu reservo a palavra a v. exa. para a sessão de ámanhã, em que poderá ainda dispor de meia hora.

A commissão de redacção não fez alterações aos projectos do lei n.ºs 98 e 118.

A ordem, do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada para hoje e mais a discussão dos projectos de lei n.ºs 104, 109, 110 e 111.

Está levantada a sessão.

Eram sete horas da tarde.

Documentos enviados para a meta n'esta sessão

Representações

Da camara municipal do concelho de Felgueiras, contra algumas disposições do decreto de l de dezembro de 1892, e seu regulamento do 19 do mesmo mez o anno, com respeito a correntes de aguas não navegaveis nem fluctuaveis.

Apresentada pelo sr. deputado Barbosa de Mendonça e enviada á commissão de obras publicas.

Dos apontadores-amanuenses e apontadores, actualmente em serviço na direcção das obras publicas do districto do Porto, pedindo que lhes sejam extensivas as garantias exaradas no decreto de l de fevereiro de 1893 e suas instrucções, e que lhes seja concedido o beneficio de viajarem, fóra do serviço, nos caminhos de ferro do estado, e nos das companhias, que accordarem na mesma concessão, pagando sómente 50 por cento do preço das tarifas em vigor.

Apresentada pelo sr. deputado Sousa Andes enviada ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Dos cambistas e negociantes de papeis ou titulos de credito da praça de Lisboa, pedindo que sejam promulgadas as disposições legislativas necessarias para que o beneficio estatuido no artigo 534.° do codigo civil seja extensivo aos que, fazendo commercio habitual de compra e venda de titulos ou papeis de credito ao portador, de boa fé os comprem em seus estabelecimentos.

Apresentada pelo sr. deputado Mello e Sousa e enviada á commissão de legislação civil.

Dos empregados do quadro das caixas, geral de depositos e economica portugueza, pedindo que seja substituido o artigo 27.° do projecto n.° 14, que reforma a caixa geral de depositos, determinando que as promoções à chefes se façam entre os primeiros officiaes alternadamente por antiguidade e por concurso, ou pela fórma estabelecida no artigo 14.° do decreto de 30 de dezembro de 1892.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho e enviada á commissão de fazenda.

Dos empregados telegrapho-postaes do Porto, pedindo que no decreto n.° 8, de l de dezembro de 1892 se façam algumas modificações que, sem alterarem a sua base fundamental, harmonise as conveniencias do estado e do serviço com as do pessoal.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho e enviada á commissão de obras publicas.

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1572 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Dos tabelliães das comarcas de Aveiro, de Vagos e de Anadia, pedindo o alargamento das funcções notariaes e a reforma da tabella para attenuar a precaria situação do notariado.

Apresentada pelo sr. deputado Santos Viegas e enviada á commissão de legislação civil.

Da associação de classe dos operarios chapeleiros de S. João da Madeira, pedindo uma lei que proteja a triste situação em que se encontra a classe operaria da chapeleria.

Apresentada pelo sr. deputado Côrte Real e enviada á commissão de fazenda.

Da direcção do syndicato agricola do Felgueiras, pedindo uma lei que proteja a aguardente de vinho nacional.

presentada pelo sr. deputado Barbosa de Mendonça e enviada á commissão de agricultura.

Dos ex-arbitradores judiciaes da comarca de Estarreja, contra o decreto de 15 de setembro de 1892, que revogou o artigo 37.° do decreto de 20 de julho de 1886 o regulamento de 17 de março de 1887.

Apresentada pelo sr. deputado Côrte Real e enviada á commissão nomeada para dar parecer sobre as medidas promulgadas pelo ministerio presidido pelo sr. Dias Ferreira.

Justificação de faltas

For motivos justificados deixei de comparecer ultimamente a diversas sessões da camara. = O deputado, Manuel José de Oliveira Guimarães.

Para a secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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