1294 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
fazenda aqui as descreveu, isto é, analogas ás do emprestimo que estamos discutindo. (Apoiados.)
Apreciando ainda os juros, disse o sr. Mello e Sousa que o credito do paiz se avalia pela cotação dos juros da divida externa, mas que a comparação entre os juros dos emprestimos e da divida não tem rasão de ser quando se trata de operações caucionadas. Não comprehendo a distincçãão do illustre deputado. Não percebo realmente em que póde influir a caução do emprestimo que negociámos agora noa juros vencidos pelos titulos da divida externa.
O argumento do sr. conselheiro Ressano Garcia era o seguinte e fora exposto com notavel lucidez: Os nossos titulos de divida externa produzem 4 por cento, á cotação actual. Formulo apenas uma hypothese, e não assevero um facto, porque não sei quanto elles vencem na realidade, visto que, infelizmente, não os possuo. (Risos.) Faz-se um emprestimo a 17 por cento. O excesso do juro é, portanto, de 3 por cento.
N'outra occasião o juro da divida externa produzia 5 por cento, e realisou-se um emprestimo a 8 por cento. O excesso continua a ser o mesmo e n'estas condições affirmava o sr. ministro da fazenda: sob o ponto de vista do credito nacional, as operações são iguaes, porque a differença entre os juros dos emprestimos e os juros dos titulos da divida externa manteve-se a mesma. (Apoiados.) Sendo isto assim, como realmente é, era que póde o facto das operações serem ou não caucionadas alterar a base da comparação? (Apoiados.) Por isso eu dizia que não comprehendia a subtileza do argumento do orador a quem estou replicando. (Apoiados.)
Os encargos da operação foram o ponto que mais preoccupou o sr. Mello e Sousa e por isso s. exa. insistiu em que, sendo o contrato de 30 de março negociado em titulos caucionados, o juro d'esse contrato nunca deveria ser superior á taxa de desconto do banco de França, que é de 2 porcento. Em vez d'isto esse juro é mais do dobro, affirmando ainda o illustre deputado que a lei franceza se oppõe a contratos d'esta ordem.
Ignoro se a lei franceza os permitte ou não. V. exa. é muito mais versado no assumpto do que eu, o tanto que todos os dias nos está dando preleções sobre as leis estrangeiras. Mas o que sei é que temos um contrato, em conto corrente com a casa Bahring, de Londres, pelo qual se estipulou pagarmos 1 por cento acima da taxa de desconto do banco do Inglaterra. A taxa d'este banco é, muitas vezes, de 4 por cento. Quando tal se dá pagámos portanto á, casa Baring 5 por cento. Alem d'isso temos ainda a satisfazer mais 2 por cento de commissão. Sommado tudo, conclue-se que quando a taxa do banco de Inglaterra é de 4 por cento, caso que não é raro, os encargos d'aquella conta corrente attingem 7 por cento.
Aqui tem o sr. Mello e Sousa um contrato tambem caucionado, pelo qual pagámos muito mais do que o dobro da taxa do banco de França. (Apoiados.)
Descobriu tambem o erudito deputado regenerador que, em virtude da letra do contrato de 30 de março, os contratadores do emprestimo ficaram com o direito de fazerem o mesmo emprestimo em libras ou francos, á sua vontade, e receberem depois os seus creditos na moeda que mais lhes convier. Alongando-se n'este ponto annunciou-nos terriveis perigos a que eu hei-de mais tarde referir-me.
Por ultimo imaginou que o governo se encontra privado de receber o coupon.
Já ha pouco contestei esta affirmação, mas torno a repetir que, desde que as obrigações da companhia dos caminhos de ferro não deixaram de ser propriedade do estado, desde que o emprestimo se fez marcando-se valor fixo a essas obrigações, essa clausula é a prova de que realmente não se contou com o coupon.
Este faz parte da propriedade dos titulos, continua pois a pertencer ao estado que não os alienou ainda. (Apoiados.) Não vejo, pois, o perigo tão tetricamento descripto. (Apoiados.}
A isto se reduziram as criticas principaes do sr. Mello e Sousa contra o contrato, criticas annunciadas com tanto reclame, como devendo constituir uma condemnação inexoravel e irrespondivel.
Abstive-me de alludir ás considerações com que s. exa. iniciou a sua replica, porque a resposta do sr. ministro da fazenda já annullára o effeito d'essas considerações e a prova é que o illustre deputado pouco depois as abandonava por completo, insistindo apenas na supposta faculdade, dos contratadores do emprestimo poderem escolher á sua vontade a moeda e os pagamentos das prestações e da recepção da importancia dos seus creditos.
A prova fulminante contra o que disse o sr. Mello e Sousa, consiste em que, segundo estou informado, os contratadores têem satisfeito em libras parte das prestações já pagas, ao contrario do que receava o illustre deputado.
Se assim é, a que se reduziu a campanha da opposição? A que vergonhas arrastou o sr. ministro da fazenda o bom nome do paiz ? O que ha no contrato, o que ha de verdadeiro em todas estas indignações que possa explicar uma tal campanha de descredito, uma tal indignação pelo grande escandalo, como aquella que a opposição manifestou?
A unica accusação, que fica de pé contra o sr. ministro da fazenda, deriva d'elle não dizer á camara os nomes dos banqueiros que alem do Anglo-Foreign Banking tomaram parte n'este emprestimo. E a unica tabua a que se agarra a opposição para continuar a explorar a credulidade do publico.
O sr. Moncada: - Ainda ha mais.
O Orador: - Talvez ellas se descubram quando v. exa. fallar, porque até agora ainda ninguem o conseguiu. (Apoiados.)
Repito, pois. A unica accusação em que converge todas as revoltas dos oradores da minoria, é a de que o sr. ministro da fazenda persiste em não declarar os nomes da banqueiros que tomaram parte na operação.
O sr. conselheiro Ressano Garcia expoz-nos, com a mais honrada isenção, o motivo por que não declarava esses nomes. Tomara com os negociadores do emprestimo o compromisso de não os indicar. Entendia que não podia fallar a esse compromisso sem que esses banqueiros lh'o permittissem. (Apoiados.)
Eis a grande vergonha, eis a vergonha sem igual!
Mas á frente d'esses nomes não está um estabelecimento de toda a respeitabilidade, ao qual o sr. Mello e Sousa foi o primeiro a prestar a devida homenagem? (Apoiadas.)
Se assim é, e é realmente, quem é que póde dizer de boa fé que receia que estas clausulas não serão respeitadas e acatadas?
A afflicção em se conhecerem os nomes dos banqueiros que têem hoje as obrigações dos caminhos de ferro em seu poder, conhecimento que se julga decisivo para só avaliar a importancia e a significação do contrato, é sobremaneira curiosa quando se vê que os deputados da opposição estão á ultima hora e constantemente a censurar o sr. ministro da fazenda por não ter vendido aquelles titulos. (Apoiados.)
Se entendem que elles deviam ser vendidos, se, no caso do governo, já lhes tinham dado esse destino, que lhes importa o nome dos que estão agora na posse d'elles ? (Apoiados.)
Isto serve apenas para acentuar como tem sido pouco sincera a attitude da minoria n'este debate.
O desastre do sr. Mello e Sousa, na sua replica, foi de tal ordem, que s. exa. mesmo o confessou logo ao começar o seu discurso. Antes de procurar invalidar os argumentos do seu adversario, exclamava já: "Vou sair do contrato."
Saíu realmente, e de tal modo que a custo tornou a fazer-lhe leves referencias.