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N.º72
SESSÃO NOCTURNA DE 28 DE MAIO DE 1898
Presidencia do exmo. sr. Manuel Afonso de Espregueira
Secretários - os exmos. srs
Frederico Alexandrino Garcia Ramires
Carlos Augusto Ferreira
SUMMARIO
Lida e approvada a acta, dá-se conta do expediente. - O sr. Ribeiro Coelho apresenta uma representação dos habitantes de Villa Verde da Raia e um projecto de lei, considerado urgente. - A requerimento do sr. Mazziotti entra em discussão, e vota-se, o projecto de lei n.º 50. - O sr. João de Mello apresenta o parecer da commissão de artes e industrias, sobre o projecto de lei n.° 4-D. - A requerimento do sr. Cayolla entram em discussão, e são approvados, os projectos de lei n.° 32 e n.° 34.- Justifica o sr. Avellar Machado as faltas do sr. Figueiredo Mascarenhas. - O sr. Francisco José Machado apresenta um projecto de lei. - O sr. visconde da Ribeira Brava requer que entre em discussão o projecto n.° 56, que é approvado. - O sr. Homem Machado requer que se discuta o projecto n.º 67, que é discutido pelos srs. Avellar Machado, Oliveira Matos, Silva Amado e visconde da Ribeira Brava, sendo julgado sufficientemente discutido a requerimento do sr. Eduardo Villaça. - O sr. Moraes Sarmento apresenta um aviso previo. - Lêem-se na mesa as alterações feitas pela camara dos pares á proposição de lei que dispensa de pagamento de emolumentos, direitos de merca e sellos a marqueza de Unbaes e conde de Cascaes, sendo approvadas por acclamação por indicação do sr. Baracho.
Na ordem do dia continúa a interpellação do sr. Mello e Sousa ao sr. ministro da fazenda a respeito do contrato das 72:718 obrigações do caminho de ferro. Fallam successivamente os srs. Mello e Sousa, Cayolla e Moncada, que fica com a palavra reservada. - No fim da sessão têem a palavra para explicações os srs. Mello e Sousa e ministro da fazenda.
bertura da sessão - Ás nove horas da noite.
Presentes á chamada, os srs. deputados. São os seguintes: - Abel da Silva, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Burnay, Conde de Silves, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Furtado de Mello, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Baptista Ribeiro Coelho, João Lobo de Santiago Gouveia, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alberto, da Costa Fortuna Rosado, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Gonçalves Pereira dos Santos; José Joaquim da Silva Amado, José Malheiro Reymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Matos, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Visconde da Ribeira Brava.
Entraram durante a sessão os srs.: - Carlos José da Oliveira, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José Machado, Francisco Silveira Vianna, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Guilherme Augusto Fereira do Carvalho de Abreu, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Antonio de Sepulveda, Joaquim Augusto Perreira da Fonseca, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Dias Ferreira, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Maria Pereira de Lima e Marianno Cyrillo de Carvalho.
Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alvaro de Castellões, Anselmo de Andrade, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Alberto de Campos Henriques, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paçô Vieira, Conde da Serra de Tourega, Francisco Barbosa de Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, João Abel da Silva Fonseca, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Joaquim Izidro dos Reis, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Paes de Abranches, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Bento Ferreira de Almeida, José Capello Franco Frazão, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães, José Mathias Nunes, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Telles de Vasconcellos, Sertorio do Monte Pereira e Visconde da Melicio.
Acta. - Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
Da camara dos dignos pares do reino, remettendo a proposição de lei d'aquella camara, que tem por fim transferir para os filhos do benemerito explorador Roberto Ivens a quantia que a este foi legalmente concedida pelos serviços prestados á patria no continente africano.
Para as commissões de marinha e de fazenda.
Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado conde de Burnay, copia authentica do telegramma expedido por este ministerio,
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1284 DIARIO DA CAMARA DOS SENH0RES DEPUTADOS
em 30 de março proximo passado, ao nosso agente financial em Londres, sobre o contrato das 72:718 obrigações do caminho de ferro.
Foi mandado publicar no Diario do governo.
O sr. Ribeiro Coelho: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma representação de habitantes da Villa Verde da Raia, concelho de Chaves, pedindo que a sua povoação seja constituida em freguezia, ficando, portanto, desligada das aldeias de Santo Estevão e Faiões.
Como estou com a palavra, mando tambem para a mesa um projecto de lei, para o qual peço urgencia. É o seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.º A povoação Villa Verde da Raia, que faz parte da circumscripção parochial do Santo Estevão, no concelho de Chaves, fica constituindo uma freguesia independente.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 28 de maio de 1898. = J. B. Ribeiro Coelho.
Considerado urgente, teve segunda leitura, foi admittido a enfiado á commissão de administração publica.
A representação vae por extracto no fim da sessão.
O sr. Mazziotti: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que entre desde já em discussão o projecto n.° 50.= Mazziotti.
Foi approvado.
Leu-se na mesa o seguinte
PKOJECTO DE LEI N.° 30
Senhores. - Appellando para a vossa generosidade, requereu D. Izabel Christina Mourão e Almeida, viuva do mallogrado tenente do exercito de Portugal, em commissão na provincia de Moçambique, João da Cruz da Fonseca e Almeida, barbaramente assassinado em Angoche pelo gentio revoltado, que permittisseis, por um projecto de lei, a entrada no real collegio militar ao filho d'aquelle brioso official, não obstante elle perfazer em 3 de junho proximo doze annos de idade e achar-se, portanto, á data da entrada n'aquelle estabelecimento militar de instrucção, fóra das condições legaes de admissão.
Esse requerimento foi apreciado pela vossa commissão de guerra e considerou-o ella tão justificado, pelas circumstancias excepcionaes em que se encontram a requerente e o orphão do infeliz tenente Fonseca de Almeida, que resolveu, de accordo com o governo, e julgando desnecessario fundamentar essa resolução, propor-vos o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É permittida a entrada no real collegio militar, no anno lectivo de l898-1899 ou de 1899-1900, a Armando da Fonseca o Almeida, filho do tenente do exercito de Portugal João da Cruz Fonseca e Almeida, ha mezes assassinado em Angoche.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 28 de abril de 1898. = F. J. Machado = Francisco Ravasco = Joaquim Telles =José Mathias Nunes = Arnaldo de Moraes Guedes Rebello = Avellar Machado = Lourenço Cayolla, relator.
Senhores. - Izabel Christina Mourão e Almeida, viuva do tenente graduado do exercito de Portugal, em commissão na provincia de Moçambique, João da Cruz da Fonseca e Almeida, morto pelos indigenas no desempenho do serviço que lhe foi confiado pelo exmo. commandante militar de Angoche, a 12 de outubro do anno findo, e tendo deixado um filho que completa doze annos de idade a 3 de junho do corrente anno, excedendo portante só quatro mezes e alguns dias a idade maxima para poder ser admittido como alumno do real collegio militar, fixado no § unico do artigo 16.° do regulamento do mesmo collegio de 10 de outubro de 1895 -P. a v. exas. que a exemplo da graça concedida pela carta de lei de 21 de junho de 1880 a Bemvinda do Carmo Leal Guimarães, e tendo em consideração que o pae do pretendente foi morto em serviço da patria e a que é pequeno o excesso de idade, seja o governo auctorisado a mandar admittir no real collegio militar o filho do mencionado tenente João da Cruz da Fonseca e Almeida, não obstante exceder o limite de idade fixado na legislação vigente.
Lisboa, 15 de fevereiro de 1898. - E. R. M.cê = Izabel Christina Morão e Almeida.
Certifico que no livro dos baptismos d'esta freguezia n.° 35 está o assento seguinte: Aos 3 dias do mez de setembro de 189G, no cartorio d'esta igreja, me foi apresentada uma sentença do juizo ecclesiastico, datada do dia 29 de agosto d'este anno, para reformar o assento de baptismo de Armando, que está a fl. 12 do livro 1889, sob o n.° 36, cuja reforma é a seguinte: Aos 19 dias do mez de março de 1889, n'esta igreja parochial de S. Mamede de Lisboa, baptisei solemnemente um individuo do sexo masculino a quem dei o nome do Armando, que nasceu n'esta freguezia ás oito horas da manhã do dia 3 de junho de 1886, filho illegitimo de João da Cruz da Fonseca e Almeida, natural da freguezia e concelho de Albufeira, diocese do Algarve, primeiro sargento em commissão, e de Maria Eugenia Gonçalves, nascida no hospital de Santo Antonio, da cidade do Porto, parochianos e moradores n'esta freguezia, largo do Rato, neto paterno de Sezinando Christino do Carmo Couto de Almeida e Joanna Lucia, e materno de Manuel Gonçalves e Luiza Francisca. Foi padrinho o visconde da Torre da Murta, João Carlos, casado, proprietario, e madrinha Emilia Rodrigues Luiza Bastos, casada, que vi serem os proprios.
E para constar lavrei em duplicado este assento de reforma, que assigno, tendo o pão e padrinhos assignado o primitivo assento. Era ut supra. = 0 prior, Antonio Dias Ferreira de Vasconcellos.
Está conforme no original.
Parochial de S. Mamede, 29 de dezembro de 1897. = O prior, Antonio Dias Ferreira de Vasconcellos.
Logar do sêllo a tinta de oleo da taxa de 100 réis.- Senhor.- Izabel Christina Morão de Almeida, viuva de João da Cruz da Fonseca e Almeida, tenente graduado do exercito de Portugal, em commissão no Ultramar, desempenhando o cargo de commandante da policia e fiscalisação de Angoche, precisando, para documentar uma pertensão, da certidão de obito de seu fallecido marido, d'onde conste que foi morto pelos macuas, em serviço e por effeito do mesmo, por isso que tal facto se deu em lucta com o gentio no desempenho de uma commissão especial de serviço, que lhe foi ordenada pelo exmo. governador do districto de Moçambique, mui humildemente pede a Vossa Magestade haja por bem mandar passar a referida certidão como acima requer.- E. R. M.cê
Lisboa, 23 de dezembro de 1897. = Izabel Morão e Almeida.
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Logar de um carimbo a tinta de oleo, com os seguintes dizeres: "Ultramar, 27. dezembro, 97.- 6.ª repartição.- N.° 3:200."
Passe do que constar, não havendo inconveniente.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 29 de janeiro do 1898. = Francisco Costa.
PROJECTO DE LEI N.° 32
Certifico, em virtude do despacho retro, que dos documentos que acompanham o officio do governo geral da provincia de Moçambique, n.° 281, de 10 de dezembro ultimo, devidamente archivado n'esta secretaria d'estado, consta que o tenente graduado do exercito de Portugal, em commissão no ultramar, João da Cruz da Fonseca e Almeida, tendo sido incumbido pelo commandante militar do Parapato de uma missão politica e de regular a cobrança do imposto de palhota nos territorios do regulo Morlamuno, que se achava em guerra com o regulo Corneamuno, foi atacado na madrugada de 12 de outubro do mesmo anno pelo bando de Mahongo-muno, sobrinho de Cornea-muno, na casa de Morla-muno, nas margens do Lardy, Angoche, o referido official foi morto, assim como quatro cypaes dos trinta que o acompanhavam, tendo sido abandonado pela gente do mesmo regulo Morla-muno, que se achava com elle.
O corpo do tenente Almeida foi encontrado, no dia seguinte, com a cabeça decepada, e presume-se que a morte foi instantanea, devida a uma bala que, entrando pelas costas do lado esquerdo, lhe varou o pulmão e o coração.
E para constar fiz passar a presente certidão, que vae por mim assignada e sellada com o sêllo das armas reaes que serve n'esta secretaria d'estado.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 31 de janeiro de 1898.= (Sobre uma estampilha do sêllo da taxa de 100 réis do primeiro semestre do corrente anno) João Thaumaturgo Junqueiro, chefe da sexta repartição.
(Logar do sêllo em branco do ministerio da marinha e ultramar.)
Não pagou emolumentos, por lhe aproveitar o disposto no artigo 87.° da carta de lei de 23 de junho de 1864.=
Teixeira.
É quanto se contém no original de onde emana esta publica forma, com o qual esta conferi e concertei, e em seguida fiz entrega de ambos ao apresentante em meu cartorio.
Lisboa, 15 de fevereiro de 1898. - E eu, o tabellião Emygdio José da Silva, da cidade e comarca de Lisboa, que a subscrevi e assigno em publico e raso. - Em testemunho de verdade. = O tabellião, Emygdio José da Silva.
Foi approvado sem discussão.
O sr. João de Mello: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o parecer da commissão de artes e industrias sobre o projecto de lei n.° 4-D, que tem por fim estabelecer uma escola de desenho industrial em Castanheira de Pera, concelho de Pedrogão Grande, no districto de Leiria.
Foi enviado á commissão de fazenda.
O sr. Lourenço Cayolla: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que seja dispensado o regimento para entrarem em discussão os projectos n.ºs 32 e 34. = Lourenço Cayolla.
Foi approvado.
Leu-se na mesa o seguinte
Senhores. - Á vossa commissão de marinha foi presente a proposta de lei n.° 45-B, para ser concedida á mãe do official da armada Eduardo Martinho Pereira dos Santos, victimado pela doença adquirida em serviço na guerra de Lourenço Marques, e morto aos vinte e dois annos de idade, pela sua dedicação ao serviço da patria. Acresce que o moço official deixou nas mais precarias circumstancias sua velha mãe, de quem era o unico amparo, bem como de seu pae, quasi cego e absolutamente impossibilitado de trabalhar. De accordo com o governo, resolveu a vossa commissão que, attendendo as actuaes circumstancias do thesouro, fosse reduzida de 420$000 réis a 360$000 réis annuaes a pensão a conceder á mãe do referido official. Por isso, temos a honra de submetter á apreciação da camara o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedida a D. Julia Adelaide Pereira da Santos, mãe do fallecido segundo tenente da armada Eduardo Martinho Pereira dos Santos, a pensão annual de 360$000 réis.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 24 de agosto de 1897.= J. E. de Moraes Sarmento = F. F. Dias Costa = Conde de Silves = Henrique de Carvalho Kendall = Lourenço Cayola = Carlos Augusto Ferreira, relator.
A vossa commissão de fazenda, estudando a proposta de lei n.° 45-B e o respectivo projecto sobre ella elaborado pela commissão de marinha, é de parecer que deve ser approvado.
Sala das sessões, 13 de abril de 1898.= Frederico Ramires = J. Barbosa = L. A. Fialho Gomes = Francisco da Silveira Vianna = Luiz José Dias = Henrique de Carvalho Kendall = Moreira Junior = J. M. de Alpoim = A. Eduardo Villaça = João Pinto dos Santos, relator.
N.° 45-B
Senhores. - Ha pouco mais de um anno o povo portuguez, cheio de jubilo, recebia com as mais vivas demonstrações de admiração e sympathia os officiaes e soldados que recolhiam victoriosos da campanha na Africa oriental, contra o gentio revoltado das terras de Lourenço Marques e de Gaza.
Ao enthusiasmo nacional associaram-se as côrtes e o governo conferindo honras e mercês aos bravos que haviam resuscitado para Portugal as gloriosas tradições dos tempos passados, abrindo nova era de esperança e de confiança no futuro.
A par dos premios aos que, mais felizes, poderam presencear o reconhecimento da mão patria, cuidou-se tambem das familias dos que, victimas da sua dedicação, ficaram mortos nos campos da batalha, ou pereceram mais tristemente nos hospitaes em consequencia de ferimentos ou doenças adquiridas n'aquella lucta contra o gentio contra o clima, decretando-se pensões de sangue, que, se não apagavam a dor causada pela perda de um filho, irmão ou pae querido, afastavam pelo menos a perspectiva das privações, resultantes da falta de um amparo perdido.
Mas a lei, no seu laconismo, não póde prever todos os casos, e nas suas aspirações de justiça, torna-se por vezes injusta, quando applicada em circumstancias especiaes.
Estabelece ella que têem direito a pensão de sangue a mãe viuva do fallecido, não prevendo que a existencia do pae, quando invalido, longe de ser uma garantia para o bem estar da familia, constitue mais um encargo a que a mãe tem de attender, e augmenta o numero dos que ficaram desprotegidos com a perda de um filho que era o seu amparo.
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E para esta injustiça relativa que eu chamo, senhores, a vossa attenção.
Entre as victimas da guerra de Lourenço Marques conta-se um official da armada, Eduardo Martinho Pereira dos Santos, victimado de doença adquirida no rio Incomati como commandante das lanchas-canhoneiras Bacamarte e Sabre, depois de prestar serviços relevantes que mereceram especial menção por parte do commissario regio o conselheiro Antonio Ennes, e dos officiaes sob cujas ordens serviu, e entre os quaes avulta o de ter induzido a sua guarnição a sujeitar-se a duras privações, fornecendo quasi todos os mantimentos que tinha a bordo ás tropas que com o capitão Mousinho de Albuquerque perseguiam o regulo de Maputo.
Era segundo tenente da armada; poderia antes chamar-lhe guarda marinha, não só porque foi n'este posto que elle prestou maiores serviços, mas porque a morte aos vinte e dois annos de idade não lhe deixou gosar mais de dois mezes os galões do tenente que elle tão brilhantemente promettia honrar.
A mãe que deixou inconsolavel, não é viuva; mas o pae vive no estado de quasi completa cegueira, impossibilitado em absoluto de qualquer trabalho que lhe permitta prover-a subsistencia da familia.
De um e outro, era o amparo o filho fallecido.
Com este fundamento tenho a honra do submetter á vossa apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É concedida a D. Julia Adelaide Pereira dos Santos, mãe do fallecido segundo tenente da armada, Eduardo Martinho Pereira dos Santos, a pensão annual de 420$000 réis correspondente ao soldo de seu filho.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, em 12 de agosto de 1897.= Henrique de Gomes Barros.
Não havendo quem pedisse a palavra, foi posto á votação e approvado.
Leu-se mais o seguinte
PROJECTO DE 1EI N.° 34
Senhores. - Á vossa commissão de marinha foi presente a proposta de lei n.° 9-D da iniciativa do illustre ministro d'aquella pasta. Esta proposta tem por fim conceder uma pensão de 4$500 réis mensaes a Joanna Rosa da Silva, mãe do grumete do corpo de marinheiros da armada Vicente da Silva Godinho, morto em combate, pensão que é igual ao pret que o fallecido recebia.
Este assumpto é digno de toda a ponderação, porque a mãe do infeliz grumete, morto em defeza da patria, era por elle soccorrida, vendo-se hoje sem o amparo do filho e reduzida á miseria.
Alem d'isso, o marido d'esta infeliz está impossibilitado, por doença grave e incuravel, de adquirir os meios de subsistencia, o que é comprovado por attestados das auctoridades competentes. Tem ella tres filhos menores, que não póde igualmente sustentar.
Exigindo a patria que os militares derramem o seu sangue, o dêem a sua vida, para defender a sua integridade e a sua honra e enaltecer o seu brilho, quando é offuscado, justo é que não deixe ao desamparo as suas familias. Só assim aquelles que são obrigados pela disciplina e pelo dever a arriscar a vida nos campos de batalha ou nos climas inhospitos das nossas possessões de alem mar, poderão praticar actos da maior heroicidade, porque têem a certeza de que a patria não deixa ao desemparo os entes queridos que ficam pranteando a sua morte.
Se o paiz se orgulhou com os feitos verdadeiramente grandiosos, que as nossas tropas praticaram nas ultimas campanhas de Moçambique, para castigar os regulos que se rebellaram contra a nossa soberania, é dever seu pagar a divida que moralmente contrahiu com aquelles que tanto enalteceram o nome portuguez, fazendo echoar o brilho das suas victorias atraves de tantas regiões.
Por estes motivos a commissão de marinha submette ao vosso exame o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É concedida a Joanna Rosa da Silva, mãe do grumete do corpo do marinheiros da armada Vicente da Silva Godinho, morto em combate, a pensão de 4$000 réis mensaes, igual ao pret que elle recebia.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Antonio Eduardo Villaça = Elvino de Brito = Conde de Silves = João Catanho de Menezes = José Mathias Nunes = Henrique de Carvalho Kendall = Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayola = Carlos Augusto Ferreira = José Maria de Alpoim = F. J. Machado, relator.
Senhores.- A vossa commissão de fazenda conforma-se com o projecto de lei, elaborado pela commissão de marinha sobre a proposta n.° 9-D, de iniciativa governamental.
Sala das sessões, 13 de abril do 1898.= Frederico Ramires = J. Barbosa = Fialho Gomes = Luiz José Dias = Francisco da Silveira Vianna = A. Eduardo Villaça = Henrique de Carvalho Kendall = M. A. Moreira Junior = José Maria de Alpoim = João Pinto dos Santos, relator.
N.° 9-D
Senhores.- O primeiro grumete do corpo de marinheiros da armada, Vicente da Silva Godinho, foi morto em combate contra os namarraes no dia 3 de março de 1897. Sua mãe, a quem elle soccorria, e cujo marido está impossibilitado, por doença grave e incurável, de adquirir os meios de subsistencia, vê-se reduzida á miseria, doente e tendo ainda tres filhos menores, e, allegando estas circumstancias, que são devidamente comprovadas por attestados das auctoridades parochiaes da freguezia onde reside, requer pensão de sangue.
Não póde o governo applicar o disposto nos decretos com força de lei de 4 de junho de 1870 e 17 de fevereiro de 1891 para deferir, como desejava, t3o attendivel pedido, em consequencia de não se achar a requerente no estado de viuva, que é exigido por esses diplomas legaes.
Por isso e no intuito de se minorar de algum modo a indigencia da mãe de um militar que perdeu a vida em defeza dos interesses da patria, tenho a honra de submetter á vossa consideração a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É concedida a Joanna Rosa da Silva, mãe do grumete do corpo de marinheiros da armada, Vicente da Silva Godinho, morto em combate, a pensão de 4$500 réis mensaes, igual ao pret que elle recebia.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 14 de fevereiro de 1898.= Francisco Felisberto Dias Costa.
Foi approvado sem discussão.
O sr. Avellar Machado: - Pedi a palavra para mandar para a mesa uma declaração de voto do sr. deputado Figueiredo de Mascarenhas.
Sr. presidente, desejava tambem chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para um assumpto importante que vi hoje tratado no jornal O Seculo; mas como s. exa. não está presente, peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando entrar na sala o sr. ministro das obras publicas, se porventura s. exa. entrar antes da ordem da noite, porque não desejo fazer observações sobre o assumpto na ausencia do sr. ministro.
Vae no fim da sessão a justificação de faltas.
O sr. Francisco José Machado: - Justifica com algumas considerações, e manda para a mesa o seguinte
Projecto de lei
Artigo 1.º É relevada a camara municipal do concelho de Almada de pagar ao hospital real de S. José as quan-
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tias em divida, pela misericordia do mesmo concelho, fixadas em decreto pelo ministerio do reino, de 6 de agosto de 1892 e de 6 de agosto de 1896, artigo 34.°
Art. 2.° A contribuição do mesmo municipio para sustentação dos enfermos recolhidos no referido estabelecimento hospitalar e seus annexos será equitativamente estabelecida em novo decreto pelo ministerio competente, e reduzida as devidas proporções.
Art. 3.° Ficara revogados os artigos 34.° de decretos de 6 de agosto de 1892 e mesma data de 1896, e toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 28 de maio de 1898.= Os deputados, F. J. Machado = Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti.
Aproveita o orador a occasião para lembrar ao governo a conveniencia do se fazer uma nova cunhagem da moeda do centenario ficando os lucros para o estado, visto que, tanto no paiz como no estrangeiro, se manifeste o maior empenho em alcançar-se essa moeda; e n'este sentido apresenta e pede que seja considerado urgente o seguinte
Projecto do lei
Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar cunhar e fazer emittir mais 500:000$000 réis de moeda de prata especial e commemorativa da celebração do quarto centenario da partida de D. Vasco da Gama para a India.
§ unico. O governo regulará por decreto os termos em que usar d'esta auctorisação, e ás cortes dará conta do uso que d'ella fizer.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 28 de maio de 1898. = F. J. Machado.
Considerado urgente, teve segunda leitura, foi admittido e enviado a commissão de fazenda.
O primeiro projecto de lei ficou para segunda leitura.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Sr. presidente, pedia a v. exa. que consultasse a camara sobre se permitte que entre desde já em discussão o projecto n.° 56.
A camara resolveu affirmativamente.
PROJECTO DE LEI N.° 56
Senhores.- Á vossa commissão de administração publica foi presente o projecto de lei n.° 9-F, da iniciativa do deputado por Beja dr. Libanio Fialho Gomes, em que se pede auctorisação para a camara municipal do concelho de Barrancos poder applicar o fundo da sua viação municipal ás outras despezas ordinarias do municipio, ficando de futuro dispensada de concorrer para o fundo de viação municipal do seu concelho.
A commissão, considerando que o concelho de Barrancos se compõe de uma unica freguezia, não tendo, portanto, estradas municipaes a construir para ligar entre as freguezias do mesmo concelho e estas com a séde d'este, e ainda tomando em consideração que a verba destinada á viação publica, não tendo applicação possiel á viação, é de toda a justiça que seja applicada às outras depezas ordinarias do municipio, é de parecer, tendo ouvido o governo, que deve merecer a vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho de Barrancos a levantar todas as verbas que tiver o cofre de viação e applical-as ás suas despezas geraes, ficando de futuro isenta de contribuir para o mesmo cofre.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão de administração publica, em 27 de abril de 1898. = Antonio Tavares Festas = Martinho Tenreiro (vencido) = Fortuna Rosado = Carlos J. de Oliveira = J. Simões Ferreira (com declarações) = Alexandre Cabral = Manuel Telles da Vasconcellos = Visconde da Ribeira Brava, relator.
N.º 9-F
Senhores.- O concelho de Barrancos está em circumstancias perfeitamente excepcionaes, em relação a todos os outros municipios do reino.
Constituido por uma unica freguezia, não tem estradas municipaes, nem d'ellas carece, e vê accumular-se, na caixa geral de depositos, uma importante quantia, que, de anno para anno, vae augmentando e á qual não póde dar a applicação legal.
A par d'isto, os paços do concelho ameaçam ruina, a cadeia é um antro immundo, as ruas estão intransitaveis á os municipes vêem-se aggravados com uma exagerado contribuição municipal, parte da qual vae avolumar a já importante, posto que inutil, verba do fundo de viação.
N'estas circumstancias esperâmos que merecerá a vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho de Barrancos a levantar todas as verbas que tiver no cofre de viação e a applical-as ás suas despezas geraes, ficando de futuro isenta de contribuir para o mesmo cofre.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 12 de fevereiro de 1898. = Francisco Limpo Lacerda Ravasco = Alfredo Cesar de Oliveira = Conde da Serra da Tourega = Antonio de Menezes e Vasconcellos = L. A. Fialho Gomes = J. M. Pereira de Lima.
Approvado sem discussão.
O sr. Bernardo Homem Machado: - Sr. presidente, peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que entre desde já era discussão o projecto n.° 57.
Foi approvado.
Leu-se na mesa. É o seguinte
PROJECTO DE LEI N.° 57
Senhores. - Á. vossa commissão de instrucção publica superior e especial foi presente o projecto de lei da iniciativa do sr. deputado Luiz José Dias, propondo o desdobramento da cadeira de physica geral, que se ensina na escola polytechnica.
A physica é uma das sciencias mais vastas, sendo n'um das que mais rapidamente se têem desenvolvido n'este seculo, logrando transformar radicalmente as condições economicas dos povos pelas suas valiosissimas applicações, que realisaram progressos realmente assombrosos nas sciencias e nas industrias.
Convém advirtir que a physica geral, que se professa na escola polytechnica, é um preparatorio para diversas carreiras scientificas militares e civis, exigindo algumas que aquelles que n'ellas se iniciam possuam estudos desenvolvidos e completos de sciencias mathematicas, bastando para outras um estudo elementar d'estas sciencias. Como ha de o professor ensinar proficuamente alumnos tão diversamente preparados, e tendo em vista fins tão differentes?
É evidente que para os alumnos, que só conhecem as mathematicas elementares, o ensino da physica tem de ser principalmente experimental; emquanto que para aquelles, que já conhecem os calculos differencial e integral, e todas as materias do primeiro e segundo annos de mathematica da mesma escola, já o ensino da physica poderá ser tratado com maior profundidade, fazendo-se completa demonstração dos theoremas physicos com o auxilio do calculo infinitesimal.
N'outros paizes tem-se reconhecido igualmente a im-
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possibilidade de ensinar proveitosamente a physica n'um só anno, e até ás nações, que se poderiam considerar mais afastadas dos grandes centros scientificos, nos podem servir de exemplo.
Na universidade de Tokio, no Japão, a faculdade de sciencias mathematicas e physicas tem, ha mais de vinte annos, o ensino da physica distribuido por tres annos, o segundo, o terceiro e o quarto do curso.
Por estes motivos, e porque da approvação d'este projecto não resulta encargo para o thesouro visto que o vencimento do professor proprietario, que haverá a mais, será inferior ao augmento de receita proveniente da matricula na nova cadeira, temos a honra do vos propor, de accordo com o governo, que approveis o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O ensino da physica geral na escola polytechnica será professado em duas cadeiras.
§ 1.º A primeira cadeira, physica experimental, fará parte do segundo anno do curso geral e do segundo anno do segundo curso da escola polytechnica; a segunda cadeira, physica mathematica, pertencerá ao terceiro anno dos mesmos cursos.
§ 2.° Para os cursos preparatorios de marinha e medicina apenas será exigida a approvação no exame de physica experimental.
Art. 2.° Os actuaes lentes proprietario e substituto da actual quinta cadeira da escola polytechnica são nomeados lentes proprietarios das cadeiras de physica experimental e physica mathematica, em que ella se desdobra.
§ unico. O logar de lente substituto das duas cadeiras de physica será provido mediante concurso de provas publicas, nos termos do regulamento em vigor.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão de instrucção publica superior e especial, 28 de abril de 1898. = Joaquim Heliodoro da Veiga = João Monteiro Vieira de Castro = José Maria de Oliveira Matos = A. Eduardo Villaça = Manuel Antonio Moreira Junior = Arthur Montenegro = José Joaquim da Silva Amado, relator.
N.° 9-G
Senhores. - A pratica de muitos annos tem demonstrado que a organisação do ensino da physica na escola polytechnica necessita de uma urgente e radical remodelação.
Ninguem desconhece os importantes desenvolvimentos que, desde o meado d'este seculo, têem experimentado alguns dos mais importantes capitulos da physica, principalmente aquelles que têem por objecto o calor e a electricidade.
As applicações de capital importancia da thermodynamica e o indispensavel estudo da medição das quantidades electricas, um dos que mais tem concorrido para o aperfeiçoamento dos methodos experimentaes, que tão larga influencia tem exercido no rapido progresso das sciencias, fundados nas determinações quantitativas, têem aconselhado, mesmo em paizes cujos recursos deveriam ser inferiores aos nossos, o ensino desenvolvido d'essas materias, subsequente ao da physica geral.
É, pois, senhores, de manifesta impossibilidade a assimilação, nos apertados limites de um anno lectivo, dos vastos conhecimentos geraes de physica que, para acompanharem os recentes progressos introduzidos em muitos ramos da arte e da industria, necessitam dispor aquelles que se destinam ás carreiras de mais elevada responsabilidade scientifica.
Senhores, a cadeira de physica da escola polytechnica á frequentada por alumnos que se destinam ás armas de engenheria e artilheria, á marinha, á engenheria civil e medicina; e, é evidente, que nem todos necessitam um estudo igualmente desenvolvido de physica geral; é, pois, mister que se procure proporcionar o meio ao fim, a preparação á applicação.
Emfim, senhores, os modernos methodos de ensino evolutivo, já postos em pratica no ensino secundario, devem ser continuados no ensino superior, o que, em parte, se realisa no ensino da mathematica e da chimica, e que urge generalisar ao da physica.
Considerando, portanto:
1.º Que é impossivel ministrar n'um anno, sem uma exageradissima densidade de ensino, que a experiencia tem demonstrado inconveniente, os conhecimentos geraes de physica, indispensaveis a quem se destina a determinadas carreiras scientificas;
2.° Que os conhecimentos preparatórios do physica geral superior devem ser mais desenvolvidos para os individuos que frequentam o segundo curso da escola polytechnica, do que para os cursos de medicina e marinha;
3.° Que convem estabelecer gradação entre o estudo da physica no ensino secundario e o que compete aos alumnos que frequentam o segundo curso destinado ás armas de engenheria e artilheria e á engenheria civil, para o qual se torna indispensavel o conhecimento dos methodos geraes de mathematica superior, adquirido durante os dois primeiros annos de frequencia do curso;
4.° Que a divisão da actual 5.ª cadeira da escola polytechnica em duas cadeiras de physica, apesar de exigir o augmento de um logar de lente proprietario, não importa augmento de despeza, porque o seu vencimento é inferior ao augmento de receita proveniente do augmento de numero de matriculas:
Temos a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O ensino da physica geral superior da escola polytechnica será ministrado em duas cadeiras.
§ 1.° A l.ª cadeira fará parte do segundo anno do segundo curso da escola polytechnica, e a 2.ª cadeira do terceiro anno do mesmo curso.
§ 2.° Para os cursos preparatorios de marinha e medicina apenas será exigida a approvação no exame da l.ª cadeira.
§ 3.° O ensino da l.ª cadeira deverá ter uma feição accentuadamente experimental, ampliando-se os conhecimentos adquiridos no ensino secundario, e evitando-se a exigencia de conhecimentos mathematicos que não tenham sido adquiridos n'este grau de ensino.
§ 4.° O ensino da 2.ª cadeira de physica será tão desenvolvido quanto seja compativel com os conhecimentos anteriormente adquiridos pelos que a frequentam.
§ 5.° Na organisação dos programmas, tanto da l.ª como da 2.ª cadeira de physica, deve ter-se principalmente em vista a futura applicação dos conhecimentos adquiridos pelos individuos que a frequentam.
Art. 2.° É o governo auctorisado a organisar este serviço, em harmonia com as exigencias das modificações determinadas por este projecto, e respectiva dotação legal.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 12 de fevereiro de 1898. = 0 deputado, Luiz José Dias.
Senhores. - A vossa commissão do fazenda concorda com o parecer da illustre commissão de instrucção publica superior e especial.
Sala das sessões, 24 de maio de 1898. = J. Barbosa = Ramires = J. Alpoim = A. Eduardo Villaça = Francisco da Silveira Vianna = Luiz José Dias = Moreira Junior = Henrique de Carvalho Kendall = Libanio Antonio Fialho Gomes. - Tem voto do sr. Lourenço Cayolla.
O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.°
O sr. Avellar Machado: - Sr. presidente, é apenas para fazer uma declaração.
O projecto traz um augmento de despeza, mas é absolutamente impossivel ensinar-se physica na escola polytechnica em uma só cadeira.
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Por consequencia, fazendo uma excepção ao meu modo de proceder na actual legislatura, em que declarei que não votava augmento algum de despeza, voto a favor d'este projecto, porque satisfaz uma necessidade publica.
O sr. Oliveira Matos: - Sr. presidente, quando nesta camara se apresentaram projectos por parte da maioria que traziam augmento de despeza, eu declarei terminantemente que não votava projecto algum n'essas circumstancias.
N'este momento que estamos a luctar com difficuldades e que se exige ao contribuinte novos impostos, eu hei de continuar a ser coherente com este principio e a manter as declarações que tenho feito, arrostando assim com o desgosto dos meus collegas da maioria, em não me prestar á approvação de projectos que tragam augmento de despeza.
É necessario que nos convençamos de que não estamos sós na camara. O paiz está de olhos fitos no que aqui se passa, (Apoiados) e tem rasão de o estar.
Eu não quero referir-me á benevolencia que por vezes se encontra n'esta casa para projectos que necessitam d'ella para poderem passar sem discussão, augmentando mais ou menos disfarçadamente cada dia as despezas publicas. Declarei isto terminantemente ha tres noites; hei de sustentar este principio e não saío delle.
Repito, se então arrostei com a má vontade e com as difficuldades dos meus amigos, não posso deixar de, por coherencia, sustentar os mesmos princípios. Não voto n'esta sessão mais um real de augmento de despeza, a não ser que seja justificada como reproductiva, indispensavel e urgente.
Não julgo indispensavel este augmento de despeza que o projecto traz no momento em que se exigem economias e que se lançam novos impostos ao contribuinte, e por isso voto contra elle; a camara porém na sua soberania votará como quizer.
(O sr. deputado não reviu.)
O sr. Silva Amado: - De um modo geral parece-me que as reflexões, que o sr. Oliveira Matos acaba de fazer, são justas. Realmente, no momento que atravessâmos é preciso que nos compenetremos da necessidade de fazer economias; entretanto é preciso que este espirito de economia seja verdadeiramente reflectido e não exagerado; (Apoiados) porque a economia não póde ir até ao ponto de prejudicar a administração. (Apoiados.)
E no caso presente parece-me que o projecto é de uma necessidade incontestavel, porque todos aquelles que frequentaram a escola polytechnica tiveram occasião de ver que a cadeira de physica serve de preparativo para variados cursos.
Alguns cursos ha para que os alumnos quando frequentam a cadeira de physica têem já sido approvados no primeiro e segundo anno de mathematica, isto é, não só algebra e geometria, mas ainda o calculo infinitesimal; pelo contrario ha outros que não têem estes preparatorios, nem precisam de os ter.
Realmente, estudar physica, como é estudada, da maneira como as lições são dispostas, exactamente como se todos os alumnos estivessem habilitados a comprehender o que o professor explica, é prejudicar o ensino.
Ha lições e lições que os alumnos não podem aproveitar. E isto é tanto assim, que nalguns annos o professor tem-se julgado obrigado a fazer um curso preliminar de mathematica n'um certo numero de lições, com prejuizo do ensino, porque o tempo, que é destinado a este estudo feito á pressa e, por assim dizer, atabalhoadamente, de uma disciplina que não lhe compete ensinar, vem a faltar para o ensino das variadissimas materias que se comprehendem na physica.
N'estas condições parece-me que é uma verdadeira necessidade para o ensino o desdobramento da cadeira como indica o projecto. Se é preciso cortar pelas despezas, deve fazer-se de maneira que seja rasoavel. Vamos então a todos os serviços publicos, cortemos tanto quanto o permittirem as necessidades do serviço e assim poder-se-hão fazer naturalmente muito maiores economias.
Não ha alumnos que tenham frequentado aquella cadeira que não estejam convencidos, creio eu, de que realmente luctaram com enormes difficuldades; basta dizer que a percentagem dos alumnos repelentes na cadeira de physica é muito maior do que nas outras, porque essas difficuldades são de tal ordem que difficilmente se podem vencer.
Quando o ensino é imperfeito, como este, e se vê que se póde obviar a esta difficuldade com uma despeza tão insignificante, como esta, que verdadeiramente não onera o thesouro porque é n'uma quantia muito pequena e porque havendo desdobramento da cadeira e sendo as matriculas por cadeiras, ha uma propina para cada uma das duas, parece-me que não ha motivo para hesitar.
Considero, portanto, este projecto como um d'aquelles que devem merecer a approvação da camara, por isso que satisfaz uma verdadeira necessidade de ensino.
(O sr. deputado não reviu os seus discursos.)
O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Mando para a mesa o seguinte
equerimento
Requeiro a v. exa. que consulte a camara se julga a materia sufficientemente discutida. = Visconde da Ribeira Brava.
O sr. Oliveira Matos: - Eu tinha pedida a palavra.
O sr. Presidente: - A palavra para um requerimento prefere. Alem d'isso, vindo o sr. deputado assignado no projecto julgava que estava de accordo.
Posto á votação o requerimento, foi approvado.
Seguidamente foi approvado o artigo 1.º do projecto.
O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 2.°
O sr. Oliveira Matos: - É simplesmente para responder ao meu illustre amigo o sr. dr. Amado. S. exa. fez uma asserção que me parece não exprime bem a sua idéa, nem tão pouco tira o valor ao argumento por mim adduzido.
Disse s. exa. que o projecto era necessario e que devia ser attendido pelo lado das questões de administração. O projecto nada implica com essas questões.
Diz s. exa. que não se deve cortar. Não se corta cousa nenhuma. Eu não sou d'aquelles que levam o furor das economias até ao ponto de cortar nos serviços que estão orçados e são indispensaveis á boa administração; mas este não está creado.
Sendo, como é, uma innovação de que resulta despeza, foi sob este ponto de vista que combati o projecto, e não levado pelo furor de ser desagradável ao illustre deputado, nem aos representantes do projecto, nem ao governo, que ainda não foi ouvido sobre o assumpto e eu desejo que o seja.
O assumpto corre pelo ministerio do reino, não está presente o nobre titular d'esta pasta e eu desejo saber só s. exa. acceita ou não o projecto com o augmento de despeza que elle traz.
Eu assignei o parecer da commissão de fazenda por estar convencido, como s. exa. está, de que o projecto não trazia augmento de despeza. Perguntei se havia augmento de despeza e disseram-me que não.
Mas desde que se reconhece que este projecto traz augmento de despeza, eu, coherente com a declaração que tinha feito, não posso deixar passar o projecto, sem o meu protesto.
Se a maioria e a minoria estão de accordo para o approvarem, convencidas até de que o projecto é excellente, podem approval-o por acclamação, essa honra e gloria fique com ellas, mas eu coherente com o que digo honra-
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de, leal e sinceramente é que não podia deixar de fazer o que estou fazendo.
Desde que das bancadas ministeriaes, em vista das circumstancias afflictivas do thesouro, se recusa a dotação do serviços que d'ella necessitam, eu entendo que presto um serviço ao paiz, ao thesouro e ao governo, combatendo um projecto que augmenta muito ou pouco as despezas publicas.
Mantenho-me n'este papel em harmonia com o que aqui d'isso ante-hontem: votarei só o augmento das despezas que forem indispensaveis á administração publica e aos serviços publicos inadiaveis. Se não, não.
Portanto, varrida a minha testada e apresentada a minha opinião com a coherencia, hombriedade e dignidade com que entendi o dever sustentar n'este logar, insisto em que o sr. ministro do reino, por cuja pasta corre este assumpto, emitta a sua opinião a este respeito para que diga se perfilha ou não esto projecto.
Por isso requeira a v. exa. que este projecto fique adiado até estar presente á discussão o sr. ministro do reino.
(O sr. deputado não reviu.)
Leu-se na mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. que o projecto seja adiado até estar presente o sr. ministro do reino, por cuja pasta corre o assumpto. = O deputado, Oliveira Matos.
Consultada a camara, foi rejeitado.
O sr. Silva Amado (relator): - Parece-me que não me equivoquei quando fiz algumas reflexões, a que respondeu o sr. deputado Oliveira Matos.
A organisacão do ensino faz parte da administração e, por conseguinte, parece-me que este projecto, que tende a melhorar o ensino, melhora a administração publica. (Apoiados.)
Por outro lado eu não sei distinguir bem entre as cousas que estão creadas e aquellas que o não estão, sob o ponto de vista do que é util; mas parece-me que nós estamos aqui para reformar as leis que forem más e fazer o que seja bom. Se houver qualquer despeza inutil, parece-me que estamos auctorisados a revogar essas leis, que permittem essas despezas inuteis; se, pelo contrario, houver qualquer despeza grande ou pequena que deva fazer-se, e seja verdadeiramente reproductiva, parece-me que estamos auctorisados a approvar a lei que auctorise essa despeza; é por isso que considero que este projecto, sendo approvado, trazendo um augmento de despeza insignificante, ou mesmo não trazendo augmento de despeza, deve merecer o voto da camara, emquanto que uma disposição qualquer que já exista, mas não seja vantajosa, deve ser derogada.
N'estas condições, parece-me que não tendo o sr. deputado apresentado objecção alguma que me convença de que não é util o principio que é estabelecido no projecto, elle deve ser approvado.
(Interrupção do sr. Oliveira Matos.)
Mas o illustre deputado, não só approvou este projecto por parte da commissão de fazenda, como tambem o approvou por parte da commissão de instrucção publica superior, e certamente que quando deu o seu voto s. exa. estava convencido de que elle realmente era justo.
(Interrupção do sr. Oliveira Matos.)
lias só ha a creação de uma cadeira é claro que ha de pagar-se ao professor; para fazer face a essa despeza ha o augmento das propinas que na escola polytechnica são pagas por cadeiras, e de certo cobrirão a despeza; e se não a cobrirem, muito a diminuirão; parece-me, portanto, que vale a pena sacrificar o pequeno augmento de despeza que acaso provenha d'este projecto, quando o melhoramento para o ensino é real e positivo.
Lido na mesa o artigo 2.° foi approvado.
O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 3.º
O sr. Oliveira Matos: - Eu pedi a palavra para dizer a v. exa. que eu estou satisfeitissimo com a resolução que a camara entendeu dever tomar, e que eu acato e respeito sem uma palavra de censura, como não quero tambem dar a ninguem o direito de me tolher o exercicio livre do meu direito n'esta assembléa. Na sua alta sabedoria e independencia, a camara entendeu que devia votar por maioria este projecto de augmento de despeza, a despeito das minhas considerações e do requerimento que mandei para a mesa, pedindo o adiamento da discussão até que estivesse presente o sr. ministro do reino, por cuja pasta corre este assumpto; eu entendi, e muitissimo bem, segundo a minha consciencia, que cumpri o meu dever respeitando a deliberação da camara, embora me custe estar em desaccordo com ella, desaccordo que não prejudica a boa camaradagem e a disciplina que existe no meu partido.
Devo, porém, declarar, em relação á opposicão, de quem eu disse que talvez por acclamação votasse o augmento de despeza, que fui injusto, pois que ella se collocou briosamente ao meu lado, entendendo que não devia concorrer para que o augmento de despeza fosse levado a effeito; repito, pois, a declaração que fiz com respeito a este projecto, e que farei tratando-se de outros em que a santa benevolencia anda pairando n'esta atmosphera, para que fosse votada por acclamação, o que, confesso, sempre me repugna, porque só por acclamação desejaria que se votassem os grandes votos de louvor, como por vezes se tem feito aos nossos heroes de Africa, os outros que os merecessem, ou ás grandes manifestações de regosijo ou sentimento nacional; por acclamação qualquer assumpto que importe augmento de despeza, n'este momento, não posso votal-o.
Lavrado o meu protesto, só meu, e mantendo a attitude que me impuz n'esta camara, em obediencia á declaração feita ante-hontem, congratulo-me com os meus collegas que votaram como entenderam; elles estão satisfeitos com o seu papel, e eu tambem estou satisfeito com o meu.
Tenho dito.
(O sr. deputado não reviu.)
O sr. Eduardo Villaça (para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. se digne consultar a camara se julga a materia sufficientemente discutida. = O deputado, A. E. Villaça.
Foi approvada.
Em seguida foi approvado o artigo 3.º sem discussão.
O sr. Moraes Saimento: - Mando para a mesa o seguinte
Aviso previo
Desejo conhecer de s. exa. o ministro do reino qual a solução dada ao conflicto pendente entre o reitor e o corpo docente do lyceu de Beja. = J. E. de Moraes Sarmento.
Mandou-se expedir.
O sr. Dantas Barracho: - Cabe-me a honra de mandar para a mesa o parecer sobre a proposição de lei da camara dos pares, que se refere ao ultimo descendente de Vasco da Gama, o grande navegador portuguez.
Este projecto, que foi d'esta casa do parlamento, que foi brilhantissimamente sustentado pela palavra eloquente do sr. José de Alpoim e ministro da justiça, que eu reforcei com palavras proprias de quem é humilde, foi modificado na camara dos dignos pares, com a annuencia absoluta e completa dos partidos que ali estão representados e do governo - a modificação é no sentido de serem dispensados do pagamento dos emolumentos, direitos de mercê e
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sellos, pelos titulos em que foram respectivamente agraciados D. Eugenia Telles da Gama e D. Manuel Telles da Gama. A primeira foi nomeada marqueza de Unhões, e o segundo conde de Cascaes.
Este projecto teve o applauso unanime da camara dos dignos pares. Em presença do que foi dito na sessão em que n'esta camara se tratou d'este assumpto, nada mais tenho a acrescentar, a não ser que eu acho tão justo o projecto, que podia que não fizessemos nota de discordancia do que se fallou na outra camara e do que o assumpto pede, pela sua elevação e pela grandeza que elle representa.
V. exa. e a camara me desculpará que eu peça a dispensa do regimento para que o projecto seja approvado por acclamação. (Muitos apoiados.}
Leu-se o seguinte:
"Alterações feitas pela camara dos pares á proposição de lei da camara dos senhores deputados, que dispensa D. José Telles da Gama do pagamento dos emolumentos, direitos de mercê e sêllo pelo titulo de conde da Vidigueira:
"Artigo 4.° São igualmente dispensados do pagamento dos emolumentos, direitos de mercê e sellos pelos titulos de marqueza de Unhões e conde de Cascaes, com que foram respectivamente agraciados, D. Eugenia Telles da Gama e D. Manuel Telles da Gama.
Art. 5.° O 4.° da proposição.
Palacio das côrtes, em 25 de maio de 1898. = Marina João Franzini = Julio Carlos de Abreu e Sousa = Conde de Bertiandos.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - Em vista da manifestação da camara, considero o parecer approvado por acclamação. (Apoiados geraes.)
ORDEM DA NOITE
Continuação da interpellação do sr. Mello e Sousa ao sr. ministro da fazenda, ácerca do contrato das 73:718 obrigações dos caminhos de ferro
O sr. Presidente: - Continúa com a palavra o sr. Mello e Sousa.
Devo lembrar a s. exa. que, para terminar o seu discurso, tem um quarto de hora e mais um quarto que lhe concede o regimento, devendo terminar ás dez horas e meia.
O sr. Mello e Sousa: - Continuando nas considerações interrompidas na ultima sessão, nota que o argumento apresentado pelo sr. ministro da fazenda de que o sr. Hintze Ribeiro firmou contratos de supprimentos com taxas superiores a 8 por cento, juntando-se-lhes as commissões, seria de má fé se s. exa. tivesse lido esses contratos, o que realmente não fez.
A verdade é que esses contratos foram sempre com taxas inferiores, e o banco commercial, com o qual se fez alguns d'elles, não exigiu caução, e foram sempre feitos a descoberto.
Concorda com o sr.. ministro da fazenda em que, geralmente, a cotação dos titulos publicos é que é a reguladora do credito do paiz, mas tal principio não se póde applicar a um supprimento caucionado.
O contrato de que se trata é na verdade um contrato de usura, e os contratos de similhante natureza eram, ainda ha pouco, prohibidos em França, e talvez ainda o sejam, o que talvez explique á rasão por que elle não foi assignado em França, embora a participação dos banqueiros inglezes fosse pequena, como presume.
Em Paris a taxa de desconto para qualquer commerciante, ainda a menos importante, é de 2 por cento, sem exigencia de caução.
Não póde, por isso, comprehender a rasão por que o sr. ministro da fazenda effectuou o contrato, tão fortemente caucionado, a uma taxa tão elevada.
Qualquer individuo, que possuisse as obrigações do caminho de ferro, negociaria com certeza em Paris um contrato em condições muito mais vantajosas.
Continúa o orador n'esta ordem de idéas, e depois de largas considerações, termina repetindo que ainda não se sabe onde param as obrigações, como não se sabe se nos pertence o coupon, nem tão pouco se temos direito a havel-as depois de satisfazermos a primeira parte do supprimento.
O que parece positivo, evidente e averiguado, é que essas obrigações desappareceram e que não ficaram senão encargos que o paiz ha de pagar.
(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - Estão inscriptos os srs. Moncada, conde de Burnay e Cayolla; mas antes de dar a palavra aos srs. deputados, desejo saber como é que s. exas. se inscrevem.
O sr. conde de Burnay é contra ou a favor?
O sr. Conde de Burnay: - Segundo a feição politica, inscrevo-me contra; mas desejo ouvir todos os srs. deputados para depois responder.
O sr. Presidente: - Então tem a palavra em primeiro logar o sr. Cayolla, em seguida o sr. Moncada e depois darei a palavra ao sr. conde de Burnay, segundo a inscripção que está feita.
O sr. Lourenço Cayolla: - Sr. presidente, a camara acaba de ouvir a replica que o sr. Mello e Sousa deu ao discurso tão sincero, tão eloquente e tão elevado que hontem proferiu o sr. ministro da fazenda.
Sem paixão partidaria e antes com mágua, porque é sempre com mágua que presenceio qualquer scena menos propria do respeito devido ao parlamento, pergunto a todos que me ouvem se essa replica, em que o orador querendo ter graça só proferiu chalaças, querendo tratar uma alta questão de moralidade, - caracter que com este debate fôra insistentemente annunciado, - fugiu constantemente a ella e empregou phrases que não se coadunam com o prestigio da primeira tribuna politica da nossa terra, para substituir a critica severa e fundamentada que era licito esperar de quem já conta tantas responsabilidades como s. exa., se essa replica, dizia eu, foi digna de quem a pronunciou, foi digna de todos nós. (Apoiados.)
Lamento ter de me exprimir assim. O sr. Mello e Sousa é sem duvida um trabalhador, é sem duvida um estudioso, mas os seus amigos politicos aqueceram-no de mais com a luz do sol da adulação. (Apoiados.) Essa luz crestou-lhe as azas. Por isso s. exa., em vez de se elevar na forma e noa conceitos ao discutir graves questões de administação publica, faz discursos como aquelle que acabámos de lhe ouvir especialmente na parte da sessão de hontem, sem um impeto de nobre eloquencia, arrancada á paixão sincera, sem a nitida comprehensão do que obriga a elevada situação que os seus correligionarios lhe pretenderam crear e, considerando talvez uma velharia desprezivel o aprumo fidalgo, caracteristico de todos os que entre nós mais têem honrado a tribuna parlamentar, prefere usar de uma linguagem de conversa intima, recorrer a trocadilhos de palavras de discutivel bom gosto, pondo de lado a gravidade da phrase, a rigorosa compostura e a seriedade da fórma, que sempre foi requisito indispensavel das mais nobres discussões parlamentares. (Apoiados.)
Sr. presidente, estas minhas palavras que, torno a repetir, deploro ter de as dizer, não excluem a admiração que consagro aos espiritos delicados e graciosos, que usam a ironia como arma superior e acerada de combate. (Apoiados.)
Mas a ironia nunca foi o gracejo forçado, a ironia não se traduz no recurso e emprego de palavras de sentido
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equivoco, como as que hontem aqui ouvimos, e acima de tudo ella não é a troça, para me servir de um estribilho muito do agrado do orador a que respondo, em que o illustre deputado quiz envolver um dos mais distinctos membros do nosso alto funcionalismo, um servidor dedicado da nação, que tem subido todos os degraus da escada da burocracia com o esforço do seu proprio merito, um politico leal e dedicado que o partido regenerador contou durante muitos annos nas suas fileiras, recebendo d'elle serviços tão altos, como o sr. Mello e Sousa difficilmente terá occasião de lhe prestar agora, o sr. conselheiro Pereira Carrilho emfim. (Apoiados.)
Sr. presidente, o sr. Mello e Sousa, ao mesmo tempo que estranhava que o sr. ministro da fazenda se tivesse referido n'esta camara ao sr. Hintze Ribeiro que não faz parte da nossa assembléa, apreciando os actos praticados pelo illustre estadista como ministro da fazenda da situação transacta, aggravava aquelle infatigavel trabalhador, descrevendo-o como um elemento passivo, que se presta a escrever tudo o que lhe indicam e provocava gargalhadas estrepitosas phantasiando uma carta de s. exa. e annunciando-a para a folha official do hoje.
Essas gargalhadas, que no momento podiam lisongear a vaidade do orador, eram o primeiro castigo da má acção que s. exa. estava praticando. (Apoiados.)
Sr. presidente, não obstante ser adversario politico do sr. Mello e Sousa e divergir muito dos processos parlamentares que aquelle illustre deputado entende dever seguir, creio bem, pelo respeito que tenho pelas suas qualidades pessoaes, que elle hoje já não se orgulha da deploravel phantasia do seu discurso de hontem. (Apoiados.)
O sr. Mello e Sousa era o mais improprio para dar a este debate o caracter que lhe deu. Ainda antes de conhecido o contrato de 30 de março, s. exa. denunciava-o ao paiz como um documento que traduzia uma verdadeira vergonha nacional. Essa affirmação feita por quem tem a sua auctoridade, devia produzir e produziu de certo um grande mal para o nosso credito. (Apoiados.) S. exa. praticou, na minha opinião, um acto leviano e pouco de molde para acreditar os seus dotes de homem publico. Uma phrase d'esta ordem só se pronuncia, quando ha a necessidade inadiavel de se denunciar um verdadadeiro crime, ou uma provada traição. De outra fórma não se vae precipitadamente e sem base dar novo alimento ás campanhas de suspeições, que tanto prejudicam a causa nacional. (Apoiados.) Mas pronunciando-a, coutrahiu uma responsabilidade muito grande, a responsabilidade de provar a verdade do que dissera. O momento era pois solemne de mais para gracejos e troças, que não se compadecem com as elevadas funcções que aqui desempenhamos. (Apoiados.)
O sr. Malheiro Reymão: - Peço a palavra.
O Orador: - No principio do seu discurso, disse o sr. Mello e Sousa que não fóra a opposição que quizera dar um caracter escandaloso a este debate, que não fora ella que andara a intrigar e a alarmar a opinião com estranhas revelações. Se essas palavras valem como um acto de arrependimento e de contricção, bem vindas sejam, mas se foram pronunciadas para lançarem sobre nós uma responsabilidade que não nos cabe, repellimol-as por completo (Apoiados.)
Ha dias e dias que os illustres deputados da opposição se referem aqui constantemente ao contrato de 30 de março. Essas referencias, desde a celebre phrase a que já alludi do sr. Mello e Sousa, vinham sempre envoltas em suspeitas desairosas e reticencias destinadas a perturbarem e desvairarem a opinião publica. (Apoiados.)
Diziam s. exas. que eram precisas ondas de luz para illuminar este caso escuro, para desvendar o mysterio quasi impenetravel que elle envolvia; preparavam uma atmosphera de desconfianças, tão densa que nos podesse asphyxiar; podiam documentos e documentos declarando que não deixariam passar uma sessão, que não desperdiçariam uma hora sem se occuparem de uma tão grave questão de moralidade. (Apoiados.)
A maneira como a opposição lá fóra secundava os esforços aqui empregados pelos seus representantes todos a conhecemos bem. (Apoiados.) E vem-se dizer agora que foi o governo, que fomos nós que provocámos o escandalo, que recorremos a intrigas, que fizemos revelações compromettedoras! (Apoiados.)
Pelo lado do governo o que se respondeu?
O nobre ministro da fazenda declarou, desde o primeiro dia, que, movido por considerações muito elevadas, pelo que devo á dignidade do seu cargo e á felicidade do paiz, assumia por completo a responsabilidade do contrato. (Apoiados.)
Esse contrato era um facto consummado, não se podia annullar; mas ainda que a annulação se podesse fazer, ella representaria um golpe talvez mortal para o credito da nação. (Apoiados.)
N'estes termos o illustre estadista, movido pelo mais nobre sentimento de patriotismo, declarava que defenderia o contrato como se elle directamente o tivesse negociado, como se elle no acto da assignatura o tivesse firmado com o seu proprio nome. (Apoiados.)
Ao fallar d'este modo não lançava insinuações sobre ninguem, (Apoiados.) não se referia a nenhum episodio anterior á assignatura do contrato, não procurava companheiros para o sacrificio que lhe queriam impor e serenamente assumia, torno-o a repetir, a responsabilidade d'esses actos como se elle e só elle os tivesse commettido. (Apoiados.)
Quem foi, pois, que deu um caracter escandaloso a este debate?
Quem levantou desconfianças e suspeições?
A opposição julgou que podia ferir o governo. Conhece agora que se lhe quebraram nas mãos as armas que suppunha possuir e é por isso que vem, com estranha audacia, que nem ao menos tem a feição sympathica desse arrependimento sincero, imputar-nos uma responsabilidade que de todo lhe pertence. (Apoiados.)
A maioria acceitou o debate no terreno em que o collocaram, mas não o provocou, não o podia ter provocado. Se elle realmente se baseasse n'uma negociação vergonhosa, tudo que se apurasse na discussão íria ferir unicamente o governo e por isso, sob o ponto de vista politico, seria pelo menos uma insensatez da nossa parte promover similhante discussão. (Apoiados.)
O sr. Reymão: - Por isso se arrependeram.
O Orador: - Onde ouviram s. exas. uma unica palavra que os auctorisasse a dizer que fomos nós que levantámos o escandalo? (Apoiados da direita.)
O sr. Reymão: - Temol-as ouvido lá fóra, em toda a parte. (Apoiados da esquerda.)
O Orador: - Somos nós que ha mais de quinze dias estamos exigindo, entre phrases de denuncia, a publicação de documentos, publicação que o governo declarava nociva aos interesses publicos? (Apoiados da direita.) De onde vieram as insinuações, as suspeitas, as desconfianças? (Apoiados.)
O sr. Reymão: - De v. exas., do sr. ministro da fazenda, do Diario do governo. (Apoiados da esquerda.)
O Orador: - Isso não é exacto. Os documentos foram publicados no Diario do governo depois de instantes reclamações de v. exas., (Apoiados.) depois do sr. Mello e Sousa ter dito que o contrato era uma vergonha para o paiz.
O sr. Cabral Moncada: - E acertou infelizmente. (Apoiados da esquerda.)
O Orador: - Acertou, diz v. exa. Resta que provo essa phrase, e que a prove melhor do que o seu collega da opposição provou a sua. (Apoiados da direita.)
Um outro crime pesa sobre os nossos hombros. Senta-se n'esta camara o ex-mandatario do governo e a maioria
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parlamentar tem emprega-lo todos os esforços, recorrido a expedientes sobre expedientes para impedir que elle falle, para alcançar que não se descerre aquella boceta de Pandora!
Como este procedimento contrasta com o da opposição parlamentar, quando o anno passado, vibrante de dignidade, intimava o mesmo sr. conde de Burnay a fazer revelações completas sobre as suas relações com o partido regenerador!
Assim o affirmam, assim estabelecem o contraste os membros da minoria.
Mas as suas palavras não são leaes nem verdadeiras. (Apoiados.) Por mim o digo. Se pertencesse a um partido tão receoso dos seus actos, que precisasse atropellar todas as praxes e todas as regras para evitar que elles fossem divulgados, saíria immediatamente por aquella porta envergonhado das horas que tinha consagrado á politica. (Apoiados.) Mas não, o partido progressista, felizmente, não tem taes receios. (Apoiados.) Faça-nos a opposição a justiça de acreditar que em questões de dignidade iguala-nos de certo, mas não nos excede nunca. (Apoiados.)
Houve, com effeito, ha dias, uma scena violenta entre a maioria e o deputado a que se allude. Mas essa scena deu-se quando esse deputado entendeu que podiam aqui ter voz os seus interesses e as suas incompatibilidades de banqueiro. (Apoiados.) A maioria protestou contra o que reputava uma offensa cruel á dignidade parlamentar, offensa que ella não podia consentir sem immediato e violento desaggravo. (Apoiados.) Mas agora, póde o sr. conde de Burnay fallar á vontade. (Apoiados.) Póde dizer tudo o que tiver de necessario á sua defeza, que ninguem lhe coarctará o uso do seu direito. Falle, esclareça tudo, diga tudo sem meias palavras, sem hesitações, sem reticencias, porque essas reticencias não as agradeceriamos e seriam mesmo o maior ultrage que s. exa. nos poderia fazer. (Apoiados.)
Vamos agora ao contrato.
O sr. Mello e Sousa, no seu primeiro discurso, para justificar os repetidos epithetos de vergonhoso, escandaloso, extraordinario, indecoroso, único, bordões constantes das suas notas rhetoricas, ainda apreciou alguns pontos especiaes do contrato. Mas, na replica, fugiu de todo d'elle, excepção aberta a duas ou tres observações que fez na sessão de hoje e a que opportunamente hei de responder.
Foi no seu primeiro discurso que s. exa. nos apresentou a pasmosa theoria de que possuindo os contratadores do emprestimo, alem da caução, os titulos do emprestimo, ficavam por esse facto com duas especies de caução, ambas negociaveis, podendo tentar assim uma grande especulação de bolsa. O nobre ministro da fazenda já desfez esta illusão do espirito de s. exa.; e eu, apesar de leigo no assumpto, custa-me a comprehender como o sr. Mello e Sousa pôde imaginar uma theoria tão estravagante. (Apoiados.)
Uma cousa é o penhor e outra é o titulo de divida. O titulo de divida existe sempre em operações d'esta natureza independentemente do penhor, o qual não muda de proprietario.
Assim, no caso de que se trata, o proprietário das obrigações da companhia real continua a ser o estado. N'estas condições como poderão os tomadores do emprestimo negociar titulos que têem em seu poder, mas cuja propriedade não lhe pertence? (Apoiados.) Eu, como já disse, não perfilho similhante receio. (Apoiados.) Se os negociadores quizerem negociar com o penhor, não obterão rendimento, porque o rendimento d'esses titulos será do estado. Se quizerem negociar com as letras, terão de pagar juro aos que as tomarem, perdendo assim o que nós pelo contrato lhes teremos de satisfazer. (Apoiados.)
Referiu-se tambem o sr. Mello e Sousa ao encargo tomado pelo estado o pagamento do sêllo. Esse encargo é uma condição constante de todos os contratos d'esta natureza, e portanto não póde ser tomado como ponto de censura para a operação que estamos apreciando.
Estygmatisou depois o emprestimo pela importancia dos seus encargos.
S. exa. architetou o calculo definitivo dos juros da operação. Não será por esse calculo que poderá conseguir a confiança que tanto almeja para a sua arithmetica. (Risos.) Serei talvez cruel fatiando assim, por isso que a mais intensa preoccupação do sr. Mello e Sousa é a do rigor e vastidão dos seus conhecimentos arithmeticos e mesmo dos seus conhecimentos mathematicos. (Risos.) Essa preoccupação soffreu porém, hoje, um duro golpe o até o meu espirito, sempre inclinado a admirar as faculdades e o saber de s. exa., ficou muito perplexo ao ouvil-o dizer que de modo algum deseja aprender mathematica com o nobre ministro da fazenda, porque se fosse discipulo do tão illustre mestre podia deixar do conhecer a epocha de pagamento das letras que tivesse a satisfazer. (Risos.) É essa a idéa que o sr. Mellos Sousa faz da formosa sciencia mathemathica ? (Risos.)
S. exa., avaliando os encargos da operação chegou a concluir que elles attingiam 9 4/10 por cento. O sr. ministro da fazenda levantou-se depois o provou de uma maneira tão irrefutavel, que o sr. Mello e Sousa nem se atreveu a contestar, que aquelles encargos pouco excediam oito por cento. (Apoiados.)
Tenho agora ensejo opportuno de me referir aos contratos de que o illustre deputado hoje desenvolvidamente tratou e a que o sr. conselheiro Ressano Garcia já hontem tinha alludido, sobre operações realisadas pelo ministerio transacto.
Recordando esses contratos o sr. ministro da fazenda asseverava que o seu juro não era inferior a 7 e a 8 por cento.
Uma d'essas operações, pelo menos, foi realisada com o Banco Commercial. Quando fallou d'essa operação não teve o sr. conselheiro Ressano Garcia uma palavra que não fosse de attenção para com tão importante estabelecimento.
O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Apoiado.
O Orador: - Porque vem, pois, o sr. Mello e Sousa, no uso do seu direito, mas de certo escusadamente, defender esse estabelecimento, que não foi aggravado, porque merece do sr. ministro da fazenda...
O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Apoiado.
O Orador: - E de todos nós a maior consideração? (Apoiados.)
Dizia s. exa. que esse contrato foi negociado a 5 por cento ao anno, e apenas com a commissão de 3/4 para o primeiro trimestre. O sr. ministro da fazenda já nos mostrou aqui a modicidade de tal contrato, que sendo a 5 por cento de taxa fixa com 3/4 por cento por trimestre de commissão, corresponde por fim ao juro de 8 por cento ao anno. A isto objectou o sr. deputado a que estou respondendo, que a commissão só se adoptou para o primeiro trimestre, porque depois, na reforma do contrato, já ella não vigorava. Esqueceu-se, porém, o sr. Mello e Sousa de que o nobre ministro da fazenda não se referia á reforma do contrato; apreciára-o na fórma como elle foi redigido e esqueceu-se ainda que o sr. conselheiro Hintze Ribeiro quando o assignou não tinha a certeza, não podia mesmo prever que o banco commercial havia depois do reformar as letras nas condições em que o fez, isto é sem a primitiva commissão. (Apoiados.)
A verdade é que aquelle illustre estadista, quando negociou esse contrato, se comprometteu a pagar um encargo que equivale a 8 por cento ao anno. (Apoiados.)
Teve occasião depois de o reformar em condições mais vantajosas para o paiz. Foi bom que o conseguisse. Mas as condições da reforma não invalidam as da primeira operação e estas foram exactamente como sr. ministro da
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fazenda aqui as descreveu, isto é, analogas ás do emprestimo que estamos discutindo. (Apoiados.)
Apreciando ainda os juros, disse o sr. Mello e Sousa que o credito do paiz se avalia pela cotação dos juros da divida externa, mas que a comparação entre os juros dos emprestimos e da divida não tem rasão de ser quando se trata de operações caucionadas. Não comprehendo a distincçãão do illustre deputado. Não percebo realmente em que póde influir a caução do emprestimo que negociámos agora noa juros vencidos pelos titulos da divida externa.
O argumento do sr. conselheiro Ressano Garcia era o seguinte e fora exposto com notavel lucidez: Os nossos titulos de divida externa produzem 4 por cento, á cotação actual. Formulo apenas uma hypothese, e não assevero um facto, porque não sei quanto elles vencem na realidade, visto que, infelizmente, não os possuo. (Risos.) Faz-se um emprestimo a 17 por cento. O excesso do juro é, portanto, de 3 por cento.
N'outra occasião o juro da divida externa produzia 5 por cento, e realisou-se um emprestimo a 8 por cento. O excesso continua a ser o mesmo e n'estas condições affirmava o sr. ministro da fazenda: sob o ponto de vista do credito nacional, as operações são iguaes, porque a differença entre os juros dos emprestimos e os juros dos titulos da divida externa manteve-se a mesma. (Apoiados.) Sendo isto assim, como realmente é, era que póde o facto das operações serem ou não caucionadas alterar a base da comparação? (Apoiados.) Por isso eu dizia que não comprehendia a subtileza do argumento do orador a quem estou replicando. (Apoiados.)
Os encargos da operação foram o ponto que mais preoccupou o sr. Mello e Sousa e por isso s. exa. insistiu em que, sendo o contrato de 30 de março negociado em titulos caucionados, o juro d'esse contrato nunca deveria ser superior á taxa de desconto do banco de França, que é de 2 porcento. Em vez d'isto esse juro é mais do dobro, affirmando ainda o illustre deputado que a lei franceza se oppõe a contratos d'esta ordem.
Ignoro se a lei franceza os permitte ou não. V. exa. é muito mais versado no assumpto do que eu, o tanto que todos os dias nos está dando preleções sobre as leis estrangeiras. Mas o que sei é que temos um contrato, em conto corrente com a casa Bahring, de Londres, pelo qual se estipulou pagarmos 1 por cento acima da taxa de desconto do banco do Inglaterra. A taxa d'este banco é, muitas vezes, de 4 por cento. Quando tal se dá pagámos portanto á, casa Baring 5 por cento. Alem d'isso temos ainda a satisfazer mais 2 por cento de commissão. Sommado tudo, conclue-se que quando a taxa do banco de Inglaterra é de 4 por cento, caso que não é raro, os encargos d'aquella conta corrente attingem 7 por cento.
Aqui tem o sr. Mello e Sousa um contrato tambem caucionado, pelo qual pagámos muito mais do que o dobro da taxa do banco de França. (Apoiados.)
Descobriu tambem o erudito deputado regenerador que, em virtude da letra do contrato de 30 de março, os contratadores do emprestimo ficaram com o direito de fazerem o mesmo emprestimo em libras ou francos, á sua vontade, e receberem depois os seus creditos na moeda que mais lhes convier. Alongando-se n'este ponto annunciou-nos terriveis perigos a que eu hei-de mais tarde referir-me.
Por ultimo imaginou que o governo se encontra privado de receber o coupon.
Já ha pouco contestei esta affirmação, mas torno a repetir que, desde que as obrigações da companhia dos caminhos de ferro não deixaram de ser propriedade do estado, desde que o emprestimo se fez marcando-se valor fixo a essas obrigações, essa clausula é a prova de que realmente não se contou com o coupon.
Este faz parte da propriedade dos titulos, continua pois a pertencer ao estado que não os alienou ainda. (Apoiados.) Não vejo, pois, o perigo tão tetricamento descripto. (Apoiados.}
A isto se reduziram as criticas principaes do sr. Mello e Sousa contra o contrato, criticas annunciadas com tanto reclame, como devendo constituir uma condemnação inexoravel e irrespondivel.
Abstive-me de alludir ás considerações com que s. exa. iniciou a sua replica, porque a resposta do sr. ministro da fazenda já annullára o effeito d'essas considerações e a prova é que o illustre deputado pouco depois as abandonava por completo, insistindo apenas na supposta faculdade, dos contratadores do emprestimo poderem escolher á sua vontade a moeda e os pagamentos das prestações e da recepção da importancia dos seus creditos.
A prova fulminante contra o que disse o sr. Mello e Sousa, consiste em que, segundo estou informado, os contratadores têem satisfeito em libras parte das prestações já pagas, ao contrario do que receava o illustre deputado.
Se assim é, a que se reduziu a campanha da opposição? A que vergonhas arrastou o sr. ministro da fazenda o bom nome do paiz ? O que ha no contrato, o que ha de verdadeiro em todas estas indignações que possa explicar uma tal campanha de descredito, uma tal indignação pelo grande escandalo, como aquella que a opposição manifestou?
A unica accusação, que fica de pé contra o sr. ministro da fazenda, deriva d'elle não dizer á camara os nomes dos banqueiros que alem do Anglo-Foreign Banking tomaram parte n'este emprestimo. E a unica tabua a que se agarra a opposição para continuar a explorar a credulidade do publico.
O sr. Moncada: - Ainda ha mais.
O Orador: - Talvez ellas se descubram quando v. exa. fallar, porque até agora ainda ninguem o conseguiu. (Apoiados.)
Repito, pois. A unica accusação em que converge todas as revoltas dos oradores da minoria, é a de que o sr. ministro da fazenda persiste em não declarar os nomes da banqueiros que tomaram parte na operação.
O sr. conselheiro Ressano Garcia expoz-nos, com a mais honrada isenção, o motivo por que não declarava esses nomes. Tomara com os negociadores do emprestimo o compromisso de não os indicar. Entendia que não podia fallar a esse compromisso sem que esses banqueiros lh'o permittissem. (Apoiados.)
Eis a grande vergonha, eis a vergonha sem igual!
Mas á frente d'esses nomes não está um estabelecimento de toda a respeitabilidade, ao qual o sr. Mello e Sousa foi o primeiro a prestar a devida homenagem? (Apoiadas.)
Se assim é, e é realmente, quem é que póde dizer de boa fé que receia que estas clausulas não serão respeitadas e acatadas?
A afflicção em se conhecerem os nomes dos banqueiros que têem hoje as obrigações dos caminhos de ferro em seu poder, conhecimento que se julga decisivo para só avaliar a importancia e a significação do contrato, é sobremaneira curiosa quando se vê que os deputados da opposição estão á ultima hora e constantemente a censurar o sr. ministro da fazenda por não ter vendido aquelles titulos. (Apoiados.)
Se entendem que elles deviam ser vendidos, se, no caso do governo, já lhes tinham dado esse destino, que lhes importa o nome dos que estão agora na posse d'elles ? (Apoiados.)
Isto serve apenas para acentuar como tem sido pouco sincera a attitude da minoria n'este debate.
O desastre do sr. Mello e Sousa, na sua replica, foi de tal ordem, que s. exa. mesmo o confessou logo ao começar o seu discurso. Antes de procurar invalidar os argumentos do seu adversario, exclamava já: "Vou sair do contrato."
Saíu realmente, e de tal modo que a custo tornou a fazer-lhe leves referencias.
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Para divagar á vontade, repetiu a insinuação de que a baixa recente das obrigações da companhia real se devia decerto a manejos dos contratadores do emprestimo. Depois da maneira tão clara e concludente como o nobre ministro da fazenda nos explicou as circumstancias que tinham originado essa baixa, tal insinuação não devia ter sido feita no parlamento portuguez, sem uma prova fulminante. (Apoiados.)
Discutia tambem o illustre deputado dois episodios que antecederam a assignatura do contrato, um referente ás letras vencidas em 15 de março, e outro ás instrucções dadas ao nosso agente financial em Londres.
Eu alludo a estes pontos, porque s. exa. admirou-se muito de que o nobre ministro da fazenda não os tivesse apreciado no seu brilhante discurso de hontem.
Se o illustre estadista assim procedeu, foi porque quiz manter uma escrupulosa correcção, que demonstra bem a sua dignidade e abnegação, postas já, a toda a luz pela leitura dos documentos que appareceram na folha official. (Apoiados.)
Pois vou eu referir-me a elles.
O nobre ministro da fazenda tinha letras a vencer em 15 de março. Quatro dias antes fazia passar os saques para a reforma das antigas letras e mandava expedir para Paris as novas, em condições que estas podiam chegar muito a tempo...
O sr. Conde de Burnay: - Está enganado.
O Orador: - Eu estou discutindo á vista de documentos officiaes, cuja verdade e authenticidade não posso pôr em duvida.
V. exa. está já inscripto. Fallará depois. Emquanto o não fizer, não me póde interromper para negar sem provas o que affirmo.
Á vista d'aquelles documentos pratica-se uma cruel injustiça, accusando-se o nobre ministro da fazenda de desleixado e imprevidente por causa da reforma das letras de 10 de março. (Apoiados.)
Quanto ás instrucções dadas ao nosso agente financial em Londres, a verdade é que até 26 de março o nobre ministro da fazenda esteve sempre convencido de que o contrato se redigiria nos termos da minuta franceza, já combinada.
Foi no dia 26 que s. exa. recebeu o aviso de que lhe era remettido o texto inglez, segundo o qual o contrato seria assignado. Esperou portanto o texto redigido em conformidade com a minuta ingleza.
A 28, o mandatario financeiro do governo mandava-lhe um telegramma, dizendo que o agente financial em Londres tinha achado conformes as duas minutas. Ainda assim, no dia 29, o nobre ministro mandava expedir um telegramma áquelle funccionario, prevenindo-o de que não assignasse o contrato pela minuta ingleza, senão no caso d'ella ser a traducção fiel da minuta franceza, já em seu poder.
E no dia 30, recebendo finalmente a famosa minuta ingleza, e reconhecendo que as duas na realidade differiam muito, apertado pelo tempo, e vencido pela urgencia das circumstancias, concordou por ultimo com a minuta ingleza, mas, ainda assim, introduzindo-lhe alterações que a approximavam muito do que antes se combinára. (Apoiados.)
Esta é a exposição serena dos factos, tal como elles se deduzem á face dos documentos, e estes destroem o castello de cartas que se tem querido levantar sobre a responsabilidade do governo na assignatura do contrato tal como elle se ultimou. (Apoiados.)
O illustre deputado o sr. Mello e Sousa notou ainda e apreciou demoradamente a declaração do sr. ministro da fazenda "de que tem sido sobria, mais do que sobria, austera a administração do actual gabinete!"
S. exa. contra essa affirmação apresentou um argumento fulminante: "ella não póde ser verdadeira, visto que os recursos do thesouro mal têem chegado para os encargos do estado. Isto prova que taes economias nunca se realisaram!"
As despezas publicas foram votadas para o anno economico de 1898-1899 em menos 2:400 contos de réis do que as do anno economico corrente. Mas o estado ainda, apesar das economias feitas, lucta com deficits.
O que concluo o sr. Mello e Sousa?
Conclue que essa reducção não tem valor algum. Suprema logica de um financeiro que alvoreceu, não se sabe porque, para a politica portugueza com todos os sacramentos de um futuro ministro da fazenda. (Apoiados.- Risos.)
Essas economias são reaes, são o complemento de outras iniciadas logo que o gabinete progressista se organisou. Tinha rasão o sr. conselheiro Ressano Garcia em se orgulhar da severidade com que nos ultimos tempos têem sido administrados os dinheiros publicos. Tinha rasão em reptar os deputados da minoria a que o confundissem com os esbanjamentos e actos de desperdicio a lançar á conta da actual situação. Vimos todos como se levantou esse repto. O sr. Mello e Sousa só apresenta como prova dos esbanjamentos d'esse governo, que já conta dezeseis mezes de existencia, o credito especial para o rancho da guarda municipal, credito especial determinado pelo aggravamento do preço das mais essenciaes subsistencias alimenticias. (Apoiados.)
Foi esta a unica prova que o illustre deputado regenerador descobriu para apresentar, elle o representante de um partido que só em 1890, n'uma faustosa reorganisação da guarda municipal augmentou os encargos do thesouro em 125 contos de réis, dos quaes 8 contos de réis foram para lustre e engrandecimento da magnifica banda da mesma guarda! (Apoiados.)
Uma voz: - 8 contos de réis para musica!...
O Orador: - Quando um governo, como o que hoje occupa o poder, vae diminuindo dia a dia o exercito de addidos que lhe legaram, evita todas as nomeações illegaes ou inuteis, simplifica com economia os principaes serviços e para contra prova d'esses processos de severa administração, os seus adversarios, desafiados a desmentil-o, citam apenas um acto como o sr. Mello e Sousa citos, esse governo póde orgulhar-se de ter cumprido a sua missão, e nós, os d'este lado da camara, tambem nos podemos orgulhar por o acompanharmos com a nossa confiança. (Apoiados.)
Quereria seguir o sr. Mello e Sousa em todas as suas considerações, mas s. exa. nada mais disse a não ser que os esforços de qualquer governo pouco ou nada influem na questão cambial, confissão preciosa que os seus correligionarios de certo não lhe podem agradecer.
E por ultimo estranhou mais uma vez s. exa. que o nobre ministro da fazenda tivesse feito referencias aos actos do sr. Hintze Ribeiro como ministro, pela extravagante rasão d'esse homem publico, a quem o illustre deputado, no auge da sua admiração fetichista, chamou excellentissimo estadista, não ter assento n'esta casa do parlamento.
N'isto deu a alta questão de moralidade, que tanto se quiz avolumar. (Apoiados.)
Não tenho auctoridade para fazer exhortações á camara. Mas abono-me na sinceridade da minha palavra, na sinceridade do meu pensar e do meu sentir para lamentar que estejamos aggravando por nossas proprias mãos a crise em que nos debatemos. (Apoiados.)
O credito nacional está bastante doente, bastante susceptivel para se resentir de quaesquer esforços que o pretendam ferir. (Apoiados.)
A opposição parlamentar, creio bem que não tem sido para prejudicar o paiz, porque acredito no seu patriotismo, mas sim pelos impulsos de uma ardente paixão partidaria, tem querido levantar, nos ultimos mezes, successivas campanhas de moralidade. Não preciso accentuar o
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triste exito d'essas campanhas. Mas mesmo mallogradas não deixam da produzir um grande abalo na economia do paiz, mal combalido ainda de um periodo tão angustioso e resentindo-se por isso com todos os sobresaltos, ainda os mais infundados. (Apoiados.)
Muitas vezes, n'estas cruentas luctas da politica, o nosso caracter meridional, violento e irreflectido, leva-nos a fazer insinuações gratuitas e injustas. (Apoiados.)
Arrependemos-nos depois de as havermos formulado. Mas o nosso arrependimento já não desfaz o mal produzido. (Apoiados.)
Taes campanhas, ou se baseiam em verdadeiros actos de immoralidade, e então é dever de todos liquidal-as até às ultimas consequencias, ou não têem fundamento serio e é preferivel não as iniciar sequer. (Apoiados.)
Com o aggravamento da situação actual não ganha de certo o paiz, não ganha mesmo a opposição d'esta camara. (Apoiados.)
Ella será ámanhã o poder, e o mal que tiver produzido com os seus ataques impensados sobre os seus hombros pesará, porque os futuros ministros não julgam certamente possuir o balsamo que sare rapidamente as feridas que elles proprios tiverem produzido, ou exacerbado. (Apoiados.)
Não digo estas palavras por egoismo politico, para advogar uma tregua, que torne facil o caminho do governo progressista. (Apoiados.)
Por temperamento sou pouco propenso aos accordos dos partidos e á estagnação das luctas parlamentares.
Mas podemos combater, oppor idéas a idéas, processos a processos, systemas de administração a systemas de administração, sem descermos a estas escaramuças do descredito, de insinuações, de meias palavras, de reticencias, que originam desconfianças e suspeitas, que só servem para desvairar a opinião, tornando-a injustamente descontada com todos. (Apoiados.)
Pelo respeito que devemos ao parlamento e às instituições, pelo amor que devemos á patria, deixemo-nos de discussões como esta e adoptemos uma lucta aberta, nobre, em nome dos principios, em nome dos mais sagrados interesses nacionaes, corpo a corpo, braço a braço, mas de cabeça levantada e com inteira lealdade de intenções.
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi muito comprimentado.)
O sr. Moncada: - Começa referindo-se á accusação feita pelo sr. Cayolla, de ter o sr. Mello e Sousa dado ao seu discurso o caracter de chalaça.
Não é verdadeira esta accusação.
Quem no parlamento iniciou tal procedimento foi o sr. ministro da fazenda.
Tambem foi injusto o sr. Cayolla quando affirmou que o sr. Mello e Sousa censurara o sr. director geral da contabilidade publica. A accusação dirigia-se ao sr. ministro pelo encargo que impoz áquelle illustre funccionario, de escrever um relatorio em sua defeza.
Na sua opinião, como na de todos que leram o contraio, elle representa uma ruina para o paiz, e demonstral-o, seria um pleonasmo.
Quanto á affirmação do illustre deputado, o sr. Cayolla, de que o governo não tem feito esbanjamentos, observa-lhe que outra cousa não representam o restabelecimento dos antigos concelhos, a creação da policia rural e o subsidio de 40 contos de réis concedidos á guarda municipal.
Em seguida recorda o orador os diversos tramites que seguiu a questão do pedido da publicação do contrato e respectivos documentos, commentando ao mesmo tempo as declarações então feitas pelo sr. ministro da fazenda.
O contrato de que se trata é, na sua opinião, uma das maiores ignominias que se podia impor ao paiz, alem de ser onerosissimo, visto que o juro não poderá ser inferior a 9 por cento, attentas as clausulas do pagamento em libras, e do pagamento do sêllo, que fica a cargo do governo.
Nem ao menos se sabe quem são os participantes, de onde resulta não se poder allegar o titulo de contrato bilateral no caso de se levantar qualquer difficuldade.
N'este ponto alarga-se o orador em considerações, e pergunta, por ultimo, onde está o diploma que sirva de base a qualquer procedimento, no caso de se recusarem os participantes a fazer entrega do deposito, visto não haver, n'esse sentido, disposição alguma no contrato.
Por ter dado a hora de se encerrar a sessão, fica com a palavra reservada.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - A commissão de redacção não fez alteração aos projectos n.os 22, 24,50, 56 e 57.
Vão ser enviados para a outra camara.
O sr. Mello e Sousa pediu a palavra para explicações para antes de se encerrar a sessão. Vou consultar a camara a este respeito.
A camara resolveu affirmativamente.
O sr. Mello e Sousa: - Eu havia pedido a palavra para explicações quando o sr. Cayolla, referindo-se às considerações que eu tinha feito, dizia que eu havia offendido e aggravado o director geral da contabilidade publica, o sr. Carrilho.
Quando eu me referi a este illustre funccionario tive logo o cuidado, o prazer e a honra de declarar-que o respeitava e considerava muito, por varias circumstancias, e especialmente pelas suas excepcionaes qualidades de trabalho, tão raras no nosso paiz. (Muitos apoiados.)
Portanto quem fallava assim, e quem na sessão passada o defendia dos ataques da maioria, que o lançava às feras como responsavel dos erros do orçamento, podia ter o intuito de não offender nem aggravar um illustre funccionario que muito respeito. (Apoiados.)
Eu não offendo nem aggravo quem está ausente, e quando offender ou aggravar quem está presente, digo as cousas muito claramente, e tomo a responsabilidade do que digo. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu tinha-me referido, e não podia deixar de o fazer, aos documentos publicados por áquelle illustre funccionario, porque se tinha dado pela primeira vez o caso excepcional de o ministro se defender com o seu subordinado, em logar de o defender a elle. (Apoiados.)
O que eu tenho visto sempre é os ministros defenderem e cobrirem com a sua responsabilidade os seus subordinados; mas vir o subordinado defender o ministro - é caso novo! (Apoiados.)
E não estranho porque aquelle funccionario é muito dedicado. Tão dedicado que o governo o obrigou a praticar um acto cuja responsabilidade é do sr. ministro, porque, dizem os jornaes, que á saída da camara o sr. ministro foi ter com áquelle funccionario para elle publicar a carta que appareceu no Correio da noite. (Apoiados.)
Repito, não quiz offender nem aggravar áquelle funccionario; mas mais uma vez estranho o caso de ser o funccionario quem defendo o ministro, em logar de ser o ministro quem defende o funccionario. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - O sr. Mello e Sousa pediu a palavra para explicar algumas palavras suas que tinham sido mal interpretadas. Eu louvo s. exa. por ter explicado o que parecia ser uma censura dirigida a um funccionario distincto do ministerio da fazenda; mas o que me parece é que s. exa. não tinha direito de vir aggravar-me a mim para desaggravar o director geral da contabilidade. (Apoiados.)
Eu não pedi a ninguem que me defendesse. Estou aqui para me defender. (Muitos apoiados). E eu appello para a camara e para o illustre deputado para que digam se eu
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SESSÃO NOCTURNA N.º 72 DE 28 DE MAIO DE 1898 1297
contra todos os ataques de quem quer que seja preciso de alguem para me defender, (Muitos apoiados.) ou se me escondo atrás de quem quer que seja quando atacado. Eu aqui estou, não preciso de ninguem para me defender. Eu mandei, sem ter protestado sequer, um despacho d'aqui ao sr. director geral da contabilidade publica para que informasse sobre todos os incidentes que tinha havido antes e depois da assignatura do contrato. Mandei, portanto, officialmente que informasse sobre todos os elementos que havia. E chama-se a isto pedir ao funccionario que venha defender-me, quando elle não fez senão informar ácerca dos documentos que encontrou no ministerio a meu cargo! Nem eu precisava que elle me defendesse. (Apoiados.)
É singular a orientação do illustre deputado. S. exa. pede a palavra para desaggravar o funccionario que podia suppor-se aggravado e aproveita a occasião para aggravar o ministro da fazenda!
Quando s. exa. quizer atacar-me não me parece ser esta a occasião propria, á meia noite e cinco minutos. Não digo isto pelo facto de receiar ser atacado, porque eu aqui estou para me defender. (Apoiados.) Auxilio só o preciso da maioria d'esta camara, com a qual o governo está perfeitamente identificado. (Apoiados.)
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Mello e Sousa: - O caso não pede tanto excesso! Isto que eu disse agora já o tenho dito mais vezes na camara. Não vim atacar o sr. ministro á meia noite e cinco minutos, como s. exa. disse; fil-o a horas proprias; mais de uma vez, e s. exa. podia ter replicado. Cáe, portanto, pela base - a asserção de se ter desaggravado tão tarde, por eu ter vindo atacal-o a esta hora.
O sr. ministro trata só do primeiro despacho publicado no Diario do governo e esquece a segunda missiva do sr. Carrilho. Esta não foi por despacho e todos os jornaes disseram que o sr. ministro depois de ter saído na vespera á noite da camara, tinha estado a conferenciar com esse illustre funccionario, apparecendo no dia seguinte um documento, que não era provocado por nenhum despacho, em que se dizia:
«Exmo. amigo e sr. - O § unico ... é assim e assim.»
Não comprehendo como se permitte que se esteja a escrever cartas nos jornaes explicando cousas que o sr. ministro não tinha querido explicar na camara. Foi uma exorbitancia de funcções. Eu referi-me a isto nas duas vezes que fallei e o sr. ministro podia ter contradictado.
Desde o momento em que o sr. Carrilho, não obstante eu ter declarado que não o queria aggravar, insistiu em que eu queria realmente aggraval-o e offendel-o, eu não podia deixar de fazer as considerações que fiz.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - O illustre deputado tem o seu feitio e não o póde perder.
Disse e mantenho ainda que eu acho impropria a occasião para s. exa. aggravar o ministro da fazenda. S. exa. tinha pedido a palavra para explicar as suas phrases, que podiam ser tomadas como um aggravo a um funccionario do ministerio da fazenda, e desde o momento em que a sua consciencia dizia que as suas palavras tinham sido mal interpretadas, a sua obrigação era restringir-se ao facto preciso.
O sr. Mello e Sousa: - Isso é com a presidencia. Só ella é que póde dizer o que eu tenho obrigação de fazer, ou o que devo deixar de fazer. (Apoiados.)
O Orador: - Agora estou eu fallando no uso do meu direito. (Apoiados.) Não obedeço a imposições de ninguem, nem consinto que me interrompam. (Apoiados.)
Digo e repito, desde o momento em que s. exa. tinha pedido a palavra e a obteve por consentimento da camara, já depois de ter dado a hora para o encerramento dos trabalhos, a fim de explicar umas palavras que tinham sido tomadas como aggravo a um funccionario superior do ministerio da fazenda, tinha obrigação moral de se restringir a essas explicações e não vir aggravar o ministro. (Apoiados.)
Quer s. exa. que eu venha aqui responder pelo que se diz na imprensa?
Pois já estou impedido, no alto criterio d'este censor, de trabalhar com os funccionarios superiores do ministerio da fazenda?!...
O sr. Mello e Sousa: - D'este censor! .. . Seja correcto . ..
Vozes: - Ordem, ordem.
(Sussurro.)
O Orador: - Já não posso trabalhar senão a occultas, com os funccionarios superiores do ministerio da fazenda, porque de outro modo os jornaes dizem no dia seguinte: «que estive a mendigar o seu auxiliou!. ..
(Ápartes da esquerda.)
Eu não quero prolongar este debato, mas digo aos illustres deputados, que não permitto que ninguem me ataque sem lhe responder. (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Presidente: - A primeira sessão é na segunda feira, á noite, sendo a ordem dos trabalhos a continuação dos que estavam designados para a sessão de hoje, e mais os projectos de lei n.os 60, 75, 76, 77, 79 e 80.
Está levantada a sessão.
Eram doze horas e vinte minutos da noite.
Documentos enviados para a mesa n'esta sessão
Representação
De habitantes em Villa Verde da Raia, concelho de Chaves, pedindo que a sua povoação seja constituida freguezia, ficando, portanto, desligada das aldeias de Santo Estevão e Faiões.
Apresentada pelo sr. deputado Ribeiro Coelho e enviada á commissão de administração publica.
Justificação de falta
Participo a v. exa. e á camara, que o meu illustre collega e camarada o sr. deputado José Gregorio Figueiredo Mascarenhas tem faltado e faltará ainda a algumas sessões d'esta camara por motivo de doença. = Avellar Machado .
Para a secretaria.
O redactor = Barbosa Colen.