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Discurso proferido na sessão de 8 de abril e que devia ler-se a pag. 1057, col. 3.ª, lin. 1.ª, do Diario n.° 81

O sr. J. A. de Sepulveda: — Sr. presidente, achando-me ausente da camara por motivos attendiveis e que já são parentes, quando se discutiu e votou na especialidade o projecto relativo aos impostos de consumo, não pude por isso sustentar a proposta n.° 2, que em parte é minha. Fa-lo-hei agora, visto que de novo esta aberta a discussão, porém com a brevidade e concisão compativeis, e mais para justificar o meu voto, um pouco discordante das opiniões da illustre commissão de fazenda, que muito respeito, do que para lisonjear pessoa alguma... mesmo ainda o. povo, a quem todavia muito quero, e com quem desejo andar sempre bem avindo.

E, sr. presidente, não farei só isto: direi tambem que não concordo com a mesma illustre commissão, emquanto que esta equipara o vinho verde, unico que a minha provincia, e especialmente o circulo que tenho a honra de representar, produz, e quasi o unico tambem que ali se consome, aos variados vinhos maduros, todos em condições tão differentes como vantajosas. E, n'esta parte, adaptando a proposta n.° 32, unica, d'entre todas que foram formuladas por muitos dos meus nobres collegas, que se harmonisa com o meu modo de ver, aqui a apresento, e a ella me associo para o effeito de ficarem pagando os vinhos maduros finos, ou de primeira classe, 12 réis; os de segunda qualidade, 10 réis; e os verdes ou de enforcado, 5 réis por cada litro.

Sr. presidente, d'esta fórma, ficando salva ao thesouro a tal ou qual venda que se espera do consumo dos vinhos, havemos de auferir mais vantagens. A largueza e multiplicidade das compras a retalho hão de fazer o milagre de produzir muito com pequenas taxas. E isto é melhor, creia o a camara, porque não aggrava a situação dos consumidores, e estabelece entre os vinhos uma proporção não arbitraria, como a regia geral do projecto e dos pareceres da commissão, mas justa, natural, reconhecida pelos apreciadores, e sanccionada pelo commercio, que n'este e outros assumptos é juiz de incontestavel competencia.

E, sr. presidente, que aquella primeira proposta, como igualmente outras, não era destituida de fundamento, de sertã de justiça, e balda de motivos para ser louvavelmente apoiada, provou-o a illustrada commissão, quando, e bem pensadamente, sem temer que fosse mal apreciado o acto pelo qual reconhecêra o primitivo parecer, não duvidou introduzir modificações em alguns objectos da tabella, como, por exemplo, no azeite de oliveira, o que importa um melhoramento, pelo qual lhe dou mil louvores, sentindo apenas que os beneficios não fossem tão amplos como era para desejar. Não fico porém, n'esta parte, de todo descontente. A deducção de um terço da importancia total do imposto lançado sobre esse objecto, a sua reducção de 15 a 5 réis por cada litro, confesso-o, é já alguma cousa. Mas, segundo penso, o governo e a illustre commissão foram avaros, porque podiam e deviam ir mais longe, alliviando completamente do (tributo um genero de geral consumo, e não o fizeram. E sempre miseravel o sacrificio que se impõe á miseria. E este de que vou fallando, considero-o n'esse caso. Não estamos ainda, e felizmente ainda, em circumstancias extremas. Se o estivessemos, mal de nós, de toda a sorte, mas ninguem ousaria medir a grandeza, o peso, a qualidade ou a quantidade dos meios de salvação. Foi em nome das necessidades publicas, ou do estado, que nós votámos o projecto na generalidade (eu, ao menos, votei-o em nome d’ellas): é isto uma verdade. Mas essas circumstancias não são tão desesperadas, que allucinem, e eu pensei por isso que emquanto não pedissemos a outras fontes de receita o que a riqueza póde e deve pagar, cumpriria deixar em paz os pobres. Quem, como eu e os restantes cooperadores da proposta, offerece larga e fecunda substituição de imposto, dá provas sinceras de querer dotar o governo com meios, igualmente largos e fecundos, de acudir ás previsões do estado. Esses meios, esse imposto, desejava eu que se tirassem dos lucros e dividendos das companhias e bancos. Por que motivo, em tempos de igualdade, hão de andar os capitaes arregimentados (permitta-me a camara que assim os appellide), cobertos com um odiosso privilegio, que se traduz em males tão funestos para o thesouro, como para o paiz?. Offerecendo uma terrivel concorrencia, mas travando luta desigual, os bancos não pagam á sociedade os favores de similhante isenção. E, além d'isto, deixando passar a aridez do fisco sobre os capitaes mutuados, em beneficas condições, pelas corporações e por muitos particulares, deixalos-ha em lamentavel posição, forçará os mutuantes a capearem usuras inmoderadas para não soffrerem a deducção legal nos redditos dos seus capitaes, levará os mutuarios a uma situação deploravel e acabará por produzir o maior de todos os males—a deslocação e concentração dos capitaes baratos.

Hão de vir dahi estas tristissimas consequencias: primeiro, o desapparecimento do dinheiro mutuado a longos 'prasos e por moderado lucro; e depois, a sua entrada nos exercitos bancarios, onde as operações são grandes, e os lucros maiores ainda. Não podemos esperar outra cousa. Ninguem, seguro de haver feito um emprestimo bem garanti do, troca subidos juros por exiguos interesses. E sabe V. ex.ª o que ha de succeder depois de tudo? Em desapparecendo completamente a receita que se colhe dos juros, o governo ha de adoptar a medida que hoje lhe proponho. Virá tarde, e só no encalço dos inconvenientes que prevejo; virá tarde, porque terá deixado lavrar fundo os males que presinto; virá tarde, porque será repressiva em vez de preventiva; mas em todo o caso, virá... (apoiados).

Sr. presidente, eu, desgraçadamente, desci fundo das altas regiões economicas, descrendo das bellezas de muitas theorias ácerca dos bancos, desde que, na pratica, observei o que se fazia por parte de muitos, e em muitas das suas operações. Não digo que possa comprehende-los a todos n'esta geral censura, porque sou justo, e não quero dirigir-me determinadamente a nenhum dos estabelecimentos d'essa natureza. Declararei, até com verdadeira satisfação, que, entre outros, se deve proclamar bem alto á excepção de que é merecedor o banco hypothecario; unico que, pela fixidade do seu juro, largueza dos prasos e fórma da amortisação do capital (apoiados), está dando, e ha de dar, maravilhosos resultados em favor da fortuna predial. Mas ao que não resisto é a confessar maguado que, dada uma crise monetaria ou commercial, os bancos, querendo pôr-se ao abrigo das tempestades, esperando a troca de suas notas, os levantamentos de depositos e outras communs eventualidades, recolhem fundos ás Caixas, receiam os emprestimos ou cessam completamente de os fazer; e quando porventura acodem á voz do afflicto, quasi sempre, e só, levam a miseria, pela limitação do tempo e excesso de juro, onde já ha muita miseria! E nas reformas de letras, sejam ou não anormaes, os tempos em que lhas pedem?!... (Apoiados.)

Sr. presidente, conceder privilegios, estabelecer dignidades, armar gigantes para taes fins, não me parece cousa justa. Mette-los em luta com os pequenos instrumentos de uma segura prosperidade, é tyrannia. Se os bancos se hão de converter em meios de oppressão; se hão de ser uma mera agiotagem e um terrivel monopolio, ou não se lhes concedam favores, ou estendam-se a todo o mundo os favores que elles gosam. E não se me tomem á conta de censura os actos de prudencia que os gerentes, para satisfazerem aos fins da associação, usam praticar. Esses refiro-os, mas não os condemno. Não vejo portanto rasões que justifiquem o privilegio, nem para que sejam tributados os capitaes particulares, deixando de o ser os lucros e dividendos d'esses estabelecimentos (apoiados).

Eu votei, e tenho n'isso a maior honra, os projectos que o nobre ministro das obras publicas trouxe a esta casa, ácerca de bancos districtaes, sociedades anonymas, e bancos agricolas. Bellos, e bem traçados trabalhos, reflexo do muito que ha de grande e bom n'esse homem de estatura ministerial, fóra de commum, a elles me associei, e delles espero muito para o paiz, e para o iniciador. Mas, se as esperanças de s. ex.ª, ainda depois de tanta gloria, e dos indeleveis vestigios que tiver firmado na senda do poder, caírem por terra com as minhas, a minha voz, não o condemnará: limitar-me-hei então a sentir e lamentar, que os capitaes das corporações de mão morta deixassem' de continuar, como até aqui, a ser um barato, seguro, facil e equitativo auxiliar, principalmente da lavoura (apoiados).

Emfim, o que eu queria mostrar era a bondade da substituição da receita que offereci na proposta. Isso, mal e á pressa, esta feito. Agora, posto que a digressão não possa ser taxada de aberrante, vou recolher-me outra vez ao assumpto principal. Peço desculpa á camara, e terminarei logo para não alongar muito a discussão dos objectos mais directamente controvertidos.

Dizia eu, sr. presidente, que os vinhos verdes estavam em condições tão differentes, como desvantajosas, compara dos com os maduros, e creio ter dito a verdade. O nosso vinho verde, de uma limitadíssima producção depois da molestia que tem flagellado as vinhas, de qualidades inferiores ás de todos os outros vinhos conhecidos entre nós, não tendo ainda mercado no estrangeiro; sendo mais sujeito ás enfermidades, que os vinhos padecem, não podendo conservar-se, e passar intacto de um para outro anno, não esta por isso em circumstancias tão vantajosas para poder pagar tanto como os vinhos que já têem favoravel mercado em todos os pontos do mundo, e que alimentam um prodigioso e rico commercio dentro e fóra do paiz (apoiados).

De mais, os nossos vinhos verdes já foram levados em conta, quando se tratou de avaliar os predios para o effeito da contribuição predial; já estão além d'isso aggravados com os impostos municipaes. É pois necessario satisfazer á justiça, tanto absoluta, como distributiva, não pedindo mais do que deve ser, nem tanto ao que vale muito, como ao que vale pouco.

Sr. presidente, eu disse ainda na minha proposta, n.° 2, que me parecia que o arroz devia ser igualmente alliviado do imposto; e hoje, como então, a minha idéa é a mesma. Em toda a parte do paiz o arroz faz um papel importante na sustentação da pobreza. Parecia-me, por esta rasão, que emquanto se não tivessem esgotado todos os meios de pedir á prosperidade, o que só esta póde pagar, não deveriam ir peiorar a situação dos desvalidos, porque se os impostos, já de si odiosos, não forem justa, equitativa e proporcionalmente distribuidos, mais odiosos e inaceitaveis se tornam (apoiados).

Como homem de ordem desejo que a medida passe, salvas as alterações que propuz, e desejaria ainda mais que os impostos sejam bem aceitos pelo paiz; mas de votar uma lei de impostos justos, regulares e indispensaveis, a executar medidas vexatorias e oppressivas, a distancia é grande. O nosso povo não se importa com que nós aqui dentro discutamos bem ou mal, mas importa se muito, quando chega o momento supremo de pagar, com as exigencias do thesouro. Nas terras onde o principio da auctoridade se apoia na força, póde elle ser fecundo; lá fóra não acontece o mesmo, se as medidas exequendas não têem por si a força moral. E para desejar portanto que tudo se conduza rasoavel e prudentemente. Peça o estado, e receba o que lhe faz mister; mas pense, medite, seja justo e moderado. Respeite-se o direito de petição sobretudo, e da parte de todos que o invoquem; e quando as representações forem rasoaveis e fundamentadas, dobre-se a cerviz ante ellas. Torna-se indispensavel, é verdade, restabelecer o equilibrio entre a receita e a despeza, mas por isso mesmo quero eu que quando se vá pedir um sacrificio ao paiz, seja elle o menos odioso possivel, porque o contrario póde lançar desgostos, sem produzir o resultado appetecido (apoiados).

O mesmo, sr. presidente, direi a respeito do azeite de oliveira. A illustre commissão já, n'este ponto, como disse, faz algumas concessões, pelas quaes lhe repito os meus louvores; mas fez pouco, porque, entre outras, a minha provincia é tão escassa n'esta producção, que o preço do genero anda sempre muito elevado. É de Traz os Montes e Porto, principalmente, que o Minho se abastece, mas o custo primitivo do genero, junto ás despezas e lucros dos agentes intermediarios ao productor e consumidores, e aggravado ainda com os gastos do transporte, torna este artigo muito e muito caro.

E comtudo é elle ali objecto de primeira necessidade, de mais largo uso que em Lisboa e noutras partes. Os habitos dos povos o fazem adoptar de preferencia na culinária, mas para as mesas de regalo, mas para adubo das comidas mais simples, a magra sopa, o caldo dos pobres e dos operarios. Portanto, ainda que o imposto fosse dar algum resultado financeiro, eu quizera que d'esta origem o não houvessemos. Parece-me que todo o favor e todas as concessões, por parte do governo e da commissão, no sentido de favorecer as classes pobres, unicas sobre as quaes vae pesar muito particular o imposto, seriam bem cabidas (apoiados).

Sr. presidente, não se julgue aqui dentro que a lavoura do Minho é rica e feliz. Engano! É muito pequena; cada lavrador não tem senão pequenos tratos de terreno, que dispõe, prepara, fabrica e amanha, á custa de muita fadiga, regando-o com o proprio suor, dando-lhe os cuidados do dia e as vigilias da noite, para, era compensação, lhe pedir, não uma, mas duas e tres producções em cada anno, e quasi em todos os annos, porque lá os pousios, a não ser nas terras fracas e montanhosas, são desconhecidos.

A pequenez dos recursos agricolas, a densidade da população e a pouca area das terras agricultadas, ao passo que impõe limitações á prosperidade material do lavrador, vae-o tornando mestre á sua custa, e leva-o a passar por cima da rotina para se tornar modelo e exemplo.

Sobre a agricultura porém pesam males que é necessario remover. E no Minho mais que em qualquer outra parte. A emphyteuse aqui é tão geral, são tão geraes os censos, que difficil se torna encontrar um palmo de terreno livre e allodial. Outra cousa reputada beneficio (e que eu não duvido que o seja, olhada ella em relação aos interesses geraes da sociedade), tem compromettido muito tambem a existencia e a prosperidade dos lavradores do Minho. Fallo da introducção dos cereaes estrangeiros que nos trouxe o abatimento de 1/4 ou 25 por cento ao praso usual, quasi constante e não excessivo do nosso milho grosso (apoiados). E grande sem duvida este mal para os que o soffrem, porque a lavoura não tem ali outros recursos, e ainda não descobriu compensações. Perdida ou reduzida a pouco a producção do vinho, que resta aos homens que se dedicam a tão laboriosa industria? O pão, que mal lhes paga o que elle mesmo custa ao productor.

É em vão que o lavrador previdente, laborioso e economico se priva e á sua familia, quando colhe algum vinho da parte destinada aos usos domesticos Ainda isto é pouco. As imposições geraes, municipaes e para obras; os juros (digo os juros, porque desgraçadamente poucos vivem livres d'esse mal), o recrutamento, a emigração, a alta dos salarios e a carestia de todas as cousas indispensaveis' á vida são e estão sendo as causas da afflictiva situação dos lavradores a que me refiro! (Apoiados.) São poucos os que vivem livres do peso da hypotheca, de obrigações caucionadas fide jussoriamente, ou mesmo pelo credito pessoal.

Por consequencia, a importação dos cereaes, e até, diga