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SESSÃO DE 1 DE MAIO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os exmos. srs.

Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dois officios do ministerio dos negocios estrangeiros, e dois do ministerio da marinha e ultramar. - Segundas leituras e admissão de cinco projectos de lei, sendo quatro do sr. Guilhermino de Barros e um do sr. Elvino de Brito. - Representações mandadas para a mesa pelos srs. Vicente Pinheiro, Reis Torgal, Lopes Vieira e visconde de Reguengos. - Requerimentos de interesse publico apresentados pelos srs. Luiz José Dias e Simões Dias. - Requerimentos de interesse particular mandados para a mesa pelos srs. Scarnichia e Pinto Basto. - Justificações de faltas dos srs. Goes Pinto, J. A. Neves, Garcia do Lima e Reis Torgal.- Declarações de votos dos srs. Garcia de Lima e Antonio Joaquim da Fonseca. - O sr. presidente declara que a deputação encarregada de representar a camara na recepção do paço, no dia 29 de abril, cumpriu a sua missão, e que as attenções serão opportunamente publicadas. - Requer o sr. Alfredo Barjona que se discuta desde já o parecer n.° 40. - Responde o sr. presidente - o sr. Simões Dias estranha a demora por parte do governo na remessa do uns documentos que requisitou. - O sr. Sant'Anna o Vasconcellos refere-se ao que havia dito em uma das sessões anteriores o sr. Fuschini em relação á Madeira. - O sr. Adolpho Pimentel insta pela remessa de uns documentos e allude aos vexames praticados em Braga na execução do regulamento do real de agua; refere-se tambem a umas obras em Espozende.- O sr. Lopes Vieira faz algumas considerações em favor de uma representação que manda para a mesa. - O sr. presidente apresenta um requerimento do sr. deputado João Chrysostomo Melicio, pedindo licença para se ausentar por algum tempo do reino. - Consultada a camara, foi a licença concedida. - Suspendo-se a sessão por não estar representado o governo. - Reaberta, um quarto de hora depois, usa da palavra o sr. Elvino de Brito para dirigir uma pergunta ao governo. - Responde-lhe o sr. ministro do reino.
Na ordem do dia continua com a palavra e termina o seu discurso o ar. Avelino Calixto ácerca do artigo 6.° do projecto n.° 18, ao qual havia offerce do uma substituição. - O sr. Avellar Machado apresenta dois pareceres da commissão de obras publicas. - Toma parte no debate sobre o artigo 6.°, apresentando uma emenda, o sr. Bernardino Machado. - Segue-se o sr. Elias Garcia que propõe uma substituição no mesmo artigo e o additamento de um artigo transitorio. - O sr. Arroyo, a quem cabia a palavra, pede para usar d'ella na sessão seguinte por estar a dar a hora. - O sr. ministro dos negocios estrangeiros manda para a mesa uma proposta de lei.

Abertura - Ás duas horas e vinte minutes da tarde.

Presentes á chamada - 38 srs. deputados.

São os seguintes: - Adolpho Pimentel, Agostinho Fevereiro, Garcia de Lima, A. da Rocha Peixoto, Alfredo Barjona de Freitas, Silva Cardoso, Pereira Côrte Real, Pereira Borges, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Avelino Calixto, Sanches de Castro, Conde de Thomar, E. Coelho, Elvino de Brito, Sousa Pinto Basto, Fernando Geraldes, Francisco de Campos, Sant'Anna e Vasconcellos, Baima de Bastos, Augusto Teixeira, João Arroyo, Joaquim do Sequeira, Simões Ferreira, Teixeira Sampaio, Ferreira de Almeida, Laranjo, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Luiz Ferreira, Bivar, M. J. Vieira, Guimarães Camões, Gonçalves de Freitas, Sebastião Centeno, Pereira Bastos, Vicente Pinheiro e Visconde de Ariz.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Moraes Carvalho, Albino Montenegro, Anselmo Braamcamp, Torres Carneiro, Sousa e Silva, Antonio Candido, Antonio Centeno, Garcia Lobo, A. J. da Fonseca, A. J. d'Avila, Lopes Navarro, Cunha Bellem, Fontes Ganhado, Jalles, Moraes Machado, Carrilho, Sousa Pavão, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, Seguier, A. Hintze Ribeiro, Urbano de Castro; Augusto Barjona de Freitas, Augusto Poppe, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Pereira Leite, Neves Carneiro, Barão de Ramalho, Bernardino Machado, Caetano de Carvalho, Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Conde da Praia da Victoria, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, Emygdio Navarro, Estevão de Oliveira, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Francisco Beirão, Correia Barata, Mouta e Vasconcellos, Castro Mattoso, Mártens Ferrão, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Guilhermino de Barros, Matos de Mendia, Silveira da Motta, Costa Pinto, J. A. Pinto, J. C. Valente, Scarnichia, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado. J. Alves Matheus, J. A. Neves, J. J. Alves, Coelho de Carvalho, Avellar Machado, Azevedo Castello Branco, Dias Ferreira, Elias Garcia, José Frederico, Lobo Lamare, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, Jose Luciano, Ferreira Freire, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Luciano Cordeiro, Luiz de Lencastre, Reis Torgal, Luiz Dias, Luiz Osorio, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Aralla e Costa, M. P. Guedes, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Pedro de Carvalho, Santos Diniz, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Tito de Carvalho, Visconde de Alentem, Visconde das Laranjeiras, Visconde de Reguengos, Visconde do Rio Sado, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.

Não compareceram á sessão os srs.: - Antonio Ennes, Barão de Viamonte, Conde do Villa Real, Goes Pinto, E. Hintze Ribeiro, Filippe de Carvalho, Wanzeller, Barros Gomes, Franco Frazão, Melicio, Ribeiro dos Santos, Ponces de Carvalho, Amorim Novaes, Correia de Barros, José Borges, J. M. dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Lourenço Malheiro, Luiz Jardim, M. da Rocha Peixoto, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Miguel Tudella, Pedro Correia, Pedro Franco, Dantas Baracho e Visconde de Balsemão.

Acta - Approvada sem reclamação.

EXPEDIEXTE

Officios

1.° Do ministerio dos negocios estrangeiros, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado J. F. Laranjo, copia de duas tabellas que o exmo. sr. João de Andrade Corvo apresentára ao governo hespanhol, com o fim de demonstrar que pelo regimen convencional, applicado a Portugal e a Hespanha, ficaria este paiz, depois de executado o tratado de commercio, ultimamente ajustado, mais favorecido com relação aquelle, no desfalque que soffreria o rendimento dos direitos de alfandega.
Á secretaria.

2.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr deputado J. P. Laranjo, o segundo trimestre de 1882 da Gaceta de Madrid, onde se encontra, a pag. 456, o tratado de commercio e navegação, celebrado em 6 de fevereiro de 1882, entre a Franga e a Hespanha.
Á secretaria.

3.° Do ministerio do ultramar, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Luiz de Lencastre, o parecer da commissão encarregada de consultar ácerca

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do regimento dos defuntos e ausentes do ultramar, datado de 4 de março ultimo.
Á secretaria.

4.° Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Luiz de Lencastre, a relação dos juizes de primeira e segunda instancia do ultramar, com as datas dos despachos e das posses, especificando-se o districto judicial a que pertencem.
Á secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores.- A camara municipal do concelho da Covilhã pede, em representação de 15 de abril corrente, dirigida á camara dos senhores deputados, para lhe ser permittido applicar, da verba destinada á viação municipal (que no orçamento do corrente anno civil monta a réis 53:790$169), a quantia de 6:000$000 réis, a fim de se achar habilitada a estabelecer um hospital provisorio para cholericos, precavendo-se de tal modo para o caso em que esta epidemia appareça no concelho que administra.
A louvavel diligencia da camara municipal da Covilhã não póde deixar de ser secundada pelos poderes publicos; e já o exmo. ministro do reino (que aliás entende ser de alta conveniencia publica não desviar, por via de regra, para applicações diversas das especiaes, as verbas destinadas a viação municipal) concordou em acceitar o pedido da camara, que muitas e diversas rasões aliás justificam.
A Covilhã tem 12:000 habitantes em uma area limitada, assenta em um declive de montanha escabrosa, onde os maiores cuidados municipaes não têem podido manter uma hygiene rigorosa e constante.
As numerosas fabricas, os materiaes que a sua labutação exige, a agglomeração dos operarios de todos os sexos e idades, a par das outras rasões já indicadas e todas relativas áquelle grande centre industrial, tornou instante a resolução do pedido d'aquella municipalidade.
Por este motive tenho a honra do apresentar a consideração da camara dos senhores deputados o seguinte projecto de lei;
Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal da Covilhã a applicar a fundação de um hospital provisorio para cholericos a quantia de 10:000$000 réis, deduzida da receita do municipio na verba destinada á viação municipal.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Lisboa, 25 de abril de 1885. = O deputado pelo circulo n.° 63, Guilhermino Augusta de Barros.
Foi admittido e enviado á commissão de obras publicas e administração publica.

Projecto de lei

Senhores. - O artigo 83.° da lei de 7 de julho de 1880 prescreveu a organisação de uma caixa de auxilio para os empregados de telegrapbos e correios, dotando a com todas as pequenas receitas que provem, alem de outras fontes, da venda de objectos inutilisados e que ordinariamente se não aproveitam, perdendo-se e estragando-se nos escombros das repartições.
Esqueceu, porém, mencionar no n.° 7.° do citado artigo os objectos inutilisados pertencentes á telegraphia ou pharoes, convindo por isso, visto que a organisação da caixa se tornou, conforme es assevera, uma realidade pela approvação dos respectivos estatutos, completar aquelle n.° 7.° do artigo 83.°, nos termos do projecto que hoje tenho a honra de apresentar a esta camara.
Artigo 1.° O artigo 83 ° da carta de lei de 7 de julho de 1880 será addicionado no n.° 7.°, depois da palavra refugo, com as seguintes expressões: «ou inutilisados quer sejam de correios, quer de telegraphos ou pharoes».
§ unico. A addição das palavras a que se refere o artigo 1.° será feita nos termos do artigo 118.º as citada carta de lei de 7 de julho de 1880.
Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Lisboa, 27 de abril de 1885. = O deputado pelo circulo n.° 63, Guilhermino Augusto de Barros.
Foi admittido e enviado á commissão de obras publicas.

Projecto de lei

Senhores. - A fusão operada pela lei de 7 de julho de 1880 tem dado logar a que numerosos funccionarios, cujos deveres aquelle diploma regula, reunam o exercicio das duas funcções de correios e telegraphos, acrescendo-lhes, ao trabalho e responsabilidade a que se obrigaram, um outro em virtude da lei. Não raro succede que, principalmente a funcção postal, forçando empregados a desempenhar serviços em diversas horas da noite, prejudica a saude, depois que, durante o dia, o serviço telegraphico, apparentemente inoffensivo, mas verdadeira causa de grandes enfermidades, quando excessivo, lhes tem gasto as forças de que dispõem.
Foi lembrado na occasião de se elaborar a lei de reforma, e, já depois, posto em pratica por via de despachos ministeriaes, o reconhecimento de tal inconveniente, dando-se a poucos funccionarios um diminuto supplemento de ordenado.
Este facto, porém, limitado, como incentivo ou exemplo para outros, a alguns directores de correio, e hoje chefes de estação, porque aprenderam a telegraphia, nem tem o caracter do generalidade, como pede a justiça, nem acode aos males que padecem os chefes de estação polo trabalho novo que veiu oneral-os, embora legal e acceito por elles, sem poderem reclamar fundadamente, a não ser pelos principios da humanidade.
Por este motivo, proponho a esta camara que se dê uma parca indemnisação aos empregados que desempenham duas funcções; a qual, longe de trazer encargo para o thesouro, póde ser causa de a augmento de receita, ao passo que é um acto de justiça.
N'este sentido, formulei o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Os chefes de estação telegrapho postaes que desempenharem simultaneamente os dois serviços postal e telegraphico, têem direito a uma percentagem de 2 por cento sobre o seu vencimento de categoria, com a condição de prestarem a devida caução.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Lisboa, 25 de abril de 1885. = O deputado pelo circulo n.° 63, Guilhermino Augusto de Barros.
Foi admittido e enviado ás commissões de obras publicas e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - O professor primario, o educador, o mestre das novas gerações, um dos primeiros e mais uteis funccionarios da nação (exprimo apenas um logar commum, que, infelizmente, e ainda hoje, apesar dos esforços incessantes da administração publica, um facto muito excepcional), padece em muitos pontos do paiz privações e falta de meios de subsistencia, cuja amargura facilmente se comprehende, quando se pense como são modestos os honorarios do professor primario, e como lhes será impossivel, dada qualquer irregularidade no seu pagamento, prover as suas limitadas necessidades.
Sem querermos afetar o quadro, e, repetimos, conhecendo bem como os funccionarios que têem a seu cargo velar pela fiel execução das leis de instrucção ordinaria cumprem o seu dever, devemos comtudo affirmar á vista dos clamores da imprensa periodica e das nossas informações particulares, que existem, com respeito a esta clause, pagamentos atrazados ao ponto de que alguns professores primarios quasi esmolam.
Um jornal de grande publicidade e distincta redacção dizia, no dia 19 do corrente mez, que n'um districto do

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continente do reino se deviam aos professores primarios 8:000$000 réis!
Esta situação, embora seja menos grave, não póde persistir como se acha, cumprindo provel-a de remedio prompto. Pede-o a conveniencia publica, exige-o a humanidade, intima-o a justiça social. Ha certamente innumeras municipalidades, que comprehendem a importancia d'este dever sagrado, mas ha outras que o esquecem, já porque não regulam as cousas da sua contabilidade por modo que das receitas cobradas reservem uma parte para pagar aos professores primarios, já por outras rasões. É certo que, em alguns concelhos, os pagamentos soffrem atrazos consideraveis, não podendo os cuidados incessantes da zelosa direcção geral respectiva e esforços pertinazes do governo arredar este grave inconveniente da execução de uma medida, inspirada a um illustre homem d'estado, pelos melhores e mais sãos principios da administração descentralisadora e patriotica.
As propostas apresentadas ao parlamento em 10 de fevereiro de 1882 e 3 de abril de 1883 com o intuito de remediar este mal grave não obtiveram approvação parlamentar e a situação dos professores primarios continua a ser a mesma.
Fundado em taes rasões, tenho a honra de apresentar-vos um projecto de lei que, me parece, attenuará o mal a que venho de referir-me, coagindo as municipalidades remissas a cumprir o seu dever, ou pelo menos a soffrer uma penalidade que aproveitará aos que soffrem, castigando a omissão das corporações municipaes que o merecerem.
Artigo 1.° O professor primario recebera os seus honorarios no dia seguinte áquelle em que termine cada mez de exercicio da sua funcção escolar.
§ 1.º Quando se de qualquer falta no cumprimento do que dispõe o artigo 1.°, terá direito o professor primario ao augmento de 50 % em seus vencimentos com respeito ao tempo por que se dér a móra.
§ 2.° O governador civil e competente para mandar separar opportunamente das receitas municipaes cobradas a parte que o municipio carecer para retribuir os professores primarios respectivos; e bem assim, para dar, ex-officio, as ordens competentes sobre o cofre municipal para se effectuarem taes pagamentos quando sejam devidos, acrescentados da indemnisação a que se refere o § 1.°
Artigo 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Lisboa, 15 de abril de 1885. = O deputado pelo circulo n.° 63, Guilhermino Augusta de Barros.
Foi admittido e enviado á commissao de instrucção primaria e de administração publica.

Projecto de lei

Senhores. - N'uma proposta de lei, apresentada pelo sr. ministro e secretario d'estado dos negocios da marinha e ultramar, na ultima sessão da legislatura proxima finda, dizia o mesmo ministro com muita verdade, que «a questão monetaria estava assumindo em todas as nossas provincias africanas, mas muito especialmente na de Cabo Verde e na da Guine, as mais graves proporções, tornando se, por isso, urgente remedial-a, sob pena de vermos o mal-estar que ali se sente transformar-se n'uma verdadeira crise das mais sérias consequencias» e acrescentava: «Desejaria o governo munir-se desde já das auctorisações necessarias para poder remediar estes males que de um momento para o outro se podem tornar gravissimos; não permittindo, porém, o adiantado da sessão que se apresentem propostas que não sejam de reconhecida urgencia, e sendo nas provincias do Cabo Verde e da Guiné que se faz sentir de um modo mais instante a gravidade do mal, limito-me por agora a apresentar á vossa illustrada apreciação a seguinte proposta de lei». (Esta proposta e a que se lê a pag. 1:587 do Diario das sessões da camara dos srs. deputados de 1884.)
Não tendo sido, porem, a proposta do governo convertida em lei e subsistindo? com maior aggravamento; os males que tanto sobresaltavam o espirito d'aquelle ministro o anno passado, mal se explica que não só não quizesse o governo aproveitar-se, durante o interregno parlamentar, da faculdade conferida no artigo 15.° do acto addicional para decretar quaesquer providencias urgentes e destinadas a por termo a anarchia que tanto affecta a circulação monetaria nas nossas possessões africanas, como não viesse ainda hoje, que vae findo o periodo normal da primeira sessão da presente legislatura, renovar a iniciativa da proposta do lei submettida a vossa esclarecida apreciação na anterior legislatura.
Na impossibilidade de averiguar os verdadeiros motivos que levariam o governo a proceder por esta fórma, limito-me, no uso de um direito e no cumprimento de um dever, a suggerir sobre o assumpto, no seguinte projecto de lei, os alvitres que a meu ver se poderão desde já adoptar para obviar aos males, sempre crescentes, que desde muito opprimem a economia financeira e commercial das referidas duas provincias africanas.
O decretamento immediato das providencias que submetto ao vosso exame responderá de um modo cabal as justissimas reclamações do commercio caboverdiano e do guincense, e fará cessar o estado cahotico em que se debate a circulação monetaria n'aquellas provincias, evitando os desastres que tão seriamente as ameaçam.
Não reputo acceitavel, como muitos sustentam, a immediata substituição de todas as moedas, de cunho variadissimo, admittidas ou toleradas na circulação provincial, pelas letras da junta de fazenda pagaveis a certos e determinados prasos, porque d'essa operação resultaria evidentemente uma grande perturbação pela ausencia do numerario no commercio e pela abundancia de papel, só pagavel a longo praso e fóra da séde do commercio de cada provincia.
Alem de que, o commercio miudo e as pequenas transacções de uma mesma ilha do archipelago, por exemplo, ou de uma a outra ilha, mal se poderiam sustentar, ou nem sequer seriam viaveis, dada a ausencia completa do dinheiro-metal e a sua substituição pelo dinheiro-papel, mormente quando este de modo algum poderá reduzir-se a fracções tão pequenas que satisfaçam ás variadissimas exigencias commerciaes.
Não me assoberba o receio que a muitos preoccupa sobre a substituição directa da moeda estrangeira pela nacional, dadas as condições de facil o gradual permutação indicadas no projecto, e observados que sejam os preceitos n'elle consignados. Os cofres publicos não estarão por certo habilitados para a substituição immediata de todas as variadas moedas estrangeiras que actualmente circulam em Cabo Verde e na Guiné portugueza, porque isso obrigaria ao adiantamento, por uma só vez, de mais de 200:000$000 réis, que a metropole teria desde logo de levantar por emprestimo, com grande sacrificio talvez para o thesouro. Nada impede, porém, que a substituição da moeda se vá fazendo a pouco e pouco e gradualmente, e por modo que o adiantamento feito pela metropole as referidas provincias não attinja mais de 30:000$000 réis, que o governo facilmente levantará emprestado, offerecendo como garantia os recursos aduaneiros d'aquellas provincias e o producto da propria recunhagem em Lisboa.
Existem hoje em circulação nas duas mencionadas provincias não só as moedas a que se refere o decreto de 19 de outubro de 1853, mas tambem e por simples deliberações das juntas da fazenda funcções d'essas moedas e uma grande quantidade de pesos chilenos, peruvianos e bolivianos de cunhagem recente, que aliás não foram auctorisados por nenhuma lei ou acto expresso do governo. A importação d'estas ultimas moedas é enorme e constante, sem que o governo tenha procurado evital-a. Ao contrario tem por si alimentado essa corrente abusiva e fraudulenta, que dá logar a especulações de todo o ponto illicitas, não só recebendo taes moedas nos e cofres publicos, como fazendo com

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ellas os seus pagamentos a rasão de 860 réis, por cada uma, quando ellas podem quando muito valer 720 réis!
É d'estes factos condemnaveis que tem resultado o complete desiquilibrio nas operações commerciaes e financeiras, de que tanto se queixam os povos d'aquellas nossas possessões africanas; e, em verdade, os effeitos de um tal meio circulante parecem-se muito com os de uma circulação de moeda falsa, pelo menos n'uma proporção sensivel da somma das moedas em giro.
Este estado e intoleravel e vergonhoso, e ao parlamento cumpre dar ao governo um exemplo severo, mas patriotico, occupando-se do um assumpto de tamanha gravidade, que o poder executivo parece descurar e desprezar.
No projecto de lei, que proponho, limito a recunhagem ás moedas de prata e cobre. Não foi o meu pensamento estabelecer um systema perfeito da circulação monetaria em Cabo Verde e na Guiné. Apenas procurei estabelecer a troca, pelos meios que me pareceram praticos e exequiveis, da actual moeda de prata estrangeira, de peso; toque o tolerancia inferiores a tabella official e em completa discordancia com a lei geral de 1854, a fim de attender de prompto aos justos clamores originados pelo estado tumultuario e vexatorio da circulação actual.
O problema da circulação monetaria, que e complexa na propria metropole, e muito susceptivel de provocar nas actuaes circumstancias uma violenta crise nas praças de Lisboa e Porto, pela notoria escassez de oiro, que por todos os meios se exporta continuadamente para o estrangeiro, e pela abundancia da moeda de prata e cobre, não o é menos no ultramar, onde a circulação não só é imperfeita e incompleta como entre nós, senão tambem absurda a anarchia, e onde, por isso, a primeira cousa a fazer é evitar quaesquer desastres que se apresentem imminentes. Remediado o primeiro mal, poderão adoptar-se outros melhoramentos tendentes a levantar a circulação ao maior grau de perfectibilidade, perfectibilidade, que aliás ainda ella não attingiu a metropole.
Não ignoro que a moeda de oiro é a moeda por excellencia, o verdadeiro typo da moeda, sendo as demais simplesmente moedas subsidiarias. Fôra optimo que desde logo entrassem em circulação nas provincias de Africa as moedas de oiro, conjunctamente com as de prata e cobre.
As difficuldades, porém, seriam muito maiores para que em breve o problema obtivesse solução prompta e viavel, é pouco o que proponho no projecto, mas ninguem desconhece que com esse pouco desapparecerão immediatamente as difficuldades de transferencias, um dos maiores males com que lucta o commercio de Cabo Verde e da Guiné e cessará desde logo a especulação, tão ilicita quanto funesta, que hoje as assoberba.
Posto isto, e convencido de que pugno por uma solução util, sujeito á vossa critica o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Serão sómente consideradas moedas legaes na provincia de Cabo Verde e na Guiné, trinta dias depois da publicação da presente lei no Boletim official da respectiva provincia, as moedas de oiro, prata e cobre que têem curso no reino, na conformidade da legislação vigente, e que já tinham ali curso legal, por valor igual, por virtude do decreto de 19 de outubro de 1853.
Art. 2.º Serão consideradas moedas legaes, para os effeitos do artigo antecedente, até serem definitivamente retiradas da circulação, nos termos do artigo 3.º e outros da presente lei, as moedas estrangeiras constantes da tabella annexa ao referido decreto de 19 de outubro de 1853 e as que, com assentamento do governo, têem curso na provincia, com os valores que são actualmente fixados na circulação, uma vez que dentro do mencionado praso de trinta dias sejam pelos seus possuidores apresentadas na junta de fazenda e nas suas delegações para serem devidamente carimbadas com o carimbo official, que pelo ministerio da marinha e ultramar será remettido para o desempenho d'este serviço á mesma junta e ás suas delegações.
§ unico. O carimbo de que trata este artigo será inutilisado no dia em que findar o praso fixado no artigo 1.°, com as formalidades expressas nas instrucções que, segundo o disposto no artigo 9.° d'esta lei, fará o governo expedir opportunamente; devendo ser devolvidos ao ministerio da marinha e ultramar, pelo governo geral da provincia, os carimbos inutilisados com os respectivos autos de inutilisação.
Art. 3.° As moedas estrangeiras assim carimbadas serão todas retiradas da circulação no praso improrogavel de tres annos, pela fórma e nas condições estatuidas n'esta lei.
Art. 4.° É o governo auctorisado a levantar por emprestimo até á quantia de 30:000$000 réis, a fim de ser exclusivamente applicada á compra de metaes para serem cunhados em moeda do reino, que servirá para a primeira operação do resgate da moeda carimbada e para o pagamento dos saques auctorisados pelo artigo 9.°
§ unico. Esta cunhagem será, em moeda de prata até 15:000$000 réis, sendo a restante em moeda de cobre de 20, 10 e 5 réis.
Art. 5.° Para realisar o emprestimo de que trata o artigo 4.° é o governo tambem auctorisado a dar annualmente até 7 por cento de juro e 10 por cento de amortisação, sendo satisfeitos estes encargos pelo rendimento das alfandegas da provincia e pelo producto de recunhagem das moedas retiradas da circulação, como dispõe o artigo 6.°
Art. 6.° A moeda retirada da circulação, por effeito da primeira operação de resgate, será remettida para o reino, a fim de ser novamente cunhada na casa da moeda em Lisboa, em moeda de prata e cobre, na proporção que as necessidades e os interesses da provincia aconselharem, sendo a moeda assim recunhada não só applicada a segunda operação do resgate da restante moeda carimbada, como ao pagamento de parte do emprestimo de que trata o artigo 4.°
Art. 7.º A moeda retirada da circulação, por effeito da segunda operação de resgate, ser-lhe-ha applicavel o disposto no artigo 6.° e assim successivamente até á completa substituição da moeda carimbada.
Art. 8.° Emquanto existirem na provincia as moedas carimbadas, todos os vencimentos, as dividas activas e passivas da fazenda publica, os contratos ou obrigações entre particulares, poderão ser indistictamente pagos pela moeda portugueza, ou pela carimbada, guardando-se a respeito d'esta a equivalencia estipulada estipulada na tabella junta ao decreto de 19 de outubro de 1853.
§ unico. Os contratos que tiverem sido feitos, com obrigação de pagamento em certo numero de moedas estrangeiras actualmente em circulação na provincia, serão satisfeitos n'esse mesmo numero e especie de moedas, mas carimbadas, emquanto ellas existirem na provincia, devendo, porem, findo o praso do resgato, ser pagos pela nova moeda em valor equivalente.
Art. 9.° É permittido á junta de fazenda da provincia saccar contra o ministerio da marinha o ultramar, em letras de pequenas quantias a favor do commercio provincial, no periodo do resgate e para facilitar o mesmo resgate, até á somma que o governo da metropole auctorisar annualmente, segundo as necessidades do referido commercio e o estado de adiantamento da recunhagem da nova moeda.
§ unico. As moedas que a junta receber em troca das letras serão immediatamente remettidas ao reino para o effeito do artigo 6.°
Art. 10.° O governo expedira immediatamente as instrucções ou regulamentos necessarios para a execução da presente lei.
Art. 11 ° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 28 de abril de 1885. = O deputado por Quilimane, Elvino de Brito.
Foi admittido e enviado ás commissões do ultramar e fazenda.

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REPRESENTAÇÕES

1.ª Dos empregados menores do lyceu nacional de Braga, pedindo que por lei se conceda aos empregados menores de todos os lyceus a aposentação.
Apresentada pelo sr. deputado Vicente Pinheiro e enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda.

2.ª Da commissao delegada do professorado do quarto circulo escalar, Valença, pedindo augmento de ordenado.
Apresentada pelo sr. deputado Reis Torgal, enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

3.ª Dos professores de instrucção primaria dos concelhos de Alcobaça, de Porto de Moz e da Batalha, pedindo augmento de ordenado.
Apresentada pelo sr. deputado Lopes Vieira e enviada á commissão de instrucção primaria, e secundaria, ouvida a de fazenda.

4.ª Da camara municipal do concelho de Souzel, districto de Portalegre, pedindo providencias com que seja combatida a crise por que esta passando a agricultura cerealifera em Portugal.
Apresentada pelo sr. deputado visconde de Reguengos e enviada á commissão especial de inquerito sobre a crise agricola.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que, polo ministerio das obras publicas e repartição dos trabalhos geodosicos, me seja remettido com urgencia o mappa dos terrenos dos concelhos a que se refere o decreto de 21 de julho de 1884, referendado pelo ministro da marinha. = Luiz José Dias.

2.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, me sejam enviadas copias de todos os documentos relativos á demissão recente do capellão do hospital da misericordia de Cintra, e do phatmaceutico da mesma santa casa, Virgilio Corta, e nomeadamente as actas de onde consta a nomeação e a demissão d'aquelles empregados, bom como copia dos officios em que lhes foi notificada a demissão. = José Simões Dias.

3.° Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da marinha e ultramar, mo sejam enviados com a maxima urgencia os seguintes esclarecimentos:
1.° Os originaes ou copia dos projectos das obras a que se refere o n.° 1.° do artigo 2.° do decreto de 21 de julho de 1884 e a data em que esses projectos deram entrada na repartição competente.
2.° Copia do parecer das estações a que se refere o ultimo considerando do relatorio que precede o citado decreto. = Luiz José Dias.
Mandou-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° De D. Josephina Luiza dos Santos Galvão, viuva de Santos Antonio Jacinto Galvão, pedindo uma pensão.
Apresentado pelo sr. deputado Scarnichia e enviado á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

2.° De Antonio Ferreira de Araujo e Silva, engenheiro civil ao serviço do ministerio das obras publicas, pedindo que lhe sejam applicaveis as disposições dos artigos 12.° e 13.° do decreto de 30 de outubro de 1868.
Apresentado pelo sr. deputado E. Pinto Basto e enviado á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro a v. exa. e á camara que por motivo do molestia não tenho podido comparecer ás sessões do mez proximo findo. = Garcia de Lima.

2.ª Faltei as duas ultimas sessões por motivo justificado. = Reis Torgal.
Para a acta.

DECLARAÇÕES DE VOTO

1.ª Declaro que se tivesse podido comparecer á sessão do dia 25 do proximo passado, teria approvado na generalidade o projecto n.° 13, relativo ás reformas politicas. = Garcia de Lima.

2.ª Declaro que se estivesse presente quando se votou a generalidade do projecto de lei das reformas politicas o teria approvado. = Antonio Joaquim da Fonseca, deputado por S. Thomé e Principe.
Para a acta.

O sr. Presidente: - A deputação d'esta camara nomeada para assistir á recepção que houve no paço por occasião do anniveisario do outorga da carta constitucional cumpriu a sua missão.
A allocução dirigada a Sua Magestade e a resposta do mesmo augusto senhor serão lidas na mesa, landas na acta publicadas no Diario do governo, logo que sejam recebidas do ministerio do reino, onde se acham.
Tenho tambem a participar á camara que os senhores deputados Goes Pinto e Joaquim Neves encarregaram-me de participar á camara que por falta de saude têem deixado de comparecer ás sessões; enviando me por casa occasião o sr. Goes Pinto um attestado de doença.
O sr. Pinto Basto: - Mando para a mesa um requerimento do sr. Aranjo e Silva, distincto engenheiro civil ao serviço das obras publicas no districto de Aveiro, que pede para que se lhe tornem extensivas as disposições dos artigos 12.° e 13.º do decreto de 30 de outubro de 1868.
Este funccionario ha mais de 16 annos que serve no districto de Aveiro já na repartição districtal, já na repartição de obras publicas, onde tem prestado relevantissimos serviços, sendo por isso digno de toda a consideração.
Peco a v. exa. que se digne dar a este requerimento o destino conveniente e confio que, a respectiva commissão não deixará de attender o requerimento, deferiado ao pedido que se me affigura de toda a justiça.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
o requerimento face o destino indicado a pag. 1372 d'este Diario.
O sr. Alfredo Barjona: - Requeiro a v. exa. consulte a camara sobre se, dispensando o regimento, permitte que entre desde já em discussão o parecer n.° 40 da illustrada commissão de fazenda.
O sr. Presidente: - Logo que haja numero para se poder deliberar, e haja occasião, eu consultarei a camara sobre o pedido do sr. deputado.
O sr. Garcia de Lima: - Mando para a mesa uma justificação de faltas e juntamente a declaração de que, se estivesse presente na sessão de 25 do mez passado, teria approvado a generalidade do projecto n.° 13, respeitante ás reformas politicas.
A declaração vae publicada na respectiva secção.
O sr. Simões Dias: - Tenho a honra de mandar para a mesa um requerimento pedindo pelo ministerio do reino alguns documentos relativos a factos que se deram recentemente no concelho do Cintra.
Como se infere da leitura que YOU fazer, desejo habilitar-me com documentos para apreciar devidamente o facto da demissão do pharmaceutico do hospital da misericordia

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1374 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de Cintra e do capellão da mesma santa casa, porque se me affigura menos correcto o procedimento de quem os demittiu.
O meu requerimento é o seguinte:
(Leu.)
Sr. presidente, não peço a v. exa. que expeça urgentemente o meu requerimento, porque sei que v. exa. costuma cumprir os seus deveres; mas devo declarar tambem que não sou tão ingenuo que desde já acredite que em breve me chegarão da secretaria do reino as informações e documentos que requeiro hoje.
Todos os dias aqui se formulam queixas e amontoam instancias por parte da opposição, sem que o governo de providencias nenhumas nem se importa com taes pedidos.
Não attribuo a v. exa. tamanhas irregularidades; mas tambem não comprehendo os motivos por que não hão de ser mandados a esta camara os documentos que julgamos necessarios para fundamental as nossas reclamações.
Incuria dos ministros? Desprezo pelas prerogativas do parlamento? Desleixo dos empregados das secretarias? Seja qual for a rasão, a verdade é que este systema é um meio indirecto posto á disposição do governo para evitar a discussão. (Apoiados.)
Associo-me aos meus collegas, que mais ou menos energicamente têem protestado contra semelhante systema, e reclamo para mim, para a opposição e para a maioria o direito liberrimo de solicitar e haver quaesquer documentos que nos sejam necessarios para accusar ou apreciar os actos do governo.
De mais a mais, sr. presidente, não é praxe parlamentar nem costume estabelecido o recusar-se o governo a mandar a camara quaesquer informações que a mesma camara exija no uso plano do seu direito.
A honrada situação progressista, que geriu os negocios publicos, desde maio de 1879 até março de 1881, não só poz especial cuidado em remetter á camara, com a maxima promptidão, os documentos que lhe eram pedidos pelos deputados, mas veiu aqui declarar que os archivos das secretarias estavam á disposição da camara, e que, para encurtar delongas, ali podiam os srs. deputados exigir as informações esclarecimentos e documentos de que porventura carecessem para accusar o governo e apreciar a marcha dos negocios.
Porque é, pergunto eu, que tão salutar exemplo não é seguido pelo actual governo?
Mas não o segue; e é por isso que eu me queixo e junto as minhas reclamações as reclamações dos meus collegas.
Declare mais:
Se o direito que todos os srs. deputados têem de exigir documentos pelas secretarias de estado por vezes reveste a fórma de uma impertinencia incommoda, quando é exercido exageradamente, eu pela minha parte não entro na classe dos impertinentes.
É esta a terceira vez que peço documentos. Verdade seja que nenhum dos meus pedidos até hoje foi satisfeito; mas não me surprehende nem irrita este facto. O que me surprehenderia e que o governo actual cumprisse religiosamente os seus deveres. E não me irrito porque tenho muitos companheiros de infortunio.
Não tenho esperanças, repito ainda, de que o requerimento que mando hoje seja rapidamente satisfeito; mas envio-o para a mesa, porque desejo que os meus eleitores saibam que cumpro o meu dever e não abdico dos meus direitos. (Apoiados.)
Concluo pedindo a v. exa. que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro do reino, visto que não vejo nos bancos do governo nenhum membro do poder executivo.
Desejo interrogar o sr. ministro do reino ácerca das rasões que teve para demorar a feitura dos programmas da Escola Macedo Pinto, de Taboaço, e conseguintemente o provimento d'aquella cadeira, que e devida á illustrada e humanitaria iniciativa da familia Macedo Pinto.
Peco a v. exa., pois, que me reserve a palavra, para usar d'ella, se o sr. ministro do reino vier a tempo a esta sessão.
O sr. Presidente: - O requerimento do sr. deputado vae ser expedido com a urgencia que reclama.
O sr. Visconde de Reguengos: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Souzella pedindo providencias ácerca da crise agricola.
Teve o destino indicado a pag. 1373 d'este Diario.
O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: - Pedi a palavra para declarar a v. exa. que nenhuma duvida tenho em applaudir, como effectivamente applaudo, a proposta do illustre deputado o sr. Fuschini para que se abra um inquerito parlamentar a fim de ser devidamente estudada a questão agraria da ilha da Madeira; e unindo a minha humilde voz á voz eloquente e auctorisada d'aquelle illustre deputado, peço á commissão respectiva que haja de dar parecer sobre este assumpto, que tanto deve á solicitude de s. exa., cuja elevação de idéas e generosidade de intuitos em prol dos interesses sociaes se impõem á minha admiração e respeito.
O illustre deputado entende que o mal estar dos madeirenses é devido em grande parte ao contrato de colonia ha muitos annos em vigor n'aquella ilha.
Sem querer entrar agora na apreciação d'esse contrato, que deve ser opportunamente estudado pela commissão de inquerito e submettido ao exame esclarecido e imparcial da camara, devo dizer a v. exa. que não só os colonos, senão todas as classes sociaes d'aquella terra, se resentem de um profundo mal estar. O commercio, a industria, as artes, todas as manifestações da actividade social d'aquelle povo se acham extremamente abatidas. (Apoiados.)
Em todo o caso não podemos nem devemos permanecer inertes á espera do resultado d'aquelle inquerito, mas antes nos cumpre pedir, instar com o governo, para que sejam adoptadas outras providencias, que as circumstancias, verdadeiramente excepcionaes, d'aquella terra urgentemente reclamam. (Apoiados.)
E assim temos feito, com o natural interesse que os deveres da nossa missão recommendam, e n'esse proposito insistimos, para o que, como v. exa. sabe, annunciámos uma interpellação ao governo.
Eu teria desde logo, pela muita consideração e estima que me merece o sr. Fuschini, respondido a s. exa. se estivesse presente, quando me fez a honra de alludir ao meu nome.
Aproveito a occasião para chamar a attenção das respectivas commissões para os dois projectos de lei que em tempo tive a honra de apresentar, e que se referem ao aproveitamento das aguas de irrigação e á arborisação das serras da ilha da Madeira.
O desenvolvimento da viação publica, a arborisação das serras e a tiragem das levadas reputo eu as necessidades mais instantes d'aquella terra. Não cessarei de empenhar todos os esforços ao meu alcance para a satisfação d'estas necessidades, pois não póde aquelle povo ficar eternamente privado de beneficios e da protecção a que tem direito, e que nos temos, como seus representantes, o dever de reclamar aos poderes publicos.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Adolpho Pimentel: - Antes de usar da palavra, que v. exa. me concedeu, desejava que o sr. secretario me informasse sobre se já veiu a consulta dos fiscaes da corôa ácerca do projecto dos estatutos da associação de beneficencia de Braga, que por copia pedi ha mais de quarenta dias.
O sr. Secretario (Sebastião Centeno): - O requerimento do sr. deputado foi expedido em 14 de março e até hoje não foi satisfeito.
O Orador: - Depois da informação, que acaba de dar-

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me o sr. secretario, peço a v. exa. a fineza de officiar novamente ao ministerio do reino para que aquella consulta seja remettida com urgencia a esta camara.
Aproveito a occasião para chamar a attenção do governo para dois assumptos que interessam, um ao circulo que tenho a honra de representar n'esta casa e o outro á terra em que tenho vivido a maior parte da minha vida, cujos habitantes muito estimo e de quem tenho recebido muitas e immerecidas provas de consideração.
Interessa muitissimo ao circulo de Espozende, por onde fui eleito deputado, o assumpto para que desejo chamar a attenção do governo, do qual espero acertadas providencias no sentido de attender ás juntas reclamações dos povos que represento, para que se cuide a serio dos indispensaveis melhoramentos do porto e barra de Espozende, unico porto que tem o districto de Braga; e que, sendo ainda hoje de alguma importancia, outr'ora fui de muitissima, porque este porto era procurado por navios de alto bordo e longo curso.
Houve epocha que em Espozende foram matriculados oitenta navios grandes, destinados a longa navegação, e é escusado demonstrar o grande interesse que tirava aquella terra de que o seu porto fosse frequentado por navios de alto bordo destinados a longa navegação.
Houve epocha que em Espozende foram matriculados oitenta navios grandes, destinados a longa navegação, alguns dos quaes pertenciam ao proprio commercio de Espozende. De verdadeira importancia para os interesses nacionaes seria a frequencia nos nossos portos de navios que fizessem larga e longa navegação, e melhor seria ainda que esses navios navegassem sob a bandeira nacional.
As obras da barra de Rspozende em tempo não foram descuradas; pelo contrario, em 1793 os povos dos concelhos banhados pelo rio Cávado pediram que para a continuação e desenvolvimento d'aquellas obras fosse creado um imposto a pagar por elles.
Creando-se o imposto, começou-se a dar grande desenvolvimento não só aos melhoramentos da barra e porto, mas tambem a serios trabalhos para melhorar a navegação do rio Cávado. Pela invasão dos francezes as obras pararam, e foram-se desconjuntando as pedras e desmorocando se as obras, o que collocou a barra em peiores condições do que estava.
A necessidade dos melhoramentos do porto e barra de Espozende foi reconhecida em 1857, e ultimamente em 1866 a lei de 20 de junho d'este anno creou um imposto destinado para os melhoramentos tanto do porto como da barra.
Na ultima sessão pedi pelo respectivo ministerio nota da importancia do imposto especial creado para os melhoramentos tanto do porto como da barra: assim que vier essa nota fallarei largamente sobre este assumpto e chamarei a attenção do governo para estes melhoramentos que são inadiaveis e não muito dispendiosos. Conheço que as circumstancias do thesouro não são as melhores, e por consequencia não podemos estar a fazer obras dispendiosas, mas quando as obras são urgentes, de verdadeiro interesse para os povos, e não importam em grandes quantias de dinheiro, é necessario fazel-as, porque n'estes casos é um acto de boa administração satisfazer aos justos pedidos dos povos.
Acresce ainda a circumstancia de que a barra de Espozende, já pela sua situação leste a oeste, já porque o seu fundo não é de rocha, póde facilmente melhorar-se com pouco dispendio.
N'estas condições é attendivel a reclamação dos povos, e mais attendivel é quando ha uma receita creada com esta applicação. Não se pede ao thesouro uma grande verba destinada para outro serviço, pede-se apenas um pequeno subsidio para juntar á receita especial creada para este fim, e d'esse modo se poderá dar a estas obras todo o desenvolvimento possivel e compativel com as circumstancias do thesouro.
Esta obra, repito, é importantissima, e espero que o governo tomará em consideração as modestas observações, aliás justas, que acabo do fazer e que dizem respeito a um melhoramento que tanto interessa ao circulo que tenho a honra de representar no parlamento.
O outro assumpto para que desejo chamar a attenção do governo e para o modo por que está sendo executada a lei do real de agua e se está procedendo a varejos nas casas de venda na cidade da Braga.
Eu sei que as leis tributarias têem sempre um certo odioso, ainda quando são bem executadas, mas juntarmos ao natural odioso que trazem as leis tributarias o odioso de executal-as illegalmente, vexando e opprimindo, com offensa da lei, os povos, e uma irregularidade que me parece dever-se evitar, porque o odioso que resulta d'isto faz com que outras leis que têem de ser cumpridas encontrem da parte dos povos grande opposição.
Apresento dois factos e por elles poderá a camara conhecer como os encarregados de cumprir as leis do fisco exorbitam de um modo vexatorio, e digno das mais severas censuras.
Os vendeiros vão manifestar os vinhos que entram em suas vendas; mas o vinho que está no fundo das vasilhas, não podendo ser vendido, porque o publico o não quer comprar por o achar um pouco azedado, e tirado das vazilhas e junto em depositos com o já estragado. Em seguida entram os varejantes e encontrando uma vazilha com o vinho verde azedado, que fôra tirado do fundo de outras vazilhas, incriminam o vendeiro por ter na loja vinagre, que não manifestára, e multam-o por contraventor das leis fiscaes.
Essa multa, porém, é injusta e illegal. O liquido encontrado e apprehendido pelos varejantes não é realmente vinagre. É vinho embora já esteja azedado, e entrando no estabelecimento no estado de bom vinho verde, como tal foi manifestado. Não basta para o vendeiro o prejuizo que soffrera de se lhe azedar uma porção de vinho, de ter do fazer repetidas lavagens a vazilha em que elle estava, o que representa tempo gasto e braços occupados, e ainda por cima e multado. (Apoiados.)
Ha ainda outro facto que e tambem vexatorio e illegal.
Os empregados do fisco entram n'uma venda, encontram uma pequena porção de carne de porco destinada aos fisos domesticos da familia do vendeiro. Immediatamente a apprehendem, e obrigam o vendeiro a pagar a respectiva multa, embora a porção encontrada seja de poucos kilogrammas, e por isso facil do ver que não era destinada á venda, mas sim ao consumo domestico. O varejante é implacavel, e não admitte a, aliás verdadeira, justificação do vendeiro. Apprehendo-lhe a carne, multa-o, e por muito favor aconselha-o a que tenha a carne de porco, destinada ao consumo proprio e de sua familia, em outra casa que não seja a da venda. Tem, pois, o desgraçado vendeiro de alugar uma casa de proposito para n'ella guardar um bocado de carne de porco, de que possa fazer uso.
O procedimento d'estes empregados é digno de censura, (Apoiados.) Isto é uma arbitrariedade, e Deus nos livre que ao odioso das leis se acrescente ainda este odioso filho da ignorancia da lei e do genio pouco conciliador d'ested empregados. (Apoiados.)
Espero que o governo adoptará as devidas providencias, para que estes factos se não repitam.
O sr. presidente: - O documento a que o sr. deputado se referiu vae ser requisitado novamente.
O sr. Vicente Pinheiro: - Mando para a mesa uma representação dos empregados menores do lyceu nacional de Braga, pedindo uma providencia legislativa que conceda e garanta aos requerentes, assim como aos seus collegas dos outros lyceus, o direito á aposentação.
Parece-me que esta representação não deixará de merecer toda a consideração ás commissões que a tenham de consultar e do mesmo modo á camara, porque poucos pedidos subirão ao parlamento, que mais se imponham pela justiça que os acompanha.

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Já não são muitas as classes de funccionarios publicos que ainda hoje estão privados do beneficio da aposentação; e se o motivo que obsta a que se possa fazer cessar esta desigualdade está nas circumstancias precarias do nosso thesouro, nem mesmo esta rasão poderá ser allegada contra a pretensão dos empregados a quem me estou referindo, por isso que a insignificancia dos seus vencimentos e tal, que a despeza resultante das aposentações que lhes fossem concedidas em muito pouco aggravaria essas circumstancias.
Por agora limito a isto as minhas considerações sobre o assumpto e opportunamente farei as mais que se me offerecerem.
Aproveitando a occasião de estar com a palavra, permitta-me v. exa. que eu me felicite pelo interesse com que o illustre deputado de Espozende, o sr. Adolpho Pimentel, advogou a causa do commmercio de Braga, cujo circulo eu tenho a honra de representar n'esta casa.
É com toda a justiça que o commercio d'aquella cidade se queixa do modo como ali se está cumprindo a lei do real de agua, e eu acompanhado pelos meus collegas, os illustres deputados, os srs. Lopo Vaz e José Borges, já entreguei ao sr. ministro da fazenda uma representação em que a associação commercial de Braga expoz a sua justiça sobre tão importante assumpto.
É-me licito esperar que o governo adopte sem demora as providencias necessarias para que não continuem as irregularidades e abusos que motivam as queixas que só têem levantado; e nada mais direi por agora sobre este ponto.
O sr. Reis Torgal: - Participo a v. exa. e a camara que faltei as duas ultimas sessões por motivo justificado.
E, como estou com a palavra, aproveito a occasião para mandar para a mesa uma representação dos professores do quarto circulo escolar, que foi enviada a redacção do Froebel.
Accedendo de bom grado aos desejos de um velho amigo, não tive a menor duvida em ser portador d'este documento, que, pela sua importancia, deve merecer a attenção de todos os que se interessam pela instrucção popular em Portugal.
Todos sabem com que difficuldades lucta a laboriosa classe dos professores de ensino primario, por isso não me demorarei em fazer o encarecimento da justiça que lhes assiste.
Peço a v. exa. que consulte a camara, a fim de ser auctorisada a publicação d'esta representação na folha official.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
O sr. Luiz José Dias: - Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo diversos documentos pelos ministerios das obras publicas e da marinha e ultramar.
Peço que se lhes dê o devido destino, e que com urgencia se faça a remessa d'estes esclarecimentos.
Vão publicadas a pag. 1373 d'este Diario.
O sr. Lopes Vieira: - Mando para a mesa uma representação dos professores de instrucção primaria dos concelhos do Alcobaça, Porto de Moz e da Batalha, pedindo a esta camara que se digne prover de remedio ás precarias circumstancias em que vivem, victimas da insufficiencia dos seus vencimentos, se não tambem do atrazo do pagamento d'elles.
Estou mais do que convencido de que todos os membros d'esta camara sabem que é bem pouco lisonjeira a situação do professorado de instrucção primaria no paiz, e creio que a minha memoria não me engana quando digo que varios membros d'esta casa já têem manifestado as suas convicções a este respeito. (Apoiados.)
Creio tambem que só em presença das circumstancias pouco favoraveis do thesouro e que se póde permittir que estes professores continuem tão mal remunerados e tenham tão poucas garantias.
Nada mais digo por agora, mas faço votos para que o governo e as commissões, ás quaes v. exa. tem de mandar esta representação, pensem seriamente sobre esta grave questão e procurem harmonisar quanto possivel as circumstancias difficeis do thesouro, com as circumstancias não menos difficeis e bem mais precarias do professorado de instrucção primaria. Oxalá que elles não percam o sen tempo nas representações que dirigem a esta camara e que finalmente consigam que se lhes faça justiça.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
A representação teve o destino indicado a pag. 1373 d'este Diario.
O sr. Presidente: - O sr. deputado João Chrysostomo Melicio pede licença para estar ausente do reino durante dois mezes.
Vae ler-se o requerimento para que a camara delibere sobre a concessão da licença pedida.
Leu-se o seguinte

Requerimento

Requeiro á camara, que me conceda licença de dois mezes para poder estar fóra do reino.
Sala das sessões, 28 de abril de 1885. = José Chrysostomo Melicio, deputado pelo circulo de Leiria.
Consultada a camara, foi concedida a licença.

O sr. Elvino de Brito: - Obtendo a palavra para um assumpto urgente, expoz a consideração da camara os seguintes factos e sobre elles pediu explicações ao sr. ministro do reino. Sabia que a Inglaterra procurava por todas as fórmas attender a sua area de occupação pelos territorios portuguezes no interior da Africa oriental. Este facto, de que ha indicies mais ou menos comprovativos, augmenta de gravidade diante do proposito manifestado pela Allemanha de aproveitando os acontecimentos emanentes da guerra anglo-russa, offerecer o seu protectorado á republica do Transwaal. A approximação d'estes factos, cada qual por si importante e grave, colloca em condições melindrosas o nosso dominio na Africa oriental, e com especialidade o districto de Lourenço Marques, em risco de o perdermos, se o governo não cuidar de prevenir as occorrencias a que possa arrastar o embate de todos esses conflictos, que se aposentam imminentes.
Pediu ao illustre ministro do reino que informasse a camara, com a devida reserva, sobre o assumpto a que acaba de referir-se, caso tenha d'elle conhecimento.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. restituir as notas (tachygraphicas.)
O sr. Ministro do Reino (Barjona de Freitas): - Não tenho noticia alguma de quaesquer tentativas no sentido que o illustre deputado indicou e que a serem verdadeiras teriam realmente gravidade; entretanto communicarei ao meu collega
dos negocios estrangeiros as apprehensões e receios de s. exa., e quaesquer esclarecimentos que porventura hajam de ser dados á camara, o meu collega não terá duvida em vir prestal-os com a prudencia e reserva exigidas em questões d'esta ordem.
O que assevero de novo ao illustre deputado e que não tenho noticia alguma que possa n'este momento preoccupar o governo a tal respeito.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)

ORDEM DO DIA

Discussão na especialidade do projecto de lei n.° 13 (reforma de alguns artigos da carta)

O sr. Presidente: - Continua com a palavra que lhe ficou reservada na ultima sessão o sr. Avelino Calixto.
O sr. Calixto: - Continuando a fazer uso da palavra, que lhe ficára reservada da sessão anterior, sustentou a sua substituição ao artigo que se discute.
Parecia-lhe que o artigo 6.° do projecto continha apenas theorias abstractas e o desconhecimento completo da parte pratica nos nossos costumes politicos.

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Via que se tem pedido o elemento electivo applicado á nomeação dos pares do reino, e, pelo caminho que se vae seguindo, querendo applicar o facto electivo a tudo, ainda havia de ver que o elemento electivo se havia de applicar á nomeação dos juizes de direito. E, se era um elixir a eleição, porque se não havia de applicar á nomeação dos juizes que julgam sobre a honra, a propriedade e a vida dos cidadãos?
Na sua opinião o principio electivo não pode dar origem segura para a organisação da segunda camara. O que mais se precisava na camara alta era de independencia politica.
De maneira alguma approvava o projecto do sr. Dias Ferreira, mas por esse projecto a camara dos pares era um corpo todo electivo, emquanto que pela proposta do governo ficava um corpo composto de elementos heterogeneos.
Como havia de haver homogeneidade num corpo composto de elemento electivo temporario sujeito a dissolução, e de elemento da nomeação regia? Para si a parte electiva da camara dos pares com a dissolução correspondia a um novo systema de fornadas, mas fornadas mais caras do que pelo systema por que até aqui se faziam, porque as eleições custam dinheiro. Sustentou a sua proposta que havia apresentado na discussão da generalidade.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa dois pareceres da commissao de obras publicas. O 1.° refere-se ao projecto de lei que tem por fim auctorisar a camara municipal da Certã, a despender do fundo de viação a quantia annual de 365$732 réis até 1898 inclusive, para pagamento do juros e amortisação de um emprestimo contrahido com a companhia do credito predial, e destinado a differentes obras de urgente necessidade publica. No 2.° resolve-se sobre a representação da camara municipal de Freixo de Espada á Cinta, pedindo ser auctorisada por lei a applicar no pagamento de juros e amortisação de um emprestimo, contrahido com a companhia geral de credito predial, até á extincção da divida, as quantias que sobrassem annualmente do fundo de viação, depois de satisfeitas as despezas ordinarias.
Enviados á commissão de administração publica.
O sr. Bernardino Machado: - Começou por observar que lhe não era necessario combater o principio do pariato hereditario, visto que ninguem o defendia. É que, reconhecendo todos a força da hereditariedade, todos conhecem ao mesmo tempo que ella não é bastante para dotar alguem com o saber e com a virtude, e estes são os unicos titulos que devem dar direito á entrada em qualquer das camaras. De mais, perguntava qual era entre nós a classe que se podesse dizer herdeira das tradições de governo, depositaria do espirito politico.
Disse que lhe era necessario, sim, combater o direito proprio ao pariato, que tantos espiritos cultos ainda sustentavam e até alguns que aliás se declaravam seus adversarios. Assim, o sr. José Dias Ferreira, que este anno combateu o direito ao pariato inherente a qualquer funccionario, o anno passado opinava pela introducção na camara dos pares de membros eleitos por corporações do estado, como o supremo tribunal de justiça, por exemplo. Pois dar a estas corporações o direito de eleger pares e essencialmente o mesmo que investir no pariato certos funccionarios publicos. O mesmo principio condemna um e outro d'estes suppostos direitos. Qual é este principio? É que se não deve inverter a ordem constitucional, segundo a qual os representantes da nação formam directamente o poder legislativo e indirectamente o poder executivo; e dar o pariato a certos funccionarios ou a certas corporações executivas, é derivar não o executivo da representação nacional, mas ás avessas, derivar do executivo um ramo da representação nacional, é a confusão dos poderes, e a peior, porque é a absorpção de todos pelo executivo.
O orador sabe que se costuma allegar em favor da elevação por direito ao parlamento dos homens mais versados na administração que assim só aproveitaria o seu saber feito de experiencia; mas responde que o ministro não deve viver isolado dos funccionarios do seu ministerio, estes devem ser collaboradores que o cerquem das suas luzes, representando-lhe os vicios e as necessidades dos serviços, e que é portanto pela iniciativa parlamentar dos ministros que o paiz deve receber o concurso do executivo na elaboração das leis.
O orador, continuando, disse achar-se em presença de dois systemas: a organisação da camara dos pares por nomeação regia e por eleição popular, e das combinações que com elles se podem fazer.
Julgava não ter que discutir os direitos da realeza e os do povo. O que é certo é que, a medida que o povo se illustra, tende a chamar a si uma parte maior da auctoridade, e isto pelo direito da rasão, da consciencia humana. Por isso declarára na discussão da generalidade que um dos caracteres progressivos da proposta era que por ella virão de futuro o povo e o Rei a ter quinhões proximamente iguaes na representação nacional, emquanto que pela carta o povo tem uma parte e o Rei duas. Tal progresso não lhe parece discutivel. A questão é outra, é de quem escolhe melhor os pares, o Rei eleitor ou o povo eleitor. Não é difficil decidil-o. o Rei não póde escolher. Tem que tiral-os d'entre os homens publicos, estes acham-se agrupados em partidos, cada partido tem os seus chefes naturaes no ministerio, e, como o ministerio vive da confiança do Rei e da maioria, não póde o Rei fazer uma nomeação de pares com que, por pouco que seja, afrouxasse essa confiança. Logo, o Rei tem de nomear sempre os pares que ao ministerio convém, quer dizer, não é o Rei quem os nomeia, mas os ministros. Isto é confirmado pela pratica, de todos conhecida.
Só n'um caso o Rei poderia exercer o direito de nomeação de pares, mas então não usava, abusava d'elle. Seria quando quizesse fazer governo pessoal, quando quizesse oppor-se á vontade das côrtes, porque, n'esse caso, escolheria um ministerio seu e nomearia pares igualmente seus.
Portanto, por duas rasões, deve acabar, senão de uma vez, ao menos gradualmente, o pariato de nomeação regia; porque o Rei só póde abusar do seu direito de nomeação, e em geral são os ministros que o exercem, invertendo a ordem constitucional, que e que os ministros sejam indicados pelo voto do parlamento e não que escolham elles quaesquer membros da representação nacional. E aqui se manifesta a importancia d'este projecto. Até agora o prestigio da camara dos pares soffria por causa da sua origem ministerial, agora vae levantar-se, concorrendo aquella camara com a dos deputados para a formação dos ministerios.
Alem de que o Rei não se achará com um direito constitucional de que lhe seria possivel abusar em lucta contra as côrtes. Todas estas vantagens provirão da introducção do elemento electivo na camara alta. E ha quem invective o suffragio popular! Affirma-se que o povo não sabe escolher os seus mandatarios. Assim succede varias vezes. Mas a culpa não é sua. É raro que o povo, depois de ter visto como um homem administra a sua casa, o eleja para gerir os negocios municipaes, depois para a junta geral, e só depois de todas estas experiencias para o parlamento. Este seria um optimo processo, mas quasi nunca é praticavel hoje. O processo pelo qual o povo elege, e em geral synthetico. Os partidos constituem com os seus homens eminentes jurys que conferem o titulo de capacidade parlamentar a certos individuos, e é d'entre estes candidatos propostos pelos partidos que o povo escolhe os seus deputados. Se escolhe mal, a culpa e fundamentalmente dos partidos que não lhe propõem os homens mais dignos, que, em vez de chamarem a politica, isto é, a mais alta situação do paiz, todos os grandes meritos, parece muita vez

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que se receiam d'elles. Esse e que e o mal, e d'elle padecemos.
O orador julgava ter demonstrado que a camara alta se devia original no suffragio. Assim desejava que se fizesse a reforma. Mas contra os seus desejos encontrava os actuaes pares do reino, cuja collaboração se tornava necessaria para a reforma. Era necessario conserval-os nas suas funcções legislativas, do que resultava a composição mixta para a camara dos pares, com o elemento temporario e com o elemento electivo, e este era o principio que os actuaes pares do reino acceitavam. Transigia, portanto, para realisar um progresso possivel, afigurando-se-lhe todavia que a proporção dos pares electivos devia ao menos ser igual á dos pares de nomeação regia, já diria porque.
Como tivera occasião de expor durante a generalidade, o systema da proposta do governo é viavel. Não ha muito que receiar que os conflictos entre as duas camaras fiquem sem solução, porque até hoje se têem resolvido em favor da camara dos deputados com a promoção de cerca de 20 pares, quando muito; e de futuro, a cada conflicto, entrarão na camara dos pares, logo que ella tenha sido dissolvida, 50 pares. Estas probabilidades irão até á certeza, se o numero de pares electivos for igual ao dos pares de nomeação, porque as questões sociaes não são questões arithmeticas, não basta dizer que os pares de nomeação regia são em numero igual, e podem por isso inutilisar o voto dos pares electivos; nas sciencias sociaes não se encontra ainda a maior parte das vezes um principio superior que dê a rasão dc certas affirmações, essa rasão é ainda uma rasão inductiva, experimental. Hoje é que, como já mostrára, os conflictos entre as duas camaras podem ficar sem solução, porque esta solução depende de que o Rei que nomeia os pares se concilie com a vontade do povo que elege os deputados. De future não.
O povo é quem, directa ou indirectamente, elegerá os deputados e os pares temporarios. Uns e outros hão de inspirar-se nos mesmos sentimentos populares. O que é necessario é que se assente desde já que tal sem a origem commum dos mandatarios electivos. O orador não admitte o pariato para a representação de classes; quer que nas assembléas primarias das eleições para pares votem os mesmos eleitores dos deputados, e opportunamente dirá o processo eleitoral que prefere. Não vê, pois, motivo para se receiar a insolvencia dos conflictos parlamentares. O que julga util é prevenil-os, e n'esse sentido propoz já, quando se discutia o artigo 2.°, a renovação da parte electiva da camara dos pares no fim de cada triennio dos deputados, e entende que ella deverá ser dissolvida sempre que o for a camara dos deputados. Esta disposição virá no seu logar, ao tratar-se do artigo 7.° Dirá, porém, desde já, que a dissolução é um appello ao paiz, que, se as duas camaras estão de accordo, deve-se appellar de ambas, se não, é inadmissivel a dissolução exclusiva da camara dos deputados, porque, ao consultar a opinião publica, não é de prever que ella seja favoravel á camara que a não reflecte directamente, e portanto na maioria dos casos terá de se proceder depois á dissolução tambem da camara dos pares. Era pois melhor dissolvel-as logo juntamente. Já reciprocamente se não póde affirmar outro tanto, e por isso acha bem que a dissolução possa recaír exclusivamente sobre os pares electivos.
Exprimiria a sua opinião a respeito do numero total de pares do reino. É grande, demasiado, o do projecto, mas não é possivel diminuil-o, por causa do numero de pares actuaes, senão a parte electiva da camara alta seria, pelo menos nos primeiros tempos tão pequena, que então e que a dominaria talvez uma oligarchia de pares vitalicios. Acceita, pois, proximamente o numero do projecto, não exactamente 150, porque 148 é divisivel por 4, o que simplifica a renovação dos pares electivos, tornando-a de metade exacta. Para o orador deverá haver portanto 74 pares electivos, isto é, cerca de 1 por quatro concelhos do continente e ilhas adjacentes.
O orador terminou por examinar as propostas do sr. dr. Calixto e do sr. Coelho de Carvalho. A primeira tende a constituir o pariato todo de nomeação regia, mas temporario. Ora, este principio é peior que o da carta. Em vez de termos uma camara de pares, formada pela sobreposição de camadas partidarias, que em summa sempre da representação a todos os partidos, teriamos uma camara, não só feita pelo poder executivo, mas feita por cada ministerio a sua imagem, e essa camara não poderia dizer se representante senão de um partido, e não da nação. Mostrou em seguida como este principio, alem de inacceitavel, não poderia applicar-se ao modo da proposta. Referindo-se em seguida á idéa emittida pelo sr. Coelho de Carvalho de serem os pares vitalicios escolhidos de entre os temporarios, declarou-se contra ella, porque, se é admissivel a origem mixta de cada par, como no Brazil, ou inversamente, como queria Garrett, o que não é admissivel é a divisão da camara alta em duas classes, taes que de uma se passe para a outra como por promoção. É indispensavel que os pares sejam legislativamente todos iguaes entre si. E, a proposito, advertiu que convinha inscrever na constituição o preceito das categorias tanto para os pares electivos como para os pares de nomeação.
(O discurso será publicado na integra quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho a seguinte emenda:
Artigo 6.° A camara dos pares compor-se-ha de cento quarenta e oito membros, metade vitalicios, de nomeação regia, e metade temporarios, de eleição popular. Só poderão ser pares os individuos que estiverem comprehendidos em determinadas categorias, identicas para os pares de eleição e para os de nomeação.
A eleição de par do reino será indirecta, votando nas assembléas primarias a massa dos eleitores de deputados. Tudo o mais se regulará por uma lei ordinaria.
§ transitorio. Os actuaes pares do reino continuarão a ter assento na sua camara; e emquanto o seu numero se não reduzir a setenta e quatro, o Rei fará a nomeação de um par por cada terno de vacaturas que elles forem deixando.
Fica por este modo substituido o artigo 39.° da carta constitucional. = Bernardino Machado.
Foi admittida.

0 sr. Elias Garcia (sobre a ordem): - Usando da palavra sobre a ordem, tenho de ler a minha moção. É a seguinte:
«Substituição ao artigo 6.º:
« Artigo 6.° A camara dos dignos pares é substituida por uma assembléa toda electiva.
«§ 1.° Os senadores renovam se por metade de tres em tres annos. Na primeira renovação decide a sorte os membros que devem saír e nas subsequentes a antiguidade da eleição de cada um.
«§ 2.º Uma lei regulamentar determina o numero de senadores, condições de elegibilidade, renovação e todo o processo eleitoral.
«§ 3.° Fica d'este modo substituido o artigo 39.° da carta.»
Como v. exa. vê esta proposta contem uma substituição ao artigo 6.° do projecto e apresentarei depois um artigo transitorio em referencia a todo o projecto, o que, na minha opinião, em nada altera a sua economia.
Vou tratar de justificar a minha proposta.
N'ella consigno os principios constitucionaes de ser electiva a segunda casa do parlamento, e de ser a duração dos poderes dos membros electivos dupla da dos deputados porque estabeleço a renovação por metade de tres em tres annos. São estes os principios que eu considero con-

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stitucionaes, isto é, são os principios que entendo que devem ser inseridos na constituição do estado. Tudo mais proponho que passe para uma, lei regulamentar.
Lendo-se o projecto vê-se que o § 1.° do artigo 6.° diz o seguinte:
«§ 1.º Os pares do reino, que hoje compõem a respectiva camara, continuarão a fazer parte d'ella na qualidade de pares vitalicios.»
Esta disposição que se quer inserir na constituição é evidentemente transitoria.
Por conseguinte, digo eu, esta disposição não deve figurar na constituição.
Depois diz:
«§ 2.° Fazem tambem parte da camara dos pares, como pares vitalicios, o patriarcha de Lisboa, e os arcebispos e bispos do continente do reino.»
Esta parte podia aqui figurar, porque só refere á composição da camara; mas como eu entendo que ella não deve ser assim composta não insiro esta disposição no artigo. Depois diz:
«§ 3.° A parte electiva da camara dos pares terá seis annos de duração, mas poderá ser dissolvida, simultanea, ou separadamente, com a camara dos deputados.»
N'este § estão inseridas doutrinas de duas especies: uma diz respeito á duração da camara dos pares; e essa está consignada na minha proposta.
A outra refere-se a dissolução das camaras, junto ou separadamente, mas eu entendo que esta attribuição menor cabe nas attribuições do poder moderador, devendo por isso inserir-se ali; pelo modo porque esta redigida, ou pelo modo porque a camara entenda que o deva ser.
No § 4.° diz-se o seguinte:
«§ 4.° Emquanto o numero de membros da actual camara dos pares não estiver reduzido a cem, não contando os pares por direito proprio, o Rei poderá nomear um por cada tres vacaturas que occorrerem, devendo depois estar sempre preenchido aquelle numero.»
esta disposição é tambem evidentemente transitoria, e portanto não deve figurar aqui.
Nos §§ 5.° e 6.º estabeleceu-se o seguinte:
«§ 5.° Só poderão ser eleitos pares os individuos que estejam comprehendidos em determinadas categorias, que não poderão ser differentes d'aquellas de entre as quaes saírem os pares de nomeação regia.
«§ 6.° Será indirecta a eleição dos membros temporarios da camara dos pares. Uma lei especial regulará tudo quanto diz respeito á sobredita eleição.»
Estas duas disposições do § 5.° e do § 6.° não devem ser inseridas na constituição, porque são materia de lei organica.
Estabelece-se aqui que a eleição seja indirecta. V. exas. hão de lembrar se de que na carta constitucional estava estabelecido este mesmo principio da eleição indirecta, para a camara dos deputados e, foi por causa d'este principio e por se julgar constitucional, que deixou de operar-se um progresso em 1851. o de transformar a eleição indirecta era eleição directa.
O que fez o acto addiccional? Supprimiu esta disposição e transplantou para a lei ordinaria tudo quanto dizia respeito á eleição da camara dos deputados; o methodo da eleição, as condições de elegibilidade, de incompatibilidade, emfim tudo diz respeito á maneira de constituir a camara.
Se nós entendemos, ou por outra, se os legisladores de 1852 entenderam que a carta não devia conter materia que dissesse respeito ao modo de ser da camara dos deputados, e que tudo devia passar para uma lei organica, do mesmo modo deve passar para uma lei ordinaria tudo quanto diz respeito ao modo de compôr a camara dos pares. Assim conseguimos introduzir na nossa legislação dois progressos: o primeiro progresso é fazer com que seja mais uniforme a nossa legislação constitucional; segundo progresso, e esse é maior, evitar a necessidade de côrtes constituintes para reformar certos artigos da carta.
Foi por este motivo que entendi que se devia consignar na constituição o que é constitucional, e proponho que passe para leis ordinarias tudo quanto é mais mudavel, havendo assim a vantagem de poder ser com mais facilidade transformado.
Portanto, d'este modo organisâmos a nossa constituição segundo o systema mais aperfeiçoado, segundo a doutrina mais acceita, e na conformidade das indicações de todos os publicistas modernos que entendem que deve restringir-se tudo o que constitua materia constitucional, porque todos são de opinião de que devem tornar-se faceis as reformas.
O que poderia contestar-se com respeito a esta minha proposta seria a doutrina d'ella; isto é, se a segunda camara devia ou não ser electiva, e qual deveria ser a sua duração. Isto é que segundo a minha proposta constitue materia constitucional.
O que ouvimos nós aqui? Ouvimos fallar e discorrer com respeito á maneira de constituir a camara alta.
A camara alta é actualmente constituida de membros hereditarios. O principio da hereditariedade não tem n'esta casa nenhum defensor. Houve quem accentuasse, assignalasse ou mostrasse a influencia que este principio tinha nas gerações successivas, mas ninguem aqui defendeu o principio da hereditariedade. Por consequencia, se ninguem defendeu o principio da hereditariedade a consequencia immediata é que este principio está morto, acabou, e escusâmos, portanto, de dizer causa alguma sobre elle. Parce sepultis.
Passemos aos membros de nomeação regia e aos electivos.
O meu illustre collega e estimadissimo amigo, o sr. Bernardino Machado, acabou agora de fazer a defeza do principio electivo de uma maneira muitissimo mais brilhante e completa do que eu poderia fazelas.
S. exa. disse, e muito bem; que a doutrina corrente e que o poder executivo saía da vontade popular; porque a vontade popular elege a camara dos deputados, e a camara dos deputados deve intervir notavelmente na organisação do poder executivo.
S. exa. disse: eu sou contrario ao principio da representação por direito proprio, tanto para certos e determinados individuos, como para certas e determinadas corporações, porque isso representaria no fundo exactamente a inversão do regimen, isto é, que em vez de ser o poder executivo que sáia do poder legislativo, é o poder legislativo que sáe do poder executivo.
Ora, digo eu, se o principio da nomeação regia é hoje inacceitavel, não o consignemos na constituição, e s. exa. de certo accede á minha proposta, porque não teve duvida em dizer que acceitava, como doutrina boa, o ser a camara dos pares composta toda de membros electivos, e só transigia com as circumstancias por reconhecer a situação em que se achava a outra camara, não perdendo tambem de vista a necessidade que tinhamos de cooperar com ella para reformar a constituição.
S. exa. disse, e muito bom, que só por causa do estado actual, é que se curvava perante a necessidade de attender aos embaraços, que a outra camara podia oppor a esta reformação; mas isto não quer dizer por fórma alguma, que s. exa. não reconheça, como todos nós devemos reconhecer, que o principio de nomeação regia, não é outra cousa, senão nomeação pelos ministros; e exactamente á inversão do regimen, porque é a constituição de uma das casas do parlamento, feita pelo poder executivo.
Portanto, repito, não insiramos na nossa constituição, um principio, que nós já hoje reconhecemos que absolutamente condemnavel, e que nos, scientifica, politica, moral e decorosamente, não podemos acceitar, e estabeleçamos na nossa constituição, os principios que temos por verdadeiros, embora tenhamos de fazer transacção; mas de modo que

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se accentuem bem na constituição as necessidades e as forças que nos levaram a estabelecer essa transação.
Nós temos o exemplo de uma transacção analoga em 1838.
Como v. exa. sabem, a constituição de 1838 estabelece o principio de que o senado é electivo, e v. exas. sabem que a revolução de 1838, quando se fez esta constituição, estava triumphante, duas vezes triumphante, e foi exactamente n'esta occasião que os homens desordeiros de 1838, victiriosos, depois de terem alcançado a victoria, vieram inserir na constituição uma disposição que representava uma transacção, transacção dignissima da parte d'aquelles homens publicos que, exactamente quando eram vencedores, quando acabavam de vencer os seus adversarios, quizesse mostrar ao paiz, a Europa e a todo o mundo que quem tinha rasão era o parlamento que estava reunido.
A constituição de 1838 estabeleceu um artigo transitorio que diz o seguinte:
«As côrtes ordinarias que primeiro se reunirem, depois do dissolvido o actual congresso constituinte, poderão decidir se a camara dos senadores ha de continuar a ser de simples eleição popular, ou se de futuro os senadores hão de ser escolhidos pelo rei sobre lista triplice proposta pelos circulos eleitoracs.»
Ora, é bem sabido como este artigo foi aqui inserido; a historia sabe-o, a historia publicada e a historia inedita. Este artigo está aqui, devido á maneira verdadeiramente bizarra com que o marquez de Sá da Bandeira entendeu que, depois do vencidos os marechaes no campo da batalha, devia pedir aos constituintes que estabelecessem na constituição de 1838 uma disposição que permittisse ainda appellar de novo para o paiz, a fim de ver se aquella doutrina era ou não acceita.
Portanto, os homens de 1838 deram prova de que já eram versados na sciencia politica, em que tanto hoje se falla; souberam accommodar a constituição as circumstancias do paiz e não se limitaram simplesmente a accentuar na constituição a victoria d'estes ou d'aquelles principios, porque esses principios eram bons no campo theorico; entenderam tambem que deviam considerar o estado do paiz, fazendo uma constituição que se achasse em condições de ser viavel, assim como esta o foi, e só deixou de o ser porque caíu diante de uma verdadeira conspiração feita por parte dos conselheiros da corôa. E para não ficar duvida de como se tinha urdido, foi pôr-se á frente d'ella um dos proprios conselheiros da corôa.
Nós estamos hoje em melhores condições do que os homens d'esse tempo. Temos obrigação de redigir a nossa constituição de accordo com os principios mais consentaneos com o progresso do direito publico constitucional, e de em presença do que se tem observado com respeito a todas as reformas dispormos as cousas de modo que a reforma da constituição se opere facilmente.
Todos sabemos o tempo que tem decorrido até chegar-mos a este estado em que se vae arrastando a reforma, estando nós, como já disse em outra sessão, tão pouco á vontade, que alguns membros d'esta casa são forçados a guardar um silencio que necessariamente ha de incommodar.
Devemos portanto dispôr todo o empenho, empregar todos os esforços para que a reforma não fique redigida em condições de se tornar difficil qualquer transformação; e por isso sou de opinião que devemos introduzir na constituição o principio com o qual não podemos deixar de estar de accordo.
O principio hereditario está morto; o principio vitalicio não tem rasão que o justifique, assim o demonstrou o sr. Bernardino Machado. Não o consignemos aqui.
Concordo em que o senado deve durar o dobro do tempo que dura a camara dos deputados.
Entendo que a maneira conveniente de proceder á eleição do senado não é elegendo-o todo, mas renovando-o por metade. Inclino-me muito para a renovação dos corpos por partes; acho bom o principio e por isso o acceito.
Não consigno aqui o principio da dissolução, porque sou contra elle. Entendo que tudo se renova a seu tempo, e deixo a esse mesmo tempo revolver todas as difficuldades, porque ninguem as resolve melhor.
Com o machinismo que existe actualmente é difficil conseguir que se não consigne o principio da dissolução relativamente á camara dos deputados; mas com relação á camara dos senadores, faça-se a renovação de dois em dois annos. Não estabelece para ella o principio da dissolução. Não dou ao poder moderador a faculdade de a dissolver, assim como tambem não lhe daria a faculdade de dissolver a camara dos deputados, e pelo menos cerecio o uso d'essa faculdade, para evitar que em vez do ser usada, passe a constituir um verdadeiro abuso.
Muitas vezes se tem usado no nosso paiz da faculdade de dissolução, e não ha homem algum que aprecie serenamente o modo como as cousas se têem passado, que, mettendo a mão na consciencia, não diga que em vez de se ter feito um bom uso d'essa faculdade, se tem lançado mão d'ella como um recurso abusivo para perturbar o nosso regimen.
Todos os que serenamente attentarem no estado do nosso paiz devem ter ido buscar as ordens do mal a diversas partes, e talvez não seja esta a ultima que se lhes apresente.
Não digo que encontrem unica e simplesmente esta causa, mas muitos publicistas lhes hão de dizer, porque já o escreveram, que está aqui a causa principal da perturbação dos diversos partidos.
Por consequencia eu, em vez de deixar ao poder moderador a prerogativa liberrima, para a dissolução, deixo-lhe a prerogativa acautelada, porque entendo que não ha entidade alguma das que constituem o organismo politico de um a nação, que não deva estar circumscripta a exercer as suas funcções unica e simplesmente dentro de certa e determinada orbita, dispondo-se as cousas por fórma que no exercicio d'essas funcções não possa ultrapassar os limites d'essa orbita.
Creio que devemos dispor as diversas engrenagens de um organismo administrativo ou politico de fórma que essas engrenagens encontrem fraccos attritos, e para os diminuir, o que devemos fazer e aperfeiçoar esse organismo.
Quando se aperfeiçoa um organismo o que se faz, ou o que se deve fazer, é dar a cada uma das entidades que o constituem a faculdade de simples e unicamente exercer as funcções para que é destinado, impddindo que possa ultrapassar o limite que lhe é traçado.
Assim é que se constitue, assim é que se faz bem, assim é que se dá maior perfeição a um mechanismo, assim é que se consegue que um organismo produza os resultados mais uteis e mais vantajosos que é susceptivel de produzir.
Nós, quando vemos um mechanismo dos mais aperfeiçoados, o que vamos encontrar n'elle é as suas peças dispostas de maneira que não podem desempenhar senão o papel que lhes está determinado.
Portanto eu digo que n'um organismo politico e administrativo devemos colocar todas as peças de tal maneira que ellas só desempenhem o seu papel.
A liberdade d'ellas está em só desempenharem esse papel. Se eu dispozer as cousas de modo que ellas deixem de desempenhar só o seu papel, não posso dizer que lhes dou a liberdade; o que devo dizer é que não comprehendo o papel que lhes destine.
Assim o diz a sciencia em todos os ramos dos conhecimentos humanos. E, embora a politica esteja mais atrazada do que outros ramos dos conhecimentos humanos, devemos trazer para ella o que é o producto accumulado de largos annos de estudo e constitue um verdadeiro progresso scientifico.
Emquanto isto não for assim a politica não será uma

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sciencia, será uma arte; e os que usarem d'ella nem sequer terão o merito de artistas, representarão um papel o qual não quero classificar agora.
Teria porventura de referir-me n'este caso a alguns cavalheiros que representam na actualidade esse papel, e talvez não fosse demasiado lisonjeiro para elles o desenho que eu fizesse.
Já vê, portanto, v. exa., sr. presidente, que eu ajusto as disposições que proponho para se inserirem na constituição com os principios que são universalmente adoptados.
Eu insiro na constituição só o que é constitucional, e passo para a legislação ordinaria o que effectivamente deve passar para ali, já para ajustar o que diz respeito á camara dos pares com o que está estabelecido na nossa legislação em relação á camara dos deputados, já tambem para tornar mais facil a transformação que de outro modo se difficultaria.
Resta tratar de como podemos proceder ao estado actual das cousas.
Esta é a sciencia theorica, agora vamos á sua applicação.
Nós temos ouvido muitas vezes fallar na revolução e na evolução, condemnando uns a evolução em termos menos proprios e explicando outros a revolução de uma maneira menos completa.
Effectivamente n'esta casa póde fazer-se uma legislação com toda a serenidade, e, comtudo, ser uma legislação revolucionaria por absolutamente contradictoria com o estado dos tempos, dos homens, da sociedade e até de uma nação em relação a todas as outras.
E póde haver accesa guerra e encarniçada lucta, e a final inserir-se na constituição um principio que parecendo a primeira vista extraordinariamente revolucionario, nem sequer chega a ser evolutivo, porque a sociedade já estava nas condições de poder inserir-se na constituição um principio mais adiantado do que aquelle; que ali se consignou.
A fórma externa não quer dizer nada; a placidez que a muitos enleva não deve inspirar grande confiança, o indispensavel é que haja criterio na applicação de um principio ás condições da sociedade.
Quando as paixões refervem e se desatam nas manifestações mais violentas, e n'essa occasião que o verdadeiro homem de estado se mostra superior, se porventura o é.
Se nós estamos em uma situação que e commoda, porque e tranquilla, se estamos a fazer uma reforma na constituição, que vae marcar um passo na nossa vida constitucional, estabeleçamos o principio de que a hereditariedade deve ser abolida.
Aqui está como chegámos todos, de escolas tão divergentes, a concordar n'um principio.
Diz-se, e diz-se bem, e não sou eu que o digo, disse-o o sr. Bernardino Machado, que o principio electivo era o unico acceitavel, e de accordo com o regimen parlamentar, que era o unico que não contrariava o movimento regular d'esse regimen.
Se isto é assim, se isto é verdade, porque não havemos de o incluir na constituição que fazemos?
Se não houvesse um unico par na outra camara, se por acaso, por um d'estes accidentes do mundo, o que eu não desejo, ámanhã desapparecessem de sobre o solo portuguez todos os pares que ha na outra casa do parlamento, eu estou convencido de que todos os deputados que aqui estão diziam: «não ha difficuldade nenhuma em estabelecer na constituição que a camara dos pares seja electiva.»
A difficuldade e porque elles estão vivos, estão juntos de nós, e porque alem d'isso nós temos de cooperar com elles.
Pois eu, que sou um espirito educado na escola evolucionista, que entendo indispensavel applicar as doutrinas que nós temos, ao estado da sociedade e as circumstancias em que essa sociedade se encontra, direi aos meus adversarios: «se quereis fazer essa reforma, de maneira que tenhaes maior lustre e gloria era fazel-a, consignal-o bom principio, e n'um artigo transitorio, podeis estabelecer a transformação do estado actual, porque d'essa maneira ficará estabelecido na constituição um principio que era indispensavel estabelecer, que traduz o progresso das idéas politicas, e em disposição transitoria, se consigna o que e incontestavelmente de natureza transitoria e acautella a situação dos individuos da outra casa do parlamento.
E assim como ou entendo que deve passar para lei ordinaria o que respeita á constituição da camara, n'essa lei ordinaria se tratará de considerar a situação dos actuaes pares.
Offerecerei, como uma prova que desejo dar aos meus adversarios, quanto o meu espirito se inclina perante as difficuldades de occasião, de momento, este artigo transitorio. Assim como em 1838 a revolução triumphante offereceu ao principio conservador aquelle artigo transitorio, que constituiu incontestavelmente para os homens de 1838 uma gloria, n'este caso, é até um republicano, do partido mais avançado, do partido radical que se offerece á grande maioria d'esta camara um artigo transitorio para ella alcançar tanta gloria e lustre como alcançaram os homens de 1838. Este artigo e uma transacção que offereço, e não quero a gloria para mim, a gloria será principalmente para a maioria d'esta casa, será para os partidos monarchicos que n'esta occasião dariam um passo agigantado, já com respeito á reforma, já com respeito ao processo usado.
O artigo transitorio que offereço, ligando-o á minha proposta, é o seguinte:
«A lei regulamentar a que se refere o § 2.° do artigo 6.° designará o modo por que ha de fazer-se a substituição dos actuaes pares do reino pelos senadores electivos.»
D'esta maneira. v. exas. vêem que eu apresento na minha proposta o que me parece a doutrina verdadeira, offerecendo ao mesmo tempo aos meus collegas da maioria um expediente que os honraria muito, e por meio do qual viria a resolver-se a questão do modo que mais lhes interessasse.
No fundo a questão, é, digamol-o assim, apenas de methodo, e parece-me que o processo que lhes offereço e o mais digno para os verdadeiros homens d'estado.
Não lhes faço, pois, uma offerta insignificante, não digo por mim, mas pelo que ella vale.
D'este modo conciliava-se tudo, estabelecia-se um bom principio.
Na reforma actual está abolida a hereditariedade. Passe-mos para uma lei organica tudo o que disser respeito á constituição da camara alta, e n'essa lei organica attenda-se á situação especial dos actuaes pares do reino, que é verdadeiramente transitoria.
Qual será o modo de se attender a essa situação?
Não entro n'este ponto, porque deixo o assumpto para essa lei organica, e agora apresento apenas esta solução aos meus collegas, solução evolucionista, que ninguem póde taxar de revolucionaria; e se acaso encontro na historia exemplo de ter sido feita por alguns revolucionarios, foi quando elles deram provas da longanimidade do seu espirito, da supprioridade do seu caracter, e ao mesmo tempo da confiança que tinham em que procedendo d'este modo faziam um serviço ao paiz, sem deixarem de manter intactas as idéas da revolução de 1836 e rendendo-lhe homenagem por consignarem os seus principios na constituição; quando depois do regressarem do campo de batalha de Ruivães, em vez de se tornarem notaveis pelas perseguições contra os homens que tinham vencido, ao contrario, procederam para com elles com toda a galhardia, prestando-lhes as honras militares, conservando-lhes as patentes e não obrigando ninguem a depôr a espada.
E depois de terem convencido da sua superioridade os

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adversarios no campo de batalha, vieram mostrar-se verdadeiros homens de estado, dando prova d'isso, apesar de vencedores, na maneira como souberam proceder, sem que a victoria os desvairasse.
Não quero alongar-me mais na defeza da minha proposta.
Creio tel-o feito muito singelamente, do accordo com os principios que me parecem os mais sãos, e affirmo a v. exa. e á camara que o meu espirito se regula pela necessidade do reconhecer o progresso das sciencias, e pela necessidade de adaptal-o ás condições da sociedade.
Mas não desejo, que na applicação d'este criterio, vamos inserir na constituição disposições que embaracem o movimento do regimen representativo.
Perfilho a doutrina evolucionista, mas desejo que se disponha o ambiente para que facilmente se desenvolva; não desejo que se diga, que se estabelece uma doutrina, quando se estabelece uma peia, que perturba a engrenagem constitucional, se gera um attrito, que faz com que esse organismo em vez de produzir mais, produza menos e em vez de produzir bem, produza mal.
Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

1.ª Substituição ao artigo 6.°
Artigo 6.° A camara dos dignos pares é substituida por uma assembléa toda electiva.
§ 1.º Os senadores renovam-se por metade de tres em tres annos. Na primeira renovação decide a sorte dos membros que devem sair e nas subsequentes a antiguidade da eleição de cada um.
§ 2.° Uma lei regulamentar determina o numero de senadores, condições de elegibilidade, renovação e todo o processo eleitoral.
§ 3.° Fica d'este modo substituido o artigo 39.° da carta.
Camara, 1 do maio do 1885. = J. Elias Garcia.
Foi admittida.

2.ª Artigo transitorio
A lei regulamentar a que se refere o § 2.° do artigo 6.° designará o modo por que ha de fazer-se a substituição dos actuaes pares do reino pelos senadores electivos.
Camara, 1 de maio de 1885.= J. Elias Garcia.
Foi admittida.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Arroyo.
O sr. Arroyo: - Poucos minutos faltam para dar a hora, e eu pedia por isso a v. exa. que, se não houvesse inconveniente, me reservasse a palavra para ámanhã.
O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Bocage):- Mando para a mesa a proposta de lei que approva o tratado de commercio com os reinos unidos da Suecia e Noruega.
Leu-se na mesa. É a seguinte:

Proposta de lei n.° 53-C

Senhores. - Sob o influxo da politica commercial iniciada na Europa pelo tratado entre a França e a Gran-Bretanha de 23 de Janeiro de 1860, celebraram posteriormente diversos estados com aquelles paizes, e entre si, actos de igual natureza, pelos quaes obtinham, por concessões reciprocas, vantagens para os seus respectivos productos. Em 1866 entrámos nós n'esse regimen commercial pelo tratado de commercio com a França, que foi seguido pela celebração de diversos tratados com outros paizes, obtendo e concedendo por elles o tratamento da nação mais favorecida, já gratuitamente, já subordinado a favores especiaes, segundo a particular natureza do commercio que se buscava desenvolver.
Modificado pelas circumstancias e necessidades differentes, esse regimen fecundo em resultados uteis subsiste ainda hoje, e nos acompanhamol-o ligados pela solidariedade economica dos paizes europeus.
É ainda continuando a serie d'estes actos internacionaes, que o governo de Sua Magestade celebrou ultimamente com o governo de Sua Magestade o Rei da Suecia e da Noruega o tratado de commercio que tenho a honra de submetter ao vosso esclarecido exame, e que não differe dos tratados de commercio anteriores nas suas estipulações essenciaes.
No presente tratado duas são as clausulas especiaes que se ajustaram para facilitar a sua conclusão. A primeira refere-se á applicação extensiva aos vinhos portuguezes contendo até 21 por cento de alcool dos direitos que pagam na Suecia e Noruega os vinhos que contém até 20 por cento de alcool, é a fixação de um direito unico sobre os vinhos contendo entre 21 e 25 por cento do alcool.
Por esta clausula são favorecidos os vinhos alcoolicos portuguezes a sua entrada nos Reinos Unidos, onde até hoje difficilmente podiam concorrer com vinhos estrangeiros menos alcoolicos.
A segunda clausula consta do protocolo annexo ao tratado, pela qual o governo portuguez se obriga a não elevar os actuaes direitos sobre o bacalhau. Por ella assegura o governo o sou proposito de não augmentar esse direito, já hoje elevado, sobre um genero que é de bastante consumo na alimentação das classes menos abastadas.
Julgando, pois, evidentes as vantagens do novo tratado, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É approvado, para ser ratificado pelo poder executivo, o tratado de commercio e navegação, concluido entre Portugal e a Suecia e a Noruega em 10 de abril de 1885.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, em 28 de abril de 1885. = José Vicente Barbosa da Bocage.

TRADUCÇÃO

Sua Magestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e Sua Magestade o Rei de Suecia e de Noruega, igualmente animados do desejo de melhorar e de alargar as relações de commercio e de navegação entre os seus respectivos estados resolverem concluir um tratado para este fim, e nomearam para seus plenipotenciarios; a saber:
Sua Magestade El-Rei de Portugal e dos Algarves:
O sr. José Vicente Barbosa du Bocage, par do reino, professor jubilado da escola polytechnica de Lisboa, grã-cruz da ordem de S. Thiago, do merito scientifico, litterario e artistico, ministro dos negocios estrangeiros, etc. etc. etc.; e Sua Magestade e Rei de Suecia e Noruega:
O sr. conde Othon Steenbock, sou camarista, commendador de 1.ª classe da ordem de Wasa, cavalleiro das ordens da Estrella Polar e de Santo Olef, commendador da ordem de Christo, seu ministro residente junto de Sua Magestade Fidelissima, etc. etc. etc.
Os quaes, depois de se terem communicado os seus plenos poderes, que acharam em boa e devida fórma, convieram nos artigos seguintes:

Artigo 1.°

Haverá liberdade reciproca de commercio e de navegação entre Portugal e os reinos unidos da Suecia e da Noruega.
Os governos respectivos obrigam-se a não conceder aos subditos de qualquer outra potencia, em materia de commercio e de navegação, privilegio, favor ou immunidade qualquer, sem ao mesmo tempo os applicar ao commercio e á navegação do outro paiz.
Os subditos de cada uma das altas partes contratantes terão tambem o direito de exercerem livremente a sua religião no territorio da outra parte, segundo as leis dos respectivos paizes.

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Artigo 2.°

Os subditos das altas partes contratantes poderão dispor á sua vontade por doação, venda, troca, testamento ou de qualquer outro modo, de todos os bens que elles possuirem nos respectivos territorios, e retirar integralmente os seus capitaes do paiz. Da mesma fórma os subditos de um dos estados respectivos, capazes de herdar bens situados no outro, poderão tomar posse dos bens que lhes viessem a caber mesmo ab intestato, observando as formalidades prescriptas pela lei, e os ditos herdeiros não serão obrigados apagar direitos de successão differentes ou mais elevados do que aquelles que forem impostos em casos similhantes aos proprios nacionaes.

Artigo 3.°

Os productos do solo e da industria do reino de Portugal e de suas colonias, de qualquer parte que elles procedam, serão admittidos nos Reinos Unidos no mesmo pé e sem estarem sujeitos a outros ou mais elevados direitos, qualquer que seja a sua denominação, do que os productos similares da nação estrangeira mais favorecida.
Faz-se reserva, em proveito de Portugal, do direito de conceder ao Brazil sómente vantagens particulares que não poderão ser reclamadas pelos Reinos Unidos como uma consequencia do sou direito ao tratamento da nação mais favorecida. Fica entendido que se Portugal concedesse a outros estados partilha dos favores que concedesse ao Brazil, os Reinos Unidos seriam admittidos a gosar dos mesmos favores.
Reciprocamente os productos do solo e da industria dos Reinos Unidos, de qualquer parte que procedam, serão admittidos em Portugal e nas suas colonias no mesmo pé, e sem estarem sujeitos a outros ou mais elevados direitos, de qualquer denominação, do que os productos similares da nação estrangeira mais favorecida.

Artigo 4.º

As mercadorias não originarias de Portugal importadas d'este paiz em Suecia ou em Noruega não poderão ser sobrecarregadas de taxas addicionaes superiores aquellas que incidirem sobre as mercadorias da mesma especie, importadas em Suecia ou em Noruega de qualquer outro paiz europeu, por outro modo que não sejam directamente por navio sueco ou norueguez.
Reciprocamente as mercadorias não originarias de Suecia ou de Noruega, importadas dos Reinos Unidos em Portugal, quer por terra, quer por mar, não poderão ser sobrecarregadas de taxas addicionaes superiores aquellas que incidirem sobre as mercadorias da mesma especie importadas em Portugal de qualquer outro paiz europeu por outro modo que não seja directamente por navio portuguez.
Cada uma das altas partes contratantes se reserva a faculdade de estabelecer sobre as mercadorias não originarias das outras taxas addicionaes iguaes ás que foram applicadas nos paizes respectivos as importações feitas por modo indirecto.

Artigo 5.°

As mercadorias do toda a especie originarias de um dos paizes contratantes e importadas no outro não poderão ser sujeitas a direitos de accise ou de consume superiores aos que pagam ou vierem a pagar as mercadorias similares de producção nacional.
Todavia, os direitos de importação poderão ser augmentados com as sommas que representarem as despezas occasionadas aos productos nacionaes pelo systema de accise.

Artigo 6.°

Os drawbacks estabelecidos na exploração dos productos portugueses não poderão ser senão a representação exacta dos direitos de accise ou de consumo interior incidindo nos ditos productos ou nas materias de que elles são fabricados.
Do mesmo modo os drawbacks estabelecidos na exportação dos productos suecos e norueguezes não poderão ser senão a reproducção exacta dos direitos de accise ou do consumo interior incidindo nos ditos productos ou nas materias de que elles são fabricados.
As altas partes contratantes poderão, alem dos direitos de alfandega, impor sobre as mercadorias estrangeiras uma taxa supplementar igual aos direitos de accise ou de consumo interior que pagam ou que vierem a pagar os artigos similares indigenas ou as materias com as quaes tiverem sido fabricados.
Fica convencionado entre os estados contratantes que, no caso de suppressão ou de diminuição dos direitos de accise ou de consumo de que se trata n'este artigo, as taxas supplementares impostas aos productos de origem ou de manufactura portugueza, sueca ou noruegueza serão supprimidas ou reduzidas em quantia igual áquella que fosse diminuida n'esses direitos de accise ou de consumo.
Todavia, em caso de suppressão, se se estabelecer uma inspecção, uma ficalisação ou um exercicio administrativo sobre os productos fabricados, os cargos directos ou indirectos que pesarem sobre os fabricantes nacionaes serão compensados por uma taxa addicional equivalente sobre os productos do outro paiz.

Artigo 7.°

Cada uma das altas partes contratantes se obriga a fazer aproveitar a outra immediatamente, e sem compensação, de todo o favor, de todo o privilegio ou reducção nas tabellas dos direitos de importação e de exportação, que uma d'ellas tenha concedido ou possa conceder a uma terceira potencia.
As altas partes contratantes se obrigam alem d'isso a não estabelecerem, uma para com a outra, nenhum direito ou prohibição de importação ou de exportação, que não seja ao mesmo tempo applicavel ás outras nações.
O tratamento da nação mais favorecida é igualmente reciprocamente garantido a cada uma das altas partes contratantes para tudo o que respeita o consumo, o entreposto, a reexportação, o transito, o trasbordo de mercadorias e o commercio em geral.
As estipulações d'este artigo não poderão ser invocadas no que respeita ás concessões especiaes concedidas ou que o forem para o futuro a estados limitrophes, em vista de facilitar o commercio de fronteiras.
Emquanto os vinhos que não contenham uma quantidade de alcool superior a 20 por cento forem onerados, á entrada em Suceia e em Noruega, de direitos unicos, independentemente do grau alcoolico, os vinhos de origem portugueza que não contenham uma quantidade de alcool superior a 21 por cento, não poderão a entrada em Suecia e em Noruega estar sujeitos a direitos mais elevados do que os vinhos que não excedem a 20 por cento de alcool.
A Suecia e a Noruega obrigam-se a conservar direitos unicos, independentemente do grau alcoolico sobre os vinhos de origem portugueza que excedam 21 por cento, mas que não excedam 25 por cento de alcool.

Artigo 8.°

Os portuguezes era Suecia e em Noruega, e reciprocamente os suecos e os norueguezes era Portugal, gosarão da mesma protecção que os nacionaes para tudo o que respeita a propriedade das marcas de fabrica ou de commercio, assim como dos desenhos ou modelos industriaes e de fabrica de toda a especie.
O direito exclusive de explorar um desenho ou modelo industrial ou de fabrica, não pódo ter em proveito dos portuguezes em Suecia e em Noruega, e reciprocamente era proveito dos subditos dos Reinos Unidos em Portugal, uma duração mais larga do que a fixada pela lei do paiz a respeito dos nacionaes.
Se o desenho ou modelo industrial ou de fabrica perten-

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ce ao dominio publico no paiz de origem, não póde ser objecto de um goso exclusive no outro paiz.
As disposições dos dois paragraphos que precedem são applicaveis ás marcas de fabrica ou de commercio.
Os direitos dos portuguezes em Suecia e em Noruega, e reciprocamente os direitos dos subditos dos Reinos Unidos em Portugal, não estão subordinados á obrigação de explorar n'esses paizes os modelos ou desenhos industriaes ou de fabrica.

Artigo 9.°

Os nacionaes do um dos paizes contratantes que quizerem assegurar-se no outro a propriedade de uma marca, de um modelo ou de um desenho, deverão cumprir as formalidades prescriptas para esse fim, pela legislação respectiva dos estados contratantes.
As marcas de fabrica, ás quaes se applicam o presente artigo e o artigo precedente, são as que nos paizes respectivos forem legitimamente adquiridas para os industriaes ou negociantes que usam d'ellas, isto é, que o caracter de uma marca de fabrica portugueza deve ser apreciado segundo a lei portugueza, do mesmo modo que o de uma marca de fabrica sueca ou noruegueza deve ser julgado segundo a lei de Suecia ou de Noruega.
Todavia o deposito poderá ser recusado se a marca para a qual é pedido for considerada pela auctoridade competente como contraria á moral ou á ordem publica.

Artigo 10.°

Os caixeiros-viajantes portuguezes, viajando nos Reinos Unidos por conta de uma casa portugueza, poderão ahi fazer compras para as necessidades da sua industria, e recolher encommendas com ou sem amostras, mas sem fazer a venda ambulante das mercadorias.
Serão tratados, emquanto a patente, como os viajantes da nação mais favorecida.
Haverá reciprocidade em Portugal para os caixeiros-viajantes dos Reinos Unidos.
Os objectos, sujeitos a um direito de entrada, que servem de amostras e que são importados por esses caixeiros-viajantes, gosarão de uma e de outra parte, mediante as formalidades de alfandega necessarias para lhes assegurar a reexportação ou reintegração em entreposto, de uma restituição dos direitos que deverão ser depositados a entrada.

Artigo 11.°

O tratamento reservado a bandeira nacional para tudo o que respeita os navios e suas cargas, será reciprocamente garantido em todos os pontos, e em qualquer circumstancia, aos navios das altas partes contratantes no reino de Portugal e suas colonias, como nos Reinos Unidos.
Faz-se excepção á disposição que precede para a cabotagem, cujo regimen fica sujeito ás leis respectivas dos paizes contratantes.
Fica alem d'isso convencionado que os navios das nações respectivas, navegando em cabotagem, serão tratados de uma parte e de outra no mesmo pé que os navios das nações mais favorecidas.

Artigo 12.°

Os navios portuguezes, carregados ou não, assim como os seus carregamentos em Suecia e em Noruega, e os navios suecos e norueguezes, carregados ou não, assim como os seus carregamentos em Portugal, á sua chegada de um porto qualquer, e qualquer que seja o logar de origem ou de destino do seu carregamento, gosarão a todos os respeitos, á entrada, durante a sua permanencia e á saída, do mesmo tratamento que os navios nacionaes e seus carregamentos.
No que respeita ao ancoradouro dos navios, seu carregamento ou descarga nos portos, enseadas, bahias ou abrigos, e geralmente para todas as formalidades ou disposições quaesquer, as quaes podem estar sujeitos os navios de commercio, suas tripulações e seus carregamentos, não se concederá aos navios nacionaes em um dos estados contratantes privilegio ou favor algum que não seja igualmente concedido aos navios da outra potencia, sendo a vontade das altas partes contratantes que, tambem a este respeito, os navios portuguezes e os navios suecos e norueguezes sejam tratados em pé de perfeita igualdade.
As altas partes contratantes se reservam a faculdade de cobrar em seus portos respectivos, sobre os navios da outra potencia, assim como sobre as mercadorias que compõem o carregamento d'esses navios, taxas especiaes destinadas á necessidade do serviço local.
Fica entendido que as taxas de que se trata deverão em todos os casos ser igualmente applicadas aos navios das altas partes contratantes ou a seus carregamentos.

Artigo 13.°

Os navios portuguezes, entrando n'um porto de um ou de outro dos Reinos Unidos, e reciprocamente os navios suecos e norueguezes entrando em um porto de Portugal, e que não quizerem ahi descarregar senão parte do seu carregamento, poderão, conformando se com as leis e regulamentos dos respectivos estados, conservar a bordo a parte do seu carregamento que for destinada a um outro porto, quer do mesmo paiz quer de um outro, e reexportal-a, sem serem obrigados a pagar por essa ultima parte do seu carregamento nenhum direito de alfandega, salvo o de fiscalisação, que do resto não poderá ser cobrado senão no valor fixado para a navegação nacional.

Artigo 14.°

Serão completamente livres dos direitos de tonelagem e de expedição nos portos respectivos:
1.° Os navios que, entrando em lastro, de qualquer logar que seja, saírem em lastro;
2.° Os navios que, passando do um porto de um dos estados respectivos a um ou muitos portos do mesmo estado, quer para ahi deixar toda ou parte da sua carga, quer para ahi compôr ou completar o seu carregamento, justificarem haver já pago esses direitos;
3.° Os navios que, entrando com carregamento em um porto, quer voluntariamente, quer em arribada forcada, saírem sem ter feito nenhuma operação de commercio.
Não serão considerados, em caso de arribada forçada, como operação de commercio o desembarque e reembarque das mercadorias para a reparação dos navios, o trasbordo para um outro navio em caso de innavegabilidade do primeiro, as despezas necessarias ao abastecimento das tripulações, e a venda das mercadorias avariadas, quando a administração das alfandegas tiver dado a auctorisação.

Artigo 15.°

A nacionalidade dos navios será reconhecida e admittida de uma e outra parte, segundo as leis e regulamentos particulares a cada estado, por meio das patentes e papeis de bordo entregues pelas auctoridades competentes aos capitaes e mestres.

Artigo 16.°

Em caso de naufragio em um sitio pertencente a uma ou a outra das altas partes contratantes, todas as operações relativas ao salvamento dos navios naufragados, encalhados ou abandonados serão dirigidas pelos consules nos estados respectivos. Estes navios, suas partes ou seus restos, seus apparelhos e todos os objectos que lhes pertencerem, assim como todos os objectos e mercadorias que forem salvos, ou seu producto, se elles forem vendidos, como tambem todos os papeis que foram adiados a bordo, serão consignados aos proprietarios ou a seus agentes, ou ao consul ou vice-consul respectivo no districto onde o naufragio tiver ocorrido. As auctoridades locaes respectivas intervirão para conservar a ordem, garantir os interesses das

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pessoas empregadas no salvamento, se ellas forem estranhas as tripulações dos navios mencionados, e assegurar a execução das disposições que deverão ser tomadas para a entrada e para a saída das mercadorias salvas.
Ellas deverão do mesmo modo, na ausencia ou até a chegada dos agentes consulares, tomar todas as medidas para a protecção dos individuos e conservação dos objectos salvos.
A intervenção das auctoridades locaes nos differentes casos acima mencionados, não occasionará a cobrança de custas de outra especie, alem d'aquellas que necessitavam as operações de salvamento, e a conservação dos objectos salvos, assim como as custas a que estiverem sujeitos em caso similhante os navios nacionaes.
As mercadorias salvas não estarão sujeitas a qualquer direito ou despeza de alfandega ate ao momento da sua admissão para o consumo interior.
No caso de uma reclamação legal qualquer com respeito ao naufragio, as mercadorias e aos objectos naufragados, o tribunal competente do paiz onde o naufragio occorrer, será chamado a decidir sobre elle.

Artigo 17.°

Os consules geraes, consules, vice-consules e agonies commerciaes de cada uma das altas partes contratantes, gosarão, nos estados e possessões da outra, dos mesmos privilegios e poderes de que gosarem os das nações mais favorecidas, comtanto que os mesmos privilegios e poderes sejam reciprocos.
No caso em que os ditos consules ou agentes quizessem fazer o commercio ou exercer uma industria, estarão sujeitos ás mesmas leis e usos ás quaes estiverem sujeitos os particulares da sua nação no sitio onde elles residem.

Artigo 18.°

Os consules geraes, consules, vice-consules e agentes commerciaes de cada uma das altas partes contratantes, receberão das auctoridades locaes todo o auxilio e protecção para a pesquiza, a prisão e a entrega dos marinheiros e outros individuos que façam parte da tripulação dos navios de guerra e de commercio do seu paiz respectivo, e que houverem desertado em um porto situado no territorio de uma das altas partes contratantes.
Para este fim elles se dirigirão por escripto aos tribunaes, juizes ou funccionarios competentes e justificarão pela exhibição dos registos do navio, rol de equipagem ou outros documentos officiaes, ou então se o navio tivesse partido pela copia dos ditos documentos, devidamente autenticada por elles, que os homens que elles reclamam fizeram realmente parte da dita equipagem.
Em vista d'este podido, assim justificado, a entrega não poderá ser recusada.
Os ditos desertores, quando tiverem sido presos, ficarão á disposição dos consules, vice-consules, e agentes consulares, e poderão mesmo ser detidos e guardados nas prisões do paiz, a requisição e a custa dos agentes acima citados, ate ao momento em que elles forem reintegradas a bordo do navio ao qual pertencem, ou até que se apresente uma occasião de os reenviar para o paiz dos ditos agentes em um navio da mesma ou de qualquer outra nação.
Se, comtudo, essa occasião não se apresentar no praso de dois mezes, a contar do dia da sua prisão, ou se as despezas da sua detenção não fossem regularmente pagas pela parte, a requisição da qual se effectuou a prisão, os ditos desertores serão postos em liberdade sem que possam de novo ser presos pela mesma causa.
Comtudo, se o desertor tivesse commettido, alem d'isso, algum delicto em terra, a sua extradicção poderá ser retardada pelas auctoridades locaes, até que o tribunal competente tenha devidamente estutuido sobre o ultimo delicto, e que a sentença proferida tenha recebido a sua completa execução.
Fica igualmente entendido que os marinheiros ou outros individuos fazendo parte da tripulação, subditos do paiz em que a deserção se realisou, estão exceptuados das estipulações do presente artigo.

Artigo 19.°

As disposições do presente tratado, applicaveis a Portugal, são-no igualmente sem nenhuma excepção as ilhas portuguezas ditas adjacentes; a saber: ás ilhas da Madeira e de Porto Santo, e ao archipelago das Açores.

Artigo 20.°

O presente tratado estará em vigor durante dez annos, a contar do dia da troca das ratificações. No caso em que uma das altas partes contratantes não houver notificado doze mezes antes do fim do dito periodo a sua intenção de lhe fazer cessar os effeitos, o tratado ficará obrigatorio, até á expiração de um anno, a contar do dia em que uma ou outra das duas altas partes contratantes o tiver denunciado.

Artigo 21.°

O presente tratado depois de haver sido approvado pelas respectivas representações nacionaes será ratificado, e as retificações serão trocadas em Lisboa logo que seja possivel.
Em fé do que, os plenipotenciarios o assignaram e lhe pozeram os seus sellos.
Feito em Lisboa, em duplicado, a 10 de abril de 1885.
(L. S.) José Vicente Barbosa du Bocage.
(L. S.) Othon Steenhock.
Está conforme. - Direcção dos consulados e dos negocios commerciaes, em 28 de abril de 1885. = Eduardo Montufar Barreiros.

Os abaixo assignados, tende-se reunido hoje para procederem á assignatura do tratado de commercio e de navegação entre o reino de Portugal de uma parte, e od reinos unidos de Suecia e de Noruega da outra, e devidamente auctorisados pelos seus respectivos governos, convieram no que segue:
O governo de Sua Magestade El-Rei de Portugal e dos Algarves obriga se a não augmentar os direitos de importação sobre o bacalhau actualmente existentes emquanto durar o mencionado tratado.
Fica entendido que pelo tratamento da nação mais favorecida toda a reducção de direitos ou de favores de que gosarem os vinhos dos outros paizes em Suecia e em Noruega serão applicaveis aos vinhos de Portugal, e que toda a aggravação de direitos ou restricção de favores impostos aos vinhos portuguezes em Suecia e em Noruega se tornarão extensivos aos vinhos dos outros paizes.
Feito em Lisboa, em duplicado, aos 10 de abril de 1885.
(L. S.) José Virente Barbosa du Bocage.
(L. S.) Othon Steenbock.
Está conforme. - Direcção dos consulados e dos negocios commerciaes, em 28 de abril de 1885. - Eduardo Montufar Barreiros.
Foi enviada á commissão da negocios externos, devendo primeiro ser publicada no Dario do governo.
O sr. Presidente: - Tenho a prevenir os srs. deputados de que ámanhã tenciono mandar fazer a segunda chamada ás duas horas, e senão estiver presente o numero de srs. deputados que, segundo a ultima deliberação da camara, e indispensavel para se poder abrir a sessão, não poderá esta ter logar.
A ordem do dia para ámanhã e a continuação da que estava dada.
Esta levantada a sessão.
Eram quasi seis horas da tarde.

Redactor. - S. Rego.

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