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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1887 1573

lizmente estes ultimos os que têem a consciencia menos negra
É, pois, para os militares que se tornaram distinctos mantendo o nosso prestigio, por occasião da desforra que precisavamos tirar do revez que as nossas tropas soffreram em Matibane, que eu peço a devida recompensa, para que se não diga que premiamos os heroes da derrota e nos esquecemos dos da victoria. (Apoiados.)
Era este, como é facil de ver, um singularissimo procedimento, cujas naturaes consequencias viriam a ser o procurarem os defensores das nossas colonias antes deixar-se derrotar, para obterem uma recompensa, do que vencerem para se tornarem victimas de um castigo.
E depois, como é mais commodo, ou pelo menos mais facil o primeiro expediente, não será absurdo suppor que os nossos annaes ultramarinos, ultimamente tão enriquecidos por façanhas assombrosas e actos de uma heroicidade que excede toda a expectativa, só tenham de hoje em diante de historiar revezes e de apontar derrotas, o que seria bem triste para quem, como nós, tem tido tanto de que se ufanar e de que sentir vaidade, especialmente nestes ultimos tempos.
O sr. ministro da marinha referiu-se tambem aos heroes que se assignalaram na bahia de Tungue.
A tomada de Tungue foi um d'estes actos do valor, que só por si dão a medida da importancia e do poder de uma nação. Tanto mais, sr. presidente, que elle foi, contra o que ninguem podia suppor, inteiramente incruento.
Não houve mortos, nem feridos, nem contundidos sequer, nem consta que se d'esse facto algum desagradavel para as tropas portuguezas.
Ora, realmente, d'estas victorias completas e sem mancha de sangue, a historia não falla de muitas.
Podemos com orgulho reclamar para nós a honra desse feito de armas sui generis, e estampal-o desafogadamente n'uma das rarissimas paginas brancas dos nossos annuaes ultramarinos.
Mas só porque este feito de armas foi incruento, inofensivo e de uma commovente innocencia, bem merecem os heroes que n'elle tomaram parte o devido preito da nossa admiração e o galardão official.
Combater, e muito particularmente com tropas negras, e sem derramar sangue, é caso que assume proporções verdadeiramente epicas e quasi milagrosas.
Bom será, porém, que os actos de valor militar praticados nas nossas colonias não sejam apreciados por fórma que desprestigiem em logar de estimularem os nossos briosos militares, fazendo-lhes ver como ao presente está rebaixado o verdadeiro merito, e como ao mesmo tempo se premeiam actos de nenhum valor militar praticados sem nenhum risco.
E se é de justiça que aos heroes de Tungue e Matibane se distribuam recompensas, justo é tambem não esquecer os heroes de Inhambane; e é para lembrar os militares que se distinguiram pelo seu valor e coragem na ultima invasão e guerra dos vatuas n'este districto, que eu principalmente pedi a palavra.
V. exa. ha de recordar-se de um telegramma do governador geral de Moçambique, publicado na imprensa, que dizia assim:
. «30:000 vatuas (gente do regulo Gungunhama) invadiram este districto no dia 16; 10:000 soldados de caçadores dos regulos sujeitos á soberania portugueza eram pouco para impedir a invasão. Batidos duas vezes retiraram para uma distancia de 12 leguas da villa. Atacados ahi no dia 23 foram derrotados os inimigos. Estou acampado no logar da batalha esperando reforço de gente do sul para continuar a oppor resistencia.»
Isto é textual, e bem merece ficar archivado nos registos parlamentares para a historia das nossas proezas africanas e da nossa ingenuidade.
Ora o acontecimento relatado n'este telegramma, acontecimento que não tem na historia nenhum outro com que possa comparar se, (Apoiados.) para quem souber o que são guerras da Africa, não deve passar desapercebido.
V. exa. comprehende muito bem, assim como comprehende todo o paiz, o alcance de um triumpho obtido contra o potentado mais aguerrido da Africa oriental, triumpho em que 10:000 combatentes, depois de derrotados duas vezes por 30:000 vatuas, derrotaram os 30:000 vencedores. (Apoiados.)
Mas o que se não comprehende é que estes 10:000 heroes, e ninguem dirá que estamos pobres d'elles, successivamente derrotados e vencedores, sejam esquecidos quando são exaltados os actos do valor praticados em Tungue, onde as nossas tropas não soffreram o menor desgosto dos subditos do sultão de Zanzibar, que, receiosos da nossa valentia proverbial em terras de Africa, abandonaram previamente o terreno que nós em seguida valorosamente conquistámos, apenas com o dispendio de alguma polvora secca e com o susto dos peixes da bahia de Tungue, já deshabituados do estrondear da artilheria portugueza.
Por isso, sr. presidente, eu, apesar do apreço em que tenho estas apregoadas hcroicidades e do juizo que faço dos protogonistas d'essas terriveis tragedias, que não raro degeneram em ridiculas farças, benevolamente acolhidas pela brandura dos nossos costumes, e devidamente apreciadas e premiadas nas regiões officiaes para alimentar o nosso patriotismo, sem querer dizer que os que possuem verdadeiro e incontestado merito procedem de outra fórma, e sem me oppor a que se premeiem os que tantos esforços fazem para ser premiados, lastimaria muito que os louvores e recompensas não sejam distribuidos tanto aos que os solicitam e mandam recommendar e apregoar as suas façanhas, como aos que, sem protectores nem panegyristas, se tiverem distinguido nas guerras com os potentados da Africa oriental.
E lembro especialmente os 10:000 heroes de Inhambane, ou as preciosas reliquias d'estes heroes, que souberam, depois de derrotados por 30:000 vatuas, vencer e derrotar os seus vencedores. (Apoiados.)
Já se vê que o governador esteve acampado no logar da batalha, esperando reforço de gente do sul para continuar a oppor resistencia, segundo refere o telegramma.
E não é para estranhar aquelle meu desejo, quando os effeitos da guerra de Inhambane para o nosso prestigio foram tão portentosos, que os vatuas desappareceram por encanto durante algum tempo, e o proprio Gungunhama ficou tão assustado com a derrota, que não só tem continuado a ameaçar o districto de Inhambane, obrigando as forças portuguezas a estarem sempre em armas para resistirem a nova invasão, mas, como prova do seu arrependimento por ter invadido as nossas possessões, mandou uma embaixada a Lisboa, sómente para pedir perdão a Sua Magestade das suas culpas passadas.
Quando fallo nas invasões dos vatuas no districto de Inhambane, refiro-me aos vatuas subditos do Gungunhama, que assolaram este districto, e que foram derrotados pelas forças portuguezas no terceiro combate com estas forças.
Ainda actualmente o nosso districto de Inhambane está ameaçado pelos mesmos vatuas, mas, a avaliar pelas boas relações em que vivemos com o successor do Muzilla, principalmente depois da sua convivencia com o residente Casalleiro, director e inventor da primeira embaixada, que em boa logica se deve considerar apocrypha para não tirar a graça e o merecimento a segunda, e com as duas professoras que acompanharam o mesmo residente na sua peregrinação, é indubitavel que estas invasões e hostilidades não são auctorisadas pelo Gungunhama, como elle confessa em linguagem official, mas sim pelos seus cabos de guerra que elle não tem podido conter, senão depois de submetter á sua auctoridade differentes potentados do districto de Inhambanc, subditos do Rei de Portugal, que