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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Discurso do sr. deputado Rodrigues de Freitas, proferido na sessão de 11 de agosto, e que devia ter sido publicado a pag. 189 do Diario da camara.

O sr. Rodrigues de Freitas: — Principio lendo a proposta de substituição do projecto que se discute. Uma parte póde considerar-se tambem como additamento.

A proposta é a seguinte (leu).

Com verdadeira timidez, levanto a voz n'esta camara, porque, alem de me fallecerem faculdades para devidamente me occupar do assumpto, a assembléa deseja passar a outra questão que se ha de levantar a proposito da resposta ao discurso da corôa; mas não posso deixar de dar algumas explicações para sustentar a substituição que acabei de ter.

Esta conjunctura é solemne e importante; creio que a camara não considera a resposta ao discurso do throno como simples formalidade; mas sim como mensagem que exprima a opinião ao povo portuguez. É n'este sentido que a tome; por isso formulei a minha substituição nos termos que a camara ouviu.

O exame da situação politica, para ser feito acertadamente, dave responder á seguinte pergunta: « Em Portugal existe de facto o systema representativo ou só nominalmente?»

Eis a these que me proponho a discutir; necessito, pois, investigar como entre nós se realisam as condições essenciaes d'esse systema politico, isto é, a publicidade, a discussão e a liberdade de voto, examinarei, pois, qual é a parte que o povo toma na governação e se o governo respeita aquellas condições do systema representativo.

Quanto á publicidade, o sr. presidente de conselho negou á camara o direito de pedir alguns esclarecimentos importantes, ainda mesmo quando fossem destinados a formular a accusação do governo! Não faço uma asserção gratuita: v. ex.ª sabe, que tendo o sr. Mariano de Carvalho requisitado alguns documentos e declarado serem de tal ordem, que podiam fundamentar uma accusação ao sr. ministro do reino, s. ex.ª contestou o direito de pedi-los e não os remetteu á camara, como exigia a dignidade do governo (apoiados).

O sr. ministro da fazenda, quando foi apresentada uma proposta de inquerito parlamentar ácerca da ingerencia das auctoridades nas eleições, immediatamente se lhe oppoz, não se lembrando de que esse inquerito era uma das attribuições da camara, e o proprio governo interessado em que fosse feito, se porventura lhe era facil justificar-se das accusações que alguns deputados lhe têem dirigido sobre tão grave materia.

Emquanto ao principio da discussão, basta lembrar o dia para o qual foram convocadas as côrtes.

V. ex.ª sabe que o governo quiz muito tempo para preparar o acto eleitoral, e sómente deu ao pai lamento o curto espaço de cinco ou seis sessões para os trabalhos da junta preparatoria, constituição da camara dos deputados e discussão da lei de meios! Periodo relativamente tanto mais curto quanto é certo que a lei de meios podia ser objecto de importante questão politica.

Emquanto ás eleições, têem sido narrados n'esta casa factos que provam qual a ingerencia das auctoridades no acto eleitoral.

Não repetirei os já contados aqui. Occupar me-hei do meu circulo.

Na cidade do Porto a auctoridade quiz influir de tal modo sobre a consciencia dos cidadãos, que não duvidou especular, permitta se-me a phrase, com assumptos religiosos.

Para attingir seus fins, não hesitou em converter um cemiterio em mercado eleitoral! E o sr. ministro do reino não usou contra aquella auctoridade senão de uma portaria, que é indigna de ser assignada por um conselheiro da corôa.

A portaria de 20 de julho de 1871 parece-me que não tem igual na jurisprudencia administrativa portugueza.

O sr. ministro do reino ignorava tudo quanto se passava na cidade do Porto, e só depois das eleições, lendo n'um jornal a narração d'aquelle facto, dirigiu um officio ao governador civil, perguntando-lhe o que havia ácerca de enterramentos no cemiterio de Paranhos.

A auctoridade respondeu a s. ex.ª que não dera ordens algumas e que só

extra-officialmente sabia do caso; refere-o a propria poriaria.

De maneira que o governador civil do Porto não sabe quaes são os factos que se passam dentro da propria cidade em que habita!

O governo, em logar de punir aquelles que tinham violado as leis, satisfez-se com informações extra-officiaes e contentou-se com reprehender o administrador do concelho, que não era o mais culpado!

Pois se o governador civil do Porto dirigia o districto de tal modo, que ignorava os factos mais graves que ali se passavam, ou sabendo-os não evitava a continuação d'elles, era caso digno de conservar-se n'aquelle logar?

O sr. ministro do reino já prometteu examinar attentamente este negocio, e proceder conforme a lei; mas s. ex.ª não tem querido punir aquelle que tão arbitrariamente praticou um attentado, lançando a discordia n'uma freguezia, transgredindo arbitrariamente duas portarias e toda a legislação sobre cemiterios, praticando emfim tudo isto para alcançar votos!

E que direi da estrada da Guarda a Castello Branco pela Covilhã! Solicitei os documentos.

Do ministerio do reino a resposta não tardou, porque diz assim: «N'este ministerio não consta nada.» Do ministerio das obras publicas ainda não recebi resposta, e comtudo o governo sabe a gravidade do assumpto e as accusações que lhe tem sido feitas.

Estes e tantos outros factos affirmam a criminosa ingerencia do ministerio nas eleições; se é criminoso, deve ser accusado; se porém o não ordenou, os ministros são indignos do cargo que exercem, porque não obrigam os delegados a obedecer ás suas ordens e a cumprir a lei.

Em qualquer dos casos a intenção do governo é deploravel, e a camara não póde deixar de se pronunciar contra elle.

Estes factos mostram que o governo, segundo a phrase do sr. ministro do reino, ou não representa nenhum partido ou representa o partido retrogrado.

Sr. presidente, podem dizer que não tem partido aquelles que, tendo estudado a sciencia social, descrêem de todas as suas theorias, e vivem no mais doloroso scepticismo, ou aquelles que consideram mal definidos os campos politicos; ou, emfim, os que tem faculdades para formarem um partido novo; mas um cavalheiro que tantas vezes ha sido ministro não póde dizer á camara que não tem partido.

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S. ex.ª, quando foi presidente do ministerio de que fazia parte o sr. bispo de Vizeu, disse que aceitava o programma do partido reformista; e mais tarde declarou que continuava a seguir o caminho anteriormente traçado. Na sessão de 1865, s. ex.ª disse que pertencia ao partido conservador progressista.

Um dos mais illustres professores portuguezes me disse que conservador progressista se parecia com gaz liquido. E o illustre ministro acrescentou, que ainda quando tinha feito parte do ministerio conservador, n'essa mesma occasião fôra progressista.

A camara avaliará a lealdade do sr. presidente do conselho, que, fazendo parte de um ministerio conservador, não tinha duvida em pertencer ao partido progressista! (Apoiados.) Parece-me que o mesmo aconteceu ha pouco; porque s. ex.ª, fazendo parte do partido reformista, não teve duvida em declarar que não tinha partido algum.

Examinei o procedimento do governo para com o systema representativo; examinarei agora o procedimento dos partidos. E para isto permitia v. ex.ª que alluda aos factos que determinaram a dissolução da camara electiva.

Em junho de 1871, a camara dos senhores deputados foi dissolvida, porque não quiz votar isenções de impostos a favor de estabelecimentos bancarios (apoiados).

Este nosso procedimento foi o motivo de tal acto do poder moderador. Sendo o sr. ministro da fazenda convidado por mim a declarar qual era a causa da dissolução, s. ex.ª não duvidou dizer que tendo tantas vezes aceitado alterações feitas pela commissão de fazenda, nas suas propostas, não podia continuar a ceder; e declarára ao sr. marquez d'Avila que punha a sua pasta sobre a questão dos bancos; que se a lei não passasse tal como havia sido approvada na camara dos dignos pares, ou o governo se demittisse ou a camara fosse dissolvida (apoiados).

Mas o que ha de mais natavel é que tendo sido consultado o paiz, tendo Sua Magestade appellado para a eleição, tendo s. ex.ª aconselhado a El-Rei que praticasse este acto do poder moderador vem agora á camara electiva a mesma proposta que o sr. ministro da fazenda rejeitára! De modo que, ou s. ex.ª quer provocar nova crise n'esta casa; ou suscita-la na camara alta.

O certo é que foi dissolvida uma camara, estando no governo homens sem partido, sem confiança de qualquer dos lados da camara!

Quando taes são os actos do poder moderador, lembro-me de um discurso do sr. Mártens Ferrão, proferido com louvavel coragem; s. ex.ª, fallando em 1865 do modo por que as crises politicas eram resolvidas, disse que elle correspondia ao que Stuart Mill chamava systema constitucional absoluto.

Annunciou-se a dissolução. Os partidos regenerador e historico não tiveram duvida de votar a lei de meios, vota-la-íam até sem restricções. A camara foi dissolvida; pouco depois os periodicos publicavam nomes de candidatos governamentaes pertencentes ao partido historico e regenerador; e poderá alguem dizer que taes partidos trouxeram á camara defensores do ministerio?

Sr. presidente, se, durante a luta eleitoral, eu tivesse aceitado a denominação de governamental, havia de sustentar aqui a politica do governo. O que eu nunca permittiria era que me chamassem governamental; mas se houvesse recebido apoio do ministerio para ser eleito deputado, havia de prestar-lhe não só o meu voto, mas tambem a minha palavra.

Ouvi outro dia a um illustre deputado, ornamento d'esta casa, e pertencente ao partido historico, affirmar que se fizesse a conta corrente dos ultimos favores eleitoraes, se conheceria que o partido historico não devia mais ao ministerio, do que o ministerio a esse partido.

Esta declaração mostra que o partido historico esteve ao lado do governo durante a eleição; e comtudo não vem apoia-lo!

Analogas considerações poderia applicar, em parte, ao partido regenerador:

Facto notavel, e estranhavel! Observando a luta eleitoral, dir-se-ía que os regeneradores tinham programma igual ao do partido historico; e um e outro igual ao do governo. Assim o pedia a logica dos factos; mas a verdade é que o programma do partido historico é differente do programma do partido regenerador, e qualquer d'estes differente do do governo.

Aquelles dois partidos têem feito á opposição parlamentar uma accusação grave, mas infundada; affirmaram que ella tem procurado retardar o andamento dos negocios publicos, e que por causa d'ella a camara não trabalha utilmente.

O meu illustre amigo, o sr. Barjona de Freitas, mandou ha dias para a mesa uma proposta para que esta camara quanto antes se occupasse do orçamento; tratavamos n'esse dia de uma questão de principios, esquecendo-se s. ex.ª de que na sessão passada, quando se apreciavam as propostas sobre tributos, fez uma interpellação ao governo sobre a pastoral do sr. patriarcha.

(Interrupção do sr. Barjona de Freitas, que se não ouviu na mesa.)

Ha grande differença entre esse procedimento de s. ex.ª e o de agora; porque na sessão passada estavam pendentes negocios importantissimos, e actualmente nada temos a discutir!

Tendo examinado a posição dos partidos historico e regenerador em relação ao governo, e acreditando que nenhum d'elles confia no ministerio (esta é a verdade por mais que pretendam encubri la), escuso de fallar dos partidos reformista ou do constituinte, cuja posição foi bem definida aqui desde o começo da sessão.

Emquanto ao partido que se diz ministerial, esse vejo que apoia o gabinete, ainda nos actos mais contrarios á constituição do estado.

Eis o estado dos partidos, pouco em harmonia com as necessidades publicas.

De 1865 a 1871 a politica portugueza tem passado por phases importantes, porém pouco uteis; uma d'ellas foi a união dos partidos historico e regenerador, quando estava no poder o sr. marquez d'Avila, em 1865. Já n'aquelle tempo s. ex.ª parecia ameaçar a camara com a dissolução, ao que os representantes do povo responderam com risos, que denotavam a sua hombridade; e o actual sr. ministro do reino disse então: «Ainda me hei de rir de todos os que praticaram a fusão». N'esse tempo havia faculdade de rir (riso).

Notavel coincidencia! Hoje esses dois partidos estão divididos e contribuem para amparar na queda o nobre marquez d'Avila! Seja-me permittido affirmar que actualmente os referidos partidos são tão affectos a s. ex.ª, como em 1865 (riso).

De tudo quanto acabo de dizer se conclue que o systema representativo não existe em Portugal senão no nome (apoiados).

Reconheço que já é grande vantagem estarem consignados na lei fundamental certos direitos. Todos sabem que tal conquista custou aos mais civilisados povos o trabalho de muitas gerações e o martyrio de tantos homens illustres: mas não basta consignar os direitos, é necessario garanti-los; essa garantia nos falta (apoiados).

Como já outras vezes aqui hei dito, ponho confiança no systema representativo sinceramente praticado; e a minha crença não o affirmo só com palavras, garanto-a com factos; duas vezes tenho vindo á camara, e nas duas lutas eleitoraes observei religiosamente os meus principios sobre o direito dos cidadãos. Tão pouco tomo a opposição como expressões de odio; ante eleitores meus asseverei que, apesar de não ter confiança no ministerio, o apoiaria em tudo quanto contribuisse para o bem do estado.

Como membro do jornalismo portuguez, tenho combatido todos os governos que, abusando do poder, influiram so-

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bre as consciencias dos eleitores. Estas as provas que eu posso dar de crer sinceramente no systema representativo; o que eu espero que jamais farei é, depois de tecer elogios á liberdade da urna, e declarar que a tomo como principio fundamental do meu programma, receber favores eleitoraes do governo. Creio no systema representativo; aceito a doutrina d'aquelles publicistas, segundo os quaes por esse systema se obtém que todos os elementos de rasão, de justiça e de verdade, que haja no corpo social, passem para a representação nacional, e se traduzam em leis (apoiados); mas quando a legislação provém de facções, que tem por principal força o abuso do poder, essas leis não podem estar em harmonia com as evoluções da intelligencia nacional; e d'ahi resulta que, em vez de ser cada cidadão um d'aquelles que concorreram por sua propria vontade para as formular, é um dos que julgam do seu direito resistir-lhes; a resistencia é uma triste consequencia dos desvarios dos poderes publicos, e ás vezes vem de companhia com ella a ruina social (apoiados).

Entendendo, pois, que o systema representativo não existe em Portugal senão nominalmente (apoiados), e que é d'este fructo que deriva todo o mal financeiro, achando a prova da influencia da politica sobre as finanças na historia de todas as nações, não posso acompanhar qualquer partido no desejo que tenha de adiar as questões politicas; os annaes de muitos povos nos mostram que a ruina da sociedade, a quéda de dynastias, a desmembração de territorio, a separação de colonias têem sido determinadas apparentemente pela questão financeira; mas quem realmente determinou taes successos foi a questão politica (apoiados). Bastaria lembrar os principaes factos que occorreram desde a independencia dos Estados Unidos até aos ultimos dias.

Eu sei que nos livros de finanças é costume fallar na grande importancia das questões financeiras, e pôr em grau inferior as politicas; todavia, examinando a historia dos movimentos sociaes mais importantes, vê-se que o desequilibrio financeiro era unicamente o symptoma de um grave mal politico, o qual dava muitas vezes os resultados mais terriveis e mais calamitosos (apoiados).

Partindo, pois, d'estes principios, é que eu, na substituição que tive a honra de mandar para a mesa, fallo princimente da lei eleitoral e da descentralisação administrativa; e como de taes assumptos hei mais de uma vez fallado n'esta casa, julgo-me dispensado de occupar-me agora d'elles.

Resta-me examinar o projecto da illustre commissão, e peço á camara que acredite sinceramente, que em tudo o que vou dizer não ha nem a menor falta de respeito ao augusto chefe do estado, nem aos signatarios d'esse documento.

O projecto da resposta ao discurso da corôa principia do seguinte modo:

«Foi com jubilo que a camara dos representantes da nação viu em seu seio o augusto chefe do estado, satisfazendo uma das mas mais importantes obrigações do codigo fundamental.»

Não quero fazer esta declaração, que envolve censura a El-Rei. Sua Magestade deixa muitas vezes de abrir a sessão das côrtes geraes da nação portugueza, e eu não quero dizer que o chefe do estado, quando não vem abri-la, deixa de cumprir um dos mais importantes preceitos da carta constitucional, mesmo porque não o encontro na carta (apoiados).

Tambem n'este periodo se falla da alliança entre o povo e a monarchia. Estimava que se tivesse dito claramente «a monarchia constitucional», (apoiados). E desejava tambem que em logar da palavra «alliança» se empregasse outra qualquer, porque esta phrase na accepção politica representa facto muito diverso da ligação em que se acha o povo com o rei (apoiados).

Leio ainda:

«No meio das agitações que têem perturbado á paz publica da Europa, acolheu a camara com vivo regosijo as declarações de continuarem inalteraveis as nossas amigaveis relações com as potencias estrangeiras, e de ter havido em toda a parto do reino a mais completa tranquillidade publica.»

Parece-me que em alguns logares não existiu completa tranquillidade publica, e por isso não voto este periodo (apoiados).

Diz outro paragrapho: «A cordial satisfação com que Vossa Magestade recebeu a, visita de seus augustos parentes, Suas Magestades o Imperador e a Imperatriz do Brazil, correspondeu a nação inteira com espontaneos jubilos, evidenciando d'esta arte quanto sympathisa com as altas virtudes e illustrado espirito de tão inclitos monarchas, e quanto aprecia as relações com o imperio brazileiro, nosso irmão pelo idioma, pela religião e pelas instituições».

Declaro a v. ex.ª que na minha opinião os jubilos d'esta nação pela visita de Suas Magestades, não tiveram por fim corresponder á cordial satisfação de

El-Rei.

Não adopto a phrase inclitos monarchas; parece-me que a palavra monarcha exprime que um só individuo occupa o throno; deixemo nos pois de dar a entender que no Brazil ha dois monarchas...

Affirma o projecto que o imperio brazileiro é nosso irmão pelo idioma, pela religião, e pelas instituições!

Eu que ignoro quasi inteiramente quaes as instituições brazileiras, sei comtudo que as temos identicas ás do imperio. E, como analyse d'este paragrapho, não posso deixar de dizer que n'aquelle paiz a camara dos senadores, por exemplo, não é heriditaria! (Apoiados.)

Tambem a descentralisação administrativa ali é praticada de modo que se assimilha um pouco á republica dos Estados Unidos; e é realmente deploravel que a El Rei, ao qual devemos verdade e sinceridade, respondamos que as instituições de Portugal são identicas ás do Brazil.

A descentralisação, como a do Brazil, e a reforma da camara dos pares, desejava eu que trabalhassemos para as conseguirmos; os inconvenientes da hereditariedade são conhecidos; e para a não aceitar bastaria saber que não ha uma physiologia especial para os dignos pares do reino; a seus descendentes póde succeder não possuirem faculdades indispensaveis a legisladores (apoiados).

Tocante á descentralisação administrativa, estimaria que o municipio e o districto se constituissem um pouco similhantemente ás instituições do Brazil, dos Estados Unidos ou da Suissa (apoiados).

Outro trecho do discurso diz o seguinte:

«A maior parcimonia nas despezas, sem prejuizo dos serviços publicos, o conveniente augmento da receita e o desenvolvimento da riqueza, concorrerão efficazmente para melhorar o credito e estabelecer o desejado equilibrio entre a receita e a despeza do estado.»

Peço que se elimine este paragrapho, aliás fallaremos a El-Rei de modo que faz lembrar uma das mais populares poesias comicas, recitadas por um dos primeiros actores portuguezes; é aquella em que se afirmam verdades de grande alcance... como esta: quando um homem tinha saído não estava em casa...

No penultimo paragrapho a camara promette de mais; e eu desejava que estas promessas não fossem alem. Sei que o periodo é a paraphrase do discurso de Sua Magestade; mas nós havemos de dizer a El-Rei que, por termos como primeira e indeclinavel a questão de fazenda, não abriremos mãos de outros assumptos de vital interesse que assegurem a tranquillidade, a independencia, a instrucção e a viação, etc.? Teremos tempo de realisar tudo?

Termina este documento do seguinte modo (leu).

Eu substituo este paragrapho pelo seguinte (leu).

Deputado da nação portugueza, os meus deveres não são resposta aos desejos de Sua Magestade; procedem de outra origem.

N'este logar diz-se: «o que devem a si e aos desejos de

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Sua Magestade»; parece-me que seria melhor redacção: «o que devemos a nós e ao povo».

Deixaria de fazer algumas d'estas observações, se a occasião não fosse solemne e grave, e se não tivesse provas de que o partido retrogrado está aqui representado (apontando para os bancos dos srs. ministros).

Sei que El-Rei não tem obrigação de proferir discurso, nem nós a temos de lhe responder (apoiados).

Ainda não ha muito, na propria Prussia, a camara dos senhores entendeu que tinha a faculdade, porém não a obrigação, de responder ao discurso da corôa.

Mas, respondendo, cumpre-nos fallar como representantes do povo, em vez de nos collocarmos em curva submissa, como se fôramos cortezãos ante rei absoluto (apoiados).

Assim fallo, com o maior respeito, ao chefe do estado, conciliando a franqueza com o proprio affecto.

Vozes: — Muito bem.

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