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DIARIO DA CAMARA DOS SENDORES DEPUTADOS
Proposta de lei n.º 102-M Senhores. — O dr. Robert Stodart Wyld era possuidor de 10 bonds da divida externa portugueza da emissão de 1853 no total de £ 2:000, sendo 2, n.°s 366 e 367, do £ 200; 2, n.ºs 12:266 e 12:3-18, de £ 500; e 6, n.ºs 113:523,191:531,203:297,215:029,244:606 e 24 5:453, de £ 100, que lhe foram roubados juntamente com outros valores quando viajava pela Escócia em setembro de 1876.
Descobertos os roubadores, foram estes sentenciados pelo tribunal de Edimburgo em 25 de junho e 9 de julho de 1877, declarando, então a mulher de um dos mesmos roubadores, que ignorando o valor dos papeis roubados tinham ella e o marido queimado a carteira que os continha.
Os factos assim expostos acham-se circumstanciadamente narrados nas peças officiaes (affidavits) extrahidas do processo e existentes no ministerio a meu cargo com recommendação ao governo portuguez, do ministro de Sua Magestade Britânica em Lisboa.
Considerando que, embora não se prove plenamente a destruição dos titulos, é ella presumivel não tendo sido apresentados a pagamento até hoje os respectives coupons vencidos;
Considerando não ser justo nem conveniente para o credito publico que o estado se recuse absolutamente á renovação dos titulos que emittiu, lucrando com o prejuizo dos proprietarios quando ha extravio d'aquelles titulos;
Considerando que, passando se novos titulos de assentamento, sujeitando-lhes a livre disposição á prescripção de trinta annos, com os juros pagos com atrazo de cinco annos, como se praticou com o banco lusitano pela carta de lei de 16 do maio de 1878, fica sufficientemente garantida a fazenda contra a eventualidade, pouco provavel, do reapparecimento dos bonds que se reputam queimados.
Tenho a honra de apresentar á vossa consideração a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar emittir, pela junta do credito publico, inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wyld, subdito inglez, com vencimento de juros do segundo semestre de 1876, inclusivè, em diante e com a clausula de intransmissiveis durante trinta annos contados do 1.° de julho de 1876, pela importancia correspondente, ao cambio de 54, a dez bonds extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo 2, de£500,n/'9 12:266 e 12:348; 2, de £ 200, n.°s 366 e 367; e 6, de £ 100, n.ºs 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453.
Art. 2.° Os juros das ditas inscripções só poderão ser pagos cinco annos depois do findo o semestre a que respeitarem, isto é, depois de prescriptos os juros dos titulos que se reputam destruidos.
Art. 3.° Se durante o praso indicado no artigo 1.º forem apresentados a pagamento os coupons dos bonds que desappareceram, proceder-se-ha á amortisação das inscripções creadas por esta lei, sem que o interessado Robert Stodart Wyld lenha direito a indemnisação alguma da parto do estado.
§ unico. O interessado, dada a hypothese do presente artigo, será obrigado a restituir ao estado os juros que houver recebido das inscripções creadas por esta lei.
Art. 4.° Decorrido o praso marcado para a prescripção dos creditos representados nos bonds, será annullada a clausula de intransmissibilidade exarada nos novos titulos, e estes ficarão livres para todos os effeitos.
Art. 5.° Reciprocamente se depois do praso da prescripção reapparecerem os bonds, serão estes considerados de nenhum valor e fóra das garantias que as leis da respectiva creação lhes confiram.
Art. 6.° Annullada a clausula de intransmissibilidade, a que se referem os artigo 1.° e 4.°, poderão ser pagos os
juros vencidos e não satisfeitos em virtude do disposto no artigo 2.°
Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio dos negocios da fazenda, 21 de abril de 1879. = = Antonio de Serpa Pimentel.
Foram enviadas ás respectivas commissões.
O sr. Rodrigues de Freitas: — A proposta apresentada pelo sr. ministro da justiça, responde a uma pergunta que eu tinha feito na sessão do sabbado. Disse então que desejava saber se s. ex.i1 apresentaria este anno uma proposta de lei ácerca do registo civil, e s. ex.ª acaba de a apresentar.
Não é occasião para me pronunciar a respeito do procedimento do governo, mas estimo muito que antes a proposta viesse tarde do que nunca; estimo muito que prove que vamos no caminho que nos foi aberto poios legisladores que s. ex.ª citou no relatorio da sua proposta do lei, pelo ministro do duque de Bragança, Mousinho da Silveira, e ainda por Joaquim Antonio de Aguiar, bom como por Manuel da Silva Passos, isto é, pelos decretos do 16 do maio de 1832 a 31 do dezembro de 1836.
No sabbado annunciei tambem que desejava perguntar ao sr. ministro da justiça, se tinha algumas noticias a respeito do que se passou na cidade do Porto com o hospital secreto, onde as irmãs de caridade, não sai se portuguezas se estrangeiras, ministraram varios medicamentos e uma agua que se diz milagrosa.
As irmãs de caridade que ali estavam, e que, cheias de piedade, juntavam á pomada camphorada a agua de Lourdes, pertencem a nina corporação? Obedecem ás auctoridades portuguezas? É executada a legislação de 1861 a este respeito?
E o que desejo saber do ministerio; e não me occupo dos actos de credulidade praticados ali; deixo em paz aquellas pessoas que julgam que a agua de Nossa Senhora de Lourdes differe alguma cousa da agua ordinaria
Disse no sabbado que estimava que o governo, sendo tolerante para com todas as manifestações de pensamento, propozesse leis que tendessem a levar-nos tão rapidamente quanto possivel para a liberdade dos cultos. A imposição de qualquer lei á consciencia, obrigar a ter determinadas relações com Deus, é um verdadeiro sacrilégio; por isso me pronunciei a favor da liberdade de cultos, e creio que, sem a estabelecermos, desde já podemos ir prudentemente adoptando providencias que contribuam poderosamente para que, dentro em -poucos annos, essa liberdade exista em Portugal.
Vieram estas observações a proposito de insultos feitos na cidade do Porto a um ministro da igreja evangélica, o qual n'aquella cidade fez algumas conferencias.
Eu leio á camara um breve trecho da correspondencia que elle dirigiu a um jornal; e é de lastimar que no nosso paiz, pessoas que se dizem catholicas comprehendam tão pouco o catholicismo, que julguem que ao ministro que tom idéas differentes das idéas catholicas se deva responder com injurias e com offensas corporaes.
N'esta carta diz o ministro evangelico.
(Leu.)
Conta outras proezas de individuos que conheciam tão pouco o catholicismo e o christianismo que misturavam com taes actos as vozes de — viva o Papa.
Tem o governo alguma informação a este respeito? Tem o governo dado as mais terminantes ordens para que os principios, ainda que hão tão liberaes como eu desejava, mas principios de alguma liberdade de consciencia e de culto, que estão no codigo fundamental da monarchia portugueza, sejam observados na cidade do Porto?
Referir-me-hei ainda a outro assumpto.
Na mesa já está uma representação do ex-vice-consul portuguez em Granada, ácerca do lamentavel acontecimento que ali se deu contra a vida de um nosso concida-
Sessão de 21 de abril de 1879