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Sessão de 21 de abril de 1879

Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva

Secretarios - os srs.

Antonio Maria Pereira Carrilho (Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dão-se algumas explicações entre o sr. Rodrigues de Freitas e o sr. ministro da justiça.. — Apresenta o sr. ministro da justiça uma proposta de lei auctorisando o governo a regular A execução dos artigos 2:415.° e 2:449° do codigo civil, estabelecendo circumscripções especiaes para esse rim onde não for possivel aproveitaras actuaes, creando a cada uma das novas circumscripções a. competente repartirão de. registo, encarregando " serviço respectivo a funccionarios retribuidos por meio de emolumentos Apresenta o sr. ministro da fazenda duas propostas de lei: 1.», auctorisando o governo mandar emittir pela junta do credito publico inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wild, subdito inglez, com vencimento de juros do segundo semestre de 1876 inclusivè em diante e com a clausula de intransmissiveis durante trinta annos, contados do 1.° de julho de 18715, pela importancia correspondente ao cambio de 54, a 10 bonds extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo 2 de £ 500, 2 de. £ 200, e 6 de £ 100; 2.% auctorisando o governo a entregar á, camara municipal de Cantanhede o pinhal de 8. João, situado na proximidade da villa de Cantanhede, ficando a mesma camara obrigada á conservação do mesmo pinhal e a proceder ás primeiras sementeiras, a fim de o conservar no estado que a. salubridade publica reclama. — Na ordem do dia continua a discussão na generalidade do projecto n.º 81 (orçamento),/aliando os srs. Saraiva de Carvalho e Carrilho.

Abertura — As duas horas da tarde.

Presentes á chamada 51 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Osorio de Vasconcellos, Alfredo de Oliveira, Alfredo Peixoto, Gonçalves Crespo, Avila, Lopes Mendes, Carrilho, Mendes Duarte, Pinto de Magalhães, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Neves Carneiro, Saraiva de Carvalho, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Cazimiro Ribeiro, Diogo de Macedo, Costa Moraes, Emygdio Navarro, Filippe de Carvalho, Pinheiro Osorio, Francisco Costa, Paula Medeiros, Palma, Freitas Oliveira, Jeronymo Osorio, João de Carvalho, Brandão o Albuquerque, Scarnichia, Sousa Machado, J. J. Alves, Frederico da Costa, Namorado, Rodrigues de Freitas, Teixeira de Queiroz, Borges, Sousa Monteiro, Sá Carneiro, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Luiz Bivar, Luiz Garrido, Faria e Mello, Nobre de Carvalho, Mariano de Carvalho, Miguel Dantas, Pedro Jacome, Visconde de Andaluz, Visconde de Balsemão, Visconde de Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Adriano Machado, Fonseca Pinto, Agostinho Fevereiro, Tavares Lobo, Braamcamp, Torres Carneiro, Pereira do Miranda, A. J. Teixeira, Barros e Sá, Fuschini, Victor dos Santos, Caetano de Carvalho, Carlos de Mendonça, Goes Pinto, Hintze Ribeiro, Francisco de Albuquerque, Monta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Pereira Caldas, Van-Zeller, Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Costa Pinto, Jeronymo Pimentel, Gomes de Castro, Barros e Cunha, João Ferrão, J. A. Neves, Almeida e Costa, Pires de Sousa Gomes, Dias Ferreira, Tavares de Pontes, Frederico Laranjo, José Luciano, J. M. dos Santos, Pereira Rodrigues, Mello Gouveia, Barbosa du Bocage, Lourenço de Carvalho, Luiz de Lencastre, Almeida Macedo, Freitas Branco, Manuel d'Assumpção, Pires de Lima, Correia de Oliveira, Alves Passos, M..1. Gomes, M. J. Vieira, Aralla e Costa, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Miranda Montenegro, Miguel Tudella, Pedro Barroso, Pedro Roberto, Visconde da Aguieira, Visconde de Alemquer, Visconde da Arriaga, Visconde da Azarujinha, Visconde de Moreira de Rey, Visconde do Rio Sado, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Alipio Leitão, Emilio Brandão, Arrobas, Pedroso dos Santos, Telles de Vasconcellos, Avelino de Sousa, Bernardo de Serpa, Sanches de Castro, Conde da Foz, Moreira Freire, Firmino Lopes, Fortunato das Neves, Mesquita é Castro, Sousa Pavão, Frederico Arouca, Melicio, Ornellas de Matos, José Guilherme, Figueiredo de Faria, Ferreira Freire, Taveira de Carvalho, Rocha Peixoto, M. J. de Almeida, Macedo Souto Maior, Pedro Carvalho, Pedro Correia, Ricardo Ferraz, Rodrigo do Menezes, Thomás Ribeiro.

Ada — Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Do ministerio do reino, remettendo, em satisfação ao pedido do sr. deputado Joaquim Pires de Sousa Gomes, o mappa, por districtos, dos contingentes votados para as forças de terra e de mar, nos annos de 1870 a 1877, com a designação dás respectivas dividas.

Enviado á secretaria.

2.° Do ministerio dos estrangeiros, remettendo 120 exemplares da segunda parte do Livro branco, publicado por aquelle ministerio.

Enviado á secretaria.

3.° Do mesmo ministerio, remettendo a representação que o ex-vice-consul em Granada, D. Francisco Leal Harra, dirigiu á camara dos senhores deputados.

Para publicar a representação no Diario do governo, em virtude de resolução da camara.

4.° Do ministerio da marinha e ultramar, acompanhando 150 exemplares do orçamento das provincias ultramarinas para o anno economico de 1879-1880.

Mandaram-se distribuir.

Participações

1.ª Participo que não tenho comparecido ás ultimas sessões por motivo justificado. = Jayme Arthur da Costa Pinto.

A secretaria.

2.ª Do sr. deputado Alipio de Oliveira de Sousa Leitão, participando que tem faltado a algumas sessões, e faltará a a mais algumas, por motivo justificado.

A secretaria.

Representações

1.ª Da. camara municipal de Grandola, pedindo que sejam abolidos Os artigos 16.° e 88.° do codigo administrativo, e alterado o artigo 131.º do mesmo codigo.

Apresentada - pelo sr. deputado Ornellas de Matos e enviada á commissão de administração publica.

2.ª Da camara municipal' de Villa Verde, districto de Braga, pedindo que se não faça concessão alguma de via ferrea, sem que primeiro sejam estudadas todas as variantes pelo valle do Tamega e do Cavado a Montalegre ou á Portella do Morgado.

Apresentada pelo sr. deputado Alves Passos e enviada ás commissões de obras publicas e de fazenda.

3.ª Da camara municipal do concelho de Fafe, pedindo que a via ferrea do Porto á Povoa de Varzim, passe por Villa Nova. de Famalicão, Guimarães, Fafe, Basto e mais concelhos importantes, até Vidago e Chaves.

Apresentada pelo sr. deputado visconde de Moreira de Rey e enviada ri, commissão de obras publicas.

4.ª Da empreza concessionaria do theatro de Maria II, pedindo que lhe seja abonado um subsidio pecuniario annual, ou que seja rescindido o contrato do adjudicação de 31 de agosto de 1877.

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Apresentada pelo sr. deputado Julio de Vilhena e enviada á commissão de fazenda.

5.ª Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Lisboa, pedindo augmento de vencimentos.

Apresentada pelo sr. deputado Ferreira de Mesquita e enviada á commissão de fazenda.

6.ª Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Aveiro, no mesmo sentido.

Apresentada pelo sr. deputado Aralla e Costa e enviada á commissão de fazenda.

7.ª Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Beja, no mesmo sentido.

Apresentada pelo sr. deputado Julio de Vilhena e enviada á commissão de fazenda.

8.ª Dos carteiros do quadro da administração central do correio de Santarem, no mesmo sentido.

Apresentada pelo sr. deputado Fevereiro e enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

9.ª Dos ajudantes machinistas navaes, pedindo serem classificados por modo que sejam consideradas as suas habilitações scientificas.

Apresentada pelo sr. deputado visconde de Sieuve de Menezes e enviada á commissão de marinha, ouvida depois a de fazenda.

O sr. Presidente: — A mesa acaba de ser imformada de que Sua Magestade a Rainha já hoje se levantara, se bem que não esteja ainda inteiramente desembaraçada da respiração, o que só mais tarde se realisará.

Hontem o sr. Pinheiro Chagas apresentou um requerimento do sr. Antonio Vicente Peixoto Pimentel, em que se pede a construcçâo de um porto de abrigo na ilha das Flores.

O sr. deputado pediu que este requerimento fosse publicado no Diario da camara; áquelles senhores que forem de voto que se faça a publicação indicada, queiram levantar-se.

Decidiu-se negativamente.

O sr. Montenegro: — Mando para a mesa uma representação dos empregados da repartição de fazenda do districto de Leiria, pedindo melhoria de vencimentos.

Peço a v. ex.ª o favor de remetter esta representação á commissão respectiva para a tomar na devida consideração.

O sr. A. Mendes Duarte: — Mando para a mesa um requerimento da junta de parochia de Vinho, concelho de Gouveia, em que pede lhe seja concedido um pequeno bocado do terra contiguo á igreja do convento de Vinho, chamado o Cerco do Menino, e que foi avaliado em 30$000 réis, para se fazerem n'elle algumas obras necessarias á mesma igreja, que tambem já lhe foi concedida.'

Peço a v. ex.ª que se sirva dar a este requerimento o andamento conveniente.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Sr. presidente, pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte requerimento.

(Leu.)

Já v. ex.ª vê por esta leitura que eu desejo obter esclarecimentos para poder julgar os actos a que se refere o requerimento.

A este respeito diz hoje o Jornal de Vizeu.

(Leu.)

Sr. presidente, eu não posso, por emquanto, asseverar á camara os factos narrados n'este jornal; é porém certo que ha muito que me parece haver no commando da divisão certas tendencias para substituir o arbitrio á lei.

Eu, pela consideração e relações que me ligam ao commandante da divisão desde o tempo em que fui auctoridade na Guarda, tenho-me abstido de fallar de algumas cousas que dizem respeito ao mesmo commando.

Deixei mesmo de fallar de certo apparato militar, sem requisição da auctoridade respectiva, por occasião da chegada a Vizeu dos srs. deputados Anselmo Braamcamp e Mariano de Carvalho.

Como, porém, eu não estava aqui para satisfazer a quaesquer considerações, que não sejamos de justiça e do bem publico, não posso mais esquivar-mo ao exame dos actos a que me tenho referido.

Espero que me seja enviado o documento que peço o depois farei as observações que julgar convenientes.

Aproveito a occasião de estar no uso da palavra, para pedir á illustre commissão de instrucção publica que dê o seu parecer ácerca do requerimento que em tempo aqui apresentei, do porteiro do lyceu de Vizeu, no qual pedia aposentação.

Sr. presidente, a justiça é devida a todos, grandes ou pequenos, nem ella é menos respeitavel quando exercida para com estes.

Dê a commissão o parecer, que é de justiça que se attenda um antigo e honrado servidor do estado.

O requerimento é o seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da guerra, me seja enviada com urgencia copia da ordem da 2.ª divisão militar, que mandou saír para Coimbra o ultimo destacamento do regimento de infanteria n.º 14, com dois alferes alumnos e dois effectivos, devendo um d'estes ser nomeado no principio do maio.

Sala das sessões, em 19 de abril de 1879. = O deputado pelo circulo de Mangualde, Francisco de Albuquerque. Mandou-se expedir.

O sr. Emygdio Navarro: — Aproveito a occasião de estar presente o sr. ministro da justiça para mandar para a' mesa uma representação da camara municipal de Ponte de Sor, reclamando contra a circumscripção comarca creada pela lei de 16 de abril de 1874.

Na sessão de 21 de março de 1877 foi interpellado pelo meu illustre e respeitavel collega e amigo o sr. Pires de Lima o ministro da justiça de então, que era o sr. Mexia Salema, sobre este assumpto, isto é, sobre se s. ex.ª tencionava apresentar ao parlamento alguma proposta de lei para corrigir os vicios d'aquella circumscripção.

S. ex.ª na sua resposta reconheceu que a circumscripção comarca creada pela lei de 16 de abril de 1874 estava cheia de vicios e era em muitas das suas partes contraria aos interesses dos povos, aos quaes causava grandes vexames. E depois, no sentido de se evitarem estes vexames, nomeou s. ex.ª uma commissão de nove membros, tres dos quaes já falleceram.

Essa commissão creio que não se chegou a reunir; de modo que, tendo-se reconhecido em 1877 que a actual circumscripção comarca está cheia de vicios e causa grandes vexames aos povos, e tendo-se nomeado uma commissão para tomar conta das queixas que havia contra estes vexames e para apresentar um projecto de lei que lhes pozesse termo, nada se tem feito n'esse sentido e a circumscripção comarca continuou como estava, porque essa commissão não tem trabalhado, não chegou a resultado algum, e creio que até nem sequer se chegou a reunir, tendo-lhe já fallecido tres dos seus membros, que não foram substituidos, o que parece dar a entender que este assumpto está abandonado completamente.

O circulo que tenho a honra de representar n'esta casa é um dos que estão mais vexados por esta circumscripção. Basta citar, para prova do que digo, a villa de Montargil, que está distante da cabeça da comarca nada menos de 60 kilometros ou 12 leguas!

Alguns srs. deputados estranharam que a votação que eu tive em Montargil fosse quasi unanime. Pois não deviam admirar-se d'isso, porque uma villa importantissima, como é aquella a que me estou referindo, que não tendo recebido d'este governo o menor beneficio para as suas muitas necessidades, e de tal sorte que á menor cheia fica com as communicações cortadas e sequestrada de todo o commercio, ainda d'elle recebe o vexame odioso de a pôr a

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12 leguas da cabeça da comarca; uma povoação em taes condições não póde ter grandes sympathias pela politica do um tal governo, e era natural que desse de boa vontade os seus votos a quem se apresentou a solicital-os como representante da opposição mais intransigente.

Considerações analogas poderia eu fazer a respeito da villa de Galveias, que pertence ao mesmo concelho.

Mas bastará dizer que para se cumprir a respeito do julgado de Ponte de Sor a lei de 16 de abril de 1874 foi necessario auxiliar a violencia com a astúcia, e só muito tarde se conseguiu transferir de ali os cartorios judiciaes para Abrantes.

Foi o julgado de Ponte de Sor o ultimo que fez entrega dos cartorios, ou antes, que deixou que lh'os levassem, porque elle não os entregou.

Ora estas reluctancias nunca se manifestam senão quando ha grandes vexames, e em administração deve ter-se como regra fundamental que é inconveniente, prejudicial e iniqua a lei que produz taes incommodos e provoca taes resistencias. (Apoiados.)

O concelho de Aviz está tambem prejudicado, na circumscripção comarca; e em geral, e com relação a melhoramentos publicos, eu posso dizer que não ha talvez cinco concelhos mais desfavorecidos do que os que constituem o circulo que tenho a honra de representar.

Mas isso virá opportunamente, porque agora tenho só de referir-me á circumscripção comarca, que já officialmente se reconheceu dever ser emendada.

Mando, pois, para a mesa esta representação da camara municipal do Ponte de Sor, e peço ao sr. ministro da justiça que me dê algumas informações a respeito d'este assumpto, e me diga o que tenciona fazer dos trabalhos da Commissão, se alguns trabalhos existem, se intenta substituir os tres membros fallecidos, e, se a commissão se não reuniu ainda, se tenciona fazel-a reunir para lhe aproveitar os serviços; n'uma palavra, peço a s. ex.ª que me diga o que pensa sobre este assumpto, que me parece da mais alta importancia para o paiz.

Por esta occasião peço tambem a v. ex.ª que consulte a camara sobre se se deve ou não publicar no Diario do governo, como se fez a respeito de outros documentos analogos, uma representação mandada pelo nosso vice-cônsul em Granada ácerca do fuzilamento de um portuguez em Hespanha.

Essa representação já está na mesa, para onde foi mandada pelo ministerio dos negocios estrangeiros, e, como a camara resolveu que outros documentos a este respeito fossem publicados, eu peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se este devo tambem ser publicado.

O sr. Presidente: — A representação vae á commissão respectiva.

Quanto ao requerimento vou consultar a camara, mas peço ao sr. deputado que me diga se a publicação é no Diario do governo ou no Diario da camara.

O Orador: — Eu não sei se os outros documentos foram publicados no Diario do governo ou no Diario da camara.

Peço que conforme elles foram publicados n'um ou neutro Diario assim seja tambem publicado este.

O sr. Ministro da Justiça (Couto Monteiro): — A commissão a que acaba de referir-se o illustre deputado o sr. Navarro, creio que foi nomeada pelo sr. Mexia Salema em 28 de junho de 1877.

Não sei bem se essa commissão se chegou a reunir. Suppunho que não, e tambem quaes os motivos que a tem impedido de funccionar.

Não tenho duvida alguma em a completar, nomeando os membros que lhe faltam por terem fallecido tres outros cavalheiros que faziam parte d'ella, nem tão pouco em lhe apresentar as representações que vieram ao ministerio do justiça, assim como aquellas que já lá estiverem, a fim de as tomar em consideração, e, se for justo, propor que em

um ou outro ponto se altere a circumscripção comarca conformo for mais conveniente á boa administração da justiça.

Aproveito a occasião para mandar para a mesa uma proposta do lei. (Leu.)

Leu-se na mesa a proposta; é a seguinte:

Proposta de lei n.º 102-L

Senhores. — Os tres decretos de 16 de maio de 1832 constituem indubitavelmente um dos mais importantes monumentos da nossa legislação moderna: são, como diz um eximio escriptor na, biographia do estadista que os referendou, o termo onde verdadeiramente acaba o velho Portugal, e d'onde começa o novo.

N'esses notaveis diplomas, em que transluz a cada passo um genio desassombradamente innovador, que não hesitou em destruir para emendar o velho edificio do passado, reconhecida a impossibilidade de o corrigir dentro do plano primitivo, foram lançadas com mão ousada e firme as bases da actual organisaçao da fazenda, da justiça e da administração, que a experiencia e progresso das sciencias sociaes têem successivamente melhorado.

Creando a administração activa e contenciosa, conforme as normas da legislação franceza, e separando-a totalmente da justiça civil, com a qual andara sempre confundida no anterior regimen, incluiu o incansavel reformador na esphera da competencia administrativa os actos que legalisam o estado das pessoas na familia, e, portanto, na sociedade, como actos meramente dependentes das instituições sociaes. D'este principio enunciado no relatorio que precede os decretos de 16 de maio de 1832, e poucos annos antes proclamado pelo eminente publicista francez, que elevou á categoria de sciencia a doutrina administrativa, se derivou a instituição do registo civil, separado do registo ecclesiastico, e incumbido a funccionarios administrativos pela fórma estabelecida nos artigos 69.° e 70.° do segundo decreto d'aquella data.

O codigo administrativo de 31 de dezembro de 1836, de accordo com o decreto de 18 do julho de 1835, publicado em virtude da auctorisaçâo conferida ao governo pela carta de lei de 25 de abril do mesmo anno, incumbiu aos administradores de concelho e aos regedores de parochia, por especial delegação d'elles, a redacção do registo civil, regulando este serviço desenvolvidamente nos artigos 132.° a 135.°; mas no artigo 255.° adiou indefinidamente o legislador a execução d'aquellas providencias, deixando-a dependente da publicação dos modelos necessarios e da fixação da epocha era que o registo deveria passar definitivamente para as auctoridades administrativas, continuando entretanto a cargo dos respectivos parochos. O codigo administrativo de 1842 limitou-se a incumbir aos administradores de concelho a redacção do registo civil, promettendo para o exercicio d'esta attribuição um regulamento especial, que nunca se publicou.

O codigo civil portuguez, approvado pela lei de 1 do julho de 1867, adoptou e melhorou a instituição do registo civil dos nascimentos, casamentos e obitos, reconhecimento e legitimação dos filhos. Occupam as prescripções relativas a este importante assumpto os artigos 2:441.° a 2:491.°, em grande parte regulamentares; mas não estando ainda creadas as repartições do registo, continuou a execução d'este serviço dependente de novos regulamentos.

Quando se adverte que a instituição de um registo especial dos actos que determinam o estado civil dos individuos, separado e independente do registo dos actos religiosos, está decretada ha quasi meio seculo, tem mantido o seu logar em todas as reformas administrativas, e ainda hoje se não acha em plena execução; quando se pondera, por outro lado, que no decurso d'este longo periodo têem presidido aos destinos da nação os homens mais eminentes de todos os partidos politicos, em que se divide a familia

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liberal, occorre naturalmente que, ou essa instituição não tem sido considerada de impreterivel urgencia, ou que serios obstaculos se tem opposto á sua realisação.

Um dos maiores estorvos que até hoje tem retardado o estabelecimento do registo civil, ou, para melhor dizer, a sua separação do registo ecclesiastico, é, a meu ver, a lai ta de uma circumscripção media entre o concelho e a parochia. A dei de administração civil de 26 de junho de 1867, creando essa circumscripção o estabelecendo n'ella a sede do registo, tinha aplanado o terreno para o seu definitivo estabelecimento em todo o reino, sem grande incommodo dos povos. Essa lei foi revogada, e o novo codigo administrativo repete apenas n'esta parte o que estava estatuido no anterior, incluindo nas attribuições do administrador de concelho a de fazer o registo civil (artigo 206.º n.º 4.°).

No estado actual do nosso direito a competencia n'este assumpto pertence aos administradores de concelho, e por delegação d'elles aos regedores de parochia. É innegavel que estes ultimos, na sua maxima parte, não offerecem garantias de aptidão e idoneidade que possam assegurar o desempenho cabal de tão momentosas attribuições. Confiar a individuos ordinariamente desprovidos da mais modesta instrucção a attestação dos factos capitães da vida civil, que definem a situação legal dos individuos »n familia e na sociedade, seria pôr em grave risco os mais sagrados direitos; dar occasião a duvidas sobre a verdade e exacção dos factos attestados; lançar suspeitas plausiveis onde é indispensavel confiança; multiplicar dissensões e pleitos entre as familias; frustrar, n'uma palavra, os intuitos que recommendam esta instituição. É preciso que a auctoridade publica proporcione a todo o cidadão um meio facil, authentico, irrecusavel, de provar cumpridamente os direitos que dimanam dos factos constitutivos do seu estado civil.

Foram estas considerações que actuaram no animo do governo ao decretar o regulamento de 28 de novembro de 1878. Collocado entre a impossibilidade de alterar por acto proprio a competencia estabelecida pela lei para o serviço do registo, e a urgencia de fornecer aos subtidos portuguezes não catholicos os meios facultados aos catholicos para a determinação do seu estado civil, soccorreu-se á disposição do artigo 2:457.° do codigo civil, e regulou n'aquelle diploma especial o estabelecimento do registo para os individuos estranhos á igreja, que, attento o seu limitado numero e a circumstancia de residirem, pela maior parte, nos centros mais populosos, podem sem grande difficuldade recorrer para esse fim ás administrações de concelho. Foi este o primeiro passo para a execução do systema do codigo civil n'este importantissimo assumpto. A completa realisação d'esse systema, pela absoluta separação do registo civil e ecclesiastico, ficou assim reservada para ulteriores providencias dependentes da intervenção do poder legislativo.

A competencia dos administradores de concelho para a execução do registo, relativo aos individuos residentes na cabeça do concelho ou nas povoações mais proximas, não offerece inconveniente pratico, póde e deve sei' mantida no decretamento do registo geral obrigatario. Outro tanto não direi da competencia dada aos regedores. Considero-a inconveniente pelos motivos que ficam apontados, mas só um acto legislativo a póde transferir para outros funccionarios.

O systema do codigo civil suppõe a existencia de repartições destinadas ao registo, e não podendo as administrações de concelho concentrar em si a execução de todo esse serviço sem grande vexame dos povos mais distantes da. respectiva sede, é forçoso crear outras repartições onde a conveniencia publica as exigir, agrupando-se para esse fim duas ou mais freguezias, quando for indispensavel.

Os officiaes do registo deverão, ser retribuidos por meio de emolumentos, e poderão nas circumscripções especiaes accumular as funcções de qualquer outro emprego que não

sejam incompativeis com as do seu cargo; tornar-se-ha mais facil d'este modo o provimento de taes logares.

Da execução do registo, pela fórma determinada no codigo civil, ha de forçosamente resultar alguma diminuição nos proventos que os parochos actualmente recebem, e que constituem parte da sua congrua. E justo indemnisal-os.

São estas, resumidamente, as considerações que em cumprimento da promessa feita no discurso da corôa, na abertura da presente sessão legislativa, me levaram a submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a regular a execução dos artigos 2:445.° a 2:491.° dó codigo civil: estabelecendo circumscripções especiaes para esse fim onde não for possivel aproveitar as actuaes; creando em cada uma das novas circumscripções a competente repartição de registo; encarregando o serviço respectivo a funccionarios retribuidos por meio de emolumentos.

Art. 2.° Os officiaes do registo poderão accumular o exercicio d'este cargo com quaesquer outras funcções que não sejam com elle incompativeis.

§ unico. Não é applicavel esta disposição aos administradores de concelho, que só accumularão com o serviço do registo as demais attribuições que a lei actualmente lhes confere.

Art. 3.° Os prejuizos que aos parochos resultarem da execução d'esta lei serão, depois de liquidados, resarcidos pelo rendimento de que trata o artigo 11.° da lei do 4 de abril de 1861, emquanto não estiver definitivamente regulada a dotação do clero.

Art. 4.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer das auctorisações que por estalei lhe são concedidas.

Art. f>.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e do justiça, em 21 de abril de 1879. = Antonio Maria do Conto Monteiro.

Foi á commissão de legislação.

O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): — Mando para a mesa duas propostas de lei: uma para o governo entregar á camara municipal de Cantanhede um pinhal que existe junto áquella villa, e outra para ser auctorisado o governo a mandar emittir, pela junta do credito publico, algumas inscripções, correspondentes a uns bonds que foram queimados, a que pertenciam a um subdito inglez.

Leram-se na mesa as propostas; são as seguintes: Proposta de lei n.º 102-K

Senhores. — Ha perto da villa de Cantanhede um pinhal, denominado de S. João, de pequena extensão, avaliado em 400000 réis, que pertence á fazenda nacional, e que não convem ao estado conservar na sua administração por ser o terreno improprio para a agricultura, e por estar assentado que as propriedades florestaes de uma area inferior a 100 hectares não compensam as despezas do seu custeio. Por outra parte julgando-se a conservação do referido pinhal indispensavel para a salubridade da povoação d'aquella villa, e sendo considerado como logradouro publico, não poderia ser alienado sem graves inconvenientes.

Por estas rasões, e de accordo com as instancias da camara municipal de Cantanhede, tenho a honra de vos propor a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a entregar á camara municipal do Cantanhede o pinhal de S. João, situado na proximidade da villa de Cantanhede.

Art. 2.° A camara municipal de Cantanhede fica obrigada á conservação do pinhal de que se trata, e a proceder ás precisas sementeiras, a fim de o conservar sempre no estado que a salubridade publica reclama.

Art. 3.° O pinhal voltará para aposse da fazenda quando a camara deixo de cumprir as condições da concessão.

Ministerio da fazenda, 19 de abril de 1879. — Antonio de Serpa Pimentel.

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Proposta de lei n.º 102-M Senhores. — O dr. Robert Stodart Wyld era possuidor de 10 bonds da divida externa portugueza da emissão de 1853 no total de £ 2:000, sendo 2, n.°s 366 e 367, do £ 200; 2, n.ºs 12:266 e 12:3-18, de £ 500; e 6, n.ºs 113:523,191:531,203:297,215:029,244:606 e 24 5:453, de £ 100, que lhe foram roubados juntamente com outros valores quando viajava pela Escócia em setembro de 1876.

Descobertos os roubadores, foram estes sentenciados pelo tribunal de Edimburgo em 25 de junho e 9 de julho de 1877, declarando, então a mulher de um dos mesmos roubadores, que ignorando o valor dos papeis roubados tinham ella e o marido queimado a carteira que os continha.

Os factos assim expostos acham-se circumstanciadamente narrados nas peças officiaes (affidavits) extrahidas do processo e existentes no ministerio a meu cargo com recommendação ao governo portuguez, do ministro de Sua Magestade Britânica em Lisboa.

Considerando que, embora não se prove plenamente a destruição dos titulos, é ella presumivel não tendo sido apresentados a pagamento até hoje os respectives coupons vencidos;

Considerando não ser justo nem conveniente para o credito publico que o estado se recuse absolutamente á renovação dos titulos que emittiu, lucrando com o prejuizo dos proprietarios quando ha extravio d'aquelles titulos;

Considerando que, passando se novos titulos de assentamento, sujeitando-lhes a livre disposição á prescripção de trinta annos, com os juros pagos com atrazo de cinco annos, como se praticou com o banco lusitano pela carta de lei de 16 do maio de 1878, fica sufficientemente garantida a fazenda contra a eventualidade, pouco provavel, do reapparecimento dos bonds que se reputam queimados.

Tenho a honra de apresentar á vossa consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar emittir, pela junta do credito publico, inscripções de assentamento a favor de Robert Stodart Wyld, subdito inglez, com vencimento de juros do segundo semestre de 1876, inclusivè, em diante e com a clausula de intransmissiveis durante trinta annos contados do 1.° de julho de 1876, pela importancia correspondente, ao cambio de 54, a dez bonds extraviados no total de £ 2:000 do fundo de 1853, sendo 2, de£500,n/'9 12:266 e 12:348; 2, de £ 200, n.°s 366 e 367; e 6, de £ 100, n.ºs 113:523, 191:531, 203:297, 215:029, 244:606 e 245:453.

Art. 2.° Os juros das ditas inscripções só poderão ser pagos cinco annos depois do findo o semestre a que respeitarem, isto é, depois de prescriptos os juros dos titulos que se reputam destruidos.

Art. 3.° Se durante o praso indicado no artigo 1.º forem apresentados a pagamento os coupons dos bonds que desappareceram, proceder-se-ha á amortisação das inscripções creadas por esta lei, sem que o interessado Robert Stodart Wyld lenha direito a indemnisação alguma da parto do estado.

§ unico. O interessado, dada a hypothese do presente artigo, será obrigado a restituir ao estado os juros que houver recebido das inscripções creadas por esta lei.

Art. 4.° Decorrido o praso marcado para a prescripção dos creditos representados nos bonds, será annullada a clausula de intransmissibilidade exarada nos novos titulos, e estes ficarão livres para todos os effeitos.

Art. 5.° Reciprocamente se depois do praso da prescripção reapparecerem os bonds, serão estes considerados de nenhum valor e fóra das garantias que as leis da respectiva creação lhes confiram.

Art. 6.° Annullada a clausula de intransmissibilidade, a que se referem os artigo 1.° e 4.°, poderão ser pagos os

juros vencidos e não satisfeitos em virtude do disposto no artigo 2.°

Art. 7.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, 21 de abril de 1879. = = Antonio de Serpa Pimentel.

Foram enviadas ás respectivas commissões.

O sr. Rodrigues de Freitas: — A proposta apresentada pelo sr. ministro da justiça, responde a uma pergunta que eu tinha feito na sessão do sabbado. Disse então que desejava saber se s. ex.i1 apresentaria este anno uma proposta de lei ácerca do registo civil, e s. ex.ª acaba de a apresentar.

Não é occasião para me pronunciar a respeito do procedimento do governo, mas estimo muito que antes a proposta viesse tarde do que nunca; estimo muito que prove que vamos no caminho que nos foi aberto poios legisladores que s. ex.ª citou no relatorio da sua proposta do lei, pelo ministro do duque de Bragança, Mousinho da Silveira, e ainda por Joaquim Antonio de Aguiar, bom como por Manuel da Silva Passos, isto é, pelos decretos do 16 do maio de 1832 a 31 do dezembro de 1836.

No sabbado annunciei tambem que desejava perguntar ao sr. ministro da justiça, se tinha algumas noticias a respeito do que se passou na cidade do Porto com o hospital secreto, onde as irmãs de caridade, não sai se portuguezas se estrangeiras, ministraram varios medicamentos e uma agua que se diz milagrosa.

As irmãs de caridade que ali estavam, e que, cheias de piedade, juntavam á pomada camphorada a agua de Lourdes, pertencem a nina corporação? Obedecem ás auctoridades portuguezas? É executada a legislação de 1861 a este respeito?

E o que desejo saber do ministerio; e não me occupo dos actos de credulidade praticados ali; deixo em paz aquellas pessoas que julgam que a agua de Nossa Senhora de Lourdes differe alguma cousa da agua ordinaria

Disse no sabbado que estimava que o governo, sendo tolerante para com todas as manifestações de pensamento, propozesse leis que tendessem a levar-nos tão rapidamente quanto possivel para a liberdade dos cultos. A imposição de qualquer lei á consciencia, obrigar a ter determinadas relações com Deus, é um verdadeiro sacrilégio; por isso me pronunciei a favor da liberdade de cultos, e creio que, sem a estabelecermos, desde já podemos ir prudentemente adoptando providencias que contribuam poderosamente para que, dentro em -poucos annos, essa liberdade exista em Portugal.

Vieram estas observações a proposito de insultos feitos na cidade do Porto a um ministro da igreja evangélica, o qual n'aquella cidade fez algumas conferencias.

Eu leio á camara um breve trecho da correspondencia que elle dirigiu a um jornal; e é de lastimar que no nosso paiz, pessoas que se dizem catholicas comprehendam tão pouco o catholicismo, que julguem que ao ministro que tom idéas differentes das idéas catholicas se deva responder com injurias e com offensas corporaes.

N'esta carta diz o ministro evangelico.

(Leu.)

Conta outras proezas de individuos que conheciam tão pouco o catholicismo e o christianismo que misturavam com taes actos as vozes de — viva o Papa.

Tem o governo alguma informação a este respeito? Tem o governo dado as mais terminantes ordens para que os principios, ainda que hão tão liberaes como eu desejava, mas principios de alguma liberdade de consciencia e de culto, que estão no codigo fundamental da monarchia portugueza, sejam observados na cidade do Porto?

Referir-me-hei ainda a outro assumpto.

Na mesa já está uma representação do ex-vice-consul portuguez em Granada, ácerca do lamentavel acontecimento que ali se deu contra a vida de um nosso concida-

Sessão de 21 de abril de 1879

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dão; a camara já approvou que esta representação fosse publicada no Diario do governo.

Se estivesse presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros, eu perguntaria a s. ex.ª se julga conveniente que, nas actuaes cireumstancias, nós não tenhamos em Madrid o nosso representante; e fazendo esta pergunta creia v. ex.ª que não vae n'ella nenhuma intriga politica. A camara comprehende o que eu quero dizer com estas palavras. 'Trato a questão só em presença das cireumstancias em, que se encontra a Hespanha, e em que nós nos achámos tambem.

E conveniente que a nossa legação em Madrid seja uma das melhor tratadas em relação á representação diplomatica.

Parece-me inconveniente que não se proceda de modo que o governo saiba tudo quanto é possivel e necessario saber-se do que se passa no reino vizinho.

A Hespanha atravessa ainda' um periodo calamitoso, e embora seja uma nação de grandissimos recursos, podem todavia ali dar-se acontecimentos taes que nós devamos ser d'elles informados immediatamente, se não avisados do que está para acontecer, por isso, repito, parece-me que o governo de Sua Magestade devia pensar em ter quanto antes em Madrid um nosso representante, um ministro.

Se porventura ha algum inconveniente em que o actual ministro volte para ali, o governo de Sua Magestade deve ter coragem para tomar as providencias que n'esse caso devem ser tomadas.

Repito, nas palavras que acabo de proferir, não ha entriga politica, e acrescentarei que respeito muito o sr. conde de Valbom, como uma elevada intelligencia e como um homem que tem prestado muitos serviços a este paiz; mas o meu respeito por s. ex.ª não podia obrigar-me a calar as observações que acabo de fazer á camara.

O sr. Ministro da Justiça: — Quando no sabbado á noite tive noticias de que o illustre deputado o sr. Rodrigues de Freitas desejava fazer-me algumas perguntas a respeito dos acontecimentos a que s. ex.ª ha pouco se referiu, fiz immediatamente um telegramma para o Porto, dirigido ao conselheiro procurador regio, junto da relação do districto, perguntando-lho o que havia a tal respeito.

Hontem recebi a resposta, esse telegramma, que e]a seguinte:

«O delegado da 2.ª vara informa verbalmente que recebeu auto de investigação do commissariado de policia, constando d'elle que fulano tinha em casa um hospicio denominado de Nossa Senhora de Lourdes, no qual curava doentes, dos quaes morreram duas mulheres e outra saíu ainda doente, empregando a agua de Lourdes e pomada camphorada, intervindo n'este negocio as irmãs da caridade fulana e fulana, e outras pessoas. O delegado vae. requerer corpo de delicto.»

A referencia que se faz no telegramma a irmãs de caridade, supponho que diz respeito a uma associação existente em Lisboa, mas que não tem esta denominação, chamava-se ha pouco tempo: «Associação das irmãs hospitaleiras da ordem terceira da penitencia de S. Francisco de Assis».

Talvez que a esta associação pertençam as pessoas de que falla o telegramma.

A associação das irmãs hospitaleiras tem existencia legal. Fui eu que na qualidade de fiscal da corôa e fazenda examinei os seus estatutos, propondo algumas alterações que foram adoptadas, expedindo-se, se bem me lembro, em 1874, o competente alvará de approvação.

Dizia-se n'esses estatutos que as associadas se propunham tratar gratuitamente os doentes nos seus domicilios, na qualidade de enfermeiras, o tenho idéa de que então se denominavam: «Irmãs hospitaleiras dos pobres pelo amor de Deus».

Ignoro se ultimamente foi auctorisada alguma modificação n'este titulo, porque estes negocios não correm pela minha repartição; mas creio que nenhuma alteração foi permittida n'esta parte ou em qualquer outra dos estatutos. Não ha, pois, duvida alguma quanto á existencia legal da associação das irmãs hospitaleiras, e consta-me que têem prestado bons serviços.

Pelo que respeita ao facto da assuada que soffreu o pregador protestante, consta tambem do telegramma que tenho presente, que o agente do ministerio publico requereu a formação do competente corpo de delicto.

Por esta fórma, como o illustre deputado e a camara acabam de ver, ambos os acontecimentos alludidos estão entregues á apreciação da auctoridade judicial.

O que eu poderia fazer seria apenas recommendar-lhe o maior zêlo na instrucção e seguimento dos processos, mas nem isso mesmo julgo necessario, porque sei que os funccionarios que n'elles têem de intervir são muito dignos e dedicados ao serviço publico.

Ao governo n'este assumpto não cabe outra intervenção. (Apoiados.)

Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente: — Tom a palavra o sr. Barros e Cunha, mas eu tomo a liberdade de lho observar que a hora está muito adiantada.

O sr. Barros e Cunha: — Não digo senão duas palavras.

Sinto que o illustre ministro não julgue dever dar alguma explicação ácerca da ultima parte das reflexões feitas pelo illustre deputado o sr. Rodrigues de Freitas; julgo pois dever dizer peja minha parte o seguinte:

Não considero que seja indifferente o modo por que devo ser cuidadosamente representado o nosso paiz no reino vizinho; mas quero assegurar á camara que o facto de não estar o sr. conde de Valbom em Madrid, não prejudica por maneira alguma os interesses da nação portugueza.

Em Madrid está encarregado de negocios o sr. visconde de Carnide, que muitos dos illustres deputados conhecem, (Apoiados) moço muito intelligente o digno, que de certo não deixará correr á revelia n'aquelle paiz cousa alguma a respeito de que careça de dar informações ao governo, nem deixará de proteger e defender os interesses dos subditos portuguezes n'aquelle paiz, conforme lhe incumbe o como elle nunca deixou de fazer, fosse qual fosse a situação em que se encontrasse. (Apoiados.).

O sr. Rodrigues de Freitas: — Agradeço as explicações que acaba de dar o sr. ministro da justiça, as quaes me satisfizeram. Não devo exigir mais ao governo.

Estimo que s. ex.ª desse tanta attenção ás palavras que proferi, e estimo o, não por mim, mas pelo assumpto de que tratei.

Devo declarar que não tenho o menor desejo de que se faça qualquer perseguição ás irmãs de caridade, (Apoiados.) e não tenho absolutamente nenhum desejo d'isso. O que pretendo é que as leis do reino sejam cumpridas, mas desde o momento em que houver tolerancia para com todos, desde o momento em que o governo julgar conveninte seguir esse caminho, não serei eu quem lhe pedirá que se desvie d'elle; o que não desejava era que a favor de um lado se inclinassem mais os poderes publicos do que a favor do outro. A camara comprehende perfeitamente o que isto quer dizer.

Parece-me que ha um engano da parte do sr. ministro da justiça. Não se. trata unicamente de irmãs hospitaleiras de S. Francisco de Assis, mas de irmãs de caridade; mais de uma vez ouvi fallar na cidade do Porto, não só d'aquellas, mas tambem d'estas.

Não desconheço os serviços prestados pelas irmãs de caridade estrangeiras; o não opino com áquelles que julgam que a mulher portugueza está de tal maneira educada que preste bem todos os serviços domesticos que lhe estão incumbidos. E sabido que, por exemplo, as irmãs de caridade francezas são boas enfermeiras; e em geral sabem nos hospitaes tratar melhor do que as portuguezas. Não hesito em dizer que, segundo informações que tive, as que ha

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DIARIO DA CAMARA DOS*SENHORES DEPUTADOS

annos serviram no hospital de S. Francisco, mostraram grandes qualidades como enfermeiras.

Diante d'estes factos, ainda que não seguisse doutrinas liberaes, seria cauteloso em quanto dissesse ácerca das irmãs de caridade. Desejo, porém, liberdade para todos, e que a tolerancia bem entendida vá contribuindo para que em breve se estabeleça a liberdade dos cultos.

Permitta-me v. ex.ª que eu diga muito pouco ácerca das palavras proferidas pelo sr. Barros e Cunha.

Agradeço os esclarecimentos dados por s. ex.ª. Eu de maneira alguma podia proferir qualquer phrase contra um individuo que não conheço e ácerca do qual não tinha informações algumas; nem sabia que o sr. visconde de Carnide era o secretario da legação; mas ainda quando seja muito habil como diplomata e que tenha todo o cuidado para informar o governo de quanto convem que saiba do que se passa em Madrid, a camara comprehende que um ministro e um secretario desempenham melhor o serviço da legação do que um secretario sómente. Não devo agora dizer mais nada.

O sr. Presidente: — Vao entrar-se na ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão na generalidade do projecto de lei n.º 81 (orçamento geral do estado)

¦O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Saraiva de Carvalho.

O sr. Saraiva de Carvalho: —... (O sr. deputado

não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Carrilho: —-... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a mesma que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e tres quartos da tarde. ]

E-N.» 215

Senhores deputados da nação portugueza. — O bispo da diocese de Angra do Heroismo, constando-lhe que se pretende sobrecarregar os poucos bens ecclesiasticos que restam por vender, assim como os mesquinhos patrimónios particulares do clero como dobro da contribuição predial directa, pede licença para lazer a tal respeito as seguintes reflexões:

Segundo o que se acha prescripto na lei fundamental da nação, ena conformidade do que dieta a rasão — todos os cidadãos, tanto da ordem phisica como moral devem ser iguaes perante a lei. De facto, porém, não se dá entre nós essa igualdade para com a igreja catholica, não obstante ser a religião do estado.

O direito de propriedade, que a todos é concedido como fundamento de progresso e de liberdade, é negado á igreja. Tinha ella bens mais que sufficientes para satisfazer as suas necessidades. Foram-lhe tirados com promessa de se occorrer a essas necessidades; e todos sabem como se tem cumprido tal promessa.

O homem é por natureza sociável; isolado nada póde, associado, porém, faz maravilhas. Por isso o direito da associação é permittido geralmente a todos os homens, e para todas as emprezas; excepto, porém, áquelles que para melhor poderem tratar do importante negocio da sua salvação, e da' do proximo, pretendem reunir seus esforços e praticar os conselhos evangélicos!

É de direito natural que se pague a quem trabalha, pro-vendo-se á sua subsistencia, não só emquanto consome suas forças no serviço alheio, mas ainda depois quando já não póde trabalhar, porque não ha de morrer á fome por occasião da enfermidade e da velhice. Com effeito, todas as classes dos que se empregam no serviço publico têem assegurado o seu futuro: os militares têem a reforma; os professores a jubilarão; os magistrados a aposentação; os ministros, porém, da religião do estado têem apenas o trabalho muito mal retribuido emquanto podem, e depois a miseria, l> abandono.

Quasi todos os empregados publicos têem accesso, aspirando sempre a melhorar de posição; o que lhes serve de estimulo o consolação para a velhice; o padre podia n'outro tempo aspirar a uma conesia, hoje, porém, nem a isso póde aspirar.

Só os criminosos, o estrangeiros são excluidos de poderem tomar na parte governação publica; o a par d'estes foram collocados os ecclesiasticos que, a não ser nas camaras legislativas, a que poucos podem chegar, nem das humildes juntas de parochia podem presentemente fazer parte! Não o digo por sentimento, mas unicamente por enumerar os factos.

Vê-se, pois, que o clero não participa da igualdade perante a lei, sendo-lhe negados os direitos de propriedade, de associação, de subsistencia, de aspiração, e á magistratura. E como se isto não fosse bastante, pretende-se aggravar-se-lhe ainda a sorte fazendo-o contribuir com o dobro do que os outros cidadãos contribuem!

Dá-se como rasão o possuir bens amortisados, que nada rendem para o estado. Isto, porém, não é exacto.

De duas ordens são esses bens que se querem fazer contribuir; o resto dos bens da igreja que estão por vender, e os miseraveis patrimónios particulares do clero. Vejamos se taes bens estão na verdade amortisados.

Os primeiros não sei como se podem dizer amortisados estando, como estão, á venda! Terá por acaso a igreja culpa, e poderá ser com justiça multada porque ainda se não venderam todos?!... E nem póde tardar que sejam vendidos visto darem-se por todo o preço que por elles se offerece; rebaixando-se até quasi a darem-se gratuitamente, quando não apparece comprador. Alem d'isto alguns ha cujo rendimento, como os dos passaes dos parochos, lhes entra no computo de suas congruas; e portanto o que se lhes subtrahir será defraudando as congruas arbitradas, que, em regra, bem insignificantes são.

Os patrimónios canonicos dos padres tambem se não podem considerar amortisados, porquê lhes é licito venderem-n'os, trocarem-n'os, substituindo-os por outros, com licença do ordinario, como acontece a cada passo. Nem a lei civil reconhece ou respeita tal vinculação.

Como estão, pois, amortisados?

E quando o estivessem seria por poucos annos, apenas ¦ até á morte do padre, isto é, trinta ou quarenta annos, quando"muito.

E poderá considerar-se amortisado um predio que não muda de possuidor durante esse praso de tempo? Se assim fosse amortisada estaria toda a propriedade, porque qual é a que muda de possuidor dentro d'elle?

Tal medida, pois, viria afastar do estado ecclesiastico grande numero de vocações, que mui diminutas são já no tempo presente; porque é necessario dizer toda a verdade, grande parte da contribuição não recairia sobre os padres, mas sobre aquellas pessoas que lhes prestam bens para constituirem em patrimonio ecclesiastico, sem que os padres jamais os possuam, não tendo estes bens alguns. E quem se prestaria d'aqui em diante a fazer tal favor, ficando sujeito a tão grande onus?

Eis aqui os resultados que"produziria tal medida. E o thesouro publico pouco ou nada com ella lucraria; porque, alem de ser o clero cada vez mais diminuto, facilmente se livraria de tal onus, transferindo os parochos o patrimonio para o seu beneficio, e constituindo os ordinandos o seu em titulos de divida publica, não sujeitos a contribuições.

E acabaria este pleito em serem dispensados os patrimónios como inuteis nos tempos presentes, e servindo só do

Sessão de 19 de abril de 1879

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DTARTO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

embaraço as vocações, como tive já a honra de representar a Sua Santidade.

Concluo por protestar que me não leva o interesse proprio, nem mesmo particular da minha diocese, a dar este passo, porque não tenho patrimonio em propriedades sujeitas a contribuições directas, nem ha presentemente n'estas diocese quasi bens alguns ecclesiasticos sobre que ellas possam recaír.

E unicamente o dever de bispo catholico que me leva a apresentar a esta respeitavel assembléa legislativa as ponderações feitas; esperando de sua illustrada prudencia e alta sabedoria as tomará na consideração que merecerem.

Angra do Heroismo, 14 de abril de 1870=João Maria, bispo de Angra.

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