SESSÃO DE 28 DE ABRIL DE 1888 1257
O sr. Franco Castello Branco: - Mando para a mesa a seguinte moção de ordem:
«A camara, considerando que o governo não respeitou os seus compromissos relativamente á emissão das novas acções do banco emissor, passa á ordem do dia.»
Sr. presidente, antes de entrar nas considerações que tenho a fazer sobre o assumpto que se está discutindo, preciso dirigir uma pergunta ao sr. ministro da fazenda, se estou persuadido de que, n'uma questão d'esta ordem, s. exa. não deixará de responder immediatamente; tanto mais que a minha pergunta versa sobre uma questão de facto, e a resposta reduz-se em ultima analyse a um sim ou um não.
Se, pois, o sr. ministro não responder, será unicamente porque não quer, e n'este caso eu terei o direito de tirar do seu silencio as illações que entender. (Apoiados.}
É corrente em Lisboa, e eu sei-o por mais de um interessado nos negocios do banco de Portugal, que já está negociado um contrato, entre a sua direcção e um grupo de capitalistas d'esta praça, para este tomar, ao preço de 120$000 réis por cada acção, todas as que, pelo aviso ou annuncio mandado publicar pela mesma direcção, não forem subscriptas de preferencia pelos actuaes accionistas.
Desejo saber se este facto é verdadeiro, o se d'elle tem conhecimento o sr, ministro da fazenda. E pergunto isto, acreditando bem que, se o facto existe, elle terá sido logo communicado a s. exa. pelo governador do banco, que é não só um homem politico importante, mas um membro distincto da classe commercial que, pela sua intelligencia e pelo seu criterio, deve comprehender o grau de importancia que tem uma deliberação d'esta ordem.
Não creio, portanto, que, se só tomou essa resolução, se ha contrato ou principio de contrato, o governador do banco deixasse de communicar o facto a s. exa.
No emtanto, preciso ouvir do governo uma declaração a tal respeito.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Respondo ao illustre deputado que eu tive a mesma informação que s. exa. Teve. Communicaram-me que a administração do banco de Portugal fez um contrato com a casa Fonseca, Santos & Vianna, com os bancos Commercial de Lisboa, Lusitano e Lisboa & Açores, para lhe tomarem firmes as acções que sobejassem das que fossem tomadas pelos actuaes accionistas.
O Orador: - A 120$000 reis?
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - A 120$000 réis.
O Orador: - É informação official?
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Como s. exa. queira.
Orador: - Como eu queira?! Mas é, uma questão de facto: v. exa. é quem deve saber. (Apoiados.) Ha realmente cousas que espantam!
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho) : - Esta nada tem de espantar. Eu não tenho officio em que se me communicasse o facto, a que s. exa. se referiu ; mas tenho uma declaração verbal do sr. governador do banco.
O Orador: - O sr. Pereira de Miranda merece, como outro qualquer cavalheiro, toda a consideração, e portanto uma declaração verbal de s. exa. vale tanto como se fosse escripta. E quanto me basta. (Apoiados.)
Sr. presidente, eu não desejo melindrar seja quem for e muito menos quem não tenha assento n'esta camara; não desejo mesmo ter de criticar ou censurar os seus actos, senão quando isso seja absolutamente indispensavel para avaliar qual devesse ser o procedimento do governo sobre o assumpto que se está discutindo; entretanto, como não saio de Lisboa, se eu offender alguem, não me ficará mal fazel-o, porque tomo inteira responsabilidade do que disser.
Era virtude das declarações que a camara acaba de ouvir ao sr. Marianno de Carvalho, fica perfeitamente conhecida, até á evidencia, a rasão por que o annuncio se publicou apenas com cinco ou seis dias de antecipação, (Apoiados.) relativamente ao fim do praso marcado aos accionistas do banco de Portugal para poderem usar do seu direito de preferencia. Está conhecido o motivo por que se interpretam de um modo, a meu ver, falsissimo os estatutos para não se permittir o uso d esse direito em toda a sua plenitude. (Apoiados.) Está igualmente reconhecido quanto se torna necessario e até indispensavel que o sr. presidente do concelho, que seguramente não se declarou sentinella vigilante, quer do ministerio, quer da maioria, tão sómente para proferir uma phrase banal, volte os seus olhos para o que se está passando, e grite ás armas contra este assalto que se vae dar ao credito do banco emissor, e aos direitos dos accionistas e interesses do estado! (Apoiados.)
Sem fazer d'esta questão uma questão politica, chamo para o que vou expor e para o que já tem sido exposto sobre o assumpto, toda a attenção do sr. ministro da fazenda e do sr. presidente do conselho.
As acções do banco de Portugal estavam cotadas na praça de Lisboa, ha dias, na rasão de 140$000 a 143$500 réis cada uma. Ha um contrato feito com banqueiros d'esta praça, para elles tomarem, na rasão de 120$000 réis, uma grande quantidade das novas acções; e digo uma grande quantidade, porque a ha de haver necessariamente, desde que se estabeleceu um limite aos accionistas, no exercicio do seu direito de preferencia. Ora, d'este modo, por cada acção, resultará, sem risco nem responsabilidade de especie alguma, um lucro de 20$000 réis, que em relação a 1:000 acções representa 20:000$000 réis, e, portanto, esse syndicato vae metter na algibeira tantas vintenas de contos, quantos forem os milharem de acções que não sejam subscriptas pelos accionistas.
Vejam v. exas. isto e digam-me se tal facto póde se tolerado! (Apoiados.)
E grita se depois, que fomos violentos n'esta camara; que usâmos da diffamação como arma politica! E clama se contra a decadencia dos nossos costumes politicos; e, parece incrivel, ainda ha quem se indigne contra aquelles que não querendo deixar se levar na torrente protestam com toda a energia da sua palavra contra os que pretendem arrastar nos para esse caminho! (Apoiados.)
Pois sr. presidente, eu pertenço ao numero dos que protestam e que não querem seguir por um caminho que não sei onde nos poderá levar; (Apoiados.) o commigo protestam todos aquelles que pensam por esta fórma, como é do seu legitimo direito e, mais do que isso, como é da indeclinavel obrigação de todos os que não vão interessados em similhantes negocios. (Apoiados.)
Poderão responder-me que a emissão de 5.500:000$000 réis de novos titulos do banco de Portugal, o lançamento na praça ou a offerta de 55:000 novos titulos, podia produzir uma baixa no preço que elles actualmente têem na praça de Lisboa. Mas então a responsabilidade de tal facto pertence exclusivamente ao sr. ministro da fazenda, que permittiu a emissão de 5.500:000$000 réis n'uma unica serie, e não em tantas quantas as precisas para não abalar o seu mercado, como a lei expressamente lhe facultava.
Alem d'isso como v. exa. de certo comprehenderá, ainda que no mercado houvesse uma pequena oscillação, como ha sempre, quando n'elle se lançam novos titulos, iguaes aos outros que já lá estão, essa, oscillação não corresponderia de certo ao lucro de 20$000 réis por titulo, e foi, portanto, para se colherem grandissimos lucros, que o governo consentiu no que se vae fazer, e aliás nunca deveria ter-se praticado.
É necessario fallar ainda mais claramente n'esta questão, do que era qualquer outra. É tempo de acudir a um acto, que eu julgo attentatorio dos costumes publicos, dos inte-