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Publica-se novamente o seguinte discurso, proferido na sessão de 11 de abril, e publicada no Diario n.° 84, por ter apparecido com algumas inexactidões.

O sr. Fernando de Mello: — Para cumprir o regimento, visto que pedi a palavra sobre a ordem, devia ler e mandar para a mesa as minhas propostas; mas V. ex.ª sabe e A camara que o meu bondoso amigo, e nosso respeitavel collega, o sr. Reis Moraes, auctorisando essas propostas com a sua assignatura, quiz ter a bondade de as enviar para a mesa quando ha pouco fallou sobre esta materia. Recorro pois a essas propostas, e vou dizer poucas palavras em defeza d'ellas; defeza de que não carecem depois das observações que acabou de fazer aquelle nosso illustrado collega, mas que eu não posso, como um dos assignadores, deixar de fazer, bem ou mal, para satisfazer á responsabilidade que tomei. Direi pois poucas palavras e em breve tempo.

V. ex.ª sabe que eu estava inscripto sobre a generalidade d'este projecto, e que não tive a palavra, nem me podia caber, porque a camara julgou a materia discutida muito, antes do logar em que eu me achava na inscripção.

Não pude por isso dizer as rasões por que approvava o projecto. Não desejo de modo nenhum agora, na discussão da especialidade, fugir para esse campo e fundamentar as rasões que deliberaram o meu voto de approvação na generalidade do projecto que se discute. Devem de ser muito proximas senão as mesmas que determinaram a maioria na mesma approvação.

A maioria julgou de necessidade a apresentação de um projecto sobre reforma de administração civil, e é isto que se vota na generalidade segundo o regimento. Votei isto tambem, mas não terei duvida, como talvez muitos dos meus collegas a não terão igualmente, de aceitar mais responsabilidade do que esta, porque para mim quem vota a generalidade de um projecto, de certo vota o seu principio fundamental, embora depois na especialidade possa discordar n'um ou n'outro ponto, e apresentar modificações ou mesmo profundas alterações em alguns dos seus artigos. Eu Concordo na necessidade de uma reforma administrativa, necessidade reclamada e reconhecida desde ha muito tempo, porque tudo o que temos sobre esta materia data já de 1842.

Aceito o principio fundamental do projecto. Aceito este em quasi todas as suas disposições, embora tenha de alterar uma ou outra; e declaro desde já a V. ex.ª que na discussão dos diversos capitulos terei mais de uma vez occasião de apresentar propostas de substituição e até eliminação a muitos dos seus artigos.

No capitulo que se discute agora poucas alterações tenho a propor. Aceito a suppressão dos districtos (apoiados) indicada no projecto, e não proponho a suppressão de mais alguns, porque me parece que nós ainda não estamos em circumstancias de o fazer; mas em todo o caso, bom é que nos vamos habituando a estas suppressões, para que mais tarde se possam reduzir mais, até que a reducção chegue a pouco mais do que um districto em cada provincia, ou mesmo até a esse numero (apoiados).

Nos districtos que eu conheço, e que já não figuram este projecto, a suppressão é bem cabida (apoiados). Em relação aos outros não me intrometto directamente n'essa questão, mas tenho visto apresenta-la e trata-la de fórma que para mim está sendo muito suspeita.

Em relação ao districto da Guarda, vi que á falta de boas rasões se adduziu em favor da sua conservação a protecção de altas influencias politicas, e não me parece um dos melhores argumentos para nos convencer logicamente da necessidade de ser conservado (apoiados).

Eu sei que o estado de viação daquelle districto póde ser por emquanto um obstaculo á sua suppressão; mas se elle não for supprimido desde já, bom é que lhe fique a sentença lavrada, e que se não faça esperar muito a sua annexação a um outro districto. E declaro a V. ex.ª e á camara com toda a franqueza que o meu desejo era de que a suppressão não só comprehendesse a Guarda, mas tambem Castello Branco (apoiados). Não concebo bem que se supprima o districto da Guarda e se conserve o de Castello Branco. E quando se removam, como se devem remover, as difficuldades da viação, dos dois districtos deve nascer um só, e todos sabem que a séde d'esse novo districto deve ser a Covilhã. A suppressão dos dois districtos concebe-se; a suppressão do districto da Guarda, conservando-se o de Castello Branco, não se póde conceber (apoiados).

O districto de Portalegre tambem se diz ser um dos privilegiados. Não quero entrar n'esta questão, porque não conheço muito da provincia do Alemtejo.

Ouvi notar com grande descontentamento que se supprima o districto de Portalegre e se conserve o de Beja. Parece-me melhor, para cortar a questão, supprimir ambos (apoiados). Os que impugnam a suppressão do districto de Portalegre escandalisam-se por não ter sido supprimido o districto de Beja. «E uma injustiça relativa»; dizem elles. Pois bem; para haver justiça absoluta supprimam-se ambos (apoiados).

E talvez que isto fosse uma cousa muito exequivel. Conservando o districto de Evora, e trazendo uma parte da provincia do Alemtejo para o districto de Lisboa, talvez que se podessem harmonisar as cousas acabando com estas injustiças relativas, que são na verdade as que mais custam a supportar (apoiados). A facilidade de communicações na provincia do Alemtejo favorece mais do que em outra qualquer a possibilidade de grandes districtos. Ha muito tempo que é reclamada por todos no parlamento, e fóra d'elle, a necessidade da reducção dos districtos (apoiados). A primeira vez que se aventou n'esta camara essa idéa, creio que poucos foram os seus membros que a não applaudiram (muitos apoiados). Hoje alguns não estão perfeitamente na mesma opinião, mas isso é porque desejavam que a suppressão não fosse á sua casa, e só fosse á casa do vizinho (apoiados).

Nada mais direi em relação aos districtos, porque defender a suppressão d'aquelles, cuja suppressão não foi impugnada, parece-me um trabalho escusado; e em relação aquelles, cuja suppressão tem sido contestada, na verdade não tenho visto apresentar argumentos que convençam da desvantagem d'essa suppressão. Por consequencia declaro a V. ex.ª que voto o artigo 2.° como está no projecto.

Emquanto aos concelhos, é reconhecida por todos a necessidade de lhes augmentar a area e a população. Sabemos todos que muitos concelhos até agora existentes lutavam com graves difficuldades para satisfazerem os seus encargos, que ainda assim não eram tão grandes como hão de ser depois de convertidos em lei este projecto e outros que com elle estão ligados. Sabemos muito bem que muitos d'esses concelhos não tinham pessoal, e provava isso a necessidade das repetidas reeleições. Era por consequencia indispensavel augmentar os concelhos, e era indispensavel augmenta-los ainda mesmo quando se conservassem as mesmas attribuições e despezas, quanto mais quando as attribuições e despezas augmentam em tão grande escala por este projecto e pelos subsequentes.

A cifra de 5:000 fogos proposta pelo governo, parece-me todavia grande de mais.

Devo declarar a V. ex.ª, com franqueza, que não gosto d'esta delimitação de concelhos pelo numero de fogos (apoiados); e se eu não tivera medo de me alcunharem de mais ministerial do que o proprio ministerio, o que seria uma injustiça creio que para todos os meus illustres collegas, mas muito especialmente para mim, na posição politica que tenho occupado n'esta casa, eu contentar-me-ia com o artigo 8.°, e supprimia completamente o artigo 5.° Logo que o governo tivesse em vista todos os factos que elle pondera no artigo 8.°, e tivesse ouvido todas as corporações a que se refere o artigo 3.°, dava-me por completamente 'satisfeito, e não precisava limites para a organisação de concelhos, nem pelo numero de fogos, nem pela area territorial.

Todos nós cabemos que ha de haver grandes difficuldades para se arranjarem concelhos de 5:000 fogos, e tambem sabemos que para ser delimitado um concelho pela area territorial simplesmente póde dar quasi um deserto. Estes dois pontos de partida, tomados de per si, podem dar resultados inconvenientes; por isso eu contentava-me com as prescripções geraes dos dois artigos citados, porque ahi estão firmados os principios de uma justa divisão municipal e concelhia. Mas eu confesso que não tenho coragem para formular esta proposta.

O sr. José de Moraes: — Tal ella é.

O Orador: — Tal ella é, diz o meu collega, o sr. José de Moraes, a quem muito respeito, e conselheiro que me tem acompanhado sempre n'estas lides parlamentares desde que entrei para esta casa (riso). A proposta era boa, mas a minha voz é muito pouco auctorisada, sou vulto muito pequeno para formular uma proposta tão grande. (Interrupção do sr. José de Moraes.) A proposta não é pequena, é a unica racional que encontro para uma divisão administrativa.

Eu appello para a camara e para o meu collega que me honrou com o seu áparte, que me diga se ha nada mais racional do que attender a todas as condições de riqueza, de população, de affinidades, de relações commerciaes, e mesmo de tendencias dos povos, e isto sanccionado pelas informações dos corpos competentes, como são as camaras municipaes, juntas geraes dos districtos e os governadores civis.

Pergunto — não serão estes os unicos dados possiveis para se fazer uma boa divisão territorial? E depois d'elles não devemos acreditar no bom senso do governo, que os ha de apreciar e fazer obra por elles?

O sr. José de Moraes: — Mas eu não acredito n'elle.

O Orador: — Se o illustre collega não acredita n'elle, eu acredito piamente. Em todo o caso, tendo apparecido no projecto uma restricção, quando o proprio governo a aceita ou a propõe, não serei eu que proponha a sua eliminação, e digo aceito-a com a mesma idéa com que o governo a apresentou; quer dizer, que este numero de 5:000 fogos, e de que eu proponho a reducção para 3:000, não será o unico termo que se ha de tomar para formar concelhos; a esta condição hão de vir agrupar-se todas as considerações necessarias para formar concelhos com pessoal e riqueza sufficientes para a sua administração e sustentação, mas em uma area dentro da qual a boa administração seja possivel.

Tendo necessidade de aceitar o numero de fogos para a formação dos concelhos, não posso aceitar o de 5:000 fogos, nem póde ser, porque na maior parte das provincias, já não quero referir-me á provincia do Alemtejo, aonde era quasi possivel arranjar um concelho com 5:000 fogos dentro n'uma area rasoavel, mas á provincia da Beira, um dos circulos de cuja provincia eu tenho a honra de representar, o concelho de 5:000 fogos tomava uma extensão de terreno tão grande e" de tal fórma accidentado, com tantas difficuldades de communicação, senão com impossibilidades, que era um completo desacerto forma-lo assim.

Eu apresento o numero de 3:000 fogos em logar de 5:000 e talvez ainda muitos dos meus collegas que conhecem melhor do que eu a provincia da Beira (O sr. Quaresma: — Apoiado, apoiado.); que conhecem muito melhor do que eu as outras provincias, talvez ainda achem este numero demasiadamente grande (apoiados). No entretanto eu sei que é necessario para as attribuições que se vão dar aos corpos municipaes em cada um dos concelhos, haver garantias de pessoal e garantias de riqueza.

As camaras municipaes vão ter maior numero de vereadores e muitas mais attribuições, e é indispensavel que haja nos concelhos não só pessoal habilitado para esse numero, mas para a sua renovação. Mal irá ao concelho que não tiver mais do que o pessoal restrictamente necessario para occupar os cargos que a lei determina. E necessario tambem que os municipios tenham receita sufficiente. Sobre as contribuições do estado, as camaras municipaes não podem lançar senão addicionaes até um certo limite; 40 por cento no orçamento ordinario e mais 10 por cento no extraordinario. E necessario para que os concelhos tenham vida duradoura, que elles se não vejam obrigados a esgotarem o ultimo termo d'esses addicionaes. Para tudo isto é necessario que os concelhos sejam grandes, e parece-me que o numero de 3:000 fogos poderá na maior parte dos casos reunir todas as condições.

Continuando na analyse do projecto, eu entendo que devem ser eliminadas as palavras do ultimo periodo do artigo 5.°, que dizem = a area territorial assim annexada a taes concelhos, não conterá menos de 3:000 fogos =.

Refere se este periodo aos concelhos formados nas cidades ou villas que tiverem mais de 5:000 fogos, aos quaes devem ser annexados segundo o projecto mais 3:000. Eu não julgo necessario que se limite o numero de fogos que se hão de annexar n'este caso. Eu concebo que fóra dos muros d'essas cidades ou villas haja um certo numero de povoações que devam ser aggregadas; mas como já devemos suppor no pessoal da cidade garantias para a boa admnistração, devemos ir fóra dos muros só procurar a commodidade das povoações circunvizinhas. Se o numero tem rasão de ser para os concelhos de 3:000 fogos, para os concelhos ruraes, o numero augmentado por 3:000 fogos nas cidades não creio que tenha justificação possivel, e por isso contento-me com o que diz o artigo, eliminando aquellas palavras.

O outro artigo, a que proponho substituição, é o artigo 6.° Eu digo com toda a franqueza a V. ex.ª que não sei a rasão por que este artigo esta no projecto. Que vantagens tirâmos nós de elevar o numero de fogos de certos concelhos á custa de municipalidades aggregadas, conservando-se lhes o seu regimen municipal?

Não concebo, não comprehendo a rasão por que se hão de augmentar alguns concelhos com outros que não vão dar nem pessoal nem riqueza áquelles a que vão ser annexados. Elles podem conservar a sua municipalidade; por consequencia toda a sua riqueza e pessoal fica para si, e nenhum auxilio vão dar aos concelhos a que se juntem.

A rasão que nós temos para prescrever o numero de 3:000 fogos não é de modo algum satisfeita com esta aggregação de municipalidades, porque as municipalidades assim aggregadas não lhe levam nem pessoal nem riqueza.

Parece-me que se n'este artigo se quiz transigir com o desejo que se deve suppor em todos os municipios de continuarem a existir, se se quiz mesmo aceitar o principio de que a municipalidade tem uma certa natureza que é sua, e de que vive encontrada pela lei politica, mas não creada por ella; se se quizeram conservar as municipalidades todas, ou quasi todas actualmente existentes, não se escolheu bom meio e nem se consegue o fim. Eu apresento em substituição a este artigo um outro, que me parece mais logico com os principios estabelecidos no projecto, e com todas as rasões que tenho visto adduzir para a boa divisão e formação dos concelhos.

Eu não proponho a morte de nenhum dos concelhos que actualmente existem. Quando morrerem só poderão queixar-se das suas circumstancias. A lei mostra-lhes a sua boa vontade de que vivam emquanto tiverem rasão para existir.

Eu digo que podem existir e viver todos os concelhos que satisfaçam ás prescripções do artigo 11.º, todos aquelles que tiverem meios sufficientes para viverem dentro do limite que a lei marca; todos aquelles que tiverem pessoal para satisfazer ás suas necessidades dentro do mesmo limite; todos aquelles contra a existencia dos quaes as camaras municipaes não reclamem; finalmente todos os que não incorrerem n'alguma das condições do artigo 11.º d'este projecto.

Vivam vida sua, e tenham não só municipalidade mas administrador, porque não acho vantagem nenhuma em que sejam aggregados a outros concelhos. Agora se elles não podem viver, tambem não levarão a mal a sua suppressão. E depois a unica vantagem que se lhes dá de serem annexados a outros concelhos, como disse ha pouco o sr. Reis Moraes, limita se a 200$000 réis, quando muito; é a unica economia que ali se póde fazer, e em troca d'isso perdem a sua autonomia.

O administrador do concelho póde perceber de gratificação 300$000 réis, e um proposto em qualquer d'estas municipalidades aggregadas poderá perceber não menos da terça parte, isto é, 100$000 réis.

Ora, aqui tem V. ex.ª de que o concelho fica alliviado, de 200$000 réis, e nada mais, tendo além d'isso os mesmos encargos que um concelho d'esses que têem o tal numero de 3:000 fogos; tem as mesmas obrigações em relação á instrucção primaria e a todos os objectos de despeza que outros quaesquer concelhos têem.

Por 200$000 réis não vale a pena que elles percam as regalias que podem conservar quando estejam em boas circumstancias para viver dentro dos limites que lhes marca a lei.

Pouco mais poderia dizer em abono das minhas propostas; e visto que já deu a hora, para não cansar a camara, que de certo o deve estar já com esta discussão, limito por aqui as minhas observações em relação a este capitulo, e