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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

(Ergue-se o sr. ministro da fazenda, e faz menção de saír.)

Sr. presidente, na sequencia d'este meu desalinhado discurso, eu tenho de me referir a algumas palavras que foram aqui proferidas pelo sr. ministro da fazenda. Naturalmente s. ex.ª ausenta se da camara para tratar negocios de mais alta importancia, mas em todo o caso eu continuo.

Vozes: — Já volta.

O Orador: — Tanto melhor, porque fico mais desafogado. No discurso feito pelo meu illustre amigo, o sr. Rodrigues de Freitas, e creio que s ex.ª me permittira dar-lhe este doce nome, já s. ex.ª verberou com a eloquencia que todos nós lhe conhecemos, os desacertos, a falta de grammatica, a confusão e até o inconstitucionalismo da resposta á falla do throno; e eu não quero repetir os argumentos adduzidos pelo sr. deputado; por dois motivos: em primeiro logar porque os não dizia tão bem, e em segundo logar porque tenho outras cousas de que tratar.

No seguudo paragrapho do projecto de resposta ao discurso da corôa, diz-se: «No meio das agitações que tem perturbado a paz da Europa, acolheu a camara com vivo regosijo as declarações de continuarem inalteraveis as nossas amigaveis relações com as potencias estrangeiras, e de ter havido em toda a parte do reino a mais completa tranquilidade publica.»

Eu chamo a attenção da camara para esta confissão, que eu acho pelo menos ingenua.

Quando estão de pé accusações vehementes e terriveis da parte do illustre deputado, o sr. Dias Ferreira, porque s. ex.ª empenhando a sua palavra de honra, disse que havia de mostrar que tinha havido associação criminosa entre o sr. presidente do conselho, e a auctoridade que tinha dirigido as eleições em Arganil; quando o sr. Luciano de Castro, membro conspicuo do partido historico, aqui descreveu os escandalos eleitoraes de Villa Verde...

O sr. Luciano de Castro: — Apoiado.

O Orador: — Quando o meu illustre amigo e collega eleito por S. Pedro do Sul, o sr. Bandeira Coelho, aqui vier demonstrar que a sua vida esteve em risco, porque um bando de homens armados em nome do despotismo e da anarchia, e portanto em nome do governo, queriam falsear a urna, e ferir e matar aquelles que por parte da opposição defendiam a liberdade do voto; quando tudo isto se tem passado, é então que o governo se atreve a dizer á camara e ao paiz que em toda a parte do reino tem havido a mais completa tranquillidade publica.

E não fallo das eleições de Mirandella e de Macedo de Cavalleiros, porque essas ainda não foram discutidas. Mas quando chegarmos a essas eleições, será occasião de demonstrar as gentilezas praticadas pelo governo, e digo governo porque eu não vejo n'estas questões senão o poder central. Vejo o governo, não vejo os mandatarios (apoiados).

E estou á espera das accusações vehementes que hão de aqui ser feitas pelo sr. Dias Ferreira, e ás quaes s. ex.ª não póde faltar, porque empenhou a sua palavra de honra. E então perguntarei ao governo se em todo o paiz reinou a mais completa tranquilidade publica durante o acto eleitoral!

Eu podia fallar da minha eleição; podia fallar dos actos praticados no meu circulo; podia dizer como o governo entendeu que devia interferir desleal e illegalmente n'esse actos que é o primeiro na vida constitucional de um povo; podia dizer como as regalias do cidadão foram acatadas pelo governo; podia mostrar como o meu circulo foi posto em estado de sitio, percorrendo a tropa as povoações desfavoraveis ao governo, como por exemplo em Figueira de Castello Rodrigo, onde a tropa esteve vinte dias aquartellada nas freguezias adversarias do ministerio, e bem assim nos concelhos de Fornos de Algodres e Aguiar da Beira, cujas guarnições levavam recommendação especial para tratar com todo o carinho auctoritario e paternal os povos, porque a auctoridade, quando ella é representada pelo actual sr. presidente do conselho, costuma ser de uma brandura e bondade que faz lembrar aquelle celebre knout que na Russia foi o symbolo da lei.

Podia fallar de tudo isto, dos guardas fiscaes, que abandonaram a fronteira para se tornarem agentes eleitoraes e de muitos outros actos, em que não quero insistir por emquanto até que seja mais conveniente fazer uma narrativa minuciosa.

Eu sou parte n'isto, e poderá alguem dizer que venho fallar aqui em nome da paixão, o que eu não quero.

Vozes: — Falle, falle. Foi testemunha.

O Orador: — Por ora não quero. Ficará para outra vez.

Mas se o governo, na discussão pendente, ou na discussão das eleições que ainda faltam, se atrever outra vez a dizer que houve a mais completa tranquillidade publica durante o acto eleitoral, eu hei de apresentar provas e documentos que hão de desmentir completamente tal asserção.

Com grande espanto meu não se falla na resposta ao discurso da corôa de um acontecimento gravissimo que se deu ultimamente, porque é sempre um acontecimento gravissimo uma crise ministerial, da qual resulta a saída de um ministro, na minha opinião o mais conspicuo (apoiados), entre os que compõem o gabinete.

Eu conheço os elevados talentos e as altas qualidades do cavalheiro que foi obrigado, posso quasi affirma-lo, em nome do decoro, em nome da dignidade, em nome da boa rasão, a saír do seio do ministerio.

Não tenho a menor duvida em dizer aqui em voz bem alta, que era elle o membro mais conspicuo do governo, e que tendo saido do ministerio, o que ali resta não é para se lhe comparar (apoiados).

Mas o governo não fallou n'este successo no discurso da corôa. Qual a causa d'esta omissão? Qual o motivo de tal eliminação? Porventura podiam assim os srs. ministros fugir á responsabilidade que lhes ha de caír effectiva e completa sobre a cabeça por causa d'este acontecimento, que eu julgo gravissimo e importantissimo, que eu julgo capital? (Apoiados.)

Os srs. ministros provavelmente limitam se a responder com o silencio. Como disse o sr. Saraiva de Carvalho, o silencio está arvorado em principio, em fundamento unico da defeza dos srs. ministros. Mas ao silencio do governo ha de corresponder a insistencia da opposição (apoiados.)

Nós queremos saber os motivos porque o sr. visconde de Chancelleiros saíu do seio do gabinete; queremos aqui os documentos que já foram pedidos pelo sr. Rodrigues de Freitas e por mim. Esses documentos não vieram, não sei porque. Ignoro se tambem sobre elles terá de haver alguma consulta do digno, honrado e intelligente conselheiro procurador geral da corôa (riso), a cuja sombra anda sempre a collocar-se o sr. presidente do conselho (apoiados).

Nós pedimos copia de toda a correspondencia official que se deu com relação a esse facto, e essa correspondencia official não vem, é trancada. A estes pedidos que nós fazemos constantemente com o direito que a lei nos dá; a estes pedidos responde o governo com o seu habitual silencio! (Apoiados.)

(Entra o sr. ministro da fazenda.)

Sr. presidente, ha dias proferiu-se aqui a palavra «cobardia». Já não é parlamentar esta palavra. Eu não empregarei a palavra «cobardia», digo, porém, que é insigne fraqueza (não quero dar-lhe outra classificação), o comportamento do governo em pretender evitar a responsabilidade dos seus actos, e em recusar instante e constantemente aquelles documentos que os deputados da opposição lhe pedem, e de que póde advir para o gabinete uma accusação formal (apoiados).

Eu insisto n'este ponto, e já hontem tinha feito um requerimento para que a questão fosse adiada, até que esses documentos viessem, tal é a importancia que entendo que lhes devo dar!