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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
çamento organisado n'aquella repartição, e, n'este ponto, preciso declarar que não vejo aqui senão o sr. ministro da fazenda, sem querer saber quem são os empregados que o coadjuvam, alguns dos quaes são excellentes, e o sr. director geral dos correios entra n'este numero; mas nem esses empregados estão sujeitos aos preceitos a que está adstricto o sr. ministro da fazenda, nem me posso esquecer do que n'esta casa disse o sr. Fontes, quando a proposito da concessão da Zambezia nos considerou que o que se discutia, não era a junta consultiva do ultramar, discutia se o ministerio, e que quem respondia pelo decreto era o ministerio e não a junta consultiva.
Quem está aqui para responder pelos calculos perfilhados pelo sr. ministro da fazenda, embora feitos por um empregado qualquer, é o proprio sr. ministro da fazenda, que poz a sua assignatura no orçamento. (Apoiados.)
Os calculos, com relação ao rendimento do correio, não estão feitos com exactidão, e senão, vejamos como se calculou a verba — sellos.
É um facto sabido que a receita de sellos nos tres mezes de julho, agosto e setembro é mais avultada do que nos outros mezes do anno. Em regra n'estes tres mezes a receita proveniente dos sellos é muito mais avultada do que a receita dos restantes nove mezes. Pois o calculo foi feito do seguinte modo: tomou-se a media d'este trimestre e generalisou-se aos doze mezes do anno. É deploravel que, feito um calculo assim, esse calculo seja perfilhado pelo sr. Antonio de Serpa.
Pois o sr. ministro da fazenda como vogal do tribunal de contas, não tem tido occasião de verificar contas do correio geral, e não sabe que nos mezes de julho, agosto e setembro a receita proveniente de sellos é muito mais avultada do que nos outros mezes do anno? Pois um tal facto nunca lhe passou pelos olhos?
Para a camara ver o erro que envolve o calculo feito pelo trimestre, em vez de ser feito pelo rendimento dos doze mezes do anno, eu vou apresentar a differença, servindo-me dos dados ministrados pelas contas do thesouro.
Segundo as contas do thesouro o anno de 1875-1876 rendeu 543:000$000 réis; o de 1876-1877 rendeu réis 504:000$000; o de 1877-1878 rendeu 461:000$000 réis. Deveria, pois, calcular-se pelo ultimo anno. Ora a receita foi calculada em 461:0006000 réis. Quero dizer, a differença, ou augmento, calculando as receitas pelo trimestre, conforme o sr. Serpa calculou, é de 21:000$000 réis.
Para melhor fazer sentir o absurdo, passarei a ver qual o resultado do processo do sr. ministro da fazenda applicado á receita de sellos, em relação ao triennio ultimo. - O calculo em relação ao anno de 1877-1878 dá o seguinte resultado:
No anno economico de 1877-1878 a media dos tres mezes, julho, agosto -e setembro, foi de 40:000$000 réis. A media do anno foi de 38:000$000 réis. A exageração seria, pois, usando do calculo do sr. ministro da fazenda, de cerca de 2:000$000 réis por mez.
Façamos agora o calculo em relação ao anno de 1876-1877.
N'este anno a media dos mesmos tres mezes, julho, agosto e setembro, foi de 43:566$000 réis. A media dos doze mezes foi de 42:049$000 réis. Usando, pois, do processo empregado pelo sr. ministro da fazenda, a exageração mensal da receita seria de 1:517$000 réis.
Vamos ao outro anno do triennio, que é 1875-1876, e vejamos o erro que resulta de se empregar o mesmo systema.
A media dos tres mezes tomados para elementos do calculo, foi no anno de 1875-1876 de mais de 48:0006000 réis (48:704$000). A media dos doze mezes do anno 45:000$000 réis (45:270$000). Haveria, portanto, com este systema uma exageração no calculo da receita mensal de mais de 3:000$000 réis (3:434$000). A camara vê bem por estes exemplos a exageração que
ha nos calculos do sr. Antonio de Serpa. Só n'este anno a exageração da receita mensal seria de 3:400$000 réis, E já uma exageração muito respeitavel.
Preciso citar mais alguns exemplos para deixar a camara convencida de que o sr. Serpa estava distraindo, ou fazendo poesia, quando disse que se conformara com o regulamento geral de contabilidade nos calculos do orçamento, e que esses calculos eram modestos, como modestos são todos os exemplos que tenho apresentado.
Vou tomar outra verba de receita; é a que diz respeito ao caminho, de ferro do sul e sueste.
Em relação a esta verba dá-se um facto que me parece notavel.
O sr. Serpa, no ultimo triennio, calculou dois annos pelo orçamento do director geral d'aquelle caminho, e com relação ao outro anno mandou fazer o calculo na repartição competente do ministerio da fazenda.
Ora, quando o calculo foi leito na repartição do ministerio da fazenda, póde dizer-se que s. ex.ª acertou havendo apenas uma differença de 4556000 réis; mas quando fez o calculo pelo orçamento do director geral d'aquelle caminho, commetteu de ambas as vezes um erro de cerca de 14 por cento, isto é um erro de 53:000j$000 réis no primeiro anno e no segundo um erro de uns 54:0006000 réis,
E quer a camara saber o que fez o sr. ministro da fazenda, achando-se collocado entre o resultado obtido em dois annos, em que, como já disse, foram commettidos erros na importancia approximada de 14 por cento, e o resultado obtido no outro anno em que se approximou da verdade quanto a previsão se póde approximar?
Entendeu que devia pôr-se em harmonia com a lei das maiorias, e como de um lado havia dois casos e do outro lado apenas um, embora áquelles trouxessem comsigo erros tão importantes como os que citei, e este uma apreciavel approximação da verdade, conformou-se com os dois casos, e fez o calculo tomando por base o orçamento do director geral do caminho de ferro do sul e sueste.
Ora o numero de kilometros em exploração no anno preterito n'aquella linha foi de 312, e sendo a receita por kilometro na importancia de 1:260$000 réis, para se saber qual a receita total é evidente que "bastará multiplicar o numero de kilometros por esta verba.
Concluiram-se de então para cá mais 10 kilometros, e para se fazer o calculo da receita, bastaria recorrer á receita do anno transacto, acrescentando-lhe apenas a correspondente a esses 10 kilometros.
Isto parece-me manifesto, pois se ha verdade assente n'esta materia, é que o desenvolvimento ou prolongamento de um caminho de ferro que não vae relacionar um centro importante de população, de commercio ou de industria com o resto da linha não tende a augmentar a receita por kilometro.
Cresce é certo o divisor, e tambem o dividendo, mas aquelle n'uma rasão maior do que este; quero dizer, o numero de kilometros cresce n'uma rasão maior do que a receita total da linha, e por consequencia a receita por kilometro deve diminuir. (Apoiados.)
Ora como Serpa não é um grande centro de população, nem um grande centro commercial ou industrial, parece-me que o prolongamento do caminho de ferro até Serpa não é rasão sufficiente para se calcular um tão grande augmento na receita d'aquelle caminho. (Apoiados.)
E possivel que o sr. ministro da fazenda, por uma attenção com a terra que tem a honra de ser conhecida pelo appellido de s. ex.ª, lhe quizesse dar este testemunho de consideração e apreço; sirva isso, ao menos, de lenitivo aos que possam estranhar não estarem os calculos em harmonia com o regulamento de contabilidade publica, nem com a modestia apregoada no relatorio do governo. (Apoiados.)
Sessão de 9 de maio de 1879