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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 18 DE ABRIL DE 1864

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 72 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Adriano Pequito, Affonso Botelho, Garcia de Lima, Abilio, Ayres de Gouveia, Sá Nogueira, Quaresma, Gouveia Osorio, Ferreira Pontes, Mazziotti, Breyner, Pereira da Cunha, Magalhães Aguiar, Palmeirim, Zeferino Rodrigues, Barão da Torre, Barão do Vallado, Bento de Freitas, Albuquerque e Amaral, Almeida e Azevedo, Bispo Eleito de Macau, Cesario, Claudio Nunes, Poças Falcão, Barroso, Abranches Homem, Coelho do Amaral, Diogo de Sá, Borges Fernandes, Gavicho, F. M. da Costa, F. M. da Cunha, Cadabal, Pereira de Carvalho e Abreu, Medeiros, Sant'Anna e Vasconcellos, Mendes de Carvalho, J. A. de Sousa, Mártens Ferrão, Fonseca Coutinho J. J. de Azevedo, Macedo, Sepulveda Teixeira, Joaquim Cabral, Mendonça, Neutel, Faria Guimarães, Galvão, Alves Chaves, Figueiredo de Faria, J. M. de Abreu, Costa e Silva, Frasão, Rojão, Sieuve de Menezes, Menezes Toste, José de Moraes, Oliveira Baptista, Freitas Branco, Alves do Rio, Manuel Firmino, Mendes Leite, Murta, Pinto de Araujo, Vaz Preto, Miguel Osorio, Monteiro Castello Branco, Ricardo Guimarães, Rodrigo Lobo d'Avila, Thomás Ribeiro, Teixeira Pinto e Visconde de Pindella.

Entraram durante a sessão — Os srs. Braamcamp, Vidal, Soares de Moraes, Mais, Eleutherio, Brandão, Seixas, Antonio de Serpa, Peixoto, Barão das Lages, Garcez, Abranches, Carlos Bento, Ferreri, Cyrillo Machado, Almeida Pessanha, Conde da Torre, Domingos de Barros, Fernando de Magalhães, Bivar, Fernandes Costa. F. L. Gomes, Bicudo, Gaspar Teixeira, G. de Barros, H. de Castro, Gomes de Castro, Aragão Mascarenhas, Albuquerque Caldeira, Torres e Almeida, Simas, Matos Correia, Rodrigues Camara, J. Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Veiga, Sette, Fernandes Vaz, Alvares da Guerra, Silveira e Menezes, Gonçalves Correia, Mendes Leal, Julio do Carvalhal, Camara Falcão, Levy M. Jordão, Camara Leme, Rocha Peixoto, Sousa Junior, Pereira Dias e Fernandes Thomás.

Não compareceram — Os srs. Annibal, A. B. Ferreira, Correia Caldeira, Gonçalves de Freitas, A. P. de Magalhães, Arrobas, Fontes, Lemos e Napoles, Antonio Pequito, Pinheiro Osorio, Pinto de Albuquerque, Lopes Branco, David, Barão de Santos, Barão do Rio Zezere, Oliveira e Castro, Beirão, Pinto Coelho, Conde da Azambuja, Cypriano da Costa, Drago, F. F. de Mello, Ignacio Lopes, Vianna, Pulido, Chamiço, Gaspar Pereira, Blanc, Silveira da Mota, João Chrysostomo, Costa Xavier, Calça e Pina, Ferreira de Mello, J. J. Coelho de Carvalho, Gama, Infante Pessanha, Luciano de Castro, D. José de Alarcão, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Batalhós, Affonseca, Moura, Alves Guerra, Sousa Feio, Modesto, Placido de Abreu, Charters, Moraes Soares, Simão de Almeida e Vicente de Seiça.

Abertura — Ao meio dia e tres quartos.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Um officio do ministerio das obras publicas, devolvendo, informada, a representação em que os escripturarios da intendencia das obras publicas do districto de Lisboa pedem augmento de vencimento. — Á commissão de fazenda.

2. Uma representação da misericordia de Mourão, pedindo que sejam desamortisados os bens das misericordias, e o seu producto empregado em contratos de mutuo. — Á commissão de administração publica.

3.º De alguns officiaes convencionados em Evora Monte, pedindo que se lhes conceda uma pensão. — Á commissão de fazenda, ouvida a de guerra.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

NOTA DE INTERPELLAÇÃO

Requeiro que Beja prevenido o sr. ministro da marinha e ultramar de que o pretendo interpellar, com toda a urgencia, ácerca dos seguintes factos que se deram em Goa e constam dos boletins officiaes:

A junta de fazenda de Goa por um simples acto augmentou em 31 de dezembro de 1863 os soldos aos officiaes militares, e continua a fazer aos officiaes residentes na capital o abono, já abolido por lei, de 600 xerafins mensaes como ajuda de renda de casa.

O governador geral da India recebeu da fazenda publica as seguintes quantias de dinheiro: 2:250 xerafins como gratificação pelos treze dias que esteve fóra de Goa visitando as praças de Damão e Diu; mais 530 rupias como para gratificar a marinhagem do vapor que o levou aquella praça; mais 2:400$000 réis fortes como indemnisação das despezas feitas na mesma viagem e em hospedar os estrangeiros.

A junta de fazenda arrendou por longo praso vastissimos terrenos da provincia de Satari, sem hasta publica, Bem medição nem nenhuma formalidade, aos estrangeiros e ao ajudante de ordens do governador, que têem depois vendido os seus contratos aos inglezes.

Lisboa, 16 de abril de 1864. = F. L. Gomes, deputado por Salsete.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Vieram da secretaria os documentos relativos ao projecto de lei n.° 56, que o sr. José de Moraes requereu que estivessem sobre a mesa para poderem ser examinados pelos srs. deputados.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

DISCUSSÃO DOS PROJECTOS DE LEI N.ºs 47 E 42

Leu-se na mesa o seguinte

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PROJECTO DE LEI N.° 47

Senhores. — O sr. deputado Manuel Pereira Dias renovou a iniciativa do projecto de lei n.° 65 da camara dissolvida em 1861, e que tinha por fim o arredondamento do concelho da Gollegã, districto do Santarem. A commissão de estatistica, achando no parecer da commissão d'aquella epocha o desenvolvimento necessario para provar a rasão que assiste aos povos do concelho da Gollegã, pelos fundamentos allegados na representação dirigida á camara dos deputados de 1860, e sobre o qual assentou o parecer n.° 65, apresentado em sessão de 20 de março de 1861, adopta como seu aquelle parecer, que é contido nos termos seguintes:

N.° 65 DE 1860 A 1861 — PASSA A SER EM 1864 N.° 38-B

Senhores. — A commissão de estatistica, tendo examinado com a mais escrupulosa attenção a representação da camara municipal e habitantes do concelho da Gollegã, na qual pedem o arredondamento do seu respectivo concelho, fixando-se-lhe os limites indicados ali pela propria natureza do terreno;

Considerando que o actual concelho da Gollegã tem apenas /g kilometro de extensão ao norte, e 1 kilometro ao sul e poente da villa;

Considerando que por este lado a demarcação actual nem foi indicada, nem é justificada pela natureza do terreno, sendo por isso visivelmente reconhecida a anomalia da sua limitação tanto ao norte como ao poente da villa;

Considerando que foi a propria natureza quem se encarregou de fixar os limites em que deve circumscrever se este concelho, estendendo-se a sua area até á margem esquerda do rio Almonda, a 2 kilometros ao norte e oeste da Gollegã;

Considerando que feita a demarcação do referido concelho pelos limites que a natureza lhe marcou, se favorece a definitiva organisação da respectiva freguezia de Nossa Senhora da Conceição, unica do concelho, e das freguezias do Pinheiro Grande e da Barquinha, no sentido da mais palpitante commodidade e conveniencia dos povos das tres referidas freguezias;

Considerando que sem este augmento se não póde equilibrar ali a receita com a despeza municipal, attenta a pouca população e a pequena area do actual concelho, e em presença das suas muitas e urgentes necessidades, que demandam grandes recursos para melhorar as condições sanitarias do municipio e para preservar os seus campos das frequentes inundações do Tejo;

Considerando finalmente que são muito extensos e populosos os dois concelhos de Torres Novas e Santarem, e que a pequena parte que se lhes tira lhes não faz perder a grande importancia que têem, emquanto póde e deve reputar-se uma restituição fundada na rasão e na justiça, por se não poder deixar de reconhecer como indisputavel até certo ponto o direito que tem o municipio da Gollegã de reclamar para si os seus proprios campos;

Por todas estas rasões e fundamentos entende a commissão que a representação da camara e habitantes do concelho da Gollegã deve ser attendida; sendo por isso que tem a honra de offerecer á approvação da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A freguezia de Nossa Senhora da Conceição, que constituo o concelho da Gollegã, comprehende pelo nascente todo o terreno desde a entrada do ribeiro de Santa Catharina no rio da Ponte da Pedra até á sua foz no Tejo; pelo sul todo o terreno banhado pelo Tejo desde a quinta da Cardiga inclusivè até á foz do rio Almonda; pelo poente todo o terreno banhado pelo rio Almonda desde a sua foz até á valia que divide o campo da Gollegã do campo das Cordas, em que vae desaguar o ribeiro dos Riachos; pelo norte todo o terreno desde a dita valia pelo ribeiro ao sul dos Riachos, incluindo o casal do Vidigal, casal da Amendoeira, direito ao ribeiro de Santa Catharina até ao rio da Ponte da Pedra.

Art. 2.° O terreno ao nascente do rio da Ponte da Pedra até á Aguatesa e os fogos do logar do Pedrogoso, pertencentes ao concelho da Gollegã, ficam pertencendo ao concelho de Villa Nova da Barquinha.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 20 de março de 1861. = Antonio Dias de Azevedo = Antonio Feio de Magalhães Coutinho = Francisco Coelho do Amaral = Francisco Lopes Gavicho Tavares de Carvalho = Joaquim Cabral de Noronha e Menezes = José Maria Rojão.

Sala da commissão, em 2 de abril de 1864. = Francisco Coelho do Amaral = Adriano Pequito Seixas de Andrade = Joaquim Antonio de Calça e Pina = Bernardo de Albuquerque e Amaral = Antonio Maria Barreiros Arrobas = José Augusto de Almeida Ferreira Galvão = Antonio Egypcio Quaresma Lopes de Vasconcellos.

Foi approvado na generalidade sem discussão.

O sr. Quaresma: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara se, dispensando o regimento, quer que se passe desde já á especialidade.

Resolveu-se afirmativamente, e foram seguidamente approvados os tres artigos do projecto.

Passou-se ao

PROJECTO DE LEI N.° 42

Senhores. — A commissão de estatistica examinou com a maior attenção uma representação dos habitantes do extincto concelho de Sobreira Formosa, districto de Castello Branco, na qual pedem ou a restituição do mesmo extincto concelho, ou que, não sendo attendida esta pretensão, Beja ao menos transferida a sede da cabeça do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa. Foram pedidos ao governo os necessarios esclarecimentos sobre o allegado na representação, e d'elles se collige que tão inconveniente seria a restituição d'aquelle extincto concelho, que ficaria composto apenas de uma freguezia, onde seria difficil achar os elementos precisos para os cargos municipaes, como vantajosa a transferencia da séde da cabeça do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa; em primeiro logar, porque Sobreira Formosa é muito mais central do que Proença, e por ella passa a estrada nova de Castello Branco a Abrantes; em segundo logar, porque a povoação de Sobreira Formosa é mais consideravel do que a de Proença, tendo esta 662 fogos e aquella 839; em terceiro logar, porque o rendimento collectavel de Sobreira Formosa é mais avultado do que o de Proença, sendo o primeiro de réis 13:900$395, emquanto que o segundo é de 9:193$814 réis; o que tudo prova que Sobreira Formosa é uma povoação muito mais importante do que Proença a Nova. Todos estes fundamentos foram devidamente considerados pela commissão districtal de Castello Branco, creada por circular do ministerio do reino de 3 de setembro de 1862, que entre outras medidas propõe no seu relatorio a mudança da cabeça do concelho de Proença para Sobreira Formosa, o que foi adoptado igualmente pela junta geral d'aquelle districto em sessão de 13 de março de 1863, de accordo com as informações dadas tambem pelo governador civil do districto.

Por todas estas rasões a vossa commissão tem a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É transferida a sede da cabeça do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa, no districto de Castello Branco.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 2 de abril de 1864. = Francisco Coelho do Amaral = Adriano Pequito Seixas de Andrade = Manuel Alves do Rio = Joaquim Antonio de Calça e Pina = Bernardo de Albuquerque e Amaral = Antonio Egypcio Quaresma Lopes de Vasconcellos.

O sr. Vaz Preto: — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara se quer que, em seguida ao projecto n.° 42 que vae entrar em discussão, entre o projecto n.° 109, que tambem versa sobre o mesmo assumpto.

Consultada a camara, não houve vencimento.

O sr. Presidente: — Está em discussão o projecto n.° 42 tanto na generalidade como na especialidade, porque tem um artigo só.

O sr. Vaz Preto: — Antes de fallar sobre este objecto, peço a v. ex.ª que me informo se já vieram os documentos que pedi ao governo, relativos ao projecto que se discute; documentos que devem estar sobre a mesa, para se poder avaliar bem este projecto. Os documentos que pedi dizem respeito ao numero de fogos do extincto concelho de Sobreira Formosa, e á contribuição predial que pagava esse antigo concelho. São necessarios estes documentos, para se poder avaliar a mudança da sede do concelho que se pretende fazer.

Ó sr. Secretario (Miguel Osorio): — Parte dos documentos pedidos pelo illustre deputado já vieram do governo, e mando busca-los á secretaria.

O sr. Quaresma: — Por parte da commissão devo informar o nobre deputado e a camara, de que os documentos que s. ex.ª pediu acompanharam o parecer, porque a commissão pediu igualmente esses documentos, que estão sobre a mesa, e se a camara os não tem visto é porque não tem querido. Os documentos foram enviados á camara por um officio assignado pelo sr. duque de Loulé.

Desses documentos consta que a população de Sobreira Formosa é maior do que a de Proença a Nova; consta que o valor das matrizes da contribuição predial é maior em Sobreira Formosa do que em Proença a Nova; e que a circumstancia de passar por Sobreira Formosa a nova estrada que ha de communicar Castello Branco com a Beira, é mais um motivo para a transferencia da sede do concelho que se propõe no projecto.

O sr. Vaz Preto: — Pedi esses documentos, a que se refere o parecer da commissão, e torno a instar por elles; não duvidando da palavra do illustre relator da commissão, convenço-me até que na commissão foram apresentados, e apesar d'isso insto por elles, e insto porque estou completamente em opposição com as consultas das juntas geraes de districto e auctoridades que pediram a extincção daquelle concelho, declarando que era um dos concelhos que não se podia sustentar por si, por não ter rendimento nem pessoal sufficiente, e tanto que no tempo em que Sobreira Formosa foi concelho, como não havia pessoal para exercer os cargos municipaes, a administração de tudo o que dizia respeito á administração municipal e bens do concelho correu o peior possivel, até que as auctoridades superiores do districto, desesperando de conseguirem pela sua solicitude a boa ordem, pelo menos na administração, evitando desperdicios, pediram ao governo, como necessidade absoluta, a extincção do concelho, unindo-o a Proença a Nova, pelas rasões que militavam a favor d'elle, inteiramente contrarias ás que expoz o de Sobreira.

Emquanto á cifra da contribuição predial, todos sabem muito bem que muitas vezes quando se quer conseguir qualquer fim, para o qual se tenham de despender mais alguns meios ou pagar mais tributos, que as matrizes sobem para poderem obter esses fins de que o concelho carece.

Quem conhecer bem Proença a Nova, quem conhecer a sua população, a sua topographia e a sua riqueza, riqueza e topographia d'aquelles insignificantes casaes que formam a freguezia de Sobreira Formosa, admira-se que se queira mudar para ali a sede do concelho.

Diz a commissão que = a povoação de Sobreira Formosa tem mais população do que Proença a Nova =; engana-se completamente, é o contrario de tudo isso. Sobreira Formosa é uma povoação em si miseravel e insignificante, e apesar da estrada que por ali passa não offerece commodidades algumas nem aos vizinhos nem aos passageiros; compõe-se de casaes a que se chama a Charneca. Basta dizer á camara que ali não se encontra homem algum de lenço ao pescoço, permitta-se-me a expressão; exceptuando unicamente o parocho, não ha um homem que possa ser camarista, nem possa exercer cargo algum, por mais insignificante que seja, porque geralmente nem sabem ler nem escrever.

Se a camara soubesse bem e examinasse a fundo o que vae votar, o desserviço que vae fazer, e o que este projecto significa, admirava-se que houvesse quem fizesse similhante projecto de lei, e que se invocasse para esse fim o nome do ministro competente; creio comtudo que a camara assumirá a sua elevada posição, e rejeitará pela fórma que merece o projecto em discussão.

A commissão diz que = pediu ao ministro esclarecimentos, e que é á face d'elles que deu o seu parecer favoravel a Sobreira Formosa =. Sr. presidente, isto é incrivel; que se attendam, que se vejam, que se leiam os documentos que os habitantes de Sobreira Formosa apresentaram, e que não se faça menção nem se attendam os que dizem respeito a Proença a Nova. Eu desejava, e a camara tem necessidade de vir examinar as representações que os povos de Proença fizeram ao governo civil e ao governo; e eu desejava, repito, que essas representações viessem tambem aqui e fossem presentes á camara, para se decidir mais seguramente. Dessas representações é que eu peço ao nobre relator da commissão, que pareceu dizer me já que = a commissão deu o seu parecer conforme os documentos que appareceram =, que d'ellas faça tambem menção.

Que fez d'ellas o governo e a commissão? Este esquecimento é indesculpavel, e n'este caso vou mandar para a mesa uma moção de ordem para que este projecto seja adiado até que se apresentem os documentos que os povos de Proença a Nova mandaram a este respeito; ou até que o sr. ministro do reino dê esclarecimentos, porque não é possivel votar-se de fórma alguma por um projecto d'estes. V. ex.ª não imagina o que isto é, e eu appello para alguns dos deputados que estão aqui, que já passaram por Sobreira Formosa, e que me digam se é povoação que possa ser sede de um concelho, havendo um concelho importante como é Proença a Nova. Alguns srs. deputados têem passado por lá, e eu appello para o testemunho competente de ss. ex.ªs, e peço que me digam se Sobreira Formosa não é uma povoação tão insignificante que nem tem o pessoal sufficiente para formar a camara. O pessoal para todos os empregos municipaes ha de ir-se buscar a Proença a Nova para satisfazer a um projecto de lei, um pouco caprichoso, e que tem certos e determinados fins; ha de ir desarranjar e incommodar os povos. Isto não se acredita.

O sr. Quaresma: — Que fins são?

O Orador: — São fins completamente eleitoraes.

Eu vou mandar para a mesa uma proposta de adiamento, para que se adie a discussão d'este projecto, até que venham á camara todas as representações em que se pede a conservação da sede n'aquelle concelho.

O sr. Quaresma: — Peço a v. ex.ª que mande ler o officio e a representação, e documentos que foram remettidos á commissão de estatistica, em resposta aos esclarecimentos pedidos pela commissão de estatistica.

(O sr. secretario Miguel Osorio leu.)

(Pausa.)

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta do Sr. Vaz Preto.

É a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que se adie o projecto em discussão até que se mandem a esta camara as representações dos povos de Proença para a conservação da sede do concelho; ou até que o sr. ministro do reino dê esclarecimentos a este respeito. = Vaz Preto.

Foi apoiada, e entrou em discussão.

O sr. Quaresma: — Admira-me que o illustre deputado estivesse combatendo uma cousa que não existe. A commissão de estatistica não quer a reconstrucção do concelho de Sobreira Formosa.

O sr. Vaz Preto: — Eu não fallei n'isso.

O Orador: — Pois se o nobre deputado não fallou n'isso, para que é então o argumento da falta de pessoal em Sobreira Formosa? Pois ha alguma lei que disponha que o pessoal necessario para os cargos municipaes seja da cabeça do concelho? Declaro que se não foi a isto que se referiu, não comprehendo o argumento de s. ex.ª

A commissão de estatistica recebeu uma representação dos povos de Sobreira Formosa, em que queriam uma de duas cousas ou a reconstrucção do concelho de Sobreira Formosa ou a mudança da séde da cabeça do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa.

A commissão de estatistica quiz dar um voto consciencioso, e não se quiz deixar arrastar por influencias, a que alludi u o illustre deputado (apoiados). A commissão não conhece influencias eleitoraes, não se importa com ellas, pediu ao governo os esclarecimentos competentes, e o governo disse-lhe: «Acho inconveniente a reconstrucção do concelho, mas acho convenientissima a mudança da sede da cabeça do mesmo concelho». E as rasões são — em primeiro logar, porque effectivamente Sobreira Formosa é povoação mais importante do que Proença a Nova; em segundo logar, porque o rendimento collectavel é mais subido em Sobreira Formosa do que em Proença a Nova; era terceiro logar, porque Sobreira Formosa é mais central. Este extincto concelho tem a mais de 800 fogos, emquanto que aquelle tem 600, e pagam as seguintes contribuições (leu).

E não se diga que esta differença no rendimento de 9:000$000 para 13:000$000 réis é de pequena consideração, este augmento é uma differença salientissima em povoações de pequena importancia; em quarto logar finalmente, porque a povoação de Sobreira Formosa está a mais alcance dos po-

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vos e é atravessada pela estrada que vem de Castello Branco a Lisboa. Alem d'isto, sr. presidente, a commissão de divisão territorial, creada em virtude do decreto de 3 de setembro de 1862, opinou n'este mesmo sentido, estando n'este ponto de accordo com o governador civil e a junta geral, porque tanto o primeiro como a segunda declarou que era muitissimo mais conveniente que a sede da cabeça do concelho fosse em Sobreira Formosa do que em Proença a Nova, e por estas declarações tiramos nós a conclusão de que não havia absolutamente contestação nenhuma a este respeito.

Não ha representação nenhuma contraria. O illustre deputado fallou em representações, mas eu respondo a s. ex.ª que a commissão não teve conhecimento d'ellas, e tenho rasão para presumir que não existem, porque os esclarecimentos remettido I do ministerio do reino referem-se unicamente ás consultas da junta geral e do governador civil, e não se falla em similhantes representações, o que deveria acontecer se lá existissem. Tenho ainda a notar que na representação, em que se pede a mudança de sede, vem assignado o vice-presidente da camara do concelho de Proença a Nova e alguns empregados, e portanto é esta mais unia prova de que reconhece que a mudança é justa, porque se assim não fóra não se veriam ali aquellas assignaturas.

A commissão de estatistica não podia, sem fazer uma grande injustiça aos povos que assignaram aquella representação, deixar de optar pela mudança da sede do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formo-a.

O illustre deputado mostrou a sua paixão por fórma tal, que até fallou em falsificação de rendimento collectavel.

O sr. Vaz Preto: — Não fallei era falsificação.

O Orador: — Eu vou repetir as palavras que o illustre deputado proferiu, para a camara tirar as consequencias.

Disse s. ex.ª = que muitas vezes até e elevam rendimentos que não existem =. Pois que querem dizer estas expressões? Pois quem diz que uma povoação tem um rendimento collectavel que não existe, o que o diz officialmente, não praticará uma falsificação? Pois ha alguem n'um concelho que queira concorrer para que se eleve o rendimento collectavel, a não ser por um pensamento reservado? E não será isto uma falsificação? Pois ha alguem que queira concorrer para o augmento do rendimento collectavel do seu concelho, para ter de pagar mais do que deve? Eu estou persuadido que o Illustre deputado nem pensa nem sente o que disse, e não posso explicar as suas palavras, senão como filhas da paixão que o domina n'este debate. Já vê portanto a camara a força d'este argumento mal trazido aqui por s. ex.ª

Em vista das considerações que acabo de fazer, todas filhas de documentos officiaes, parece-me que a camara não deve ter a menor difficuldade em approvar este projecto, porque é de rigorosa justiça. Voto contra o adiamento, e repito que não supponho que existam no ministerio do reino essas representações a que se referiu o illustre deputado, visto que não foram enviadas á commissão de estatistica. Não ha por consequencia rasão nenhuma para approvar o adiamento.

O sr. Vaz Preto: — Peço a attenção da camara por alguns momentos, porque vou responder a todos os argumentos apresentados pelo sr. Quaresma pobre a questão que nos occupa.

Em primeiro logar, cumpre ma dizer que no projecto que está em discussão não se trata de reconstrucção de nenhum concelho, mas sim de mudança, da sede de um concelho; para o extincto concelho de Sobrera deixar de ser concelho, por muitas rasões, por sua administração e por falta de pessoal, etc.; e quando isso suceder, porque o anexarão a Proença e não Proença á Sobreira, é exactamente porque todas as rasões que apresenta o illustre relator são o contrario de tudo o que digo. Pois se ali não ha pessoal, o pessoal é de Proença, porque se ha de incommodar Proença para satisfazer a pretensão do auctor do projecto?

Disse tambem s. ex.ª que = não teve conhecimento das representações a que eu me referi =: devo pois explicara, rasão por que eu disse que havia essas representações.

Os povos d'aquellas localidades cuidavam que eu era procurador á junta geral do districto, e como elles sabiam que alguem pretendia fazer lhes a grande injustiça de propor a mudança da fede do concelho, mandaram me pois algumas representações mostrando a sua justiça, a fim de eu defender os seus interesses. Como eu não era procurador á junta geral do districto, enviei lhes outra vez essas representações, a fim de serem remettidas ao governo civil, governo e poderes competentes.

São pois exactamente essas representações que eu peço que sejam presente á camara, para se avaliarem bem as circumstancias em que se acham os povos, cujos interesses vão ser atacados por meio d'este projecto.

Alem d'isso, não ha inconveniente algum em demorar por mais tempo a mudança da pede do concelho; inconvenientes, e muito grande?, resultarão de certo de não serem attendidas as rasões que tenham a apresentar os povoa de concelhos que ha tanto tempo estão unidos.

Emquanto á freguezia de Sobreira Formosa, repito que só os deputados que tenham passado por aquella povoação é que podem saber as especiaes circumstancias em que ella se acha.

Aquella freguezia é insignificantíssima; apenas tem uma certa quantidade do casaes, compostos ordinariamente de gente pobre. E porque motivo vem o relator da commissão dizer que Sobreira Formosa é uma grande terra, e que se deve ali estabelecer a sede do concelho? Dizem que é mais central. Mas note se que é uma só freguezia. Central! Ceptro de que?! Não nos venham aqui deitar poeira nos olhos, pois não vêem que ella existe n'uma extremidade das freguezias que formaram o antigo concelho de Proença?! Só se for centro dos seus casaes; como querem pois que a freguezia de Sobreira Formosa seja a séde de outro concelho, quando o não pôde ser de si mesmo?

Eu julgo que este negocio carece de uma madura attenção. O adiamento que eu proponho é no interesse de todos. Não digo que se não approve este projecto, mas examinem-se primeiramente as rasões que aquelles povos allegam; e se a camara não quer ter attenção com esses documentos que eu requeiro, eu pelo menos que qs tenho em muita consideração farei aqui um solemne protesto contra este procedimento inqualificavel. Estou inteiramente persuadido que quem considerar bem as especiaes circumstancias em que se acha aquella localidade, quem examinar as representações a que eu me referi, de certo não pôde deixar de approvar o adiamento que eu proponho e até de cão dar o seu voto ao projecto em discussão.

O sr. Mártens Ferrão: — Sr. presidente, pedi a palavra sobre a ordem para mandar para a mesa uma moção propondo o adiamento do projecto até que esteja presente o sr. ministro do reino.

Eu entrava na sala, discutia-se este projecto, fui ver á mesa o assumpto da discussão, e vi que é um projecto de divisão de territorio ou mudança de sede de um concelho, sem que no parecer se declare se foi ouvido o governo e se está de accordo; e sem que na discussão esteja presente o governo!

Sr. presidente, materias d'esta ordem, assumptos de divisão de territorio, que tão de perto prendem com, a administração dos povos e com os seus legitimo» interesses, não é nem nunca foi principio aceitavel de administração trata-los a retalho, permitta se me a phrase; discuti-los na ausencia do governo, e na completa carencia de informações por parte d'elle.

Não pôde jogar-se assim com a administração do paiz e com os interesses dos povos. A camara não poda deixar de prestar a assumptos d'esta ordem toda a circumspecção.

Eu voto contra todos os projectos n'este sentido que estão na mesa Não serei taxado de suspeito. Estão ali projectos analogos a este apresentados por amigos meus politicos, estão outros apresentados por cavalheiros da maioria; eu voto contra todos, emquanto o governo não se apresentar e disser que entende, de conveniencia de administração alguma alteração, n'esse caso se as rasões do governo me convencerem, então approvarei. Mas estar a camara a fazer a divisão administrativa sem um systema combinado, sem informações inconvenientes, sem o governo dar á camara as explicações necessarias, é uma cousa que não está nas boas praticas parlamentares, nem nos bons principios de administração. V. ex.ª sabe que a camara resolveu na sessão passada, que os projectos de divisão de territorio não se discutissem separadamente, mas só quando viesse uma medida geral de divisão territorial. Hoje votam se projectos d'esta ordem na absoluta falta de informações, ou, o que ainda é peior, havendo as contradictorias; e sem que o governo dê a sua opinião! Isto não é systema de fazer leia, nem de tratar dos interesses publicos.

Eu devo ainda ponderar á camara com muita franqueza, que entendo que actualmente o parlamento deve ser muito cauteloso em votar materias d'esta ordem. Estamos nas vesperas de uma eleição geral, que deve ser desaffrontada, se se quer que o systema, constitucional seja uma realidade entre nós; o parlamento por um principio de dignidade, e por um respeito devido por aquelles principios, não pôde querer que se possa dizer que elle á ultima hora está pensando pelas suas resoluções, está influindo, no resultado eleitoral. Elle que deve ser o guarda da lei! Compenetre-se a camara d'esta verdade, que é minto grave e importante.

Nós, sr. presidente, estamos dando um triste exemplo votando com nimia facilidade projectos d'esta ordem, que pela maior parte não passam na outra camara. Não é de certo muito airoso para esta camara ver assim continuamente quebradas na outra camara as suas resoluções.

Adie se pois o projecto até que esteja presente o sr. ministro do reino, e se o objecto é tão importante e urgente como dizem os srs. deputados que sustentam o projecto, o sr. ministro do reino que o venha dizer á camara, e eu se achar conveniente as suas rasões não hesitarei em o votar.

Sr. presidente, com o que digo não combato o direito com que se requer á camara sobre assumptos d'esta ordem, nem que os deputados instem pela e na resolução; combato sim o modo e o systema que se está seguindo para os resolver.

Mando para a mesa a minha moção.

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho o adiamento do projecto até que esteja presente o sr. ministro do reino. — Mártens Ferrão.

Foi apoiada, e ficou tambem em discussão.

O sr. Quaresma: — Eu já em uma das sessões passadas disse que a commissão de estatistica teve uma conferencia com o sr. ministro do reino, e que s. ex.ª auctorisou a commissão a fazer estas modificações, e deu-lhe para isso poderes plenos, e dou testemunho dos meus collegas da commissão (apoiados). O sr. ministro do reino disse nos que =era necessario cautela com a reconstrucção dos concelhos = o nós não temos dado nem mais um parecer sobre reconstrucção de concelhos. O parecer que deu a commissão de estatistica é de accordo com o sr. duque de Loulé; é a mudança da sede da cabeça do concelho, e não a reconstrucção do concelho (apoiados).

Se se não declarou no relatorio o accordo que houve com o governo, foi por descuido.

Eu já tinha dito n'uma das sessões passadas que o sr. ministro do reino tinha concordado e auctorisado a commissão para lavrar este parecer, e n'este sentido. Por consequencia posso dizer á camara que este parecer é auctorisado pelo sr. ministro do reino.

De mais a mais houve a especialidade de ser presente a

representação, e s. ex.ª dizer que a approvava. Esta é a verdade passada na commissão.

Tenho dito por mais vezes que não gosto das divisões feitas a retalho; mas ha injustiças tão flagrantes, que para as reparar não é possivel esperar por mais tempo pela divisão geral do territorio. Todos sabem isto muito bem.

Eis-aqui está a rasão por que nós vamos acudindo a estas pequenas cousas que o illustre deputado classificou de grandes, e que o não são; talvez o illustre deputado tenha as suas rasões...

(Interrupção.)

O Orador: — Isso é um systema como outro qualquer, nem eu impugno isso. O que realmente não acho conveniente é que se esteja a querer envenenar qualquer intenção da commissão com intuitos eleitoraes; isto realmente não se pôde admittir (apoiados). Não é justo que uma ou duas freguezias estejam a quatro ou cinco leguas de distancia da cabeça de um concelho, estando a um kilometro da cabeça de outro concelho, e cito um exemplo muito frisante.

A freguezia de Panascoso, actualmente pertencente ao concelho de Abrantes, está a quatro leguas de Abrantes, e a distancia de, quando muito, um kilometro do concelho de Mação. Perguntarei eu — será justo e rasoavel que os povos continuem a soffrer estes vexames, á espera que venha uma medida geral que apresenta immensas difficuldades?

Ha de ser difficil que qualquer governo se atreva a fazer uma divisão territorial, principalmente na vespera de uma eleição geral; isso é mais serio. Portanto a commissão não tem em vista senão attender á rigorosa justiça, quando estão conformes n'isto todas as informações, como em relação ao objecto de que tratámos, no qual está de accordo o governador civil, a commissão da divisão de territorio, nomeada em virtude do decreto de 2 de setembro de 1862, e a junta geral de districto.

Diz o illustre deputado que = a junta geral do districto é o mesmo que a commissão districtal =, não é exacto.

O sr. Vaz Preto: — Não d'isso tal, o que disse é que os membros da commissão estavam na junta cerai.

O Orador: — Não duvido nada d'isso; mas é preciso que o illustre deputado saiba que a commissão não é composta sómente dos membros da junta geral de districto, entra o director das obras publicas e outros individuos; não são tribunaes identicos, são differentes e muito differentes.

O illustre deputado para advogar a sua causa fez lhe conta confundir uma com outra d'estas corporações...

(Interrupção.)

O Orador: — Mas entram outros elementos que podem contrabalançar a opinião dos membros da junta geral. E na junta geral alem dos vogaes, que podem pertencer á commissão de divisão territorial, entrára outros e em muito maior numero, e o que eu vejo é que tanto una como outros estão de accordo n'esta questão.

Estando pois do accordo o governador civil, a junta geral, a commissão de divisão territorial, e não havendo uma só informação contra, que outro parecer poderia dar a commissão de estatistica? Ultimamente o sr. duque de Loulé, na informação que deu, pronunciou-se pela mudança da sede do concelho.

O sr. duque de Loulé diz n'aquelle officio que = não concordando com a reconstrucção, comtudo a mudança da sede acha a justa =.

Querem mais clara a opinião do sr. duque de Loulé!?

E o que tenho a dizer em resposta ás reflexões, que fez

0 illustre deputado e meu amigo o sr. Ferrão, e como o seu adiamento é o mesmo que o do sr. Vaz Preto, voto tambem contra elle.

O sr. Pinto de Araujo: — Pouco direi sobre o projecto, em discussão, principalmente depois das observações que acaba de fazer o meu illustre collega e amigo, o sr. Mártens Ferrão.

Entendi porém que devia tomar parte na discussão d'este projecto, por ser de localidade differente da divisão territorial de que se trata, ser portanto insuspeito na apreciação que d'elle possa fazer, e por ver que o illustre relator da commissão não está muito em harmonia, defendendo o parecer e combatendo o adiamento, com as doutrinas, expendidas no relatorio que precede o projecto.

Quer se defender o projecto, e julga-se de muita conveniencia a mudança da capital do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa, porque a junta geral do districto, todas as. auctoridades administrativas, e mesmo a commis-

1 são districtal nomeada pelo decreto de 2 de setembro de 1862, são de opinião que esta mudança é essencial.

Embora todas aquellas auctoridades, ou corporações indicadas no relatorio, cujas idéas foram substanciadas pelo illustre relator da commissão, votem pela mudança indicada pela commissão, é todavia certo que. ella está condemnada no relatorio que preceda o projecto.

Peço licença á camara e ao illustre relator da commissão para ler o relatorio. Diz elle:

«Foram pedidos ao governo os necessarios esclarecimentos sobre o allegado na representação, e d'elles se collige que tão inconveniente seria a restituição d'aquelle extincto concelho, que ficaria composto apenas de uma freguezia, onde seria difficil achar os elementos precisos para os cargos municipaes, como vantajosa a transferencia da séde do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa.»

Ora, eu não posso tirar a conclusão que tirou o illustre relator das premissas que estabeleceu no relatorio.

Sobreira Formosa não serve para capital do concelho, porque não tem pessoal nem os elementos necessarios para se restabelecer o concelho, e para ali ser a sede do antigo concelho, porque Sobreira Formosa, é uma freguezia onde faltam todos os elementos essenciaes e indispensaveis para

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a reconstrucção de um concelho. Mas, diz ainda o relatorio — Sobreira Formosa pôde ser capital do concelho.

É isto o que diz o relatorio.

Ora, conveniencia material não a ha na mudança da capital do concelho, porque Sobreira Formosa fica numa extremidade, e Proença a Nova fica mais central. Diz isto o officio que ha pouco se acabou de ler á camara.

A freguezia de Sobreira Formosa tem oitocentos e tantos fogos, e as tres freguezias restantes, Proença a Nova e outras duas, têem dois mil duzentos e tantos fogos.

Portanto não pôde haver conveniencia alguma que aconselhe o formar Sobreira Formosa um concelho de per si só, sendo uma freguezia que a não ser a distancia e a difficuldade de communicações com a outra capital do concelho Proença a Nova, não pôde haver outra rasão que nos leve a votar este projecto, porque não tem elementos para ser concelho, como confessa a commissão no seu relatorio.

Estas rasões por consequencia vem em abono da conveniencia de se conservar a capital do concelho em Proença a Nova.

Eu bem sei que se quererá dizer, por parte da commissão, que se Sobreira Formosa não tem elementos necessarios para por si formar um concelho, junta com outras freguezias tem todos 01 elementos necessarios para ser capital do concelho; mas a isso responde-se que os elementos, que n'esse caso vem a ter Sobreira Formosa para ser concelho, são elementos que lhe vera de fóra; são elementos que aquella localidade não tem, e vem a herdar da capital do concelho; são elementos de pessoal e de outras condições necessarias para ser concelho, que lhe ha de fornecer a Proença a Nova.

Pergunto pois ao illustre relator e á camara—se haverá mais commodidade em fazer com que o pessoal de Proença a Nova venha funccionar a Sobreira Formosa, visto que aqui não ha elementos para constituir um concelho?

Uma voz: — Todos.

O Orador: — Todos? Diz o relatorio que Sobreira Formosa não tem os elementos para ser cabeça de concelho, não sou eu que desminto.

O sr. Quaresma: — Não diz.

O Orador: — Não diz!? Eu peço licença á camara para ler novamente o relatorio:

«.....que ficaria composto apenas de uma freguezia, onde

seria difficil achar os elementos precisos para os cargos municipaes.

A commissão diz no seu relatorio que =ré difficil achar em Sobreira Formosa os elementos precisos para os cargos municipaes = =. Diz mais ainda do que eu disse. Por consequencia a mudança da capital do concelho de Proença a Nova para Sobreira Formosa não pode de maneira nenhuma votar-se.

Uma voz: — O pessoal para os cargos municipaes é de todo o concelho.

O Orador: —:Então, se o pessoal para os cargos municipaes é de todo o concelho, e não unicamente da capital d'elle, e se a commissão diz que em Sobreira Formosa é difficil encontrar elementos para constituir a administração municipal, claro é que a capital do concelho está bem collocada em Proença a Nova.

Uma voz: — E menos central.

O Orador: — E se é menos central do que Proença a Nova, quaes são as considerações de outra ordem que podem determinar a commissão de estatistica a mudar a capital do concelho?

As considerações que se deduzem do principio estabelecido no relatorio pela commissão, parece-me serem as mais concludentes para se votar contra o projecto que está em discussão, e eu não acho rasão nenhuma com que possa justificar-se a disposição do projecto.

Alem d'isso (peço licença ao sr. Mártens Ferrão para fazer minhas as suas palavras) entendo de muita conveniencia, quando se trata da discussão de projectos d'esta ordem, que o governo esteja presente, principalmente o sr. ministro do reino, a fim de dar os esclarecimentos necessarios, e declarar por parte do governo as vantagens d'estas alterações.

Pois que significa vir a commissão de estatistica a camara, e dizer-nos A commissão chamou ao seu seio o sr. ministro do reino, entendeu-se com elle a respeito dos projectos que lhe estavam affectos, e s. ex.ª auctorisou a commissão para dar os pareceres que estão na mesa»?

Uma voz: — Auctorisou sob certas bases.

O Orador: — Este não é o meio regular nem official de se resolverem de accordo com o governo quaesquer projectos que entrem em discussão n'esta casa.

Os membros que compõem a commissão de estatistica merecem-me muita consideração; mas entendo que a camara não deverá merecer menos consideração ao sr. ministro do reino do que a commissão de estatistica.

Pois o sr. ministro do reino tem a condescendencia de ir á commissão, a chamado d'ella, para dar as suas informações sobre o modo por que a commissão se havia de dirigir dando o seu parecer sobre as questões de divisão territorial que lhe estavam affectas, e a camara não merecerá a s. ex.ª a consideração de vir assistir á discussão d'esses projectos?! Não sei o que isto signifique. Pois o sr. ministro do reino, passou procuração á commissão de estatistica para o representar na camara? Para que vem aqui o dizer-se: «O sr. ministro do reino deu á commissão as explicações necessarias, e o parecer está por consequencia elaborado de accordo com o governou?! Pois isto pôde dispensar a sua presença e as suas explicações na camara quando se discutam projectos d'esta ordem? Não se pôde deixar passar em julgado uma tal doutrina.

Entendo por isso que, não só este projecto, mas todos os que se acham sobre a mesa, e que digam respeito a divisão territorial, devem ser adiados para serem discutidos em presença do governo. E isto não é materia nova; não é a primeira vez que se apresentam moções identicas á que está em discussão. Recordo-me de que na sessão passada se apresentou uma, moção, a qual a camara approvou, para que a discussão dos projectos que dissessem respeito a divisão territorial ficasse adiada para quando se tomasse uma medida geral. E então que quer dizer julgar a camara conveniente na sessão passada o votar-se uma moção d'aquella natureza, e estar agora discutindo a retalho projectos que se devem considerar prejudicados por aquella votação?

Ou o principio era bom, ou o principio era mau. Se era mau, a camara n?.o o, podia votar, vendo que tinha diante de si muitos projectos de divisão territorial para discutir. Mas parece-me que o principio era bom, porque a camara o sanccionou com o seu voto.

Entretanto responde-se a isto: «O sr. duque de Loulé foi ao seio da commissão e deu todos os esclarecimentos». Mas porque não vem o sr. duque de Loulé á camara? Porque não vem esclarece la sobre a conveniencia de se adoptarem as divisões territoriaes que se propõem nos diversos projectos que estão sobre a mesa?

Por todas estas considerações, eu voto contra o projecto e pelos dois adiamentos que se apresentaram, porque entendo que nós devemos pôr um dique a estas divisões territoriaes a esmo que se estão aqui fazendo todos os dias, sem se saberem as rasões de conveniencia que as determinam, e das quaes nós só podemos ter conhecimento quando o governo, oficialmente e pelos meios regulares, no-lo faça saber.

Tenho concluido.

O sr. Adriano Pequito: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se a materia está discutida.

Julgou se discutida.

O sr. Vaz Preto: — Peço licença para retirar a minha proposta de adiamento.

Foi concedido.

O sr. Presidente: — Vae votar-se a proposta de adiamento do sr. Mártens Ferrão.

O sr. J. M. de Abreu: — Peço que a votação seja nominal.

Assim se decidiu, e feita a chamada verificou-se não haver vencimento.

O sr. Mártens Ferrão (para uma explicação pessoal): — Direi muito pouco. O illustre deputado, o sr. Quaresma, entendeu que eu havia querido entrar nas intenções dos cavalheiros que apoiam o projecto; s. ex.ª enganou se, não me fez justiça.

O que eu disse foi que — não julgava nem conveniente, como medida de administração, nem proprio com a dignidade do parlamento, que na vespera de uma eleição geral o parlamento estivesse dando o exemplo de alterar a divisão do territorio na ausencia de explicações categoricas e positivas da parte do governo dadas á camara, porque o dever dos governos constitucionaes é comparecerem no parlamento e explicarem ahi as rasões de administração sobre os pontos que se ventilam; e com muita mais rasão n'uma materia toda de administração, como é esta. Apresentei uma proposição geral, um principio geral; disse, e repito, que não acho conveniente nem proprio que na vespera de uma eleição geral se faça no parlamento a divisão de territorio por um modo tão differente d'aquelle que tem sido pratica constante no mesmo parlamento; o um facto que não pôde ser bem interpretado. Quem não dirá que se está assim querendo influir nos resultados eleitoraes! Aqui não ha allusão, aqui ha um facto contrastado (apoiados). Apresentei uma proposição generica, e se o illustre deputado quiz tomar para si e para outros aquillo que por modo algum podia ser assim tomado, não é culpa minha, nem a minha proposição dava logar a isso (apoiados).

A minha proposição foi e é exactíssima. E irregular este systema de discutir projectos d'esta ordem na ausencia do governo (apoiados). O sr. ministro respectivo não podia dar um voto de confiança á commissão, como disse o illustre deputado, para ella apresentar projectos ácerca de divisão territorial debaixo de certos principios ou condições; o governo devia e deve vir á camara dar as rasões de administração e conveniencia publica que houver para que a divisão territorial seja alterada d'esta ou d'aquella fórma (apoiados). O voto de confiança dado á commissão, como disse o illustre deputado, rejeito-o, porque elle nao serve de nada para mim, nem para os deputados que, no uso do seu direito, desejam pedir explicações ao governo, porque este, no cumprimento do seu restricto dever, lh'as deve dar ácerca de qualquer objecto da administração publica. Estes é que são os principios, e não a camara votar pelo voto de confiança do ministerio (apoiados).

A missão parlamentar vale mais alguma cousa.

São estas as explicações pessoaes que tinha a dar.

O sr. Quaresma: — Peço a palavra para uma explicação.

O sr. Presidente: — Devo advertir ao illustre deputado que o regimento manda dar a palavra para explicações quando se tenha pedido durante a discussão, portanto não lh'a posso conceder, e passâmos á ordem do dia. Os srs. deputados que tiverem algum requerimento, representação ou projecto a mandar para a mesa podem manda-los.

O sr. Rocha Peixoto: — Mando um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Julio do Carvalhal: — Remetto para a mesa um projecto de lei a respeito da estrada do caes do Pinhão a Mirandella, e um requerimento para que entre em discussão o projecto n.° 73, de 1862; e um outro requerimento para que se recommende á commissão de guerra haja do apresentar o seu parecer sobre as pretensões dos srs. barão de Grimancellos, Antonio Rodrigues Lemos e João Antonio de Azeredo Coutinho.

O sr. Fernandes Vaz: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Almeida, pedindo a continuação do caminho de ferro pela Beira a Almeida.

O sr. Levy: — Mando para a mesa um requerimento.

O sr. Almeida e Azevedo: — Mando para a mesa um requerimento de Francisco Xavier de Brito, do logar da aldeia de Villa Maior, concelho de S. Pedro do Sul, em que pede a esta camara a graça de lhe fazer extensivo o beneficio do artigo 1.° da carta de lei de 11 de fevereiro de 1862, para o effeito de ser reformado no posto de alferes de infanteria, e addido aos batalhões de veteranos.

As rasões em que baseia o seu pedido, e que exuberantemente comprova com o attestado que vae junto, passado por João Pedro Soares Luna, coronel que foi de artilheria n.° 2, e cuja probidade e honradez ninguem jamais ousará pôr em duvida, são de tal fórma concludentes que não podem deixar de ser attendidas, principalmente por uma camara tão esclarecida como esta, e que tantas provas ha dado de que sabe acatar o grande principio de igualdade perante a lei.

Bastará recordar que este honrado cidadão, tanto na qualidade de membro do corpo academico, em que se alistara já antes de 1830, como no posto de alferes de infanteria n.° 15, para que fôra nomeado na ordem do exercito de 31 de outubro de 1833, e do qual fôra demittido, pelo requerer, em abril do 1834, quando terminou a luta, fez relevantes serviços á causa da liberdade e do throno constitucional. Sendo forçado a emigrar para a Galliza, d'onde passou para a ilha Terceira, indo ajudar á tomada da ilha de S. Miguel, desembarcando depois com seus bravos camaradas nas praias do Mindello, e continuando em seguida a pelejar sempre com denodo e bravura nas batalhas em que entrou até 1834, em que acabou a guerra.

Seria portanto menos conforme á equidade, para não dizer injusto, que este cidadão, só pela circumstancia feliz de não haver sido ferido gravemente em combate algum (o que deve á Providencia Divina), ficasse privado do beneficio d'aquella lei, cujo espirito não podia ser outro senão o dar uma recompensa aos que prestaram tão valiosos serviços, e soffreram privações e incommodos n'uma epocha tão difficil e arriscada como a que decorreu de 1830 a 1834.

Quanto mais, se a camara ha pouco acabou de votar uma lei, em que mandou reformar no posto de alferes os sargentos que serviram com a junta do Porto; se agora mesmo se acha em discussão um projecto de lei para ser ampliado aos segundos sargentos que serviram na mesma junta o disposto na carta de lei de 30 de janeiro ultimo; se os serviços que estes militares prestaram são de uma ordem muito inferior aos que prestára o requerente, como ninguem poderá contestar, nem mesmo podem entrar em linha de comparação com os d'este, é de rasão e justiça que a sua pretensão seja attendida, concedendo-se-lhe o beneficio que implora.

Termino aqui, pedindo que o requerimento com o attestado junto sejam remettidos á commissão de guerra.

O sr. Silveira Menezes: — Tenho a honra de mandar para a mesa uma representação da commissão administrativa da santa casa da misericordia de Villa Viçosa, na qual se pede-a esta camara que não estenda ou applique aos bens das misericordias o principio da desamortisação; e quando porventura applique seja pelo menos com o correctivo de poderem as mesmas misericordias amortisar a juro e com as devidas seguranças os capitães que produzirem os bens desamortisados. Funda este pedido em rasões valiosissimas, que me abstenho de expor por agora para não fatigar a attenção da camara com considerações extemporaneas, reservando-me para as mencionar em occasião opportuna, e limitando-me presentemente a pedir a v. ex.ª que se digne dar á mesma representação o destino conveniente.

O sr. Freitas Branco: — Mando para a mesa um projecto de lei, no qual falta a assignatura do sr. Gonçalves de Freitas, porque este illustre deputado está gravemente doente.

O sr. Pinto de Araujo: — Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Presidente: — A camara votou que se entrasse na discussão do projecto sobre a abolição da pena de morte; mas a discussão d'este projecto exige a presença do sr. ministro da justiça, e s. ex.ª não pôde comparecer hoje, porque está empenhado na discussão de outro negocio na camara dos dignos pare?.

Devia continuar a discussão do orçamento; mas não está presente o sr. ministro da obras publicas, cujo orçamento se estava discutindo. Portanto, visto que o adiamento do projecto n.° 42 não obteve vencimento, fica para outra occasião, e passa-se á discussão do projecto n.° 44, que vae ler-se.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 44

Senhores. — Á commissão do guerra foram presentes requerimentos assignados por alguns cidadãos que, tendo sido promovidos a officiaes depois do mez de abril de 1828, lhes não foram garantias suai patentes na concessão de Evora Monte, nos quaes pedem não só a confirmação do posto de alferes desde o dia em que obtiveram esse posto, mas a sua reforma, applicando-se-lhes o disposto no decreto de 23 de outubro de 1851.

Tendo sido declarados pela regencia na ilha Terceira nullos todos os actos emanados do governo intruso desde o dia 25 de abril de 1828, os postos, especialmente os de alferes, conferidos depois d'aquella data, não podiam ser considerados legaes, e portanto garantidos na concessão de Evora Monte.

A commissão, porém, reconhecendo que os cidadãos requerentes tinham abraçado a carreira das arruas, e n'ella prestado bons serviços, havendo alguns feito a campanha

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peninsular, a de Montevideu e a de 1826; que é de toda a justiça remunerar os serviços feitos á patria; que é tempo de acabarem todos os vestigios das dissensões politicas entre a familia portugueza; e finalmente que foi e9te o principio em que se firmou a carta de lei de 30 de janeiro ultimo: é de parecer que seja submettido á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° As praças de pret dos corpos de primeira linha do exercito que até o dia 25 de abril de 1828 eram porta estandartes, porta bandeiras, sargentos ajudantes, sargentos quarteis mestres, cadetes e primeiros sargentos serão reformados no posto de alferes, ficando addidos aos batalhões de veteranos.

Art. 2.º As disposições d'esta lei só aproveitarão aos individuos das classes de que trata o artigo antecedente que não tenham emprego lucrativo do estado, de que lhes resulte igual ou maior vencimento.

Art. 3.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 30 de março de 1864. =. Augusto Xavier Palmeirim, presidente = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Francisco Maria da Cunha = João Nepomuceno de Macedo = D. Luiz da Camara Leme = Fernando de Magalhães Villas Boas = Antonio de Mello Breyner, relator.

O sr. Ferreri (sobre a ordem): — Não sei o motivo por que estando presente o sr. ministro da guerra se não entra na discussão do orçamento do ministerio da guerra, como aconteceu ao da marinha e obras publicas que, apesar de não estar presente o sr. ministro do reino, e estar em discussão o orçamento do seu ministerio, foi esta inter rompida, e interrompida se acha ainda, e discutiu se o orçamento da marinha, passando-se depois ao das obras publicas.

O sr. Presidente: — Digo ao illustre deputado que o sr. ministro da guerra tem de ir para a outra camara, e por isso se não pôde entrar desde já na discussão do orçamento do ministerio da guerra. Portanto está em discussão na generalidade o projecto n.º 44, que acabou de ser lido, e tem a palavra o sr. Affonso Botelho sobre a ordem.

O sr. Affonso Botelho (sobre a ordem): — Vejo com muito prazer um momento, ainda que tardio, de justiça aos mais antigos desgraçados das nossas dissensões politicas.

Tenho advogado e continuarei a advogar sempre a causa dos desgraçados em que conheça uma justiça tão clara como aquella que conheço n'aquelles individuos que fazem objecto d'este projecto.

Já dei os meus louvores ao meu nobre amigo e collega, o sr. Coelho do Amaral, pela franca e leal protecção que deu a todas as victimas das nossas dissensões politicas, sem distincção.

Servir-me-hei da phrase do meu nobre amigo e collega, porque ella significa a justiça e a imparcialidade. O meu nobre collega e amigo disse «justiça a todos»; e eu digo tambem—justiça a todos.

É preciso que acabem por uma vez os vestigios d'essas dissensões politicas que todos nós deplorámos, aconselha-o a politica, aconselha-o a rasão, aconselha o a justiça e aconselha-o o proprio interesse do partido dominante. Mais de uma vez me tenho pronunciado contra a politica de partido, porque só a imparcialidade da justiça pôde reunir-nos e terminar nossas fataes dissensões.

As restricções que faz este projecto no numero dos desgraçados a quem diz respeito, mostram desgraçadamente tristes vestigios de uma politica do partido que não está em harmonia com a justiça de um governo liberal, de uma politica contraria até á dignidade da nação.

Não louvo nem censuro nenhum dos differentes partidos que se têem gladiado. Infelizmente houve uma epocha de divisão no nosso paiz, havia differentes opiniões que se combateram e foram sustentadas pelos seus partidarios, porém a revolução acabou ha muito tempo, é preciso que acabem as suas consequencias e que acabem para todos.

Os homens incluidos n'este projecto e n'outros que juntamente foram apresentados e votados sem discussão, foram praças de pret, que não devem ser politicos, nem genealógicos, mas soldados que devem ser obedientes aos seus superiores e nada mais; e quem obedece aos seus legitimos superiores nunca erra. Quando a sociedade exige castigos para reparação de delictos politicos, é aos chefes que mandaram, e não aos subditos que obedeceram á sua voz, a quem os deve applicar.

Só o coronel é responsavel pela disciplina do corpo, como só o capitão é responsavel pela disciplina da companhia, e assim successivamente; mas querer estabelecer como doutrina que um soldado seja um homem de livre arbitrio, que discuta as ordens dos seus superiores, e que seja castigado porque obedeceu devidamente, é destruir as principaes bases da disciplina militar.

Estou muito longe de censurar as reparações que se têem feito a todos os partidos que se envolveram em questões politicas depois da convenção de Evora Monte, ao contrario felicito os meus nobres collegas que as propozeram; e eu votei a favor de todas ellas, e votarei ainda a favor de todas as reparações que forem fundadas em justiça; mas seja-me licito perguntar — aquelles militares, que se revoltaram e combateram contra o governo estabelecido dentro do paiz e foram vencidos, terão menos direito para lhes serem reparados os prejuizos que soffreram em virtude das suas especulações politicas do que aquelles que combateram e capitularam em Evora Monte?

Já disse e repito, que nós os militares somos todos solidarios pela conducta que se exerce á sombra da bandeira portugueza; ambos os partidos combateram á sombra da mesma bandeira, nenhum d'elles a deshonrou, foi uma questão de irmãos; é preciso que nos abracemos cordialmente, e que a justiça seja igual para todos.

Sr. presidente, sem faltar ao meu dever, tive a fortuna de me não envolver nos choques dos partidos politicos; servi com todos os que governaram o paiz, cumprindo sempre religiosamente o meu dever, não posso portanto reclamar a honra dos -que venceram, nem partilhar as consequencias dos vencidos; tenho direito a ser julgado imparcial nesta questão.

O projecto diz o seguinte (leu).

Porque se restringe esta disposição unicamente aos de 25 de abril, e não se amplia até ao tempo em que teve logar a convenção de Evora Monte? (Apoiados.) Diz a illustre commissão que = a rasão é porque na ilha Terceira houve um decreto da Regencia que declarou nullos os postos concedidos posteriormente =. Muito bem.

E questão — se ás praças de pret que alcançaram postos inferiores, concedidos pelos commandantes dos corpos, é applicavel esse decreto; porém eu não faço d'isto questão, e julgo-o muito bem applicado aquelles que podiam ouvir as determinações da Regencia, mas não aos outros.

Eu não queria descer a comparações, porque desejaria riscar da ordem dos acontecimentos todos os successos revolucionarios que nos têem dividido; mas não posso ver uma injustiça tão parcial. Pois os que se revoltaram contra o governo existente em 1846, que ouviam as suas ordens, conheciam as suas leis, são menos revoltosos do que aquelles que seguiram as suas bandeiras nos desgraçados acontecimentos de 1828?

Torno a dizer, que estimo muito que se tenham reparado todos os prejuizos motivados por causas politicas, mas reclamo que se faça o mesmo a respeito de todos, sem fazer distincções odiosas, que conservam o germen da discordia, que podem prejudicar a todos os portuguezes, e principalmente ao partido dominante, que se tiver quem o combata, o que eu não espero, terá coberto com uma fraca cinza o fogo da discordia, que animava uma injustiça tão revoltante, para se desenvolver com toda a força de uma nobre e justa reacção contra a tyrannia.

Custa-me muito offerecer uma emenda ao primeiro artigo, mas desde já previno a camara — offereço esta emenda que julgo fundada em justiça, mas se eu vir durante a discussão que ella pôde ir embaraçar que se dê este escasso bocadinho de pão aos poucos d'estes desvalidos contemplados no projecto, desde já declaro que hei de pedir licença á camara para a retirar. É a seguinte (leu).

Peço para todos o mesmo que se dá a estes poucos, e creio que os meus nobres collegas hão de sympathisar com estes desgraçados e folgar de lhes fazer justiça.

Sr. presidente, felicito-me com o sr. Coelho do Amaral por haver promovido a justiça a favor dos seus compatriotas de todas as opiniões e de todos os partidos, e concordo completamente com o pensamento de s. ex.ª, de que é preciso acabar por uma vez e extinguir completamente os effeitos de todas as dissensões que nos têem dividido, e eu desejava que uma esponja limpasse por uma vez quanto podesse recordar as causas e os effeitos de acontecimentos sempre deploraveis aos olhos de todos os verdadeiros portuguezes.

Lastimo o espirito de partido que me censura e attribue a motivos partidarios a perseverança que tenho tido em proteger estes desvalidos; desprezo as mesquinhas suspeições de espiritos incapazes de comprehender pensamentos leaes e generosos que talvez não sejam capazes de praticar, e pensem de mim como quizerem, e apreciem a minha conducta como lhes aprouver; porque no exercicio das minhas obrigações só escuto a voz da minha consciencia, e só desejo que se faça justiça igual a todos, e creio que esse é tambem o pensamento geral da camara a que tenho a honra de pertencer.

Concluo mandando a minha proposta para a mesa.

É a seguinte:

SUBSTITUIÇÃO

As praças de pret dos corpos de primeira linha, que foram porta bandeiras, porta estandartes, sargentos ajudantes, sargentos quarteis mestres, cadetes e primeiros sargentos no exercito que capitulou em Evora Monte, e não foram contempladas em virtude do decreto de 26 de outubro de 1851, serão reformadas no posto de alferes, ficando addidas aos batalhões de veteranos. —Affonso Botelho.

Foi admittida.

O sr. Mello Breyner (por parte da commissão): — E para mim muitissimo penoso ter de referir-me a uma epocha desgraçadissima, da qual todos desejámos esquecer-nos (apoiados); entretanto tendo de defender o relatorio da commissão, que foi atacado, não posso deixar de me referir aquella epocha.

De certo espero não dizer cousa alguma que possa, pela maneira mais simples que seja, aggravar o assumpto ou escandalisar aquelles cavalheiros que por modo nenhum quero offender, e muito menos o illustre deputado e meu amigo que encetou este debate. Os individuos que acompanharam o exercito que se submetteu em Evora Monte, seguiram a opinião que tinham e que eu respeito, porque respeito a opinião de todos, apesar de n'essa occasião me achar no campo opposto, onde tive a fortuna de combater e a desgraça de verter muito sangue; mas esses individuos não têem, a meu ver e da commissão, os mesmos direitos d'aquelles que a commissão contempla no seu parecer. E contempla, note-se bem, em 1864, quando estes individuos desde 1851 que têem requerido á camara este beneficio ou outro maior; mas as commissões de guerra e as camaras entenderam sempre que não tinha chegado a epocha de fazer esse beneficio que hoje propõe a actual commissão.

O exercito que depoz as armas em Evora Monte compunha-se de officiaes, que já o eram pelo governo legitimo, e de outros individuos que foram promovidos durante a guerra, promovidos não só para preencher as vacaturas que se

deram pela mortalidade de officiaes em diversos combates, que foi grande, mas mesmo por virtude da molestia que fez n'aquelle exercito immensas victimas.

A ultima promoção extraordinarissima teve logar em Santarem, quando já a causa se julgava perdida. E eu encontrei em Evora individuos que, tendo sido promovidos a alferes e a tenentes, me pediram para serem conservados no exercito como soldados, requerimento que me repugnou, e a que se não podia attender, porquanto individuos que tinham sido considerados officiaes não deviam descer á classe de soldados.

Já se vê que estes homens, e aos quaes o illustre deputado, que acaba de fallar, se refere, não podem ser considerados nas mesmas circumstancias em que estão aquelles a que se refere o parecer da commissão. No parecer da commissão trata-se de individuos que fizeram ainda a guerra da Peninsula, ou parte d'ella, e bem assim a campanha de 1826, onde prestaram grandes serviços.

Ora, a regencia da Terceira determinou, e a roeu ver muito bem, que de certa e determinada epocha em diante, todos os actos emanados do governo de Sua Alteza o Senhor Infante D. Miguel se considerassem irritos e nullos.

Se a camara pois approvasse a proposta do illustre deputado, teria, para não ser injusta, de attender a todos os despachos, em todas as carreiras, que tinham sido feitos n'aquella epocha por aquelle governo. O seu espirito de classe, o seu amor pelo exercito, não o devem levar a commetter a injustiça de querer que se attenda a uma classe excluindo todas as outras, porque o Senhor Infante D. Miguel, quando rei, fez muitos despachos em todas as classes.

Eu desejaria muito, e creio que a camara toda desejaria, que se abrangessem todas, e se fizesse um projecto amplissimo, ainda que me parece que já não estão todas no mesmo caso em que estas, de que trata o projecto, se acham. Mas quer-se dar postos aos sargentos, a que a lei não marcava direito a accesso, como hão de ficar os outros officiaes? Seria então preciso contempla-los todos, e a estes com muita maior rasão se lhes não podia negar, por isso que eram já officiaes. Necessariamente todos estes haviam de passar a outro posto, quando tivessem boas informações e antiguidade. Parece-me que a camara attenderá a estas rasões, e que, sem prejuizo da approvação do projecto, a proposta do illustre deputado vá á commissão para ser examinada convenientemente.

Quando se tratar do artigo 1.° hei de mandar para a mesa um artigo que falta, e que me parece de toda a justiça. Entre estes individuos, ou fóra d'aquelles que são aqui mencionados no artigo 1.°, ha individuos que têem o curso das armas especiaes de artilheria e engenheria (apoiados); estão em condições muito diversas, porque os seus despachos podem considerar-se, e hão de considerar-se, como devidos ás suas habilitações, do que a despachos de mero arbitrio ou de favor. Portanto na occasião em que se discutir o artigo 1.° hei de mandar para a mesa um artigo por parte da commissão.

O sr. Castro Ferreri (sobre a ordem): — Folgo que este projecto de augmento de despeza seja discutido na presença de alguns membros do gabinete (apoiados). Estimo muito que esteja presente o nobre ministro da fazenda para nos dar algumas explicações a este respeito, aliás estariamos, por assim dizer, ás escuras, tratando de um objecto grave e que importa augmento de despeza, sem que o nobre ministro declarasse se o nosso estado financeiro comporta esta despeza. Quero ouvir o sr. ministro.

A camara ha de ter notado que sou governamental o maximo possivel, na idéa de querer que se governe e administre bem; por isso tenho pugnado constantemente. Não é só n'esta epocha, tem sido em todas, e com todos os governos. Admiro a bondade e generosidade de todos os srs. deputados, o bom coração que têem para fazer bem, e desejar beneficiar a todos; conheço que isso é proprio da bondade do coração dos portuguezes, e principalmente de homens illustrados como aquelles que se sentam n'esta camara. E na verdade parece que sou uma aberração ou desvio d'esta bondade do coração, porque estou sempre a contraria-los na sua bonhomia, no seu modo de sentir para com todos os individuos. Parece que faço uma aberração d'este proceder geral dos meus collegas, e que me colloco em pessima situação; mas a minha consciencia é que me guia sempre nas minhas idéas, no meu pensamento e no alvo dos meus desejos. Este alvo dos meus desejos é que as nossas finanças sejam restauradas, o equilibrio da receita com a despeza mantido, os melhoramentos materiaes em grande progresso, e o grande progresso que o lado da maioria apregoa, que seja uma verdade apalpada e sentida por todos. São estes os meus votos, e todos os meus fins convergem a esse ponto.

Não pôde haver medida alguma, por mais importante que seja, que não parta do systema central. Esse systema central, chamo eu ao systema financeiro. É o centro donde irradiam os raios da luz para toda a parte, e sem elles não é possivel fazer-se nada.

N'outro dia já nós discutimos e approvámos alguns projectos de augmento de despeza, e eu um pouco mais concisamente dei estas rasões; mas emfim a maioria votou; o governo estava ausente, o governo concordou com isso segundo affirmaram. Portanto não tenho responsabilidade, e estou seguro de que o paiz poderá com essa despeza, se é que pôde.

Apparece outro novo projecto; é preciso que a camara tenha em vista que não questiono o projecto pelo lado partidario. Talvez a camara julgue que combato este projecto, porque se refere a uma outra classe de individuos que, por assim dizer, não tem entrado n'essas ultimas questões politicas. Pôde julgar que havia alguma divergencia n'este modo de sentir, ou menos tolerancia da minha parte. É o con-

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trario d'isso; e tanto é assim que eu não julgava que este projecto viesse assim fraccionado, e que contemplasse sómente uma parte sem rasão de ser, em relação ao todo. Não vejo rasão alguma. A minha proposta não vem a ser mais do que um limitado adiamento até que o governo traga uma medida geral sobre todos os convencionados de Evora Monte. O projecto é uma medida justa; mas é preciso que comprehenda todos esses individuos. Não vejo rasão alguma, nem vi que o illustre relator da commissão a apresentasse, que me convencesse de que a concessão feita a alguns individuos e aos primeiros sargentos, que não tinham direito algum a accesso, deixasse de ser feita a todos que eram officiaes e que seguiram as suas bandeiras até Evora Monte. Não vejo rasão alguma para haver uma excepção a este respeito. O que eu desejo é uma medida geral, e que o governo combine o modo de a fazer. Apresente a na camara, que estou prompto a vota-la. O projecto que está em discussão é uma medida mesquinha, porque diz só respeito a certos individuos. Portanto a minha proposta, repito, não é senão adiar este projecto até que o governo apresente uma medida que abranja todos até á convenção de Evora Monte. Não julgue a camara que no meu animo existe o mais pequeno resentimento partidario, antes pelo contrario direi que o partido decaído, o partido Convencionado em Evora Monte, é o mais liberal que pôde haver, e talvez que os seus membros se possam reputar mais liberaes do que eu proprio. Talvez que isto pareça uma opinião exagerada, mas não o é, e vou prova-lo.

Todos sabem que os membros d'esse partido onde os mais importantes fizeram parte dos movimentos que tiveram logar em 1847, serviram debaixo das ordens da junta do Porto. Eu achava-me então da parte de fóra e vi que esses individuos, que eu tinha combatido desde tenros annos, me combatiam porque me julgavam moderado nas minhas idéas, e portanto menos liberal do que elles. Diziam que nos vinham combater, porque não seguíamos as grandes idéas e doutrinas liberaes, e por conseguinte que defendiam a bandeira da maxima liberdade e do maximo progresso.

Eu não posso imaginar que houvesse idéas menos nobres ou fins occultos entre uma parte d'esses homens que se agruparam para defender a mesma causa, porque então era necessario suppor que não havia boa fé, ou que existia um arrière pensée, um pensamento extranho que ali os levava que podia ennegrecer o seu caracter e a sua honra. Isto não o posso eu crer, e se combatiam os que se achavam do lado contrario ao seu, dizendo que elles não eram liberaes e que não seguiam as verdadeiras idéas de progresso, é porque se consideravam mais liberaes e mais rasgadamente progressistas.

Elles diziam: «Nós temos idéas liberaes, nós somos progressistas e estamos promptos a derramar o nosso sangue por esta causa». Poderia haver n'isto algum pensamento menos airoso, menos leal, de menos sinceridade da parte de alguns d'esses individuos collocados n'uma importante posição, e altas personagens de um partido? Não pôde ser. Portanto não podemos pensar senão que, entre todos esses individuos, havia idéas homogeneas, e que essas idéas eram as do progresso mais rasgado. Os homens que se alistaram ao serviço da junta disseram: «Vamos combater os liberaes moderados, porque queremos mostrar-lhes que somos mais liberaes do que elles, e que prezámos mais do coração as idéas do progresso». Sendo isto assim, pergunto — se porventura os individuos do partido decaído não são tanto ou mais liberaes do que eu? (Apoiados.)

Já so vê que não posso considerar esses individuos como absolutistas, retrogrados ou reaccionarios; considero os tão progressistas e tão liberaes como os membros da maioria d'esta camara, ou como os membros da esquerda.

E esses individuos que combatiam em prol d'essa liberdade e d'esse progresso eram tão liberaes, e estavam tão unidos e fraternisados que, cousa notavel, havendo um movimento sedicioso dirigido por um general estrangeiro que estava em Braga proclamando outro chefe do estado e outra fórma de governo, quando todos julgavam que os officiaes do partido decaído seguiriam as idéas proclamadas por esse general, viu se por elles abandonado logo que a Victoria ficou do lado dos liberaes.

Passado pouco tempo, talvez dias, esses mesmos individuos que se achavam n'esse campo por uma conversão rapida, mais rapida que a de S. Paulo, e illuminados pelo Espirito Santo, por assim dizer, pela mesma fórma por que o foram os apostolos, immediatamente largaram as armas, e se aggregaram aos progressistas, entrando na cidade eterna. Por conseguinte já se vê que por todas estas rasões não podem deixar de ser considerados como homens liberaes, como individuos que lançaram por terra, á voz dos seus chefes arrependidos e como envergonhados da sua contumácia, os emblemas que os apresentavam como inimigos das idéas liberaes.

Parece-me portanto que, depois d'este succinto relatorio, não podem ser considerados senão como progressistas e grandes liberaes, e assim os considero e aprecio.

A camara vê por conseguinte que eu não posso combater o que se propõe no projecto senão por ser mesquinho, e porque desejo uma medida geral que abranja todos os individuos que desde o principio da luta cumpriram o seu dever até Evora Monte.

Isto é, uma questão que tem sido discutida nesta casa, nos jornaes, e que se acha discutida na opinião publica. Todos os dias se ouve dizer que é necessario sarar as cicatrizes que nos têem deixado as nossas dissensões civis, as nossas contendas politicas; e se queremos sarar essas cicatrizes é necessario tornar a medida mais larga, e levar o beneficio a todos aquelles que se achem nas mesmas circumstancias.

A minha idéa é que o governo apresente uma medida geral que comprehenda todos os officiaes, e por isso proponho o adiamento até que o governo traga á camara uma medida geral a respeito dos convencionados de Evora Monte...

Uma voz: — Não traz nada.

O Orador: — Isso é não confiar no governo...

O sr. J. A. de Sousa: — Não se faz nada.

O Orador: — Pois o illustre deputado não confia em que

0 governo, que é tão tolerante, ha de tomar todas as medidas para esquecer todas as nossas dissensões politicas e remediar os males que d'ellas provieram? Eu confio em que o governo ha de assim proceder; e peço lhe que, depois de estudar e meditar sobre a conveniencia de apresentar a este respeito uma medida geral, apresente essa medida ao parlamento, que lhe não ha de decerto recusar o seu voto.

Leu-se logo na mesa a seguinte PROPOSTA

Proponho o adiamento até que o governo traga á camara uma medida geral a respeito dos convencionados de Evora Monte. = Ferreri.

Foi admittida.

O sr. José de Moraes (sobre a ordem): —Tendo me inscripto sobre a ordem, vou mandar para a mesa uma proposta...

O sr. Affonso Botelho: — Peço a palavra para um requerimento, t

O Orador: — Naturalmente é para abafar a discussão?

O sr. Affonso Botelho: — Não, senhor. Julgue bem emquanto não tem rasões para julgar mal.

O Orador: — A proposta que mando para a mesa não é nova, é velha, e importa o adiamento d'esta questão, que a camara está no direito de rejeitar. Nunca me offendi com isso, porque tanta gloria tenho quando fico ao lado da minoria como quando fico ao lado da maioria.

Mas esta proposta foi votada na sessão de 13 de março passado, com a qual não se fez mais do que revalidar a disposição consignada no nosso regimento, de que sobre todos os pareceres de quaesquer commissões que tragam augmento de despeza seja ouvida a commissão de fazenda.

Eu entendo que isto é justissimo. Pois qualquer membro da commissão de guerra, qualquer deputado, qualquer membro da commissão de fazenda, o proprio sr. ministro da fazenda pôde dizer emquanto importa a despeza proveniente d'este projecto? Ninguem o pôde dizer...

O sr. Camara Leme: — Peço a palavra.

O Orador: — Eu respondo ao illustre deputado, porque já sei o que vae dizer (riso).

Tambem em 1853, quando se apresentou n'esta casa uma proposta para reformar uns certos brigadeiros, me disseram d'aquelle lado da camara (o esquerdo) «pôde votar; não são mais de tres; e o augmento de despeza não pôde ser maior de 600$000 ou 700$000 réis».

Uma voz: — Quem o disse está na India.

O Orador: — Está na India, é verdade. Foi o sr. conde de Torres Novas.

Mas eu, apesar de acreditar muito na palavra d'aquelle cavalheiro, de lhe consagrar todo o respeito, e de ser seu particular amigo, fui votando contra a proposta. E não fiz mal, porque a despeza que ella trouxe, segundo affirmou o meu amigo, o sr. Camara Leme, não subiu a 18:000$000 réis, I como eu tinha dito, mas a 14:000$000 réis.

Ora a differença de 700$000 réis para 14:000$000 réis é uma bagatella que o pobre contribuinte paga!

E poderemos nós com estes augmentos de despeza, que se estão fazendo todos os dias em grande escala? Poderemos nós com estes augmentos de despeza, quando o sr. ministro da fazenda no seu relatorio diz que o deficit para o anno economico futuro andará por 1.200:000$000 réis quando a commissão de fazenda o calcula em 1.700:000$000 réis, mais 500:000$000 réis do que no calculo do sr. ministro; e quando eu, sem ter auctoridade financeira mais do que aquella que me poderia conceder o administrar bem o que possuo, digo, comquanto não queira ser propheta, que talvez exceda a 3.000:000$000 réis?

A contar com os projectos que já se votaram este anno, com os que se estão votando, e com os que se hão de ainda votar, a contar com estes projectos ad hominem, de interesse pessoal, que nos mais annos vinham no fim da sessão ao levantar da feira (permitta se a expressão), e que este anno vem tão cedo, vejam aonde irá parar. Ha de chegar ao ponto de o sr. ministro da fazenda, seja elle quem for, vir aqui dizer «Vós votastes projectos que se converteram em leis, as quaes trazem um extraordinario augmento de despeza. A essa despeza não se pôde occorrer sem que se lancem tributos; e portanto votae os tributos».

E o povo ha de pagar não sei porquê.

Na historia dos 85:000$000 réis, que já se votaram, se houvesse quem tivesse querido tirar d'isso partido tirava-o...

O sr. Quaresma: — Houve, houve.

O Orador: — Eu n'estas questões sou mais ministerial do que o proprio sr. ministro.

Parece-me que as observações que apresento são de algum peso, e dignas de ser attendidas.

Eu não faço opposição ao projecto de que se trata. Mas se toda a vez que um projecto de lei trouxesse augmento de despeza, fosse este augmento n'elle determinado, já com relação a este, não vinha o sr. Affonso Botelho com a sua proposta, e não viriam com outras propostas no mesmo sentido todos os illustres deputados que pediram a palavra sobre a ordem.

Não quero adivinhar, mas aposto que todas as propostas que vão ser offerecidas todas tendem para augmentar a despeza que o projecto envolve comsigo!

Mando para a mesa a proposta a que me referi.

E peço ao meu amigo, o sr. Camara Leme, que é membro da commissão de guerra, me diga qual é a cifra da despeza d'este projecto, porque pretendo d'ella tomar nota, para quando tornarmos a encontrar-nos n'esta casa, lhe dizer se me enganei ou não. Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que seja adiado o projecto n.° 44, de 30 de março de 1864, por não se ter ouvido a commissão de fazenda, ouvida a de guerra, cumprindo-se a resolução da sessão de 13 de março de 1863. = José de Moraes Pinto de Almeida.

Foi admittida.

O sr. Gomes de Castro: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda. Mandou-se imprimir.

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — Eu agora não entro na discussão do principio que serve de base a este projecto, e não trato de indagar se é ou não justo ampliar disposições de leis anteriores que têem relação com esta questão. O que me parece é que devemos andar com toda a prudencia em votar projectos d'esta ordem, que podem trazer grande augmento de despeza (apoiados); porque, embora o nosso estado financeiro não seja medonho, é certo que temos um deficit, que provém principalmente da necessidade de satisfazer despezas extraordinarias de utilidade publica (apoiados).

Podemos ir attendendo a diversas considerações de ordem politica e fazendo justiça distributiva, mas á proporção dos recursos que formos tendo, não devendo ir alem d'isso; e em todo o caso, quando se tomar uma medida d'esta ordem, devemos examinar primeiro qual a despeza que pôde trazer comsigo, e ver se o estado do nosso thesouro comporta esse aggravamento de despeza (apoiados).

Portanto sem querer combater o projecto em principio, parece-me que seria mais prudente devolve-lo ás commissões de guerra e fazenda, para que de accordo o examinem de novo, e as diversas emendas e propostas, que têem sido offerecidas todas debaixo do ponto de vista de elevar a despeza, e apresentem o seu parecer á camara.

Isto é o que julgo mais prudente para chegarmos a mais acertada solução d'esta questão (apoiados).

O sr. Affonso Botelho (para um requerimento): — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me dá licença que retire a rainha substituição ao artigo 1.°

Não apresento as rasões por que peço para a retirar, e só digo que retirando-a faço com que esses desgraçados, que são envolvidos n'este projecto, não sejam privados do beneficio que outros têem recebido em virtude de projectos identicos que têem sido approvados por esta camara.

A camara permittiu-lhe retirasse.

O sr. Mello Breyner: — Começarei respondendo ao meu. amigo, o sr. José de Moraes, e dir-lhe-hei que emquanto á despeza em que importa este projecto não o sabe a commissão de guerra, como o não ha de saber a commissão de fazenda, e...

O sr. José de Moraes: — Aceito a declaração. Que tal é a despeza.'!...

O Orador: — Esta é a verdade. Ainda que as commissões e o governo tratem de saber por todos meios ao seu alcance quantos são os individuos a que este projecto aproveita e quaes as sommas que isto ha de produzir, nós nunca viremos a sabe-las. Pelo menos nem eu, nem a commissão de guerra, nem a commissão de fazenda podemos responder desde já ao illustre deputado.

Ora, se a commissão de guerra se apressou em dar o seu. parecer sobre este projecto, foi por ter a camara já votado o principio que se tornou em lei em 30 de janeiro d'este anno que, apesar da declaração que fiz, approvei, porque era anti-governamental e revolucionario; mas depois de votado pela camara, agora, custe o que custar, ha de votar este, senão fará uma injustiça (apoiados).

E o que tenho a dizer.

O Sr. Visconde de Pindella: — Disse o nobre ministro da fazenda que =era preciso haver muita cautela em se votarem projectos de que se não sabe o alcance, e que de certo vão sobrecarregar as despezas do thesouro; e que lhe parecia que o melhor era adiar esta questão e trata-la em grande =. E esta idéa é tambem a do meu illustre amigo o sr. Castro Ferreri.

Até certo modo concordo com o adiamento; mas digo só que se ha adiamentos que acabam com as questões, este é um d'elles. Se o adiamento for indefinido, se levar muito tempo e nós não tratarmos d'este assumpto, e não dermos de comer a esta classe, não ha necessidade nenhuma depois de o trazer; porque ella vae aproveitar a pessoas de uma avançada idade, que pela ordem natural das cousas têem uma grande mortalidade; por conseguinte se não vier n'esta sessão, que estou a ver não virá, passar para outra e durar mais tempo, pouco ou nada aproveitará (apoiados).

Noto que a lei não seja igual para todos, e que queiram sómente contemplar uma classe de um certo modo, deixando outros da mesma classe por contemplar. Não entendo que similhante procedimento esteja no espirito liberal e progressista d'esta casa (apoiados). Esta é que é a cousa, permitta-se-me a expressão, não tem outro nome. Vejam os illustres deputados o que querem fazer; se querem fazer o que deve estar no seu animo, então vejam bem que a lei é igual para todos, e que devemos contemplar todos do mesmo modo. Esta é que é a questão (apoiados).

Tambem sou de voto que se deve attender ao estado da nossa fazenda, que podem mesmo as commissões de accordo com o governo considerar este negocio, é a minha opinião; mas que não tenha um adiamento Indefinido; quando não, não aproveita aquelles que desejámos sejam beneficiados, o que é de toda a justiça. E para Isto não vae o bom coração dos deputados, como disse o Illustre deputado, aqui

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nao ha melhor nem peior coração; o que ha é justiça contemplando a todos do mesmo modo, a todos como se tem feito (apoiados).

Quanto aos officiaes de armas scientificas, é mais uma rasão, alem da rasão, da justiça que assiste em geral, por pertencerem a um curso superior, pelo que devem ser dobradamente contemplados.

Não faço mais largas considerações á camara, porque tendo de mandar uma substituição aos artigos, e sendo precedida de alguns considerandos, entendo que n'elles está o bastante para a justificar. Peço que a minha substituição vá á commissão, e que ella a attenderá como lhe parecer de justiça (leu).

Creio, como já disse, que n'estes considerandos está a sustentação d'este projecto. Póde-se dizer muito mais por differentes phrases e palavras, mas a substancia está aqui, era repetir a idéa e nada mais, e eu seria impertinente se continuasse a justificar esta minha emenda ou substituição aos artigos, alem do que vae nos considerandos d'ella, porque os meus nobres collegas têem tambem substituições a mandar para a mesa, e por consequencia eu devo ter com elles esta contemplação.

Sr. presidente, aqui não ha nem mais progressistas nem mais liberaes; ha uma cousa que está acima de tudo isto, ha portuguezes (apoiados). São todos portuguezes, todos seguiram o seu partido, porque entenderam que o deviam seguir; todos o sustentaram com honra (apoiados); todos seguiram as suas bandeiras julgando que serviam uma boa causa; e todos obedeceram aos seus chefes, como é a primeira obrigação de todo o militar, e do soldado portuguez é nobre timbre (apoiados).

Isto está dito por muitas pessoas competentes, e ainda ha pouco tempo foi dito por um illustre deputado insuspeitíssimo, muito liberal, como é o meu illustre amigo, o sr. Coelho do Amaral; não é suspeito, repito, assim como creio que o não sou, nem o é ninguem (apoiados).

Nós não estamos tratando senão de fazer justiça, e por conseguinte parece-me que na substituição que tenho a honra de mandar para a mesa está consignado este principio.

Não quero tirar mais tempo á camara; digo só que se se quer que a commissão e o governo reflictam sobre esta materia vá muito embora o projecto á commissão, mas que não seja adiamento indefinido, porque quando não acaba esta sessão e podem acabar os homens a quem esta lei aproveita; creio que esta é a verdade.

Mando pois para a mesa esta

PROPOSTA

Considerando que é de alta conveniencia politica acabar com todos os vestigios de nossas lamentaveis dissensões politicas, restabelecendo a perfeita igualdade de direitos ante a lei a todos os portuguezes, como é de justiça universal, e determinadamente a estatue a carta constitucional da monarchia;

Considerando que é de summa justiça reconhecer os prestantes serviços do antigo exercito de Portugal, feitos em prol da liberdade e independencia do paiz;

Considerando que é dever dos governos respeitar e fazer respeitar o principio da disciplina militar, e não offender esse principio desconsiderando aquelles que a guardaram religiosamente;

Considerando que será honrosissimo para o partido liberal portuguez, inaugurar uma epocha de verdadeira tolerancia e liberdade, que só podem assentar na justiça, proponho em substituição aos artigos 1.° e 2.° do parecer n.° 44 o seguinte:

Artigo 1.° São conservadas aos officiaes do exercito, que depoz as armas em Evora Monte, e do todas as forças da dependencia d'esse exercito, as honras dos postos que tinham em 27 de maio de 1834.

Art. 2.° Aos officiaes de 1.ª linha, não comprehendidos no decreto de 23 de outubro de 1851, que não tiverem logar publico retribuido, será abonado um subsidio de réis 12$000 mensaes, pago pelas pagadorias militares das divisões onde residirem os subsidiados.

Art. 3.° O governo poderá reformar d'estes officiaes aquelles que tiverem prestado ou vierem a prestar serviços relevantes ao paiz e á liberdade. = O deputado pelo 2.° circulo eleitoral de Guimarães, Visconde de Pindella.

Foi admittida.

O sr. Quaresma: — Mando uma proposta que escuso de justificar, porque vae de accordo com os argumentos apresentados por alguns illustres deputados. É necessario saber a despeza que pelo projecto se faz e como se faz (apoiados).

PROPOSTA

Proponho que o projecto era discussão e as propostas que ácerca d'elle têem sido mandadas para a mesa, sejam enviados, ás commissões de guerra e fazenda. = Quaresma.

Foi admittida.

O sr. Camara Leme: — Tenho visto as propostas que têem sido mandadas para a mesa, assim como ouvido attentamente as rasões pelas quaes muitos dos illustres deputados julgam conveniente que estas propostas vão á commissão de fazenda, mas não posso deixar de me admirar da injustiça relativa com que se fazem as cousas n'esta casa.

A camara approvou hontem, ou ha dois dias, dois projectos de lei exactamente nas mesmas circumstancias, os quaes diziam respeito aos sargentos da junta do Porto; approvaram-se estes projectos e ninguem se levantou para querer saber em quanto importava-a despeza (apoiados). Ninguem disse que era necessario ir á commissão de fazenda, não houve nenhum deputado zeloso em querer saber em quanto importava a despeza e se havia meios com que lhe fazer face (apoiados); vem agora o projecto dos sargentos que se dizem realistas e que deviam merecer toda a contemplação d'esta camara, e pede-se que vá á commissão para dizer qual a despeza que o projecto ha de occasionar! Pois eu sem ser propheta posso dizer que a despeza ha de ser menor, do que a que se ha de fazer com os sargentos da junta do Porto (apoiados).

Uma voz: — Não se sabe quanto é.

O Orador: — Não se sabe, nem ha de ser facil saber-se, porque se não póde saber exactamente quantos são os individuos que estão n'estas circumstancias, assim como é difficil saber em quanto importa o projecto dos sargentos da junta do Porto que os illustres deputados votaram em silencio (apoiados).

O projecto que se discute trata dos sargentos que serviram outra causa, e os illustres deputados que tanto empenho mostraram por que se votasse o dos sargentos da junta deviam ser os primeiros a querer que se applicassem agora os mesmos principios. Eu sou insuspeito, porque na commissão quando o sr. visconde de Sá apresentou o projecto de lei a respeito dos sargentos da junta do Porto, eu disse juntamente com o sr. D. Antonio de Mello que approvava o projecto, comtanto que o principio fosse extensivo a todos em iguaes circumstancias (apoiados). Accordou-se n'isto.

A commissão apresentou então um projecto concedendo certas vantagens aos sargentos que haviam servido a junta do Porto, e este projecto passou para a outra camara. Na camara dos pares fizeram se alterações, vem o projecto para esta casa e ficou pendente da sessão passada para este anno. Este anno, logo que se abriu a sessão, muitos illustres deputados pediram que a commissão desse o seu parecer sobre essas alterações, e alguns illustres deputados pediram que se fizesse extensiva a disposição aos sargentos realistas. A commissão apresentou o projecto para se attender aos sargentos realistas e para se lhes conceder o mesmo que se tinha concedido aos da junta do Porto; entra este projecto em discussão, levanta-se toda a gente para pedir que vá á commissão de guerra! Parece-me que estes desgraçados eram tambem dignos de se ter para com elles alguma compaixão e affecto, não me parece que o partido liberal queira fazer distincção a respeito d'estes individuos (apoiados).

Por consequencia eu pedia á camara que, visto o meu illustre amigo e parente, ter desistido do seu requerimento, e tendo em vista as circumstancias do thesouro, quizesse attender desde já aos individuos que se reputam ter mais justiça, e sou mesmo de opinião que se não podia aceitar desde a emenda do meu amigo o sr. Affonso Botelho, sem ser considerada pela commissão, porque podia ir occasionar uma despeza extraordinaria.

Mas, quanto aos individuos que se acham comprehendidos n'este projecto, parece-me que era um acto de justiça e de generosidade da parte da camara, o não votar uma injustiça relativa. Pois para que ha de o projecto ir á commissão se o principio é o mesmo?

O illustre deputado, o sr. José de Moraes, que sinto não ver presente, porque lhe queria responder, e mais o sr. Quaresma, são os illustres deputados que pedem sempre para que os projectos sobre negocios militares vão á commissão de fazenda. Julgo que é um bom expediente, mas parece-me que deviam ser do mesmo modo solicitos quando se tratou dos sargentos da junta, que estão nas mesmas circumstancias.

A camara póde fazer o que quizer, eu hei de rejeitar que o projecto vá á commissão de fazenda, porque não tem que lá ir fazer, e hei de votar para que não volte á commissão de guerra, porque esta já o apreciou e não tem mais que dizer. Quanto á despeza, a commissão de fazenda não póde dar parecer, porque não sabe quantos são os individuos a quem a lei terá de se applicar. E um adiamento indefinido, e o projecto não ha de cá voltar.

Por conseguinte, concluindo, digo que assim como a camara approvou o projecto a respeito dos sargentos da junta, deve tambem approvar o projecto que se acha em discussão, porque são todos portuguezes, e estão nas mesmas circumstancias (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Já ainda agora disse, por parte do governo, que não combato os principios do projecto (apoiados). O governo não faz differença entre os diversos cidadãos portuguezes (apoiados); seja quem quer for ha de fazer justiça igual para todos.

O governo não contesta o beneficio que pelo projecto se trata de fazer, mas não póde deixar de dizer á camara que é mais prudente e sensato votar com conhecimento de causa, do que votar sem esse conhecimento.

Diz-se: «Mas já se votaram dois projectos sobre materia analoga, sem irem á commissão de fazenda». Pois entendo que teria sido melhor irem á commissão de fazenda e apreciar-se qual é a despeza. Mas, se uma vez se procedeu assim, reconhecendo se depois que é melhor proceder de outro modo, não se segue que se proceda sempre como primeiro se fez; a questão é, se o que se vae fazer é racional ou não; e entendo que é, porque quando se vota uma medida que póde causar um augmento de despeza, deve-se apreciar até onde vae essa despeza.

Diz-se: «Não é possivel apreciar-se a despeza nas commissões, e a commissão de guerra já deu o seu parecer». Não é assim. Ha propostas novas que se apresentaram hoje, ainda agora apresentou uma o sr. visconde de Pindella, e ha mais outras propostas novas para a commissão examinar, em que se amplia o principio que ella adoptou; e a commissão, para ser logica, assim como admittiu outras ampliações, deve admittir todas as mais, e estender o mesmo principio de justiça a todos, segundo as doutrinas que admittiu; mas querendo estende-lo a todos é necessario apreciar até onde poderá ir a despeza; porque, como disse ainda agora, sem se negar o principio de justiça igual para todos, é necessario que o thesouro caminhe de modo que não vá alem dos seus recursos e que tenhamos em consideração os meios que temos para satisfazer as despezas que votámos (apoiados).

Portanto as commissões podem investigar e examinar por todos os meios que estiverem ao seu alcance, e de accordo com o governo, que se ha de prestar a dar todas essas informações, e a obte-las, até onde podem ir estas despezas, e depois informarem devidamente a camara, a fim d'ella votar com conhecimento de causa, e saber até onde vae a despeza, e se o thesouro está habilitado para lhe fazer face ou não.

Acho que este modo de proceder é muito mais prudente, e que todos os precedentes em contrario não provam contra o que elle é do racional.

Acho portanto que a questão não fica prejudicada nem sophismada indo ás duas commissões, e discutindo-se e elaborando-se ali um projecto que informe a camara da despeza que é necessario fazer, a fim de que ella vote com conhecimento de causa.

Acho pois que é muito mais racional, logico e prudente que o negocio vá ás duas commissões.

Agora peço licença para apresentar duas propostas de lei. Não lerei os relatorios, porque são um pouco extensos. (Leu a primeira).

No relatorio se desenvolvem os motivos por que é necessario fazer esta acquisição.

A segunda é para uma reducção do direito de baldeação (leu).

No relatorio tambem se desenvolvem os motivos em que esta proposta se funda.

São as seguintes:

PROPOSTA DE LEI N.° 66-D

Senhores. — A faculdade de baldear mercadorias de uns para outros navios, está sujeita ao pagamento do direito de 2 por cento ad valorem, fixado no artigo 4.° do decreto de 22 de março de 1834, que declarou franco o porto de Lisboa e estabeleceu na respectiva alfandega grande o deposito commercial.

Este excessivo direito, era relação á operação mercantil de que se trata, ha occasionado não só que o commercio não se tenha aproveitado de uma tal faculdade, mas tambem que o estado não haja auferido todas as vantagens inherentes a um maior movimento mercantil, tanto neste porto de Lisboa, como em todos os mais portos do reino.

Já não excederia de certo o indicado direito se, pelo faceto de não figurar entre os mencionados nas pautas das alfandegas e na receita do estado, não tivesse caído em esquecimento n'essas repetidas occasiões em que desde 31 de dezembro de 1852 se têem reduzido uns e eliminado outros, dos indicados direitos arrecadados naquellas casas fiscaes.

Tendo sido porém ultimamente requerido ao governo, por parte do commercio, que as baldeações fossem isentas, de direitos, ou quando muito, apenas sujeitas ao direito de um por milhar, igual ao que estabelecêra a carta de lei de 22 de fevereiro de 1861 para o transito das mercadorias por terra, isto a fim de que possam ser effectuadas n'este porto de Lisboa, de preferencia a outros portos, as baldeações a que é mister recorrer de presente para evitar os perigos da guerra em que infelizmente se acham envolvidas diversas nações, entendi ser chegada a occasião de sei adiantar mais um passo n'esse caminho, já encetado, das reformas tendentes a facilitar o maior desenvolvimento - do commercio nos portos do paiz, e assim obterem-se as correlativas vantagens.

E posto que o mencionado direito de um por milhar seja dez vezes inferior ao direito de 1 por cento estabelecido para as reexportações (saída para paizes estrangeiros de mercadorias de proveniencia estrangeira depositadas nas alfandegas e que não foram despachadas para consumo), nem por isso é de receiar que esse menor direito venha prejudicar a receita derivada do outro maior; porquanto é sabido que as reexportações têem uma rasão de ser mui diversa da das baldeações; e dado, mas não concedido, que houvesse de causar alguma diminuição, seria ella insignificantíssima, attendendo a que no anno economico de 1862-1863 foi o total da receita proveniente de reexportações 15:675$995 réis, contribuindo a alfandega grande de Lisboa com 13:070$926 réis.

Assim pois sendo de esperar que de se realisar a solicitada concessão, longe de haver diminuição, haverá augmento de receita para o thesouro publico, na rasão com postal da receita proveniente das baldeações, da que a mais se deve cobrar proveniente dos direitos de tonelagem) e doai de exportação (porque alguma é de prever haja a maior), bem como da que deve derivar-se, por diversos outros meios; do mais avultado movimento commercial e mercantil; harmonisando-se por esta fórma, na hypothese sujeita, os principios economicos com os financeiros; concedendo se novas franquias ao commercio, e auferindo-se maior reddito para o estado; assegurando ainda estes tão favoraveis resultados a consideração de que o porto de Lisboa será preferido a qualquer outro nacional ou estrangeiro, attentas as bem reconhecidas vantagens que offerecem a sua posição, entrada e ancoradouro: por todas estas considerações; que a vossa illustração bem saberá apreciar, tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° O direito de 2 por cento a que estão sujeitas as baldeações de mercadorias, em virtude do disposto no artigo 4.° do decreto de 22 de março de 1834, fica reduzido a um por milhar.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da fazenda, em 15 de abril de 1864. = Joaquim Thomas Lobo d'Avila.

PROPOSTA DE LEI N.° 66-E

Senhores. — A falta que desde ha muito se tem feito sentir de armazens adequados para o deposito de mercadorias que

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foi estabelecido pelo decreto de 22 de março de 1834 no porto de Lisboa, cada dia vae subindo de ponto, com gravame para o commercio e graves embaraços para a administração da respectiva alfandega.

O governo tem posto em acção todos os meios ao seu alcance para attenuar, de algum modo, aquella falta, e entre elles figura o de que trata o documento n.° 69 do relatorio, que tive a honra de vos apresentar em 5 de janeiro ultimo.

Apesar do aperto das circumstancias, não ha o governo feito uso da faculdade que lhe é conferida pelas respectivas provisões do capitulo 6.° do decreto de 10 de julho de 1834, concedendo que as mercadorias se recolham em armazens particulares, já porque em alguns casos esse expediente é assás oneroso para o commercio, e já porque a acção fiscal soffre com elle grande quebra, pondo em risco os legaes interesses da fazenda publica.

Dando-se presentemente o favoravel ensejo de serem adquiridos os tres predios sitos na rua do Jardim do Tabaco, que pertencem á sociedade em liquidação, denominada «manutenção civil», por isso que se acha annunciada a sua proxima arrematação para se realisar na casa da praça do commercio d'esta cidade, sobre o lanço garantido de 51:000$000 réis, venho propor-vos, que o governo seja habilitado para poder mandar licitar n'aquella arrematação.

Não só pelo que levo dito, mas tambem pelo que ainda passo a adduzir, conhecereis que se torna como impreterivel a acquisição, por parte da fazenda publica, dos armazena que constituem aquelles tres predios.

A sua capacidade, a sua collocação proxima aos armazena que ali já tem a alfandega, bem como da nova estação principal dos caminhos de ferro do norte e de leste, condições estas que se não encontram em nenhum outro edificio n'aquellas proximidades, tudo está indicando quanto seja conveniente o estabelecer nos ditos armazens, postos á venda, assim o deposito de todas as mercadorias transportadas pelos referidos caminhos de ferro, como a apropriada delegação da alfandega grande de Lisboa para dar despacho ás mesmas mercadorias; evitando se por este modo os graves inconvenientes de terem estas de vir á indicada alfandega.

Finalmente, senhores, considerando ser de uma bem entendida provisão fiscal, que se procure, pelos meios menos onerosos, que entre a alfandega e a estação dos caminhos de ferro não existam predios, que não sejam do dominio da fazenda publica, isto pelas rasões que por obvias deixarei de mencionar; considerando que realisada que seja a acquisição de que ora se trata, muito se facilitará o obter-se aquelle fim; por todas estas considerações pois julgo que merecerá a vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar licitar e arrematar, por conta da fazenda nacional, os tres predios situados na rua do Jardim do Tabaco, pertencentes á sociedade em liquidação, denominada «manutenção civil», e que se acham annunciados para proxima venda na casa da praça do commercio de Lisboa.

Art. 2.° Os predios arrematados nos termos do artigo antecedente serão encorporados nos proprios nacionaes, e ficarão considerados como pertenças da alfandega grande de Lisboa, para n'elles estabelecer os deposites de mercadorias e as estações fiscaes, que forem convenientes ao serviço da mesma alfandega, e á maior commodidade do commercio.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria. d'estado dos negocios da fazenda, em 12 de abril de 1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

Foram ambas remettidas á commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada, e mais os projectos n.º 39, 58, 59 e 51 deste anno.

Está levantada a sessão.

Eram mais de quatro horas da tarde.

Em virtude da resolução da camara dos srs. deputados se publica o seguinte documento

Senhores. — A commissão de fazenda foi enviado um requerimento da companhia união mercantil, em que pede que esta camara interprete qual o sentido que foi dado ao artigo 5.° da carta de lei de 13 de julho de 1863 combinado com o artigo 1.° da mesma lei.

Diz a companhia que, nos termos do artigo Li da referida lei, fôra intimada pelo governo para se reorganisar a fim de poder obter as vantagens que por aquelle artigo se lhe concedêra.

Que era virtude d'esta determinação a companhia tratou de se constituir definitivamente, estabelecendo porém o estado provisorio em que era necessario entrar, durante o tempo essencial e preciso para se reconstituir, pedindo ao governo que, assim, a considerasse para obter as vantagens da nova lei.

Que em resposta o governo declarára á companhia:

«1.° Que não concede o subsidio auctorisado pela lei de 13 de julho de 1863, porque a companhia senão rehabilitou dentro do praso por elle designado;

«2.° Que o governo se considere livre para providenciar ácerca da navegação da Africa, Açores e Algarve, como convier aos interesses publicos e for de justiça.»

Pretende a companhia, que o governo por esta sua determinação contrariou o espirito e a letra do artigo 5.° da referida lei, com grave prejuizo da fazenda publica e dos seus accionistas.

A commissão, tendo examinado com a attenção que lhe merece um negocio tão importante, e

Considerando que o artigo 1.° da lei de 13 de julho estabeleceu os subsidios e vantagens, que se deviam conceder á companhia união mercantil, regularmente reorganisada, eu a outra qualquer empreza, que estabelecesse uma carreira regular de navegação a vapor entre Lisboa, Africa, Açores e Algarve;

Considerando que o artigo 5.° e paragrapho da mesma lei teve em vista auctorisar o governo a providenciar, como julgasse mais conveniente, a fim de que a navegação não parasse durante o intervallo necessario para a reorganisação definitiva da companhia união mercantil, ou para igual organisação de outra qualquer empreza, como claramente se vê da disposição d'este artigo:

A commissão é de parecer, depois de ouvida a commissão de commercio e artes, e de accordo com o governo, que não é necessaria a interpretação da carta de lei de 13 de julho de 1863 para o caso de que trata a representação da companhia união mercantil, e que ao governo pertence fazer o uso que julgar conveniente das auctorisações que por esta lei lhe foram concedidas.

Sala das commissões, 19 de abril de 1864. = Belchior José Garcez = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida = João Antonio Gomes de Castro = Claudio José Nunes = J. A. de Sant'Anna e Vasconcellos = A. J. Braamcamp = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = A. V. Peixoto.

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