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SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretaries- os exmos. srs.:

Francisco Angusto Florido de Moota e Vasconcellos
Sebastião Rodrigues Barbosa Centeno

SUMMARIO

Dá-se conta de um officio do ministerio de fazenda devolvendo informado o projecto de lei que tem por fim augmentar com mais 20:000$000 réis o subsidio que o estabeleci ao monte pio official.- Têem segundas leituras um projecto de lei do sr. Arroyo, outro do sr. Alfredo Rocha Peixoto, outro do sr. Pereira Leite, e uma nota do sr. José Borges renovando a iniciativa de um projecto de lei que apresentou em 13 de março de 1882.- Apresentam representações: o sr. Antonio Ennes, da mesa da assembléa geral da associação protectora de crenças instituida em Lisboa; o sr. Ferrão Castello Branco, dos quarenta maiores contribuintes do concelho dos Oliveaes.- O sr. Consiglieri Pedroso apresenta uma nota de interpellação ao sr. Ministro dos negocios estrangeiros.- Justificam faltas os srs. Henrique de Mendia, Sousa Machado, Ferreira de Mesquita e Mattoso Côrte Real.- Fazem declarações de votos os srs. Fontes Ganhado, Santos Viegas, Henrique de Mendia e Ferreira de Mesquita.- Dá-se conta na mesa de apresentações das contas da junta administrativa da camara no periodo decorrido desde 18 de maio de 1884 até 20 de janeiro de 1885.- O sr. Luiz de Lencastre apresenta dois pareceres da commissão de legislação civil.- O sr. Ferreira de Almeida chama a attenção do sr. Ministro da fazenda para uns casos de extravio de direitos que, segundo lhe constava, tinha havido nos ultimos navios de guerra portuguezes chegados ao porto de Lisboa.- O sr. Elvino de Brito refere-se a tentativas feitas na Africa oriental com o fim de estender o seu dominio ou influencia em territorios que elle considera portuguezes, e ás tentativas da Allemanha em relação ao Transvaal. Tambem insta de nonvo pela remessa dos esclarecimentos que tem requerido.- Responde-lhe o sr. Ministro da fazenda.- O sr. Antonio Ennes faz algumas considerações com relação ao trabalho dos menores na industria, a proposito da representação que apresentou.- Responde-lhe o sr. Ministro da fazenda.- Apresentam projectos de lei os srs. Antonio José d'Avila e Teixeira de Vasconcellos.- A camara auctorisa a publicação no Diario do governo de umas representações que o sr. José Borges apresentou na sessão antecedente.
Na ordem do dia entra em discussão o projecto de lei n.° 34 (orçamento rectificado). - Enceta o debate o sr. Eduardo José Coelho, que propõe o adiamento do projecto. - Fallam tambem os srs. Carrilho, Consiglieri Pedroso, ministro da fazenda e Emigdio Navarro, que fica com a palavra reservada. - A requerimento do sr. Carrilho mandam-se publicar no Diario do governo os documentos que estavam sobre a mesa, e que o sr. ministro da fazenda tinha apresentado ha dias. - A sessão esteve interrompida uma hora por susurro e ápartes violentos que se deram, quando o sr. Carrilho começou a fallar respondendo ao sr. Eduardo José Coelho.

Abertura - As duas horas e um quarto da tardo.

Presentes á chamada - 38 srs. deputados.

São os seguintes: - Albino Montenegro, Silva Cardoso, A. J. D'Avila, Pereira Borges, Fontes Ganhado, Moraes Machado, Santos Viegas, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, A. Hintze Ribeiro, Sanches de Castro, Conde da Praia da Victoria, E. Coelho, Elvino de Brito, Goes Pinto, Fernando Geraldes, Mouta e Vasconcellos, Francisco de Campos, Matos de Mendia, João Arroyo, Joaquim de Sequeira, Coelho de Carvalho, Simões Ferreira, Teixeira Sampaio, Ferreira de Almeida, José Frederico, Pereira dos Santos, Oliveira Peixoto, Luciano Cordeiro, Luiz Ferreira, Bivar, Luiz Dias, Guimarães Camões, Miguel Tudella, Sebastião Centeno, Dantas Baracho, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: -Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Agostinho Fevereiro, Moraes Carvalho. Garcia de Lima, A. da Rocha Peixoto, Anselmo Braamcamp, Alfredo Barjona de Freitas, Sousa e Silva, Pereira Corte Real, Antonio Centeno, Garcia Lobo, A. J. da Fonseca, Cunha Jalles, Carrilho, Sousa Pavão, Seguier, Urbano dee Castro, Augusto de Freitas, Augusto Poppe, ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Barão de Ramalho, Bernardino Machado, Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Conde de Villa Real, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Basto, E. Hintze Ribeiro, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Correia Barata, Castro Mattoso, Mártens Ferrão, Guilherme de Abreu, Guilhermino de Barros, Sant'Anna e Vasconcellos, Costa Pinto, Franco Frazão, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Scarnichia, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, J. Alves Matheus, Ponces de Carvalho, J. J. Alves, Azevedo Castello Branco, José Borges, Elias Garcia, Laranjo, Lobo Lamare, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Ferreira Freire, Simões Dias, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Reis Torgal, Luiz Jardim, Luiz Osorio, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Aralia e Costa, M. P. Guedes, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Pedro de Carvalho, Santos Diniz, Gonçalves de Freitas, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Visconde de Alentem, Visconde de Ariz o Visconde do Balsemão.

Não compareceram á sessão os srs.: - Torres Carneiro, Antonio Candido, Antonio Ennes, Lopes Navarro, A. M. Pedroso, Fuschiui, Neves Carneiro, Avelino Calixto, Barão do Viamente, Caetano de Carvalho, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, Estevão de Oliveira, Filippe de Carvalho, Vieira das Neves, Wanzeller, Frederico Arouca, Barros Gomes, Silveira da Motta, Baima de Bastos, J. A. Pinto, Melicio, Ribeiro dos Santos, Sousa Machado, J. A. Neves, Amorim Novaes, Avellar Machado, Correia de Barros, Dias Ferreira, J. M. dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Lopo Vaz, Lourenço Malheiro, M. da Rocha Peixoto. M. J. Vieira, Mariano de Carvalho, Pedro Correia, Pedro Franco, Vicente Pinheiro, Visconde de Reguengos, Visconde do Rio Sado e Wenceslau de Lima.

Acta -Approvada.

EXPEDIENTE

fficio

Do ministerio da fazenda, devolvendo o projecto de lei que tem por fim augmentar com mais 20:000$000 réis o subsidio que o estado da ao monte pio official, e remettendo como informação a representação que a direcção do mesmo monte pio enviou a este ministerio relativa ao assumpto.
Á secretaria.

Segundas leituras

Projectos de lei

1.° Senhores. - Têem merecido a approvação do parlamento portuguez innumeros projectos de lei, diffundindo com mais ou menos igualdade, os beneficios da administração publica sobre variadissimos ramos da actividade humana. Sciencias, industrias, inventos, explorações, tudo tem chamado a attenção dos nossos legisladores! Os interesses artisticos, o muito especialmente os interesses musicaes, esses foram e são entre nus completamente descurados.

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A indifferença pelo bom ou mau futuro da arte em geral accentua-se e evidenceia--se relativamente a arte da musica.
Ao passo que tão persistente abandono desalenta todas as vocações que em Portugal são naturalmente attrahidas para a cultura da arte musical, não acontece o mesmo nas outras nações.
A Hespanha já tem a zarzuela; a Franca a sua opera comica; a Italia possue uma escola musical perfeitamente caracterisada; a Allemanha ostenta as suas obras musicaes como o seu maior titulo de gloria artistica, e uma das maiores provas do seu vigor especulativo; a Austria, a Russia, a Suecia e a Noruega procuram animar e avigorar os elementos peculiares da sua musica caracteristica.
Todas ellas possuem a sua opera popular ou nacional, bibliothecas musicaes, funccionalismo especial e competente para promover e dirigir o constante progrexsso musical.
E o que temos nós de tudo isto? Onde estão as bibliothecas musicaes? Qual o valor da propriedade artistico-musical entre nós? Que passos se têem dado para a creação das escolas coraes nos diversos municipios do paiz? Onde estão estabelecidos os direitos protectores que incitem o artista a consumir as suas vigilias na composição de obras musicaes, quer symphonicas, quer dramaticas? Porque nos não lançâmos no caminho d'essas innovações e melhoramentos, que persuadam de uma vez, tanto os nacionaes como os estrangeiros, da boa vontade do parlamento portuguez em preencher pouco a pouco esta importantissima lacuna da nossa legislação?
Temos recebido muitas vezes a visita da zarzuela, e por vezes a da opera comica franceza; recebemos ha quasi um seculo a visita annual da opera italiana, e para a hospedarmos condignamente inscrevemos no nosso orçamento uma verba avultada. Os cultores da musica estrangeira, seja qual for o seu paiz, sito deveras apreciados em Portugal; mas, ao passo que assim procedemos para com esses artistas, nenhuma providencia tomou o parlamento portuguez, nenhuma medida promulgou o poder executivo, tendente a incitar os artistas portuguezes, as verdadeiras vocações musicaes da nossa terra, a pratica affincada e pertinaz da arte musical, nas suas variadissimas manifestações.
No entretanto, innumeros factos evidenciaram em tempos passados que o nome portuguez, intromettendo-se na cultura da arte musical estrangeira, conseguiu acreditar-se e distinguir-se, alcançando fama e gloria no duello travado com a pleiade de compositores e cantores italianos. Seria longo enumerar os antigos nomes portuguezes, inscriptos, com honra nossa, nos annaes da historia musical; mas bastará tão sómente relembrar os nomes de Marcos Portugal e de Luiza Todi, para demonstrar que não nos illudimos quando consideramos os nossos antecedentes artistico-musicaes como penhor sufficiente das nossas tendencias para a cultura da musica, e da seriedade dos nossos conhecimentos technicos, relativamente a uma arte tão difficil e tão complexa. A grande quantidade de orgãos do mosteiro de Mafra são um signal da consideração que aos nossos maiores mereceu a cultura da musica religiosa.
D'esde esses tempos até á actualidade, o progresso incessante da musica, o aperfeiçoamento continuado da organisação dos primeiros conservatorios da Europa, a instituição de concertos populares, a fundação das sociedades de musica de camara, a creação dos orpheons, a producção incessante de trabalhos sobre a harmonia ou o contraponto, o desenvolvimento extraordinario da arte de instrumentação, o apparecimento interrompido do artistas realmente notaveis em todos os ramos da arte musical, tornaram bom palpavel e bem evidente a maneira desigualissima como os parlamentos e os governos nacionaes e estrangeiros sabem curar dos interesses artistico musicaes.
Não obstante, uma observação conscienciosa do que em Portugal se passa ha alguns annos parece accusar os mais decididos symptomas de um accentuado movimento de renascença. Formam-se, succumbem, mas renascem com tenacidade crescente as aggremiações de amadores, sustentadas a expensas proprias; instituem-se algumas sociedades de musica do camara; criam-se associações choraes; desempenham-se operas sem a intervenção de artistas estipendiados; apparecem pouco a pouco jornaes destinados exclusivamente ao estudo e propaganda da musica; progride visivelmente a critica artistica e sente-se maior dedicação o cuidado por tudo quanto respeita a esta arte.
Não param aqui os symptomas de renascimento: a musica portugueza apresentou-se muito condignamente no certamen artistico de Milão, e a representação de tres operas portuguezas no real theatro de S. Carlos, no periodo relativamente curto de quatro annos, denota a existencia do vitalidade artistica, com forca para se engrandecer progressivamente.
Instigue-se e anime-se este movimento ascencional, e Portugal poderá, dentro de um limitado praso, possuir artistas musicaes capazes de lançar os hombros á penosa, mas formosissima empreza de organisar e constituir a musica nacional, sobre o manancial variado e fecundodos nossos cantos populares.
Creio, pois, senhores, que os poderes publicos não devem permanecer silenciosos e inertes perante tão auspiciosos prenuncios, e que e chegado o momento inadiavel em que uma iniciativa energica e vigorosa deve fortalecer e encaminhar essa tendencia salutar, auxiliando as vocações decididas para o estudo e para a cultura da arte musical.
Por maiores e mais sinceros que sejam os desejos dos poderes publicos para bem providenciar sobre tão importante assumpto, seria a sua obra inutil e ephemera e quasi de impossivel realisação na ausencia de estudos technicos e preparatorios, levados a cabo por artista competente que ponha bem em relevo o que e necessario fazer-se, que alcance os subsidios artisticos indispensaveis, e que forneça o projecto de regulamentação das medidas ou reformas uteis e apropriadas ao nosso meio social.
Não possuimos, como em França, um largo serviço administrativo destinado as bellas artes; não temos mesmo instituição alguma especial para superintender nos assumptos artistico-musicaes, illustrando o governo e o parlamento; portuguez na adopção de medidas opportunas e de verdadeira conveniencia.
Lá fóra, funccionarios competentes, em relação com os seus collegas de paizes estrangeiros, em ligação estreia com os primeiros artistas e compositores, em correspondencia activa com os directores dos principaes conservatorios, percorrendo as capitaes onde se exibem importantes novidades musicaes, visitando as mais acreditadas fabricas de instrumentos de musica para julgarem dos progressos que esta industria vae successivamente realisando, adquirem assim os elementos que, transformados e apurados em relatorios, servem de base a subsequentes reformas e aperfeiçoamentos artisticos.
Em Franca, onde a organisação d'este funccionalismo é mais completo, dividem-se por commissarios technicos as varias especialidades d'este serviço. A Italia, a Allemanha, a Russia, a Belgica e a Austria acompanham na, mais ou menos desenvolvidamente, no estabelecimento de tão importantes cargos.
Por estos motives e muitos outros que a vossa provada illustração facilmente supprirá, tenho a honra de submetter a vossa apreciação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É creado o logar de superintendente regio dos estudos e espectaculos musicaes.
§ unico. Este logar será gratuito, e a sua nomoação deverá recair em pessoa que tenha superiores habilitações litterarias, provada competencia artistica e exercicio da arte musical com distinção.
Art. 2.° Este funccionario corresponde-se directamente o para todos os effeitos com a direcção geral de instrucção publica.

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Art. 3.º Incumbe ao superintendente regio dos estudos e espectaculos musicaes:
1.º A apresentação de relatorios semestraes, a partir da data da sua nomeação, onde forneça a amplas e fieis informações ácerca do movimento musical portuguez e estangeiro sob todos os aspectos, e muito especialmente sobre a organização e systemas de ensino dos conservatorios, sobre os theatros de musica, sociedades que o nosso meio exigir, convenientemente regulamentados;
2.º A colleccionação dos cantos populares portuguezes directamente colhidos nos logares da sua producção;
3.º A apresentação de quaesquer informação ou de qualquer trabalho litterario relativo á arte musical, que por via competente lhe for indicado, fóra dos prasos marcados no n.º 1.º d'este artigo.
Art. 4.º É o governo auctorisado a abonar ao superintendente regio dos estudos ou espectaculos musicaes, pelas sobras do capitulo de instrução publica, ajudas de custo, para despezas de viagem e outras que o desempenho das funcções do seu cargo torna indispensaveis, que todavia não excedam a quantia de 1:000$000 réis em cada anno.
Art. 5.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, em 4 de maio de 1885.= João Marcellino Arroyo.
Foi admittido e enviado á commissão de instrucção superior, ouvida a de fazenda.

2.º senhores.- A lei de 22 de lunho de 1867 determina no artigo 13.º que, as sociedades anonymas de responsabilidade limitada sejam administras por mandatarios temporarios, revogaveis, retribuidos ou gratuitos, escolhidos de entre os associados.
D'estas sociedades, umas são administrativas por directores com ordenado fixo, outras têem estabelecido como gratificação para os seus directores uma fracção dos lucros liquidos que porventura haja no fim de cada anno, comprovados pelas contas apresentadas ás respectivas assembléas geraes; e em lisboa é d'estas o maior numero.
Tem succedido que algumas não têem tido lucros o que se prova pelos seus relatorios e balanços annuaes; que portanto não têem retribuição alguma os seus directores; e que estes ainda assim têem sido collectados na contribuição industrial prescripta pela lei de 14 de maio de 1872, e regulada pelo decreto de 28 de agosto do mesmo anno.
É manifesta a iniquidade. São assim sujeitos a pesados impostos cidadãos sem motivo algum para serem collectados.
Obvios são os perigos que d'aqui resultam para sociedades anonymas de responsabilidade limitada, em crises mais ou menos graves da sua existencia.
Directores de sociedades d'este genero, n'estas tristes circumstancias, têem provado, perante os res+ectivos gremios, e depois perante as juntas dos repartidores, que têem administrado essas sociedades gratuitamente; mas nem as suas allegações perante os gremios, nem as suas reclamações perante as juntas dos repartidores, têem sido attendidas.
Por estas considerações, cuja evidente justiça dispensa maior desenvolvimento, tenho a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º São isentos de contribuição industrial os mandatarios que administram quaesquer sociedades anonymas de responsabilidades limitada, retribuindo apenas com uma fracção dos lucros liquidos d'essas sociedades, sempre que provem, pelas contas apresentadas ás respectivas assembléas geraes, que não houve lucros liquidos e que portanto os mesmos mandatarios não receberam remuneração alguma.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 4 de maio de 1885.= Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto.
Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.
3.º Senhores.- A camara municipal do concelho da Povoa de Lanhoso, districto de Braga, tendo urgente necessidade de reconstruir os paços do seu concelho, para reconcentrar n'um só edificio todas as repartições que se acham espalhadas por differentes casas, de que paga rendas relativamente importantes, e para melhorar as que actualmente ali existem das quaes algumas ameaçam proxima ruina, e não podendo effectuar similhante obra muitas despezas com que o municipio se acha onerado, o que claramente se verifica na representação que dirigiu a esta camara, onde solicita um projecto de lei para poder desviar do cofre da viação ordinaria até á quantia de réis 4:000$000 para applicar a estas obras, e como um tal pedido se me afigura de toda a justiça, visto as circumstancias peliculares em que se encontra este municipio e a obra ser urgente e de inconmtestavel vantagem, e as suas estradas estarem muito desenvolvidas; por estes fundamentos tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º É auctorisada a camara municipal do concelho da Povoa de Lanhoso a desviar do fundo especial da dotação de estradas municipaes a quantia de 4:000$000 réis, para ser applicada á reconstrucção dos paços de seu concelho.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 4 de maio de 1885.= O deputado Pereira Leite.
Foi admittido e enviado á commissão de obras publicas ouvida a de administração publica.

Proposta para renovação de iniciativa

Renovo a iniciativa do projecto de lei, apresentado por mim na sessão de 13 de março de 1882, que tem por fim igualar o vencimento dos pagadores de obras publicas ao pagadores do caminho de ferro do Minho e Douro, alem da gratificação para os seus propostos estabelecida no artigo 27.º do decreto de 28 de outubro de 1869.= O deputado por Braga, José Borges de Faria.
Lida na mesa, foi admitida e enviada ás commissões de obras publicas e de fazenda.

O projecto de lei a que se refere esta proposta é o seguinte:

Senhores.- Estando inquestionavelmente equiparados o trabalho e responsabilidades das direcções de obras publicas aos dos caminhos de ferro, sendo maiores, talvez, n'aquelles, pela natureza das localidades onde exercem as suas funcções e circunstancias accidentaes que muitas vezes soffrem nos transportes, parece que de justiça fôra equiparal os tambem nas garantias. Não succede, porém, assim, porque ao passo que os pagadores dos caminhos de ferro logram transporte nas carruagens commodas das vias acceleradas, tendo ainda sobre isto vencimentos relativamente superiores, aquelles têem de percorrer extensas distancias, com pessimos meios de transporte, e não raro sujeitos a accidentes que até a propria vida lhes põem em risco.
Além disto, gosando por lei uma reforma ou aposentação os thesoureiros pagadores dos districtos, com sensivel diminuição de trabalho, por isso que nem ao transporte de fundos se dão, igualmente seria de toda a justiça que os pagadores das direcções de obras publicas gosassem da mesma vantagem e fossem postos ao abrigo da mesma lei, pela identidade das commissões de serviço que desempenham.
A classe, porém, dos pagadores de obras publicas não logra nem as vantagens dos vencimentos dos pagadores dos caminhos de ferro, nem as garantias da aposentação dos thesoureiros pagadores dos districtos.
E sendo de inteira equidade, de inteira justiça, que a, igual trabalho e responsabilidade correspondam igual re-

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muneração e garantias, tenho a honra do vos apresentar o seguinte projecto do lei :
Artigo 1.° O vencimento dos pagadores do obras publicas será igual ao dos pagadores do caminho do ferro do Minho e Douro, alem da gratificação para os seus propostos estabelecida no artigo 27.° do decreto de 28 de outubro de 1869.
Art. 2.° São applicaveis aos pagadores de obras publicas as disposições do artigo 59.° do decreto de 3 de novembro de 1800.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessõs da camara dos deputados, 11 de março de 1882. - O deputado por Espozende, José Borges de Faria.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da assembléa geral da associação protectora das creanças, instituida em Lisboa, pedindo para ser convertida em lei a proposta do falecido estadista Saraiva de Carvalho, regulando o trabalho dos menores na industria.
Apresentada pelo deputado Antonio Ennes e enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.
2.ª Dos 40 maiores contribuintes do concelho dos Olivaes, pedindo que todas as freguezias deste concelho cotinuem a fazer parte do actual municipio.
Apresentada pelo sr. Deputado João Ferrão de Castello Branco e enviada á commissão de fazenda, ouvida a de administração publica.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.º Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam enviadas á camara copias de quaesquer diplomas remettidos ao governador geral de Moçambique, auctorisando-o a prorogar os arrendamentos dos prazos da corôa da referida provincia, e bem assim a relação de todos os prazos da corôa da mesma provincia, arrendados ou administrados pelo estado, com a designação das condições de arrendamento e dos arrendatarios.= O deputado por Quelimane, Elvino de Brito.
Mandou-se expedir.

2.º Requeiro a v. exa. que, consultando a camara, caso seja preciso, seja instado o gabinete para que attenda aos esclarecimentos que por esta camara foram, por minha iniciativa, pedindo pelo ministerio da marinha e ultramar, esclarecimento que na sua quasi totalidade estão ainda por satisfazer, a despeito de terem sido solicitadas ha mais de tres mezes.= Elvino de Brito.
Será revogada a requisição, feita nos ultimos dias da semana passada, quando houver demora na expedição.

3.º Requeiro que a v.exa. se digne consultar a camara se permitte que sejam publicadas no Diario do governo as representações que hontem apresentei á camara.= O deputado por Braga, José Borges de Faria.
Foi approvada a publicação.

NOTA DE INTERPELLAÇÃO

Desejo interpellar o sr. Ministro dos negocios estrangeiros sobre a exclusão de Portugal da conferencia da Paris, destinada a regularisar a neutralidade do canal de Suez.= O deputado por Lisboa, Consiglieri Pedroso.
Mandou-se expedir.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

1.ª Declaro a v. exa. que não assisti á sessão de hontem por motivo justificado. = Henrique de Mendia.

2.ª Declaro que não compareci hontem á sessão por motivo de serviço publico impreterivel.= Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

3.ª Declaro que o sr. Deputado João de Sousa Machado não comparece á sessão de hoje n'esta camara por motivo justificado.= Francisco de Castro Mattoso da Silva Côrte Real.

DECLARAÇÃO DE VOTO

1.ª Declaro que se podesse ter estado presente teria approvado os artigos do parecer da commissão sobre as reformas politicas, e na votação nominal teria igualmente aprovado a eliminação do artigo 8.° do projecto do governo = Fontes Ganhado.

2.ª Declaro que votaria, se estivesse presente, pela eliminação do § 14.° do artigo 75.° da carta constitucional da monarchia portugueza.= 0 deputado, Santos Viegas.

3.ª Declaro a v. exa. que, se estivesse estado presente, approvaria todos os artigos das reformas constitucionaes, que hontem foram votados. = Henrique de Mendia.

4.ª Declaro que, se estivesse presente, teria approvado os artigos do projecto n.° 13, que hontem foram votados. = Ferreira de Mesquita, deputado secretario.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° De D. Henriqueta Carlota Saraiva Esteves Alves da Guerra, pedindo uma pensão.
Apresentado pelo sr. deputado Santos Viegas e enviado d commissão de fazenda, ouvida a de guerra.

2.° Dos officiaes inferiores da companhia de reformados do exercito, Domingos José Correia, Joaquim Antonio Teixeira, Joaquim Ferreira, Joaão de Almeida, João Nunes, João Soares da Rocha, José Antonio Gonçalves, José Francisco, José Lourenço, Manuel de Moraes Pereira e Sebastião Martins, pedindo melhoria de reforma.
Apresentados pelo sr. Deputado Santos Viegas enviadas á commissão de fazenda, ouvida a de guerra.

O sr. A. J.d'Avila:- Quando tive a honra de apresentar o projecto que foi convertido na lei de 16 de maio de 1884, e em virtude do qual o governo foi auctorisado a conceder definitivamente o edificio do extincto convento de S. Francisco e suas dependencias á santa casa da misericordia na cidade da Horta, para construir um hospital, existiam em cofre para esse fim 8:000$000 réis de differentes dadivas, tendo contribuido largamente para este resultado o muito valioso donativo mandado dar por Sua Magestade a Rainha, cuja excelsa caridade nunca é invocada em vão.
A caridade publica tem continuado a proteger esta patriotica idéa e actualmente existem em cofre cerca de réis 12:000$000. A santa casa da misericordia resolveu, pois, dar começo á construção, e vem pedir á camara dos senhores deputados que a auxilie no meritorio emprehendimento de dotar o districto, da Horta com um hospital que é o unico do districto adoptando um projecto de lei que auctorize o governo a conceder a insenção dos direitos de entrada ao material que se vae importar para aquella construção.
Este projecto de lei é de toda a justiça e espero que merecerá a consideração da commissão respectiva.
Apresentou um projecto que ficou para segunda leitura.
O sr. Santos Viegas:- Mandou para a mesa uma declaração de voto.

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Mando tambem dois requerimentos, um do sr. Joaquim Ferreira, furriel n.° 60 da 1.ª companhia de reformados do exercito e que, allegando as circumstancias em que se encontra, pede melhoria da reforma.
São, parece-me, tão justas e tão cheias de rasão as considerações feitas por este antigo veterano, que me animo a pedir a v. exa. interponha o seu valimento em favor da sua pretensão, e dê ao requerimento o destino conveniente. O outro requerimento é de D. Henriqueta Alves da Guerra que pede lhe seja concedido um subsidio, pelos importantes serviços prestados por seu pae á causa da liberdade.
Peço a v. exa. dê a este requerimento o destino conveniente.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Ha algumas sessões, sr. presidente, fiz notar á camara a demora que tom havido na remessa de uns documentos que pedi pelo ministerio dos negocios estrangeiros.
Estes documentos eram-me muito necessarios, disse eu então, para tratar de uma quentão de alta importancia e de bastante gravidade para o nosso paiz.
A questão refere-se á exclusão de Portugal da conferencia de Paris actualmente reunida para tratar da neutralidade do canal de Suez.
Ha mais de um mez que eu pedi com urgencia esses documentos, que são de facil preparação, pois se resumem a uma copia das instrucções dadas pelo governo aos agentes diplomaticos de Portugal junto dos gabinetes de Paris e Londres, e ao mesmo tempo á correspondencia trocada com esses governos a respeito da reunião da referida conferencia.
Apesar da simplicidade dos documentos solicitados, ainda me não foram remettidos. Eu continuo a considerar a questão a que alludo de grande gravidade, e como me parece que ha um proposito firme em não enviar á camara os documentos pedidos, declaro desde já que prescindo d'elles para formular a minha nota de interpellação ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, nota que com effeito vou mandar para a mesa
A nota de interpellação é a seguinte:
«Desejo interpellar o sr. ministro dos negocios estrangeiros acerca da exclusão de Portugal da conferencia actualmente reunida em Paris para a regularisação da neutralidade do canal de Suez.
Sala das sessões da camara, 5 de maio de 1885. = O deputado por Lisboa, Z. Consiglieri Pedroso.»
Peço a v. exa., que com a maxima brevidade se digne mandar expedir esta nota, e espero que o sr. ministro dos negocios estrangeiros, de accordo com as declarações no outro dia feitas n'esta casa pelo sr. ministro do reino, de que os ministros estavam sempre promptos a responder ás interpellações que lhe fossem dirigidas, não demoraria por muito tempo a realisação d'esta interpelleção.
Visto que estou no uso da palavra, aproveito a occasião, para obter esclarecimentos de v. exa. ou de algum dos membros da commissão de inquerito, com relação ao imposto do sal, sobre o andamento que têem tido os trabalhos d'essa commissão. V. exa. e a camara sabem perfeitamente as circumstancias angustiosissimas para uma numerosa classe da nossa população trabalhadora, que levaram o parlamento a eleger a commissão de inquerito a que me retiro; escuso de recordar novamente essas circumstanscias, porque estão bem na memoria de todos. Todos sabem com effeito, que os pobres pescadores, que reclamavam contra o imposto, andaram durante mais de seis mezes á espera, não digo já de que lhes fosse feita justiça, mas de que da parte dos srs. ministros houvesse alguma consideração para com o seu tristissimo estado; esse assumpto foi bem largamente debatido na imprensa e escuso de estar a cançar agora a attenção da camara com os deploraveis pormenores que lhe andam conjunctos; no entretanto devo notar a v. exa. que, sob a pressão de circumstancias d'esta ordem, a camara viu-se forçada, passando por cima já de duas deliberações consecutivas, com relação ao imposto do sal, a reconsiderar, nomeado uma commissão de inquerito, para estudar os effeitos da incidencia d'este imposto, que pela minha parte continuo a reputar, como altamente gravoso para a classe aos nossos pescadores, e para a economia de toda a nossa população em geral.
A camara nomeou a commissão de inquerito, que tem affecta ao seu exame, entre outras, a proposta de um sr. deputado, de cujo nome não me recordo n'este momento, para que o imposto do sal seja completamente abolido; ora a sessão parlamentar já vae alem do seu periodo ordinario, estando mesmo a approximar-se rapidamente do termo da primeira prorogação, e não sei quantos dias mais nos quererão conceder para estarmos aqui reunidos.
Desejava, portanto, que v- exa. me informasse do estado em que estão os trabalhos da commissão, e de poderemos ter a certeza de que ainda n'esta sessão alguma cousa se ha de fazer a tal respeito.
Parece-me que é de boa justiça, e não precisa ser lembrado, que a camara não demore, nem por um momento, a resolução de uma questão, que importa gravissimas perdas para o paiz, perdas que já hoje são grandes, mas que n'um futuro serão ainda muito maiores, se não mesmo irreparaveis!
Tenho dito.
O sr. Carrilho: - Pedi a palavra para dizer ao iilustre deputado, que posso asseverar a s. exa. que a sub-commissão do inquerito ao imposto do sal, isto é, aquella que estava encarregada dos inqueritos directos e indirectos, está elaborando já o seu relatorio, relatorio que conta que seja muito brevemente apresentado á grande commissão, para depois ser submettido á apreciarão da camara.
O sr. Mendia: - Mando para a mesa uma declaração de voto.
O sr. Ferreira do Almeida: - A declaração singela que hontem fiz n'esta casa suscitou da parte de um sr. deputado um reparo ou recriminação sobre a opportunidade com que a opposição se dispunha a tratar aqui varios assumptos.
O meu collega o sr. Elvino do Brito, por essa occasião, disse que hoje daria as explicações convenientes.
Como o sr. deputado, que fez as observações, não está presente, entendo dever abster-me de fazer quaesquer considerações que seriam menos proprias na ausencia de s. exa.; tanto mais que o mesmo sr. deputado devia ter ouvido que este assumpto se renovaria hoje. (Apoisados.)
Aproveito estar no uso da palavra para dizer que folgo ver presente o sr. ministro da fazenda, por isso que a questão de que vou occupar-me interessa á administração a seu cargo; e espero que s. exa. se encarregará de communicar ao seu collega do reino, a quem mais directamente diz respeito, o que vou narrar.
Consta que nos navios de guerra ultimamente chegados a este porto se têem dados censuraveis casos de sonegar objectos aos direitos da alfandega, chegando a fazer-se tomadias: é realmente para lamentar e como entende que é dever de toda e qualquer corporação corrigir abusos em logar de encobril-os, chamo a attenção do governo sobre este assumpto para que preceda devidamente contra os abusos; faltas e erros que se reflectem depois indevidamente sobre todos os membros das respectivas corporações.
O sr. Jose Borges: - Peço a v. exa. queira consultar a camara sobre se permitte que as representações, que hontem apresentei n'esta casa, sejam publicadas no Diario do governo.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
O sr. Elvino de Brito: - Disse que, se lhe tivesse cabido a palavra antes do sr. Ferreira de Almeida, teria feito uma declaração analoga á que s. exa. fizera em relação ao incidente levantado na sessão anterior pelo sr. Marçal Pacheco.
Associava-se, portanto, ao sr. Ferreira de Almeida e re-

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servava-se tambem para fazer algumas considerações a respeito d'aquelle incidente quando o sr. Marçal Pacheco estiver presente.
Perguntou ao sr. ministro da fazenda, cuja ausencia estava sendo muito sentida pela opposição, porque s. exa. poucas vezes tinha vindo a camara, se a procuradoria geral da corôa já devolveu ao seu ministerio o processo relativo ao concurso para terceiro official da alfandega, que deu logar a um incidente, bem conhecido do sr. ministro, e que ainda não está liquidado.
Desejaria tambem que s. exa. lhe dissesse, se estivesse habilitado para isso, e com as reservas que o caso demanda, o que havia a respeito dos factos a que se referiu numa das ultimas sessões, esperando que lhe fosse dada qualquer resposta por algum dos membros do gabinete.
Referia-se as tentativas feitas na Africa oriental pela Inglaterra no sentido de estender o seu dominio ou influencia em territorios que elle, orador, tem por portuguezes, e ás tentativas feitas pela Allemanha em relação ao Transvaal.
Os conflictos com as nações cujos territorios confinam com os nossos mais ou menos se têem repetido estes ultimos annos, e por isso desejava que o sr. ministro da fazenda, se estivesse habilitado para isso, elucidasse a camara sobre este assumpto.
Observou que por mais de uma vez tem instado por que lhe sejam mandados os documentos que ha mais de tres mezes pediu pelo ministerio da marinha, documentos que são indispensaveis para se estudar devidamente a administração colonial, e que o governo tinha obrigação de remetter a camara, porque esta tem o direito de conhecer a marcha dos negocios; mas que esses documentos na sua quasi totalidade ainda ate hoje não appareceram.
Nem sequer viera a copia de um telegramma expedido para o governador geral da India e que o sr. ministro da marinha declarou na camara que continha só a palavra auctoriso.
Lamentando que o governo não enviasse á camara os esclarecimentos que lhe são pedidos, mandava para a mesa um requerimento pira que fosse consultada a camara, no caso de ser preciso, sobre ser instado o gabinete a que attenda os pedidos de esclarecimentos que, pelo ministerio da marinha, foram feitos por iniciativa do orador.
Maudava tambem para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio da marinha, copia de quaesquer diplomas remettidos ao governador geral de Moçambique, auctorisando-o a prorogar os arrendamentos dos prazos da corôa na referida provincia; e bem assim a relação de todos os prazos da corôa, arrendados ou administrados pelo estado. Este requerimento referia-se a um assumpto da maxima importancia para a provincia de Moçambique.
Constando-lhe que sobre este assumpto se tinham dirigido documentos confidenciaes ao governador d'aquella provincia, fazia o seu requerimento para fazer uso desses documentos tambem com as reservas cuja necessidade comprehende perfeitamente.
(0 discurso será publicado na integra, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - Devo informar o sr. deputado, quanto ao seu primeiro requerimento, que ainda na sexta feira ou no sabbado se fez a ultima requisite ao ministerio da marinha.
Não tem ainda portanto decorrido muito tempo. Em todo o caso, se houver demora, far-se-ha nova requisição.
O segundo requerimento do sr. deputado vae ser expedido.
O sr. Elvino de Brito: - Desde que pela primeira vez tive a honra de fallar n'esta casa na actual sessão legislativa fiz oito ou nove requerimentos pedindo esclarecimentos ao governo.
Foi satisfeito um com a declaração de que não existiam os documentos que eu pedia; e os outros nunca obtiveram uma resposta qualquer.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Eu não sabia que a minha presença n'esta camara era tão desejada pelo illustre deputado que acaba de fallar.
A s. exa., que manifestou um sentimento do profunda saudade por me não ter visto aqui, devo dizer que se não tenho vindo a camara e porque não me constou que algum sr. deputado tivesse reclamado a minha presença para eu dar quaesquer escclarecimentos, quaesquer respostas que me fossem pedidas.
É este o unico motivo por que não tenho vindo aqui. A camara sabe muito bem que eu sou sempre prompto em esclarecel-a no que esta ao meu alcance.
A uma pergunta que o sr. Elvino de Brito me dirigiu a respeito de um processo de concurso para terceiro official da alfandega, processo que foi em tempo discutido nesta camara, tenho a dar uma resposta muito simples.
Esse processo foi mandado a procuradoria geral da coroa, nao para que consultasse-a este respeito, mas sim para que, como chefe do ministerio publico, fizesse intentar os processos judiciaes que devessem emanar d'elle.
Aquelle processo não tinha portanto de voltar ao meu gabinete, porque eu não pedia a procuradoria geral da corôa que consultasse a este respeito; dizia-lhe simplesmente que tizesse intentar os processes convenientes ou necessarios.
Em consequencia d'isto consta-me que pela procuradoria geral da corôa foram dadas ordens n'este sentido.
Esse processo foi intentado em um dos tribunaes da comarca de Lisboa e desde então não sei, não conheço, o seguimento que tem tido o negocio.
Desde que elle está affecto ao poder judicial e esto o unico competente para lhe dar seguimento nos termos dos preceitos legaes em vigor.
N'este caso só os tribunaes judiciaes são competentes para esclarecerem o illustre deputado e para esclarecerem a camara.
Pelo que toca a outra pergunta feita pelo illustre deputado, eu não estava presente quando s. exa. a fez, mas ; soube depois, pela leitura do extracto da sessão, que ella se referia a algumas velleidades inglezas ácerca da extensão da influencia da Inglaterra era certos territorios da parte oriental da Africa.
Não posso informar o illustre deputado a este respeito. Não correm pela minha pasta assumptos d'esta natureza, nem tenho esclarecimentos officiaes que possa communicar a s. exa.
E comprehende-se bem que em assumptos tão importantes e delicados eu devo ter toda a reserva, para não exprimir quaesquer idéas, que não sejam fundamentadas nos factos.
Este sentimento que s. exa. manifesta, por não lhe terem sido enviados documentos pelo ministerio da marinha, sem duvida ha de dissipar-se, e se o meu collega ainda os não mandou, e porque provavelmente são muitos.
O illustre deputado tem formulado tantos requerimentos e exigido tantas respostas, pelo que tenho ouvido nas sessões a que tenho estado presente, que talvez seja esse o motivo por que o meu collega não pode ter satisfeito ainda tudo que s. exa. requereu; entretanto communicarei ao sr. ministro da marinha os desejos do illustre deputado, e estou certo que em tudo quanto estiver ao alcance de s. exa. se apressará dar as informações necessarias.
O sr. Ferrão Castello Branco: - Apresentou uma representação dos quarenta maiores contribuintes do concelho dos Olivaes, pedindo que todas as freguezias do mesmo concelho continuem a fazer parte d'elle.
Pediu que esta representação fosse publicada no Diario do governo.
Foi auctorisada a publicação.
0 sr. Antonio Ennes:- Uma sociedade beneficente

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que recentemente se constituiu era Lisboa, e que se denominava a associação protectora das creanças, encarregou-me de apresentar a esta camara uma representação em que lhe pede que de andamento, e que se digne approvar a proposta de lei regulando os trabalhos dos menores, cuja iniciativa foi renovada n'esta sessão polo sr. Antonio Augusto de Aguiar, quando ministro das obras publicas.
Faço meu o pedido da benemerita associação, embora tenha pouca esperança de que elle seja attendido, e, lamento que, em quatro annos, que tantos decorreram já desde que o finado Saraiva de Carvalho subscreveu a proposta a que alludo, o parlamento portuguez ainda não tivesse tido tempo para cumprir um dever de justiça e de philantropia, cujo cumprimento e ao mesmo tempo um acto de boa politica.
Não sei que haja proposta que mais deva recommendar-se aos sentimentos e aos principios generosos e philantrophicos de legisladores liberaes; que corresponda a uma ordem de necessidades mais universalmente reconhecidas e lamentadas; que esteja melhor abonada, por exemplo das legislações de todos os povos cultos ; e todavia tem passado de sessão para sessão, no monte dos papeis velhos e inuteis, sempre desattendida, sempre preterida e preterida, muitas vezes, por assumptos nem sympathicos a moralidade, nem perfilhados pelo interesse geral publico.
Esta desattenção, esta preterição, parece-me grave, porque pode ser considerada como demonstração de que, infelizmente, o regimen representative em Portugal ainda desfavorece systematicamente os interesses legitimos e os direitos sagrados das classes mais numerosas da sociedade, (Apoiados.) expondo-se assim a perder a confiança e a adhesão d'essas classes.
Repito; não confio em que seja attendido o pedido da associação, e creio que serão absolutamente inefficazes as rainhas palavras; mas deixo desde já, lavrado o meu protesto contra a incuria, contra a desconsideração pelas necessidades das classes trabalhadoras, e não sei tambem se contra a conjuração tacita do certos interesses oligarchicos absorventes que têem obstado, e estão obstando ainda a que seja convertida em lei a proposta de Saraiva de Carvalho.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Não ha protesto que não tenha contraprotesto.
O illustre deputado referiu-se a um projecto de lei apresentado pelo sr. Saraiva de Carvalho, projccto de lei ex-cellente nas intenyoes, e realmente de graude alcance no fundo da sua doutrina, que tinha por fim regular o trabalho dos menores nas fabricas.
Quando eu tive a honra de ser ministro das obras publicas, não descurei este assumpto tão completamente como ao illustre deputado se afigura; pelo contrario.
Com relação a este projecto cooperei com um membro desta casa, que não vejo presente, ácerca das suas idéas fundamentaes, para que se podesse resolver, sobre bases que importavam moditicações que me pareciam acceitaveis e boas, a fim de que elle podesse ser convertido em lei.
Infelizmente, não chegou a realisar-se.
Mas se isto revela uma grande incuria da parte do governo, perguntarei ao illustre deputado, que tão empenhado se mostra em que essa medida vingasse, porque e que, estando as camaras abertas ha tantos mezes, s exa. não se apressou a vir renovar a iniciativa do projecto?
S. exa. lavrou um protesto contra a incuria do governo; eu contraprotesto.
Se s. exa., que é tão humanitario nas suas idéas, e dotado de tanta bondade nos seus sentimentos, tivesse vindo a esta casa lembrar que havia um projecto de lei que era tão importante e benefico para a classe operaria, s. exa. encontraria de certo a melhor vontade da parte da maioria e do governo para cooperarem, por todos os meios, para que as suas idéas fossem aproveitadas e podessem converter--se em uma realidade pratica.
Tenha o illustre deputado a certeza, comquanto eu não seja ministro das obras publicas, que no intuito de poder chegar a um resutado pratico, pelo que toca a regularisação do trabalho dos menores nas fabricas, se o sr. deputado, aposar de ser membro da opposição, renovar o projecto, ou apresentar outro n'esse sentido, tenha a certeza, repito, de que não encontrará reluctancia da parte do governo; pelo contrario, encontrará muito boa vontade e o melhor desejo do cooperar para um melhoramento que realmente se justifica, para que o projecto tenha entre nos uma realidade pratica.
O sr. Mattoso Corte Real:-O anno passado votou-se n'esta camara, por accordo de todos os partidos, a lei do 21 de maio que no artigo 26.° estabeleceu que as execuções passassem para o poder judicial.
Pelo § 3.° d'aquellc artigo ficou o governo auctorisado e regular a forma do processo applicado a essas execuções.
Não discuto agora a rasão ou a sem rasão desta disposição; o que me obriga a pedir a palavra é o desejo que tenho de saber se o sr. ministro da fazenda tenciona ou não dar cumprimento a disposição a que me refiro, mandado sem mais demora confeccionar e publicar o respectivo regulamento. (Apoiados.)
Entendo que e altamente prejudicial aos interesses do paiz que as leis se façam para não serem cumpridas. (Apoiados.)
Peço, pois, ao sr. ministro da fazenda que me diga com toda a franqueza se esta ou não resolvido a por em execução aquella lei na parte relativa as execuções fiscaes.
Sr. presidente, a pratica que tenho dos tribunaes auctorisa-me a asseverar a s. exa. e a camara, que a fazenda publica lucrara muito em que os processes das execuções fiscaes corram os seus termos nos tribunaes judiciaes.
Appello para o testemunho dos magistrados judiciaes, que têem assento nesta camara. (Apoiados.)
Suscitando esta questao, não advogo a minha causa, porque já não sou juiz de primeira instancia e portanto nada lucro em que as execuções administrativas passem para o poder judicial. (Apoiados.)
Faço esta declaração para todos os effeitos. (Apoiados.)
Ouvirei as respostas do sr. ministro da fazenda, e depois farei as considerações que entender convenientes.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - A minha resposta ao illustre deputado e muito simples.
Não podia deixar de ser minha intenção cumprir a lei e é esse o meu dever.
A lei determinou que o governo ficasse auctorisado a regular as execuções riscaes de modo que ellas passassem para os tribunaes judiciaes em vez de correrem como ate agora pelo administrativo.
É evidente que eu tenho de cumprir a lei e a pergunta do illustre deputado devia ser se eu a tenho cumprido. A essa pergunta e que eu vou responder.
O projecto do regulamento para as execuções fiscaes, em harmonia com a lei aqui votada, foi feito na secretaria do ministerio a meu cargo e remettido a procuradoria real da corôa para o considerar, e d'ella esta dependente.
Logo que essa repartição me habilite com o seu parecer, tornarei immediatamente effectivo o cumprimento da lei fazendo publicar o seu regulamento.
O sr. Corte Real: - Peço a palavra.
0 sr. Presidente: - Esta a dar a hora para se entrar na ordem do dia.
O sr. Corte Real: - Asseguro a v. exa. que são muito breves as considerações que tenho a fazer em resposta ao sr. ministro.
O sr. Presidente: -Não posso dar a palavra ao sr. deputado nem aos mais srs. inscriptos, porque, como já disse, vae entrar-se na ordem do dia.
Os srs. deputados que tiverem papeis a mandarem para a mesa podem fazel-o.

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ORDEM DO DIA

Entra em discussão o projecto n.° 34 Orçamento rectificado

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 34

Senhores.-A vossa commissão do orçamento foram presentes as propostas do lei do governo fixando as receitas e despezas ordinarias e extraordinarias do estado, no excercicio futuro, e rectificando os calculos dos recursos e encargos da nação, na motropole, no exercicio corrente do 1884-1885.
Achando-se já ultimado o exame da proposta, rectificando o orçamento vigente, e do resultado d'esse exame que a vossa commissão vos vem dar conta, esperando, dentro em pouco, apresentar-vos o sou parecer sobre as receitas e despezas geraes da nação no futuro exercicio.
A proposta do governo, em relação ao exercicio do 1884-1885, resume-se no seguinte:

Receitas ordinarias .... 31.647:317$000
Despezas ordinarias .... 33.070:734$202
Differença .... 1.422:617$202
Despezas extraordinarias.... 7.020:122$388
Receitas extraordinarias, não provenientes do recurso ao credito....306:137$813
Differença .... 6.713:954$575

Para fazer face a estas differenças, applicar-se-ha, nos termos da lei de 14 de maio do 1884, a parte do emprestimo d'esse anno, que for necessaria para a satisfação regular de todos os encargos publicos. O governo, porém, espera, e com fundamento, que o desequilibrio no orçamento ordinario seja muito menor.
Com effeito, o exame das contas provisorias da gerencia actual, publicadas na folha official, pode-nos dar indicações, se não completas, pelo menos tão approximadas da realidade, sobre os resultados do exercicio de 1883-1884, que a sua comparação com o que as contas geraes do estado, em relação aos exercicios anteriores, nos indicavam, leva-nos a concordar com a opinião do governo.
Com effeito, addicionando ás receitas e despezas do estado, pertencentes ao orçamento ordinario de 1883-1884, e effectivas em 30 de junho de 1884, as que, respectivamente ao mesmo exercicio, se realisaram, em dinheiro, no periodo complementar decorrido ate dezembro ultimo, teremos em numeros redondos:

Receitas ordinarias .... 29.746:000$000
Despezas ordinarias .... 31.593:000$000
Deficit ................ 1.847:000$000

Os deficits ordinarios anteriores tinham sido:

Exercicio de 1882-1883 .... 2.529:000$000
Exercicio de 1881-1882 .... 3.061:000$000
Exercicio de 1880-1881 .... 4.113:000$000

E como as receitas ordinarias, arrecadadas no primeiro semestre da actual gerencia, mostram já sobre os productos de igual natureza e identico periodo, um augmento de proximamente, 936:000$000 réis, e licito esperar que a differença entre os recursos ordinaries e as despezas correspondentes do exercicio de 1884-1885, fique muito abaixo, não só da differença no ultimo exercicio, como da que se encontra na proposta governamental a que a vossa commissão se está referindo.
As receitas ordinarias fixadas pelo governo são superiores 210:600$000 réis as que constavam do mappa annexo ao decreto de 10 de junho ultimo, promulgado em virtude da auctorisação concedida pela lei de 23 de maio antecedente.
As despezas ordinarias são superiores 664:996$123 réis e as extraordinarias 882:122$388 réis as descriptas nas tabellas. As causas das differenças acham-se todas justificadas e explicadas, como de costume, no orçamento apresentado. No emtanto, visto que tanto as despezas como as receitas têem de soffrer algumas modificações, a vossa commissão passa a expor em que consistem essas modificações, começando pela parte relativa aos encargos.

O orçamento rectificado da junta do credito publico, proposto pelo governo, sobe a quantia de 13.832:836$992 réis, isto e, superior 739:133$000 réis ao que se mencionara na tabella decretada em virtude da auctorisação con cedida pela lei de 23 de maio de 1884. A rasão d'esta differença provem, na sua quasi totalidade, da inclusão da juros dos capitaes de divida consolidada, emittidos por auctorisação dada nas leis de 21 de junho de 1883 e 14 do maio de 1884. E em relação a parte d'essas emissões, representada em divida externa, os juros referem-se só ao coupon pago em janeiro ultimo, visto que o encargo do coupon do primeiro semestre do anno civil corrente, devendo ser pago no 1.° de julho de 1885, pertence ao exercicio de 1885-1886.
Ha, porem, ainda que fazer algumas modificações na proposta do governo. A verba para serviço extraordinario na agenda em Londres (artigo 8.°) carece de ser augmentada com £ 140, ou 626$865 réis.
Tendo sido aposentado um primeiro official da contadoria da junta, o respectivo vencimento n'este anno economico sobe a 345$000 réis com que deve ser augmentado o artigo 4.°
Para fazer face a estes augmentos, na importancia de 971$865 réis, pódee, sem inconveniente, deduzir-se concorrente quantia, na verba do artigo 12.°, fixada para commissão, corretagem, juros, difterenças de cambios e outras despezas em Lisboa, não sendo por esta forma alterada a importancia total da proposta do governo para encargos da divida consolidada.
O orçamento da despeza ordinaria do ministerio da fazenda rectificada no exercicio corrente, proposto pelo governo, comparado com a tabella decretada nos termos da lei de 23 de maio ultimo, apresenta os seguintes resultados:

[Ver tabela na imagem]

As differenças para menos nos encrgos geraes provém da consolidação da divida fluctuante, compensada com o9 augmento de despezas para subsidios aos srs. Deputados, já pelo maior numero d'elles, já por se descrever no orçamento essa despeza em relação ao periodo de cinco mezes, e não de tres, como mencionava a tabella.
O augmento do encargo no serviço proprio dos ministerios preveiu principalmente:
1.º De depezas de fiscalisação aduaneira;
2.º De quotas de cobrança de rendimentos e da feitura das novas matrizes prediaes;
3.º Do movimento de empregados aposentados.

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Todas estas differenças acham-se perfeitamente descriptas no orçamento rectificado.
No emtanto, factos posteriores a proposta do governo demonstram que ainda e necessario dotar melhor algumas verbas para se poder satisfazer as necessidades do serviço.
Na secção VII do artigo 31.° "Gratificações de residencia aos guardas" reclama--se o augmento de 3:000$000 réis.
Na secção VIII do mesmo artigo "Visitas e despezas de transporte" mais 10:000$000 réis.
Na secção I do artigo 35.°, mais 6:000$000 réis.
É assim de 19:000$000 réis o augmento no capitulo VI "Alfandegas". A melhor fiscalisação, a que corresponde notavel melhoramento na arrecadação das receitas aduaneira, e o grande movimento que houve do pessoal fiscal por causa das providencias sanitarias, explicam este novo augmento de encargo.
Na verba para organisação de novas matrizes prediaes, ha que augmentar ainda 10:000$000 réis (capitulo VIII, artigo 60.°). Mandou-se dar grande desenvolvimento a este serviço no actual anno economico. Estão a concluir, ou foram concluidas, as matrizes dos districtos de Portalegre, Horta e Lisboa; deu--se o maximo desenvolvimento as matrizes do districto de Santarem, que dentro em pouco estarão ultimadas ; e mandou-se proceder activamente aos trabalhos da coordenação d'ellas nos districtos de Bragança, Villa Real, Coimbra, Vizeu, Leiria e Funchal. Está assim explicada e justificada a despeza, que aliás tem de ser addicionada respectivamente aos contingentes da contribuição predial.
Dos vinte e um districtos do continente e ilhas, não ha ainda n'estes termos trabalhos de revisão de matrizes; senão apenas em seis: Aveiro, Braga, Castello Branco, Guarda, Porto e Vianna do Castello. As dos districtos de Beja, Evora, Faro, Angra e Ponta Delgada já estavam concluidas.
Ficará, pois, segundo as indicações acima, fixada a despeza ordinaria do ministerio da fazenda, no actual exercicio em 6.353:262$832 réis.
Á despeza extraordinaria proposta pelo governo na importancia de 232:726$134 réis, haverá que addicionar réis 6:000$000 para satisfazer todas as despezas extraordinarias do saude, liquidadas nos termos do decreto de 3 de junho de 1884, ficando assim a verba total elevada a 238:726$134 réis.

O ministerio do reino rectificou o orçamento das suas despezas, fixando as
ordinarias em réis..... 2.205:649$459
e as extraordinarias em .... 100:200$601
.... 2.305:850$060

Mas estas avaliações, segundo as informações prestadas pelo governo, carecem ainda de ser correctas.
O augmento constante do numero de enfermos no hospital de S. José e annexos tem aggravado a despeza n'aquelles estabelecimentos em proporções não cogitadas, de sorte que, apesar do acrescimo da dotação respectiva, nos dois ultimos annos, a divida por fornecimentos não pode ser extincta e o atrazo n'esses pagamentos faz com que os mesmos fornecimentos sejam mais caros, porque n'elles ha de recair o juro da mora do embolso do preço dos generos. Essa divida era em 30 de junho de 1884 de réis 31:672$844, segundo as contas da respectiva administração o governo pede que a camara o habilite, por meio de verba extraordinaria, a pagal-a e para esse fim a commissão descreveu no sen projecto a quantia de 31:700$000 réis. A necessidade de adquirirmos mais alguns hospitaes-barracas, e de todos conhecida e ainda a commissão entendeu que se pode applicar extraordinariamente a essa acquisição a quantia de 30:000$000 réis.
Pelos esclarecimentos fornecidos pelo governo vê-se que a verba calculada por este ministerio para despezas extraordinarias de saude não é sufficiente. Novas liquidações de despezas em tempo ordenadas, têem sido feitas e reclamam approximadamente a quantia do 9:000$000 réis.
Sobem assim os augmentos de despeza sobre a proposta do governo, por este ministerio, a 70:700$000 réis.
Para lhes fazer face, pode sem inconveniente, deduzir-se:
1.° Na verba da secção 4.ª do artigo 14.° da tabella de despeza ordinaria do ministerio a quantia de 40:000$000 réis, visto como todos os ordenados dos professores dos lyceus ahi descriptos estão integraes, e a uma parte d'esses professores, como provisorios, só e abonada metade do ordenado;
2.° Na verba da secção 4.ª do artigo 15.° da mesma tabella a quantia de 40:700$000 réis, visto como pelos esclarecimentos prestados pela competente repartição as sobras n'esse artigo devem ser muito superiores:

N'estes termos haverá ainda no conjuncto dos pedidos constantes da proposta governamental uma economia de réis 10:000$000, ficando assim fixada a despeza ordinaria em réis.... 2.124:949$459
e a extraordinaria em.... 170:900$601
.... 2.295:850$060

Comparando estes numeros com os da tabella decretada, segundo a auctorisação da lei de 23 de maio de 1884 vê-se o seguinte:

Despeza ordinaria:
Tabella.... 2.213:043$509
Projecto da commissão.... 2.124:949$459
Para menos no projecto.... 88:094$050

Despeza extraordinaria:
Tabella.... 50:000$000
Projecto da commissão.... 170:900$601
Para mais no projecto.... 120:900$601

Estas differenças estão minuciosa e claramente explicadas no orçamento rectificado, com as correcções a que acima se refere a vossa commissão.

O ministerio da justiça pede mais 17:337$639 réis do que fora fixado na tabella de distribuição de despeza. Os encargos com habilitações ,canonicas o sagração de prelados diocesanos, encargos preliminares da installação da cadeia geral penitenciaria, e o sustento do presos justificam o augmento proposto.
Mais ainda: segundo os esclarecimentos dados pelo governo a alimentação dos presos, impõe que a respectiva verba seja dotada com um novo supplemento de credito na importancia de 10:000$000 réis, ficando por esta forma elevada a despeza deste ministerio a 698:887$634 réis.

A despeza ordinaria rectificada do ministerio da guerra e apreciada em 4.873:837$551 réis, isto e, em somma superior 15:263$241 réis a que fora auctorisada pela tabella approvada por decreto de 3 de junho ultimo.
Este augmento proveiu do resultado do encontro de muitas e variadas verbas de excesso e diminuição de despezas, como o orçamento minuciosamente demonstra. Entre ellas, porem, encontra-se a de 15:000$000 réis, a maior, para gratificações dos officiaes e cirurgiões empregados nas commissões revisoras do recrutamento, em conformidade do

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artigo 22.° da nova lei eleitoral de 22 de maio de 1884, e a essa verba se póde attribuir quasi exclusivamente o augmento do encargo.
A despeza extraordinaria tem a mais 336:769$095 réis, augmento perfeitamente desenvolvido no orçamento. Parte d'esse augmento tem receita correspondente: a que se refere á acquisição do palacio de Santa Clara, mobilia e utensilios para os novos quarteis e ás reparações urgentes em quarteis e edificios militares, paga pelo producto das remissões de recrutas, nos termos da lei de 15 de junho de 1882 e decreto de 19 de maio de 1884 (artigo 3.°).
O producto d'estas remissões, nos termos do citado decreto de 19 de maio, é avaliado como recurso extraordinario, no orçamento em 89:000$000 réis: no emtanto esse producto subia effectivamente em 31 de janeiro de 1885 a cerca de 152:000$000 réis. Tendo, porém, o alludido decreto determinado que o producto de taes remissões fosse applicado (artigo 3.º) a occorrer ao pagamento dos vencimentos dos alferes graduados, que não tivessem sido promovidos a effectivos, sendo o restante applicado á demora da artilheria e obras militares, alem das verbas para tal fim consignadas no orçamento e considerando que no orçamento rectificado actual se incluem os vencimentos dos alferes graduados, que não foram collocados ainda nos quadros, e que nas armas de cavallaria e infanteria, segundo o orçamento do exercicio futuro subiram á somma de réis 40:858$000, correspondente a 182 militares d'essa graduação; deve no orçamento ordinario d'este exefcicio e para, nos termos da lei, compensar essa despeza, ser incluida no mappa da receita a somma de 41:000$000 réis, para o abono de que se trata, devendo o resto do producto de taes remissões continuar figurando no mappa da recita extraordinaria para os fins marcados na mesma lei. E sendo como acima se diz, o producto conhecido das referidas remissões, em 31 de janeiro ultimo, de 152:468$817 réis depois de descontada a parte, na importanciade 41:000$000 réis, que é receita compensadora de despeza ordinaria; o resto, 110:000$000 réis (numeros redondos) é receita extraordinaria, que ficará assim elevada, em relação ao que d'esta proveniencia se acha fixado no orçamento em 21:000$000 réis.
N'estes termos entende a vossa commissão que, em harmonia com o exposto, os capitulos 3.º, 4.º e 5.º do orçamento de despeza extraordinaria do ministerio da guerra devem ser incluidos n'um só capitulo, assim redigido:

Despeza pelo producto das remissões auctorisadas pelo artigo 3.º do decreto de 19 de maio de 1884:

Compra do palacio sito em Santa Clara, para serviço elo ministerio da guerra .... 80:071$975
Mobilia e utensilios para os quarteis dos novos corpos, organisados em virtude do alludido decreto .... 10:000$000
Reparações urgentes em quarteis e edificios militares, para complemento da remonta da artilheria e outras despezas militares .... 21:000$000
(N. B. As despezas por este capitulo poder-se-hão elevar á somma que produzirem as respectivas remissões de recrutas, e que figurar nas contas de receita, descontada a quantia ele réis 41:000$000, compensação dos vencimentos dos alferes graduados não collocados nos quadros em 30 do outubro de 1884).
111:071$975
Com estas correcções a despeza extraordinaria do ministerio da guerra ficará rectificada na somma total de 1:540:769$095 réis.
É superior 111:231$630 réis a despeza ordinaria do ministerio da marinha, á que havia sido fixada pela tabella da distribuição da despeza.
Os augmentos principaes são no capitulo II «Armada» 94:277$115 réis, e no VI «Empregados reformados, aposentados, jubilados e veteranos».
Não havendo sobras no artigo 10.° para com cilas se satisfazer a despeza com a escola dos marinheiros, a deducção de 30:000$000 réis feita na tabella não se pôde realizar; a organisação do corpo dos marinheiros militares, decretada em 29 de maio de 1884, o maior numero de praças exigido pelas lotações dos navios armados, e bem assim o maior numero de navios em serviço fóra do Tejo, reclamam a seu turno maior numero e maior dispendio com as rações, e tudo isso explica não só o augmento de encargo no orçamento actual, como no do futuro exercicio e até a necessidade que ha de providenciar, em relação a identicas despezas do exercicio de 1883-1884, para fazer face ás quaes não bastaram as sommas descriptas na lei rectificando as respectivas verbas.
Quanto ao excesso de encargos no exercicio corrente é elle compensado, em parte, com a verba nova de 12:000$000 réis inscripta no mappa da receita e cuja importancia tem de ser descontada ás praças da armada pelo pagamento dos artigos de uniforme que lhes são destribuidos.
A despeza extraordianria d'este ministerio, pela direcção da marinha, foi augmentada com 82:426$558 réis, sendo para reparações de navios 56:990$889 réis e 25:435$669 réis de despezas extraordinarias de saude, nos termos do decreto de 3 de junho de 1884. A vossa commissão. Porém, reconhece que para estas ultimas despezas será sufficiente a somma de 17:000$000 réis.
Ficarão, pois, as despezas d'este ministerio, pela direcção geral de marinha, fixadas:

As ordinarias em ......... 1.787:609$201
As extraordinarias em .... 323:990$889
2.111:600$090

Quanto ás despezas do exercicio de 1883-1884 a vossa commissão propõe-vos que seja aberto um credito supplementar da quantia de 95:093$679 réis, sendo 90:175$904 réis para despezas da armada, descriptas no artigo 10.° da respectiva tabella e 4:917$775 réis para vencimentos de inactividade descriptos no artigo 25.° O excesso das liquidações no capitulo «Armada» classifica-se assim:

Rações ..................................... 24:225$857
Combustivel para os navios ................. 25:563$683
Material de guerra e de machinas ........... 27:070$395
Passagens de officiaes e praças de pret .... 13:315$869
90:175$904

A estas despezas foram applicados saldos de supprimentos anteriormente feitos á promulgação do decreto de 26 de junho de 1884 (Diario n.° 144), que sujeitou ao visto preliminar do tribunal de contas todas as ordens de pagamento, quer de despezas certas, quer de despezas variaveis, em harmonia com o pensamento geral da lei de reforma ela contabilidade publica.
Em relação ao exercicio corrente e ás despezas do ultramar a cargo da metropole, nenhuma alteração ha nas despezas ordinárias, que são fixadas ainda em 96:000$000 réis.
Não aconteceu o mesmo ás despezas extraordinarias. O governo pede mais 180:000$000 réis para essas despezas, sendo 6:000$000 réis para a provincia da Guiné - encargos da pacificação da provincia; 4:000$000 réis para a de S. Thomé, 30:000$000 réis para a de Angola e réis 17:000$000 para a da India, sommas que ellas não poderam pagar e que poderiam ter sido satisfeitas pelos exce-

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dentes da provincia de Macau, se esses excedentes tivessem sido enviados para a metropole; e finalmente 123:0005000 reis para a provincia de Moçambique, a fim do occorrer principalmente aos encargos que d mesma provincia trouxeram os acontecimentos de Massingire.
A vossa commissão, reconhecendo que o estado da administração da fazenda nas provincias ultramarinas e da sua contabilidade e insustentavel; que a ausencia, quasi absoluta, de contas de como os dinheiros do estado são ali cobrados e applicados, não pode continuar; approva comtudo os creditos pedidos e confia em que o governo continuara nas diligencias que ha muito emprega, para haver contas das ditas provincias, desejando que sejam tomadas todas as providencias para que, no mais curto espaço do tempo, o parlamento, e portanto o paiz, saibam de como os rendimentos publicos são cobrados e applicados, nas terras de alem mar.

Pelo ministerio dos negocios estrangeiros é pedida na proposta do governo a quantia a maior de 11:215$980 reis sobre a auctorisação contida na tabella approvada por decreto de 18 de junho proximo passado. A vossa commissão, porem, reconheceu que a verba destinada para despezas extraordinarias de legações e consulados é ainda insufficiente, sendo preciso addicionar-lhe 10:000$000 réis. As despezas extraordinarias que nos trouxe a conferencia de Berlim, explicam este augmento de dotação pedida pelo governo e com a qual a commissão se conforma. Fica assim elevada a 351:187$296 réis a somma que o ministerio dos estrangeiros pode despender, nos termos legaes, no actual exercicio.

A despeza ordinaria do ministerio das obras publicas é superior 41:742$401 réis a fixada na respectiva tabella: os augmentos provém, principalmente, como se torna evidente da proposta governamental, da conservação de estradas, de serviço dos caminhos de ferro e do serviço postal telegraphico, consequencia inevitavel do desenvolvimento que esses serviços têem tido.
No emtanto no capitulo 4.° "Caminhos de ferro" ha a fazer as seguintes modificações:
Artigo 8.° - Secção l.ª - Incluir os vencimentos de logares providos por despacho de 26 de Janeiro ultimo.
Direcção da fiscalisação, exploração e policia dos caminhos de ferro do norte e leste:

Inspecção de via e obras:
1 agente fiscal de 1.ª classe:

Vencimento ....180$000
Gratificação....90$000
.... 270$000

Inspecção do movimento e trafico:
1 fiscal de estatistica:
Ordenado .... 288$000
Gratificação .... 144$000
....432$000
.... 702$000

No artigo 9.°, secção 4.ª, augmentar as verbas relativas a direcção da exploração dos caminhos de ferro do Minho e Douro:

Direcção.- Serviços centraes :
l.ª repartição, central. - 2 serventes,
vencimentos a 1445000 reis.... 288$000
3.ª repartição, contabilidade geral.
1 aspirante, vencimento.... 216$000
5.ª repartição, fiscalisação e estatistica.
- Ajudas de custo nos balanços .... 80$000
6.ª repartição, armazens geraes. -
1 guarda, vencimento.... 144$000

Serviços de trens. - Movimento:
Percursos aos guardas freios.... 400$000
10 carregadores, jornaes .... 1:168$000
Ajudas de custo do pessoal das estações.... 450$000

Tracção e officinas. - Tracção:
Deslocações e percursos.... 120$000
Serões por trabalhos extraordinarios.... 1:000$0000
.... 3:866$000

No artigo 10.°, secção l.ª - Elevar a verba de despezas de expediente da direcção da fiscalisação, exploração e policia dos caminhos de ferro do norte e leste de 500$000 a 800$000 réis - augmento 300$000 réis.
No mesmo artigo 10.°, secção 4.ª- Diminuir nas verbas respectivas as seguintes importancias, para compensar os augmentos acima descriptos no mesmo capitulo:

Direcção da exploração dos caminhos de ferro do Minho e Douro:

Serviços centraes:
Expediente, impressos, publicações e annuncios - reduzir a verba de reis 3:300$000 a 1:700$000 réis- reducção.... 1:600$000

Services externos:
Expediente, impressos, annuncios, mobilia e utensilios do movimento e trafico - reduzir de 18:000$000 réis a 14:732$000 réis - differença .... 3:268$000
.... 4:868$000

Ficarão assim compensadas as alterações que, n'este capitulo, propõe a vossa commissão, continuando, pois, a despeza ordinaria a ser avaliada na somma de 2.920:463$231 réis.
A despeza extraordinaria e proposta pelo governo na somma de 4.093:000$000 réis, importancia total auctorisada na tabella vigente. Para que os dois numeros podessem ser iguaes, o governo reduziu 294:0005000 réis em algumas das verbas da tabella, reconhecendo-se que essas reducções se poderiam verificar, sem prejuizo do serviço.
Igualmente julga a commissão que ainda pode ser limitada a 500:000$000 réis a verba destinada para a construcção de novos pharoes e a 1.500:000$000 réis a verba dos caminhos de ferro, ficando por esta forma a despeza avaliada na quantia de 3.957:000$000 réis.

As receitas ordinarias do estado computadas no orçamento rectificado subiam
á somma de.... 31.647:317$000
Na tabella coordenada nos termos da lei de 23 de maio de 1874 e approvada pelo decreto de 10 de junho, a avaliação era.... 31.436:717$000
para mais no orçamento.... 210:600$000

sendo nos impostos directos 27:000$000 reis, nos indirectos 154:600$000 réis e nos rendimentos diversos reis 29:000$000, como miudamente no referido orçamento é explicado.
Entende, porem, a vossa commissão que não devem figurar no computo dos recursos ordinarios, n'este exercicio:

1.° O subsidio pelo cofre das receitas do recrutamento, visto ter sido modificada a legislação sobre o assumpto.... 44:000$000

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2.° O subsidio dos districtos para sustento de presos, subsidio que ainda não está praticamente regulado.... 64:000$000
3.° O subsidio pelas sobras das auctorisações de despeza pelo ministerio do reino, visto que taes sobras representam menor encargo pago pelo thesouro.... 5:425$000
Somma.... 113:425$000

Para compensar estas eliminações temos:

1.° A parte do producto das remissões das recrutas, nos termos da lei de 15 de junho de 1882 e decreto de 19 de maio de 1884, para pagamento dos vencimentos dos alferes graduados não collocados nos quadros .... 41:000$000
2.° Os augmentos já conhecidos em alguns tributos, confirmados não só pelo orçamento de 1885-1886, mas pelas cobranças no anno economico corrente:
a) Direitos do consumo em Lisboa.... 40:000$000
b) Real de agua.... 57:000$000
c) Imposto de cereaes, no continente ....57:000$000
Total.... 195:000$000

somma que compensa sobejamente as eliminações que a vossa commissão propõe.
Note-se que no orçamento do 1885-1886 se tomaram por base os rendimentos arrecadados ate 1883-1884 e as contas de gerencia de 1884-1885 mostram já, em relação aos tres impostos acima mencionados, as seguintes cobranças no
continente, no primeiro dia das gerencias corrente o anterior.

[Ver tabela na imagem]

Advirta-se, porem, que o augmento acima do 154:000$000 réis sobre os calculos do orçamento rectificado nas tres fontes de receita indicadas, já está reconhecido pelos excessos das cobranças da gerencia de 1883-1884 sobre as de 1882-1883, ultimo anno que serviu de base aos calculos das receitas do exercicio corrente. Se a vossa commissão vos apresenta agora a comparação das receitas da gerencia de 1884-1885 (primeiro semestre) com a de igual periodo no anno anterior, e para vos demonstrar que os factos já estão de sobra confirmando as apreciações assim feitas.
Nas demais verbas, seguindo-se sensatas praticas anteriores, a vossa commissão deixa subsistir as avaliações contidas no orçamento.
E não é porque na generalidade das arrecadações não haja melhoramento incontestavel nas verbas d'este anno, comparadas com as do anno passado.
Esse augmento dá-se, e notavel, como consta da nota dos rendimentos em dinheiro, na metropole, no primeiro semestre do anno corrente, comparados com os do anno anterior, já muito superiores aos de igual periodo de 1882-1883. Una documento publicado recentemente no Diario mostra qual tem sido a marcha das ditas cobranças.

[Ver tabela na imagem]

Demonstra-se, pois, que nas receitas ordinarias o augmento das arrecadações no semestre findo e já de réis 936:079$050. Mas a vossa commissão entende não dever fazer outras modificações nos calculos, alem das acima indicadas, porque não tendo as receitas outra limitação que não seja a dos preceitos das leis que as estabeleceram, hão do ser descriptas nas contas taes como forem arrecadadas, e ha sempre vantagem, como no parlamento mais de uma vez tem sido reconhecido, que dos documentos publicos se possa rapidamente conhecer quaes os resultados da fiscalisação tributaria, e do desenvolvimento ou retrahimento da riqueza publica, pelo acrescimo ou diminuição no producto dos impostos, comparado com a avaliação primitiva.
Posto isto; a receita geral do estado ordinaria e avaliada pela vossa commissão da forma seguinte:

Impostos directos .... 6.307:890$000
Sêllo e registo .... 3.248:600$000
Impostos indirectos.... 16.450:760$000
Addicional por lei de 27 de abril de 1882.... 1.057:000$000
Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos .... 3.591:520$000
Compensações de despeza .... 1.073:122$000
Somma avaliada no orçamento rectificado.... 31.647:317$000
Differença para mais.... 81:575$000

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A receita extraordinaria não proveniente de recursos ao credito é modificada apenas na parte do producto da remissão de recrutas nos termos do decreto de 19 de maio de 1884(artigo 1.°), que foi elevada, pelas rasões expostas noutro logar deste parecer, de 89:000$000 a 110:000$000 réis.

E como as despezas, ordinarias e extraordinarias, são reduzidas de 95:435$669 réis, e as receitas ordinarias augmentadas em 81:575$000 réis, e reduzida, n'esses termos, de 7.237:371$777 réis a 7.039:361$108 réis a parte do emprestimo de 1884, que pode ser applicada as despezas do exercicio, sem contar com as dos armamentos do exercito, que igualmente podem, provisoriamente, ser custeadas por esse producto, visto que o thesouro ainda não realisou a emissão especial para prover aos encargos d'esses armamentos.
Nos termos, pois, das observações que acabam de ser feitas, eis os resultados geraes do exame do orçamento quanto as despezas, que são propostas pela commissão, de accordo com o governo:

[Ver tabela na imagem]

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Quanto as receitas as modificações são, em resume, as seguintes:

[Ver tabela na imagem]

Receitas ordinarias:
Imposto directos....
Sêllo e registo....
Impostos indirectos....
Imposto addicional por lei de 27 de abril de 1882....
Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos....

Differença para mais na proposta- Rs.

Receitas extraordinarias:
Não provenientes de emprestimos....
Provenientes de recursos ao credito:
Parte do emprestimo consolidado de 1884....
Emprestimo para armamentos do exercito....

Differença para menos na proposta- Rs.

Resumo

Receita ordianaria....
Receitas extraordinarias:
Recursos ao credito....
Outras receitas....

Total....Rs.

Differença para menos.... Rs.

São, pois as despezas ordinarias do actual exercicio computadas em....33.039:034$202
E as recitas ordinarias em....31.728:892$000
Desequilibrio....1.310:132$202

Que é de esperar fique muito attenuado, em conformidade com as considerações que, n'outro logar, a vossa commissão expõe.
As despezas extraordinarias são fixadas e....6.956:386$719
E os recursos extraordinarios não provenientes do credito em....327:167$813
Somma a preencher por meio do credito.... 6.629:216$906

As despezas extraordinarias d'este exercicio são notavelmente augmentadas, porque estão em construcção por conta do estado a conclusão dos caminhos de ferro ao sul do Tejo, do Algarve e do Douro; a docka de Leixões; e porque foi necessario augmentar o armamento do exercito, e prover as despezas preventivas contra a invasão da cholera, de que felizmente se livrou o paiz.
A vossa commissão termina assim as breves considerações que o exame do orçamento rectificado lhe suggeriu, e certo de que a sabedoria da camara supprira todas as numerosas deficiencias do parecer, entende que deveis approvar o seguinte
Artigo 1.° A avaliação das receitas do estado, no exercicio de 1884-1885, e rectificada, em conformidade com o mappa junto n.° 1, e que desta lei faz parte, ficando computadas as receitas ordinarias na somma de réis 31.728:892$000; e as extraordinarias na de 8.266:528$921 réis, perfazendo aquellas e estas] a importancia total de 39.995:420$921 réis.
Art. 2.° As despezas totaes do estado, ordinarias e extraordinarias, no mesmo exercicio, são fixadas em réis 39.995:420$921 de accordo com os mappas juntos n.ºs 2 e 3, que fazem parte d'esta lei.
§ 1.° O governo decretara nas tabellas de distribuição de despeza d'este exercicio as rectificações conformes com esta lei.
§ 2.° Na tabella da despeza da junta do credito publico poderão effectuar-se as necessarias transferências de verba do capitulo 6.° para o capitulo 2.°, que forem exigidas pela conversão de titulos de divida externa em titulos de divida interna.
Art. 3.° É aberto um credito supplementar a favor do ministerio da marinha e do ultramar e em relação ao exercicio de 1883-1884 da quantia de 95:093$679 réis, sendo 90:175$904 para o artigo 10.° e 4:917$775 réis para o artigo 25.° da respectiva tabella, devendo as despezas pagas, em virtude d'este credito, serem escripturadas na actual gerencia, em conta do referido exercicio, sem embargo da disposição do artigo 11.° do regulamento geral de contabilidade publica.
Art. 4.° Ficam assim modificadas as leis de 2 e de 23 de maio de 1884, e modificada toda a legislação contraria a esta.
Sala da commissão do orçamento, aos 9 de abril de 1885. = Caetano Sanches Pereira de Castro = Fernando Afonso Geraldes = Tito Augusta de Carvalho = Lopes Navarro = Arthur Hintze Ribeiro = José J. D'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

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N.° 1

Mappa das receitas do estado, ordinarias e extraordinarias, rectificadas, do exercicio de 1884-1885, a que se refere a lei d'esta data

Receitas ordinarias

ARTIGO 1.°

Impostos directos

[Ver tabela na imagem]

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Direitos de importação excepto tabaco e cereaes:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Direitos de navegação do Douro

Direitos de reexportação:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Direitos de tonelagem:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Direitos sanitarios e impostos de quarenta e de lazareto:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Emolumentos geraes das alfandegas de Lisboa e do Porto

Fazendas abandonadas, demoradas e salvadas nas alfandegas:
No continente
Nas adjacentes

Guindaste e escaleres nas alfandegas das ilhas adjacentes
Imposto de transito nos caminhos de ferro

Imposto de cereaes:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Imposto especial de 2 por cento ad valorem sobre o vinho exportado
Imposto especial do vinho, etc., entrando para o consumo no Porto e em Villa Nova de Gaia

Imposto do pescado e addicional:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Imposto especial de 4 decimos por cento do valor das mercadorias importadas, nos termos da lei de 26 de junho de 1883 e decreto de 2 de junho
Impostos para as obras da barra do Douro
Imposto especial de tonelagem para as obras da barra da Figueira
Impostos por lei de 12 de abril de 1876
Imposto especial de tonelagem para as obras da barra de Portimão
Imposto especial de tonelagem para as obras da barra de Vianna do Castello, nos termos da lei de 2 de setembro de 1869
Taxa do porto artificial de Ponta Delgada, por lei de 18 de abril de 1873
Imposto especial de tenelagem para as obras de Espozende
Imposto sobre o sal
Imposto sobre o tabaco:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Imposto especial do tabaco fabricado nas ilhas

Real de agua:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Taxa complementar aduaneira:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Tomadias:
No continente
Nas ilhas adjacentes

ARTIGO 4.º

Imposto addicional por lei de 27 de abril de 1882

ARTIGO 5.º

Bens proprios nacionaes e rendimentos diversos

Academia real das sciencias
Acções do banco de Portugal
Aguas mineraes do arsenal da marinha
Aluguer do dique e da cabrea do arsenal da marinha
Aluguer de logares pela alfandega do consumo de Lisboa
Armazenagem nas alfandegas:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Arsenal do exercito, fabrica da polvora e diversas receitas militares
Barcas de passagem e pontes
Caminho de ferro americano
Caminhos de ferro do Minho e do Douro
Caminhos de ferro do sul e do sueste
Capitaes mutuados pelos extinctos conventos:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Casa da moeda
Collegio militar
Correios, telegraphos e pharoes

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SESSAO DE 5 DE MAIO DE 1885 1437

[Ver tabela na imagem]

Desconto para fardamento das praças da ramada
Extincto collegio dos nobres
Fabrica de vidros da Marinha Grande

Fóros, censos e pensões:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Fornos de cal, gesso e pedreiras

Heranças jacentes e residuos:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Hospital da marinha
Hospital dos invalidos militares em Roma
Imp+rensa da universidade de Coimbra
Imprensa nacional e Diario do governo
Instituto geral de agricultura e escola regional de Cintra
Instituto industrial
Juros das inscripções do curso superior de letras e de outras, com applicação de diversos encargos

Laudemios:
Ni continente
Nas ilhas adjacentes

Moinho de Valle de Zebro
Monte pio militar
Padaria militar
Pinhaes e matas
Presidio da Trafaria

Propriedades pertencentes a praças de guerra:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Receita por decreto de 26 de dezembro de 1869, com applicação ás obras do Mondego

Receita por decreto de 3 de dezembro de 1868:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Receita de emprestimo á camara municipal de Coimbra
Receita do recrutamento por decreto de 19 de maio de 1884

Receitas eventuaes:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Rendas:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Rendimento da hospedaria do lazareto
Serviço da barra de Aveiro

Venda de bens nacionaes:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Rendas de fóros, censos e pensões:
No continente
Nas ilhas adjacentes

Contribuição da provincia de Macau para o emprestimo de 400:000$000 réis
Contribuição das provincias ultramarinas para o emprestimo de réis 1.750:000$000
Subsidio pelo cofre dos rendimentos dos conventos de religiosos supprimidos
Subsidio pelo cofre das receitas do recrutamento

ARTIGO 6.º

Compensações de despeza

Parte do producto das remissões de recrutas, nos termos do artigo 3.º do decreto de 19 de maio de 1884
Parte dos lucros da caixa geral de depositos e da caixa economica portugueza, correspondente ás despezas das respectivas secretarias
Emprestimos de diversos bancos para pagamento ás classes inactivas
Juros de bonds cancellados e depositados no banco de Inglaterra
Juros dos titulos de divida consolidada na posse da fazenda:
Divida interna
Divida externa

Desconto de 5 por cento nas quotas dos escrivães de fazenda
Subsidio dos districtos para sustento dos presos
Subsidio pelas sobras das auctorisações de despeza pelo ministerio do reino

Somma da receita ordinaria

Receitas extraordinarias

Parte do producto da remissão de recrutas nos termos do artigo 3.º do decreto de 19 de maio de 1884
Parte da receita especial por lei de 14 de fevereiro de 1876, applicada ás obras do novo edificio do correio de Lisboa(importancia igual á despeza)
Parte do producto do emprestimo consolidado de 1884, nos termos da lei de 14 de maio de 1884(Diario n.º 110) para fazer face ás despezas extraordinarias e ao deficit ordinario d'este exercicio ( importancia a determinar pelos pagamentos)

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1438 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Receita especial destinada as obras no edificio da alfandega de LisbOa, nos termos do decreto de 9 de outubro de 1884 (importancia igual á despeza a realisar n'este exercicio)....
Emprestimo para armamentos do exercito, nos termos do artigo 2.° do decreto de 19 de maio de 1884 (importancia igual a despeza a realisar n'este exercicio, e por esta proveniencia, e podendo ser paga pelo producto do emprestimo, nos termos da lei de 14 de maio de 1884) ....
Total - Rs. ....

Sala da commissão do orçamento, aos 9 de abril de 1885.= Caetano Pereira Sanches de Castro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Lopes Navarro = Arthur Hintze Ribeiro = João J. D'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

N.° 2

Mappa da despeza ordinaria do estado, rectificada, do exercicio de 1884-1885, a que se refere a lei desta data

Junta do credito publico

Administração da divida consolidada

Encargos de divida interna :
Gratificações aos membros da junta e ordenados aos empregados....
Juros....
Amortisações....
Diversos encargos....

Encargos de divida externa:
Despezas com a agencia financial em Londres....
Juros....
Amortisações ....
Diversos encargos....

Administração da caixa geral de depositos e economica

Caixa geral de depositos e economica portugueza....

Ministerio dos negocios da fazenda

Encargos geraes:
Dotação da familia real....
Cortes....
Juros e amortisacoes a cargo do thesouro....
Encargos diversos e classes inactivas....

Serviço proprio do ministerio:
Administra9ao superior da fazenda publica....
Alfandegas....
Administração geral da casa da moeda e papel sellado....
Repartições de fazenda dos districtos e dos concelhos....
Empregados addidos e aposentados....
Despezas diversas....
Despezas de exercicios findos.....
Amoedação de moeda de bronze .....

Ministerio dos negocios do reino

Secretaria d'estado....
Supremo tribunal administrativo....
Governos civis....
Municipalidades ....
Segurança publica....
Hygiene publica....
Instrucção publica....
Beneficencia publica....
Addidos aos quadros, aposentados e jubilados....
Diversas despezas....
Despezas de exercicios findos ....

Ministerio dos negocios ecclesiasticos e de justiça

Secretaria d'estado....
Dioceses do reino....

Supremo tribunal de justiça.....
Tribunaes de segunda instancia....
Juizos de primeira instancia....
Ministerio publico....
Sustento de presos e policia de cadeias....
Diversas despezas ....
Exercicios findos.....
Aposentados.....
Subsidios a religiosas....

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SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1885 1439

Ministerio dos negocios da guerra

Secretaria d'estado ....
Estado maior do exercito e commandos militares ....
Corpos das diversas armas ....
Fracas de guerra e pontos fortificados .....
Diversos estabelecimentos e justiça militar.....
Officiaes em diversas commissões.....
Officiaes em disponibilidade e inactividade temporaria.....
Officiaes sem accesso e reformados ....
Veteranos e invalidos ....
Diversas despezas.....
Despezas de exercicios findos .....

Ministeri dos negocios da marinha e ultramar

Marinha :
Secretaria d'estado e repartições auxiliares.....
Armada nacional.....
Tribunaes e diversos estabelecimentos ....
Arsenal da marinha e suas dependencias.....
Encargos diversos.....
Empregados, reformados, aposentados, jubilados e veteranos.....
Despezas de exercicios findos ....

Ultramar :

Despezas do ultramar realisadas na metropole....

Ministerio dos negocios estrangeiros

Secretaria d'estado.....
Corpo diplomatico ....
Corpo consular ....
Despezas eventuaes ....
Condecorações .....
Empregados addidos e em inactividade ....
Despezas de exercicios findos.....

Ministerio das obras publicas, commercio e industria

Secretaria d'estado ....
Pessoal technico e de administração....
Estradas.....
Caminhos de ferro .....
Direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes ....
Diversas obras ....

Estabelecimentos de instrucção e tratamento das vinhas phylloxeradas.....
Pinhaes e inatas nacionaes....
Direcção geral dos trabalhos geodesicos, topographicos, hydrographicos e geologicos do reino....
Empregados addidos, fora dos quadros, jubilados e aposentados ....
Diversas despezas ....
Despezas de exercicios findos ....

Sala da commissão do orçamento, aos 9 de abril do 1885. = Caetano Pereira Sanches do Castro = Fernando Affonso Geraldes = Tito Augusto de Carvalho = Lopes Navarro = Arthur Hintze Ribeiro = Julio J. D'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilhoo, relator.

N.º 5

Mappa da despeza extraordinaria do estado, rectificada, para o exercicio de 1884-1885, a que se refere a lei datada de hoje

Ministerio dos negocios da fazenda

CAPITULO I

Debito antigo do thesouro ao deposito publico de Lisboa - parte a satisfazer n'este exercicio....

CAPITULO II

Alfandegas

Melhoramentos geraes no edificio da alfandega de Lisboa, segundo o decreto de 9 e outubro de 1884 ....
Adaptação de uma parte do edificio da alfandega do consume a secretaria do segundo corpo de fiscalisação externa.....
Assentamento de novos carris e compra de dois guindastes para a alfandega de Lisboa....
Grandes reparações nos armazens do Porto Brandão.....

CAPITULO III

Despezas extraordinarias de saude publica

Para estas despezas, nos termos do decreto de 3 de julho de 1884 ....

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1440 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Ministerio dos negocios do reino

CAPITULO I

Lyceu de Lisboa

Para a construcção do edificio (não se realisa despeza n'este anno economico)....

CAPITULO II

Despezas da escola polytechnica, nos termos da lei de 10 de junho de 1881....

CAPITULO III

Despezas de instrucção primaria, nos termos da lei de 1 de junho de 1882....

CAPITULO IV

Despezas extraordinarias de saude publica
Para estas despezas, nos termos do decreto de 3 de julho de 1884 ....

CAPITULO V

Para pagamento da divida de fornecimentos ao hospital de S. José....
Para a acquiaicao de hospitaes barracas ....

Ministerio dos negocios da guerra

CAPITULO I

Estrada militar da circumvallação e conservação das obras de fortificação de Lisboa e seu porto ....

CAPITULO II

Subsidios, rancho, alojamentos e transportes a emigrados hespanhoes....

CAPITULO III

Despeza pelo producto das remissões, auctorisadas pelo artigo 3.° do decreto de 19 de maio de 1884

Compra do palacio sito no campo de Santa Clara, para serviço do ministerio da guerra....
Mobilia e utensilios para os quarteis dos novos corpos, organisados em virtude do decreto de 19 de maio de 1884 ....
Reparações urgentes em quarteis e edificios militares, segundo o artigo 3.° da lei de 15 de junho de 1882 ....

(As despezas por este capitulo poder-se-hão elevar á somma que produzirem as respectivas remissões de recrutas e que figuram nas contas de receita, descontada a quantia de 41:000$000 réis, compensação dos vencimentos dos alferes graduados, não collocados nos quadros em 30 de outubro de 1884.)

CAPITULO IV

Fornecimento de bronze para a estatua do marquez de Sá da Bandeira, nos termos da lei de 1 de abril de 1880.....

CAPITULO V

Despezas extraordinarias de saude publica

Para estas despezas, em conformidade do decreto de 3 de julho de 1884....

CAPITULO VI

Para compra de armamentos, nos termos do decreto de 19 de maio de 1884....

Ministerio dos negocios da marinha e ultramar

CAPITULO I

ARTIGO 1.°

Deficit das provincias ultramarinas, incluindo despezas com a expedição de Massingire....

ARTIGO 2.°

Expropriações para o caminho de ferro de Mormugão.....

ARTIGO 3.º

Despezas com o estabelecimento de novas missões ou estações civilisadoras e commerciaes e exploração em Africa.....

CAPITULO II

ARTIGO 1.º

Acquisição de uma corveta e duas canhoneiras (resto do custo)....

Grandes reparações:

ARTIGO 2.º

Transporte Africa ....
Corveta Estephania....
Hiate Visconde da Praia Grande de Macau ....

ARTIGO 3.º

Despezas extraordinarias de saude publica

Para estas despezas, em conformidade do decreto de 3 de julho de 1884....

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SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1885 1441

ARTIGO 4.°

Compra de artilheria para os navios da armada ....

ARTIGO 5.º

Construcção e reparação dos edificios da marinha.....

Ministerio das obras publicas, commercio e industria

CAPITULO I

Estradas

Estudos, construcção e grandes reparações de estradas de 1.º classe no continente do reino e ilhas adjacentes, menos nos districtos de Villa Real e Bragança ....
Estudos, construcção e grandes reparações de estradas de l.ª classe nos districtos de Villa Real e Bragança....
Subsidios para estradas municipaes, districtaes e respectivas pontes :
Todos os districtos do continente o ilhas, menos Villa Real e Bragança ....
Districtos de Villa Real e Bragança .....
Ponte de D. Luiz I (lei de 19 de maio de 1880)....

CAPITULO II

Caminhos de ferro

Construcção, estudos, fiscalisação da construcção e mais despezas com caminhos de ferro....
Construcção do caminho de ferro do Algarve e do prolongamento das linhas do sul e sueste, corforme com a lei de 29 de marco de 1883....

CAPITULO III

Obras hydraulicas

Estudos e melhoramentos de portos e rios, incluindo o Mondego e o Tejo, obras hydraulicas nas bacias das ribeiras e regimen das aguas correntes ....
Porto artificial de Ponta Delgada.....
Porto artificial da Horta.....
Para o porto artificial no Funchal, podendo esta verba servir de base a uma operação para a mais rapida conclusão da obra ....
Porto artificial de abrigo de Leixões (lei de 26 de junho de 1883)....

CAPITULO IV

Correios, telegraphos e pharoes

Construcção de novas linhas telegraphicas....
Construcção de novos pharoes....
Tres carruagens ambulancias postaes ....
Construcção do novo edificio do correio (lei de 14 de fevereiro de 1876)....

CAPITULO V

Arborisação e dunas

Pinhaes e matas nacionaes, arborisação das dunas, montanhas e estradas florestaes....

CAPITULO VI

Congresso postal

Congresso postal em Lisboa ....

CAPITULO VII

Exposição agricola de Lisboa

Pavilhão na tapada da Ajuda - ultima prestação....

CAPITULO VIII

Escola agricola em Villa Fernando (lei de 22 de junho de 1880)....

CAPITULO IX

Despezas extraordinarias de saude publica

Para estas despezas, nos termos do decreto de 3 de julho de 1884 ....

Sala da commissão do orçamento, aos 9 de abril de 1885.= Caetano Pereira Sanches de Castro = Fernando Affonso Geraldes =Tito Augusto de Carvalho = Lopes Navarro = Arthur Hintze Ribeiro - João J. D'Antas Souto Rodrigues = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

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1442 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

0 sr. Eduardo José Coelho (para uma questão previa): -Em obediencia as prescripções do regimento mando para a mesa a seguinte moção.
(Leu.)
Empregarei os esforços, que em mim couberem, para justificar a minha moção, ou proposta de adiamento; e, por isso que proponho o adiamento, claro e que não posso entrar na discussão dos variados assumptos que respeitam ao orçamento rectificado; mas não poderei deixar de fazer algumas considerações, que parece melhor cabimento teriam por occasião de se discutir o orçamento rectificado, quando e certo que o meu intento e justificar o adiamento.
Vou fazer a camara uma revelação, que talvez pareça extraordinaria, original até não e por modestia, que declaro não ser intenção minha entrar na discussão do orçamento rectificado.
Tenho hoje opiniões muito differentes das opiniões de outro tempo. Em epochas não muito remotas, tinha eu pela sciencia financeira, e estadistas financeiros, um profundo respeito, uma veneração quasi supersticiosa.
Tinha os inculcados financeiros como entes excepcionaes, quasi milagrosos, unicos que possuiam os segredos, os elixires, que felicitam, que salvam os povos; e ate na pose, nos ademanes, me pareciam seres a parte. (Riso.)
Confesso porém a v. exa. que a minha opinião e hoje outra, e careço de dar as rasões d'ella. Direi ate que estou completamente desilludido.
Affirmo, pois, que nada mais facil, nem menos importante, do que a apregoada sciencia financeira, e tal e a minha convicção hodierna, que ate me julgo competente para entrar nas questões financeiras. (Riso.) Vou summariar as rasões d'esta minha opinião, que já disse pode parecer original.
Em 1881 foi ao poder o ministerio imposto pela gravidade das circumstancias, e o ministro da fazenda d'aquella epocha limitou-se a pouco mais do que propor o projecto de lei de meios, que não foi approvado; remodelou os serviços aduaneiros, de modo que essa remodelação teve um nome na historia, e que agora não quero repetir; suspendeu em parte o imposto de rendimento, e tornou-se ainda notavel aquella gerencia financeira por uma celebre portaria destinada a matar um tyranno que ainda não existia, quero referir-me ao arrematante do real de agua. (Riso.)
Ora, sendo isto muito pouco, e não podendo negar-se ao então ministro da fazenda elevados dotes de espirito, nem sciencia, nem consciencia da responsabilidade do cargo, chego á conclusão, de que não e precise nem possuir elevados dotes de espirito, nem sciencia excepcional, para subir ao que reputamos tão elevado cargo, - e que os chamados assumptos financeiros têem minguada importancia, e não carecem de grande competencia para os gerir e tractar. (Apoiados. - Riso.)
Sabe v. exa. e a camara, que o primeiro ministro da fazenda do ministerio da gravidade das circumstancias desappareceu como por encanto, e que foi substituido pelo sr. presidente do conselho de ministros, e proferindo este nome digo tudo. O sr. Fontes, que a si assume e em si concentra todos os poderes, em si mesmo resume e personifica todas as competencias. (Apoiados.)
E se tivesse tempo de colligir os meus apontamentos, eu faria a v. exa. e a camara uma narração talvez curiosa, porque alguns dos meus illustres collegas, dos mais dignos e illustrados d'esta camara, e que tem, entre outras, a missão de esclarecer a opinião publica, como correspondentes de jornaes alias muito illustrados da cidade do Porto, pouco mais fizeram n'aquella conjunctura, do que noticiarem a entrada do actual presidente do conselho para a pasta da fazenda, como um assignalado triumpho, e como penhor seguro de nossa prompta e immediata regeneração financeira. O paiz podia confiar tranquillo, porque o sr. Fontes, armado com a clava de Alcides, esmagaria de vez a cabeça do deficit. (Apoiados.)
A tarefa da imprensa regeneradora, nesta conjunctura, limitou-se, repito, a assignalar como um grande triumpho, e como uma grande fortuna para o paiz, a entrada do sr. Fontes Pereira de Mello para o ministerio da fazenda. Era então a phrase consagrada, de que este facto mostrava bem que as reformas politicas não passavam de uma grande impertinencia, ou de uma grita da demagogia inconsciente, pois a grande questão, a questão vital, a questão redemptora, e que havia de garantir a nossa autonomia, era a questão financeira, a qual ia ser deveras tratada e resolvida. (Apoiados.)
Ninguem o podia duvidar. Desde o momento, que o actual presidente do conselho tomava esta resolução heroica, ficavam todos sabendo que a questão de fazenda ia absorver todos os seus cuidados e fadigas; os assumptos fazendarios occupariam a sua exclusiva attenção.
O que aconteceu, porém? Nós o vimos: o sr. ministro da fazenda lembrou-se de saldar o deficit, de reorganisar a fazenda publica, com o expediente de lançar alguns addicionaes ás contribuições existentes! E eu, que já começava a duvidar dos financeiros o da sciencia financeira, quasi fiquei sceptico desde este momento, porque me pareceu então, e permaneço na mesma convicção, de que lançar addicionaes as contribuições existentes não e assumpto que careca de grandes meditações, operação que demande largas indagações, e ainda menos elevados dotes de espirito. (Apoiados.)
Mas não foi só isto. Depois de lançar os addicionaes, o nobre ministro fez converter em lei projectos taes, como os relativos aos cereaes (aguas ardentes) e o relativo ao sal.
No tempo, em que eu acreditava nas finanças e nos financeiros, as leis deviam ser sabias e justas, e por isso duradouras. Tinha de mim para mini, que os discursos podem ser um improvise, mas as leis careciam de serio estudo antes de só fazerem. Os tempos agora são differentes. O meu espirito soffreu novas desillusões. A leis sabias e justas devem ser taes, que tenham de emendar-se, ou aperfeiçoar-se logo na sessão seguinte! (Apoiados.)
D'aqui concluo tambem que, para lançar addicionaes e fazer leis numa sessão para noutra serem emendadas, não e necessario ser financeiro, nem possuir grandes conhecimentos sobre finanças. (Apoiados.)
E n'isto cifrou o sr. presidente do conselho as medidas redemptoras sobre assumptos financeiros; s. exa. que tudo pode e tudo sabe!
Veiu depois o actual sr. ministro da fazenda: e sendo a primeira vez que me dirijo a s. exa., não quero faltar aos devidos cumprimentos. Tem s. exa. por si o que posso chamar a tyrannia da opinião, porque eu chamo tyrannicas as opiniões unanimes. Ora, o sr. ministro da fazenda, pelo que respeita a pujança da sua intelligencia, a inexcedivel competencia financeira, esmerada cultura do seu espirito, tem por si a opinião unanime.
O sr. ministro da fazenda assumindo, pois, a responsabilidade de acceitar a pasta da fazenda, collocou sobre os seus hombros a pesada cruz da nossa salvação financeira. O terceiro Salvador desde 1881! E como se tem desempenhado d'esta penosa tarefa? Sabemol-o todos.
Dedicou-se a ingrata missão de reformar as proprias reformas, isto e, quasi se limitou a propor as reformas e emendas das leis votadas na anterior sessão legislativa; e nesta sessão já conseguiu infelizmente uma lei, que o auctorisa a remodelar os serviços aduaneiros, que outro seu antecessor havia reformado! Além do exposto, apresentou o relatorio, primorosamente escripto, com cinco ou seis propostas de lei, uma das quaes só augmenta receita publica. A synthese das medidas salvadoras no largo periodo desde 1881, e que tenho referido, attendendo a que são da iniciativa de ministros de tanto saber e illustração, forta-

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SESSÃO DE 5 DE MAIO DE 1885 1443

Lecem-me na crença, de que nada ha mais facil n'este paiz, do que ser financeiro, ou, o que vale o mesmo, estadista salvador de finanças, (Apoiados.- Riso.)
O exame retrospectivo da gerencia financeira d'esta situação despertou-me a lembrança de um notavel discurso, cuja leitura fiz em 1868, proferido (parece-me em 1867) pelo sr. Mendes Leal, onde aquelle illustre estadista querendo desculpar-se de tratar de assumptos economicos e financeiros, o que alias fez com distincta proficiencia, dizia que a difficil sciencia de gerir a fazenda publica, sendo uma sciencia de cifras, não era do sem especial agrado, e que para isso talvez houvessem concorrido certas predilecções archaistas, porque em linguagem portugueza vernacula cifra e igual a zero. Eu, attento o exame já feito, amplio a idéa do sr. Mendes Leal, parecendo-me em verdade que a sciencia financeira pouco mais e do que zero.
Parece-me, portanto, que não e cousa muito difficil, principalmente n'este paiz, e a julgar pelo occorrido desde 1881, ser financeiro ou ter o encargo de gerir a pasta da fazenda.
Houve tempo, tempos muito remotos, porque nos temos um notavel senso pratico para nos governar, em que, tratando-se do uma organisação ministerial qualquer, e havendo algum pretendente de somenos importancia, dizia-se logo: pode ir para a pasta da marinha. (Riso.)
Observe que o sr. ministro da marinha se alterou, ao ouvir as minhas palavras, mas não se altere ou sobresalte, porque de nenhum modo quero referir-me a s. exa. ou a qualquer outra pessoa designadamente; declare ate, para afastar susceptibilidades, que me refiro a tempos muito remotos; mas faço a historia da politica portugueza, como ella é, porque isso entra na ordem dos meus argumentos.
Eu sempre entendi que o ministerio da marinha era o mais importante de todos os ministerios: que a pasta da marinha era de todas as pastas a mais difficil de administrar, porque resume todos os ministerios; mas que estuda as antigas organisações ministeriaes chega a conclusão do que o gente pratico governativo entre nos e outro.
Bem sei que agora se falla muito na resolução dos problemas coloniaes, como ligadas a elles a nossa futura prosperidade e independencia de nação, e, portanto, só homens notaveis podem sobraçar a pasta da marinha.
Em compensação, e visto que o exame d'estes cinco ultimos annos me auctorisa a crer que nada ha mais facil do que gerir a pasta da fazenda, eu posso dizer, sem escrupulo, que qualquer mediocridade, com pretensões a ministro, esta logo indicada para o ministerio da fazenda. (Riso. - Apoiados.)
Esta ordem de considerações, que são o exame retrospectivo da administração financeira da situação, serve tambem para me justificar se pretendo discutir assumptos financeiros.

ada ha mais facil, attentos os factos narrados, do que o estudo e critica da sciencia financeira, e das medidas dos estadistas financeiros em Portugal; parece estudo e critica do dominio das mediocridades parlamentares.
Faço assim a minha apresentação, e procurei justifical-a com solidas rasões. (Riso.)
A primeira cousa, que me surprehendeu, na leitura do orçamento rectificado, e a falta de documentos indispensaveis para apreciar um documento desta importancia. (Apoiados.)
Lembro-me de ler em um publicista de grande merito, que uma das causas mais poderosas da decadencia do parlamentarismo em toda a parte era porque as assembléas legislativas faltavam a principal missão, que consiste no exame severe e implacavel da gerencia administrativa, economica e financeira do poder executivo. (Apoiados.)
Eu digo a v. exa., sem preocupação, que me não assustaria muito, se, modificando-se o actual systema, se desse a outra entidade a faculdade de fazer as leis. Não quero com isto significar que as cortes não sejam muito auctorisadas para fazer leis sabias e justas, como aqui juramos de as fazer, mas creio que não faltaria quem as substituisse, de modo que na pratica os resultados não seriam inferiores aos actualmente obtidos.
O que não pode substituir-se, sem que a liberdade desappareça, sem que o poder executivo seja contido dentro das suas attribuições, e o exame e a fiscalisação de todas as despezas publicas, e isto por uma rasão capital, porque não ha despeza publica que não seja, na essencia, uma questão de imposto. (Apoiados.)

importava-me pouco, ou nada, que o actual governo, ou os governos futures, assumissem a dictadura, comtanto que isso não trouxesse angmento de despeza.
Se os eleitos do povo cumprissem o sen dever, e declarassem aos governos: façam as dictaduras que lhes aprouver, mas não esperem que se consinta no augmento da despeza publica um seitil que seja, fiquem v. exa. e a camara seguros, de que as dictaduras acabavam. (Apoiados.)
Não teriamos a lamentar a constante violação da lei, porque a verdade e que os governos, em regra geral, não atropellam as leis, senão para augmentar as despezas publicas. (Apoiados.)
Concluo, pois, que o dever do parlamento não e só fazer leis, mas principalmente fiscalisar e superintender os actos do poder executivo, e fiscalisar com o maximo rigor. (Apoiados.)
Agora permitta-me v. exa. que confesse a minha estranheza.
Designar para hoje a discussão do orçamento rectificado, onde ha enormes despezas extraordinarias, e recusar a remessa de documentos, julgados indispensaveis, e ha muito tempo pedidos, e um facto em verdade inqualificavel. (Apoiados.)
O sr. ministro do reino, com a competencia que todos lhe reconhecem, disse ha poucos dias que não queria saber de accusações que fossem feitas sem documentos nem provas, e que os bons principios eram que quem accusa e que tem obrigação de provar. Isto e um aphorismo em direito, que se não discute, e que não admitte replicas.
Mas eu sou aqui juiz do s. exa. e do governo, e para o julgar e accusar careço de documentos que não me podem, nem ao parlamento, ser negados. (Apoiados.)
Pois eu digo ao governo, e digo-o com muita antecipação, que careço de documentos para exame do orçamento rectificado, e o governo sonega-os ?
A dignidade do governo, se isso não fosse o cumprimento do proprio dever, exigia que a remessa dos documentos fosse prompta e sem demora. (Apoiados.)
Pedem-se os documentos, designa-se dia para se discutir o orçamento rectificado, e os documentos ficaram nas secretarias de estado!
Não se acredita facilmente.
Para não chamar burla odiosa, direi que isto e o mesmo que os ministro s virem ao parlamento pedir um voto de confiança politica. (Apoiados.)
Ora, se isto e questão de confiança politica, se não e um exame rigoroso, como eu entendo que deve ser, (Apoiados) a opposição não tem aqui que fazer. A opposição não da votos de confiança politica; examina, discute, e accusa, se tanto for necessario. (Apoiados.)
Isto e o posso, quero e mando dos outros tempos. (Apoiados repetidos.)
Repito, a falta da remessa dos documentos, quando de mais a mais houve a prevenção de se dizer deste lado da camara, que a falta destes documentos podia dar logar a suspeitas...
O sr. Presidente : - Estão sobre a mesa os documentos relativos aos ministerios das obras publicas, marinha e guerra, e espera-se que os do ministerio do reino tambem sejam enviados hoje.

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1444 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Orador:- -Mais uma rasão para justificar o adiamento. (Apoiados.)
Eu não podia adivinhar que esses documentos estavam na mesa; mas, desde que v. exa. agora declara que elles estão na mesa, o meu adiamento está plenamente justificado. (Apoiados.)
V. exa. não levara a mal que eu interrompa as minhas considerações para examinar os documentos, se o governo e a camara consentem em suspender a sessão.
(Apartes) Vozes: - Venham os documentos.
O Orador: - Se v. exas. dão a sessão por interrompida e adiada, calo-me.
O sr. Presidente:- O sr. deputado escusa de se interromper. Eu apenas disse que estavam na mesa os documentos.
O Orador:-Alem dos documentos, ha outras faltas. Eu n'uma das ultimas sessões pedi ao governo que publicasse, quanto antes, o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, porque nós não estamos aqui para levantar questões bysantinas; não estamos assistindo a uma discussão academica, em que cada um revela maior ou menor sagacidade na arguição e na replica. (Apoiados.)
Estamos aqui para discutir a questão financeira; e para averiguar o modo, por que o governo despende e administra os dinheiros publicos em frente dos respectivos documentos.
A questão de fazenda, como v. exa. sabe, não e um facto isolado que possa apreciar-se sem comparar os antecedentes com os consequentes.
Logo, digo eu, a publicação do relatorio dos actos do ministerio da fazenda não era um dever de simples cortezia parlamentar, era um acto necessario e digno, que s. exa. praticava.
Por conseguinte lançar na téla do debate o orçamento rectificado, e ao mesmo tempo negar os meios de o apreciar, e um facto extraordinario (Apoiados.) e que nos faz lembrar que estejamos assistindo as exequias parlamentares (Apoiados.)
É tanto mais grave isto, quanto e certo que o orçamento rectificado e uma resposta eloquentissima, ou tristemente eloquente, que o sr. ministro da fazenda deu ao relatorio que precede as propostas de fazenda. (Apoiados.)
E depois expandimo-nos em manifestações de ruidoso patriotismo. Pois lá fora, em Anvers, por exemplo, mostra-se que se conhece e aquilata com alguma exactidão a nossa situação financeira...
(Interrupção que não se ouviu.)
Com alguma exactidão, e eu hei de demonstral-o, salvo as intenções perfidas, que abomino.
Ora, sr. presidente, quando este orçamento rectificado demonstra o estado melindroso, mais do que isso, ruinoso, proximo do abysmo, da nossa situação financeira, o governo compraz-se em dizer: "vote a camara sem discutir", porque o mesmo e negar documentos que nunca se negaram ao parlamento. (Apoiados.)
É n'esta situação, que o sr. ministro da fazenda, no relatorio que precede as propostas de que fallei já, queixa-se, amargura-se, argue de falta de patriotismo todas as palavras, todos os factos, que possam revelar o estado critico da nossa situação financeira, prejudicando assim o nosso credito dentro e fora do paiz.
Eu não sabia, mas fico sabendo, que os estrangeiros nada conhecem a este respeito, se a opposição se calar, e os descridos não levantarem alguns queixumes. Receia-se que as nossas apreciações passem as fronteiras!...
Houve tempo, em que se discutiu entre nos qual das escolas devia preferir-se, applicada a litturatera e especialmente á historia. A escola da dissimulação, e a escola da franqueza e da verdade. Não faltavam partidarios de um also patriotismo, que defendiam as nossas lendas, como factos averiguados, com verdadeira superstição.
Ninguem ignora, que A. Herculano pertencia a escola opposta, e dizia que a verdade se devia a todos e a tudo, e que era precise dizel-a ate por patriotismo, porque alias os estrangeiros nol-a diriam com mais rude e cruel franqueza.
Faço applicação d'estes principios a questão financeira e a situação economica do paiz.
Não nos illudamos. Se occultarmos a verdade, dil-a-hão os estrangeiros com mais rude franqueza, porque elles nos estudam, e conhecem perfeitamente as nossas circumstancias.
Dizer, pois, a verdade, como ella é, e como eu a sinto, não e faltar aos deveres, que o patriotismo impõe, e tenho por mim valiosas auctoridades.
Bastar-me íam apenas os dictames da minha consciencia.
O sr. R. Moraes Soares, que não tem estatuas, mas que deixou obras que são verdadeiros monumentos, que o tornarão contemporaneo de todas as epochas (e é isso que distingue os homens notaveis), lembrou-se de escrever sobre a critica situação economica e financeira do paiz em 1867, e sabe v. exa. o que elle disse? Disse o seguinte :
"No estado, a que nos chegamos, occultar a verdade ao paiz e uma estulticia ou uma traição."
O sr. Moraes Soares disse verdades, que hoje podemos e devemos recordar; já o podemos chamar propheta. Como quem sabia o paiz a quem se dirigia, intitulou aquella brochura, o folheto, Palavras ao vento. É caracteristico; e todavia, contendo aquelle folheto pouco mais de 90 paginas, declara elle que são o producto de doze annos de estudo e reflexão sobre aquelle assumpto.
Precise invocar auctoridades, que possa antepor a auctoridade do sr. ministro, visto que a minha, por pouco auctorisada, não o pede convencer.
Não ignora o nobre ministro, porque e muito lido n'estas materias, que foi um acontecimento notavel em França a memoria lida por mr. Fould em sessão do conselho privado e no conselho de ministros em 12 de novembro de 1861.
A publicação d'esta memoria no Moniteur, acompanhada de uma carta do superior, deram ao facto importancia extraordinaria.
"O estado do credito, diz Fould, deve tanto mais chamar a attenção do imperador, quanto e certo que a situação das finanças preoccupa todos os espiritos ... O corpo legislativo e o senado têem já exprimido a sua inquitação sobre este assumpto.
"Este sentimento penetrou na classe dos homens de negocios, que todos presagiam e annunciam uma crise tanto mais grave, quanto e certo que, imitando o estado, e com o fim de melhoramentos e progressos talvez demasiado precipitados, os departamentos, as cidades e as companhias particulares se têem lançado em despezas muito consideraveis."
Diz ainda Fould "seria manter perigosas illusões o contar indefinidamente sobre o desenvolvimento do credito nacional."
Citarei ainda outras palavras d'aquelle notabilissimo documento, que são as seguintes: "o verdadeiro perigo para as nossas finanças esta na liberdade que o governo tem de decretar despezas sem a contraprova do poder legislativo.) Não cito outros trechos da memoria de Fould, e direi só que um publicista celebre diz, que ella se recommenda sobretudo pela verdade e cruel franqueza, e acrescenta, que aprouvera a Deus, que só fosse ministro aquelle individuo que tivesse a coragem de dizer a verdade ao paiz.
É assim que respondo aos sustos e as criticas do sr. ministro da fazenda.
Mr. Fould disse verdades em 1861, que podemos e devemos recordar nos em 1885.
Ora, dizia eu, se os ministros despendem como querem, e alargam os quadros das despezas como lhes apraz, sem tom nem som, chegâmos á conclusão que e inutil o parla-

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mento, pela rasão jádada; porque é impossivel a contra prova.
De que serve o poder legislativo, se elle não está habilitado a fiscalisar. (Apoiados.)
Entrando n'outra ordem de considerações, direi que pode o governo recorrer a todos os artifícios, responder o que lhe aprouver, que não consegue illudir a realidade dos factos, e que o publico não a conhece tal qual ella é, pavorosa e triste. (Apoiados.)
Comparando o orçamento retificado com o orçamento do anno económico de 1884-1885, nota-se logo um grande desequilibrio, e um excesso de despeza enorme.
Esse desequilíbrio e excesso de despeza é de tal ordem que me parece dever assustar ainda os que forem mais robustos na sua fé.
O que é certo é que com este desequilibrio entre a receita e a despeza parece-me que, sem ser financeiro, porque já disse que não o sou, não é possivel chegar ao equilibrio entre a receita e a despeza, senão por um dos quatro meios seguintes: a bancarota (que nenhum homem de bem póde defender), o augmento do imposto, a reducção das despezas, o recurso ao credito.
(Interrupção.)
Não se assuste v. exa. porque primeiro do que eu, disse isto Rodrigo Moraes Soares, que me parece pessoa competente n'este assumpto.
Mas dizia eu que para chegarmos á conclusão, ao equilibrio da receita com a despeza, não ha senão a bancarota, torno a repetir, e os outros meios já indicados.
Note a camara que indicar os meios, que são apontados como proprios para igualar a receita com a despeza, não é defender este ou aquelle.
Ha de, pois, recorrer-se ao augmento do imposto, ao credito ou á reducção nas despezas publicas. Não conheço qualquer outro meio, alem d'estes, ou a combinação d'elles n'uma proporção maior ou menor.
O que é certo, e foi aqui demonstrado pelo sr. Mariano de Carvalho, intelligencia robustíssima, á qual todos fazem justiça, (Apoiados.) e que o recurso do credito nos ultimos annos indica um perigo imminente, porque não poderemos tão depressa mudar de caminho. E, todavia, os homens pensadores não se cansam de proclamar que pouco falta, se alguma cousa ainda falta, para ser desesperada a nossa situação financeira.
Desde 1878 até 1885 o recurso permanente ao credito é, termo medio, de 8.000:000$000 a 10.000:000$000 réis por anno. O governo, no orçamento rectificado, confessa que o deficit é de 8.443:000$000 réis, e o sr. Mariano de Carvalho demonstra que elle ha de subir a perto de réis 10.000:000$000! É esta a triste eloquencia dos factos; é a verdade historica, contra a qual não valem argucias, nem affirmações phantasticas.
E note v. exa. que não recorro a epochas anteriores a 1878, para não importunar a camara, e porque estou propriamente justificando o adiamento do projecto até serem presentes todos os documentos necessarios para o exame d'elle.
Tendo nós, por consequencia, um desequilibrio que accusa um deficit permanente de 8.000:000$000 réis a 10.000:000$000 réis, pergunto: Qual é o meio de preencher esse deficit? O augmento de imposto? A diminuição da despeza? Ou o recurso ao credito?
Examinadas as propostas do governo, vemos que elle não conta com o augmento do imposto em larga escala, por isso mesmo que ha apenas uma proposta em que se augmenta a receita publica por via do imposto.
Não vemos que elle adopte o systema de diminuição das despezas publicas, porque pouco mais se tem feito do que converter em lei projectos que augmentam essas despezas, e é esse o seu sestro. (Apoiados.}
Parece, pois, que posso tirar logicamente a conclusão de que o governo para saldar o deficit não tem senão o recurso ao credito. E que ogoverno não póde recorrer ao imposto em larga escala prova se facilmente.
O paiz não lh'o consentiria, porque a meteria collectavel está esgotada.
Compulsando a historia, desde 1851, chegamos á conclusão de que o tributo directo triplicou, o sêllo e o registo sextuplicaram, os imposto indirectos subiram a mais do dobro.
No quadro das receitas, são estas as principaes addições.
Ora este augmento das receitas não é o natural desenvolvimento da riqueza publica, mas principalmente o resultado do aggravamento nas taxas tributarias. De maneira que este augmento successivo não é symptoma de riqueza publica, é antes signal de verdadeira miseria publica. (Apoiados.)
O governo apavora-se, não tem a coragem de recorrer ao imposto para fazer desapparecer o desequilibrio existente entre a receita e a despeza; e como não tem a coragem de diminuir as despezas, porque a sua indole o impelle em sentido contrario, a consequencia fatal é que elle só tem a lançar-se no uso immoderado do credito, o que chamarei a libertinagem do credito.
Eu, pergunto, pois, se na opinião de toda a gente sensata este recurso constante, permanente, ao credito para satisfação de despezas, que são permanentes, que são de todos os dias, é uma norma de preceder que offereça confiança, que não de logar a gravissimas preoccupações, que não faça antever perigos serios n'um futuro maio ou menos proximo? (Apoiados.)
E vou responder já a algumas considerações que se podem fazer em desfavor meu, suppondo-se que tenho o proposito de carregar as cores do quadro.
Vou demonstrar, sem esforço, que as preoccupações em relação ao nosso futuro já assaltaram toda a gente, que os lyrismos do parlamento já não encontram echo fóra d'esta casa. (Apoiados.)
Quer v. exa. que eu demonstre isto de uma maneira muito facil?
Os juros da divida fundada a cargo da junta do credito publico e os que se pagam pelas obrigações do thesouro sommam, pelo menos, 15.000:000$000 réis.
Creio que ninguem duvidará d'esta somma.
A receita, segundo estava orçada, é de 31.000:000$000 réis, cifra redonda, pouco mais.
Logo, temos quasi metade da receita para pagamento de juros.
Se de 31.000:000$000 réis abatermos 15.000:000$000 réis, ficam 16.000:000$000 réis.
Pergunto eu: com 16.000:000$000 réis poderemos satisfazer a todas as despezas obrigatorias, a todos os serviços do estado, e ás chamadas dividas mansas, ou não teremos de recorrer a qualquer dos meios já indicados, d'onde nos ha de vir, mais proximo ou mais remotamente, a ruina? (Apoiados.)
Quer v. exa. saber o que acontece?
Segundo os dados officiaes, nós temos proximamente 3:000 instituições (misericordias, asylos, creches, etc.) que foram compellidas pela lei a trocarem os seus bens de raiz e outros, no valor de 11.300:000$000 réis effectivos, por fundos publicos no valor nominal de 23.093:000$000 réis.
Pois eu affianço a v. exa. que são 3:000 propagandistas contra o actual estado de cousas, (Apoiados.) ou pelo menos tres mil individuos ou corporações em receios, em sobresaltos, por este recurso constante e inconsciente ao credito. (Apoiados.)
Isto não é uma affirmação platonica; não é a minha paixão partidaria que me suggere esta afirmativa, cuja gravidade reconheço.
E como conheço o costume da terra, phrase que já tem foros de cortezania; parlamentar, eu trouxe os documen-

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tos comprovativos da minha asserção, que a muitos poderia parecer exagerada, ou demasiado terrorista. Começo por fazer a leitura do relatorio e contas da associação dos empregados no commercio e industria, relativo ao anno de 1883, no qual a pag. 2 se diz o seguinte:
"0 deficit tem sido saldado com os juros do nosso fundo consolidado; porem, achando-se este empregado todo em fundos publicos, não podo a direcção, sem faltar aos deveres que lhe impõe a sua consciencia, deixar de notar a vossa imprevidencia. Os encargos do estado augmentam todos os annos, e por consequencia o receio começa a preoccupar muita gente ... No dia em que o thesouro suspender o pagamento dos juros da divida publica, o que não será para admirar, teremos a associação em bancarota."
E que prova isto ?
Demonstra que esta associação, aliás respeitabilissima, começa a preoccupar-se com o futuro dos seus haveres, dos seus capitaes. (Apoiados.)
E isto é mais grave, e mais importanto, do que esses folhetos,- que ruins intentos podem fazer publicar no estrangeiro, e aos quaes já fiz referencia.
Talvez me julguem demagogo, ou pregoeiro officioso do nosso descredito, e por isso vou tratar de por-me a coberto com auctoridade insuspeita a esse lado da camara.
No relatorio da mesma associação, relativo ao anno de 1884, vejo eu que ali se insistiu na mesma idéa, reiterou os mesmos propositos, e alimentou os mesmos receios, porque enviou a esta camara uma representação, pedindo que fosse revogada a lei de 7 do abril do 1864, a fim de poder adquirir propriedades para garantia dos seus capitaes. E sabe a camara quem foi o apresentante d'essa representação? Dil-o o relatorio de 1884 a pag. 6. Foi o sr. José Gregorio da Rosa Araujo.
Foi pois interprete dos sentimentos d'aquella associação o sr. Rosa Araujo, deputado n'aquella epocha e actual presidente da camara municipal de Lisboa, que não pode ser accusado de demagogo, nem de pregoeiro de mas novas, pela direita desta camara. Parece que alguns deputados mostraram, ou insinuaram polos seus gestos, que os relatorios, de que fiz em parte a leitura, são de minguada importancia.
Pois vou ler outro documento, que talvez os convença melhor.
Refiro-me ao monte pio geral, o qual no relatorio, relativo ao anno de 1883, a pag. 6, indica como vantagem incontestavel empregar alguns capitaes em titulos da divida publica de nações de credito inabalavel, como a Inglaterra e a França.
Allude, por modo muito suave, mas sufficiente para mostrar o receio, que o sobresalta, o corpo gerente a crise política de 1846, e a crise commercial de 1876.
Aqui esta o latet anguis, aqui esta o pregão de justo receio de uma associação d'esta ordem, que tem a responsabilidade enorme de velar pelo futuro de milhares de familias. Não pode ser indifferente e marcha desordenada do governo, e a consciencia brada-lhe alto, que e preciso acautelar o futuro e o presente de milhares de familias, que têem por patrimonio unico as prestações de tão notavel e bemfazeja instituição. (Apoiados,)
Não póde suspeitar-se, que os corpos gerentes de tão respeitaveis corporações fossem influenciados por suggestões partidarias. Affasto esta hypothese, porque ninguem a admitte n'este caso.
Como a camara sabe, discuto principalmente o adiamento do projecto, por falta de documentos indispensaveis; e carecia de provar, pelo conjunto dos factos, que a situação financeira é gravissima, e que por isso mesmo não podem ser sonegados a esta camara os elementos necessarios, para definir as responsabilidades do governo, para o accusar se e culpado, ou para pregoar a sua innocencia se por ventura fez justa applicação dos dinheiros publicos:
Ainda espero da dignidade do governo, que deve ser o primeiro a zelal-a, e da dignidade da camara, por isso que não faço uma affirmação partidaria, que não consintam se prosiga na discussão d'este projecto, sem que as justas reclamações d'este lado da camara sejam satisfeitas. (Apoiados.) A camara póde, e o governo tambem pode, se atenderem ao numero, não fazer caso destas reclamações ; mas então as consequencias podem ser graves, porque as imposições da forca provocam as justas resistencias. E necessario que d'aqui parta o exemplo, e que maioria e o governo sejam os primeiros a salvaguardar os brios e credito dos srs. ministros, que ninguem deseja menoscabar.
Aguardo as explicações do governo, para por ellas modelar o meu procedimento.
Por ora estou no periodo da mansidão, e tenho fallado com a possivel moderação; mas se da parte do governo continuar o silencio obstinado, e as surprezas systematicas, porque não tem outro nome a remessa de documentos (e não de todos) a ultima hora, não hei de acobardar-me no exercicio do meu direito, nem me arreceio de ser accusado de exaltado.
Se o governo nos provoca, e nos colloca n'uma situação excepcional, terei de perguntar-lhe com muita severidade, de que modo quer ser julgado. Tenho concluido.
Vozes :-Muito bem.
(O orador foi comprimentado por alguns srs. deputados.)

eu-se na mesa a seguinte

Proposta de adiamento

Proponho o adiamento do projecto de lei sob n.º 34, relativo ao orçamento rectificado, até serem enviados os documentos pedidos para justificar as despezas extraordinarias de saude, e ate se publicar o relatorio dos actos do ministerio da fazenda.
Sala das sessões, 5 de maio de 1885. = O deputado, E. José Coelho.
Foi apoiado o adiamento e ficou em discussão.

O sr. Lencastre (por parte da commissão de legislação civil): - Mando para a mesa dois pareceres da mesma commissão e peço a v. exa. que tenha a bondade de lhe dar o devido destino.
O sr. Carrilho (relator): - Não posso acceitar a proposta do adiamento mandada para a mesa pelo illustre deputado Eduardo Coelho, porque me parece que ella não tem o mais pequeno fundamento.
Se me fosse licito invocar precedentes, diria a s. exa. que na sessão de 24 de abril de 1880 discutia-se o orçamento geral do estado para o anno de 1880-1881. A essa data não estava distribuido o relatorio dos actos do ministerio da fazenda e o sr. ministro da fazenda dessa epocha, que era o sr. Barros Gomes, declarava que os srs. deputados não tinham necessidade desse documento para proceder ao exame do projecto que estava em discussão...
(Interrupção violenta do sr. Emygdio Navarro, que não se ouviu.)
Uma troca de phrases entre alguns srs. deputados da opposição e o sr. relator do projecto deu logar a que a sessão se tornasse tumultuosa.
O sr. presidente, tendo tocado tres vezes a campainha e não podendo restabelecer a ordem, declarou interrompidos os trabalhos.
Eram quatro horas da tarde.
Ás cinco horas continuou a sessão.
O sr. Presidente:- Tenho a participar a camara que já estão sobro a mesa os documentos vindos do ministerio do reino, e os do ministerio da fazenda já vieram ha muito tempo.
Tem a palavra o sr. relator da commissão para continuar o seu discurso.
O sr. Carrilho: -Continuando o seu discurso, disse que, conforms ja declardra, não podia por parte da commissão

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de fazenda acceitar o adiamento proposto pelo sr. E. J. Coelho, por lhe parecer que não havia rasão para o projecto ser adiado. Nem a falta do relatorio sobre os actos do ministerio da fazenda, nem mesmo que se desse a falta dos documentos relativos á saude publica, isso era rasão para que a camara não tomasse conhecimento do projecto.
Como tambem já tivera occasião de dizer, em sessão de 24 de abril de 1880 discutia se na camara o orçamento de 1880-1881, e o relatorio sobre os actos do ministerio da fazenda não havia ainda sido distribuido. Mas não era preciso invocar precedentes.
Se o relatorio de 1884 ainda não foi distribuido,era certo que todos os documentos, a que elle se tinha de referir, foram distribuidos á camara em janeiro, e as contas haviam tambem já sido apresentadas.
As contas estavam dadas, e dadas de fórma como ainda o não haviam sido.
Quanto ás contas da applicação dos fundos destinados ás despezas de saude, maravilhava-o uma tal exigencia, e maravilhava-o tanto mais, quando tal exigencia daria em resultado nunca mais se discutir o orçamento do estado. Era preciso ver que essas despezas ainda se estavam realisando.
Na mesa estava a nota das despezas e os documentos haviam de em tempo opportuno subir ás repartições de contabilidadepara serem depois enviados ao tribunal de contas.
Parecia-lhe, pois, que a camara estava sufficientemente habilitada para poder fazer juizo seguro do estado da fazenda publica com os documentos que foram apresentados pelo governo.
(O discurso do sr. deputado será publicado na integra quando devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Consiglieri Pedroso:- Sr Presidente, cabe-me a palavra no momento em que acaba de dar-se na camara um incidente sobre o qual, eu, mais do que nenhum dos meus collegas n'esta casa, estou no caso de emittir um juizo imparcial e independente.
Com effeito a nossa limitada representação parlamentar, e ao mesmo tempo as circumstancias especiaes do nosso partido na politica militante do paiz, permittem que as minhas palavras não possam ser desvirtuadas attribuindo-se-lhes outras intenções ou outros moveis que não sejam o sincero desejo de pugnar pelo mais stricto respeito aos direitos que devem Ter as opposições n'esta camara.
Creio que todos os que me escutam, amigos, indifferentes ou adversarios, me farão a justiça de acreditar que se fallo n'este incidente é unica e exclusivamente porque, como representante de uma fracção da opposição parlamentar, entendo que me é imposto o dever de pleitear por todas as regalias, ou melhor por todas as garantias, que as maiorias nunca devem pretender roubar ás opposições que lhes são inferiores em numero, e que por isso necessitam de uma seria defeza contra todas as imposições feitas em nome da força numerica, que elevada a criterio para resolver todas as contendas degeneraria em tyrannia incomportavel!
Se o meu partido, sr. presidente, encarasse todas as questões que se debatem n'esta casa apenas atravez do prisma dos seus interesses particulares, não teria eu senão que felecitar por se darem como aquella a que há pouco todos nós assistimos. Muitas scenas d'estas, srs. deputados, e creiam s. exas. que terão contribuido em grande parte para a propaganda que nós andamos fazendo no paiz!
Mas não, sr. presidente! Mais de uma vez tenho dito e repetido n'esta casa, não para fazer effeito, mas porque é a expressão sincera dos meus sentimentos, que acima de todas as questões partidarias eu colloco os altos interesses da minha patria; e por isso attentando n'elles entristeço-me e entristeço-me profundamente por ver que o parlamento portuguez está dando á nação espectaculos como aquelle que há pouco teve jugar...
O sr. Costa Pinto:- Tambem em França se constam muitos d'esses incidentes...
O Orador: - Bem sei! no tempo do Napoleão III eram muito vulgares...
O sr. Costa Pinto:- Mesmo agora no tempo da republica!
O Orador: - Bem sei tambem! por tal signal provocados pelo monarchista Baudry d'Asson e pelo imperialista Paulo de Cassagnac!...
Diz-se e repete-se a toda a hora que o parlamentarismo está decadente entre nós. Está, sr. presidente, mas quem contribue sobretudo para que a vitalidade d'esta instituição dia a dia se vá amortecendo, e vá perdendo a consideração que lhe é devida, como do mais alto poder do estado, nas sociedades contemporaneas, são evidentes os que deviam Ter o cargo de velar pela sua honra impoluta.
Mas ponhamos a questão no seu verdadeiro campo. De que se trata, com effeito, n'este momento? Sobre que recáe a questão previa apresentada pelo sr. Eduardo Coelho? Sobre um adiamento da discussão do orçamento rectificado, emquanto não forem presentes á camara os documentos que pela opposição parlamentar tinham sido julgados indispensaveis para poder, com conhecimento de causa, entrar n'este debate.
Os documentos a que se refere o sr. Eduardo Coelho não foram pedidos por mim, portanto não se póde dizer que estou pleiteando em causa propria.
Eu tambem pedi alguns documentos, é verdade, que reputo indispensaveis para esta discussão, mas não são d'esses que se trata agora.
se porventura esses documentos que se pediram são ou não indispensaveis para a apreciação do orçamento rectificado; mas o facto é que taes documentos foram exigidos pela opposição parlamentar, declarando ella que lhe eram necessarios para poder discutir; ora desde o momento cm que se fez um tal pedido, ninguem tem direito, e muito menos, a maioria e o relator da commissão, para dizer que esses documentos não são necessarios. Não são necessarios?! Não o serão para o sr. relator, mas desde que um deputado declara que lhe são precisos para se illucidar, ainda mesmo que realmente o não fossem, a obrigação do governo era apresental-os. Eis aqui a correcta doutrina parlamentar.
N'esta questão dá-se um facto verdadeiramente unico e que só se encontra em Portugal.
(Interrupção )
É um facto extraordinario, repito, mas infelizmente muito vulgar na historia do parlamento portuguez, esta pertinacia constante do governo e das commissões em não facultarem aos deputados da opposição os documentos que elles pedem.
Eu sei que muitas vezes se torna trabalhoso para as secretarias de estado a satisfação de todos os requerimentos que lhes são enviados, mas as secretarias de estado servem exactamente para ministrar aos representantes da nação os documentos de que elles carecem.
Se os srs. ministros entendem que nas suas secretarias não têem pessoal bastante ou bastante habilitado para que os documentos requeridos possam vir a esta camara com a presteza necessaria, tenham a coragem de vir fazer essa confissão ao parlamento, que elle tomará as indispensaveis providencias.
Mas o que não póde ser, é estarem os deputados quasi por favor todos os dias a requisitarem contas sem que o governo tome em consideração taes pedidos!
Qualquer dos srs. deputados presentes pôde consultar os annaes dos parlamentos estrangeiros, e ha de ver que n'esses parlamentos os deputados têem todas as informações e documentos necessarios para estudarem as questões que são submettidas ao seu exame. Podem consultar-se na bi-

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bliotheca das côrtes os annaes das camaras francezes, hespanhoes, italianos, austriacos e dos Estados Unidos da America, e ver-se-ha como a proposito de questões que muitas vezes não prendem tão directamente com a riqueza publica, como e a discussão do um orçamento, os governos respectivos d'esses paizes apresentam documentos illucidativos de toda a ordem para que as camaras possam votar conscienciosamente! Aqui, entre nós, precede se de modo totalmente
diverso !
A recusa constanto do quaesquer documentos, o espanto que se manifesta na maioria lego que se pede um esclarecimento, por muito simples que seja, sabe v. exa. o que revelam ?
Revellam, entre outros factos, a falta de habito de estudar, e mostra que nem sequer se comprehende a necessidade impreterivel que têem alguns deputados da opposições de estudarem com seriedade os negocios, sobre que têem de dar o seu voto!
E será porventura a falta de tempo, ou uma inadiavel urgencia, que pedem que se vote este projecto sem estarem presentes os documentos?
Mas, sr. presidente, nos que temos passado dias e dias, semanas e semanas, mezes e mezes, em discussões bysantinas, não podemos agora esperar dois ou tres dias ate que venham os esclarecimentos que se pediram?!
Uma voz: - Que se pediram ha tres mezes.
O Orador: - E tem o illustre deputado rasão, que se pediram ha tres mezes.
E não basta, sr. presidente, serem esses esclarecimentos apresentados com dez minutos de antecedencia.. . Risum teneatis.
Quando ha pouco, durante a interrupção da sessão, se mo disse que estavam alguns dos documentos pedidos, sobre a mesa, e que eu os poderia ir examinar, recusei--me terminantemente a fazel o, porque não estou acostumado a preparar-me em dez minutos para entrar numa discussão em que, factos da mais alta importancia, têem de ser apreciados com todo o descernimento!
É possivel que os illustres membros da maioria possam proceder com tanta rapidez ao estudo das questões que aqui se tratam; eu, porem, que não sou dotado do faculdades tão excepcionaes, precise de algum tempo para estudar.
É a triste condição de quasi toda a nossa pobre huamanidade... excepto da maioria, já se vê; e isso ao menos consola-me.
Portanto, a questão e muito simples.
Pedem-se documentos, e não e um membro da maioria, nem o sr. ministro, nem o sr. relator, que podem dizer se os documentos são ou não necessarios.
Não serão necessarios ao sr. relator nem ao sr. ministro, faço-lhes a justiça de acreditar que são sinceros quando o affirmam, mas são necessarios para alguns dos membros que estão aqui presentes e tanto basta. Alem d'isso os documentos, de que se trata, foram instantemente pedidos, foram officialmente promettidos e ninguem tem direito de os negar. (Apoiados.)
Disse o sr. Carrilho, que parte d'esses documentos não podiam vir a camara, porque se referiam a despezas que continuarão ainda por um certo espaço de tempo e que, como tal, ainda não estão encerradas.
Ora, todos sabem que no orçamento rectificado ha principalmente uma verba que tem despertado a attenção; e a verba que se refere as despezas feitas com os serviços extraordinarios de saude publica.
Eu não sei, e ao illustre relator da commissão esqueceu dizer-nos, ate quando é que estas despezas para nos preservar do cholera continuarão a fazer-se. Quousque tandem?! Demais, persistindo o estado de receio constante em que a Europa esta com relação a epidemia do morbo asiatico, creio que pelas rasões dadas nunca o parlamento portuguez poderá ver esses documentos, porque sempre haverá alguma cousa mais que gastar!
Alem d'isto o argumento do sr. Carrilho, admittindo que possa ser acceito, servirá para os documentos que não estão na mesa; mas não serve para os que acabam de ser patentes em nota, porque esses referem-se a contas que já estão ultimadas, por isso que ali estão. (Apoiados.)
Ora as notas d'esses documentos, e não os proprios documentos, entenda se, acabam de chegar a mesa ; pediu-se o adiamento da discussão d'este projecto ate que esses documentos fossem conhecidos por todos que queiram entrar n'esta discussão, por consequencia não ha rasões que contrariem reclaação tão legitima! E tanto assim foi que pendo a sessão interrompida, e mandando o regimento que ella se reabrisse meia hora depois, eu não sei, talvez fosse defeito do meu relogio, mas parece-me que essa meia hora se prolongou bastante mais...
E devo notar tambem que exactamente no momento em que a sessão se reabria acabavam de chegar do ministerio do reino, o ultimo que faltava, não os documentos, mas apenas tambem uma nota dos documentos que tinham sido requisitados. (Apoiados.)
É porque, sejamos francos, apesar do sr. relator ter declarado pomposamente que não acceitava o adiamento proposto pela opposição, um tardio remorso lhe pungiu a consciencia, e elle mesmo quiz, por uma forma indirecta, deixar aos deputados, que faziam esta exigencia, alguns minutos para consultarem os documentos. (Apoiados.)
Creio que os que me escutam farão justiça as palavras que acabo de proferir sobre o incidente que ha pouco se levantou, e comprehenderão bem as rasões da minha attitude ; portanto não tenho mais que dizer com relação á moção do sr. Eduardo Coelho senão que a approvo e que lhe dou todo o meu assentimento, não se pelos motives que acabei de expor, e que me parece devem ter calado no animo dos membros da maioria, mas porque tendo pedido tambem uns documentos que não me foram ainda enviados e que eu reputo indispensaveis, me lembra a identidade de situação o conhecido verso latino: Non ignara malis, miseris succurrere disco !
Alem d'isso será sempre este o meu procedimento e a minha norma de conducta, não deixando nunca de por o meu voto e a minha palavra ao serviço de quem quer que seja que peca documentos, a qualquer lado da camara que este deputado pertença!
Como estou com a palavra, e nestes dias não tenho podido interrogar o sr. ministro da fazenda ácerca do facto a que vou referir-me e que esta intimamente ligado com o assumpto em discussão, e visto que s. exa está presente e póde dar--me resposta, vou perguntar-lhe qual e o motivo, porque tendo eu pedido n'esta casa, ha quatro mezes, os documentos relativos ás dividas a fazenda publica, por direitos de merce de condecorações, titulos nobiliarios e outros diplomas honorificos, que não foram satisfeitas ao estado, qual e o motive, repito, porque s. exa. ainda não achou tempo de enviar a esta camara os documentos por mim ha tanto tempo reclamados ?
Ha quatro ou cinco dias, fiz esta mesma pergunta ao sr. ministro do reino, e ao menos este, diga se a verdade, se não me enviou os documentos que era o que eu mais desejava, (Riso.) em todo o caso dirigiu a camara um officio declarando, que, referindo-se esses documentos a verbas espalhadas pelo espaço de dez annos, ainda havia de levar algum tempo a preparar os elementos para a nota por mim pedida ser presente á camara.
O sr. ministro do reino, ao menos, deu esta satisfação ao parlamento e disse mais estas palavras, que devem já ter ficado archivadas nos annaes parlamentares, mas sobre as quaes vou insistir novamente, disse mais o seguinte, referindo-se a minha pergunta:
"Eu comprehendo que ha questões, que, embora sejam espinhosas é necessario acabar logo com ellas, e se esses

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são documentos, que mais tarde ou mais cedo têem de vir d camara, a minha opinão e que, quanto antes, tal questão se liquide."
Foram estas as palavras do sr. ministro do reino! Muito bem! Mas o que peço é que as palavras sejam acompanhadas das obras correspondentes! Demais, os requerimentos que foram enviados para o ministerio da fazenda são um pouco diversos, ou pelo menos um d'elles e diverso, dos que foram enviados ao ministerio do reino.
Assim, pedi ao sr. ministro do reino uma relação nominal dos devedores d fazenda publica por sellos e emolumentos não pagos; fiz tambem um pedido analogo por direitos de mercê ao ministerio da fazenda; mas ha outro requerimento, onde pedi a verba total das dividas actuaes fazenda publica, com relação a esse ramo de contribuição. Eu não me illudo; sei perfeitamente que não são as difficuldades burocraticas, que não são as difficuldades da repartições publicas, que não e o estarem as verbas, a que me retire, espalhadas por dez annos, o que tem impedido que a relação appareça.
O verdadeiro motivo e tristemente outro!
É porque se trata de um negocio vergonhosissimo de protecção official aos defraudadores da fazenda publica, os ministros da corôa recuam em trazel-o ao parlamento, por estarem nesse negocio envolvidas altas personalidades dos partidos monarchicos militantes, influentes personagens altamente collocados na politica do paiz, que não querem ver o seu nome assoalhado n'um rol de devedores a fazenda publica!
Pois bem! Serei generoso por agora!
Já o sei, e o paiz já sabe commigo, a que esphera social pertencem os afidalgados devedores d fazenda!
Não peço já n'este momento os nomes dos devedores dêem-me ao menos a conta total da divida, porque quero mostrar que não venho aqui fazer opposição a pessoas, mas unicamente pugnar por que os abuses da nossa administração financeira se corrijam.
Dêem-me a conta total, mas ate ao dia de hoje, repare o sr. ministro bem, e com as alterações especificadas que soffreu, com respeito a pagamentos em atrazo n'estes ultimos quatro mezes.
A camara comprehenderá bem o motivo d'esta exigencia.
O meu requerimento, conforme v. exa. vê, sr. presidente, não é, pois, um requerimento ad odium contra certas e determinadas personalidades; não o fiz para ter o triste prazer de assistir ás difficuldades em que se poderiam encontrar alguns cavalheiros que estão altamente collocados; mas unicamente n'elle insisto, porque tenho por principio, em materia de receitas publicas, que antes de lançarmos novos impostos devemos tratar de bem regular a cobrança dos que existem.
Eu entendo que a nossa regeneração financeira não esta nesses elixires que todos os annos os srs. ministros da fazenda apresentam come epilogo das propostas, para equilibrar a receita com a despeza, mas sim na boa e equitativa distribuição do imposto, approximando-a tanto quanto possivel d'essa perequação, que é, na sua expressão absoluta, uma utopia theorica, mas para a qual devem tender todos os esforços do economista e do financeiro.
Já vêem, pois, v. exas., que neste ponto quero ser mais generoso do que o tem sido para mim o sr. ministro da fazenda com a recusa ate hoje dos documentos que pelo seu ministerio pedi.
Note v. exa. que eu posse haver um certo numero d'esses documentos, que se referem ás dividas em questão; mas uns não têem origem official e outros não chegam até á actualidade, o que principalmente para mim e muito importante, visto eu desejar, entre outros esclarecimentos, as modificações que possam ter havido no pagamento d'essa divida nos ultimos tres ou quatro mezes.
Já vê v. exa. que e indispensavel que me sejam remettidos esses documentos pela via competente para fazer d'elles o uso que entender conveniente.
Terminando direi, que mo associo ao pedido do adiamento do sr. Eduardo José Coelho.
Concordo em que é indispensavel que esta camara examine detidamente, e não apenas em alguns minutos, os documentos pertencentes as despezas com a hygiene publica, para se saber ate que ponto, sob o pretexto da imminencia de uma calamidade publica, se zelaram ou malbarataram as importantissimas quantias postas, por um decreto dictatorial, a disposição do governo.
N'este ponto sei bem avaliar as difficuldades por que estão passando os meus collegas n'esta casa que desejam discutir o assumpto. Eu mesmo já n'uma discussão importantissima que teve aqui logar, ha pouco, me vi em identicos embaraços.
Tratava-se do emprestimo ou melhor da dadiva de réis 1.000:000$000, já está, assim classificado a casa real.

u tinha pedido uma serie de esclarecimentos que julgava indispensaveis para poder entrar com toda a exacção nesse debate. Os documentos que pedi pelo ministerio da fazenda, sou o primeiro a confessal-o, vieram todos em tempo competente, não havendo por consequencia nada que dizer a respeito da remessa d'elles ; mas quanto aos que tinha pedido pelo ministerio das obras publicas, que me eram indispensaveis, e que me podiam ter ministrado valiosos subsidies para a discussão, foram-me negados, ou antes nunca se me disse uma palavra ácerca d'elles. A discussão passou e hoje, ainda que viessem, não seria o momento opportuno para me poder d'elles aproveitar.
É porventura isso o que se chama o regimen parlamentar?
É porventura este o regimen, em que os eleitos do povo têem por missão fiscalisar todas as despezas publicas, inquirindo da sua legitimidade?
Se e este o regimen parlamentar a que todos os doutrinarios constantemente estão alludindo n'este paiz, eu não sei se me colloque ao lado d'aquelles que antes desejam a sua prompta extincção; porque mais vale um franco regimen absoluto que, com todas as usurpações, partilho tambem de todas as responsabilidades, do que este falso regimen de ficções e de apparencias a que não corresponde outra realidade senão a violencia feita ás minorias! Disse.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): -Pouco mais tenho que fazer do que responder a uma pergunta do illustre deputado, o sr. Consiglieri Pedroso.
Levantou-se um incidente ha pouco, incidente que versava precisamente sobre uma remessa de documentos que o illustre deputado, o sr. Eduardo José Coelho, desejava que se fizesse para esta camara.
S. exa. insistiu na impossibiiidade em que estava collocado de discutir o orçamento rectificado sem que esses documentos estivessem presentes ; todavia 03 instantes passaram, e por bastante tempo o illustre deputado occupou a attenção da camara, e prendeu de certo a minha com a exposição de muitos assumptos, que podiam dizer respeito a questão de fazenda, que podiam mesmo do perto tocar com o assumpto em discussão, o orçamento rectificado, mas que não versavam sobre os documentos pedidos. (Apoiados.)
Isto prova que s. exa. podia entrar na discussão do orçamento rectificado, onde tanto havia a dizer onde tantas ponderações havia a fazer, tantas opiniões havia a emittir, onde tantos juizos havia a expor e onde tantas criticas havia a submetter á consideração da camara, independentemente d'aquelles documentos, tão vasto e o assumpto de que tratamos, tão larga e a area do debate que nos occupa. (Apoiados.)
Ao illustre deputado, o sr. Consiglieri Pedroso, não perguntarei ou qual e a representação parlamentar do s. exa.
Para mim representa o paiz, e tanto me basta. (Apoiados, - Votes: -Muito bem.)

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Defensor das instituições o devo crer, desde o momento em que as instituições devemos todos n'esta camara respeito e fé. (Apoiados.)
Acreditando na lealdade do seu caracter e na sua probidade politica, não perguntarei a s. exa. de onde vem, não lhe perguntarei qual é o seu objectivo, qual e o seu fim politico.
Sei que é um representante do paiz, e como representando do paiz me cabe o dever de lhe responder.
Eu não creio que s. exa. podesse jamais regosijar-se por que no seio do parlamento portuguez, no seio da representação nacional, podessem levantar-se dissidencias que tomassem um caracter tão grave que podessem por em perigo as instituições vigentes, ou, pelo menos; offuscar o seu brilho.
S. exa., como portuguez, não podia nunca regosijar-se com essas dissidencias. (Apoiados.)
O que vimos nós?
Eu vi uma discussão apaixonada como tantas que tem havido em todos os tempos, em todas as epochas, sobre mil assumptos era que se debatem as opiniões contrarias e em que por vexes a paixão política tem tambem os seus desabafos. (Apoiados.)
Não vi nada mais do que isto. (Apoiados.)
Se eu for percorrer a historia, e se fôr, prescindindo mesmo da historia, olhar para o que se faz ao presente em muitos paizes, e ate em alguns cujas instituições seriam decerto do agrado do sr. Consiglieri Pedroso, encontraria ahi incidentes bom mais graves; (Muitos apoiados) encontraria ahi dissidencias politicas com manifestações bem mais offensivas, bem acrimoniosas; encontraria ahi diatribes. (Apoiados.)x
Encontraria ahi doestos que iam bem alto, a personagens politicos que tinham obrigação de defender as instituições do seu paiz.
Não cito factos, e sabem porque os não cito? É porque devo respeito e consideração aos parlamentos estrangeiros, e não posso neste logar referir-me a esses factos. Mas a historia esta patente, todos os elementos de apreciação nos chegam, e devem ser bastantes para convencer o illustre deputado de que em todos os parlamentos ha incidentes que obrigam a suspensão das sessões, por decoro dos debates parlamentares.
Não temos, pois, que passar um véu sobre o incidente, incidente da natureza dos que muitas vezes se têem dado, a que muitas vezes tenho assistido, e a que hei de assistir ainda, se a minha vida politica for longe.
Pelo que toca ao incidente unico que vejo discutido, direi que e tão livre aos illustres deputadas os srs. Eduardo Coelho e Ccnsiglieri Pedroso entender que precisam para a discussão de documentos que lhes não chegaram, ou que chegaram e ainda não leram, como e livre a qualquer outro deputado da maioria ou a um ministro sustentar uma opinião contraria e julgar dispensaveis esses documentos; porque o sr. Eduardo Coelho mandou para a mesa uma proposta não com caracter pessoal, mas em nome da camara, e pediu sobre ella uma deliberação collectiva.
Não e o unico juizo de s. exa. que póde ser tornado como auctoridade, e uma deliberação da camara, e para essa deliberação e necessario que a camara discuta, como a qualquer deputado é licito dizer que os documentos são dispensaveis.
Já vê, pois, o illustre deputado que qualquer de nos, e quando fallo do nos fallo da maioria, que qualquer de nós tem o direito de dizer se esta discussão pode proseguir independentemente d'aquelles documentos que lhe dizem respeito, e assentar essa opinião em circumstancias que realmente mostrem que a camara pode proseguir no debate sem a presença d'elles.
Com mais ou menos pausa o examo dos documentos ha de fazer-se, e os illustres deputados encontrar-me hão prompto a defender os actos ministeriaes e terão muito que discutir e de certo com quem discutir.
Eu ouvi o illustre deputado o sr. Consiglieri dizer que o que estava patente na mesa não eram documentos, mas apenas uma relação de despezas.
Como muito bem disse ha pouco o sr. Carrilho, o que esta em discussão não e uma conta de despeza, e o orçamento, e este orçamento refere-se pelos differentes ministerios a despezas emanadas de um decreto dictatorial já apreciado por esta camara, e a despezas propriamente sanitarias. Mas essas despezas correm ainda. Se ellas estivessem absolutamente findas, e se podesse trazer-se á camara uma conta definida e ultima ácerca d'essas despezas, perfeitamente bem; mas desde que são despezas correntes só podem trazer-se as que se liquidarem.
Ás verbas que apparecem no orçamento abrangem despezas já feitas e outras que se cstao a liquidar. É exactamente isto que lhe do um caracter de orçamento, e não um caracter de contas.
Já vê o illustre deputado que para se discutir um orçamento não se precisa desses documentos. Mas sendo precisos, para os illustres deputados se illustrarem ácerca do modo como o governo tinha applicado os dinheiros publicos no exercicio de uma missão tão elevada como era a de evitar um mal tão fonesto como o cholera, sendo precisos hão de tel-os.
E agora mo lembro de que quando os receios se davam, quando a invasão era imminente, quando os portos estrangeiros eram atacados, quando outros paizes lançavam mão de todos os meios do combate, não se perguntava ao governo em que tinha gasto, nem o que podia gastar; pelo contrario, dizia-se-lhe que levantasse bem alto o encargo que lhe estava commettido, que tratasse, por todos os modos ao seu alcance, em nome do paiz, e em honra da saude publica, de evitar que esse contagio viesse a Portugal. Então não se perguntava o que se gastava dia a dia para evitar o cholera, mas pedia-se que se tomassem todas as providencias que fossem necessarias para evitar o mal. Hoje que os receios se dissiparam, já julgam necessario o exame dos documentos. Uns estão patentes, outros estão nas secretarias.
É claro que a esta camara não podem vir os processes de todas as despezas que se têem effectuado até agora; os illustres deputados não imaginam o volume que isso dava, e o prejuizo que trazia para o andamento dos negocios das secretarias se os documentos originaes de lá saissem, e o tempo que seria necessario para que se extrahissem copias circumstanciadas.
Se vieram relações de despezas, eu em nome do governo posso dizer nos illustres o deputados, que quizerem confrontar essas relações com os documentos originaes, que abertas estão as secretarias. Façam ahi o seu exame, façam depois as sim apreciações; o governo responderá.
Pelo que toca propriamente á discussão do orçamento, essa pode proseguir sem duvida. Como este projecto tem duas discussões, uma na generalidade e outra na especialidade, podem muito bem os illustres deputados reservar para a especialidade o discutir miudamente despeza a despeza, verba a verba, aquillo que no orçamento rectificado se descreve.
Mas é só isso a discussão do orçamento rectificado? Então no orçamento rectificado os illustres deputados não têem mais que apreciar do que o que se gastou nas medidas sanitarias para evitar o cholera? Não ha a questão de fazenda, não ha todas as verbas do receita e despeza que estão rectificadas? É só contra esse ponto que assentam as suas iras e cerimonias? Discutam. A discussão na generalidade e aberta, franca o sincera da parte do governo; venha a discussão; e oxalá que venha para que não se possa dizer, nem com rasão affirmar, o que com effeito se ouviu dizer, o perdoe me o illustre deputado o sr. Consiglieri Pedroso que lh'o diga, em menoscabo do paiz, com

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respeito a uma brochura que não passa de uma diatribe.
Emquanto os illustres deputados se limitarem a essas affirmações, eu hei de oppor-me a ellas com a convicção de um homem que occupa um logar importante, como o de ministro da coroa, que se preza de ser portuguez e que acima de tudo colloca os interesses da patria. (Apoiados.)
Venha a discussão em toda a sua largueza; quando os illustres deputados me accusarem eu responderei, não com recriminações vagas, mas com factos e algarismos.
Resta-me agora responder a pergunta do illustre deputado o sr. Consiglieri Pedroso, porque não vieram os documentos que s. exa. exigiu, e que s. exa. na sua magnanimidade ia até ao ponto de prescindir que viessem documentos minuciosos e detalhados, e contentava-se ate que se dissesse qual a cifra, qual a verba, a que subiam os direitos de mercê.
Queria um documento official. Esse documento esta aqui, esta publicado na conta geral da administração financeira, a pag. 78.

elo que toca ao estado da divida em 30 de junho de 1884, não está aqui, porque pertence a conta da gerencia que terminou em 30 de junho de 1884.
As contas que se fazem posteriormente apuram-se no fim do anno de 1885.
As verbas que se cobram representam o pagamento desses direitos e vêem-se nas contas mensaes, que estão publicadas no Diario do governo.
Que quer mais o illustre deputado?
Se concorda em que lhe sejam enviadas as relações nominaes e minuciosas, ha de esperar que essas relações se possam tirar, porque são longas e têem de ser conferidas para virem exactas.
Aqui tem a resposta a sua pergunta.
Se eu me animasse a fazer algum pedido a opposição, era que continuasse n'este debate serenamente, sem acrimonia nem paixões que nos podem prejudicar, porque a questão de fazenda é grave, mas com a consciencia verdadeira dos factos taes quaes elles se passaram e das circumstancias reaes e veridicas em que o paiz se encontra.
Vozes : - Muito bem.
(S. exa. nunca revê as notas tachygraphicas dos seus discursos.)
O sr. Emygdio Navarro: - A opposição não faltará á cordura que deve aos debates parlamentares e a sua propria dignidade. (Apoiados.) Mas e precise que a maioria e o governo saibam tambem que a opposição não faltará á energia, que for preciso para fazer manter os seus direitos e acatar o seu decoro. (Apoiados.)
Quando n'esta casa se discutiu o bill de indemnidade, pedimos os documentos relativos as despezas extraordinarias feitas com as providencias tendentes a evitar a invasão do cholera, para a vista d'elles vermos se podiamos absolver o governo pelo acto dictatorial que tinha praticado. A absolvição, que não se podia negar ao fim, podia recusar se aos abuses, que com esse fundamento se houvessem praticado.
Respondeu então o representante da maioria, o relator do projecto, que era o sr. Franco Castello Branco, que os documentos haviam de vir para a discussão no orçamento recrificado. (Apoiados.) Assim foi respondido; assim foi promettido. (Apoiados.)
E como foi cumprida a promessa?
É certo que vamos entrar na discussão do orçamento rectificado sem que esses documentos tivessem sido enviados á camara! Os nossos protestos são, pois, mais que justificados. (Apoiados )
O sr. ministro da fazenda diz-nos que no orçamento rectificado ha outros assumptos, de que podemos occupar-nos; e eu respondo que não e ao governo, que pertence indicar quaes são os pontos que devem ser discutidos ou por onde deve começar a discussão. Nos discutimos quando e como queremos. (Apoiados) É esse o nosso incontestavel direito. (Apoiados.)
Nos breves minutos, que nos foram concedidos para examinarmos os documentos ou antes um simples rol de despezas, apenas pude ver no rol enviado do ministerio do reino que a verba gratificação estava escripta trinta o oito vezes. Não vi mais nada, eu pouco mais, mas isto e bastante. A primeira pagina d'este rol é de cerca de 9:000$000 réis, e toda do gratificações.
Tudo aqui tem gratificações. De modo que nos serviços do saude parece que nada ha obrigatorio, visto que tudo se gratifica. (Apoiados.)
Nos documentos do ministerio das obras publicas encontram-se algumas verbas curiosas.
Por exemplo:
«Resto da mobilia, roupas e utensilios para a penitenciaria - 7:556$300 réis.»
Que tem o cholera com a mobilia da penitenciaria? A penitenciaria, se não fosse o cholera, ficava sem mobilia, sem roupas e sem utensilios?
Leio ainda n'esta mesma nota do ministerio das obras publicas uma verba de 17:000$000 réis para o lazareto, que fora realisada pelas necessidades estraordinarias da occasião. Mas, independentemente d'essa verba extraordinaria, cuja applicação alias se não indica, ha outra para a reparação da muralha dos armazens. Ora a ruina d'essa muralha não foi de certo devida ao microbio. (Riso).
Temos tambem 4:000$000 réis para o cano de esgoto da penitenciaria. Então a penitenciaria ficava sem cano de esgoto, se não fosse o cholera? Pois não era uma obra a fazer pola dotação d'aquelle edificio?
O mesmo direi das verbas, que ali figuram para concertos nas cadeias do Limoeiro e do Aljube, que têem dotações orçamentaes, e não podiam, por isso, ser incluidas nas despezas extraordinarias por causa do cholera.
D'este rapido exame se vê, que o microbio foi para o governo um expediente salvador para alargar as verbas orçamentaes, e para distribuir numerosas gratificações.
(Apoiados.)
Sr. presidente, n'estas questões é muito conveniente attender as indicações da opinião publica, quando ella se affirma unisona e accorde n'um grande interesse commum, sem querer saber quem está no governo, nem quem está na opposição. Mas, per isso mesmo, quando assim se recebe, dos proprios adversarios, um voto de confiança, corre duplicado dever, para quem o recebe, de se manter strictamente dentro d'elle, e de não abusar d'essa confiança para, a sombra d'esse incitamento e do applauso geral, alargar as despezas do orçamento que tem verbas especiaes, e a pretexto de um sentimento nobilissimo, que todos applaudem, fazer despezas que se não justificam e que ha fundado direito para censurar.
Vejamos a nota do ministerio do reino.

primeira verba e uma gratificação de 500$000 reis a tres empregados da repartição de saude.
A que pretexto se deram estas gratificações?
Para que são os empregados de saude, se por um leve serviço, dentro da sua missão, tem de se lhes dar uma gratificação avultada?
Vozes: - Ora, ora!
O Orador: - Ora, ora!
Por trabalharem ?...
Não havia occupação alguma, que fosse mais apropriada ao seu cargo.
E se assim não é, diga-se qual e o fundamento, com que recebem os seus vencimentos normaes.
Eu ainda comprehendia e applaudia que se fizessem essas despezas e que se pagassem largas gratificações quando houvesse riscos e perigos acima do commum ; mas não comprehendo que, sem esses riscos e perigos, o por trabalhos que, rigorosamente, são normaes, se dêem gratificações de 500$000 réis. (Apoiados.)

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Se assim não é, não sei para que servem os empregados de saude.
Se a ameaça do cholera produziu este jubileu de gratificações, o que seria se o cholera nos invadisse!
Seria um diluvio! (Apoiados.)
Então, estas gratificações de 500$000 réis iriam a reis 50:000$000, e a somma total a quantias fabulosas! (Muitos apoiados.)
«Gratificação aos empregados da junta consultiva de saude, 900$000 réis.»
Diz isto a nota. Para que é esta junta de saude, se quando se junta ha de receber gratificações d'esta importancia?
O melhor então e supprimir os ordenados permanentes, e pagar-lhe só quando ella funccionar. (Apoiados.) Mas convocar a junta para o exercicio das suas funcções e darem-se gratificações de 900$000 réis é abusar muito do sentimento geral, que levou a opinião publica a pedir ao governo que tomasse todas as providencias para desviar para longe de nos o terrivel flagello do cholera. (Apoiados.)
Não faço sobre este assumpto considerações mais largas, porque, nos poucos minutos, que tive para examinar estes documentos, não pude esmiuçar estas contas, e só apenas, como ja disse, vi que a verba gratificação vem trinta e oito vezes repetida na nota enviada pelo ministerio do reino. Esta repetição vale pelo melhor dos commentarios.
A hora já deu, e por isso pego a v. exa. que me reserve a palavra para a sessão seguinte, porque não pude, se quer, começar no exame do assumpto, para que principalmente pedi a palavra.
O convite feito pelo sr. ministro da fazenda á opposição parlamentar para discutirmos os seus actos e muito louvavel; mas permitta-me s. exa. que lhe diga que era desnecessario, porque muito antes d'essa provocação amigavel, e de boa cortezia politica, tinhamos nós resolvido, para não faltar a ella e as obrigações do nosso mandato, chamar o governo ao ajuste de contas das suas responsabilidades financeiras.
O sr. Carrilho (para um requerimento):- Pedia a v. exa. que consultasse a camara sobre se queria que os documentos enviados a esta camara pelo ministerio da fazenda ha uns poucos de dias, e que se referem as despezas de saude publica, sejam publicados no Diario do governo de amanhã.
Assim se resolveu.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é a continuação da de hoje.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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