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SESSÃO DE 8 DE JULHO DE 1887 1607

dos castigos, que, por seculos, tinham sido de um empirimismo cruel e sangrento.
Á phylantropica reacção contra o systema do punir da idade media, gloriosamente iniciada por Beccaria, succedeu a escola correccionalista, valentemente sustentada pelo insigne criminalista Roeder.
Segundo esta escola, o fim da pena é puramente educativo; é a emenda moral e jurídica do delinquente, a aspiração suprema do castigo imposto ao infractor da lei e perturbador da ordem juridica, base fundamental da sociedade.
Os princípios apostolisados por aquelle criminalista adquiriram sectários fervorosos em muitos paizes, e ainda exercem prestigioso império entre os partidários do regimen de prisão cellular, quer de separação continua entre os condemnados, quer de separação nocturna e silencio obrigatório entre os presos; pois que a pena no systema penitenciario, se é intimidante e afflictiva, tem comtudo como principal objectivo a moralisação do delinquente, favoncada pelo benéfico influxo que o isolamento, o ensino religioso, escolar e o profissional devem exercer no animo do criminoso.
Não póde negar-se em absoluto o valor dos princípios da escola correccionalista, affirmando a sua improficuidade na applicação pratica do regimen educativo dos delinquentes; todavia é mister evitar a illusão da omnipotência educativa, pois que a educação, se tem uma verdadeira efficacia na conservação de certos caracteres originariamente bons, só póde concorrer para depurar e robustecer outros, que se mantém na zona media entre o bem e o mal, não possue todavia o maravilhoso poder de modificar os caracteres, a ponto do transformar um ente pshychicamente degenerado, um homem perverso por instincto ou por habito inveterado, num cidadão probo e honesto, em cuja consciência fulgure o amor pelo bem, o culto da justiça e a dedicação pelo dever. (Apoiados.)
O principio de que a pena deve emendar o delinquente é geralmente acceite e acolhido na jurisprudência criminal, nas escolas e na applicação dos systemas penitenciários; mas, sc0 valor da educação penitenciaria é importante e muito consideravel, não é todavia absoluto, pois que as estatísticas, as observações anthropologicas e pshycologicas provam que ha numerosos delinquentes, cuja correcção é impossivel, difficilima, ephemera ou instavel, e estes, já por defeito da sua constituição organica, já por habito contraindo, e, muitas vezes, pelo influxo pernicioso do ambiente social, são a demonstração da improficuidade da therapeutica moral da pena.
Até ha poucos annos, a sciencia do direito penal tem osculado entre a opinião dos que julgam ser indispensavel uma severa repressão do crime, e a dos que entendem que a suavidade da pena e a educação do criminoso são os meios mais adequados á defeza e restabelecimento da ordem social, quando offendida pela pratica do crime.
Ao estudo abstracto e metaphysico do delicio no domínio da philosophia espiritualista, ao exame do facto criminoso na sua relação com a liberdade morai do agente, succederam as ideias e o methodo da philosophia positiva, que estuda o delinquente e não o delicto, como ente abstracto, analysa os elementos anthropologicos e sociaes do delicto, pondera as circumstancias internas e externas que poderiam ter influencia na pratica do crime, e determina, emfim, a applicação da lei penal, procurando que seja justa, no ponto de vista do delinquente, e util, no ponto de vista dos interesses legítimos da sociedade.
Preponderam ainda nos codigos modernos os principios da escola penal, que se póde chamar classica, e as idéas metaphysicas, em face das quaes só ha sancção penal legitima quando o crime é o resultado da acção intelligente e livre de quem o praticou. O delicto é a violação do direito, tutelado pela lei penal, o livre arbítrio, a base fundamental do direito de punir.
Não cabe no ambito de um discurso parlamentar a serie de considerações que naturalmente podiam derivar deste assumpto; releve-me, porém, a camara que eu me haja alongado mais do que deveria, pois prometto que não transformarei esta casa em escola de direito penal ou em academia.
Ha poucos annos, surgiu uma brilhante pleiade de juristas, anthropologos e psychologos, que, estudando o crime e o delinquente, proclamam que o crime, na sua manifestação mais geral, deve considerar-se em regra como effeito da anormalidade individual do seu auctor, ou como symptoma de pathologia social, mas que o fim supremo da pena é a segregação dos elementos nocivos á sociedade, devendo conjuntamente prover-se ao saneamento do ambiente social pelos meios preventivo» mais consentâneos e práticos, a fim de que uma efficaz prophylaxia preserve os menos vigorosos e resistentes da influencia nociva de um péssimo regimen moral e economico, fautor incontestavel de um schema social propicio ao crime.
A escola positiva considera a sociedade como um verdadeiro organismo, que só póde desenvolver-se e manter-se por um processo de desassimilação dos seres que o affectam pathologicamente. Esta reacção da sociedade contra os delinquentes não vae até às consequencias extremas de reclamar o extermínio de todos os criminosos; não glorifica a pena de morte; não pretende a applicação de sevícias e tormentos cruéis e inúteis; mas unicamente proclama que se ponham em pratica os meios de eliminação perpetua ou temporária dos indivíduos que, dando-se á pratica do crime, são elementos perigosos ou anti-sociaes.
Não se retrocede aos rigores excessivos da penalidade, mas não se sacrifica na ara do sentimentalismo a necessidade impreterivel de assegurar a ordem da sociedade contra os ataques e perturbações consequentes do crime.
Se estes princípios não estão absolutamente formulados em disposições de lei penal, não se podem considerar alheios de todo á jurisprudência dos códigos, pois que a pena da privação da liberdade e a de degredo, nos seus immediatos effeitos, consiste na eliminação dos indivíduos anti-sociaes.
Estes principies impõem-se á consciência de todos sempre, que um grande crime abala a sociedade.
E por isso que no julgamento a que alludo o tribunal disse que era indispensável que o réu Marinho da Cruz fosse retirado do meio social, e desde o momento em que ha uma sentença que o diz, e é essa a opinião dos peritos que serviu de fundamento á decisão do tribunal, é mister que se cumpra. (Apoiados.)
N'estes ultimos annos o estudo da anthropologia criminal tem tido um grande desenvolvimento, e muitos escriptores são concordes em que não só é preciso estudar o crime fóra da metaphysica, mas que é indispensavel, sobretudo, estudar o criminoso, para se examinarem as rasões determinantes da infracção da lei. Este estudo levará logicamente á classificação dos criminosos, segundo a sua idiosyncrasia e habitos e o grau de temor que inspirem pela probabilidade da reincidencia, ou da incorrigibilidade, classificação precisa para convenientemente se afastarem os perigos que podem resultar do seu convivio.
Os criminosos não são entre si iguaes, e não só se differenciam pela organisação physiologica e psychica, como pela maior ou menor influencia que sobre elles exerce um mau ambiente social, a falta, ou vícios de educação, ou o temperamento desenvolvido pelas condições mesologicas.
Poderá pôr-se em duvida a existência de indivíduos que praticam crimes ferozes com a mais insensível indifferença, que ha muitos evidentemente incorrigíveis, que se mostram insensíveis às dores da penalidade, e finalmente que ha outros que delinquem sob o domínio da alienação mental? E a par d'estes, não ha outros que, por incidente imprevisto, occasional, ou pelo ímpeto de uma paixão subitanea, com-