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1608 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mettem crimes, sem que sejam perversos, corrompidos, ou degenerados?
O estudo, pois, do delinquente, e a sua classificação, é fundamental, para que a sociedade se premuna contra a repetição dos factos criminosos. Se o criminoso é um incorrigível, ou um indivíduo propenso ao delicto por hereditariedade, por vicio contrahido, ou perigoso peio seu estado pathologico, a pena a applicar, ou antes a preservação social, está na privação completa da liberdade do delinquente; mas se este infringiu a lei num momento de paixão, ou em circumstancias anormaes e infelizes, se este não constitue um perigo constante para a sociedade, a penalidade deverá ser diversa quanto â forma e quanto á duração.
Se persisto em fatigar a camara com estas reflexões, a que todavia não dou o desenvolvimento desejado, é porque o problema da criminalidade se está impondo hoje á consideração de quantos se dedicam aos estudos sociologicos.
A onda da criminalidade vem rolando e avolumando ameaçadora, impetuosa e terrível. (Apoiados.)
Nos congressos penitenciários, nos livros, nas revistas e nas estatísticas não se dissimula a desagradável impressão que a numerosos pensadores tem causado este facto.
Os phanaes da sciencia fulguram nas eminencias da civilisação deste século potentissinio, laborioso e audaz, e a cultura geral levanta do limbo da ignorância as classes populares; todavia a tão radioso desabrochar da consciencia humana não corresponde o desapparecimento da criminalidade, ou o seu decrescimento.
Grande illusão deveria sentir o maior poeta da França, que pedia a abertura de escolas para fechar os cárceres!
Attenda a camara a alguns dados estatísticos.
Em França, por exemplo, desde 182G a 1380 triplicaram os crimes, e esse augmento não se deu na proporção do augmento da população. Desde 1851 a 1880 as reincidencias cresceram progressivamente de 21 a 41 por cento nos crimes correccionaes e de 3ò a 50 nos crimes de maior gravidade.
Na Belgica desde 1800 até 1875 os processos dos condemnados pelos tribunaes, quer os accusados tivessem de responder pelos crimes a que entre nus corresponde o processo ordinario, quer pelos crimes a que corresponde o processo correccional, subiram de 20:428 a 25:072.
De 1868 a 1880 as reincidencias attingiram a 42 por cento.
O augmento dos crimes excedeu muito o crescimento proporcional da população.
Na Italia, este problema social tem preoccupado todos os criminalistas, porque a criminalidade tem ido n'aquelle paiz em um crescendo extraordinario, que não está em proporção com o augmento da criminalidade dos outros paizes da Europa.
De 1860 a 1870 houve um augmento de 22 por cento nos crimes a que é applicavel a pena capital, e de 64 por cento nos outros crimes; é sobre tudo ali que tem, por assim dizer, primazia a máxima criminalidade, sendo assombroso o numero de homicidios.
Este facto social preoccupa os mais distinctos criminalistas italianos, e é neste glorioso paiz, nesta pátria do direito, que o assumpto de que me occupo é hoje o thema de profundos e variados estudos.
Na Hespanha os processos criminaes subiram de 94:574 a 146:277.
De 1868 a 1874 houve 159 condemnações á morte e de 1875 a 1881 houve 213. No primeiro período as execuções foram 50, no segundo 125!
O quadro estatisco das reincidências é por toda a parte desconsolador e muito influe para que os systemas penitenciários, ainda os mais bem organisados e bem praticados, não gosem do prestigio que cercou esta instituição, quando na Europa lhe foi dada hospitalidade cariciosa, na perspectiva de que alfim se havia descoberto a panaceia salvadora contra a epidemia mortifera do delicto.
Sinto não me poder referir a recentes estatísticas de Portugal. As que existem são respectivas a um período tão curto que não offerecem elementos bastantes para se poder fazer um estudo comparativo com os outros paizes, e apreciar com exactidão possível o estado da criminalidade portugueza comparada com a de outras nações da Europa. (Apoiados.)
Ora, quando na Europa se dá este crescendo de criminalidade, e quando a sciencia está demonstrando que uma grande parte dos crimes anda completamente ligada a vícios organicos, a verdadeiros estados pathologicos, o assumpto impõe-se de per si, sem necessidade de encarecimentos rhetoricos, á consideração illustrada do parlamento. (Apoiados.)
É mister reformar o codigo do processo, refundir o código penal e completar a nossa legislação por modo que o crime não fique impune e que os delinquentes que a lei não repute responsaveis, não se constituam em perigo para a sociedade. (Apoiados.)
A nossa legislação actual não é inteirameente omissa, quando se trata de loucos criminosos; mas e incompleta. Carece-se de uma legislação de caracter preventivo, que sirva de égide protectora da sociedade contra aquelles que por vicio mental estão mais propensos ao crime, transformando-se de seres intelligentes e livres em feras, ou autómatos, a que é inútil, senão barbaridade, applicar penas, que nem curam, nem melhoram esses infelizes. (Apoiados.)
A questão da applicacão na lei penal está ligada com outras disposições das nossas leis. A organisação dos processos, pelo que respeita á parte medica, está entre nós completamente embrionária e é preciso que se regule devidamente. Ha porventura cousa mais importante do que e o estudo do indivíduo como agente de um crime? E todavia nós sabemos, que até na organisação dos processos dos corpos de delicto, a não ser em casos excepcionaes, ha completa ausência da applicação dos preceitos da medicina legal.
Agora declarou o tribunal irresponsável um delinquente por padecer de epilepsia larvada. Acceite-se a decisão em homenagem á sciencia. Nada tenho, nem a camara, com o veredictum do jury; mas o facto, pela sua estranheza e pelo abalo que produziu na opinião publica, trouxe á superfície da corrente um thema de estudo importantíssimo. (Apoiados.)
Não me assustam as conclusões da sciencia; o que eu temo é a applicação errada ou fraudulenta dos seus princípios, sempre que os expedientes da advocacia se soccorram do auxilio da sciencia para dar a verdadeiros criminosos um patrocínio funesto para a sociedade. (Apoiados)
Não ha duvida em que a epilepsia tem uma intima connexão com a loucura e com a criminalidade.
O sr. Jackson, medico do hospital de Londres e do hospital de epilepticos e paralyticos, escrevia, ha annos: «A loucura epileptica é de ordinario violenta, e a sua violencia póde tomar a forma de crime, como consequencia de circumstancias puramente fortuitas».
O sr. Knetch, em 1883, fazendo, na Allemanha, estudos de anthropologia criminal, em 1:214 criminosos, encontrou epilépticos 5 por cento. Este sábio é de opinião que o movei do crime se deve procurar mais nas causas sociaes do que na anthropologia individual; mas não hesita em declarar que uma constituição nevropathica torna o indivíduo mais propenso a infringir as leis que regem a sociedade, havendo por isso connexão intima entre o delicto e a nevropathia.
Segundo Falret na epilepsia larvada os paroxismos, as convulsões, são substituídos frequentemente por um accesso de loucura.
A descarga epiléptica produz-se nos centros nervosos