1350 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
E naturalmente abriram-se com o explicador, porque era aquelle o caminho direito para saberem as intenções do sr. ministro. (Apoiados.)
E o sr. Reeves caíu n'esta ingenuidade e foi pedir conselho ao explicador.
Diz o sr. Reeves: a minha intenção é construir os muros das obras do porto de Lisboa exactamente como estão descriptos no projecto feito pelo sr. Matos; mas a margem dos lucros que tenho é nulla ou pouco importante, e por isso preciso arranjar alguma outra obra de onde mo venha uma margem de lucros qualquer para eu poder fazer faço ás eventualidades de um trabalho d'esta ordem; e descobri o seguinte meio de conseguir o meu fim:
Se eu fizesse uru caminho de ferro que fosse de Alcantara até Cascaes, se ficasse com a exploração d'este caminho de ferro e com a do caminho de ferro que vae do caes dos Soldados até Alcantara, se fizesse tambem a rectificação da margem do Tejo desde o Porto Franco até Belem.
ficando com os terrenos d estas obras, tirava os lucros sufficientes para com elles me julgar habilitado a poder ir ao concurso, e sujeitar-me aos poucos lucros que tiraria da execução da obra principal.
E lembrou-se de propor aquellas obras como complementares, nos termos do § 2.º do artigo 1.º do programma do concurso, e foi esta sua idéa, este seu pensamento que elle communicou ao sr. Matos.
Por uma curiosa coincidencia, viu-se mais tarde que o sr. Hersent tambem andava pensando exactamente a mesma cousa.
Mas o que respondeu o sr. Matos?
O caminho de ferro que vae de Santa Apollonia até Alcantara chamava-lhe o sr. Reeves o seu primeiro systema, e o caminho de ferro que segue de Alcantara até Cascaes chamava-lhe o mesmo empreiteiro o seu segundo systema.
O sr. Matos, consultado sobre se esta obra complementar era ou não do agrado do sr. ministro, disse que o primeiro caminho de ferro fazia parte do plano geral dos melhoramentos do porto de Lisboa, pois que effectivamente era o que estava traçado no dito plano geral e fazia parte do projecto que servio de base ao concurso; e como o systema adoptado pelo sr. Reeves, quer dizer, o traçado que elle apresentava se afastava do indicado n'aquelle plano geral, por isso não poderia elle ser attendido no concurso, o que era obvio.
Por consequencia, o leccionista disse ao empreiteiro, com relação á obra complementar que queria propor; - o seu projecto affasta-se do traçado do caminho de ferro que faz parte do plano geral, e como esse plano geral não póde ser alterado, escusa de fazer essa proposta porque vae ao concurso, e fica sem a obra.
O sr. Reeves, em vista d´esta informação, deixou de ir ao concurso, não podendo seguir o seu plano que se combinava com o resto das suas operações financeiras, E, como o sr. Matos lhe tinha dito que lhe não era acceite a proposta n'aquelles termos, não foi.
Foi só o sr. Hersent; seguiram se os tramites, e foi-lhe adjudicada a obra.
O sr. Hersent, como nós sabemos, é quem tinha de fazer o projecto definitivo, e quando o executou, pediu, e foi-lhe concedido, entre outras cousas, o poder alterar e arredondar os angulos da doca de Santas, a fim de convenientemente modificar o traçado do caminho de ferro do Alcantara a Santa Apolonia.
Logo, a idéa do sr. ministro de que não podia ser alterado o plano geral foi modificada; logo afastou do concurso o sr. Reeves sem rasão e sem motivo, porque, se o plano não se podia alterar, se era inalteravel, se não se podia modificar em qualquer ponto, o conselho dado ao sr. Reeves não foi leal e verdadeiro, e serviu só para elle não ir ao concurso!
É fatal; desde, que se consentio ao sr. Hersent fazer qualquer modificação no plano geral que para o sr. Reeves era inalteravel, este empreiteiro não foi correctamente leccionado.
Antes do concurso não se podia alterar o plano geral, mas depois do concurso já se podia alterar a doca de Santos, o traçado do caminho de ferro, a doca do arsenal de marinha, e a linha exterior dos muros da doca do Terreiro de Trigo!
Já se podia alterar tudo; não havia já rasão para se conservar o plano geral!
Aqui está como o leccionista não andou bem, aqui está como se poz fóra do concurso o concorrente Reeves.
E como o cesteiro que faz um cesto faz um cento, assim como foi posto fóra um podiam ter sido postos fóra do concurso todos os outros.
De, mais a mais era a idéa do sr. ministro dar-se a empreitada a um empreiteiro favorecido ou que segundo imaginava, desempenharia melhor do que qualquer outro, aquelle trabalho.
Parece-me que como exemplo de boa administração não ha nada superior a este quadro. (Apoiados.)
Os actos irregulares do governo succedem-se e encastellam-se de uma maneira notavel n'este processo.
Vou agora tratar, e discutir o despacho de adjudicação das obras do porto de Lisboa, feita depois do concurso que teve logar n'estas bellas condições, que acabo de expor.
Permitta-me v. exa. que eu leia á camara este despacho para que ella tomando inteiro conhecimento d'elle possa apreciar todas as considerações que vou fazer.
O despacho diz assim:
"Despacho. - Vista a resolução do conselho de ministros;
"Visto o parecer n consultas da commissão especial e da junta consultiva de obras publicas e minas e procuradoria geral da corôa e fazenda, com as quaes o governo se conforma ;
"Vista a desistencia apresentada por parte de mr. Pierre Hildenert Hersent por via do seu bastante procurador Nicolás Arthur Maury, quanto ás obras complementares a oeste do caneiro de Alcantara;
"Visto o protesto e pedido da companhia real de caminhos de ferro portuguezes, que em documento especial são attendidos a respeito das obras complementares acima referidas e de um caminho de ferro que assente sobre ellas.
" Adjudique-se ao proponente Pierre Híldenert Hersent, pela quantia a l0.790:000$000 réis (dez mil setecentos e noventa contos de réis) as obras que construem a primeira secção do plano geral dos melhoramentos do porto do Lisboa proposto pela, commissão nomeada em 16 de março de l883, conforme as condições approvadas por decreto de 22 de dezembro de 1886 e consultas supramencionadas.
Paço em 9 de abril de 1887. = Emygdio Julio Navarro."
Sinto que não esteja presente o sr. presidente do conselho. (Apoiados.)
Sendo esta uma questão que se póde considerar do honra e dignidade para o partido progressista, o sr. presidente do conselho tinha obrigação de assistir á discussão completa d'ella; e todavia no momento em que tenho de me dirigir a s. exa., não o vejo no seu logar.
Sou informado por alguns dos meus collegas que o sr. ministro de remo e presidente, do conselho foi para a camara dos dignas pares; pedia por isso a v. exa. a fineza de lhe fazer saber que eu desejava que s. exa. viesse occupar o seu logar.
O sr. Presidente: - O sr. Sr. presidente do conselho está na camara dos dignos pares.
O Orador: - O sr. ministro das obras publicas lhe dirá,, se julgar conveniente, o que vou expor.
Acabei de ler o despacho que fez a adjudicação das obras do porto de Lisboa e que affirmava ter sido feito em