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SESSÃO DE l DE MAIO DE 1888 1353

porque são tantas as circumstancias extraordinarias que se envolvem n'esta discussão, que nem mesmo é possivel coordenar idéas para se discutirem de uma maneira rapida tão variados assumptos.

Vamos agora examinar outro ponto.

O sr. ministro das obras publicas, na ultima sessão, estava muito afflicto, por não saber qual era o motivo por que a companhia dos caminhos de ferro tinha vindo offerecer-se para construir a linha urbana, a estação do Rocio, a linha de Alcantara a Cascasse, e a rectificação da margem do Tejo até Belem; e perguntava s. exa.: onde está o gato ?

Ora vamos a ver se eu digo onde está o gato. (Riso.)

Para este systema de discussões, é necessario um processo que não destôe da fórma em que é posta a questão.

Vejâmos pois onde está o gato.

O sr. visconde de S. Januario...

Um sr. Deputado: - Esse é o gato? (Riso.)

O Orador: - Não é o gato, é um rato. (Riso.) O sr. visconde do S. Januario tomou posse do seu logar de fiscal da companhia dos caminhos de ferro, e começou a conhecer os negocios da companha. O sr. Marianno de Carvalho, antigo director da companhia, ficou sempre com amor áquelle estabelecimento, que elle creou e gerou, e com a esperteza, que naturalmente Deus lhe deu, começou a perceber que o empreiteiro Hersent vinha a Portugal fazer umas obras de graça; e eu digo de graça, porque alguns engenheiros do ministerio das obras publicas até dizem que elle vem perder dinheiro! (Riso.)

Chegam a affirmar que é tão bom homem, que até nos vem entregar todas as suas economias!

Então os srs. Marianno de Carvalho e visconde de S. Januario começaram a impressionar-se com aquella idéa.

De remota data, o sr. Marianno anda, como se sabe, de rixa velha com os belgas; em vendo um belga, fica logo incommodado! (Riso.)

Se não, veja-se o que succede com o sr. Burnay. Quando o sr. Marianno de Carvalho vê o sr. Burnay, é como se visse o diabo. (Riso.)

Começou, pois, s. exa. a andar de ponta com o sr. Hersent e disse ao sr. visconde: "Então ha de vir um belga ganhar fama no nosso paiz, e fazer as obras do porto de Lisboa, de graça, perdendo mesmo dinheiro, e a companhia dos caminhos de ferro ha de ficar atraz?

Não póde ser!

É já fazer o ramal de Cascaes, a linha urbana, a estação ao Rocio, e a rectificação da margem do Tejo, e tudo de graça! (Riso.)

Vamos metter o belga n'um chinelo!"

E ahi tem o sr. ministro das obras publicas o gato. (Riso.)

Dizem que Hersent vae fazer as obras de graça; pois tambem a companhia quer fazer obras de graça para lhe não ficar atraz!

A companhia não precisava fazer uma estação no Rocio, nem a linha urbana, nem as obras ao Tejo, tudo de graça; mas faz tudo por ciume; tudo para fazer ferro ao Hersent. É verdade que a companhia tem tarifas especiaes para seu uso e governo, recebe de mão beijada o caminho de ferro manginal desde o cães dos Soldados a Alcantara para explorar e receber os proventos d'essa exploração, e tambem se fortifica com os, terrenos conquistados ao Tejo entre Alcantara e Belem; mas tudo isto são bagatellas que não explicam a evolução dos sentimentos patrioticos d'aquella empreza, postos só em evidencia pela negra emulação que lhe despertou o procedimento do empreiteiro Hersent.

Mas apesar de tudo e sejam quaes fossem as rasões que imperassem no animo da companhia real, o que a concessão tem é ser evidentemente illegal. (Apoiados.)

Póde ser a manifestação dos mais respeitaveis sentimentos, o que quizerem, mas o que é tambem é illegal. (Apoiados.)

E eu vou mostrar o fundamento que tenho para assim pensar.

Repito, póde a concessão considerar-se uma belleza, póde ser um encanto, mas é illegal.

E se é illegal, não presta para nada, não serve, não se devia fazer. (Apoiados.)

Como foi feita esta concessão? Qual é o seu fundamento legal ?

Esta concessão do caminho de ferro de Alcantara, até Cascaes é feita á companhia real como sendo a concessão de um ramal do caminho de ferro de Santa Apolonia.

Não me cansarei expondo grande numero de argumentos. Basta-me um.

A linha que vae desde o caes dos Soldados até Alcantara foi considerada pelo governo como sendo uma linha divergente, e por isso incluida no projecto Hersent como fazendo parte dos melhoramentos do porto de Lisboa.

Ninguem se lembrou de pedir a concessão d'esta linha, ou de se oppor á sua inclusão no projecto das obras do porto de Lisboa. (Apoiados.)

Logo, o ramal a que a concessão se refere só póde ser a linha partindo de Alcantara para oeste, e assim foi concedido um ramal que não entronca na linha principal! (Apoiados.)

Mas, um ramal que não entronca na linha principal não tem esse nome. (Apoiados.)

É preciso, mais que um grande esforço de intelligencia para se comprehender um ramal que está a alguns kilometros da linha principal. (Apoiados.)

Logo não podia ser feita similhante concessão. De mais a mais a companhia, pelo artigo 33.° do seu contrato, é que deve construir os ramaes, de que se aproprie.

E quem é que vae construir o troço de linha desde Alcantara até ao caes dos Soldados?

É o governo por intermedio do sr. Hersent. Logo a concessão não se podia fazer porque representava uma revoltante illegalidade. (Apoiados.)

Já respondi ao argumento engraçado que a este respeito nos apresentou o sr. ministro das obras publicas: e se se quizer conhecer o que a companhia vae ganhar, talvez algum dos meus collegas se encarregue de o demonstrar, desfiando o bom numero de contos de réis que elle ou os empreiteiros de obras vão metter nos seus cofres com esta concessão.

Não é difficil. (Apoiados.)

Continuando ainda com a analyse do despacho, tenho a lazer a seguinte observação; o sr. ministro lavrou este despacho em 9 de abril de 1885, e, quando e fez, tinha em cima da sua mesa todos os documentos que instruem o processo.

Examinou tudo naturalmente, viu as informações das estações competentes affirmarem-lhe que as modificações introduzidas pelo sr. Hersent no projecto, que serviu do base ao concurso, eram acceitaveis, debaixo do ponto de vista technico: viu outras varias informações das differentes estações, dizendo que o concurso estava em termos regulares e só lhe faltava um documento que não examinou mas que o sr. ministro dispensou para proferir este despacho.

Vejamos qual era esse documento.

A empreiteirada tinha de ser adjudicada, servindo de base um projecto definitivo e esse projecto tinha um orçamento que representava, necessariamente, as, idéas economicas do governo em relação áquellas obras; mas como, o sr. Hersent, pelas condições do concurso podia introduzir modificações n'esse projecto, que o alteravam, claro é que esse facto podia modificar as condições financeiras já estipuladas, isto é, o orçamento inicial.

O sr. ministro para ter, pois, perfeito conhecimento das condições em que ía lavrar o seu despacho, e para cumprir o disposto no artigo 17.° do programma, que já vou ler, é claro que precisava ter uma idéa, uma noção e uma informação precisa sobre a economia e sobre as condições