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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ventando desordens o tumultos, que ninguem viu, pois que nem ao menos houve nas assembléas eleitoraes uma leve altercação, que, exagerada pela paixão partidaria, podesse passar ao longe por uma desordem ou tumulto. Esta é a verdade attestada por toda a gente imparcial.

«É porém certo que o administrador do concelho de Arganil receiou muito que a ordem publica fosse alterada na assembléa, desde que teve noticia de terem apparecido homens armados em differentes freguezias; e tendo-lhe participado dois regedores que tinha ido d'esta cidade o fiscal dos tabacos Antonio Pinto, para, auxiliado com a quadrilha dos Brandões de Midões, alterar a ordem publica, ordenou o mesmo administrador a captura do referido Antonio Pinto, que teve logar no dia 7 do corrente, como tudo consta dos officios que, sob o n.º 1, passo ás mãos de v. ex.ª, e fe-lo conduzir á minha presença no dia 10.

«Podiam dar-se circumstancias em que o administrador do concelho devesse proceder d'este modo, auctorisado pelos artigos 249.° n.º 18, e 258.° do codigo administrativo, e portaria circular de 19 de julho de 1845; mas devia dar-me conta immediatamente do facto e dos motivos d'elle, o que não fez, e por este motivo, e para proceder por um magistrado estranho á indagação»

Por não dar conta do facto é que foi suspenso o administrador do concelho. Não foi suspenso pela prisão arbitraria, foi por não dar conta da prisão.

V. ex.ªs hão de achar curiosa a portaria circular de 19 de julho de 1845. Mas hão de ver que eu tinha rasão quando dizia que me contentava que a eleição de Arganil tivesse sido feita nos termos d'aquella portaria. Para meu socego bastava-me que ella tivesse sido fielmente cumprida.

Se o governo tivesse feito áquelles povos ao menos a graça de mandar preceder á eleição nos termos da portaria de 19 de julho de 1845, eu, apesar de reprovar a doutrina da portaria, a ponto de ser um dos pontos da minha proposta, teria circumscripto as minhas observações sobre o assumpto, e talvez não tivesse accusado o governo por este motivo. Mas nem a portaria se cumpriu. Eu vou fazer a leitura d'ella á camara, porque é bom ir registando estes factos para não esquecermos os tempos calamitosos, em que aliás nos documentos publicos se respeitava mais a liberdade eleitoral do que hoje.

(Apoiado de um sr. deputado.)

O illustre deputado diz apoiado, porque s. ex.ª é o unico magistrado que em 1871 citou a portaria circular de 19 de julho de 1845.

Não tenho noticia de nenhum attentado de tal ordem desde 1851 a esta parte.

Quem quer voltar para 1845 cita a portaria. Tem a coragem de a citar como fez o illustre deputado (apoiados).

Eram porém escusados os officios dos regedores, que eu logo mostrarei o que são, e que apenas significam o meio de querer fugir á responsabilidade de actos attentatorios da liberdade do suffragio.

Ao menos tenham a coragem dos seus actos. Não se escondam atraz dos regedores (apoiados).

A portaria é redigida nos seguintes termos:

«Constando a Sua Magestade a Rainha, por differentes participações officiaes, e por informações fidedignas, que os anarchistas sob o pretexto de promoverem as proximas eleições para deputados da nação em favor da opposição contra o actual governo, têem apparecido em varias povoações, e praticado assuadas e motins, em despeito das leis policiaes e de segurança; e bem assim que elles premeditam repetir nas mesmas e n'outras terras as suas correrias, indo reunidos em grupos a pé ou a cavallo: mas sendo certo que o seu verdadeiro fim é o de incutirem terror e receio nos habitantes probos e amigos das instituições vigentes, e ver se por este modo alcançam algum resultado, mais proficuo para a mesma opposição, já que o não podem conseguir por meios licitos; e attendendo a mesma Augusta Senhora, por um lado, a que estes sediciosos manejos tolhem o pleno exercicio dos direitos politicos dos cidadãos, o qual deve ser inteiramente livre de quaesquer embaraços que intorpeçam a acção das leis que o regulam; e por outro, considerando que similhantes manejos são sobremaneira attentatorios da tranquillidade e segurança geral dos povos, por isso que tendem a desvaira los, corrompe-los, e arrasta-los para o crime, por meio de vociferações, de improvisadas calumnias, e de convicios, com que pretendem desacreditar o governo e todos os seus actos, assim como as auctoridades constituidas, para as despojar da força moral, de que devem estar revestidas; e querendo tambem Sua Magestade obviar promptamente as consequencias funestas que podem provir de tão desordenado, como subversivo procedimento, mantendo-se em toda a parte a melhor ordem e o maior socego para que assim possam os cidadãos gosar em todas as occasiões, e com especialidade n'esta, da segurança e protecção que lhes é devida para que sem o minimo receio de incommodo, ou perigo usem do direito de votação que lhes competir: manda, pela secretaria, d'estado dos negocios do reino, que o governador civil do districto de Aveiro expeça, sem perda alguma de tempo, as mais explicitas e positivas ordens a todas as auctoridades da sua dependencia, recommendando-lhes o seguinte:

«1.° Que se por ventura se apresentarem nos seus respectivos concelhos ou parochias alguns grupos de individuos a pé ou a cavallo incitando por qualquer fórma a desordem e anarchia, ou praticando assuadas e motins, passem immediatamente a captura-los, seja qual for a sua jerarchia ou condição, fazendo-os autuar, como amotinadores, para todos os effeitos da lei.

«2.° Que dando-se o caso de evasão de algum ou alguns dos amotinadores para jurisdicção alheia do concelho em que commetterem o delicto, deverá o administrador d'esse concelho, ou o regedor da respectiva parochia por commissão sua, requerer desde logo a captura dos profugos em continuação do flagrante, á auctoridade do concelho ou da parochia a que se houverem acolhido, para os mesmos effeitos da lei.

«E 3.° Que os presos que pelos referidos motivos forem recolhidos na cadeia do concelho, sejam transferidos para a da capital do districto, ou d'esta para as de Lisboa ou Porto, como melhor convier á segurança publica.

«Sua Magestade, pois, declarando immediatamente responsavel o sobredito governador civil pela pontual execução d'esta real ordem, na parte que lhe compete, quer que elle faça igualmente responsaveis as auctoridades suas subordinadas pela sua observancia, na certeza de que empregará com todas ellas as mais severas demonstrações do seu desagrado, se se houverem com omissão ou negligencia, e se não desenvolverem aquella energia e actividade que demanda a presente conjunctura, durante a qual a segurança e tranquillidade dos povos, e a ordem publica devem ser mantidas com o maior rigor: cumprindo que o mesmo governador civil não só dê conta por este ministerio, em todos os correios, do que lhe for constando sobre tão importante objecto, ou por expresso quando seja necessario, como do que a respeito d'elle obrar.

«Palacio de Cintra, em 19 de julho de 1845. = José Bernardo da Silva Cabral.

«Identicas se expediram para todos os governadores civis do continente do reino e ilhas.»

Os ministros n'esse tempo não se regulavam só pelas participações da auctoridade administrativa. Não procediam como o sr. presidente do conselho, que só sabe as cousas pelas informações do governador civil do districto. N'aquella epocha os ministros regulavam-se não só por differentes participações officiaes, mas tambem por outras informações fidedignas.

Este memoravel documento denominava anarchistas os homens politicos que fizeram depois a revolução de 1846.

Na opinião d'aquelle gabinete eram anarchistas os que combatiam os actos de violencia e de despotismo do poder,