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Em virtude de resolução da camara dos senhores deputados se publica o seguinte

(Continuado do numero antecedente)

Resposta aos quesitos constantes da portaria de 3 de fevereiro de 1864 sobre a syndicancia a que se mandou proceder por decreto de 1 de fevereiro do mesmo anno.

O districto de Villa Real dividido em dois campos politicos, um favoravel ás auctoridades constituidas e outro opposto a ellas, deu por occasião das ultimas eleições municipaes um espectaculo, que mostrou a todo o paiz até onde póde chegar o excesso das paixões partidarias, que contagiosamente affectaram a todos, sem deixar alguem na indifferença ou neutralidade.

Foi esta a primeira e maior difficuldade com que a syndicancia deparou logo no principio dos seus trabalhos; era preciso adquirir a certeza do modo por que correram aquellas eleições, como se houveram as auctoridades antes, ao tempo d'ellas, e ainda depois, e até que ponto de verdade chegaram os protestos, reclamações e queixumes tão estrepitosos por toda a parte, que até subiram aos degraus do throno, e era necessario ao mesmo tempo que a syndicancia nas suas indagações se houvesse por um modo que a todos inspirasse a confiança de que este meio adoptado pelo governo de Sua Magestade não era um passo inutil.

Ensaiaram-se pois todos os meios conducentes a este fim, compulsaram-se todos os papeis e documentos respeitantes ao processo eleitoral de todo o districto, consultaram-se mappas corographicos, colligiram-se informações e documentos das auctoridades judiciaes e militares, annunciou-se e abriu-se franca audiencia a todos os que quizessem inscrever-se para prestarem suas declarações juradas sobre o assumpto, tomaram-se estas, e por fim obteve-se um resultado que segundo a ordem dos quesitos ou instrucções da regia portaria de 3 de fevereiro ultimo é o seguinte:

1.° Por quem apresentada a suspeição opposta aos conselheiros de districto; termos d'ella; qual a prova para a justificar; que contestação oppozeram os suspeitados, e que fundamentos adoptou o conselho de districto para a julgar procedente?

Tres cidadãos eleitores do concelho de Villa Real, Francisco José de Gouveia, padre José Justino de Carvalho e José Ayres Lopes Junior foram os que averbaram de suspeitos os vogaes effectivos do conselho de districto os bachareis Luiz de Bessa Correia, Antonio Tiburcio Pinto Carneiro e Antonio José Ferreira de Carvalho, para que estes não decidissem o recurso por aquelles interposto da deliberação da camara municipal, que fixou as assembléas para a eleição da nova camara, que havia de ter logar no dia 22 de novembro de 1863, isto em petição que allegava acharem-se os suspeitados altamente empenhados na luta eleitoral de todo o districto, e especialmente na do seu dito concelho, podendo cada um d'elles ser considerado como chefe de um dos partidos que se debatiam, como provavam muitos factos por elles praticados publica e notoriamente. Não se deu prova alguma e nenhuma foi a contestação, porque os suspeitados não foram ouvidos; mas o conselho em sessão de 13 do dito mez, presidido pelo governador civil e composto dos tres vogaes substitutos Antonio Ludovico Guimarães, Manuel Ignacio Pinto Saraiva e Manuel Ignacio Teixeira, faltando o primeiro Francisco Maria Cabral de Sampaio, apesar de avisado, julgou procedente e provada a dita suspeição, e o quarto vogal effectivo Martinho de Mello da Gama, que tambem foi presente, absteve-se de votar e declarou que não tomava parte em todas as questões que subissem ao conselho sobre processos e negocios eleitoraes. Do mesmo modo e com causa identica se julgou n'esta sessão igual suspeição opposta pelo cidadão Antonio Joaquim Ribeiro Cardoso, do concelho de Murça.

Em outra sessão do dia 17, composta dos mesmos vogaes julgaram-se iguaes suspeições sobre o mesmo objecto, a saber: uma opposta por José Julio de Sousa Canavarro, administrador do concelho de Villa Pouca d'Aguiar, e outra pelo cidadão Luiz Guedes de Azevedo, do concelho de Sabrosa; e em outra sessão do dia 18 com os mesmos vogaes tiveram igual julgamento mais suspeições identicas, sendo uma opposta pelos cidadãos Manuel Teixeira dos Santos, Diogo Bento Rodrigues, e outros do concelho do Peso da Regua, desattendendo-se a impugnação n'esse acto apresentada pelo bacharel Agostinho da Rocha e Castro, como procurador de Francisco José da Silva Torres, e outros do dito concelho, e outra opposta pela commissão municipal do concelho de Alijó, para que os ditos tres vogaes suspeitados não conhecessem do recurso interposto por João Baptista de Lima Sampaio da divisão das assembléas eleitoraes feita pela dita commissão; e n'este ultimo julgamento declarou não tomar parte o governador civil que se disse suspeito por ser negocio attinente ao concelho da sua naturalidade.

Dadas estas suspeições tiveram provimento ao mesmo tempo todos os recursos interpostos da divisão das assembléas eleitoraes feita pelas camaras recorridas, menos os da feita pela camara do Peso da Regua e pela commissão municipal de Alijó, pelo modo, e motivos que se hão de expender quando se fallar ácerca de cada um dos concelhos separadamente.

Sem entrar no arcano da consciencia do conselho de districto, que julgou sem provas e só pela verdade sabida, e sem que onze taxar de illegal o seu procedimento por não haver lei expressa que regule o caso sujeito, seria porventura mais curial e satisfactorio, que os suspeitados fossem ouvidos, e que aquella decisão assentasse em provas que demonstrassem a verdade de tão vagas arguições, mesmo por analogia com o decreto e regulamento do conselho d'estado, de 9 de janeiro de 1850; e se a verdade sabida, independente de provas externas, era bastante a fundamentar uma tal decisão, identicos, se não maiores, motivos se davam em relação aos tres vogaes substitutos que julgaram porque já nos jornaes publicos se haviam declarado membros de uma commissão encarregada de dirigir os trabalhos eleitoraes; e para apartarem de si toda a ideia de paixão facciosa deveriam abster-se de tomar parte no julgamento d'esta questão. Se assim se fizesse quero persuadir-me de que ninguem estranharia taes suspeições.

Ás suspeições politicas propriamente ditas rejeito-as com aquella promptidão com que todo o homem liberal deve repellir qualquer ataque á liberdade de opinião; mas quando esta opinião se transforma em factos, que só deixam ver no julgador a parcialidade, a dependencia, e a paixão totalmente incompativeis com o seu ministerio, então já não temos uma suspeição politica, mas sim uma incompetencia legal, que o inhibem de pronunciar um veredictum consciencioso. É este o caso em que estamos: suppondo que os vogaes suspeitados pertencendo a uma associação politica diametralmente opposta aquella a que pertenciam os suspeitantes, se haviam manifestado por seus actos inimigos encarniçados dos outros, e decididamente empenhados na questão que lhes era submettida, não eram elles então os competentes para a julgar, obstava-lhes legitima excepção de suspeição baseada em factos por elles praticados, embora de origem politica; eram os effeitos, e não a causa, eram os factos, e não a politica que lhes imprimia o caracter da incompetencia.

É isto o que tendem a provar as testemunhas de fl. 64, 73, 110 e 141, com relação aos tres vogaes effectivos, o que estes todavia contestam na sua exposição (documento n.° 1), advertindo que em iguaes circumstancias estavam os tres substitutos, pela rasão já referida.

Mas deixando esta questão, como um pouco alheia á missão da syndicancia, continuarei respondendo pela ordem dos quesitos ou instrucções do governo de Sua Magestade.

2.° Que ordem se seguiu no chamamento dos vogaes substitutos do conselho de districto, isto é, se foi rigorosamente seguida a ordem prescripta no codigo administrativo, ou se esta se alterou, e porque motivo?

Já fica notado que para as decisões até aqui tomadas, faltando o primeiro substituto depois de convocado, se seguiu a ordem prescripta no artigo 267.° do codigo, como melhor se póde ver da confrontação feita com a relação (documento n.° 2) dos vogaes do conselho do ultimo biennio e dos anteriores, confeccionada pela ordem da confirmação regia, segundo o parecer do procurador geral da corôa de 16 de abril de 1844, e portarias de 18 do mesmo mez e anno, e de 23 de outubro de 1860.

Mas em sessão de 28 de dezembro posterior ás eleições compareceram os quatro substitutos com mais o vogal effectivo immediatamente desimpedido do biennio anterior Antonio Pinto Machado, e foram pelo bacharel Agostinho da Rocha e Castro, por si e como procurador de diversos reclamantes, averbados de suspeitos os tres substitutos Ludovico, Saraiva e Teixeira, como altamente empenhados nas eleições, segundo mostravam por factos publicos e notorios, para não conhecerem da suspeição por elle opposta ao presidente governador civil, a qual tinha de julgar-se n'esta sessão, e simultaneamente foram averbados de suspeitos pelo bacharel Sebastião Maria da Nobrega, com os mesmos motivos, o primeiro substituto Cabral de Sampaio, e o do biennio anterior Pinto Machado, o qual tendo tomado a presidencia como mais velho, levantou a sessão dizendo que opportunamente se decidiria sobre as suspeições.

Seguiu-se a sessão de 29 de dezembro, na qual compareceram os mesmos vogaes da sessão antecedente, presididos pelo governador civil, dizendo-se na acta que faltou o substituto Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, e ahi o governador civil, presidente, fazendo menção das suspeições referidas e de outras que em petições separadas foram tambem oppostas ao secretario geral, como presidente eventual do conselho, e aos vogaes dos biennios anteriores que o poderiam compor, requerendo-se de mais a mais previo aviso

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sobre os nomes de quaesquer pessoas, que porventura fossem chamadas a julgar sobre os differentes protestos eleitoraes que havia pendentes, porque outras suspeições tinham a oppor, declarou-se embaraçado sobre o modo de romper estas difficuldades, que todas tendiam a estabelecer uma crise extraordinaria de não haver conselho que podesse decidir os ditos protestos e recursos, com grave prejuizo da publica administração; e então munido dos autos investigatorios a que mandára proceder, dos quaes se via provada unicamente a suspeição dos tres primeiros vogaes effectivos, e prevalecendo-se do disposto no artigo 234.° do codigo administrativo, resolveu constituir o conselho com os vogaes presenteassem embargo das suspeições a elles relativas, e submetteu de novo ao seu conhecimento e decisão a suspeição dos tres referidos, e retirando-se n'este acto os vogaes Pinto Machado e Cabral de Sampaio, que se disseram suspeitos em todos os negocios eleitoraes, ficou assim constituido o conselho com os tres já ditos substitutos do ultimo biennio Ludovico, Saraiva e Teixeira, julgou procedente e provada a suspeição dos tres effectivos, e passou a conhecer de differentes protestos e recursos eleitoraes.

Cabe aqui notar que no começo d'esta sessão parece ter se reconhecido a necessidade da comparencia de seis vogaes, de harmonia com a doutrina das portarias de 15 de janeiro de 1839, e 20 de agosto de 1844, explicativas do artigo 268.° do codigo administrativo, emquanto que depois considerou se o conselho legalmente constituido com os tres ditos substitutos sómente; entretanto como pelo artigo 1.º da lei de 24 de julho de 1855 se podem suppor derogadas aquellas portarias, uma vez que se dê a convocação dos seis vogaes, não ouso taxar de illegal este procedimento, embora menos coherente, pois que ainda na immediata sessão de 30 do dito mez apparecem reunidos os mesmo tres substitutos, e bem assim os que serviram em biennios anteriores Antonio Gerardo Monteiro, e Vital Maximo Teixeira de Moura, dizendo-se faltar por motivo justificado José de Moura Coutinho da Silveira Montenegro; e para notar é tambem que o conselho só desse provimento aos recursos interpostos pelo partido chamado governamental. É certo porém que n'aquellas sessões em que se deu a necessidade da convocação de seis vogaes, mostra-se das minutas dos officios convocatorios archivados na secretaria, e da certidão (documento n.º 3.°) que se guardou a devida ordem n'aquelle chamamento, deixando apenas de mencionar-se nas actas respectivas a falta de alguns, que foram convocados com as antecedencias que lhes competiam, e não compareceram.

3.° Que credito merece a asserção de que fóra falsificada a eleição da Regua, apparecendo um numero de votos superior ao dos votantes; qual o numero dos recenseados e qual o dos votantes, segundo os cadernos de descarga?

A este quesito não póde dar-se uma plena satisfação pela falta das actas originaes e respectivos cadernos do recenseamento, que subiram á presença do governo de Sua Magestade, e pela contradicção em que se acham as testemunhas inqueridas d'este concelho. Mas a julgar pelo que consta do relatorio do administrador, do auto de investigação ali levantado pelo administrador de Villa Real, pelo que se vê das actas transcriptas no Diario de Lisboa, n.° 47, e pela absoluta carencia de provas no manifesto que se fez em sentido contrario, nenhum credito merece a dita asserção, pois o numero de recenseados era de 666, o entraram na urna 505 listas, que conferiram com as notas de descarga. Embora se diga, como a testemunha a fl. 143, que nos cadernos foram postas notas de descarga a eleitores que não votaram; era esse um facto que para ser acreditado carecia de uma prova clara e evidente, mas nenhuma apparece, ao passo que dos citados documentos consta que muitos eleitores se abstiveram de votar, vindo para fóra ordenar o dito manifesto, que este contém muitas assignaturas apocriphas, outras de eleitores que já tinham votado, outras de cruz, attribuindo-se a individuos que sabiam escrever, e ainda outras de quem não era eleitor, o que melhor seria avaliado no tribunal competente, onde consta que pende recurso.

4.°, 5.°, 6.°, 7.° e 8.° Que fundamentos houve para alterar a designação e composição das assembléas eleitoraes, declaradas permanentes pelo § 3.°, do artigo 49.°, do codigo administrativo; se se attendeu á commodidade dos povos; se se obrigaram os eleitores da Regua, Alijó, Villa Pouca de Aguiar, etc. a percorrerem grandes distancias; qual o motivo da disparidade que se nota entre umas e outras assembléas, quanto ao numero dos eleitores; que distancia ha entre o logar destinado para cada uma e as povoações de que se compozeram; que rasão houve para se collocar a assembléa do Peso da Regua na casa da camara, deixando se de parte a igreja parochial, em que era de uso reunirias assembléas eleitoraes; como se justifica a collocação de uma assembléa em Gouvinhas, na extremidade do concelho de Sabrosa; se depois da votação a uma foi conduzida para casa dos parentes do administrador, protegendo este acto homens armados, que fizeram calar os eleitores que a isso se oppozeram; e finalmente o que ha de verdade nos actos de violencia que se dizem praticados pelas auctoridades em Villa Real, Peso da Regua, Alijó, Santa Martha, Sabrosa, Murça, Villa Pouca de Aguiar, Chaves, Boticas e Bobadella?

Para responder a estes quesitos, todos em relação uns com os outros, cumpre notar que sendo o districto de Villa Real composto de quatorze concelhos, a saber: Villa Real, Peso da Regua, Alijó, Santa Martha de Penaguião, Sabrosa, Murça, Villa Pouca de Aguiar, Chaves, Boticas, Montalegre, Mondim de Basto, Mezãofrio, Valle Passos e Ribeira de Pena, examinei e indaguei o modo porque correram as eleições e trabalhos preparatorios d'ellas em cada um dos ditos concelhos, e por sua ordem passo a responder aos citados quesitos.

1.°

CONCELHO DE VILLA REAL

A divisão das assembléas n'este concelho foi alterada pela camara, mas esta alteração não subsistiu, porque o conselho de districto deu provimento á reclamação de tres eleitores, mandando prevalecer a divisão e fixação adoptada no biennio anterior, e por isso ficou o concelho dividido em seis assembléas eleitoraes, a saber: S. Diniz de Villa Real, Torgueda, Borbella, Andrães, Filhadella e Mouçós, sendo cada uma d'ellas composta das freguezias designadas no mappa (documento n.° 4).

Esta divisão, alem da sua conformidade com a do biennio anterior, reuniu, como era natural, maior numero de eleitores na capital do concelho, emquanto que a feita pela camara apresentava uma assembléa rural com um inúmero de eleitores muito superior ao d'aquella.

Quanto ao modo por que os actos eleitoraes correram, verifica se que na dita primeira assembléa de S. Diniz se fez a eleição com toda a regularidade, havendo apenas um protesto inserido na acta, mas tão infundado, quanto é certo que as listas, que se dizem de côres, e que andam appensas á mesma acta unico fundamento do protesto) são de papel commum, e apenas um pouco anillado, o que não podia servir de signal externo, e nem a lei que regula as eleições municipaes auctorisava similhante protesto, ainda quando o papel das listas tivesse uma côr mais viva, pois não é o decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, de que tantas I vezes se fez uso em differentes partes e que se invocou no dito protesto, applicavel a eleições municipaes, senão em materia de recenseamento, conforme as portarias de 17 de junho e 23 de agosto de 1853, decreto sobre consulta do conselho d'estado de 10 de agosto de 1857; Diario do Governo n.° 251; decreto de 4 de junho de 1860, Diario de Lisboa ti'.° 169, e accordão do mi premo tribunal de justiça de 6 de agosto de 1863, citado Diario n.° 208.

Em todas as mais assembléas não houve vicio que affectasse a substancia e pureza da eleição, segundo consta das respectivas actas, nas quaes não apparece protesto algum. Entretanto ao conselho do districto subiu uma reclamação contra as eleições de todo o concelho, allegando-se que foram feitas com violencias e excessos repressivos da liberdade eleitoral, e apresentando se como unica prova dos mesmos uma proclamação impressa, que insinuava os eleitores a votarem contra a lista da camara que findava. O conselho porém desattendeu o sobredito protesto, e esta reclamação no que, a meu ver, fez justiça, porque ao primeiro obstavam as rasões já expendidas, e a segunda era completamente destituida de prova, pois tal consideração não merecia a alludida proclamação por não affectar a liberdade do voto; e demais são tão vagas e exageradas as allegações da dita reclamação que até descrevem a villa como militarmente occupada no dia da eleição com infanteria, caçadores e cavallaria, cruzando as ruas, e fazendo marchas e contra marchas para aterrar os eleitores, quando é certo que segundo o relatorio do administrador, e depoimento do commandante respectivo (documento n.° 5 a fl. 4), e mais depoimentos idas testemunhas a fl. 73 e outras, a unica força armada que então aqui se achava eram apenas 14 soldados de infanteria, e 8 de cavallaria, em tal estado de não poderem fazer serviço, que até a guarda da cadeia fôra feita por cabos de policia, pois que a outra força se havia repartido por differentes concelhos e assembléas para onde fóra requisitada, a fim de evitar o transtorno da ordem publica, mas ahi mesmo não serviu ella senão para a guarda das umas na noite de 22 para 23, aonde a eleição se não pôde concluir no primeiro dia, sem mesmo ser preciso empregar-se para restabelecimento da ordem que não foi alterada,: como consta dos depoimentos idos respectivos commandantes (documento n.° 5 a fl. 4), officios dos delegados da auctoridade administrativa, e já citado relatorio d'esta. Pelo contrario é publico e notorio, e consta especialmente do atito de investigação a que procedeu o administrador do concelho, corroborado com a prova testemunhal a fl. 64, 73, 110 e 141, que o partido denominado da opposição empregára todos -os meios licitos e illicitos com o fim de obter o triumpho que desejava, chegando a comprar votos, como até diz a testemunha contraproducente de fl. 99 v. e a tentar falsificar a urna da assembléa de Andrães pelo modo criminoso e traiçoeiro, que as testemunhas a fl. 73 e 110 relatam, emquanto que as de fl. 96, 99, 107 108 v. depõem apenas de ouvida vaga sobre ameaças do administrador do concelho, e seus agentes, e por um modo tão exagerado que revelam paixão, e que por isso merecem pouco credito.

De tudo isto, bem como do officio do delegado do procurador regio (documento n.° 6), se deduz que em todas as assembléas do concelho de Villa Real não houve incidente que affectasse a liberdade dos eleitores, ou acarretasse responsabilidade ás auctoridades.

2.°

CONCELHO DO PESO DA REGUA

A camara municipal d'este concelho fez nova divisão de assembléas, elevando-as a quatro, e quando no biennio anterior eram apenas duas; mas em verdade com bastante desproporção no numero dos eleitores, pois que uma tinha 823, e a outra 268; desproporção que seria ainda mais saliente na eleição de que se trata, sustentada que fosse aquella divisão, por terem sido recenseados a mais 89 eleitores. Justa causa teve portanto acamara para augmentar o numero das assembléas, dando assim melhor proporção ao dos eleitores, e sem incommodo para elles em relação ás distancias, como se deprehende de um mappa corographico fornecido pela direcção das obras publicas d'este districto. Mas ainda assim foi esta divisão impugnada por alguns eleitores que reclamaram a pretexto de incommodidade dos povos; porém o conselho de districto fundando se em que era publico e notorio que a ordem e tranquillidade publica se achavam ameaçadas era uma das quatro assembléas com assentada em Gallafura, supprimiu esta, reunindo a á da Regua, e approvando em tudo o mais a divisão e fixação feita pela camara, como proporcional, commoda e segura para todos os eleitores, ficando assim o concelho dividido em tres assembléas, a saber: Peso da Regua, Fontellas e Mouramorta, com as freguezias constantes do mappa (documento n.° 4).

Quanto á primeira assembléa, apesar de constar das actas transcriptas no Diario de Lisboa, que ali foi feita a eleição com legalidade, - mencionando apenas a requisição que a mesa logo depois de constituida fizera ao administrador do concelho para que desse providencias tendentes a prohibir a entrada de gente estranha a esta assembléa, por lhe constar que com ella se pretendia perturbar o acto eleitoral, comtudo houve contra a eleição que aqui se fez uma reclamação e protesto, fundando-se em que alem da falsificação da uma na vespera á noite alguns individuos protegidos pelo administrador do concelho espancavam todos os homens que vinham de Jugueiros e commettiam outros excessos; que n'essa mesma noite se introduziram homens armados na casa da assembléa, os quaes no seguinte dia, o da eleição, enchiam a mesma casa, impedindo a entrada aos eleitores; que n'este mesmo dia fóra postada uma força armada prompta a descarregar sobre o povo; que á porta da casa da assembléa estavam dois homens armados impedindo a entrada aos eleitores da opposição; que os mesmos eleitores assignaram na rua um protesto ou manifesto contra tudo isto, e que n'esta occasião o administrador do concelho pedíra ao commandante da força militar para carregar sobre elles e dispersa-los ao que o dito commandante se recusou.

Com effeito no conjuncto das provas que offerecem os já citados documentos combinados com outros, ora presentes, como os officios dos commandantes da força armada que ali estiveram (documento n.° 7) e depoimento a fl. 5 do documento n.° 5, declaração da propria mesa da assembléa, officio do delegado do procurador regio (documento n.° 6) e depoimento das testemunhas a fl. 34, 38 v. 41, 43, 45, 113 v. 118 v. e 120 transluz uma verdade, e é, que o administrador do concelho não teve força e vontade propria, deixando-se levar >de alguns amigos que a titulo de o coadjuvarem no exercicio da sua auctoridade o comprometteram de algum modo, fazendo-se alguns espancamentos, ainda que leves, na noite da vespera da eleição e chegando até a disparar se de um grupo onde elle se achava, um tiro contra um cidadão que passava a cavallo, alem de outros disturbios.

Porém tambem se observa que da parte da chamada opposição houve provocações, ameaças e recontros que logo n'esta noite pozeram em luta os dois partidos, já dantes preparados e armados um contra o outro; que não se póde ter como veridico o facto da occupação da casa da assembléa por homens armados no dia da eleição, nem a existencia dos dom guardas armados á porta impedindo a entrada aos eleitores da opposição, pois que apenas estiveram ali dois desarmados, os quais só consta haverem vedado a entrada a dois dos mais conhecidos chefes da opposição que não eram votantes, e assim mesmo achavam se ali postados á ordem da auctoridade de quem a mesa havia requisitado esta providencia, em harmonia com o disposto nos artigos 56.º e 58.° do codigo administrativo; que finalmente é falso ter havido pressão e terror imposto pela torça armada, e que o administrador do concelho lhe exigisse dar carga sobre os que assignavam o manifesto, antes a circumstancia de o terem feito e assignado diante da mesma força mostra a plena liberdade em que se achavam. A casa da assembléa foi a mesma onde se fizeram as eleições nos biennios anteriores, como provam os attestados do parocho respectivo, e certidão passada no governo civil (documento n.° 8).

E nem havia rasão para se mudar de local, porque pela divisão adoptada das assembléas competiu á da Régua o numero de 666 eleitores, quando no biennio anterior o numero d'elles se elevava a 823, como se observa do já citado mappa comparativo da divisão das assembléas nos dois anteriores biennios (documento n.° 4).

Nas outras duas assembléas de Fontellas e Mouramorta correu a eleição regularmente, e nem contra ella apparece protesto ou queixa alguma.

O conselho de districto, e desattendendo o dito protesto ou reclamação por improvada, julgou validas as eleições de todo o concelho, baseando-se em que os acontecimentos da vespera, alem de exagerados e de remota relação com o processo eleitoral, foram provocados por parte dos reclamantes, e que os do dia, longe de prejudicarem a ordem publica e a liberdade eleitoral, antes correram poderosamente para a sustentar.

De tudo isto se deduz: 1.º que o administrador do concelho não andou bem quando, de accordo com o presidente da mesa, collocou á porta da casa da assembléa, ainda que desarmados durante a eleição, os dois homens que vedaram a entrada a dois chefes da opposição, embora ali não votassem, porque a eleição é um acto de sua natureza liberrimo, por consequencia da maior publicidade; e devia limitar as suas providencias á ordem impeditiva da entrada de pessoas armadas, e a estabelecer meios de vigilancia na assembléa para reprimir qualquer tentativa de desordem que ali se manifestasse o que de prompto podia fazer com a força que tinha á sua disposição, e a não longas distan-

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cias; 2.º que lhe cabe igual censura pelos acontecimentos da vespera, os quaes, supposto exagerados tiveram existencia, mas não se dariam se o dito administrador se não deixasse possuir do panico terror de ser aggredido pela gente da opposição, a ponto de se lançar nos braços dos que tinha por amigos, os quaes a pretexto de manterem a ordem e de meios preventivos de defeza e policia da noite se excederam, pois para aquelle fim bastava-lhe a força armada, que já então ali se achava, sem fazer causa commum com os discolos, nem sanccionar, com a sua presença alguns desacatos, que todavia acredito estranhos á sua vontade; 3.° que o conselho de districto, approvando a eleição, não preterio a lei nem a justiça, porque alguns dos actos referidos não affectaram, segundo me parece, a essencia da eleição, e porque os outros, que tal effeito poderiam produzir, não se provam.

3.º

CONCELHO DE ALIJÓ

Pelo exame dos documentos archivados na secretaria do governo civil, correspondencia official, e certidão passada pelo official maior do mesmo governo civil (documento n.° 9) vê-se que o decreto dissolutorio da camara, datado de 21 de outubro de 1863, fôra remettido por expresso ao administrador do concelho no dia 6 de novembro, dia em que deu entrada no correio de Villa Real o officio circular, com o alvará da designação do dia das eleições municipaes e parochiaes, datado de 5.

N'aquelle mesmo dia 6 procedeu a camara á divisão e fixação das assembléas eleitoraes, alterando a ordem do biennio anterior sem motivo justificado, tanto em relação ás distancias como ao numero dos eleitores; e attentas as horas de partida e da chegada do correio, segundo consta da certidão citada, conclue-se evidentemente que a camara procedeu aquelle serviço antes de ter recebido a correspondencia alludida, ou parte official da sua dissolução, embora aliunde o soubesse por outra qualquer via, como é de presumir.

No dia 11 fez a commissão municipal nova divisão de assembléas, sem que da mesma sorte tivesse motivo justificado para isso, tanto em relação ás distancias, como á proporcionalidade do numero de eleitores em cada assembléa, acrescendo que na de Alijó se reuniu, sem necessidade, o numero de 6.24 eleitores, emquanto que a de Villa Verde ficou apenas com 171, tendo era muita proximidade algumas freguezias que foram desviadas para outras assembléas, ás quaes algumas d'aquellas não faziam falta se viessem para Villa Verde completar ao menos o numero legal de eleitores. Em confirmação d'isto estão os mappas (documento n.° 4) comparativa da distribuição das assembléas que prevaleceu para o biennio de 1864 e 1865, e das que preexistiram no biennio de 1862 e 1863, e o da distribuição das assembléas feita por differentes camaras, tudo confrontado com o outro mappa corographico fornecido pela direcção das obras publicas n'este districto.

Esta divisão feita pela commissão municipal foi confirmada pelo conselho de districto, que desattendeu a reclamação contra ella, e baseou o seu accordão na melhor commodidade dos povos, em sessão de 18 de novembro, ficando assim o concelho de Alijó dividido em cinco assembléas, a saber: Alijó, Favaios, Sanfins, Carlão e Villa Verde.

Quanto ao modo por que as eleições correram n'este concelho, verificou-se o seguinte:

Na assembléa de Alijó o dia 22 occupou-se todo com a constituição das mesas; porque se levantou acalorada discussão sobre a formação da mesa definitiva por escrutinio ou sem elle; e porque o tumulto se ía tornando maior inter veiu força armada a requisição do presidente da mesa, restabelecendo-se assim o socego; porém ainda o escrutinio para a mesa não terminou n'aquelle dia, e por isso continuou no seguinte, no qual, por não haver, questões que interrompessem o regular andamento da eleição, foram concluidas todas as operações eleitoraes até ao apuramento final. Contra esta eleição porém houve protesto e recurso para o conselho de districto, fundado em allegados tumultos que afugentaram da uma os eleitores da opposição, e em que votaram varios individuos munidos de accordão, ou sentença judicial, sem se acharem inscriptos no caderno do recenseamento. Mas não obstante isto foi a dita eleição approvada; pelo conselho de districto, cuja resolução entendo que foi justa emquanto desattendeu o fundamento dos tumultos que se não provam; mas não assim emquanto ao outro fundamento da admissão de eleitores não inscriptos no respectivo caderno, porque, segundo o disposto no artigo 18.° § unico da lei de 23 de novembro de 1859, não eram eleitores legitimos, embora munidos de accordão ou sentença judicial, podendo talvez, esta circumstancia, que tambem se deu em outras assembléas do mesmo concelho, influir no resultado geral da votação

Na assembléa de Carlão fez-se a eleição com regularidade nos dois dias em que ella, durou, não obstante o que diz a testemunha de fl. 87 v. que por ser singular não faz prova, alem da inverosimilhança do seu depoimento; porém resente-se do mesmo erro de serem admittidos a votar eleitores apenas munidos de sentença judicial. Deu-se igual protesto e igual approvação do conselho de districto.

Na assembléa de Villa Verde aconteceu o mesmo, e nas restantes, a saber: Sanfins e Favaios houve regularidade, e não se deu protesto algum.

De accordo com este juizo feito ácerca das eleições d'este concelho, estão as actas eleitoraes que foram lidas e examinadas no Diario de Lisboa, por não existirem as proprias, que subiram á presença do governo de Sua Magestade, confrontadas com as actas das sessões do conselho de districto, protestos e mais papeis concernentes a este objecto, bem como o officio do delegado do procurador regio da comarca (documento n.° 6), d'onde consta não se haver

instaurado processo algum, e que importa uma formal negação da existencia de factos criminosos contra a liberdade e segurança dos eleitores, officio do commandante da força que ali se achava, remettido ao governo civil (documento n.° 7), declaração do mesmo a fl. 4 do appenso n.º 10, e depoimento de testemunhas a, fl. 72, 76, 112 e 139, que reunidos aos outros meios de prova já referidos, destroem ou supplantam qualquer verosimilhança que porventura se encontre nos depoimentos contrarios.

4.°

CONCELHO DE SANTA MARTHA DE PENAGUIÃO

N'este concelho houve uma só assembléa, assim como no biennio anterior. No dia 22 correu a eleição, segundo se vê das actas, com regularidade até ao ponto em que acabou a votação pela chamada geral. Finda esta operação, e fechadas as urnas, levantou-se discussão na assembléa sobre o modo por que deviam ser guardadas, querendo uns que ficasse na igreja com luzes, e as portas abertas para poderem ser vigiadas por todos, e sustentando outros, que as portas da igreja se deviam fechar, e d'esta opinião eram o administrador do concelho, o presidente da mesa, e um secretario. Desde logo se levantou voz de que o administrador do concelho tinha dentro da igreja um seu agente escondido para de noite falsificar as urnas, em virtude do que muitos correram a dar busca, e com effeito encontraram na sachristia um official da administração embuçado em uma capa, e cheio de teias de aranha (palavras textuaes da acta), e isto fez com que da altercação se passasse á desordem, forcejando os partidarios da auctoridade por se apoderarem das urnas e os outros por defende-las, do que resultou apparecer a urna que continha as listas para juiz ordinario esmagada em algumas partes, emquanto que a que continha as listas para vereadores appareceu sem signal algum de violencia, como se tivesse sido intacta.

Para apasiguar esta confusão e desordem foi preciso a interferencia da força armada, e os ditos presidente, secretario e um escrutinador abandonaram tudo, deixando as urnas entregues á assembléa, a qual deliberou que ficassem fechadas na fabrica da igreja, entregando-se a chave ao parocho.

No dia seguinte á hora legal reuniu-se a assembléa, e esperando hora e meia pelo presidente e mais mesarios que faltavam, appareceu o administrador do concelho com força armada, prohibido que se continuasse nas restantes operações eleitoraes por falta do presidente e mesarios já ditos; mas cedendo logo depois ás observações que alguns eleitores lhe fizeram, ordenou que a igreja se abrisse, e dentro d'ella se reunisse assembléa, elegendo quem substituisse os mesarios que faltavam, e assim se fez; mas como não houvesse as chaves, que os ditos mesarios tinham levado, quebraram-se os cadeados das urnas, e abertas estas, continuaram as operações eleitoraes, até que e administrador do concelho protestou e varios eleitores presentes contraprotestaram, seguindo-se depois a extracção das listas e o apuramento dos votos em fórma regular.

Isto mesmo que consta da acta acha-se repetido em um officio dirigido ao governador civil pelo presidente da camara, e dita assembléa, que se havia retirado.

Aquelle protesto subiu por meio de recurso ao conselho de districto, e este, em sessão de 30 de dezembro, approvou a dita eleição, desattendendo o referido protesto, por entender que não fôra viciada a votação, nem affectada a essencia da eleição, applicando para justificar a substituição dos mesarios faltosos o decreto outra vez citado de 30 da setembro de 1852.

É este o unico caso em que se vê o conselho de districto approvar uma eleição opposta ao partido denominado governamental, de que se dizem sequazes os vogaes que a approvaram; porém algumas pessoas têem dito que se deu esta excepção porque os vereadores eleitos se declararam governamentaes logo depois da eleição.

Pelo exame des provas não póde dizer-se que as haja plenas para se ter como certo que o administrador do concelho tentára falsificar as urnas, comtudo ainda apesar da exposição feita pelo official da administração (documento n.º 11), a quem tambem ouvi verbalmente, bem como ao outro individuo com quem se quiz abonar, ha presumpções vehementes de que o dito administrador teria feito alguma combinação com os já ditos mesarios e official para o fim sinistro que alguns eleitores suppunham, o que bem poderia realisar-se depois de fechada a porta da igreja, em que tanto se empenhava com os mesarios já referidos, que eram os clavicularios das urnas. Mas se isto não aconteceu, nem assim se póde certificar a pureza das urnas, depois da porfiada luta que sobre ellas se deu, tanto mais porque o commandante da força que ali acudiu informa que vira faltar da mesa uma urna, e apparecerem listas dispersas pelo chão, como se vê a fl. 8 do documento n.º 5, onde se lê seu depoimento, com o qual está de accordo o da testemunha a fl. 69, deprehendendo-se de tudo que a eleição fôra tumultuaria e que a força armada de todas as vezes que interveiu, o fez sómente para applacar a desordem e restabelecer o socego, recolhendo-se a quarteis depois de o conseguir.

As testemunhas, de fl. 55 v. 58, 60 e 62, imputando excessos e violencias á auctoridade local de accordo com o chefe superior do districto, baseiam as suas asserções no vago fundamento da notoriedade publica, emquanto que as de fl. 67, 68, 69 o 70 v. contradizem tudo isto por um modo mais conveniente; e attendendo-se a que a essencia e verdade dos depoimentos está na rasão d'elles, póde assegurar-se que da parte da auctoridade não houve os inculcados excessos, e muito menos connivencia ou auctorisação do chefe do districto, cujas ordens e instrucções em toda a parte, apparecem a recommendar o socego e manutenção da liberdade eleitoral.

(Continúa.)

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