APPENDICE Á SESSÃO DE 19 DE JULHO DE 1890 1378-A
O sr. Francisco José Machado: - Sr. presidente, permitta-uie v. exa. que eu comece por estranhar que não estejam presentes nesta camara os ministros das pastas a quem desejava referir-me, e v. exa. sabe, que ha umas, poucas de sessões, que antes da ordem do dia só está presente o sr. ministro da fazenda, e esse porque tem pendentes nesta casa projectos relativos á sua pasta, aliás estou convencido que faria o mesmo que os seus collegas.
V. exa. sabe perfeitamente que os meus collegas da opposição antes da ordem do dia desejam referir-se a assumptos dependentes de outras pastas, e não encontram presentes os ministros respectivos para que possam obter as respostas convenientes. Se v. exa. com a sua amabilidade e auctoridade póder conseguir, que os srs. ministros venham aqui para responderem às perguntas que temos necessidade de lhes fazer, v. exa. obsequeia-me muito e aos meus collegas.
V. exa. sabe, que a ultima vez que tive a palavra para antes da ordem do dia foi para me dirigir ao sr. ministro da marinha, relativamente ás armações do Peniche, e v. exa. sabe que as respostas que o sr. ministro da marinha deu não me satisfizeram, e tanto que pedi a v. exa. a palavra para antes de se encerrar a sessão, visto a maioria não ter consentido que eu respondesse logo a s. exa.; mas tendo-me o sr. ministro da marinha declarado que o seu estado de saúde não lhe permittia estar até muito tarde na camara, por essa rasão não pude usar da palavra, e esperava que s. exa. voltasse a esta camara antes da ordem do dia para continuar n'esta questão que é bastante grave e séria, como a camara já deve estar convencida.
Uma voz: - O sr. ministro está doente.
O Orador: - Sinto muitissimo os incommodos de saude de s. exa. e desejarei que melhore com a rapidez que s. exa., os seus amigos e nós todos desejâmos. Creio que os outros membros do gabinete estão sãos e escorreitos, gosando de perfeita saude, mas apesar d'isso não vemos aqui nem o sr. presidente do conselho, nem nenhum dos outros ministros a não ser o sr. ministro da fazenda, e isto não obstante não haver hoje camara dos dignos pares. Não vejo premente nem o sr. ministro das obras publicas, nem os srs. ministros das outras pastas; no entretanto como eu fallo para a camara, e tambem para o paiz, cujos interesses estou aqui advogando, vou referir-me a alguns dos pontos a que o sr: ministro da marinha aqui tocou o outro dia para que o paiz saiba como o governo trata os interesses publicos e os do meu circulo. O sr. Julio de Vilhena declarou aqui muito terminantemente que não revogava nenhum dos despachos dos seus antecessores, fossem de que parcialidade politica fossem. S. exa. referiu-se ao assumpto que eu aqui tratei relativamente ás armações de pesca de Peniche.
Esta theoria é tão extraordinaria, que parece impossivel que um homem de talento, como é o sr. ministro da marinha, a venha aqui sustentar.
Pois então os ministros actuaes revogam os seus próprios decretos e o sr. Julio de Vilhena diz que não revoga os despachos dos seus antecessores?! (Apoiados.)
Pois então os ministros são infalliveis? Eu creio, que nenhum dos membros do partido regenerador póde dizer que nunca se enganou. (Apoiados.)
Pois é muito possivel, que o sr. Arouca venha dizer que se tem enganado e muitas vezes e isso não fica mal a s. exa. nem a ninguém. O que fica mal é errar e persistir no erro. Pois então quando se reconhecer que um ministro commetteu uma injustiça, não se ha de revogar o despacho para reparar essa injustiça? (Apoiados.)
Mas o que é notavel é esta divergencia no modo de pensar do governo! (Apoiados.) Os ministros não têem programma? Não têem uniformidade do pensar e de proceder? Então reina a anarchia; cada um faz o que lhe vem á cabeça?
O paiz já sabia isso, agora o que não esperava de certo, era que, um dos ministros o viesse aqui confessar. Todos sabem, que o sr. ministro das obras publicas revogou, decretos seus e dos seus antecessores.
O sr. Julio de Vilhena não revoga nada, embora reconheça que o seu antecessor praticou uma flagrantissima injustiça.
Pela pasta do sr. Julio de Vilhena não ha meio de se obter justiça.
É isto, que nós conseguimos saber das declarações de s. exa.
S. exa. ha de comprehender, que essa theoria é insustentavel, mesmo relativamente á sua pessoa; porque é s. exa. imaginar-se infallivel, e creio que o illustre ministro não tem tal pretensão.
O sr. Julio de Vilhena nem póde dizer que esse modo de proceder entra no programma do governo, porque os. seus collegas revogam quasi diariamente actos seus praticados na vespera.
Como é, pois, que o sr. ministro da marinha quer proceder de modo contrario? É evidente, que s. exa. mantendo se dentro dos limites restrictos das declarações que fez á camara, entende que esse é o modo de governar. Póde ser um systema mais ou menos censuravel, mas no emtanto é um systema.
N'esse caso censura s. exa. os actos praticados, pelos seus collegas, que procedem de modo differente, e então não póde o sr. Julio de Vilhena fazer parte do mesmo gabinete, porque se não entende com elles.
Veja lá s. exa. em que fica.
Quando o governo actual tomou conta das pastas, catava, á marcado por um decreto do seu antecessor, dia para a arrematação em praça publica da construcção da estrada de Braga a Chaves. O sr. Arouca, ministro das obrçs publicas, suspendeu essa arrematação, e d'ahi a pouco revogou essa sua suspensão, mandando novamente abrir concurso para se construir a estrada. (Apoiados.)
Estava tambem marcado dia para a arrematação de um paredão ou quebra-mar na Povoa de Varzim e do mesmo modo publicou o sr. Arouca um decreto revogando uma determinação do seu antecessor e mandando suspender a arrematação.
Dias depois revoga o seu proprio acto, e volta atraz, mandando abrir concurso para a construcção d'aquella obra. (Apoiados.)
O sr. Arouca fez o mesmo a respeito da ponte de S. João do Loure sobre o Vouga no districto de Aveiro. Do mesmo modo procedeu relativamente á ponte da Chamusca.
E não quero citar mais exemplos, porque estes me bastam.
Pois o sr. Arouca revogou os seus proprios decretos e os dos seus antecessores para fazer injustiças, exercendo pressões nos eleitores, e o sr. Julio de Vilhena não ha de proceder do mesmo modo para livrar da fome os desgraçados maritimos de Peniche?
Por consequencia, o sr. ministro da marinha não póde sustentar esta sua doutrina, que. de mais a mais é prejudicial aos interesses publicos (Apoiados.) e vae de encontro ao programma do governo, de que s. exa. faz parte. (Apoiados.)
O sr. Júlio de Vilhena declarou tambem que não quer tratar dos negocios de Peniche!
Eu fiquei espantado! Pois Peniche não pertence a este paiz? (Apoiados.) Os negocios de Peniche não se reflectem no resto do paiz? (Apoiados.) Mas então a que paiz pertence Peniche? E, as contribuições que Peniche paga não entram para os cofres publicos? (Apoiados.) Pois aquella terra não é portugueza? (Apoiados.) Pois o sr. ministro póde dizer, que não se importa com os negocios desta terra ou d'aquella localidade portugueza? O sr. ministro não póde dizer isto.
(Apoiados.) Salvo se s. exa. não quer ser ministro de Peniche, e então não se ha de importar com nenhum dos negócios que lhe dizem respeito.
S. exa. ha de importar-se com os negocios de Peniche e
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