O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1507

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os exmos. srs.

Francisco Augusto Florida de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dois officios do sr. ministro dos negocios estrangeiros e um do ministerio da fazenda. - Representações mandadas para a mesa pelos srs. Avellar Machado, Silva Cardoso e José Borges. - Apresentam requerimentos de interesse publico os srs. barão de Ramalho, Teixeira de Sampaio, Albino Montenegro, Figueiredo Mascarenhas e Azevedo Castello Branco. - Justificações de faltas dos srs. Mendes Pedroso, Avellar Machado, Avelino Calixto, Pinto de Mascarenhas, visconde de Reguengos, J. A. Neves e Martens Ferrão. - Resolve-se, a requerimento do sr. Avellar Machado, que sejam publicadas no Diario do governo as duas representações mandadas para a mesa por este sr. deputado, que faz algumas considerações para as justificar. - O sr. Teixeira Sampaio insta pela remessa de uns documentos. - O sr. Mendes Pedroso apresenta um projecto de lei, acompanhando o de diversas considerações. - O sr. A. da Rocha Peixoto manda para a mesa um parecer da commissão de legislação penal e pede dispensa do regimento para entrar em discussao. - O sr. Goes Pinto allude á pretensão do capitão de cavallaria, Sá Nogueira, e pede vista dos requerimentos que se oppõem a essa pretensão. - Responde o sr. presidente. - O sr. Sousa e Silva, queixando-se da falta de remessa de uns documentos que pediu pelo ministerio da fazenda, pede que se lhe conceda a palavra quando estiver presente o respectivo ministro. - O sr. Azevedo Castello Branco apresenta um projecto de lei e expõe as rasões que o justificam. - Resolve-se que entre em discussão o parecer apresentado pelo sr. Rocha Peixoto. - É approvado sem discussão. - A camara approva o requerimento do sr. José Borges para que sejam publicadas no Diario do governo as duas representações que mandou para a mesa. - Apresenta um projecto de lei o sr. Manuel d'Assumpção. - Envia para a mesa uma proposta, que fica para segunda leitura, e refere-se á cobrança do real de agua o sr. Castro Mattoso. - Responde o sr. rninistro da fazenda. - O sr. Carrilho informa ácerca do andamento de um projecto de lei do sr. José Borges. - Mandam para a mesa pareceres de commissões os srs. Scarnichia e Franco Castello Branco.
Na ordem do dia continua em discussão na generalidade e orçamento rectificado. - Usa largamente da palavra, combatendo-o, o sr. Veiga Beirão - Responde-lhe o sr. A. Carrilho, na qualidade de reitor. - A requerimento do sr. Santos Viegas e aggregado á commissão de instrucção primaria e secundaria o sr. Rocha Peixoto. - Apresenta duas propostas de lei o sr. ministro da fazenda.

Abertura - Ás duas horas e um quarto da tarde.

Presentes á chamada - 39 srs. deputados.

São os seguintes: - Agostinho Lucio, Albino Montenegro, Silva Cardoso, Sousa e Silva, A. J. da Fonseca, Fontes Ganhado. A. M. Pedroso, Avelino Calixto, Barão de Ramalho, Conde de Thomar, Conde do Villa Real, E. Coelho, Sousa Pinto Basto, Goes Pinto, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Ponces de Carvalho, Simões Ferreira, Teixeira Sampaio, Avellar Machado, Azevedo Castello Branco, José Frederico, Lobo Lamare, Luciano Cordeiro, Luiz de Lencastre, Luiz Ferreira, Bivar, Luiz Dias, Manuel de Medeiros, M. P. Guedes, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Gonçalves do Freitas, Sebastião Centeno, Visconde de Balsemão, Visconde das Laranjeiras, Wenceslau de Lima e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, A. da Rocha Peixoto, Torres Carneiro, Alfredo Barjona de Freitas, Antonio Centeno, Garcia Lobo, A. J. d'Avila, Antonio Ennes, Lopes Navarro, Cunha Bellem, Jalles, Moraes Machado, Carrilho, Santos Viegas, Sousa Pavão, Seguier, A. Hintze Ribeiro, Augusto Poppe, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Pereira Leite, Bernardino Machado, Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Conde da Praia da Victoria, Cypriano Jardim, Elvino de Brito, Emygdio Navarro, E. Hintze Ribeiro, Fernando Geraldes, Vieira das Neves, Correia Barata, Mouta e Vasconcellos, Castro Mattoso, Mártens Ferrão, Guilherme de Abreu, Barros Gomes, Matos de Mendia, Sant'Anna e Vasconcellos, Silveira da Motta, Costa Pinto, Baima de Bastos, Augusto Teixeira, Scarnichia, Franco Castello Branco, João Arroyo, Teixeiva de Vasconcellos, Sousa Machado, J. Alves Matheus, J. A. Neves, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Coelho de Carvalho, Ferreira de Almeida, José Borges, Elias Garcia, Laranjo, Pereira dos Santos, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Ferreira Freire, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Julio de Vilhena, Lourenço Malheiro, Reis Torgal, Luiz Osorio, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, M. J. Vieira, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Pedro Franco, Rodrigo Pequito, Dantas Baracho, Tito de Carvalho, Visconde de Alentem, Visconde de Ariz, Visconde de Reguengos o Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Agostinho Fevereiro, Anselmo Braamcamp, Antonio Candido, Pereira Côrte Real, Pereira Borges, Pinto de Magalhães, Almeida Pinheiro, Urbano de Castro, Augusto Barjona de Freitas, Neves Carneiro, Barão de Viamonte, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Ribeiro Cabral, Estevão de Oliveira, Filippe de Carvalho, Wanzeller, Frederico Arouca, Guilhermino de Barros, Franco Frazão, J. A. Pinto, J. C. Valente, Melicio, Souto Rodrigues, Ribeiro dos Santos, Ferrão do Castello Branco, Amorim Novaes, Correia de Barros, Dias Ferreira, J. M. dos Santos, Pinto de Mascarenhas, Lopo Vaz, Luiz Jardim, M. da Rocha Peixoto, Aralla e Costa, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Pedro de Carvalho, Pedro Correia, Santos Diniz, Pedro Roberto, Pereira Bastos e Vicente Pinheiro.

Acta - Approvada sem reclamação.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Ministerio dos negocios estrangeiros. - Direcção politica. - Lisboa, 8 de maio de 1885. - Illmo. e exmo. Sr. - Tenho a honra de communicar a v. exa., em resposta ao officio de 21 de abril ultimo, sobre a interpellação do sr. deputado Elvino José de Sousa e Brito, ácerca dos negocios relativos no real padroado do Oriente, que me considero habilitado a responder á referida interpellação, logo que o sr. presidente da camara dos senhores deputados a der para ordem do dia. -Deus guarde a v. exa. = José Vicente Barbosa du Bocage. - Sr. secretario da camara dos senhores deputados.
Á secretaria.

2.° Ministerio dos negocios estrangeiros. - Lisboa, 8 de maio de 1883. - Illmo. e exmo. sr. - Tenho a honra de communicar a v. exa., em resposta ao officio de 6 do corrente mez, sobre a interpellação do sr. deputado Zophimo Consiglieri Pedroso, ácerca da exclusão de Portugal da conferencia de Paris, destinada a regularisar a neutralidade do canal de Suez, que me considero habilitado a responder a referida interpellação logo que o sr. presidente da camara dos srs. deputados a der para ordom do dia. -

80

Página 1508

1508 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Deus guarde a v. exa. = José Vicente Barbosa du Bocage. - Sr. secretario da camara dos senhores deputados.
Á secretaria.

3.° Do ministerio da fazenda devolvendo, informado, o projecto de lei n.° 32-C, relativo ao lançamento e cobrança da decima de juros dos capitaes das irmandades, confrarias ou corporações de mão morta e de beneficencia.
Á secretaria.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da sociedade agricola do districto de Santarem, contra algumas disposições do tratado de commercio com a Hespanha.
Apresentada pelo sr. deputado Avellar Machado, enviada á commissão de negocios externos, e mandada publicar no Diario do governo.

2.ª Dos primeiros aspirantes, encarregados do serviço da estação telegraphica principal de Lisboa, pedindo serem promovidos a segundos officiaes, com o ordenado e vencimento de exercicio equivalentes.
Apresentada pelo sr. deputado Avellar Machado, enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

3.ª Dos magistrados e empregados judiciaes da camara da Guarda, pedindo serem isentos do pagamento da contribuição industrial, ficando sujeitos ao imposto de rendimento.
Apresentada pelo sr. deputado Silva Cardoso e enviada á commissão de fazenda.

4.ª Dos mesarios das confrarias de Nessa Senhora do Rosario, erecta na Sé primás de Braga, e de S. Gregorio, da freguezia de S. Pedro de Maximinos, pedindo que seja convertido em lei o projecto apresentado pelo sr. deputado José Borges, na sessão de 30 de março ultimo, relativo ao lançamento e cobrança da decima de juros dos capitaes das irmandades, confrarias ou corporações de mão morta e de beneficencia.
Apresentadas pelo sr. deputado José Borges, enviados á commissão de fazenda, e mandadas publicar ao Diario do governo.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, seja remettida a esta camara, por copia ou no original, a representação dirigida ao governo, em fevereiro ultimo, pela camara municipal de Angra do Heroismo, sobre a conveniencia de desviar uma parte da sua receita de viação, e enviada depois a commissão de obras publicas, a que se acha affecto um projecto de lei por mim apresentado no sentido da mesma representação. - Barão do Ramalho.

2.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas; sejam por copia, enviadas a esta camara, quaesquer propostas que o concessionario do caminho de ferro de Foz Tua a Mirandella tenha submettido ou venha a submetter a approvação do governo, tendentes a modificar ou alterar o projecto ou traçado que serviu de base ao concurso e adjudicação do referido caminho de ferro, e bem assim quaesquer pareceres que a junta consultiva de obras publicas e minas de quando ouvida, sobre taes propostas; e ainda as resoluções que o governo tome ácerca das mesmas. = O deputado por Alijó, Joaquim Teixeira Sampaio.

3.º Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja com urgencia enviada a essa camara copia do decreto que reformou o tenente da Africa occidental Bento de Andrade Cabral, e bem assim copia do parecer da junta de saude de Angola que o inspeccionou. = Albino Montenegro.

4.° Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, seja com urgencia remettido a esta camara o processo instaurado contra Francisco Jose Diniz, ex-tenente da guarnição da provincia de Moçambique, pelo crime de se ter dado uma parte falsa contra um sargento, e de se ter desfalcado o cofre do conselho administrativo do respectivo batalhão. = Albino Montenegro.

5.º Requeiro que pelo ministerio da marinha, sejam enviados com urgencia a esta camara copia dos pareceres da commissão de pescarias, e despachos do sr. ministro da marinha sobre a questão levantada este anno entre as armações de pesca de atum Oiro e Pedra de Gallé, e bem assim de quaesquer telegrammas trocados entre o ministerio da marinha ou o sr. ministro da marinha e o chefe do departamento do sul. = José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas.

6.° Requeiro que, pelo ministerio da justiça, seja enviada a esta camara, com a maior urgencia, certidão passada por cada um dos escrivães da comarca de Valle Passos, d'onde conste:
I. Qual o numero de causas civeis pendentes em conclusão a data d'este requerimento;
II Qual a data desde que se acham conclusas;
III Se d'aquellas que se acham conclusas ha mais tempo que o determinado na lei, o delegado do procurador regio requereu se lhe entregasse certidão.
Sala das sessões da camara dos deputados, 3 de maio de 1885. = José Azevedo Castello Branco.
Mandaram-se expedir.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Declaro que, por motivo justificado, não pude comparecer á sessão de sabbado ultimo, 9 do corrente. = O deputado por Santarem, Antonio MendeS Pedrozo.

2.ª Declaro a v. exa. e á camara, que tenho faltado ás ultimas sessões por motivo fustificado. = Avellar Machado, deputado pelo circulo n.° 86.

3.ª Declaro que, por motivo justificado, faltei a algumas sessões. = Avelino Calixto.

4.ª Declaro que o sr. deputado José Soares Pinto Mascarenhas tem faltado a algumas sessões por motivo justificado. = Avelino Calixto.

5.ª Declaro a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, não tenho comparecido a algumas das sessões passadas. = O deputado, Visconde de Reguengos.

6.ª Declaro que tenho faltado ás sessões d'este mez por motivo justificado. = J. A. Neves.

7.ª Declaro que faltei ás sessões dos dias 8 e 9 do corrente mez por motivo justificado. = Francisco Roberto Mártens Ferrão.
Para a acta.

O sr. Avellar Machado: - Mando para a mesa uma declaração de que faltei ás ultimas sessões d'esta camara por motivo justificado.
Mando tambem para a mesa uma representação dos primeiros aspirantes da estação telegraphica principal de Lisboa, pedindo ao parlamento se digne resolver que lhes se-

Página 1509

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1509

ja applicavel o § unico do artigo 47.º da carta de lei de 7 de julho de 1880.
E tão justa, a meu ver, a pretensão dos requerentes, e está ella tão bem fundamentada na representação a que me acabo de referir, que, sem duvida, a camara a ha de tomar na consideração que merece, praticando d'este modo um acto de verdadeira equidade.
Finalmente, tenho a honra de apresentar á elevada consideração de v. exa. e da camara uma representação da illustrada e benemerita sociedade agricola do districto de Santarem, contra, algumas disposições do tratado de commercio ultimamente celebrado com a Hespanha, hoje submettido a sancção do parlamento.
As clausulas que a sociedade agricola desejaria ver estabelecidas no tratado sobre as mercadorias em transito e para garantia e verdadeiro conhecimento de nacionalidade dos productos que se exportassem pelos nossos portos, ou pelos portos hespanhoes, resumem-se habilmente no seguinte trecho da representação:
(Leu.)
Quando se discutir o tratado de commercio com a Hespanha terei occasião de desenvolvidamente apresentar a minha opinião ácerca do importante assumpto de que se trata; mas como membro de uma das commissões parlamentares que lhe deu parecer favoravel, creio poder asseverar, sem commetter delicto de inconfidencia, que o honrado ministro dos negocios estrangeiros declarou perante ellas que não ratificaria o tratado sem que, por um accordo previo, ficasse bem acautelada a effectiva reciprocidade da convenção de transito, e bem assim a questão das marcas indoleveis e obrigatorias nas vasilhas ou taras em que forem exportados pelos nossos portos quaesquer productos de origem hespanhola.
Tambem o illustrado ministro a que me refiro se comprometteu a usar da sua legitima influencia junto dos seus collegas no governo para que as tarifas do transporte nos caminhos de ferro de norte e leste, para os productos hespanhoes, não sejam em absoluto, ou relativamente; inferiores ás que forem approvadas para o transporte de productos similares de origem nacional.

Ácerca da abolição do imposto de exportação para o nosso azeite, eu espero apresentar opportunamente á camra um projecto de lei n'este sentido assignado por alguns dos nossos collegas que, como eu, acham perfeitamente juntas as sensatas considerações que a este respeito faz a sociedade agricola de Santarem.
Pondera ainda a mesma sociedade, que o imposto a pagar em Hespanha por cada cabeça de gado sumo que exportamos, em logar do ser arbitrario, e de 1$080 reis, deveria ser de 350 ou 360 réis, isto é proporcional ao valor medio de cada cabeça de gado importado e exportado, aceitando o imposto de 90 réis por cada cabeça que importamos.
Sobre este ponto não foi infelizmente possivel ao habil negociador do tratado obter do governo hespanhol a desejada reciprocidade; no entanto, como a propria representação reconhece, as condições em que ficâmos não prejudicam sensivelmente esta ramo importante da nossa industria, que, se não melhorou, tambem não peirou com o tratado.
Vê se, pois, que uma parte das justas aspirações da sociedade agricola de Santarem serão attendidas, pois que o tratado não será ratificado sem que ellas fiquem bem clara e explicitamente assentos.
A outra parte não o poderá infelizmente ser, porque traduz as concessões que fomos obrigados a fazer em troca de outras que Hespanha nos fez.
Repito, quando se discutir o tratado de commercio, que já está na ordem do dia, estas questões serão convenientemente explanadas e espero poderei cabalmente demonstrar que as negociações para elle cabalmente dirigidas com consciencia e zêlo.
Por ultimo rogo a v. exa. se digne consultar a camara se permitte a publicação no Diario do governo não só da representação da sociedade agricola de Santarem, que se acha perfeita e correctamente elaborada, mas tambem da dos aspirantes telegraphicos da estação principal de Lisboa.
Consultada a camara, resolveu-se que as representações sejam publicadas no Diario do governo.
A justificação vae publicada na secção competente.
O sr. Teixeira de Sampaio: - Mando para a mesa um requerimento, pedindo pelo ministerio das obras publicas, quaesquer propostas já apresentadas ou que o venham a ser pelo concessionario do caminho de ferro do Tua a Mirandella para alterações no projecto que serviu de base a adjudicação e bem assim quaesquer pareceres da junta consultiva de obras publicas e resoluções do governo sobre o assumpto.
A começar pela portaria de 19 de Janeiro de 1883 é tão extraordinario o processo seguido para modificar o traçado d'aquelle caminho de ferro que eu tenho fundados receios de que appareçam reclamações e protestos por parte dos respectivos concessionarios.
Como estou resolvido a apreciar, quanto em mim couber, quaesquer modificações que sejam propostas, por isso e que eu requeiro a remessa d'estes documentos.
Peço a v. exa. se digne dar ao meu requerimento o destino conveniente.
E visto estar com a palavra, peço tambem a v. exa. o favor de me dizer se já vieram os documentos que pedi pelo ministerio das obras publicas em uma das sessões do mez de Janeiro, e que se referem ao mesmo caminho de ferro.
O sr. Secretario (Sebastião Centeno): - Os documentos a que v. exa. se refere. foram pedidos em officio n.° 12 de 9 de Janeiro e ainda não vieram.
O Orador: - Quando pedi esses documentos, declarei que me satisfazia que me fossem remettidos, não todos por uma só vez, mas á medida que estivessem promptos.
Apesar disso, são passa-los quatro mezes, e, até; agora, nenhum chegou ainda, como a mesa acaba de informar.
Vejo, por isso, que tenho necessidade de renovar a minha instancia, para que se não prolongue mais a demora na remessa.
O sr. Mendes Pedroso: - Em primeiro logar, mando para a mesa uma justificação de falta; e aproveitando o ensejo de estar com a palavra, permitta mo v. exa. que eu faça algumas considerações a respeito de dois assumptos, ácerca dos quaes têem vindo varias representações a esta camara. Refiro-me á creação das escolas e á questão cerealifera.
Parece-me que a proposta de lei apresentada ao parlamento pelo illustre ex-ministro das obras publicas, o sr. Antonio Augusto de Aguiar, instituindo as escolas praticas de agricultura, deve merecer toda a attenção da camara, porque eu creio que tal proposta póde, n'um futuro não muito remoto, como que transformar os actuaes processos de cultura, e concorrer poderosamente para a resolução favoravel de varios problemas agricolas, e, conseguintemente tambem para os que se ligam á questão cerealifera.
Sr. presidente, a adopção d'esta proposta não importa para o thesouro um notavel augmento de despeza, e, segundo p parecer apresentado pelo conselho escolar do instituto agricola, collocando se uma d'estas escolas em cada um dos districtos, onde existem quintas regionaes de agricultura, será facil e pouco dispendiosa a sua installação, e o paiz póde auferir grandes beneficios d'este novo ensinamento.
Se no tempo de Augusto os pontos precisavem um Mecenas que os protegesse, as nossas propostas na camara estão sujeitas a um eterno olvido, quando mão robusta as não ampara. D'esta, bom Mecenas seria com effeito o seu auctor, se ainda tivesse voz nos concelhos da

Página 1510

1510 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

corôa, ou ao menos n'esta casa do parlamento, mas, como isto se não dá agora, receio muito pela sorte que a espera.
Não deixarei eu, comtudo, de rogar á illustre commissão, que se apresse em trazer á camara um parecer a tal respeito, parecer que espero lhe seja favoravel, não só porque, como já disse, esta instituição não será muito onerosa para o estado, mas tambem porque as escolas praticas de agricultura, alem do seu valor proprio, devem tomar um logar muito importante na resolução das questões agricolas, e da crise cerealifera, cuja repetição deve evitar se pela combinação dos meios mais adequados.
Sr. presidente, se na sessão passada eu estivesse presente, quando um distincto parlamentar, o sr. Julio de Vilhena apresentou uma representação da camara municipal de Beja pedindo augmento de imposto sobre a importação dos cereaes estrangeiros, ter-me-ia logo associado ao pedido dirigido a camara pelo nobre deputado.
Quando propuz ao parlamento que fosse nomeada uma commissão de inquerito para estudar os meios mais apropriados a resolver a crise cerealifera, não o fiz porque julgasse menos urgente a solução deste assumpto, mas porque entendi que uma commissão especial, poderia occupar-se d'elle muito mais attentamente, e porque eu não desejava que uma resolução precipitada podesse trazer o augmento no preço do pão, alimento de primeira necessidade, sobretudo para as classes pobres e trabalhadoras.
Os novos e multiplicados encargos que em seguida foram commettidos a commissão levaram-me logo a acreditar que ella não poderia apresentar o resultado dos seus trabalhos durante a sessão actual.
A crise cerealifera, ou pelo menos os graves embaraços em que ha algum tempo se encontram os agricultores portugueses, tem uma causa proxima que é de todos conhecida: é a concorrencia dos trigos estrangeiros, e por um preço tão baixo, ainda mesmo acrescido do actual imposto, que os nossos lavradores não podem competir com elles nos principaes mercados do paiz.
Ora para combater de prompto este mal gravissimo, e a causa occasional, que o provoca eu não vejo meio mais efficaz que o augmento moderado nos direitos de importação para o trigo estrangeiro, combinado por tal fórma com a que é applicado a importação das farinhas que d'esta medida não resulte augmento do preço no pão.
E não se pense que esta solução que é provisoria, e que julgo necessaria, porque é urgente acudir com algum soccorro á classe agricola, uma das mais numerosas, e importantes do nosso paiz, vae brigar com a resolução tomada de ouvir a tal respeito a commissão de inquerito.
Esta tem muito que fazer, tem variadissimos assumptos a estudar.
É ella quem nos ha de dizer as principaes rasões porque os nossos agricultores não podem produzir o seu trigo por mais baixo preço, e concorrer com os cereaes estrangeiros; é ella quem ha de propor os variados remedios para este estado verdadeiramente anormal n'um paiz agricola, onde existem do ferazes campinas.
Deverá fazer-se a cultura intensiva? Deverá a cultura do trigo limitar-se aos terrenos de alluvião e de primeira qualidade? Deverão as sementeiras d'este genero ser substituidas pelas de outros cereaes, ou pelas de leguminosas? Deverão formar-se associações para a montagem de fabricas de moagem e trazer aos principaes mercados pão fabricado com farinhas nacionaes? Tudo isto são importantes questões commetidas á commissão de inquerito, cuja missão é muito mais ampla, e deve ser completa.
O que é certo, é que apesar do trigo estar por um preço excessivamente baixo, como já disse, o pão ainda está caro, e o seu custo não se acha em relação com o do trigo. Este, vende-se por 500 réis o antigo alqueire, proximamente 50 réis o kilogramma, e para isso precisa ser da melhor qualidade; a sua procura é pequena.
O pão está, termo medio, a 77 réis o kilogramma, por que se algum menos bem fabricado se vende a 65 réis, tambem o melhor se paga por 90 réis.
Ora isto provem, e a discussão ha mezes travada na imprensa, documentos e estatisticas publicadas, provam-o exuberantemente, do preço elevado que as farinhas conservam, e do lucro excessivo que, aquelles que as fabricam estão auferindo vendendo-as, embora a praso, pelo preço apenas inferior ao que, com a protecção elevada que agora tem, ellas poderiam vir do estrangeiro.
Esta, e não tanto o ganho dos padeiros, julgo ser a verdadeira causa do preço elevado que o pão conserva.
Parecia-me pois, que se tomassemos já a resolução de augmentar um pouco o imposto sobre o trigo conservando como está o que pesa sobre as farinhas, de modo que continuassemos dando as fabricas de moagem uma protecção limitada, e não tão larga como hoje se lhe dispensa, mas apenas a necessaria para evitar a ruina d'aquellas industrias, o que eu não quereria por modo algum, alcançariamos immediatamente um resultado proveitoso para os lavradores, facilitando-lhe a saida dos seus trigos, sem que d'ahi podesse originar se o augmento no preço do pão.
N'estas brevissimas considerações fundamento o projecto de lei que tenho a honra de mandar para a mesa, e pelo qual e elevado o imposto sobre o trigo estrangeiro de 10 a 14 réis.
(Leu.)
D'este modo a protecção ás fabricas de moagem fica sendo de 2 réis em vez de 6, e parece me que é protecção sufficiente, porque me consta que estas nossas fabricas estão montadas como as mais perfeitas dos outros paizes, podendo fornecer os seus productos nas mesmas condições.
Se, porem, a commissão onde este projecto deve receber parecer, e a camara, entenderem que tal protecção deve ser um pouco acrescida só me resta acatar a sua sabia deliberação.
Ouvi tambem que na mesma sessão em que fallou o sr. Vilhena sobre este assumpto, o illustre ministro declarára, que apresentaria ainda na sessão um projecto de lei a tal respeita.
Sendo assim não terei duvida de retirar o meu projecto, porque não me inspira a vaidade na sua apresentação, e só o desejo de ser util a classe agricola, e ao meu paiz.
Tenho dito.
A justificação vae publicada na secção competente. O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Alfredo Peixoto: - Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação penal, e attendendo á sua manifesta justiça, pedia a v. exa. que tivesse a bondade de consultar a camara sobre se permitte que, despensando-se o regimento, entre este parecer desde já em discussão.
O sr. Presidente: - Opportunamente será consultada a camara sobre o requerimento do sr. deputado.
O sr. Barão de Ramalho: - Mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo.
Vae publicado na secção competente.
O sr. Goes Pinto: - Desejava fazer algumas perguntas aos srs. ministros da fazenda e da marinha, mas como s. exas. não estão presentes reservo-me para melhor opportunidade.
E agora, já que estou com a palavra, vou fazer a v. exa. um pedido.
Sei, sr. presidente, que foi mandado para a mesa um projecto de lei que diz respeito ao capitão de cavallaria, Miguel de Sá Nogueira.
Constando-me que esse projecto foi a imprimir, e que, portanto, será brevemente distribuido, peço a v. exa. que antes de elle ser dado para ordem do dia, me seja dada vista de todos os requerimentos dos officiaes de cavallaria que foram presentes á camara contra a pretensão d'aquelle capitão.

Página 1511

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1511

Faço este pedido a v. exa. no caso de estar o de deferil-o nas suas attribuições; no caso contrario peco a v. exa. queira consultar a camara sobre se consente que antes de ser dado para ordem do dia o projecto a que me refere, me seja facultado rever todos os requerimentos a que alludi.
O sr. Presidente: - Os requerimentos a que o sr. deputado se refere, foram enviados á commissão respectiva.
Eu consultarei o sr. presidente ou o sr. secretario d'essa commissão sobre se ella póde dispensar os mesmos requerimentos, para serem entregues a s. exa.
O Orador: - Desejo unicamente vel-os antes da discussão do projecto.
O sr. Sousa e Silva: - Peço a v. exa. o obsequio de me dizer se já vieram os esclarecimentos que, pelo ministerio da fazenda, eu requeri, relativamente ao tabaco insulano, em uma das ultimas sessões do mez de Janeiro, e cuja renovação apresentei nos primeiros dias do mez de março.
O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): - O requerimento do sr. deputado foi expedido em 3 de fevereiro, e a renovação em 27 de março, mas ainda não vieram os esclarecimentos.
O Orador: - Eu não peço a v. exa. que renove a instancia, porque já vejo que será trabalho baldado; mas peço queira reservar-me a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda, a quem desejo fazer este pedido pessoalmente. Talvez assim consiga ver satisfeito o meu requerimento que, apesar de repetido em tres sessões, ainda não obteve solução.
(S. exa. não reviu as notas tachugraphicas.)
o sr. Azevedo Castello Branco: - Mando para a mesa tres requerimentos pedindo esclarecimentos pelo ministerio da justiça.
Estes documentos hão de servir para fundamental um pedido de syndicancia que desejo que se faça a actos praticados pelo delegado do procurador regio da comarca do Valle Passos.
Não desejo lançar suspeições sobre o caracter de pessoa alguma.
Entretanto, tambem não estou auctorisado a duvidar do caracter dos individuos que por mais de uma vez, se me têem queixado das prepotencias e de actos de pouca seriedade praticados pelo actual delegado.
N'estas condições entendo, para honra d'aquelle magistrado, e para satisfazer a justiça de todos, que o nobre ministro da justiça será o primeiro interessado em mandar os esclarecimentos que peço.
Aproveitando a occasião de estar com a palavra, tenho a honra de mandar para a mesa um projecto de lei tendente a organisar o quadro de saude militar.
Parecerá estranho que tendo-se feito ha pouco tempo uma reforma do exercito, na qual foi attendida a maior parte das exigencias da organisação do serviço militar, eu venha já lançar na corrente um projecto de lei que tende a melhorar especialmente a organisação do quadro medico castrense.
Para justificar o procedimento que pode parecer estranho, attendendo a que tive a honra de defender os trabalhos da commissão, devo dizer, com quanto nós todos o saibamos, que a commissão encarregada de organisar a reforma do exercito se compunha de cavalheiros a todos os respeitos eminentes na sciencia militar.
Entretanto, por um conjuncto de circumstancias que não quero nem desejo apreciar, o facto foi que a corporação medico-molitar não teve a honra de ser ouvida, nem de ser representada directamente n'essa commissão.
D'ahi resultou que a organisação do serviço de saude militar, estando, quero crel-o, completamente com a ordem de idéas expendidas por essa commissão nos seus trabalhos, aliás importantes, foi todavia descurada em detalhes que simplesmente os homens de sciencia poderiam apreciar condignamente.
É exactamente essa deficiencia que eu venho tentar remediar apresentando um projecto de lei onde se consignam tres inovações importantes.
Uma d'ellas é a creação do internato parta o serviço dos hospitaes permanentes.
Mas para não sobrecarregar desde já, o thesouro com uma despeza que não será avultada, mas que é importante, pretendo simplesmente crear um internato no hospital de Lisboa.
A outra inovação tem por fim fixar o limite maximo da idade para a entrada no serviço medico militar.
Em geral os medicos militares entram para o serviço aos trinta annos; e por via de regra trinta annos depois estão ainda no posto de cirurgiões móres, isto é, já em idade que difficilmente se poderá coadunar com a hypothese d'esse serviço em campanha.
Mas como a reforma facultada pela lei nenhumas vantagens offerece, ninguem se reforma, ainda mesmo na idade avançada, de onde resulta que no serviço medico-militar ha facultativos que têem o delicioso posto de cirurgiões mores aos setenta, setenta e um e setenta e dois annos.
É n'estas circumstancias que eu apresento um projecto de lei tendente a modificar esta situação consignando o principio da diuturnidade de serviço para o effeito da reforma, estabelecendo o praso de vinte e cinco a trinta annos para essa reforma no posto de cirurgiões móres, de brigada e de divisão, consignando alem d'isso o limite maximo da idade passado o qual não e permittido a nenhum facultativo permanecer no serviço, qualquer que seja o posto a que tiver chegado.
No projecto estabeleço a idade bastante avançada de setenta annos, ainda que devesse ser de sessenta e cinco, por uma rasão e é porque, vendo no almanach militar com referencia a 30 de dezembro ultimo qual era o numero do facultativos militares que têem mais de sessenta e cinco annos, deparei com o quadro aliás muito lisonjeiro de que quasi dois terços tem essa idade ou mais, isto é, em circumstancias de se reformarem e a consequencia seria sobrecarregar extraordinariamente o thesouro.
Proponho pois o limite maximo de setenta annos estabelecendo para o effeito da reforma as graduações por diuturnidade de serviço.
Parece-me que por este projecto, se elle tiver a honra de merecer a approvação da camara melhorará o serviço, assim como a situação de uma classe que precisa de auxilio e protecção.
Os requerimentos vão publicados na secção competente.
O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Presidente: - Tenho de consultar a camara sobre o requerimento feito pelo sr. Alfredo Peixoto para se dispensar o regimento e entrar em discussão um parecer que ha pouco mandou para a mesa.
Vae ler-se primeiro esse parecer.
Leu-se. É o seguinte:

PARECER

Senhores. - Foi presente a vossa commissão de legislação penal a copia do processo summario de policia correcional, requerido em 1881 contra Martinho Pinto de Miranda Montenegro, actualmente deputado ás côrtes, e outros, membros da commissão de recenseamento politico em Castello de Paiva, com fundamento de não haverem sido affixados nas portas das igrejas os editaes respectivos ao recenseamento politico d'aquello anno, sendo a remessa feita originariamente pelas justiças de Arouca para esta camara decidir se deve dar ou recusar licença para a continuação do processo; e
Considerando que o delicto arguido ainda que realmente tivesse existido, não teria produzido de uma maneira necessaria consequencias de prejuizo effectivo para os direitos politicos dos cidadãos;
Considerando que os outros individuos envolvidos n'aquelle

Página 1512

1512 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

processo, tendo já respondido em audiencia correccional na comarca de Arouca, foram ali absolvidos;
Considerando que não ha motivo sufficientemente fundamentado para privar um deputado de continuar integralmente no exercicio das suas funcções, pois que não se infere do processo que da sua parte, houvesse intenção criminosa;
Considerando que, segundo o artigo 27.° da carta constitucional e a interpretação constante, que se lhe tem dado, a esta camara pertence decidir se o processo deve ou não continuar, e o deputado ser ou não suspenso do exercicio das, suas funcções:
É a vossa commissão de parecer que não deve ser concedida licença para a continuação do alludido processo.
Sala das sessões, 11 de maio de 1885. = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = Agostinho Lucio = Adolpho Pimentel = Moraes Carvalho = Silveira da Motta = Correia Barata = Manuel d'Assumpção = Eduardo José Coelho = Marçal Pacheco = Alfredo Felgueiras da Rocha Peixoto, relator.
Foi dispensado o regimento.

O sr. Presidente: - Está em discussão.
Não havendo quem pedisse a palavra foi posto a votação e approvado.
O sr. Calixto: - Mando para a mesa uma justificação do faltas.
Vae publicada na secção competente.
O sr. Silva Cardoso: - Tenho a honra de mandar para a mesa uma representação dos magistrados e empregados judiciaes da comarca da Guarda, pedindo que a contribuição industrial a que estão sujeitos, seja substituida pelo pagamento do imposto de rendimento.
Parecem-me procedentes as rasões com que os signatarios fundamentam a sua pretensão, e eu não duvido por isso recommendal-a a consideração da camara e da illustre commissão que tem de dar o seu parecer.
Pelo mesmo motivo deixo de fazer agora as considerações que se me offerecem sobre o assumpto, reservando-me para quando elle venha a discussão.
A representação teve o destino indicado a pag. 1508.
O sr. Albino Montenegro: - Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo diversos documentos pelo ministerio da marinha e ultramar.
Peço a v. exa. que se digne dar a estes requerimentos o devido destino, e espero que o sr. ministro respectivo dará tambem as competentes ordens para que, com a maior brevidade, elles sejam satisfeitos.
O sr. José Borges: - Mando para a mesa representações de duas confrarias de Braga, pedindo que seja approvado o projecto de lei que tive a honra de apresentar em sessão de 30 de março ultimo, relativamente a decima de juros dos capitaes das irmandades, confrarias, ou corporações de mão morta e do beneficencia.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que estas representações sejam publicadas no Diario do governo.
E aproveitando a occasião, pergunto ao sr. secretario da commissão competente, se me pode informar que andamento tem tido o projecto a que me refiro, isto é, se já foi distribuido, se já tem relator, e se posso, emfim, ter a esperança de o ver discutido ainda n'esta sessão.
O sr. Manuel d'Assumpção: - Tenho a honra de mandar para a mesa um projecto de lei em que proponho que seja concedida uma pensão á viuva e e filhas do contra-almirante Francisco Antonio Gonçalves Cardoso, que tantos serviços prestou ao paiz.
A camara não ignora, por certo, os feitos heroicos d'este militar e que são conhecidos de todos; por isso não me demoro em expol-os n'este momento. Limito-me a mandar o projecto para a mesa e peço a v. exa. que lhe dê o destino conveniente.
O sr. Castro Matoso: - Vou mandar para a mesa uma proposta para que em cada semana se marquem dois dias, a fim de serem discutidos antes da ordem do dia alguns projectos de lei de interesse secundario que estão sobre a mesa e que ainda não tiveram solução alguma.
E já que estou com a palavra permitta v. exa. que eu dirija ao sr. ministro da fazenda algumas observações sobre um assumpto que reputo de muita importancia.
O sr. Presidente: - O sr. deputado esta com a palavra, e eu não lh'a posso retirar.
O que lhe pedia era que resumisse as suas observações, porque são horas de se passar a ordem do dia.
O Orador: - Eu vou resumir o mais que me for possivel as observações que tenho a fazer.
Chamo a attenção do sr. ministro da fazenda para o modo tumultuario e illegal por que está sendo cobrado em alguns concelhos do paiz, e especialmente no de Coimbra, o imposto do real de agua.
S. exa. sabe perfeitamente que o imposto do real de agua e devidido sómente pelos generos que são expostos á venda para consume.
A expotição dos generos a venda e a base fundamental d'esse imposto.
Pois apesar d'isso no concelho de Coimbra está-se cobrando o imposto do real de agua por generos que não são expostos á venda para consumo, pelos que são mandados de presente, por exemplo.
Um cidadão manda a um amigo um presente, e os empregados do real de agua exigem o imposto pelos generos que constituem esse presente.
Isto não póde ser.
Desde o regimento de 23 de Janeiro de 1763 até no ultimo regulamento do real do agua, sempre se estabeleceu e respeitou a doutrina que deixo exposta.
Devo, porem, declarar com toda a franqueza o motivo porque os empregados da fiscalisação do imposto do real de agua exigem esse imposto por generos que não são expostos á venda.
Em 5 de outubro de 1874 foi expedido um officio circular, pela direcção das contribuições indirectas, em que se declarou que o imposto do real de agua e devido por todos os generos, sujeitos a elle, sejam ou não expostos á venda para consumo.
Posteriormente a esse officio veiu o regulamento de 1879, que no artigo 22.° expressamente determine que pão sujeitos ao imposto sómente os generos expostos ou vendidos ao publico.
Ora, v. exa. sabe que um officio de qualquer repartição não póde derogar as disposições da lei. Essa faculdade pertence ao poder legislativo.
Nada ha mais inconveniente do que tornar odiosa aos contribuintes a cobrança dos impostos. (Apoiados.)
Confio nos bons desejos do sr. ministro da fazenda, e espero por isso que tomará promptamente as providencias necessarias para que este estado de cousas cesse não só em Coimbra, mas em todos os concelhos onde me consta que se estão dando os factos a que me referi. (Apoiados.)
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro.): - São muito sensatas as considerações feitas pelo illustre deputado, e pela minha parte asseguro a s. exa. e a camara que o meu desejo e que se cumpra a lei, e que na cobrança do real de agua se não lancem collectas nos generos que não devam ser sujeitos áquelle imposto.
Creia o illustre deputado que tenho n'isto o maior empenho; mas é certo tambem que o fiel e exacto cumprimento d'ella depende dos agentes riscaes e da solicitude dos escrivães de fazenda, a quem não tenho faltado com as instrucções necessarias no sentido de ser o imposto Cobrado, como beneficio para o thesouro, mas recaindo unicamente sobre os generos que a elle estão sujeitos legalmente, e sem que na sua cobrança se pratiquem quaesquer abusos.
Na execução das disposições da lei que regula este as-

Página 1513

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1513

sumpto, poderá ter havido um ou outro facto a corrigir; mas póde o illustre deputado estar de que assim como tenho dado instrucções para ser rigorosa a cobrança do imposto, do mesmo modo hei de ordenar que se não offendam interesses ou firam direitos que não estejam incluidos na lei.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que nas sessões das quartas feira e sabbados, sem prejuizo da ordem do dia, sejam discutidos alguns projectos de interesse secundario. = Francisco de Castro Mattoso Côrte Real = A. Carrilho.

O sr. Presidente:- Esta proposta fica na mesa para ser votada quando haja numero.
O sr. Carrilho:- O projecto a que se referiu ha pouco o sr. José Borges, já foi distribuido na commissão, mas ainda não teve parecer, em consequencia de sr. terem pedido varios esclarecimentos ao governo que ainda não vieram, mas é provavel que na primeira reunião da commissão o projecto possa já ser relatado.
O sr. Figueiredo Mascarenhas:- Mando para a mesa um requerimento pedindo, pelo ministerio da marinha, alguns esclarecimento sobre a questão levantada e te anno entre os proprietarios de algumas armações de pesca de atum no Algarve.
Peço a v. exa. que se sirva dar prompto andamento a este requerimento.
Vae publicado na secção competente.
O sr. Scarnichia:- Mando para a mesa dois pareceres da commissão do ultramar relativos, aos requerimentos de Timotheo Pinheiro Falcão, pedindo a jubilação como professor do seminario episcopal de Angola, o de José Maria de Carvalho e Sousa, major reformado da provincia de Moçambique, pedindo melhoria de reforma.
Mando tambem um parecer da commissão de marinha, relativo ao requerimento de Antonio Justino de Faria Leal, segundo sub-inspector de saude naval reformado, pedindo melhoria de reforma no posto de inspector.
Foram enviados á commissão de fazenda.
O sr. Franco Castello Branco:- Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda, sobre o projecto de lei n.° 60-A, creando o logar de superintendente regio dos estudos e espectaculos musicaes.
A imprimir.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão do projecto n.º 34 (orçamento rectificado)

O sr. Francisco Beirão: - Proponho-me fazer algumas considerações, - tão breves quanto a exposição das minhas idéas o permitia, tão modetas quanto a limitação das minhas faculdades o exige - acerca da proposta de lei que rectifica as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1884-1885.
Antes, porém, de entrar, precisamente, na apreciação da materia, que faz objecto da presente proposta de lei, cumpre me replicar aos argumentos, com que, o illustre relator da commissão do orçamento - cavalleiro cuja competencia n'estes assumptos é incontestavel e incontestada - pretendeu combater a proposta de adiamento feita pelomeu amigo, e leal correligionario, o sr. Eduardo José Coelho.
Este illustre deputado, ao abrir-se a discussão, mandou para a mesa a seguinte proposta:
(Leu.)
O meu illustre correligionario pedia, pois, o adiamento d'este projecto com dois fundamentos: por ainda não ter sido distribuido ao parlamento o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, e, por o governo não haver, até então, enviado a esta camara, todos os documentos relativos ás despezas extraordinarias de saude publica, que mais de uma vez, e instantemente, lhe tinham sido exigidos. O sr. relator da commissão entendeu que, nenhum d'estes documentos, era necessario para se entrar na discussão do orçamento rectificado. É aos argumentos, com que s. exa. combateu a proposta de adiamento do sr. Eduardo José Coelho, que, antes de tudo, responderei.
Começou o sr. relator invocando um precentedo ministro o progressista, dando a entender que nós não tinhamos competencia, para vir propor o adiamento da discussão do orçamento rectificado, por não Ter sido distribuido ainda o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, por isso que, em 1880, discutindo-se na sessão de 24 de abril d'esse anno, o orçamento geral do estado, não se achava ainda distribuido o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, e, que, o respectivo ministro de então, o sr. Barros Gomes, declarara que os deputados da opposição, não precisavam d'esse documento para discutir o orçamento.
É tão grave accusação, e, o precedente invocado, seria, de tal modo fulminante, não só contra o sr. Eduardo José Coelho, que tinha proposto o adiamento d'esta discussão, mas contra o gabineta progressista, e contra o partido que o sustentou, que eu não posso deixar de levantar as allegações feitas pelo sr. relator da commissão.
Leio as proprias palavras de s. exa. para acrescentar bem a qual a accusação que nos é feita. Acham-se publicadas no Diario da camara de 5 do corrente:
São estas:
(Leu.)
Fui, n'este momento, que, da parte da opposição, se levantaram protestos, em virtude dos quaes, a sessão foi interrompida.
Reaberta ella, foram apresentados os documentos, - os chamados documentos. - que faltavam para comprovar as despezas feitas com as providencias extraordinarias tendentes a prevenir a invasão do cholera morbus.
Em seguida, o sr. relator, tomando outra vez a palavra, invocava o mesmo precedente, repetia a mesma accusação.
O sr. Carrilho não fazia parte d'esta camara, em 1880, e não posso, por isso accusar a sua memoria de menos fiel; mas, sinto que, s. exa., curando, decerto por informações erradas, tivesse vindo fazer similhante accusação, contra a qual, os factos protestam alta, terminante e completamente!
Quando, em sessão nocturna, do 24 do abril de 1880, entrava em discussão, o orçamento geral do estado, levantava-se, como acontecia quasi sempre, das bancadas da opposição, o actual sr. ministro da fazenda, Hintze Ribeiro, e dizia, que reservava a discussão da questão de fazenda para quando se tratasse do imposto de rendimento, visto que n'aquella occasião, não podia entrar na discussão do orçamento, porque só n'esse dia lhe tinham sido fornecidos - note a camara- o relatorio dos actos do ministerio da fazenda e o orçamento rectificado.
Já vê a camara que o sr. Hintze Ribeiro confessava, elle proprio, que n'essa occasião o relatorio dos actos do ministerio da fazenda estava distribuido.
E o que lhe respondeu o sr. Barros Gomes?
O que o ministro da fazenda, d'aquella epocha, disse, foi que se os srs. Hintze Hibeiro e outros deputados não, tinham recebido o relatorio dos actos do ministerio a seu cargo e o orçamento rectificado, a culpa não era, de certo, da mesa, e que os illustres deputadoseram tão conhecedores de mechanismo parlamentar, e da epocha habitual em que taes documentos são apresentados, que o natural interesse os teria impellido a procurarem obter um exemplar d'esse relatorio.
Mas, supponhamos, que da parte da mesa tinha havido qualquer falta, e que esses documentos não haviam sido distribuidos. Ainda assim a accusação feita pelo sr. relator não tinha rasão de ser; porque o sr. Hintze Ribeiro tinha tido, muito antes d'essa occasião, todos os elementos para

Página 1514

1514 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

poder examinar o relatorio dos actos do ministerio da fazenda. Quer a camara saber porque? Porque o relatorio tinha sido apresentado em sessão do 8 do março de 1880, n'esse mesmo dia foi publicado no Diario do governo, n.° 53, no dia 10 foi impresso no Diario da camara, e por isso quando se começou a discutir o orçamento geral em sessão de 24 de abril, havia, mais do mez e meio, que o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, tinha sido entregue á publicidade. O orçamento rectificado, a que o sr. Hintze só referia, tem a data de 18 de março de 1880, e, por isso, no dia 24 de abril, ao discutir-se o orçamento geral do estado, já tambem havia mais de um mez, que elle se tinha conhecimento.
Já vê, pois, o sr. relator, que na tua allegação, - de certo por mal informado - foi completamente inexacto, e, por consequencia, o precedente, que allegou, volta se contra si proprio, e contra o sr. ministro da fazenda.
Onde está o relatorio dos actos do ministerio da fazenda que já devia ter sido apresentado? Não está publicado no Diario do governo, não se acha impresso no Diario das sessões, ainda não foi distribuido ao parlamento; portanto somos nós, que, temos rasão, e, não s. exas. (Apoiados.)
No tempo da gerencia do ministerio progressista, quando começou a discussão do orçamento geral do estado, já estava distribuido ao parlamento, e entregue a publicidade o relatorio dos actos do ministerio da fazenda: hoje achamos-nos discutindo o orçamento rectificado, estamos no mez de maio, e não ha memoria, nem sombra, d'esse relatorio! A camara ajuizará quem tem rasão, e contra quem se volta o precedente invocado pelo sr. relator. (Apoiados.)
Accusar o partido progressista de fartar documentos a discussão parlamentar e á publicidade!
Elle que, antes, tem sido accusado de exagerado na publicação de actos do ministerio da fazenda, e, a quem, até, disso, se tem formado capitulo de accusação para se dizer que desprestigia o nosso credito lá fóra! (Apoiados.)
Elle que franqueou todas as secretarias, que apresentou todos os documentos, ainda os mais secretos, á apreciação do parlamento! (Muitos apoiados.)
Singular contradicção!
Fica, pois, sem base a accusação, que, o sr. relator, por más informações, de certo, veiu, n'um momento do infelicidade, para si, e para o partido que defende, apresentar á camara. (Apoiados.)
Maravilhava-se, mais, o sr. relator com a exigencia dos documentos justificativos das despezas extraordinarias de saude, pois que tal exigencia daria em resultado nunca mais se discutir o orçamento; era precise ver - acrescentava - que essas despezas ainda se estão realisando.
Restava provar que as verbas aqui descriptas, como de despezas extraordinarias de saude publica, representam quantias, cuja despeza vae ser auctorisada, e, não cujo pagamento já se fez.
Não era, porem, necessario que qualquer deputado requeresse a exhibição de taes documentos, pois que elles, já, de ha longo tempo, deviam, estar na camara, se o governo tivesse cumprido o seu dever, obedecendo ás prescripções do regulamento geral de contabilidade. (Apoiados.)
É, sem duvida, permittido tomar providencias extraordinarias para prevenir, e, para debellar uma epidemia. Caso tão infelizmente repetido não podia deixar de ser previsto na legislação do paiz.
A lei preceitua que n'essa hypothese se abram creditos extraordinarios, mediante certas formalidades.
O governo, porém, não publicou decreto algum, abrindo taes creditos, e nada fez, d'aquillo a que era obrigado, pelo seu proprio decoro, porque o seu decoro e cumprir a lei. (Apoiados.)
Esses creditos só podiam ser abertos com audiencia do conselho d'estado, reunido na presença do Rei, previamente convocado, em conferencia, por meio de aviso, com tres dias de antecipação, pelo menos, e, no qual, se declarasse o objecto da convocação. N'essa conferencia, devia ter sido apresentado o relatorio do ministro competente, referindo desenvolvidamente as despezas, a que os creditos eram destinados, devendo lavrar-se acta da conferencia, que seria apresentada ao Rei, com o decreto que mandasse abrir o credito. Os respectivos decretos, e relatorios, deviam ter sido publicados, immediatamente, na folha official, para serem registados pelo tribunal de contas: e deviam ser apresentados as côrtes, dentro dos primeiros quinze dias depois da sua constituição, devendo mais, o tribunal de contas, enviar a esta camara, no mesmo praso, uma relação dos creditos, que tivesse registado, e, bem assim, o relatorio, em que emittisse o seu juizo, ácerca da regularidade com que foram abertos.
Nada d'isto se fez. Se o governo tivesse cumprido a lei, se tivesse satisfeito as prescripções terminantes do regimento de contabilidade publica, o seu relatorio, e, aquelle, em que uma corporação, tão competente, como o tribunal de contas, tivesse preferido o seu juizo, ácerca da regularidade dos creditos, devia estar na camara, quinze dias depois da sua constituição. Se não estão, pois, aqui esses documentos, a culpa inteira, e, exclusiva, é do governo.
Vamos, pois, discutir sem documentos; não temos o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, não temos o relatorio do tribunal de contas, com relação a despezas extraordinarias! Neguem que isto assim seja, e, depois, digam que não tem rasão o partido progressista quando accusa o governo, de não dar publicidade a documentos, que aquelle nunca recusou.
Mas discutamos a proposta de lei rectificando as receitas e as despezas do estado no presente anno economico.
Esta proposta deve dar ao sr. presidente do conselho enormissima satisfação!
S. exa. já teve o grande prazer de apresentar um orçamento, em que se descrevia a maior receita que o estado tem tido, e, hoje, tem o pendant d'esse jubilo, apresentando um orçamento, em que se descreve a maior despeza, que em orçamentos tem figurado. Deve ser, repito, grandissima satisfação!...
Sr. presidente, no orçamento geral do estado, não ha mais do que prevenções, baseadas sobre calculos que podem ser contestados, e, melhor, ou peior, apreciados; mas como o orçamento geral tem de ser apresentado, e por isso elaborado, muito antes do começo do exercicio a que respeita, e claro que, casos ha, em que existe a necessidade de rectificar o mappa das receitas e a tabella das despezas, descriptas no orçamento, fixando definitivamente umas e outras, e occorrendo á deficencia das receitas.
O orçamento rectificado já pode servir, pois, como elemento para apreciar a administração do governo, durante o respectivo exercicio, e, para avaliar os resultados do systema financeiro, por elle, adoptado e seguido. E, isto tanto mais verdade e, no caso presente, por isso que, o anno economico, a que o orçamento rectificado se refere, já vae muito adiantado.
Examinando-se a proposta respectiva ao orçamento rectificado, vê se logo que é a de um orçamento perfeitamente regenerador - e digo regenerador, no sentido de que, n'elle, se encontra a observancia de todos os principios, e de todas as tradições, que formam o systema politico financeiro d'este partido.
O orçamento rectificado apresenta um augmento de despeza sobre as auctorisações votadas ao governo; o orçamento rectificado infringe, mais de uma vez, os preceitos da contabilidade publica; o orçamento rectificado insiste em apresentar um deficit augmentado; o orçamento rectificado exagera, ainda, as despezas extraordinarias.
São estes os quatro pontos cardeaes por que tenho a distribuir a materia do meu discurso, são estas as quatro principaes theses que me proponho defender, tão desenvolvidamente, quanto possivel me for.

Página 1515

SESSÃO DE l1 DE MAIO DE 1885 1515

O orçamento rectificado não figurava antigamente no plano geral da contabilidade publica.
O decreto de 4 de janeiro de 1870 não falla n'ella.
Comtudo já têem sido apresentados differentes orçamentos rectificados, e, hoje a apresentação n'esse documento acha-se prevista no actual regulamento geral da contabilidade publica.
Examinemos, por alto, alguns d'esses orçamentos, para os compararmos com o que está em discussão.
Se, bem pude apurar, o primeiro orçamento rectificado, apresentado ao parlamento, foi o do sr. Dias Ferreira, quando ministro da fazenda.
Deixemos, porém, esse orçamento: e comecemos no que foi apresentado pelo sr. conde de Samodães em 1869-1870. E principio n'este ponto, por isso que o sr. conde de Samodães, como ministro da fazenda, fazia porte d'aquella administração do bispo de Vizeu, que, no dizer do um illustre deputado - a quem me não é permittido elogiar n'este momento, pois que s. exa. usou, poucas sessões ha, de tal benevolencia para commigo que me deu por suspeito no que eu podesse dizer agora - foi administração que não deixou de si memorias nem saudades.
Foram estas as palavras que o illustre deputado preferiu, embora, antes, houvesse feito justiça ás rectas intenções d'aquelle estadista.
Vejamos, pois, se essa administração não deixou memorias, e, se houve rasões para, d'ella, não ficarem saudades.
Citarei apenas um facto, cuja memoria não se offerecerá de certo, ainda, na mais longinqua posterioridade.
É, o celebre decreto, de 25 de fevereiro de 1869, abolindo o estado de escravidão, em todos os territorios da monarchia portugueza. (Apoiados.)
Creio que se, s. exa., se tivesse recordado d'este facto, não diria que a administração do bispo de Vizeu não tinha deixado memoria de si...
O sr. Franco Castello Branco :- Referi-me á administração financeira, propriamente dita, d'aquelle ministerio.
Quanto ao decreto para a abolição da escravatura, esse merece certamente da minha parte a mais completa approvação.
O Orador:- Muito bem. Deixemos, pois, as memorias, e vamos ás saudades, e, precisamente, com respeito á administração financeira, a que, o illustre deputado, se queria referir.
Desde já declaro a s. exa. que estou perfeitamente de accordo com a sua opinião. A administração financeira do bispo de Vizeu, não deixou saudades, porque não é precisamente esse o sentimento, que desperta o medico quando, para evitar a gangrena, cauterisa a ferida. (Apoiados)
Bom será recordar as circumstancias em que o bispo de Vizeu tomou conta do governo do estado.
Não me referirei á situação politica do paiz, embaraçada por successivas crises ministeriaes, complicada pela confusão, e, até, pela anarchia dos partidos, e, já agitada por diversas commoções populares: não fallarei da situação economica, resultante da guerra do Brasil com o Paraguay, e, sobre a qual, já pairavam as nuvens prenuncias d'aquelle tempo, que, o grande poeta d'esse seculo, appellidou anno terrivel; não direi qual a angustiosa situação geral em que o thesouro se encontrava. Limirtar-me-hei a ler umas pequenas notas officiaes, cuja exactidão o ilustre deputado póde verificar, porque, d'ellas, se infere, bem, quaes eram as embaraços, com que a administração, e os encargos a que tinha de acudir.
(Leu)
«Demonstração das importancias dos emprestimos, e saques da thesouraria do ministerio da fazenda, que a agencia financial de Londres, devia satisfazer nos mezes de outubro e dezembro de 1868:

[Ver Tabela na Imagem]

Emprestimos....
Saques....
Total....

Mais:
«Importancia dos vencimentos de supprimentos e dos saques da thesouraria, do ministerio da fazenda, que, a agencia financial de Londres, deveria satisfazer nos mezes de janeiro até março, e em junho de 1869, por operações realisadas até 31 de dezembro de 1868:
«Total 1.719:812 libras ou 7.739:154$000 réis!»
A somma dos totaes, d'estas duas notas, dá 2.766:179 libras ou 12.447:895$500 réis!
Ainda não era tudo, porém.
A estas importancias, acresciam os encargos resultantes da negociação de 350:000 libras, ou 1.575:000$000 réis, para se pagar, era janeiro de 1869, o compon do segundo semestre, de 1868, da divida consolidada externa.
Por esta rapida leitura, verá, o illustre deputado, qual era o estado e que se encontrava a fazenda publica, e, por isso, comprehenderá quaes as amarguras, que tiveram de soffrer os membros de ministerio, que tomaram conta do governo, n'aquellas condições.
O gabinete precisava, urgentemente, de recorrer ao credito, para acudir aos encargos que, a pouco trecho, tinham de ser exigidos ao thesouro.
Dirigia-se á praça de Londres e encontrava ahi a guerra, tenaz e implacavel, que lhe era movida pelos interessados no caminho de ferro do sul; voltava-se para a praça de Paris, e, encontrava a mesma guerra, igualmente tenaz, igualmente implacavel, movida, pela companhia do caminho de ferro do norte e leste.
Tal é o pallido escorço de um dos quadros, representativos, das minhas difficuldades, com que luctou a administração do bispo de Vizeu.
Bem perto do illustre deputado, vejo, n'este momento, alguem que as conheceu de perto, e que, por isso, lhe podia dar, d'ellas, minuciosa conta.
Mas, por acaso, no meio de tantos embaraços e difficuldades, disse o bispo de Vizeu, ou algum dos seus collegas, que a questão de fazenda, se havia de resolver, só com reducções de despeza?
Nunca tal se disse.
O que se disse foi que se não devia resolver essa questão sem economias mas não só com ellas.
Era, este, um elemento, mas não o único, para a solução do problema.
E tanto assim que o ministro apresentou, bom ou mau, um desenvolvimento systema financeiro, e, digo bom ou mau, porque não venho agora defender aquella situação.
Em 1869, o sr. conde de Samodães, propunha uma larga reforma tributaria. Conservava o imposto predial de repartição, por isso que não julgava as matrizes sufficientemente exactas, para se passar para o systema de quotidade, mas melhorava este serviço. Abolia os addicionaes sobre a decima de juros; derogava os privilegios concedidos aos bancos; reformava em parte a contribuição industrial, a pessoal, e a do sêllo; sujeitava ao imposto de registo os arrendamentos a longo praso, e algumas transmissões ainda exceptuadas; tributava a cultura do arroz, alterava os direitos de consumo e os de importação para certos generos, e creava uma contribuição de renda, que racaia sobre os dividendos de companhias, sobre os vencimentos dos directores, agentes, thesoureiros, empregados de companhias, bancos, e sociedades anonymas.
Portanto, não se póde dizer que queria só fazer economias. A economia era um dos elementos do governo, repito, mas não era o único.
Os ministros - escreveu-o um d'elles com responsabilidade de todos - adoptando um systema, todo respassado de

80*

Página 1516

1516 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

desgostos, e, sujeito a mais violentas e injustas accusações, e calumnias não tiveram outra mira que não fosse o bem publico, e, deixar aos successores trabalhos menos espinhosos.
Procuraram-se os meios de reduzir as despezas publicas, atacando-se interesses mais ou menos justificados, fecharam-se as portas aos candidatos a empregos, imposeram-se duros sacrificios aos funccionarios e contribuintes. Foi a cruel lei da necessidade. (Apoiados.)
Portanto, já vê o illustre deputado, que quem precede assim, pode deixar, de si, outro sentimento, mas nunca, o da saudade. (Muitos apoiados.)
Se o illustre deputado tivesse, em vida do bispo de Vizeu, percorrido as provincias, se se tivesse demorado algum tempo, nos ultimos recantos d'este paiz - d'este paiz, onde, para o povo, os nomes dos ministros, raro, ultrapassar as barreiras das cidades - encontraria, nos mais rudes lavradores, nos mais humildes proprietarios, n'aquelles que passam a vida acorrentados ao torrão natal regando-o cor o seu suor, um culto ardente para com o bispo de Vizeu, e haveria a prova de que, em torno d'elle, se tinha formado uma lenda, tão respeitosa, como sympathica, de respeito pelo seu caracter, de sympathia pelo seu coração. (Muitos apoiados.)
Se, mais tarde, o illustre deputado tivesse ido, em piedosa romaria, como eu, e, muitos collegas que aqui estão, fomos, a Vizeu, assistir aos funeraes d'aquelle illustre e honrado cidadão, teria presenciado um espectaculo que, por certo muitos annos que o illustre deputado viva, não poderia vir a esquecer.
Ali, ao cerrar da noite, no cemiterio, onde concorreram milhares de pessoas, teria visto bem patente, na commoção de todos, que, não era só, o homem simples e bom, o prelado virtuoso o bemfazejo, mas tambem o cidadão, cujo nome symbolisava as aspirações do paiz, que todos pranteavam, e, que, o que descia á terra, não era só um cadaver, mas tambem uma esperança! (Muitos apoiados.)
Felizes nós - feliz da nação! - se hoje, podesse alguem, á similhança do ultimo dos Gracchos, que expirante, lançou ao ar - na phrase do orador - o pó de que nasceu Mario, arrombar a lousa que cobre as cinzas do bispo de Vizeu, e, lançando-as aos quatro ventos do paiz chamar a vida cidadãos, como elle, grandes pelo espirito e pelo coração! (Muitos apoiados. - Vozes: - Muito bem.)
Mas o illustre deputado vae ver algumas das rasões porque o bispo de Vizeu não deixou saudades. Estão no orçamento rectificado, que elle apresentou ao parlamento.
Em 3 de Janeiro de 1869 tinha sido apresentado o orçamento geral.
O governo havia sido auctorisado, por uma lei anterior de 9 de setembro de 1868, a reformar todos os serviços, effectuando n'elles as necessarias reducções e economias.
As camaras foram depois, como se sabe, dissolvidas; e em 20 de maio apresentava-se ao parlamento o orçamento rectificado, que, já disse, não era o primeiro, porque já tinha sido anteriormente, pelo sr. Dias Ferreira, apresentado um outro, mas fui um dos primeiros. A lei que havia auctorisado as despezas fôra a de 26 de junho de 1867.
Ora n'este orçamento rectificado comparando-se a situação anterior, com a, d'elle constante, lê-se o seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

«Importam as economias em ....
«Additando as reducções a que me refiro, approximadamente ....
«Temos uma diminuição de ....
«As receitas creadas desde setembro de 1868, provenientes do caminho de ferro do sul, emolumentos consulares e do thesouro publico, das capitanias dos portos e emolumentos de saude, são calculadas em ....
«Sommam estas verbas ....
«Porém como a despeza com os encargos da divida cresce sempre, e desde 1867 tem augmentado, não só pela emissão do emprestimo externo, mas por emissões successivas de titulos da divida publica interna, e evidente que estas reducções e augmentos da receita não influem de modo a diminuir consideravelmente a cifra do deficit, que alias estaria hoje muito reduzido se não fôra esta rasão.»
2.128:101$237 réis de differença para menos no orçamento rectificado! (Apoiados.)
Eis o exemplo de um orçamento rectificado, accusando na despeza uma differença para menos da que estava calculado. (Apoiados.) 2.000:000$000 réis, que não podiam deixar duas mil saudades. (Riso)
E, n'esta quantia, incluia-se o vencimento de um dos ministros, porque o bispo de Vizeu, - ou melhor, a administração de que elle fazia parte - se cortou cerce todas as verbas do orçamento, que, reputava superfluas, ou, ainda de uma utilidade, apenas relativa, cortava tambem os vencimentos dos proprios ministros.
Esse ministro não tinha, que eu saiba, bens de fortuna, e foi o proprio que referendou o decreto da abolição do conselho geral de instrucção publica, cujo era membro. Graças aos céus, porém que, assim como quasi todas as outras verbas, então cortadas, figuram já no orçamento, a respectiva a tal conselho tambem já foi restaurada!
Foi a ultima, creio, e, para essa restauração, por certo que nada concorreu o ex-ministro, que a havia cortado, e, que nem da nova junta de instrucção publica, que ahi se organisou, ficou fazendo parte. E, eu, folgo muito de ter esta occasião, de prestar a devida homenagem ao sr. Latino Coelho, cujo talento e muito grande, mas cujo caracter e ainda maior, sentindo a sua falta no parlamento, e lamentando - mas tirando d'isso licção - que elle houvesse de tomar uma attitude que é um protesto eloquente contra a política que ultimamente se tem seguido.
Mas não foi só elle, o unico ministro que ficou, depois de o ser, em peiores condições. Outro ministro, igualmente digno e honesto, entendeu dever abandonar a alta posição que occupava na administração n'este paiz, retirar-se para a terra da sua naturalidade, e viver, ahi, só com os seus rendimentos. Refiro-me ao sr. Pequito de Andrade.
Ora aqui tem s. exa. porque a administração do bispo de Vizeu não deixou nem podia deixar saudades.
O orçamento de 1869 para 1870 accusava, pois, como disse, 2.128:000$000 réis, numeros redondos, para menos; e insisto de novo, estes 2.128:000$000 réis, não chegavam para cobrir os encargos da divida externa e interna contrahidos para solver responsabilidades anteriores a administração de 1869-1870.
Examinemos agora outro orçamento rectificado. E o seguinte, o de 1870-1881.
O orçamento geral havia sido apresentado em 3 de Janeiro de 1869, em seguida foi, tambem, dissolvida a camara, o gabinete, de que era presidente o illustre duque de Loulé, apresentou, a nova camara, um orçamento rectificado em 20 de maio de 1869.
Tinha tambem havido uma lei, a de 23 de agosto de 1869, pela qual o governo fôra auctorisado a reorganisar os quadros e serviços publicos de modo a simplificar estas e a reduzir a respectiva despeza. E, antes de continuar, direi, que quando me refiro a esta auctorisação, devo ser tido, completamente, como insuspeito, por isso que, apesar de deputado, quando foi concedida ao governo, nenhuma responsabilidade n'ella tive. Essa auctorisação fazia parte de uma lei de meios, e eu votei, na commissão de fazenda e no parlamento, contra ella.
Quando, n'uma outra discussão, me referi a esta auctorisação, um illustre deputado levantou-se, e, disse que por virtude d'ella, o governo tinha augmentado as despezas. O sr. Luciano de Castro, e eu; protestamos contra tal asserção.

Página 1517

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1517

Vamos ver se o orçamento rectificado, a que me vou referir, dava, ou não, fundamento para o nosso protesto.
Esse orçamento dizia o seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

«Recapitulando todas estas economias effectivas nas despezas totaes com o serviço proprio dos diversos ministerios, ve-se que sobem a quantiosa somma de ....
«E addicionando a verba que se não despende realmente no ministerio da fazenda ....
«O augmento na dotacção das estradas ....
«O remanescente dos emolumentos dos consulados de Inglaterra ....
Será de ....

«a diminuição effectiva nas despezas com o serviço proprio dos ministerios, comparado o actual orçamento com o que fôra apresentado para 1869-1870 com o relatorio de 20 de maio de 1869. Sendo a importancia dos vencimentos dos empregados alem dos numeros dos quadros 376:129$424 réis, que devem ir pouco a pouco dando tambem reducçõs na despeza do thesouro, ter-se-ha um somma total de réis 1.166.001$056 do diminuições de despezas effectuadas, parte em virtude da lei de 9 de setembro de 1868, e parte pelo disposto no artigo 3.º da lei de 23 de maio de 1869.»
Tal era o orçamento apresentado pelo ministerio historico. Accusava uma economia effectiva desde logo de mais de 400:000$000 reis, e annunciava para o futuro ainda uma outra?
O ministro da fazenda, que apresentou aquelle orçamento rectificado, era o sr. Anselmo Braamcamp, o mesmo que e, hoje, o honrado chefe do partido progressista, e, por consequencia, somos perfeitamente coherentes combatendo o presente orçamento, por accusar, não diminuição, mas augmentos de despezas.
Vejâmos, porém, outros orçamentos rectificados: - os dos annos economicos de 1877-1878, 1878-1879, 1879-1880 e 1880-1881.
Anno economico de 1877-1878:

[Ver Tabela na Imagem]

A despeza auctorisada por virtude da lei de 17 de abril de 1877 fôra de ....
A despeza constante do orçamento rectificado apresentado em 11 de Janeiro de 1878 foi de ....
Differença para mais ....
E a despeza effectiva d'este exercicio foi, afinal, como se vê da conta geral da administração financeira do estado de ....
Vindo por isso a ser, a differença verdadeira sobre a differença auctorisada ....

Passemos ao anno economico de 1878-1879.

[Ver Tabela na Imagem]

A despeza auctorisada por lei de 8 de maio de 1879 era de ....
A accusada pelo orçamento rectificado de 10 de fevereiro de 1879 de ....
Sendo, pois, a differença d'esta para mais de ....
E a despeza real veiu a ser, como se vê do relatorio de fazenda, apresentado em 28 de fevereiro ultimo, de ....
Vindo a ser a differença final para mais de ....
No anno seguinte (1879-1880) a despeza calculada, por carta de lei de 19 de junho de 1879, foi de ....
O orçamento rectificado, de 19 de junho de 1879, inscrevia como despeza calculada ....
Differença para mais ....
E a despeza real foi de ....
Sendo, pois, a differença final de ....

Passemos agora a examinar um anno de cuja gerencia é responsavel o partido progressista.
É o anno de 1880-1881.

[Ver Tabela na Imagem]

A despeza auctorisada fôra de ....
A que se inscreveu no orçamento rectificado de 18 de março de 1880 ....
Differença para mais ....

Note a camara como estamos longe das differenças accusadas nos anteriores orçamentos rectificados!

[Ver Tabela na Imagem]

A despeza real foi, n'esse anno, de ....
Vindo pois a ser a differença para mais de ....

Comparem estes resultados com os outros a que me referi e... concluam!
O illustre relator é muito forte nesta sciencia dos numeros, e eu estou sempre a tremer, quando a elles tenho de me referir, na sua presença; mas estes aqui estão: são positivos. Differença para mais no orçamento rectificado só 164:000$000 réis!
Tal foi o resultado do orçamento rectificado apresentado pela administração progressista!
Vejamos se o actual orçamento rectificado se filia nos que augmentam, ou nos que diminuem a despeza.

[Ver Tabela na Imagem]

A despeza auctorisada pela lei de 23 de maio de 1884 era de ....
O orçamento rectificado inscreve, porém, a despeza ....
Differença para mais ....

Pergunto, em qual dos orçamentos rectificados se filia este, nos orçamentos regeneradores ou nos progressistas?
Tal era, como disse, o primeiro capitulo de accusação que tinha contra o orçamento rectificado, articulei-o ao começar estas considerações, creio haver-lhe demonstrado a sufficientemente procedencia; passemos, pois, ao capitulo segundo.
Disse eu, que este orçamento accusava graves faltas de cumprimento das disposições do regulamento de contabilidade publica, e vou demonstral-o.
Diz o artigo 22.° do referido regulamento:
«A transferencia de verbas de artigo para artigo, dentro do mesmo capitulo do orçamento, continua a ser permittida nos termos do § 3.° do artigo 41.° do actual regulamento geral de contabilidade publica, precedendo decreto fundamentado em conselho do ministros.»
Acrescenta o § unico:
«Os decretos transferindo verbas são publicados na folha official para serem registados pelo tribunal de contas, e apresentados as côrtes na immediata sessão legislativa.»
«Não me consta que tenham sido apresentados ao parlamento decretos effectuando transferencias d'esta ordem, e, custando-me a crer, que, com a administração financeira, existente n'este paiz, se não tenham dado alguns d'estes casos, por isso pergunto, tendo-se dado taes transferencias de verbas, como, e quando, se deu cumprimento ao disposto

Página 1518

1518 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

no mesmo regulamento geral de contabilidade publica? (Apoiados.)
Diz o artigo 40.º do mesmo regulamento:
«Pelos differentes ministerios serão annualmente apresentados ás côrtes, quinze dias depois da constituição da camara dos deputados, mappas indicativos de todos os contratos por esses ministerios realisados, de valor em preço superior a 500$000 réis, designando-se n'elles o objecto do contrato, o nome e domicilio do contratador, o preço, duração e todas as condições principaes dos mesmos contratos.
Ora, pergunto eu, é possivel ter-se administrado a fazenda publica, n'estes ultimos annos, de fórma a não se terem celebrado contratos superiores a réis 500$000!
Pois, nem ao menos, na repartição de obras publicas, e emprego a palavra «repartição», em geral, não teria havido contrato algum de valor superior a 500$000 réis?! Se não os houve, muito bem, mas se os houve, onde estão esses contratos, que deviam ha muito ter sido apresentados a esta camara?
Não insistirei mais uma vez na falta da publicação dos decretos abrindo creditos extraordinarios, para prevenir a invasão da cholera morbus, pois que, não só, quando discuti o bill de indemnidade, mostrei a illegalidade com que o governo procedeu, mas tambem, porque já invoquei, ha pouco, as disposições expressas do regulamento de contabilidade, que o governo desprezou, - o que foi mais que violal-o - e mostrei que elle poz, completamente, de parte, todos os preceitos que lhe eram impostos pela lei, pois que não apresentou relatorio algum ao conselho de estado, não couvocou este, fez as despezas na importancia de quatrocentos e tantos contos de réis, a que acrescem ainda a verba propostas pela commissão, não publicou o relatorio justificativo e taes despezas, e, a final, quando lhe pediamos os documentos comprovativos dizia-nos que não precisavamos d'elles?
E allega mais, que não houve ainda tempo de os elaborar e processar convenientemente!
Na Italia, sr. presidente, não se tomaram só prevenções para combater o cholera, houveram de se adoptar providencias para o debellar.
Houve lucta - e lucta violentissima! - principalmente em Napoles, cidade esta, que, como é sabido, foi cruelmente flagellada pela terrivel epidemia.
Pois bem, em Italia, apesar de tudo isto, em 24 de dezembro do anno passado, isto é, ha quasi cinco mezes, já o ministro da fazenda declarava, na camara dos deputados, que se tinham gasto para prevenir e debellar o cholera liras 6.000:000, approximadamente, isto é, pouco mais ou menos, 1.080:000$000 réis!
Pois, em tão pouco tempo, já o governo d'aquelle paiz, podia dizer, e tinha a ingenuidade de confessar ao parlamento, quanto tinha gasto, não só para prevenir, mas para aniquilar o cholera, e, nós, estamos em maio, e os documentos que se pediram ainda não chegaram! Veiu só uma nota das despezas extraordinarias com a saude publica, mas incompleta, nada mais! Muito adiantada, ou - quem sabe? - muito atrazada está a Italia!
Ha mais, quanto á violação do regulamento da contabilidade publica. Diz este no artigo 26.°, do modo mais expresso e terminante, que em nenhum caso os creditos supplementares poderão ser abertos, para legalisar despezas effectuadas, quer pertençam aos exercicios correntes, quer aos preteritos.
Veiu porém a illustre commissão do orçamento, e o que fez? Eu vou dizer.
No ministerio da marinha foram applicados saldos de supprimentos anteriores a despezas do exercicio de 1883 a 1884. Ora, no orçamento, ha um capitulo para despezas de exercicios findos.
Parecia pois, que, o mais natural, era agora rectificar-se essa verba com as despezas feitas no exercicio de 1883 a 1884.
Mas, não, senhores, a commissão orçamental, querendo imitar o governo, infringiu tambem o regulamento de contabilidade, abriu um credito supplementar a favor do ministerio da marinha para pagar 95:000$000 réis (numeros redondos) do exercicio de 1883 a 1884!
Ora, se isto não é violar uma disposição clara e terminante do regulamento de contabilidade publica, já não sei o que é violar a lei.
O terceiro capitulo da minha accusação era apparecer no orçamento rectificado, não só um deficit, mas um deficit augmentado; porque nós para o anno corrente já temos tres deficits calculados pelo governo, e, com o parecer da commissão, teremos um quarto, sendo o segundo maior que o primeiro, o terceiro maior que o segundo, e assim successivamente, havendo fundadas esperanças de que o maior de todos será o real e verdadeiro!
Um orçamento rectificado com deficit para o anno de 1884-1885, presidindo o sr. Fontes ao conselho de ministros, é cousa que se possa acreditar?
Eu pela minha parte confesso que se não visse, acreditava. (Riso.)
O sr. Fontes, depois de ter deixado passar o periodo necessario para honrar a sua palavra, de que não substituiria o ministerio progressista, subiu ao poder; e assumindo, a pasta da fazenda, recolheu-se, tempo depois, como foi publico, a uma especie de Thebaida, passou, ali, longo tempo a meditar na solução do problema financeiro e depois de muitas cogitações e trabalhos, reappareceu no parlamento, com o celebre relatorio de 1882.
Veiu então, como aquelles grandes penitentes de outr'ora, vestido de sacco, coberto de cinza, cingido o cilicio, prostrar-se reverente, não diante da cathedral, mas perante parlamento, fazer amende honorable, entoar o panitet e dizer: peccavi.
Se havia deficit era por culpa de umas administrações que não tinham resolvido acabar com elle de vez. Mas, agora, declarava, vae acabar o deficit. (Riso.)
Pois não escreveu s. exa. que o deficit, ou acaba de uma vez, ou ameaça de não acabar nunca?
E não acrescentou que elle se conservaria até ao dia em que os poderes publicos tomassem a resolução suprema de acabar com elle de uma vez para sempre? (Apoiados.)
E hoje, volvidos tres annos, o deficit, em logar de ter acabado de vez, apparece augmentado n'este orçamento?
Porque se não tornou, pergunto, a resolução suprema de o extinguir? (Apoiados.)
Não allegou s. exa. que era indispensavel que o espirito de economia e proposito inabalavel de extinguir o deficit dominasse todos os actos e presidisse a todas as resoluções do governo e parlamento?
Que fez, pois, s. exa. d'esse proposito inabalavel, pois que o desequilibrio, orçamental ainda persiste? (Apoiados.)
Não tem o sr. Fontes presidido sempre ao conselho de ministros?
Mas infelizmente preside tambem sempre o deficit aos seus orçamentos.
Co-existem sempre estes dois presidentes. (Riso.)
E co-existem apesar do compromisso solemne tomado pelo sr. Fontes, que dizia estar na inabalavel resolução de vincular a sua existencia política ao conseguimento do grande fim que então se propunha, qual era a extincção do deficit?
E, todavia, a existencia política de s. exa. não acaba e o deficit ainda menos ameaça acabar! (Riso.)
Tem-se dito, e repetido, na presente sessão parlamentar, que é menos fundado accusar homens, com larga vida publica, de mudarem de opinião, accentuando-se até que elles não podem ter a immobilidade da ostra. Se tomar, como norma de politiica a ostra, póde ser muito mau,

Página 1519

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1519

talvez seja peior tomar como exemplo o camaleão. (Apoiados.)
Seja porém assim.
É possivel que as circumstancias aconselhem a que se possa mudar de opinião em assumptos financeiros. Muda-se de opinião, mas não se muda de consciencia; o desejo recto de servir o paiz e sempre o mesmo, o que ha e um novo modo de apreciar as questões; mas o proposito de acertar e o mesmo. E, nestes termos, não se póde criminar o homem politico que variou de parecer.
Faço justiça ao sr. Fontes, cavalheiro a quem tribute a maior estima e consideração.
Acredito que a sua consciencia mo mudou n'esta questão. Mudou, porém, a sua opinião, e mudaram os seus actos, por isso e que o accuso, e censuro, politicamente.
N'aquelle relatorio, notavel, sob muitos pontos de vista, calcularam-se as receitas por uma fórma que se allegava ser tudo quanto havia de mais rigoroso.
O sr. Fontes Pereira de Mello teve o cuidado de dizer que não se deviam calcular nem metter em linha de conta tanto a diminuição de despeza resultante das vacaturas como o augmento de receitas, dizendo que esses elementos eram conjecturaes, e que tudo isso devia ficar para as despezas imprevistas.
As receitas eram, pois, calculadas com tal rigor no orçamento, e no relatorio de fazenda, que não se mettiam em linha de conta nem as vacaturas nem o crescimento espontaneo das receitas.
Calculavam-se, por tanto, as receitas o mais rigorosamente possivel em 28.529:838$000 réis, e as despezas, tambem o mais rigorosamente possivel, em 30.837:374$960 réis.
O sr. Fontes Pereira de Mello fazia differentes correcções, e dizia a final que o deficit ordinario, depois de todas essas correcções, chegava a somma de 2.826:361$960 réis a que era necessario supprir.
Para satisfazer as despezas extraordinarias contava com o producto liquido da conversão das obrigações dos caminhos de ferro do Minho e Douro, e dos navios de guerra, operação esta que foi, em verdade, feliz para o thesouro, e digo, intencionalmente, feliz para o thesouro, porque, com respeito ao paiz, talvez tivesse de fazer algumas restricções.
Teve, pois, o governo a felicidade de poder applicar ao pagamento das despezas extraordinarias de 1882-1883 o producto d'aquella operação, e por isso só tinha a prover ao deficit ordinario, que, calculado com o rigor a que se se fez referencia, subia a 2.368:097$854 réis.
Para suprir este deficit dizia s. exa. que não vinha propor uma organisação financeira definitiva, longe disso, limitava-se a algumas medidas que não passavam, em grande parte, de expedientes de occasião, mas que tinham o unico merecimento de assegurar, uma vez que fossem devidamente executadas, o equilibrio do orçamento nacional.
Era s. exa. o proprio que criticava os novos impostos que propunha, era elle mesmo que até, quanto a outros que mantinha, se accusava de contradictorio, mas acrescentava, e, com sobrada rasão, que entendia dever sacrificar a sua personalidade ao interesse que o paiz tinha em debellar, de uma vez para sempre, o deficit.
Simples expedientes, pois, e nada mais: e tanto assim que, por certo, para os não complicar, o governo faltava ao compromisso que, solemnemente, tinha contrahido, anteriormente, ao suspender, na parte que dependia do lançamento previo, o imposto de rendimento.
Com effeito no respectivo decreto, cujo relatorio e talvez um dos mais prolixos de que ha memoria, dizia-se que a substituição do imposto de rendimento n'aquella parte por um addicional, lançado em todo o caso - note a camara - guardadas, quanto possivel as proporções da lei de 18 de junho de 1880, era medida de grande alcance.
Apparece, porém, o sr. Fontes Pereira de Mello, e por um simples artigo, lança um addicional de 6 por cento sobre todas as contribuições, ficando postas de parte todas as proporções do imposto de rendimento!
Emquanto calculava o sr. Fontes Pereira de Mello o rendimento dos novos impostos, o producto dos seus expedientes?
Em 2.407:000$000 réis.
Por consequencia, com as receitas calculadas, como se dizia, rigorosamente, o producto dos novos impostos era sufficiente para equilibrar o orçamento.
Mas vamos a ver o resultado geral.
O resultado geral, não sou eu que digo, qual foi: é a actual commissão do orçamento que o diz no parecer, que se acha em discussão.
O resultado geral do anno em que não devia haver deficit ordinario foi este:

Exercicio de 1882-1883 - deficit .... 2.529:000$000

Mas ha mais: a receita total do anno economico de 1882-1883, resultante da addição do producto das taes receitas calculadas rigorosamente no orçamento e do producto de novos expedientes tributarios, não chegou a attingir a quantia que o sr. Fontes tinha calculado só para os antigos rendimentos! Com effeito a receita ordinaria total do estado foi n'esse anno de 28.186:003$749 réis.
No anno seguinte (1883-1884) o sr. Fontes chegava de novo a satisfactoria conclusão de que estaria debellado o deficit ordinario se as receitas se mantivessem, e não augmentassem as despezas; insistia nos seus calculos anteriores, e annunciava que o deficit ordinario d'esse anno seria apenas de 259:291$162 réis. E a final de quanto foi o deficit verdadeiro? A conta do exercicio de 1883-1884 ainda não está publicada, mas, em presença da respectiva conta de gerencia, o actual sr. ministro da fazenda encarrega-se de responder ao sr. Fontes e diz-nos, no relatorio que precede o orçamento rectificado, que estamos discutindo, ter sido esse desiquilibrio entre as receitas e as despezas 1.276:000$000 réis!
De maneira que, em vez do deficit de exercicio, que devia ser de 259:000$000 réis, temos um deficit de gerencia na importancia de 1.265:000$000 réis!
Taes são os resultados financeiros dos annos de 1882 a 1884, em que o deficit devia ter acabado.
O sr. Fontes deixou a pasta da fazenda, legando-a, com os respectivos deficits, ao sr. Hintze Ribeiro. Segue-se, pois, mui naturalmente, entrar agora na apreciação do deficit actual.
Dizia eu que já havia calculados, para este anno, tres deficits. Temos no orçamento geral do estado de 1884-1885 calculado o deficit de 772:000$000 réis; em seguida tivemos computado o desequilibrio de 969:021$079 réis entre as receitas e despezas ordinarias fixadas por virtude da lei de meios, de 23 de maio de 1884, e agora o presente orçamento rectificado de 1884-1885 apresenta uma terceira, correcta, e augmentada, edição de deficit na importancia de 1.423:417$202 réis. E poderá a camara convencer-se de que este venha a ser o deficit final? Eu tenho, a este respeito muitas duvidas, fundadas nos proprios calculos do sr. ministro da fazenda, e que, no desempenho do meu dever, passo a expor.
Temos o calculo da receita e o calculo da despeza.
O presente orçamento rectificando o calculo das receitas em mais de 210:000$000 réis, eleva-as a 31.646:000$000 réis, numeros redondos, e rectificando as despezas, em mais de 664:000$000 réis, tambem numeros redondos, eleva as a 33.069:000$000 réis, igualmente numeros redondos, vindo a ser o deficit rectificado de 1.423:000$000 réis. Pretende, porem, o sr. ministro da fazenda que esta seria a peior das hypotheses, e que, ha fundadas rasões, para prever que elle não exceda 636:000$000 réis. Vejamos os calculos em que taes provisões se fundam.
As receitas effectivas dos doze primeiros mezes do exer-

80 **

Página 1520

1520 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cicio de 1883-1884 foram de 28.422:000$000, a estas addicionam-se as pertencentes ao mesmo periodo, que deviam ter sido arrecadadas no semestre supplementar d'aquelle exercicio, e que o sr. ministro da fazenda calcula em réis 1.193:000$000, mas que eu admitto que fosse mais do que isso, porque do relatorio da illustre commissão do orçamento, segundo os seus calculos, esta receita foi de réis 1.324:000$000. A estas duas verbas acrescenta o sr. Hintze Ribeiro a importancia do augmento annual das contribuições: 1.500.000$000 réis.
Não contestarei este calculo; acceitarei os 1.500:000$000 réis do augmento annual. Eu podia perguntar ao sr. ministro da fazenda sé este augmento e calculado pela comparação de semestres ou do annos; pois que no seu ultimo relatorio esta comparação póde levar a resultados diversos, como demonstrei em tempo a camara, sendo certo que ali se escreve que a media do augmento annual e não de réis 1.500:000$000 mas de 1.000:000$000 réis.
Acceitemos, pois, por emquanto a fixação, da receita em 31.115:000$000 réis.
Vamos á despeza. A inscripta n'este orçamento orça por 33.071:000$000 réis. D'esta quantia, porém, pretende o sr. Hintze Ribeiro que se abata a de 1.322:000$000 réis de vacaturas, annullações de serviços, e outras despezas que não se realisam, calculando a sua importancia em 4 por cento de excesso no exercicio de 1882-1883.
Mas aqui e que assenta a minha grande duvida; e, por isso, desta verba direi laid anguis.
O sr. Fontes não calculava em 1882 para a extincção do deficit ordinario com a importancia das vacaturas, se bem que já com ella contava em 1883, e ao contrario, n'aquelle anno, entendia que tal importancia se devia deixar para supprir, com ellas, despezas imprevistas. Ainda assim, porem, calculava a sua importancia em 200.000$000 réis.
Como é, porem, que para o presente anno se calculam as vacaturas, se bem que acrescentados com as chamadas annullações e despezas que se não realisam, em réis 1.322:000$000?
Porque em 1882-1883 houve uma differença entre as despezas auctorisadas e as despezas pagas de 1.312:000$000 réis ou cerca de 4 por cento, superiores ao orçamento. E isto, que se deu n'esse anno, deve tambem dar-se no presente anno economico. Eis o argumento do governo.
Parece que, para se calcular, em 4 por cento, a importancia das vacaturas, anuullações, e não realização de despezas, no anno que vae correndo, o que faria qualquer mathematico era tomar a media de uns poucos de annos, se esta media desse 4 por cento então, estava bem feito o calculo do sr. ministro da fazenda. Mas o governo não fez isto, tomou só o anno de 1882-1883, nada mais. É pouco.
Dei-me ao trabalho de tomar a media da differença entre as despezas avaliadas e as despezas pagas nos differentes exercicios a que se refere a conta geral da administração financeira do estado.
Tenho aqui o respectivo calculo e posso apresental-o ao illustre relator da commissão; quando fallo em calculos tremo sempre diante de s. exa. D'esse calculo apurei que a media da percentagem entre as despezas pagas e as auctorisadas n'esses annos deve ser de pouco mais do 2 por cento, d'aquellas sobre estas. Como se estabeleceu, pois, o calculo de 4 por cento, que representa o maximo de um anno, e não a media de todos?
E assim os 1.322:000$000 réis que o governo conta para attenuar o deficit ordinario, ficam por esta consideração em 661:000$000 réis.
Notarei tambem que no anno de 1882-1883, se as despezas foram avaliadas em 32.027:000$000 réis, foram liquidadas só em 31:400:000$000 réis, ou menos réis 627:000$000, e percorrendo a conta geral da administração do estado, - documento a que não posso deixar de me referir sempre com louvor, - vejo que essa diminuição e devida em grande parte a despezas de instrucção primaria que se avaliaram a cargo do estado, mas que se não liquidaram. Ora, para a procedencia do calculo parecia melhor tomar a differença entre a liquidação e a cobrança, do que entre a cobrança e a avaliação: mas não se fez assim.
Porque é, porem, que o governo escolheu para base do seu calculo o anno de 1882-1883?
Pensei, reflecti muito, mas a final parece-me ter descoberto a rasão da preferencia.
Antigamente o exercicio compunha-se de vinte e quatro mezes: mas em 1882-1883, por virtude da reforma da contabilidade publica, começou o exercicio a ter só dezoito mezes. De maneira que ficou havendo um periodo supplementar só de seis mezes, em logar de doze, como antigamente. Ora, em seis mezes paga-se muito menos do que n'um anno. De maneira que no orçamento desse anno, que tinha um exercicio, muito mais curto do que os outros, as despezas pagas foram muito menos do que as dos outros annos.
Parece-me ser esta a explicação da escolha d'aquelle anno.
E era caso para admirar, como haviamos nós, sem ter dado por tal, economisado em 1882-1883, 1:312:000$000
É que d'esta quantia ficavam em divida 612:000$000 réis de juros da divida publica interna e externa, que se hão de pagar por força, e, n'ella se comprehende, ainda, a importancia de despezas de instrucção primaria, que, como vimos, não foram liquidadas.
Examinando assim a prova de que o deficit será diminuido, vamos á contraprova; porque no relatorio do governo ha prova e contraprova.
A contraprova e baseada na importancia do desequilibrio, resultante da comparação, entre as receitas ordinarias e as despezas ordinarias, constantes da conta da gerencia da administração da fazenda publica em 1883-1884.
Ora d'esta simples consideração se conclue, que este deficit de 1883-1884 não é deficit de exercicio, mas sim de gerencia. E como é possivel que o deficit de exercicio seja superior ao da gerencia, e, em todo o caso, ha de ser diverso, não é acceitavel tal base para o calculo do deficit do exercicio no anno corrente.
Acceitei, ate aqui, como a camara tem visto, o calculo do governo quanto a fixação das receitas, mas não posso acabar commigo, não me referir agora a rectificação, para mais, que este orçamento propõe sobre as avaliações do mappa das receitas elaborado para o presente exercicio.
Bem sei que o augmento proposto não e extraordinario - 210:000$000 réis - mas infelizmente, não nos encontrâmos em circumstancias financeiras, de tal ordem, que possamos desprezar qualquer augmento de receita.
O augmento provem, principalmente, do producto calculado para o imposto do sal, que, tendo sido avaliado em 116:000$000 réis, passa agora a ser computado em 270:000$000 réis.
D'esta rectificação collijo eu, antes de tudo, que o governo não tem intenção de alterar, de modo algum, o imposto do sal, porque qualquer alteração n'esse tribute modificaria os calculos apontados. E como o producto é calculado para mais, e não para menos, ficâmos sabendo todos, com certeza, que o imposto do sal se manterá!
E, tal é, o despacho, que, o governo, da a todos os que teem requerido e reclamado contra o imposto do sal! (Muitos apoiados.)
Este imposto é muito conhecido entre nós e já tem atraz de si uma revolução.
A primeira cousa que, a D. João I, quando voltava victorioso, reclamaram os povos, foi que se abolisse o vexatorio imposto do sal. Contra elle levantou a sua palavra, eloquentissima, José Estevão, e eu tenho a consolação de que alguem, a quem me prendem os lagos mais intimos, tambem, contra elle, foi, n'esta camara. Fez uma revolução, re-

Página 1521

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1521

pito, tem esta historia atraz de si, e hoje, apesar de todas as commissões parlamentares, e extra-parlamentares que se têem, constituido, a despeito de quaesquer trabalhos que ellas tenham organisado, sem embargo das representações e das supplicas apresentadas, o governo diz: o imposto do sal vae render 270:000$000 réis! Isto é, mais 116:000$000 réis!
Bom despacho! (Muitos apoiados.)
Desçamos, porém, as particularidades, a ver se os factos justificam os calculos.
A proposta apresentada pelo sr. Fontes estabelecia o imposto de 10 réis por litro sobre o sal importado pelas alfandegas ou apurado nas salinas, exceptuando o destinado á exportação, á salga, do peixe, e o que se consumisse no fabrico de productos chimicos. A maioria da epocha, apesar de dedicada ao governo, reagiu um pouco contra o imposto, e, fez introduzir na lei algumas correcções. De sorte que o imposto passou a ser de 8 réis por litro, em vez de 10 réis, e foram, muito augmentadas, as excepções.
O sr. Fontes tinha calculado que o imposto, como elle propunha, renderia 490:000$000 réis; mas com as correcções feitas pela camara, com a diminuição da taxa e com o alargamento das excepções devia render 270:000$000 réis.
Mas o que rendeu esse imposto? Responde, o sr. ministro da fazenda actual, ao sr. presidente do conselho, que era, então, ministro da fazenda.
O imposto do sal, em todo o anno de 1883, diz o sr. Hintze, no sen relatorio de 1884, rendeu 16:356$509 réis.
Agora a conta geral do thesouro, - essa conta que o sr. relator fez com tanta proficiencia, e que tem de ser o calvario de muitas provisões, porque s. exa. não podia faltar á verdade, nem era capaz disso, essa conta que vem justificar como são feitos muitos calculos dos ministerios regeneradores - essa conta diz que, em 1882-1883, o imposto do sal rendeu 1:746$755 réis.
É preciso dizer que o producto fôra, n'esse anno, calculado em 135:000$000 réis, pois por virtude da publicação do regulamento, o imposto só começou a executar-se no segundo semestre d'esse anno.
Em 1883-1884 o imposto, avaliado já em 270:000$000 réis rendeu 30:583$350 réis.
Em 1884, o actual sr. ministro da fazenda, entendeu, e entendeu bem - n'essa parte não posso deixar de acceitar a defeza de s. exa. feita pelo sr. Franco Castello Branco, - que se devia modificar este imposto, lançado pelo sr. Fontes.
Reconheceram assim, embora tarde, que, apesar de tanto se terem esforçado, durante a discussão, por mostrar o rigor e a procedencia dos seus calculos, se haviam enganado.
A taxa foi diminuida de 8 a 3 réis, applicada a todo o sal consumido, ou, empregado no reino, e, em vista deste remodelamento o mappa das receitas calculou o producto deste imposto só em 116:000$000 réis.
Com que fundamento, pois, se rectifica hoje esta verba mais 154:000$000 réis? Porque?
A explicação, diz-se, vem na observação 46.ª do orçamento de 1885 para 1886, e ahi declara-se que o imposto deve render 270:000$000 réis.
Essa nota, porém, diz respeito só ao producto de dois mezes e meio. É, pois, muito pouco para basear o proposto augmento de receita.
Quando se calcula o rendimento do imposto só pelo que tem rendido em dois mezes ou dois mezes e meio, pouca confiança posso ter na diminuição do deficit.
E, eu, já poucas esperanças posso ter, de que, o deficit fique nos limites, marcados pelo sr. ministro da fazenda. Pois vamos a ver o que fez a commissão do orçamento.
A commissão augmentou as despezas do orçamento rectificado proposto á camara pelo governo.
A commissão augmentou 221:000$000 réis, numeros redondos, sobre o orçamento apresentado pelo governo, e como não desejo dizer cousa que não possa provar, vou mostrar, em que, consiste esse augmento.
Na junta do credito publico ha o augmento de 971$865 réis; no ministerio da fazenda 35:000$000 réis; no ministerio do reino 70:700$000 réis; no ministerio da justiça 10:000$000 réis; no ministerio dos estrangeiros 10:000$000 réis; no ministerio da marinha 904:093$679 réis. Total réis 221:065$544.
Devo dizer que, algumas das despezas, são justificadas.
No ministerio da fazenda temos 19:000$000 réis para fiscalisação das alfandegas, 10:000$000 réis, que é o contingente a augmentar para a correcção das matrizes, e, réis 6:000$000 para despezas extraordinarias no ministerio de saude. Isto perfaz a somma de 35:000$000 réis.
No ministerio da justiça o augmento e destinado á alimentação dos presos.
No dos estrangeiros o excesso, proposto pela commissão tem por fim satisfazer despezas, com a conferencia de Berlim.
E no ministerio do reino o seguinte:
«Mas estas avaliações, segundo as informações prestadas pelo governo, carecem ainda de ser correctas.
«O augmento constante do numero de enfermos no hospital de S. José e annexos tem aggravado a despeza n'aquelles estabelecimentos em proporções não cogitadas, de sorte que, apesar do acrescimo da dotação respectiva, nos dois ultimos annos, a divida por fornecimentos não póde ser extincta e o atrazo n'esses pagamentos faz com que os mesmos fornecimentos sejam mais caros, porque n'elles ha de recair o juro da mora do embolso do preço dos generos. Essa divida era em 30 de junho de 1884 de 31:762$844; réis, segundo as contas da respectiva administração: o governo pede que a camara o habilite, por meio de verba extraordinaria, a pagal-a, e para esse fim a commissão descreveu no sou projecto a quantia de 31:700$000 réis. A necessidade de adquirirmos mais alguns hospitaes-barracas, e de todos conhecida, e ainda a commissão entendeu que se póde applicar extraordinariamente a essa acquisição a quantia de 30:000$000 réis.
«Pelos esclarecimentos fornecidos pelo governo vê-se que a verba calculada por este ministerio para despezas extraordinarias de saude não e sufficiente. Novas liquidações de despezas, em tempo ordenadas, têem sido feitas e reclamam approximadamente a quantia de 9:000$000 réis.
«Sobem assim os augmentos de despeza sobre a proposta do governo, por este ministerio, a 70:700$000 réis.»
Alem d'estes augmentos ha mais um credito supplementar aberto a favor do ministerio da marinha e do ultramar em relação ao exercicio de 1883-1884 de 95:093$679 réis, - somma 221:065$544 réis.
Mas, o mais extraordinario, o que, realmente, me fez reflectir muito, e que a commissão, augmentando 221:000$000 réis, diz que diminue a despeza, sobre o projecto do governo, e apresenta uma tabella, perfeitamente organisada, em que, de facto, apparece uma diminuição, na despeza ordinaria, de 31:700$000 réis.
As despezas augmentam, porque estas verbas são effectivas, mas ha uma economia de 31:700$000 réis! Como se faz isto?
Vou expôr á camara como e que se operou este prodigio de augmentar 221:000$000 réis de despezas effectivas, e economisar 31:700$000 réis.
Não fallando nos 971$865 réis da junta de credito publico que se dizem compensados na verba destinada a commissões, corretagens, juros, differenças de cambios e outras despezas extraordinarias, temos: ministerio da fazenda 35:000$000 réis; 6:000$000 réis tiram-se das despezas ordinarias e passam-se para as extraordinarias, e ficam aquellas em 29:000$000 réis; pelo ministerio da justiça não ha compensação; pelo ministerio dos estrangeiros tambem não ha compensação; para os 95:000$000 réis do mi-

Página 1522

1522 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nisterio da marinha cria-se um credito supplementar e os 70:700$000 réis do ministerio do reino vão tambem para a despeza extraordinaria. Ficou, pois, para a despeza ordinaria: fazenda 29:000$000 réis, justiça 10:000$000 réis, estrangeiros 10:000$000 réis, somma 49:000$000 réis. Vae-se ao ministerio do reino e faz-se a economia de réis 80:700$000!
Resultado final diminuição de 31.000$000 réis!
Mas que economias são estas que só fazem no ministerio de reino? Vae dizel-o a commissão:
«Para lhes fazer face, póde sem inconveniente deduzir se:
«1.° Na verba na secção 4.ª do artigo 14.° da tabella de despeza ordinaria do ministerio a quantia de 40:000$000 réis, visto como todos os ordenados dos professores dos lyceus ahi descriptos estão integraes, e a uma parte d'esses professores, como provisorios, só é abonada metade do ordenado;
«2.° Na verba da secção 4.ª do artigo 15.° da mesma tabella a quantia de 40:700$000 réis, visto como pelos esclarecimentos prestados pela competente repartição as sobras n'esse artigo devem ser muito superiores:
«N'estes termos haverá ainda no conjuncto dos pedidos constantes da proposta governamental uma economia de réis 10:000$000.»
Estes 80:700$000 réis, não representam, porém, como a camara vê, uma economia effectiva, pois eram quantias que, de facto, se não gastavam.
Mas ha mais.
O sr. ministro da fazenda, não direi, com a sua phantasia uberrima, mas com os seus rigorosos calculos, tinha achado que as sobras e annullações davam 1.312:000$000 réis este anno.
Parece que já lá deviam estar calculados estes 80:700$000 réis. Pois não estavam. A não ser que, como no theatro, em que certos comparsas sáem por uma porta e entram por outra, para figurarem exercitos numerosos, estes algarismos figurem em duplicação!
Não sei, pois, como isto possa ser economia effectiva! Fiquei certo de que o augmento real proposto na despeza é de 221:000$000 réis; da economia, porém, duvido.
Parece-me ter demonstrado que o orçamento rectificado traz augmento de despeza, que o orçamento rectificado accusa graves violações do regulamento geral de contabilidade publica, que o orçamento rectificado inscreve um deficit augmentado, e que o parecer da commissão ainda exagera as despezas.
Resta pensar no capitulo quarto das minhas considerações; que é o que se refere as despezas extraordinarias.
A proposito de despezas extraordinarias, lembro uma phrase do sr. Fontes: a despeza extraordinaria e a que se quer que seja.
Um orçamento que for calculado sob o principio de que a despeza extraordinaria e a que se quizer, de certo não pode merecer grande confiança.
Eu não comprehendo que distincção, de facto e positiva se póde fazer, entre despeza ordinaria, e certa despeza extraordinaria, que por sua propria natureza o não é, por ter de se repetir annualmente.
Abrindo o orçamento rectificado, vejo que elle nos apresenta uma verba de despeza extraordinaria na importancia de 7.020:122$388 réis, isto é, mais 1.782:122$388 réis do que a fixada pela lei de 23 de maio ultimo, o que não é, sem grave surpreza minha, pois que, lendo os relatorios do sr. Fontes, de 1882 e 1883, vejo que s. exa. queria que o pensamento de uma justa parcimonia nas despezas presidisse as deliberações dos poderes publicos, que, mais acconselhava, que a despeza extraordinaria fosse feita de modo que os juros fossem representados no orçamento, e, que pedia se não que se parasse, que ao menos se diminuisse o andamento, e se limitassem essas despezas ao que fosse meramente necessario; insistindo era o que qualquer pequeno desvio era um grande perigo, e concluia dizendo que chegados a certa extremidade, só nos restaria o imposto, que é o onus, ou a bancarota, que e a deshonra.
Isto aconteceu em 1882 e repetiu-se em 1883.
Mas, apesar de taes propositos, em 1882, não contentes com fazerem se despezas extraordinarias no paiz, iam fazer-se no estrangeiro: subsidiava se uma companhia de caminhos de ferro em Hespanha! (Apoiados.)
Já não serão só despezas extraordinarias, eram tambem extranacionaes!! Mais uma qualificação de despezas.
Em 1883, a corrente que requeria despezas extraordinarias era tão forte, que, parecia, ao sr. Fontes chegou a faltar aquella coragem e aquella firmeza que, dissera ser necessaria para resistir, e ao fazer o calculo d'essa despeza, que era importantissima, consolava se dizendo que os encargos d'ahi provenientes só se tornariam effectivos nos annos de 1886-1887 e 1887-1888!
Agora já estamos perto de começar a pagar esses encargos de todas essas despezas extraordinarias!
Calculava s. exa.:
Lindas de Mirandella e Vizeu 2:790$000 réis, Beira Baixa, 62:000$000 réis (nos primeiros annos) 277:020$000 réis nos outros; Sul do Tejo 264:000$000 réis, e afinal, depois de enumerar diversas linhas, concluia que em 1 de julho de 1888 o encargo annual será de 603:000$000 réis numeros redondos. Além d'esta, havia as despezas de pharoes e outras. Mas depois d'isso ainda ha a contar com o porto de Leixões; com a occupação do Zaire, de que ninguem mais teve noticia; com o cabo submarino, que já se votou este anno; e emfim com todos os encargos provenientes de diversos melhoramentos!
Bem sei que se me vae responder com a rede dos caminhos de ferro, com o desenvolvimento das communicações, com todos estes melhoramentos materiaes, cuja iniciativa e privilegio unicamente do partido regenerador, mas quanto tem crescido a despeza em relação á receita?
A proporção n'estes ultimos trinta annos e de 80 para 100!
Emquanto as receitas crescem 80, as despezas crescem 100!
E, pergunto, ao governo, e ao illustre relator da commissão, se esta proporção pode continuar, e se não devemos voltar aos principios financeiros do sr. Fontes de 1882?!
O sr. ministro da fazenda diz á opposição que discuta serenamente este assumpto, - e eu creio que o tem feito, - e, fazia votos para que o espirito de conciliação que actuara no emprehendimento das reformas politicas se manifestasse na cooperação dos partidos para a resolução das difficuldades que suscita a questão da fazenda.
O que eu, porém, se permittido me fosse, diria a s. exa. era que, em vez, de fazer esses pedidos a opposição, tratasse primeiro de pôr-se de accordo com o sr. Fontes Pereira de Mello, porque s. exa., quando ministro das obras publicas, foi quem lhe fez mais opposição, e agora, com o systema que segue está-se desviando, profundamente, dos principios financeiros do sr. Fontes de 1882.
Esta questão das despezas extraordinarias tem sido maduramente considerada lá fóra, onde a civilisação tambem tem exigencias.
Lembro-me de ter lido em tempo um artigo muito notavel do sr. Cambray Digny, antigo ministro da fazenda em Italia, ácerca do luminoso relatorio apresentado ultimamente ao parlamento italiano, pelo actual ministro das finanças d'aquelle paiz.
Em primeiro logar, este illustre estadista, diz que o ministro da fazenda, dizendo a verdade ao paiz, como ella é, fizera obra, não só digna da sua intelligencia, mas essencialmente leal e honrada. E insiste sobretudo no perigo apontado, de se desenvolverem as despezas extraordinarias, que quer, ao que me pareceu, se contenham dentro de certos limites, se façam com as sobras do orçamento ordinario, sem se recorrer ao credito.

Página 1523

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1523

N'outro artigo, de mr. Ramus, publicado, creio, na Nouvelle revue de mme. Adam (Juliette Lambert) dizia-se uma grande verdade, qual era que o orçamento da despeza extraordinaria, em França, era o desaguadeiro do orçamento da despeza ordinaria, tão insufficiente, porém, que não evitou que aquelle trasbordasse. É exactamente o que acontece entre nós.
Qual é a situação financeira da Italia para ter tanto medo das despezas extraordinarias?
E, note-se, que ali pozeram-se de accordo, como eu que na que se pozessem, entre nós, o ministro da fazenda e o da guerra para diminuir a despeza: comprehendendo ambos que, para honra da patria, não basta ter um exercito bem cuidado, mas é mister, tambem, satisfazer os compromissos do paiz. (Apoiados.)
A situação d'aquelle paiz accusa-a esta nota, que tenho presente, e que é extrahida do artigo do sr. Cambray Digny.
Na Italia deu-se uma cousa para nós extraordinaria. Nos orçamentos ordinarios, do ultimo triennio de 1882, 1883 1884, o augmento das receitas ordinarias, sobre as despezas, foi da media annual de 23 milhoes, e, o augmento das despezas effectivas ordinarias de 7 milhões, havendo, por isso, um melhoramento de 16 milhões.
Acontecia, porém, que as chamadas despezas extraordinarias foram, no mesmo periodo, do 115 milhões, e as receitas cobradas de 27 milhões, vindo assim estas a absorver aquella melhoria, e, a demais, a causar a cessação total dos saldos de receita sobre despeza que se tinha elevado a 56 milhões!
Ali faz se distincção entre despezas, simplesmente extraordinarias, e despezas ultra extraordinarias, ou imprevistas, para, as quaes o sr. Fontes dizia deverem deixar-se as verbas provenientes das vacaturas e do crescimento da receita.
Isto é o que se faz em Italia, mas entre nós faz se o contrario.
Porque não nos havemos de conter dentro de uns certos limites e fixar o maximo para as despezas extraordinarias? Porque só não faz isto? (Apoiados.) Não comprehendo.
Dir-se-ha que o governo, a respeito da gerencia financeira, quer seguir o preceito do sermão da montanha:
«Não vos atormentais pelo ámanhã; o ámanhã lá curará do que lhe pertence; bem bastam a cada dia as suas penas.»
Que lhe importa o dia de ámanhã? Bem lhe bastam as penas de hoje, as de ámanhã outros a sentirão. Muito bem: seja assim.
Temos, pois, desequilibrio entre as receitas e as despezas ordinarias, e temos o augmento nas despezas extraordinarias. Situação grave.
Qual é o plano que o ministro da fazenda nos apresenta para sairmos d'esta situação? Quaes são as suas idéas a respeito da solução d'este problema que urge resolver?
Não tem s. exa., na opinião do sr. Fontes Pereira do Mello, senão dois caminhos a seguir: ou o do imposto, que é o ónus, ou o da bancarota, que é a deshonra.
Não optando s. exa., como de certo não opta, pelo segundo, resta-lhe o primeiro que propõe.
Mas o que nos offerece o sr. ministro?
Por um lado traz-nos calculos como aquelles que eu indiquei, e, por outro, emenda a mão do sr. Fontes Pereira de Mello, remodelando os impostos que tinham sido apresentados por o sr. presidente do conselho. E pouco. Mais. Veiu pedir-nos uma auctorisação para a reforma das alfandegas, a qual, já sabemos, hade importar augmento de despeza, mas cujos beneficios não podemos apreciar devidamente, porque deixaram de ser presentes ao parlamento todos os materiaes necessarios para formar opinião a este respeito. Não basta. E, por fim, prometteu-nos uns centos de contos de réis resultantes da alteração das taxas do imposto do sêllo.
E eis tudo!
Pergunto, será isto, na conjuncção actual, sufficiente?
E, deverão ser acoimados de pessimistas, aquelles que se limitam a dizer a verdade ao paiz, a respeito da situação financeira?
Creio que não. (Apoiados.)
E, direi mais, que os meus collegas que tal fizeram praticaram, consoante a opinião que ha pouco citei, um acto, não só digno da sua alta intelligencia, mas sobretudo leal e honesto. (Apoiados.)
Para concluir appello para a consciencia do sr. ministro da fazenda. Estou convencido de que, nas circumstancias occorrentes, s. exa. ha de repetir, pelo menos para si proprio, as palavras que o seu collega da Italia não teve duvida em proferir no parlamento, quaes eram «que aquelles que examinavam, severamente, o orçamento do estado eram benemeritos, por isso mesmo que eram rigorosos». (Apoiados.)
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
o sr. Presidente: - Os documentos a que se referiu o sr. Goes Pinto, antes da ordem do dia, estão sobre a mesa, para s. exa. os poder examinar, como pediu.
0 sr. Carrilho (relator): - Sr. presidente, o illustre deputado que acaba de fallar perguntou á commissão e ao governo como é que têem tenção de providenciar para fazerem face a esta despeza de 39.995:000$000 réis, descripta no orçamento rectificado, quando a final de contas a receita ordinaria avaliada e apenas de 31.647:000$000 réis.
Responderei a esta pergunta em poucas palavras.
Responderei, digo, com a nota da divida fluctuante em 30 do abril de 1885, comparada com a existencia d'ella em 31 de Janeiro do anno corrente.
Ao passo que a divida fluctuante era em 31 de Janeiro de 1885 de 3.361:000$000 réis, em 30 de abril do mesmo anno havia descido a 2.662:000$000 réis.
A divida fluctuante tem assim diminuido neste periodo do actual anno 698:000$000 réis, o que quer dizer, n'este segundo semestre do anno economico as receitas ordinarias do thesouro têem sido sufficientes para se poder satisfazer a todas as despezas ordinarias e extraordinarias, visto como temos n'esse periodo attendido a todos os pagamentos orçamentaes regularmente e havemos mesmo diminuido parte do empenho do semestre anterior.
Aqui estão os meios com que o governo conta para fazer face as despezas do actual anno economico, mencionadas no projecto que se discute.
Se tratassemos de apreciar o orçamento do exercicio futuro, comprehendia-se a pergunta do illustre deputado; nas em relação ao orçamento do actual anno, ao qual faltam apenas menos de dois mezes para o seu periodo principal de exercicio e em que de mais a mais os recursos se mostram relativamente abundantes e sufficientes para os nossos encargos, a pergunta e perfeitamente deslocada.
Para fazer face aos encargos do anno economico de 1884-1885, de que trata este orçamento, não temos necessidade de nenhum recurso extraordinario, além dos já realisados.
Ao iniciar o seu brilhante discurso, affirmou o illustre deputado que eu não tinha sido perfeitamente exacto nas allegações que havia feito ha dias quando respondi ao sr. Eduardo Coelho, a proposito da moção de adiamento que por este digno representante da nação havia sido apresentada.
Eu disse que me parecia que essa proposta de adiamento não tinha fundamento. O sr. Eduardo Coelho baseava-a na falta do documentos comprovativos da despeza, avaliada na proposta, com as providencias sanitarias para impedir a invasão do cholera morbus no paiz, e no

Página 1524

1524 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

facto de ainda não estar distribuido o relatorio dos actos do ministerio da fazenda em relação ao anno civil de 1884.
Ora, nós não tratavamos de discutir uma conta de despeza mas sim um orçamento, e o relatorio dos actos do ministerio da fazenda tambem não me parecia necessario e indispensavel n'este debate, porque parte dos documentos que eram costume ter logar n'esse relatorio já estão publicados ha muito tempo.
E direi ainda que uma cousa é o relatorio de que se trata, isto é, a noticia mais ou menos larga dos documentos, outra cousa e a apresentação dos mesmos documentos conjunctamente com o relatorio. E são os documentos as peças necessarias para apreciar o orçamento geral do estado, principal se não exclusivamente na parte em que elles se referem a gerencia dos dinheiros publicos no ultimo anno.
E como o illustre deputado na sua moção parecia de certa forma insinuar que os documentos financeiros de 1883-1884, isto é, quanto se referem a liquidação, cobrança e applicação dos dinheiros publicos não estavam distribuidos á camara, eu, de accordo com os factos peço licença para dizer a s. exa. que esses documentos estão publicados na conta geral do estado, e ha muito distribuida e que portanto o illustre deputado, querendo accusar-me de menos correcto na minha apreciação, foi um pouco injusto para commigo.
Eu vou ler novamente o que se diz sobre este ponto na nota preliminar da primeira conta geral do estado, distribuida em principios da actual sessão legislativa. O texto é claro e os documentos justificam sobejamente esse texto. «Alguns dos documentos compendiados na segunda e sexta partes d'estas contas eram regularmente publicados no relatorio annual dos actos do ministerio da fazenda. Como, porém, esses documentos, não só têem inteira ligação com a conta geral do estado, mas servem de esclarecimento para a situação do thesouro e de contraprova a outros documentos da administração financeira, deu-se-lhes aqui logar como o mais apropriado para a sua apresentação ao parlamento, remodelando-os e harmonisando-os, tanto quanto possivel, as necessidades do mais complete e minucioso exame da contabilidade do estado e das epochas em que os recursos são arrecadados.»
Aqui tem o illustre deputado de como os documentos principaes da administração financeira no anno economico findo já tinham sido apresentados á camara quasi no principio da sessão, e portanto s. exa. não póde dizer que faltam os elementos necessarios para apreciar o orçamento rectificado, por isso que taes documentos tinham sido apresentados em epocha anterior aquella em que o costumam ser.
E eu não censurei a administração de 1880 por não ter feito distribuir o relatorio dos actos do ministerio da fazenda de 1879, quando se começou a discutir o orçamento de 1880-1881. Disse que, se me fosse licito invocar precedentes, invocaria o que se me deparára na sessão de 24 de maio de 1880, em que se notára que, apesar de entrar em debate o orçamento do anno economico seguinte, não tinha sido distribuido pelos senhores deputados o relatorio dos actos do ministerio da fazenda, o illustre ex-ministro o sr. Barros Gomes, que então dirigia a pasta das finanças, fez observar que o relatorio já tinha sido apresentado e que não era culpado da sua pouco exacta distribuição. Ora como não é possivel examinar documentos que se não possuem, o precedente colheria se por acaso hoje o parlamento estivesse na mesma ignorancia dos factos financeiros da gerencia anterior eu que o estava, não digo toda a camara, mas a oposição, na epocha parlamentar de 1880, quando se encerrou o debate do orçamento. Então o digno ministro da fazenda appellava para a illustração, zêlo e competencia dos deputados da opposição para com taes predicados supprirem a falta da distribuição do relatorio; hoje o governo e a commissão respondem as arguições que se lhes fazem lendo a conta geral do estado, onde os documentos parallelos e mais desenvolvidos estão publicados. E essa conta já ha muito está distribuida.
Já se vê, pois, que eu não fui injusto no reparo, e que outro tanto talvez se não possa dizer da arguição que se me fez a este respeito.
Disse se tambem n'este debate que o orçamento accusa graves violações dos preceitos do regulamento de contabilidade publica, que augmenta o deficit e que traz grandes despezas extraordinarias.
Vamos a ver em que e que este orçamento contém violação dos preceitos de contabilidade publica;
Se é com relação ás despezas extraordinarias de saude publica, essas foram feitas por meio de um decreto dictatorial, de que o governo já foi absolvido.
Não tinha necessidade nenhuma de abrir creditos extraordinarios, porque tinha, usando de poderes extraordinarios, publicado um decreto com forca de lei para fazer essas despezas.
Para que havia de abrir creditos extraordinarios se já tinha lei para realisar essas despezas? E tanto tinha que o tribunal de contas visou as ordens de pagamento respectivas, sem a maior hesitação.
Portanto, se se podia em tempo censurar o governo por ter publicado o decreto dictatorial, hoje, em que as camaras já fallaram sobre o assumpto, essa censura é incorrecta. E n'esses termos, repito, para que havia o poder executivo de abrir creditos extraordinarios para as despezas, cuja realisação já estava auctorisada por um documento que tinha a força de lei? Não tinha obrigação nenhuma d'isso.
Tinha o dever de abrir creditos extraordinarios se não tivesse publicado o decreto. Portanto abril-os era um perfeito pleonasmo, era uma accumulação de documentos. (Apoiados.)
Mas, acrescenta-se: o tribunal tinha obrigação do não visar as ordens, porque os preceitos do regulamento de contabilidade não tinham sido cumpridos: ha erro manifesto n'esta apreciação.
O tribunal tinha obrigação de resistir, se por acaso o governo não tivesse publicado o decreto dictatorial de que se trata e esse decreto representa a imposição legal que o poder executivo póde fazer para o visto das ordens de pagamento que faz expedir. Assume a completa responsabilidade do acto de que tem de dar contas ao parlamento. E já deu contas d'aquelle de que se trata e já foi relevado da respectiva responsabilidade.
Disse tambem o nobre deputado que se deviam ter feito no anno findo transferencias de verbas de artigo para artigo do orçamento, e não lhe consta que no Diario do governo se tivessem publicado documentos d'esta ordem comprovativos da legalidade dessas transferencias.
Como as despezas se fazem em regra como vem marcadas para cada artigo das tabellas, e claro que, se o governo, por qualquer circumstancia, tivesse excedido essas verbas, o tribunal de contas tambem não lhe visava as ordens respectivas: e se lh'as visou foi porque os competentes documentos de transferencia de verbas foram publicados.
A minha memoria nunca foi grande e agora, já velho, está muito fraca; no emtanto, recordo-me de que em dezembro de 1884 se publicou um decreto d'esta natureza pelo ministerio da marinha; em principios do anno ou fim do anterior, outro decreto pelo ministerio da guerra; e em outubro e novembro de 1884 tres decretos pelo ministerio da fazenda; havendo tambem, pelo menos, um pelo ministerio da justiça, cuja data não posso precisar.
Não podia adivinhar que s. exa. faria taes observações, senão teria trazido a nota dos numeros do Diario em que foram publicados os decretos determinando taes transferencias.
Portanto, como se diz que n'este ponto se infringiram os preceitos do regulamento de contabilidade? Parece-me

Página 1525

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1525

que acabo de mostrar que não se infringiram, antes não houve senão o exacto cumprimento da lei.
Disse s. exa. que lhe parecia tambem extraordinario que durante a gerencia financeira passada não se tivessem feito pelos diversos ministerios contratos superiores a 500$000 réis, visto que não tinha sido enviada para a camara nota d'esses contratos, nos termos tambem dos preceitos da lei de contabilidade publica.
Eu não sei se essas notas estarão sobre a mesa; mas eu estava na camara quando em tempo ouvi ler os officios que acompanhavam algumas d'essas notas.
V. exa., sr. presidente, póde dizer-me se sobre a mesa estão algumas notas enviadas pelos diversos ministerios, com relação a contratos por elles feitos, superiores a réis 500$000, e as datas em que essas notas vieram para a camara?
O sr. Presidente: - A mesa vae informar o illustre deputado.
O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): - Foram remettidas as notas a que se refere o illustre deputado nas seguintes datas:
Em 30 de Janeiro d'este anno do ministerio da fazenda;
Em 21 de Janeiro do mesmo anno do ministerio da marinha e ultramar;
Em 4 de fevereiro do ministerio do reino;
Em 23 de março do ministerio da guerra.
O Orador: - Já vê a Camara que os preceitos do regulamento de contabilidade, que o illustre deputado o sr. Beirão disse haviam sido falseados, não deixaram de ser cumpridos. Ha muitos mezes que estão sobre a mesa as notas dos contratos superiores a 500$000 réis, feitos pelos diversos ministerios, e no entanto dizia-se que essas notas não tinham sido apresentadas! (Apoiados.)
Tambem o illustre deputado, respondendo ao brilhante discurso do sr. Franco Castello Branco, referiu-se as difficuldades financeiras em que se encontrára o governo do nobre bispo de Vizeu, no anno de 1868-1869, e alludiu por essa occasião as importantes economias que se fizeram n'aquella data, e ao mesmo tempo a resultante de todas essas economias.
Não quero fazer politica retrospectiva, nem historia das finanças; portanto não acompanharei o illustre deputado na sua longa apologia d'essa situação politica, quero recordar alguns, poucos, factos d'essa data, para que se não julgue que é completamente exacta a apreciação feita pelo sr. Veiga Beirão, e que d'essa administração resultára a organisação; completa das nossas finanças.
É verdade que o sr. conde de Samodães se encontrou em grandes difficuldades para gerir a fazenda publica, mas maiores difficuldades elle teria se acaso o sr. Fontes, em 2 ou 4 de Janeiro de 1868, não tivesse deixado ficar intacto aos seus successores o producto liquido de 4.000.700:000 libras na importancia effectiva do 7.342:000$000 réis, emprestimo emittido a perto de 40 por cento; quando menos de dois annos depois, nem a tanto chegava o preço da parte da emissão que conseguia ser collocada, isto depois das economias fritas pelos successores do sr. Fontes; deixou depois este illustre financeiro o melhor de 7.342:000$000 réis nas arcas do thesouro, e não aconteceu, como mais tarde mezes, em que esse governo, que não pretencia ao partido regenerador, tendo caido, veiu perguntar ao seu successor, que tambem não era do governo da regeneração, como contava pagar uma letra de 400:000 libras, que se vencia horas depois, quando nas areas do thesouro não havia um real para satisfazer esse encargo! Os ministros regeneradores podiam dizer, nós deixámos ficar em dinheiro disponivel 7.342:000$000 réis, os seus successores nenhum recurso deixaram para os pagamentos immediatos e urgentes.
Parece-me que é uma somma respeitavel a de mais de 7.000:000$000 réis effectivos, principalmente nas circumstancias angustiosas, não só da fazenda publica, em Portugal, mas em geral de todos os mercados da Europa.
Portanto, se queremos recordar factos succedidos nessa epocha, recordemos todos, e não vamos attribuir ao partido regenerador responsabilidades que por fórma alguma lhe cabem.
Fizeram-se economias?
Vejamos qual foi a importancia d'essas economias.
Córte na despeza ordinaria, sem fallar nas deducções, 860:000$000 réis; córtes na despeza extraordinaria, réis 1.022:000$000; total dos córtes, 1.883:000$000 réis. Agora o reverso. Augmento effectivo dos juros da divida consolidada e fluctuante 2.030:000$000 réis; logo, augmento dos encargos 147:000$000 réis.
Apesar dos enormissimos sacrificios impostos ás differentes classes de servidores do estado, e a toda a gente, a despeza tinha augmentado de uma maneira prodigiosa, e a respeito de credito todos sabem que das de amargura nos fizeram transitar, a ponto de termos de pagar a multa Goschen.
No periodo de 1868 a dezembro de 1871, alem dos 7.342:000$000 réis effectivos deixados pelo sr. Fontes, foram consumidas as reservas correspondentes do capital nominal de 64.300:000$000 réis em inscripções, de novo lançadas no mercado, visto que os juros da divida publica subiram n'esses quarenta e quatro mezes nem menos de 1.930:000$000 réis!
É triste ter de recordar isto, mas em todo o caso é conveniente fazel o para nos servir de indicação.
São estas, porventura, as circumstancias actuaes do thesouro? Não são. As receitas crescem. Apesar de todas as difficuldades e de todas as calumnias que lá fóra se têem levantado contra o nosso credito, a divida fluctuante vae diminuindo, sem ter necessidade de recorrer a esses onzeneiros que fazem publicar opusculos como os de Antuerpia, tecidos de falsidades villissimas, onde se abusa da exageração com que por vezes fallâmos dos actos dos nossos contrarios.
Protesto solemnemente contra o allegado n'esse folheto; confirmando as palavras do sr. Franco Castello Branco, que alias não tinham necessidade de confirmação minha, porque s. exa. disse a verdade.
N'este folheto diz-se o seguinte:
«Nos ultimos annos de 1875-1876 Portugal pediu emprestados em media e por annos 69 milhões effectivos (12.420:000$000 réis); o producto d'esses emprestimos não serviu senão para cobrir deficits ou para attender a despezas improductivas.»
Isto é, affirma-se que os nosso paiz pede cada anno réis 12.420:000$000 para despezas improductivas ou deficits orçamentaes ordinarios! Isto é falso, como vou demonstrar.
Sr. presidente, ainda mesmo que eu me referisse só a conta geral do estado, nos termos em que esta coordenada, poderia chegar a resultados que demonstrassem completa e absolutamente que isto é falso; mas vou ver com a maxima approximação qual o deficit ordinario e extraordinario dos exercicios decorridos desde 1877 até hoje, fazendo nas contas de cada anno as correcções constantes do relatorio do nobre ministro da fazenda, de fevereiro ultimo, e as mencionadas na nota preliminar da conta geral do estado, isto é, acrescentando as despezas effectuadas que ainda hoje estão inscriptas como operações de thesouraria, fazendo em cada exercicio as devidas correcções, em resultado de adiantamentos de receita quer por uso antecipado do tabaco, como do adiantamento de receitas em 1882, para mostrar bem quaes as verbas respectivas dos orçamentos ordinarios e quaes as verbas do orçamento extraordinario.
É claro que não vou considerar para fazer face a quaesquer despezas senão as receitas que não sejam provenientes de recurso ao credito, porque essas vou consideral-as como deficit, quer ordinario, quer extraordinario.

Página 1526

1526 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Direi que a effectividade da separação do orçamento em ordinario e extraordinario pertence mais ao partido que succedeu ao regenerador em 1879. Não tinhamos nos considerado como despeza extraordinaria o que se despendia com estradas e obras de portos e rios; essas verbas estavam incluidas no orçamento ordinario; mas s. exas., os nossos illustres adversarios entenderam que deviam passar para extraordinarias estas despezas e portanto não têem hoje muita rasão em estar a censurar por continuarmos a classificação que elles quizeram iniciar no orçamento do estado. (Muitos apoiados.)
No exercicio de 1877-1878 as receitas ordinarias, segundo a conta geral, foram 25.524:000$000 réis, e as despezas 29:024:000$000 réis. Mas acrescentando a estas 105:000$000 réis de juros da divida amortisavel, não incluidos nas contas e transferindo para as despezas extraordinarias 1.359:000$000 réis de estradas, 181:000$000 réis de portos e rios o 181:000$000 réis de fortificações, fica a despeza em 27.413:000$000 réis, e portanto o deficit ordinario em 1.869:000$000 réis.
As despezas extraordinarias, como da conta, foram réis 5.165:000$000, e juntando os 1.726:000$000 réis de transferencia das despezas ordinarias e mais 40:000$000 réis de obras na defeza de Lisboa, ficam aquellas em 6.031:000$000 réis, todas preenchidas por meio do credito.
No exercicio de 1878-1879 foram as receitas réis 27.610:000$000, mas descontando a parte do imposto de tabaco cobrado por antecipação, ou 2.712:000$000 réis, ficam em 24 898:000$000 réis. As despezas sobem a réis 31.554:000$000, mas addicionando 111:000$000 réis de juros do divida amortisavel o eliminando 3.126:000$000 réis de estradas, portos e rios e despezas de guerra, ficam em 28.317:000$000 réis. Logo, deficit ordinario réis 3.419:000$000.
As despezas extraordinarias na conta são 2.714:000$000 réis, acrescentando 3.126:000$000 réis transferidos do orçamento ordinario e 19:000$000 de saldo dos soccorros em cereaes para S. Miguel, ficam elevadas a réis 5.859.000$000, para fazer face ás quaes apenas houve uma receita de 7:000$000 réis; logo, recurso ao credito 5.852:000$000 réis.
No exercicio de 1879-1880 as receitas ordinarias são na conta 23.873:000$000 réis, mas addicionando parte da receita de Macau não escripturada, 26:000$000 réis, e a parte do imposto de tabaco cobrada antecipadamente réis 1.899:000$000, ficam elevadas a 25.798:000$000 réis.
As despezas nas contas são 30.927:000$000 réis, mas addicionando 551:000$000 réis de juros de divida amortisavel e transferindo para a despeza extraordinaria réis 1.125:000$000 de estradas, 203:000$000 réis de portos e rios e 263:000$000 réis da guerra, ficam em réis 29.887:000$000, sendo o deficit 4.089:000$000 réis. As despezas extraordinarias com as transferencias a que alludo ficam em 4.160:000$000 réis, para as quaes houve réis 11:000$000 de receita propria; logo, deficit 4.149:000$000 réis.
No exercicio de 1880-1881 as receitas foram réis 25.977:000$000, mas acrescentando a parte do imposto de tabaco que lhe compete, 8l4:000$000 réis, e 26:000$000 réis da receita de Macau, ficam em 26.817:000$000 réis: as despezas ordinarias foram 30.090:000$000 réis; logo, deficit ordinario 3.273:000$000 réis. As despezas extraordinarias foram 4.329:000$000 réis, para as quaes houve receita propria na importancia de 58:000$000 réis; logo, deficit 4.271:000$000 réis. N'este anno começou a vigorar o systema progressista de considerar como extraordinarias as despezas com estradas, portos e rios.
No exercicio de 1881-1882 as receitas foram réis 28.560:000$000, mas acrescentando 26:000$000 réis vindos de Macau e abatendo 960:000$000 réis de direitos cobrados por antecipação, teremos 28.386:000$000 réis. As despezas pagas foram 31.621:000$000 réis; logo, deficit ordinario 3.235.600$000 réis. As despezas extraordinarias subiram a 3.842:000$000 réis, para fazer face ás quaes apenas tivemos 7:000$000 réis de receita propria; logo, deficit 3.842:000$000 réis.
No exercicio de 1882-1883 as receitas foram réis 28.186:000$000, que juntos aos 960:000$000 réis de despachos cobrados no anno anterior, perfazem 29.146:000$000 réis; as despezas foram 30:710:000$000 réis; logo, deficit ordinario 1.769:000$000 réis. As despezas extraordinarias pagas subiram a 2.842:000$000 réis, e para essas tivemos o lucro da conversão de 1881 e a remissão de recrutas, o que tudo produziu 2.933:000$000 réis: logo, saldo réis 91:000$000.
No exercicio de 1883-1884, segundo as contas provisorias que se podem n'este momento organisar, as receitas ordinarias sobem a 29.746:000$000 réis e as despezas a 31.593:000$000 réis, sendo o deficit 1.847:000$000 réis. As despezas extraordinarias regulam por 4.440:000$000 réis, tendo tido recursos proprios na importancia de réis 54:000$000; logo, deficit 4.386:000$000 réis.
(Aqui o orador não póde ser ouvido por algum tempo.)
Confrontando, pois, as receitas arrecadadas este anno em oito mezes com as de igual periodo do anno anterior, vemos que ha na actualidade um excesso superior a réis 900:000$000.
Comparando, pois, os differentes deficits a que ha pouco me referi, veremos:
Orçamento ordinario:

[Ver Tabela na Imagem]

1877-1878 ....
1878-1879 ....
1879-1880 ....
1880-1881 ....
1881-1882 ....
1882-1883 ....
1883-1884 ....

E note-se que, sendo provisoria a conta de 1883-1884, e faltando apurar receitas cobradas por meio do letras, o deficit final ha de ser inferior ao que acabo de mencionar.
O deficit ordinario, pois, tem diminuido e as receitas já se mostram superiores a igual periodo do anno anterior, em 900:000$000 réis.
Portanto, não se póde dizer que o deficit ordinario cresce porque é uma grande inexactidão.
Portanto, n'este periodo de oito annos o recurso ao credito para o deficit ordinario foi de 19.501:000$000 réis e a media e de 2.876:000$000 réis, e no entanto no folheto de Antuerpia disse-se que a media dos deficits ordinarios era de 12.420.000$000 réis, visto que tal havia sido o recurso ao credito para despezas improductivas ou deficits!
E para despezas extraordinarias apenas pedimos o seguinte: 29.431:000$000 réis, logo a media annual de recurso ao credito foi de 6.990:000$000 réis, para todas as despezas, isto é, metade do que calumniosamente nos era attribuido.
Estranhou tambem o illustre deputado o sr. Beirão que o nobre ministro da fazenda, para apreciar o deficit provavel do exercicio de 1883-1884, se servisse das contas do exercicio de 1882-1883 e não fosse buscar a media dos annos anteriores.
Affirmo que o illustre ministro andou acertadamente, porque ainda fica superior ao que as contas do thesouro jus a ficam, e se s. exa. fosse buscar a media o deficit havia de ser menor.
Andou, portanto, com segurança o illustre ministro apresentando o seu calculo em 1.215:000$000 réis, o desequilibrio total, visto que as conta do exercicio concluidas até hoje mostram que o deficit foi apenas de cerca de réis 900:000$000, isto é, menos 50 por cento do que tinha sido calculado pelo nobre ministro, em fevereiro d'este anno.
Ainda o illustre deputado disse que em regra os deficits

Página 1527

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1527

excedem todos os calculos, e apresentou uma larga lista de contradições entre as previsões orçamentaes lados que as coutas indicavam.
Póde isto ser exacto era relação ao exercicio de 1880, por exemplo, cuja receita foi calculada em réis 26.551:000$000, e as despezas ordinarias e extraordinarias em 33.828:000$000 réis, havendo assim um deficit de 7.277:000$000 réis, ao passo que as contas mostraram receita 26.061:000$000 réis; despeza, 34.418:000$000 réis, deficit 8.357:000$000 réis; menos recursos, maiores encargos, maior deficit.
Póde ainda ser exacto com a lei, rectificando o orçamento do 1879-l880, que dizia: receitas totaes réis 20.007:000$000, despezas 33.269:000$000 réis, deficit 7.262:000$000 réis. E no entanto as contas mostraram receitas, incluindo l.639:000$000 réis de emprestimos, réis 25.548:000$000 (menos do que o calculado); despezas réis 34.045:000$000 (mais do que o calculado); deficit réis 8.497:000$000 (mais do que as apreciações).
Nenhum d'estes documentos é regenerador.
Quanto, porém, ao exercicio de 1882-1883 as observações não são fundadas.
Se o illustre deputado tivesse attentado na conta geral do estado veria o seguinte:

[Ver tabela na imagem]

A somma effectiva do deficit foi, portanto, muito menor do que tinha sido calculada pela commissão, e que a camara tinha approvado na lei respectiva, rectificando esse orçamento; mas ainda mais, quando se apresentou o orçamento primitivo o deficit era de 2.393:000$000 réis; depois d'esta data houve despezas extraordinarias no ultramar; pois, apesar d'essas despezas andarem por 400:000$000 réis, o deficit foi superior apenas a 50:000$000 réis ao que tinha sido calculado primitivamente.
Portanto vê se que, apesar das accusações que se fazem aos orçamentos regeneradores, e ao parlamento, de não serem muito cautelosos nos calculos das receitas e despezas, os factos vem confirmar que essas accusações não são perfeitamente fundadas, e que é bom fazer justiça a todos não estar com estas exagerações; que dão em muitas vezes, a publicação de escriptos e de folhetos, taes como os de Anvers, que, ainda mal, causam profunda impressão em quem os lê, e contribuem para a baixa dos fundos, que immerecidamente estamos soffrendo. (Muitos apoiados.)
É bom, repito, não exagerar e não pintar com cores risonhas aquillo que está em circumstancias desagradaveis, mas é peior vir dizer que o que está em circumstancias relativamente prosperas se encontra em situação, não só difficil, mas invencivel; quando todos os documentos e elementos officiaes, isto é, a verdade dos factos, nos demonstram que, se não temos uma grande prosperidade, estamos em circumstancias muito melhores do que estavamos em periodos que não vão longe. (Muitos apoiados.)
Dizia o sr. Beirão que o deficit augmentou.
Não augmentou.
Pois como é que elle augmentou?
Se no exercicio de 1879-1880 foi o deficit ordinario de 4.089:000$000 réis, e se o de 1883-1884 ha de ser inferior a 1. 847:000$000 réis, como se diz que elle cresceu?
Para que se affirma, pois, isto? (Apoiados. )
Que são necessarias economias e severas, e não exagerar as despezas publicas, mesmo as de melhoramentos materiaes, estou de accordo; mas é o caso de dizer «bem prega fr. Thomás, fazei o que elle diz e não o que elle faz».
Não é verdade que todos os dias vemos accusar os governos de não fazerem todasas obras de que as diversas localidades carecem ao mesmo tempo?
Não ouvimos mesmo aqui e lá fóra accusar o governo de não ter trazido proposta para os melhoramentos do porto de Lisboia, e não vemos ao mesmo tempo accusal-o do ter proposto e ter em via de execução o porto de Leixões? (Apoiados)
Ou havemos de nos manter no proposito firme de não fazermos novas despezas, de maneira que os actos correspondam ás palavras, ou então havemos de fazer melhoramentos reclamados de todas as partes e por todas as fórmas, e n'este caso as despezas que se fizerem com esses melhoramentos têem de traduzir-se em augmento de encargos, avolumar os orçamentos extraordinarios, temos por força de recorrer ao credito. (Apoiados.)
Dizia o sr. Beirão que era impossivel calcular o deficit de 1883-1884 á vista dos elementos que encontrava no relatorio do governo e no parecer da commissão.
(Interrupção do sr. Beirão)
(Aqui tambem não pôde ser ouvido o orador.)
Quasi que se póde dizer que a gerencia de 1884-1885 ha do ser encerrada em 30 de junho, com um deficit, com toda a certeza, não superior ao do anno passado, ainda apesar das despezas do saude, apesar das despezas com armamentos, com as do ministerio da marinha, que são importantes, como v. exa. sabe, porque tivemos por causa do Zaire de mandar maior numero de navios para a costado Africa e esses navios fazem despezas grandes; porque o Zaire precisa do navios e de dinheiro, e já estes 90:000$000 réis de despeza a realisar do exercicio de 1882-1883, a que se referia o illustre deputado, representam parte do encargo com a occupação do Zaire.
E por esta occasião responderei a uma observação de s. exa. que me ia passando em claro.
S. exa. disse que no pedido d'esta legalisação de despeza se tinha abusado do regulamento geral de contabilidade publica.
Pela lei de contabilidade era permittido ao thesouro, adiantar aos ministerios da guerra e da marinha, até á importancia das sommas auctorisadas, certas e determinadas á sombra d'esses adiantamentos o tribunal de contas visava as ordens que eram provisorias e as liquidações só se faziam tarde e a más horas, dando ensejo a excesso de despezas que as leis e o regulamento não tinham cogitado.
Em junho de 1884 o governo, entendendo que este systema não era bom nem conveniente, e que era necessario que a contabilidade publica fosse uma realidade, prohibiu expressamente esses adiantamentos, e ordenou, em decreto publicado na folha official, que todas as ordens de pagamento, quer de despezas certas, quer variaveis, fossem submettidas ao visto preliminar do tribunal de contas, acabando ao mesmo passo com os supprimentos que davam motivo aos excessos de despeza cuja legalisação ora se pede.
O governo já providenciou convenientemente para que as irregularidades de que se trata não mais se repitam.
Ora aqui tem o illustre deputado a rasão por que se incluiu aqui esta despeza dos 90:000$000 réis.
Diz s. exa., mas por que não levam esta quantia para despezas de exercicios findos?!
Porque é conveniente que cada exercicio carregue com as despezas que lhe competem, e é exactamente por esta despeza pertencer ao exercicio de 1882-1883 que se pede n'esta parte dispensa do preceito da lei.
(Interrupção,)
No caso presente, pertencendo ao exercicio de 1883-1884 a despeza, não seria proprio nem de accordo com a verdade, carregar essa verba no exercicio de 1884-1885, quando ella pertencia a outro exercicio e paga durante o seu imperio. (Apoiados.)
(Interrupção.)

Página 1528

1528 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

É por isso que o governo pediu a sancção parlamentar para o acto, e a commissão entendeu que devia confirmar o pedido do governo, dizendo á camara que estava nas circumstancias do ser approvado...
(Interrupção.)
Repito, estas irregularidades não se podem tornar a repetir, porque o tribunal de contas já não visa ordem nenhuma para supprimentos.
O sr. Barros Gomes: - Desejava saber se houve lucta no tribunal de contas para pôr o seu visto nas despezas com o serviço de saude.
O Orador: - Não houve nem podia haver desde o momento em que o governo assumiu a dictadura, desde o momento em que o governo publicou o decreto, assumiu immediatamente a responsabilidade, e o tribunal de contas tinha obrigação de visar as ordens de pagamento; não tinha mesmo que luctar.
(Interrupção.)
Supponhamos que o governo expediu ordem de pagamento sem o decreto dictatorial e sem o credito extraordinario competente. O tribunal não visava a ordem e o governo, usando do seu direito, tomava a responsabilidade do facto, determinava que a ordem fosse visada. Em conformidade da resolução ministerial, e de accordo com a lei, o tribunal visava então a ordem.
Pois o decreto dictatorial foi a imposição a todas as estações publicas de que cumprissem o que n'elle estava determinado, e de que o governo tomava a responsabilidade inteira e completa, pedindo depois as cortes para o relevar da responsabilidade em que tinha incorrido.
Já se vê, pois, que o procedimento do tribunal de contas foi, como sempre, perfeitamente correcto e legal; como sempre têem sido os actos d'aquella respeitavel corporação.
E referindo-me a uma accusação apresentada ha dias pelo illustre deputado. o sr. Consiglieri Pedroso, de que as receitas de direitos de mercê não se cobram, achando-se este serviço em completo abandono, - direi que a affirmativa de s. exa. não é fundada.
Pedi ao sr. ministro da fazenda que mandasse organisar uma nota, não só do que estava em divida, mas do que tinha sido liquidado e cobrado ate fevereiro d'este anno.
Esta nota diz o seguinte:
De julho a fevereiro liquidámos, no continente e ilhas, 172:000$000 réis, e cobramos perto de 121:000$000 réis, mas como os direitos de mercê se pagam regularmente em quarenta e oito prestações mensaes, segue-se que regularmente das liquidações feitas n'este anno economico se devem ter cobrado 43:000$000 réis e a cobrança foi de 120:000$000 réis, isto é, superior 77:000$000 réis a normal, demonstrando-se assim que os conhecimentos em ser continuam a ser cobrados regularmente, e que portanto este serviço não está tão descurado como muitas pessoas imaginam.
(Áparte do sr. Consiglieri Pedroso.)
O illustre deputado mostrou o seu desejo de que as receitas publicas sejam arrecadadas cuidadosamente.
Esse desejo é sempre muito patriotico e muito sensato, e todos o temos ou devemos ter.
(Áparte do sr. Consiglieri Pedroso.)
Imposto, em regra, quer dizer vexame, maior ou menor. Essa é a theoria.
Os impostos são todos vexatorios. Não conheço nenhum que o não seja.
(Áparte do sr. Consiglieri Pedroso.)
Ah! Isso sei eu; mas o illustre deputado citava ha pouco entre os nossos impostos um que julgava detestavel, o do bacalhau...
(Áparte do sr. Consiglieri Pedroso.)
Pois eu digo que esse imposto vae dar dentro em pouco nada mais e nada menos do que um grande auxilio a industria piscatoria e á navegação, e a prova é que já se annuncia que vão vinte navios portuguezes destinados á pesca do bacalhau. Ora esse bacalhau pagará, não os 40 por cento do valor, mas menos de 9 por cento a que tanto monta o imposto do pescado.
Aqui tem v. exa. como a sombra do imposto podemos fazer desenvolver a industria da pesca, e ao mesmo tempo a industria da navegação, e fazer com que o producto se torne mais barato, auxiliando assim as classes menos abastadas.
(Interrupção.)
E com relação á pesca, eu devo dizer que temos estado por vezes, a proposito do imposto do sal, a confundir os interesses dos pescadores com os interesses dos empreiteiros desses pescadores, porque uma cousa é o homem que pesca, que arrisca a sua vida num laborioso e penosissimo trabalho, de que tira pouco lucro, e outra o homem que manda pescar.
Não ponho duvida em repetir esta affirmação tantas vezes quantas forem necessarias, para mostrar que não devemos confundir cousas que não podem nem devem confundir-se.
Disse o illustre deputado o sr. Beirão que a commissão, acceitando os calculos do governo tomou a responsabilidade de todos esses calculos, e disse tambem que tinha sido calculado o imposto do sal em 270:000$000 réis, mas sem base alguma justificada.
Sem base?!
A nova lei do imposto foi começado a executar em 15 de agosto de 1884 e produziu logo nos quinze dias d'esse mez 16:000$000 reis, em setembro 19:000$000 e em outubro 29:000$000 réis.
O governo não olhou para a escala ascendente em que ia o imposto, e calculou-o em 270:000$000 réis que era a base que o sr. Fontes tinha tornado quando apresentou a proposta de lei ao parlamento, com a taxa muito mais elevada do que a actual.
Com relação ao imposto do sal direi que foram cobrados até ao fim de fevereiro no continente 117:549$206 réis e nas ilhas 8:741$579 réis, quando com a taxa anterior, em igual periodo a cobrança não passou de 10:000$000 réis.
O resultado da actual lei e o que se ve, isto apesar de todos os pretendidos vexames.
Mas ha mais alguma cousa. Direi a s. exa. que mesmo o imposto do pescado, propriamente dito, tem produzido approximadamente a somma igual arrecadada em igual periodo anterior, o que demonstra, ou que a pesca tem sido abundante, ou o prego do peixe subido muito, o que vem a dar o mesmo resultado para as industrias da pesca.
Quando os impostos produzem por esta fórma não devemos pensar em os abolir, sem nenhuma compensação, e sem maduro estudo, porque a final de contas tem uma influencia, a meu ver, muito importante com relação ás nossas finanças.
Vozes: - Deu a hora.
O Orador: - Dizem me que deu a hora, e portanto vou terminar, visto parecer-me que busquei responder, posto que imperfeitamente, as principaes allegações feitas peio illustre deputado o sr. Beirão a proposito do orçamento rectificado. Se for necessario tomar a palavra novamente n'este assumpto não tenho duvida em o fazer.
Vozes: - Muito bem.
(O orador não foi muitas vezes ouvido na mesa dos tachygraphos.)
O sr. Santos Viegas: - Envio para a mesa um requerimento ácerca do qual peço a v. exa. que consulte a camara.
Leu-se na mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro. por parte da commissão de instrucção primaria e secundaria, que o illustre deputado Alfredo Felgueiras da Rocha Peixoto seja aggregado á mesma commissão. = O deputado, Santos Viegas.
Foi approvado.

Página 1529

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1529

O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Pedi a palavra para mandar para a mesa, em nome do governo, uma proposta de lei regulando a eleição dos senadores, como comprimento das reformas politicas, e, por parte do sr. ministro do reino, uma proposta de lei relativa aos exames das disciplinas professadas nos lyceus.
Como a hora está muito adiantada, e estas propostas têem de ser lidas na mesa, peco ser dispensado de fazer a sua leitura.
Leram-se na mesa.
São as seguintes:

Proposta de lei n.° 63-A

Artigo 1.° É approvada a organisação eleitoral da parte electiva da camara dos pares, nos termos e pela fórma determinada na presente lei.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

TITULO I

CAPITULO I

isposições geraes

Artigo 1.° Haverá cincoenta pares electivos: vinte e cinco eleitos pela camara dos deputados, vinte e um pelos districtos administrativos e quatro pelos estabelecimentos scientificos.
Art. 2.º São elegiveis os cidadãos portuguezes, que, estando no goso dos seus direitos civis e politicos, e tendo mais de trinta e cinco annos de idade, se acharem comprehendidos n'alguma das categorias mencionadas no artigo 4.° da lei de 3 de maio de 1878, salvo o disposto no artigo 6.° da presente lei.
Art. 3.° Os pares dos districtos administrativos serão eleitos por collegios eleitoraes, reunidos nas capitães dos districtos.
§ unico. Em cada districto haverá um collegio districtal, que elegerá um par.
Art. 4.° Os collegios districtaes serão compostos:
1.° De quatro delegados eleitos pelas juntas geraes no mesmo dia em que se fizer a eleição dos delegados municipaes.
2.° Dos delegados dos collegios municipaes.
§ unico. Nas cidades de Lisboa e Porto as respectivas camaras municipaes reunidas com as juntas geraes elegerão sete delegados.
Art. 5.° Os collegios municipaes serão constituidos:
1.° Pelos membros effectivos ou substitutos em exercicio da respectiva camara municipal, salvo o disposto no § 1.° d'este artigo;
2.° Pelos quarenta maiores contribuintes da contribuição predial;
3.° Pelos quarenta maiores contribuintes da contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas.
§ 1.° Em cada concelho constituir-se ha um collegio municipal, excepto nas cidades de Lisboa e Porto, onde haverá um collegio em cada bairro constituido pelos eleitores mencionados nos n.ºs 2.° e 3.° d'este artigo.
§ 2.° Nos concelhos de menos de tres mil fogos cada collegio elegerá um delegado ao collegio districtal; nos de mais de tres mil fogos e nos bairros de Lisboa e Porto dois delegados.
§ 3.° Além dos delegados effectivos serão eleitos outros tantos supplentes, que substituirão os primeiros no caso de falta ou impedimento.
§ 4.º Os quarenta maiores contribuintes da contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas serão recenseados em cada concelho ou bairro pelas respectivas commissões de recenseamento, com as mesmas formalidades com que o são pela legislação vigente os quarenta maiores contribuintes da contribuição predial, e com os mesmos recursos para os tribunaes, abrindo-se mais uma casa no livro do recenseamento.
§ 5.° O cidadão recenseado como maior contribuinte da contribuição predial não poderá ser recenseado como maior contribuinte das outras contribuições.
Art. 6.° Não poderão ser eleitos pares pelos districtos administrativos:
1.° Os governadores civis nos respectivos districtos;
2.° Os juizes dos tribunaes de segunda instancia nos districtos da sua relação;
3.° Os commandantes de divisões militares nos districtos das suas divisões.
Art. 7.° A eleição de pares pelos estabelecimentos scientificos verificar-se-ha por um collegio especial, reunido na capital do reino e composto de delegados dos seguintes estabelecimentos: universidade de Coimbra, escola polytechnica do Lisboa, academia polytechnica do Porto, escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto, curso superior de letras, escola do exercito, escola naval, instituto geral de agricultura, institutos industriaes de Lisboa e Porto e academia real das sciencias.
§ 1.° A universidade de Coimbra elegerá dez delegados, dois por cada faculdade; a escola polytechnica de Lisboa e a academia polytechnica do Porto elegerão cada uma quatro delegados; a academia real das sciencias elegem tambem quatro delegados, dois por cada classe, todos os outros estabelecimentos scientificos elegerão cada um dois delegados.
§ 2.° Poderam tomar parte na eleição de delegados os socios effectivos na academia real das sciencias e os lentes e professores effectivos e substitutos nos outros estabelecimentos scientificos.
Art. 8.° O deputado, que for eleito par do reino, deverá no praso de oito dias depois de communicada a eleigao á camara dos pares, optar entre um e outro logar.
Art. 9.° O par eleito poderá ser privado da sua dignidade do par, ou suspenso do exercicio das suas funcções, pelos mesmos motivos designados na lei para o par de nomeação regia.
§ unico. O par eleito perderá tambem o seu logar pelos mesmos motivos por que o perderia qualquer deputado.
Art. 10.° A eleição pela camara dos deputados preferirá a eleição pelos estabelecimentos scientificos, e esta á eleição pelos districtos administrativos.
Art. 11.° O par eleito poderá renunciar ao seu logar antes de tomar assento na camara fazendo-o assim constar por escripto a mesma camara.

TITULO II

Da eleição

CAPITULO I

Da eleição pela camara dos deputados

Art. 13.° A eleição de pares pela camara dos deputados verificar-se-ha na primeira sessão legislativa seguinte á terminação do mandato dos pares anteriormente eleitos ou á dissolução da parte electiva da camara dos pares.
Art. 14.° A eleição realisar-se-ha, n'um dos primeiros tres dias depois de constituida a camara, por escrutinio de lista e á pluralidadade absoluta dos votantes.
§ unico. Na eleição de pares pela camara dos deputados poderão tomar parte os que tiverem já verificados os seus poderes.
Art. 15.° Se depois do segundo escrutinio ainda não estiverem apurados os 25 pares, far-se ha terceiro escrutinio em que prevalecerá a maioria relativa.
Art. 16. ° No caso de renuncia, fallecimento ou perda de logar, o par eleito pela camara dos deputados será substituido, nos termos do artigo antecedente, dentro de tres

Página 1530

1530 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

dias depois de declarada a vacatura pela camara dos pares.
Art. 17.° A eleição feita pela camara dos deputados não podem recair era nenhum dos seus membros.

CAPITULO II

Da eleição pelos districtos administrativos

Art. 18.° A eleição de pares pelos collegios districtaes verificar-se-ha no domingo, que for fixado em decreto do governo, publicado com antecedencia pelo menos de trinta dias, de modo que a eleição se realise antes da terminação do mandato dos pares anteriormente eleitos, ou dentro do praso do tres mezes no caso de dissolução ou de declarada a vacatura pela respectiva camara.
Art. 19.° A eleição dos delegados pelos collegios municipaes verificar-se-ha quinze dias antes do fixado para a eleição de pares pelos collegios districtaes.
Art. 20.º° Nem a eleição de pares, nem a dos delegados se realizarão no dia em que se verificar a eleição de deputados.
Art. 21.° Poderão ser eleitos delegados aos collegios districtaes todos os cidadãos, elegiveis para deputados no respectivo concelho.
§ 1.° Não poderão ser eleitos delegados em Lisboa e Porto os membros da camara municipal, e em todos os districtos administrativos os membros da junta geral do districto.
§ 2.° O logar de delegado ao collegio districtal será incompativel com o de delegado ao collegio especial, preferindo a eleição para este ultimo logar.
Art. 22.° Os collegios districtaes serão presididos pelo presidente da junta geral do districto; os collegios municipaes pelo presidente da camara municipal, ou por quem suas vezes fizer.
§ unico. Nas cidades do Lisboa e Porto os presidentes dos collegios municipaes serão escolhidos pelas commissões de recenseamento entre os eleitores do respectivo collegio.
Art. 23.° As commissões de recenseamento enviarão, cobrando recibo, aos presidentes dos collegios municipaes, pelo menos tres dias antes d'aquelle em que deve verificar-se a eleição dos delegados, uma lista em duplicado dos oitenta maiores contribuintes, que podem votar nos respectivos collegios.
§ unico. Estas listas serão facilmente trasladadas do recenseamento encerrado em 30 de junho immediatamente anterior ao dia da eleição e rubricadas pela commissão podendo tambem sel o pelo respectivo administrador do concelho.
Art. 24.° O collegio municipal reunir-se ha pelas dez horas da manhã no edificio da camara municipal, constituindo-se a mesa, além do presidente, com dois escrutinadores; e dois secretarios.
§ 1.° Constituida a mesa definitiva e votando primeiro esta e depois os membros da camara municipal, serão chamados para votar todos os eleitores pela ordem indicada nas respectivas listas.
§ 2.° Serão admittidos a votar, embora não estejam incluidos nas listas, os cidadãos, que se apresentarem munidos de sentença do poder judicial, mandando-os inscrever como maiores contribuintes.
§ 3.° Cada lista devera conter em separado e com a competente designação os nomes dos cidadãos escolhidos para delegados effectivos e os nomes dos escolhidos para delegados supplentes.
§ 4.º Uma hora depois de feita a chamada dos eleitores proceder-se ha á contagem das listas.
§ 5.° A votação assistirão o administrador do concelho e o escrivão de fazenda para informar sobre a identidade dos votantes.
§ 6.° A acta da eleição mencionará a declaração de que os cidadãos, que formam o collegio eleitoral, outorgam ao delegado ou delegados eleitos, e aos seus substitutos na falta ou impedimento dos primeiros, os poderes necessarios para que reunidos com os outros membros do collegio districtal elejam um par do reino.
§ 7.° A acta da eleição far-se-ha em duplicado, ficando um exemplar no archivo da camara, e sendo outro remettido pelo seguro do correio com todos os mais papeis da eleição ao presidente do collegio districtal.
A cada um dos delegados eleitos, se entregará copia authentica d'essa acta, que lhe servirá de diploma; e se algum não estiver presente ser-lhe-ha enviada com carta de aviso da mesa.
Art. 25.° Á constituição da mesa e á eleição serão applicaveis as disposições dos artigos 46.°, 48.º a 52.º, 54.° a 61.°, 64.º a 73.°, 75.º, 76.°, 78.° e 79.° do decreto eleitoral de setembro de 1852 na parte não modificada pelo disposto no artigo precedente.
Art. 26.° O collegio districtal reunir-se-ha na sala das sessões da junta geral do districto, ou, quando não tenha a precisa capacidade, no edificio que para esse fim for destinado pelo respectivo governador civil.
Art. 27.° O delegado effectivo, que por motivo justificado não possa comparecer as reuniões do collegio districtal, deverá participal o immediatamente ao presidente d'este collegio e aos delegados supplentes do seu concelho.
Art. 28 ° Os delegados supplentes só farão parte do collegio districtal na falta ou impedimento dos effectivos do seu concelho, os quaes substituirão pela ordem da maior votação.
Art. 29.° No domingo immediato ao da eleição dos delegados, reunir-se-ha o collegio districtal pelas dez horas da manhã, a fim de proceder a constituição da mesa e á verificação dos poderes dos delegados eleitos.
§ unico. O delegado supplente, que tiver recebido a partcipação a que se refere o artigo 27.° e a quem compita substituir algum delegado effectivo, deverá comparecer á reunião.
Art. 30.º Na formação da mesa os collegios districtaes observarão o que vae disposto para os collegios municipaes, na parte que for applicavel.
Art. 31.º Constituida a mesa definitiva o presidente apresentará fechadas e lacradas as a tas e os mais papeis que nos termos do § 7.º do artigo 24.º lhe devem ter remettido os collegios municipaes. Os delegados eleitos por estes collegios apresentarão igualmente os seus diplomas.
Art. 32.° Proceder se-ha em seguida a eleição de duas commissões de verificação de poderes, composta cada uma de cinco membros.
§ 1.° Os processes serão distribuidos com igualdade pelas duas commissões, de modo que a verificação dos poderes dos membros de uma commissão pertençam sempre á outra.
§ 2.° Os poderes dos membros da junta geral do districto suppor-se-hão verificado, logo que a sua qualidade e identidade sejam certificadas pelo presidente do collegio districtal.
Art. 33.° As attribuições das commissões limitar-se-hão a verificar:
1.° A identidade dos delegados;
2.° A authenticidade dos seus diplomas, confrontando-os com as actas originaes;
3.° Se os diplomas foram conferidos pelos collegios municipaes aos mais votados;
4.° Se os delegados mais votados são absoluta ou respectivamente ineligiveis aos termos do artigo 21.°;
5.º ° A ordem pela qual os delogados supplentes deverão substituir os effectivos nas suas faltas ou impedimentos.
§ unico. Qualquer dos eleitores do collegio poderá apresentar documentos para elucidar as commissões nas suas investigações.
Art. 34.º Os pareceres das commissões serão lidos e approvados ou reformados pela assembléa.
Art. 35.º É absolutamente defeza aos collegios distri-

Página 1531

SESSÃO DE 11 DE MAIO DE 1885 1531

Actaes annullar as actas ou a eleição com o fundamento de que houve alguma nullidade no recenseamento, na formação das mesas, ou no processo eleitoral, ou com qualquer outro que não seja a falta de authenticidade ou genuinidade expressamente especificados nos n.ºs 2.º e 3.º do artigo 33.º
Art. 36.° Se o collegio districtal reconhecer que o portador do diploma passado pelo collegio municipal não é o proprio, ou que o seu diploma não é authentico, ou lhe não competia por não ser o mais votado, mandará passar novo diploma, que será remettido pelo presidente ao delegado eleito.
Art. 37.º Se o collegio districtal reconhecer que o delegado eleito é absoluta ou respectivamente inelegivel, o presidente mandará carta de aviso ao respectivo delegado supplente para o substituir.
Art. 38.º De todas as decisões tomadas pelo collegio districtal cabe recurso para a camara dos pares, sem effeito suspensivo.
§ unico. Este recurso poderá ser interposto por qualquer dos membros do collegio, ou na acta, ou em separado, em fórma de protesto, que se juntará ao processo eleitoral.
Art. 39.º Terminada a verificação dos poderes organisar-se-ha uma lista de todos os eleitores do collegio districtal e dos respectivos supplentes, a qual será feita em duplicado, affixando se um exemplar na porta do edificio e entregando-se o outro, que será assignado e rubricado pela mesa e pelos eleitores que assim o requeiram, ao presidente do collegio districtal.
Art. 40.º Da constituição da mesa e da verificação dos poderes se lavrará acta, mencionando todas as circumstancias que tiverem occorrido.
§ 1.º A acta far-se-ha em duplicado, ficando um dos exemplares no archivo da junta geral do districto e o outro em mão de um dos secretarios do collegio districtal.
§ 2.º de todos os outros papeis recebidos dos collegios municipaes, ficará depositario o presidente do collegio districtal.
Art. 41.º No Domingo immediato, marcado para a eleição de pares, reunir-se-hão os eleitores do collegio districtal á mesma hora e no mesmo local, a fim de procederem á votação.
Art. 42.º O presidente apresentará a lista a que se refere o artigo 33.º e por ella se fará a chamada dos eleitores para darem o seu voto.
§ 1.º Terminada a chamada dos eleitores inscriptos na lista, se algum dos delegados effectivos tiver feito as participações, a que se refere o artigo 27.º, será chamado a votar o respectivo supplente.
§ 2.º A votação é por escrutinio secreto. Das listas que tiverem mais de um nome só se conta o primeiro.
§ 3.º Recebidas as listas de todos os eleitores presentes, esperar-se-ha meia hora se faltarem ainda alguns eleitores a votar.
§ 4.º Finda a meia hora sem terem ainda votado todos os delegados effectivos, serão admittidos a votar, em logar dos que tiverem faltado sem fazerem as participações a que se refere o artigo 27.º, os respectivos delegados supplentes, se estivessem presentes.
§ 5.º Terminada a votação seguir-se-ha o apuramento dos votos, observando-se o disposto para os collegios municipaes.
Art. 43.º Só poderá ser elito par o cidadão que reunir a maioria absoluta dos votos.
Art. 44.º Se do primeiro escrutinio não resultar para algum nome a maioria absoluta, proceder-se-ha a segundo escrutinio; e, se n´este ainda não houver maioria absoluta, a terceiro escrutinio, no qual só poderão ser votados os dois cidadãos que tiverem tido maior numero de votos no escrutinio anterior.
§ unico. No segundo e terceiro escrutinio guardar-se-hao as mesmas formalidades do primeiro, só podendo votar os eleitores que n´este tiverem votado.
Art. 45.° Concluida a eleição publicar-se-ha por edital o nome do par eleito.
Art. 46.º Da eleição lavrar-se-ha acta em que se declare:
I. Os nomes dos eleitores que faltaram por motivo justificado ou sem causa legitima, ou se ausentaram antes de concluida a eleição;
II. Os nomes dos supplentes que votaram sem estarem inscriptos na lista dos eleitores;
III. Quanto escrutinios correram e o numero dos votantes em cada um;
IV. O nome de todos os votados e o numero de votos que cada um teve;
V. A declaração de que os eleitores, que formam o collegio districtal, outorgam ao par eleito os poderes necessarios para que reunido com os outros pares do reino, faça, dentro dos limites da carta constitucional e dos seus actos addicionaes, tudo quanto for conducente ao bem geral da nação.
Art. 47.º D´esta acta se entregará copia assignada por toda a mesa ao par eleito, se estiver presente; estando ausente, enviar-se-ha com participação official do respectivo presidente.
Art. 48.º A acta original do collegio districtal, conjunctamente com as actas e mais papeis, que tiverem vindo dos collegios municipaes, serão immediatamente remettidos ao ministro e secretario de estado dos negocios do reino para serem presentes á camara dos pares.
Art. 49.º Ao par eleito por mais de um districto será applicavel quanto á opção, o disposto na legislação eleitoral para o deputado eleito por mais de um circulo.

CAPITULO III

Da eleição pelos estabelecimentos scientificos

Art. 50.º A eleição de pares pelos estabelecimentos scientificos realisar-se-ha no mesmo dia, que for designado para a eleição de pares pelos districtos administrativos.
Art. 51.º A eleição de delegados ao collegio especial verificar-se-ha á mesma hora e no mesmo dia em que são eleitos os delegados aos collegios districtaes.
Art. 52.º Os delegados serão eleitos em sessões extraordinarias das congregações, conselhos ou secções das respectivas corporações, sob a presidencia dos seus respectivos decanos, directores ou presidentes, em escrutinio secreto, esperando-se meia hora, antes de se proceder ao apuramento, quando não estejam todos os membros presentes.
Art. 53.º Da eleição se lavrará acta em duplicado, ficando um exemplar no archivo do estabelecimento e remettendo-se o outro ao presidente do collegio especial.
§ unico. A cada um dos delegados se entregará uma copia authentica d´essa acta, que lhe servirá de diploma.
Art. 54.º Aos delegados supplentes será applicavel o disposto nos artigos 26.º e 27.º
Art. 55.º O collegio especial reunir-se-ha na sala da academia real das sciencias, devendo comparecer os delegados effectivos e os supplentes, que tenham recebido a participação a que se refere o artigo 26.º
Art. 56.º O collegio especial é presidido pelo presidente da academia real das sciencias, observando-se quanto á constituição da mesa, verficação de poderes e eleição o mais que vae regulado para os collegios districtaes, salvo o disposto nos paragraphos seguintes:
§ 1.º A formação da mesa e a verificação dos poderes realisar-se-ha dois dias antes do marcado para a eleição reunindo se para esse fim o collegio especial.
§ 2.º Os delegados supplentes eleitos por qualquer estabelecimento scientifico só substituirão os effectivos do mesmo estabelecimento.
§ 3.º A carta de aviso, a que se refere o artigo 36.º, sómente será enviada aos delegados supplentes residentes em

Página 1532

1532 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Lisboa, ou que n´esta cidade tenham escolhido domicilio para a receber por officio dirigido ao presidente do collegio.
TITULO III
Da verificação dos poderes dos pares eleitos
Art. 57.° Os pares eleitos não tomarão assento na camara dos pares, sem que por esta sejam verificados os seus poderes.
Art. 58.° A camara dos pares competira a decisão definitiva de todas as duvidas e reclamações, que se suscitaram tanto durante a eleição de pares como durante a eleição dos delegados.
Art. 59.° São causas de nullidade as infracções de lei, que affectem a essencia do acto eleitoral e possam influir na eleição do par.
Art. 60.° Se a camara dos pares annullar a eleição feita pelos collegios districtaes ou pelo collegio especial, só n´esses collegios se repetirá a eleição com os mesmos delegados anteriormente eleitos.
Art. 61.° Se a camara dos pares annullar as eleições de delegados feitas em mais de um collegio municipal, de um districto ou em mais de um estabelecimento scientifico, repetir-se-ha o acto eleitoral em todos os collegios municipaes ou em estabelecimentos scientificos, que compõem o collegio districtal ou o collegio especial.
§ unico. Se a annullação apenas comprehender um collegio municipal ou um estabelecimento scientifico, só n´esse collegio ou n´esse estabelecimento se repetira a eleição de delegados.
Art. 62.° A annullação da eleição de delegados feita em qualquer collegio importará sempre a repetição do acto eleitoral no respectivo collegio districtal, ou no collegio especial.
Art. 63.° A camara dos pares não poderá resolver sobre questões de recenseamento em contrario das decisões das respectivas commissões de recenseamento ou das sentenças dos tribunaes, que as confirmarem ou modificarem.
Art. 64.° Na verificação dos poderes ou no julgamento das vacaturas observar-se-hao as formalidades, que a camara decretar no seu regimento.
TITULO IV
Disposições geraes e transitorias
CAPITULO I
Disposições penaes
Art. 65.° Os factos ou omissões puniveis pelas leis que regulam a eleição de deputados serão punidos com igual penalidade quando respeitem a eleição de pares do reino.
Art. 66.° Os delegados effectivos que deixarem de comparecer as reuniões do collegio districtal ou do collegio especial sem motive justificado pagarão uma multa de 50$000 réis a 100$000 réis.
§ unico. Se tiverem feito as participações a que se refere o artigo 27.° a multa será de 10$000 a 30$000 réis.
Art. 67.° O delegado que, tendo motivo justificado para não comparecer, não fizer as participações a que se refere o artigo 27.° pagará uma multa de 5$000 a 20$000 réis.
Art. 68.° Aos delegados supplentes será applicavel o disposto no artigo 66.°, quando avisados a tempo para substituir os effectivos não comparacerem sem motivo justificado.
Art. 69.° Aos presidentes dos collegios municipal, districtal e especial será applicavel o disposto no artigo 124.° do decreto de 30 de setembro de 1852 para os presidentes das assembléas primarias ou de apuramento.
Art. 70.° Aos membros dos collegios districtaes e do collegio especial, quando infringirem o disposto no artigo 35.° será applicavel a penalidade prescripta no artigo 134.° do decreto de 30 de setembro de 1852 para os membros da assembléa de apuramento.
CAPITULO II
Disposições transitorias
Art. 71.° A primeira eleição de pares pela camara dos deputados verificar-se-ha na primeira sessão da mesma camara depois da promulgação d´esta lei.
Art. 72.° Em execução d´esta lei o governo publicará um decreto mandando reunir as commissões de recenseamento e fixando, nos termos do artigo 39.° da lei de 21 de maio de 1884, os prasos para em recenseamento supplemental se inscreverem os quarenta maiores contribuintes da contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas.
Art. 73.° A primeira eleição de pares pelos districtos administrativos e pelos eslabelecimentos scientificos verificar-se-ha dentro do praso de tres mezes depois de encerrado o recenseamento supplementar.
Presidencia do conselho de ministros, em 11 de maio de 1885.= Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Augusto Cesar Barjona de Freitas = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro = Manuel Pinheiro Chagas = José Vicente Barbosa du Bocage.
Foi admittida e enviada a commissão especial das reformas politicas, depois de publicada no Diario do governo.

Proposta de lei n.° 65-B

Senhores.- Está proxima a epocha em que se deve proceder aos exames das disciplinas professadas nos lyceus centraes e nacionaes do reino e das ilhas adjacentes; e é, portanto, indispensavel providenciar sobre a forma por que hão de ser realisados taes exames.
Nos dois ultimos annos escolares occorreu-se a este serviço em virtude de auctorisações excepcionaes e transitorias, concedidas peias cartas de lei de 22 de maio de 1883 e 23 de maio de 1884.
Não sendo possivel, adiantada como vae a actual sessão legislativa, apresentar vos a promettida reforma do instrucção secundaria, da qual se esta occupando o conselho superior de instrucção publica, e parecendo-me que será inconveniente pôr em pratica qualquer outro systema de exames antes de decretada a reforma, visto como da organisação que for dada aos estudos secundarios, das matriculas e da frequencia dos cursos depende essencialmente a fórma e processo dos exames, tenho a honra de submetter a vossa esclarecida approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Emquanto não for decretada a reforma da instrucção secundaria, os exames das disciplinas professadas nos lyceus regular-se-hão pelas disposições da carta de lei de 23 de maio de 1884.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d´estado dos negocios do reino, em 11 de maio de 1885.= Augusto Cesar Barjona de Freitas.
Admittida e mandada publicar no Diario do governo, sendo enviada depois á commissão de instrucção primaria e secundaria.
O sr. Presidente: - Novamente peço aos srs. deputados que compareçam mais cedo. Eu não posso dar sessão, quando não haja numero sufficiente á hora marcada.
A ordem do dia para ámanhã e a continuação da que estava dada.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas da tarde.

Rectificação

No discurso do sr. deputado Ferreira do Almeida, proferido em sessão de 9 do corrente, e publicado no Diario das sessões a pag. 1501, ha a fazer as seguintes rectificações:
Na col. 1.ª, lin. 16.ª, onde se lê «mui», deve ler-se «meus»
Na mesma col., lin.57.ª, onde se diz «e eu direi onde», deve ler-se « e direi então onde».
Na col 2.ª, lin. 30.ª, onde se lê «que se persiste n´estas affirmações», leia-se «que se permittiu estas affirmações».

Redactor = S. Rego.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×