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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1381

tadas em dia e hora fixa, perante ajunta encarregada de presidir ao concurso, sob a forma de cartas fechadas e lacradas, sendo publico o acto da entrega e abertura das referidas cartas, como se preceitua nos artigos 7.° e 8.° da citada lei.

Mas, sem termos necessidade de sair do paiz, vemos que no nosso ministerio das obras publicas se não abre concurso algum de uma certa importância, sem ser por propostas em carta fechada, e, se o sr. ministro da fazenda quizesse aconselhar-se com o seu collega das obras publicas, este lhe explicaria decerto as boas rasões que ha na-quelle ministério, onde os concursos são frequentes, para assim se proceder.

Com respeito á base 2.ª ainda tenho outra observação a fazer.

Preceitua-se ahi que o contrato será feito dentro de um certo praso com a empreza ou individuo adjudicatario. Ora o que quer dizer esta disjunctiva, que deixa suppor que quando o adjudicatário for um só individuo não haverá empreza, se é o proprio codigo commercial que expressamente declara que as emprezas commerciaes podem ser singulares ou collectivas?

É verdade que no primeiro período da base 6.a, que assim briga com a referida base 2.a, já se demonstra que mesmo quando o concessionário seja um só individuo tambem haverá empreza.

Mas então porque se não redigem as bases em harmonia umas com as outras? Porque se procede com tanta leviandade e incorrecção num assumpto de tal grandeza? (Apoiados.)

No terceiro periodo da mesma base 6.º diz-se:

«Os estatutos da empreza concessionaria têem de ser approvados pelo governo, que, ouvida a procuradoria da coroa, póde dispensar a applicação do codigo commercial, especialmente em relação á proporção a guardar entre a emissão de acções e obrigações.»

Mas, como no primeiro periodo da mesma base se entende que haverá empreza mesmo quando a concessão fique nas mãos de um só individuo, resulta dahi que, nesta hypothese, poderá esse concessionário, no entender da commissão, emittir acções e obrigações.

Ora eu perguntarei como é que um individuo póde ter a faculdade de emittir acções, (Apoiados) se as acções só por si significam a existência de uma sociedade? (Apoia dos) E se não emittir acções, porque seria absurdo ha-vel-as em tal caso, como é que póde ter o direito de emittir obrigações? (Apoiados.)

Tudo isto carece de ser novamente estudado pela commissão, porque está redigido de um modo confuso e ambíguo. (Apoiados.)

Encontro ainda n'este terceiro periodo da base 6.ª uma disposição que me causa graves apprehensões: é a do governo reservar para si a faculdade de dispensar ou não a applicação do codigo commercial no que respeita designadamente á proporção a guardar entre o capital obrigações e o capital acções.

Eu comprehendo que se diga clara e terminantemente que a empreza poderá ter maior capital em obrigações do que em acções; mas deixar esse direito dependente do ar-bitrio do governo é abrir a porta aos abusos, permittindo que se sophisme a perfeita igualdade de condições que deve existir para todos os concorrentes. (Apoiados.)

Eu não digo que haja intenção reservada n'esta redacção; mas as cousas são o que são, e esta clausula deixa nas mãos do governo uma arma com que elle póde proteger um certo e determinado concorrente, em detrimento de todos os outros; (Apoiados.) basta que lhe declare antecipadamente que só a elle concederá mais tarde aquelle direito e a nenhum outro, pelo menos na mesma proporção (Apoiados.)

É indispensavel, portanto, redigir esta base de modo que não fique ao arbitrio do governo o conceder ou não uma faculdade tão importante, podendo assim arredar ou desanimar alguns concorrentes em beneficio de um outro que proteja. (Apoiados.)

Ha quem sustente e com bons argumentos que o capital obrigações pôde, sem perigo, exceder o capital acções, e as emprezas de caminhos de ferro constituem uma applicação frequente d'esta theoria.

Outros, ao contrario, entendem que o capital acções é que serve de garantia ao capital obrigações, e que por isso não deve este nunca exceder aquelle. Esta doutrina, que é a do nosso codigo commercial, foi sustentada insistentemente pelo sr. Hintze Ribeiro com o fundamento de que permittir que a importancia das obrigações exceda a das acções é deixar o campo livre ás especulações de má fé. Esta phrase não é do sr. Emygdio Navarro, como suppoz o sr. ministro da fazenda, mas sim do seu collega o sr. Hintze Ribeiro, a quem s. exa. deve perguntar se o projecto que estamos discutindo auctorisa ou não as especulações de má fé. (Apoiados.)

Ainda com respeito á base 6.ª devo dizer que, em contrario do que só estabelecia na proposta ministerial, se admitte que a concessão possa ficar nas mãos de um só individuo, embora estrangeiro, dispensando-o da obrigação da constituir uma sociedade portugueza.

Isto é grave e gravissimo. (Apoiados.)

Pela antiga legislação os caixas do tabaco tinham de ser cidadãos portuguezes. A lei hespanhola, a que já me referi, de 22 de abril de 1887 tambem admitte que a concessão do monopolio fique nas mãos de um só individuo, mas exige que este seja hespanhol e domiciliado em Madrid.

Quer o governo entregar nas mãos de um estrangeiro um monopolio d'esta natureza e importancia? (Apoiados.) Não lhe aproveitou a triste expiriencia que o paiz
tirou do caminho de ferro de Lourenço Marques? (Apoiados.)

O artigo 51.° do contrato pelo qual se fez a concessão d'este caminho de ferro obrigava o concessionario primitivo a organisar, dentro do praso de seis mezes, uma sociedade anonyma portugueza, com a sede em Lisboa, para a execução dos fins a que o mesmo contrato se refere. Pois apesar de se ter cumprido esta condição do contrato, apesar de se ter constituido a companhia portugueza, com quem o governo tinha exclusivamente de entender-se, bastou que o concessionário primitivo fosse americano e que o capital subscripto fosse inglez para que, no primeiro conflicto que se levantou com essa companhia, apparecessem immediatamente em sua defeza os governos dos Estados Unidos e da Gran-Bretanha, com os quaes temos estado em divergencia por tal motivo, vendo-nos na necessidade, para a resolver, de acceitar a arbitragem de uma terceira potencia, a republica Helvetica.

E aproveito o ensejo para observar que em sessão de 9 de maio perguntei eu ao governo o que havia ácerca d'esta questão de Lourenço Marques, e designadamente qual era o ponto sobre que devia versar a arbitragem internacional que já então andava annunciada nos jornaes inglezes.

Pois, por emquanto, a camara dos senhores deputados ainda não pôde obter do governo esclarecimento algum a tal respeito, e só pelos jornaes sabemos que foi a Suissa escolhida, como arbitro, para decidir a questão pendente.

Este silencio systematico faz parte do programma governativo do actual ministerio. (Apoiados.)

O Times, chegado hoje, publica já as bases da convenção que, ao que parece, vae ser assignada entre os governos portuguez e inglez, com respeito aos negocios de Africa, e, apesar d'isso, o parlamento ainda nada sabe a tal respeito. (Apoiados.) Precisâmos ler os jornaes inglezea para saber o que de mais grave e importante se passa no nosso paiz. (Apoiados.)

Censuro e censuro asperamente este procedimento do governo, com que pretende
deprimir a dignidade da representação nacional. (Apoiados.)

Voltemos, porém, ás bases do projecto em discussão.