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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Lêem-se dois officios do ministerio da marinha, remettendo documentos requeridos pelos srs. Luciano Cordeiro e Espregueira, relativos a caminhos de ferro no ultramar. - O sr. presidente declara que esses documentos ficam na camara para serem examinados pelos srs. deputados. - O sr. Bocage manda para a mesa um requerimento de interesse particular.

Na ordem da noite continua a discussão do projecto de lei n.° 141 (exclusivo da fabricação dos tabacos). - O sr. Ressano Garcia combate o projecto em todas as suas disposições, e como inconveniente por não estar ainda feita a experiencia completa da régie. - O sr. Malheiro, em defeza do projecto, faz algumas considerações no pouco tempo que resta para se encerrar a sessão, e fica com a palavra reservada para a sessão seguinte.

Abertura da sessão - Ás nove horas da noite.

Presentes á chamada 60 srs. deputados. São os seguintes: - Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alfredo Cesar Brandão, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, An tonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Cardoso, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Augusto José Pereira Leite, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Bernardino Pacheco Alves Passos, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde de Villa Real, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Elvino José de Sousa e Brito, Emygdio Júlio Navarro, Fernando Pereira Palha Osório Cabral, Fidelio de Freitas Branco, Fortunato Vieira das Neves, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco José de Medeiros, Frederico Ressano Garcia, João de Barros Mimoso, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Pinto Moreira, João Simões Pedroso de Lima, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Simões Ferreira, Joaquim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Estevão de Moraes Sarmento, José Freire Lobo do Amaral, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria dos Santos, Julio Antonio Luna de Moura, Júlio Ccsar Cau da Costa, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Augusto de Carvalho, Pedro Ignacio de Gouveia, Roberto Alves de Sousa Ferreira e Thomás Victor da Costa Sequeira.

Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Agostinho Lucio e Silva, Alexandre Maria Ortigão do Carvalho, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Arroyo, Antonio José Ennes, Antonio Maria Jalles, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Sérgio da Silva e Castro, Arthur Hintze Ribeiro, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Maria Fuschini, Bernardino Pereira Pinheiro, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Eduardo José Coelho, Eugenio Augusto Ribeiro de Castro, Fernando Mattozo Santos, Francisco de Almeida e Brito, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, Jacinto Cândido da Silva, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alves Bebiano, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João da Paiva, João Pinto Rodrigues dos Santos, José de Azevedo Castello Branco, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Elias Garcia, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Júlio Rodrigues, José Maria Greenfield de Mello, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel de Arriaga, Manuel Francisco Vargas, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Pinheiro Chagas e Pedro Victor da Costa Sequeira.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Mendes da Silva, Álvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Fialho Machado, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Costa, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Antonio Teixeira de Sousa, Aristides Moreira da Motta, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Augusto da Cunha Pimentel, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde do Côvo, Eduardo Abreu, Eduardo de Jesus Teixeira, Estevão Antonio de Oliveira Junior, Feliciano Gabriel de Freitas, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco Severino de Avellar, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio José Franco, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Marcellino Arroyo, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João de Sousa Machado, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Antonio de Almeida, José Bento Ferreira de Almeida, José Dias Ferreira, José Domingos Ruivo Godinho, José Frederico Laranjo, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Latino Coelho, José Monteiro Soares de Albergaria, José Paulo Monteiro Cancella, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luciano Cordeiro, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz Virgilio Teixeira, Manuel Affonso Espregueira, Manuel d'Assumpção, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro de Lencastre (D.), Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Visconde de Tondella e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da marinha, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Luciano Cordeiro, copia do parecer da junta consultiva de obras publicas sobre o

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projecto do caminho de ferro de Mossamedes, e outros documentos.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado M. A. Espregueira, nota das receitas e despezas da exploração do caminho de ferro de Mormugão e Ambaca, e bem assim o extracto de esclarecimentos enviados em telegramma do director do caminho de ferro de Lourenço Marques, que opportunamente serão completados quando chegarem a esta secretaria todas as informações requisitadas.

Para a secretaria.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PARTICULAR

Roqueiro, por parte da commissão de guerra, que seja ouvido o governo, pelo ministerio da guerra, ácerca do requerimento junto do general de divisão reformado, Augusto Pinto de Moraes Sarmento. - Carlos du Bocage.

Mandou-se expedir.

O sr. Presidente: - Vae ler-se um officio do ministerio da marinha remettendo a esta camara os documentos pedidos por alguns srs. deputados, relativos a caminhos de ferro nas provincias ultramarinas.

Leu-se e é o seguinte:

Officio

Secretaria d'estado dos negocios da marinha o ultramar - Direcção geral do ultramar - Terceira repartição. - Illmo. o exmo. sr. - Em resposta aos officios de v. exa. de 7 de junho e 17 do corrente, com relação ao requerimento do sr. deputado Luciano Cordeiro, tenho a honra de enviar a v. exa. copia do parecer da junta consultiva de obras publicas sobre o projecto do caminho de ferro de Mossamedes e outros documentos, cuja devolução se pede.

Deus guarde a v. exa. - Secretaria destado dos negocios da marinha e ultramar, em 19 de julho de 1890. - Illma. e exmo. sr. deputado secretario da camara dos senhores deputados. = Júlio Marques de Vilhena.

Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Uns documentos a que se refere este officio; duas memorias justificativas e descriptivas, ácerca do caminho de forro de Mossamedes ao Bihé, (primeira parte), e de Mossamedes ao alto da Chella, (anteprojecto), são remettidos pelo sr. ministro da marinha, e ficam sobre a mesa a fim de serem consultados pelos srs. deputados que assim o desejarem, hoje, e por todo o dia de ámanhã.

O sr. Barbosa du Bocage: - Por parte da commissão de guerra mando para a mesa um requerimento.

O requerimento vae publicado a pag. 1380.

O sr. Presidente: - Vae entrar-se na ordem da noite.

Continúa com a palavra o sr. deputado Ressano Garcia.

ORDEM DA NOITE

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 141, auctorisando o governo a adjudicar, em concurso publico, o exclusivo da fabricação da tabacos, no continente do reino, actualmente na administração do estado, em harmonia com as bases que fazem parte d'esta lei e a ella vão annexas

O sr. Ressano Garcia: - Sr. presidente, tinha eu annunciado ao findar a sessão diurna que ia tratar da especialidade d'este projecto, e é o que vou fazer.

As bases 1.ª e 2.ª, que se occupam exclusivamente da fórma e processo do concurso, são redigidas do modo seguinte:

«1.ª Pelo ministerio da fazenda e repartição do gabinete se annunciará, pelo menos com trinta dias de antecedencia e com a maior publicidade, no paia e no estrangeiro, a abertura do concurso para a adjudicação do exclusivo do fabrico dos tabacos.

«Os respectivos annuncios darão conhecimento circumstanciado e completo do programma do mesmo concurso, em harmonia com estas bases, e mencionarão as formalidades necessárias para a admissão dos concorrentes.

«2.ª O concurso estará aberto durante o praso de trinta dias.

«O contrato, com a empreza ou individuo adjudicatário, far-se-ha dentro do praso maximo de um mez, a contar do dia em que se proceder á licitação!

O sr. Emygdio Navarro mandou para a mesa uma proposta para que fossem substituidos os dois prasos de trinta dias que aqui se estabelecem por um praso único de sessenta dias, e se determinasse precisamente o dia e hora em que se devia realisar o concurso.

Effectivamente não se percebe a necessidade da distincção entre estes dois prasos.

Diz a base 1.ª que o concurso será annunciado com trinta dias de antecedencia, e a base 2.ª que elle estará aberto durante o praso de trinta dias; ora, se a licitação só tem logar no ultimo dia deste praso, não se percebe bem o que significa estar o concurso aberto durante o praso de trinta dias.

Se a licitação tivesse de verificar-se por meio de propostas em carta fechada, ainda poderia suppor-se que o governo e a commissão quizessem, com a redacção dada a estas duas bases, exprimir o pensamento do que no ministerio da fazenda se receberiam as referidas propostas, durante o segundo dos mezes indicados; mas nem sequer essa explicação e admissivel, porque o sr. ministro da fazenda já no decurso desta discussão declarou que a licitação seria verbal.

E como em taes circunstancias se torna bem frisante a impropriedade com que se diz que, o concurso estará aberto durante o praso de trinta dias, porque de facto elle só estará aberto uma ou duas lioras em dia prefixo, embora annunciado com sessenta dias de antecedencia, insisto em que, por parte do governo ou da commissão, se explique qual a idéa que presidiu á redacção da base 2.ª

Eu sou contrario á licitação verbal. Entendo que esta fórma de concurso e a que mais se presta aos conluios, ao passo que, quando a licitação é por cartas fechadas, cada um dos licitantes fixa meditadamente o preço que lhe convém, não se deixando arrastar pelos caprichos da praça, como muitas vezes acontece, quando n, licitação e verbal.

Sr. presidente, quando ouvi o sr. ministro da fazenda declarar que mais convinha a licitação verbal, foi grande a minha surpreza, porque da base 2.ª da sua proposta se infere que, ao apresental-a ao parlamento, tinha s. exa. opinião exactamente contraria. Effectivamente diz a base 2.ª da proposta ministerial:

«O concurso estará aberto durante o praso de trinta dias.

«O contrato definitivo com a empreza ou individuo adjudicatário far-se-ha dentro do praso máximo de um mez, a contar do dia em que se proceder á abertura das propostas dos licitantes».

Logo s. exa. entendia então que as propostas deviam ser feitas em carta fechada, e se agora se tornou apologista da licitação verbal, e porque se converteu aos dogmas do sr. Pedro Victor. Pois eu estou com a opinião, de ha dois mezes, do sr. Franco Castello Branco e entendo que a licitação verbal só deve admittir-se no caso de haver duas ou mais propostas de igual preço, sendo este o mais conveniente, e ainda assim, limitada aos respectivos proponentes ou seus legitimos representantes, como muito bem indicou o sr. Emygdio Navarro na substituiçcão que mandou para a mesa.

Em Hespanha, onde tambem, por licitação, se passou da régie para o monopolio particular, nos termos da lei de 22 de abril de 1887, as propostas tinham de ser apresou-

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tadas em dia e hora fixa, perante ajunta encarregada de presidir ao concurso, sob a forma de cartas fechadas e lacradas, sendo publico o acto da entrega e abertura das referidas cartas, como se preceitua nos artigos 7.° e 8.° da citada lei.

Mas, sem termos necessidade de sair do paiz, vemos que no nosso ministerio das obras publicas se não abre concurso algum de uma certa importância, sem ser por propostas em carta fechada, e, se o sr. ministro da fazenda quizesse aconselhar-se com o seu collega das obras publicas, este lhe explicaria decerto as boas rasões que ha na-quelle ministério, onde os concursos são frequentes, para assim se proceder.

Com respeito á base 2.ª ainda tenho outra observação a fazer.

Preceitua-se ahi que o contrato será feito dentro de um certo praso com a empreza ou individuo adjudicatario. Ora o que quer dizer esta disjunctiva, que deixa suppor que quando o adjudicatário for um só individuo não haverá empreza, se é o proprio codigo commercial que expressamente declara que as emprezas commerciaes podem ser singulares ou collectivas?

É verdade que no primeiro período da base 6.a, que assim briga com a referida base 2.a, já se demonstra que mesmo quando o concessionário seja um só individuo tambem haverá empreza.

Mas então porque se não redigem as bases em harmonia umas com as outras? Porque se procede com tanta leviandade e incorrecção num assumpto de tal grandeza? (Apoiados.)

No terceiro periodo da mesma base 6.º diz-se:

«Os estatutos da empreza concessionaria têem de ser approvados pelo governo, que, ouvida a procuradoria da coroa, póde dispensar a applicação do codigo commercial, especialmente em relação á proporção a guardar entre a emissão de acções e obrigações.»

Mas, como no primeiro periodo da mesma base se entende que haverá empreza mesmo quando a concessão fique nas mãos de um só individuo, resulta dahi que, nesta hypothese, poderá esse concessionário, no entender da commissão, emittir acções e obrigações.

Ora eu perguntarei como é que um individuo póde ter a faculdade de emittir acções, (Apoiados) se as acções só por si significam a existência de uma sociedade? (Apoia dos) E se não emittir acções, porque seria absurdo ha-vel-as em tal caso, como é que póde ter o direito de emittir obrigações? (Apoiados.)

Tudo isto carece de ser novamente estudado pela commissão, porque está redigido de um modo confuso e ambíguo. (Apoiados.)

Encontro ainda n'este terceiro periodo da base 6.ª uma disposição que me causa graves apprehensões: é a do governo reservar para si a faculdade de dispensar ou não a applicação do codigo commercial no que respeita designadamente á proporção a guardar entre o capital obrigações e o capital acções.

Eu comprehendo que se diga clara e terminantemente que a empreza poderá ter maior capital em obrigações do que em acções; mas deixar esse direito dependente do ar-bitrio do governo é abrir a porta aos abusos, permittindo que se sophisme a perfeita igualdade de condições que deve existir para todos os concorrentes. (Apoiados.)

Eu não digo que haja intenção reservada n'esta redacção; mas as cousas são o que são, e esta clausula deixa nas mãos do governo uma arma com que elle póde proteger um certo e determinado concorrente, em detrimento de todos os outros; (Apoiados.) basta que lhe declare antecipadamente que só a elle concederá mais tarde aquelle direito e a nenhum outro, pelo menos na mesma proporção (Apoiados.)

É indispensavel, portanto, redigir esta base de modo que não fique ao arbitrio do governo o conceder ou não uma faculdade tão importante, podendo assim arredar ou desanimar alguns concorrentes em beneficio de um outro que proteja. (Apoiados.)

Ha quem sustente e com bons argumentos que o capital obrigações pôde, sem perigo, exceder o capital acções, e as emprezas de caminhos de ferro constituem uma applicação frequente d'esta theoria.

Outros, ao contrario, entendem que o capital acções é que serve de garantia ao capital obrigações, e que por isso não deve este nunca exceder aquelle. Esta doutrina, que é a do nosso codigo commercial, foi sustentada insistentemente pelo sr. Hintze Ribeiro com o fundamento de que permittir que a importancia das obrigações exceda a das acções é deixar o campo livre ás especulações de má fé. Esta phrase não é do sr. Emygdio Navarro, como suppoz o sr. ministro da fazenda, mas sim do seu collega o sr. Hintze Ribeiro, a quem s. exa. deve perguntar se o projecto que estamos discutindo auctorisa ou não as especulações de má fé. (Apoiados.)

Ainda com respeito á base 6.ª devo dizer que, em contrario do que só estabelecia na proposta ministerial, se admitte que a concessão possa ficar nas mãos de um só individuo, embora estrangeiro, dispensando-o da obrigação da constituir uma sociedade portugueza.

Isto é grave e gravissimo. (Apoiados.)

Pela antiga legislação os caixas do tabaco tinham de ser cidadãos portuguezes. A lei hespanhola, a que já me referi, de 22 de abril de 1887 tambem admitte que a concessão do monopolio fique nas mãos de um só individuo, mas exige que este seja hespanhol e domiciliado em Madrid.

Quer o governo entregar nas mãos de um estrangeiro um monopolio d'esta natureza e importancia? (Apoiados.) Não lhe aproveitou a triste expiriencia que o paiz
tirou do caminho de ferro de Lourenço Marques? (Apoiados.)

O artigo 51.° do contrato pelo qual se fez a concessão d'este caminho de ferro obrigava o concessionario primitivo a organisar, dentro do praso de seis mezes, uma sociedade anonyma portugueza, com a sede em Lisboa, para a execução dos fins a que o mesmo contrato se refere. Pois apesar de se ter cumprido esta condição do contrato, apesar de se ter constituido a companhia portugueza, com quem o governo tinha exclusivamente de entender-se, bastou que o concessionário primitivo fosse americano e que o capital subscripto fosse inglez para que, no primeiro conflicto que se levantou com essa companhia, apparecessem immediatamente em sua defeza os governos dos Estados Unidos e da Gran-Bretanha, com os quaes temos estado em divergencia por tal motivo, vendo-nos na necessidade, para a resolver, de acceitar a arbitragem de uma terceira potencia, a republica Helvetica.

E aproveito o ensejo para observar que em sessão de 9 de maio perguntei eu ao governo o que havia ácerca d'esta questão de Lourenço Marques, e designadamente qual era o ponto sobre que devia versar a arbitragem internacional que já então andava annunciada nos jornaes inglezes.

Pois, por emquanto, a camara dos senhores deputados ainda não pôde obter do governo esclarecimento algum a tal respeito, e só pelos jornaes sabemos que foi a Suissa escolhida, como arbitro, para decidir a questão pendente.

Este silencio systematico faz parte do programma governativo do actual ministerio. (Apoiados.)

O Times, chegado hoje, publica já as bases da convenção que, ao que parece, vae ser assignada entre os governos portuguez e inglez, com respeito aos negocios de Africa, e, apesar d'isso, o parlamento ainda nada sabe a tal respeito. (Apoiados.) Precisâmos ler os jornaes inglezea para saber o que de mais grave e importante se passa no nosso paiz. (Apoiados.)

Censuro e censuro asperamente este procedimento do governo, com que pretende
deprimir a dignidade da representação nacional. (Apoiados.)

Voltemos, porém, ás bases do projecto em discussão.

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Na redacção da base 6.ª, o meu prezado amigo o sr. Pedro Victor, que é engenheiro, como eu, permittiu se dar uma lição sobre pontos de direito ao sr. ministro da fazenda, que é um jurisconsulto distincto. E é para não ficar atraz do sr. relator, que eu tambem estou discutindo questões de direito, certo de que assim agradarei ao sr. Pinheiro Chagas, que tudo acceita menos mathematicos a fazerem calculos e jurisconsultos a tratarem de direito.

Dizia o sr. ministro na base 6.ª da sua proposta:

«A sociedade, parceria ou indivíduo a quem for adjudicado o exclusivo», etc., e vae o sr. relator e elimina a parceria, e elimina-a muito bem, como vamos ver.

O antigo codigo commercial, que parece ser a cartilha por onde ainda lê o sr. ministro da fazenda, dizia effectivamente:

«Parceria mercantil é em geral toda a associação conjuncta de commerciantes em communhão, sem animo de sociedade.»

O que a final outra cousa não era senão uma associação em couta de participação ou uma copropriedade ou ainda uma sociedade em commandita.

Mas o novo codigo acabou, como era de justiça, com esta associação sem animo de sociedade, apesar de ser conjuncta e de commerciantes em communhão, e, respeitando o uso estabelecido, só auctorisou os interessados em qualquer especulação maritima, como são os armadores, a tripulação e os carregadores a reunirem-se sob a denominação de parceria.

Mas o contrato dos tabacos será tambem uma especulação marítima? (Riso.)

Eu bem sei qne por entre os baixios d'este projecto já navegam alguns flamengos, povo essencialmente maritimo, (Riso.) mas chamar o sr. ministro da fazenda a isto uma especulação maritima é esquecer tudo quanto aprendeu na universidade. (Apoiados.)

Não quero deixar passar a base 5.ª sem fazer algumas observações sobre o que disse o sr. Pinheiro Chagas.

S. exa. não precisa fazer cálculos para saber se a renda mínima de 4:250 contos por anno é sufficiente ou não. Lá está a praça, que tudo corrigirá.

O sr. ministro da fazenda já tinha sustentado, pouco mais ou menos, a mesma singular theoria.

Mas, porque é então que s. exas. querem que se fixe o minimo da renda? Mais logico, segundo o seu modo de ver, seria supprimil-o, deixando a fixação da renda dependente da praça.

A praça corrige tudo!

E os conluios, e as fraudes que poderão ahi praticar-se, quando se reconhecer que o governo, fixando um mínimo muito baixo, deixa margem para lucros que, pela sua importancia, chegam para muitos? (Apoiados.)

A praça corrige tudo!

E se se apresentar um só concorrente, não haverá adjudicação? (Apoiados.)

A praça corrige tudo!

Para que é então que o sr. Pinheiro Chagas, quando ministro da marinha, careceu de estudos prévios para saber qual era o custo kilometrico sobre que havia de garantir o juro, tia concessão do caminho de ferro de Ambaca? Para que é que o sr. ministro das obras publicas manda fazer os orçamentos minuciosos dos projectos das estradas, antes de pôr a sua construcção em praça?

A praça corrige tudo!

E ha de o parlamento abdicar do seu direito de examinar em que condições se quer enfeudar, por dezeseis annos, a melhor receita do estado, deixando os interesses públicos á mercê de quaesquer combinações fraudulentas?

Singular theoria esta para um homem que tem a honra de ser ministro, e para outro que já o foi! (Apoiados.)

Passemos á base 7.ª

Preceitua-se ahi que o concessionario pagará ao governo 3:600 contos de réis no dia da assignatura do contrato, e igual quantia sessenta dias depois.

Sinto não ver presente o sr. Pinheiro Chagas que, alludindo a uma phrase do meu collega e amigo o sr. Elias Garcia, disse que o arrematante não seria aquella figura sinistra recamada do oiro e pedrarias a que este illustre deputado se havia referido no seu discurso, mas um pobre burguez que vinha tomar conta da fabricação do tabaco.

Pobre burguez! Mas a que chamará o sr. Pinheiro Chagas um argentario poderoso, se para s. exa. ainda é pobre burguez um homem que póde de prompto entregar 3:600 contos de réis em bom metal sonante, e outra quantia igual dentro do curto praso de sessenta dias, isto é, ainda antes de se poderem realisar essas importancias por meio da emissão de acções e obrigações?

Como está redigida a base 7.ª, póde affirmar-se, sem receio de errar, que á praça só concorrerão os gros-bonnets da finança ou os estabelecimentos bancários de primeira ordem, (Apoiados.) e estes não costumam fazer-se muito mal uns aos outros, mas antes têem por norma ligar-se entre si para explorar terceiros. Les loups ne se mangent pas entre eux.

É por isso que eu não confio na tal theoria de que a praça corrige tudo. (Apoiados.)

E o sr. ministro, se quer que a praça seja concorrida, como convém aos interesses pUblicos, devia alargar o praso para o pagamento dos 7:200 contos réis, porque assim se daria tempo ao concessionário menos abastado para realisar a maior parte d'essa somma por meio de acções e obrigações.

Mas tal é a urgencia d'aquelle supprimento, que o sr. ministro não recua perante o perigo de ver a praça entregue exclusivamente aos potentados da bolsa.
(Apoiados.)

Chegâmos á base 9.ª, que trata das obrigações do arrematante, e ao famoso n.° 1.° d'esta base, que tem já sido largamente discutido.

Refere-se este numero á partilha de lucros entre o concessionario, os operários e o estado, nos termos seguintes:

«O concessionario do exclusivo fica mais obrigado:

«1.° A partilhar os seus lucros liquidos com o estado e com o pessoal operario e não operario, pela forma seguinte:

«Os lucros liquidos do concessionario, tendo previamente em consideração, no calculo, a deducção da annuidade para amortisar 7.200 contos de réis em dezeseis annos á taxa de 5 por cento serão partilhados em partes iguaes entre o estado e o concessionario depois de deduzidos 5 por cento para fundo de reserva, 5 por cento para operarios, 1 por cento para pessoal não operário e 10 por cento de um capital de laboração na importancia de 3.500:000$000 réis para dividendo d'este capital.

Antes de tudo devo observar que esta redacção é differente da do sr. ministro da fazenda, que na sua proposta dizia assim:

«O concessionario do exclusivo fica mais obrigado:

«9.ª 1.° A partilhar os seus lucros liquides com o pessoal operario e não operario e com o estado pela fórma seguinte:

«Dos lucros liquidos, consideradas as amortisações em dezeseis annos ao juro de 5 por cento, deduzidos 5 por cento para fundo de reserva, 5 por cento para os operarios, 1 por cento para o pessoal não operario e 10 por cento do capital de laboração empregado, para dividendo, o restante será partilhado na rasão de dois terços para o concessionário e um terço para o estado.»

Eu não percebo muito francamente o que é que o sr. ministro entende por amortisações em dezeseis annos ao juro de 5 por cento. Que se pague 5 por cento de juro sobre uma determinada quantia, todos sabem o que seja. Que se amortise em dezeseis annos uma certa somma ainda todos comprehendem. Mas amortisar em dezeseis

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annos ao juro de 5 por cento 6 cousa que só o sr. Franco Castello Branco póde entender. (Apoiados.)

Bem andou, pois, a commissão era substituir esta expressão incorrecta, que só se explica pela confusão que lavra no espirito do sr. ministro da fazenda entre o que seja juro e amortisação.

Mau foi que, em compensação, a commissão preceituasse que, antes de começar a partilha de lucros com o estado, ha de o concessionário retirar 10 por cento de dividendo, não do capital de laboração realmente empregado, como dizia a proposta ministerial, mas de um capital de laboração fixado na importância de 3:500 contos de reis.

Se se tivesse limitado a commissão a fazer esta substituição, sustentando que a empreza carecia do 3:500 contos de capital de laboração, era ao menos clara e nitida a sua situação, e todo o trabalho da opposição consistiria em demonstrar que tal capital de laboração era excessivo e propositadamente fixado para demorar o mais possivel a partilha de lucros com o estado.

Mas a propria commissão e que se incumbiu de evidenciar a todos os olhos o absurdo desse capital de labora cão, quando diz no seu parecer:

«Fixou-se em 3:500 contos de reis o capital, que a proposta do governo considera como de laboração, por se suppor que o concessionário precisa de 800 contos de capital circulante, que juntos a 2:700 contos do valores existentes na administração da régie perfazem o capital indispensável para o seu giro.»

Assim, sr. presidente, os taes 2:700 contos de valores entregues pelo estado ao monopolista figuram tres vezes no referido n.° 1 da base 9.ª e sempre em beneficio do arrematante. Porque estão inchados nos 7:200 contos que o estado recebe no começo da concessão, vencem juros de 5 por cento e têem a amortisação necessaria para se extinguirem ao cabo de dezeseis annos, e porque fazem parte do capital de laboração de 3:500 contos recebem o dividendo de 10 por cento ou 270 contos por anno, apesar de irem sendo successivamente amortisados.

Diz o sr. relator que isto e uma formula. De accordo, mas e uma formula absurda, (Apoiados) como eu vou demonstrar, porque a commissão teve a ingenuidade de nos dar a deducção, a genesis da sua formula.

O sr. ministro da fazenda, quando fallou nos suppostos prejuizos que o estado tem soffrido com as avultadas in-demnisações de mais de 7:200 contos de reis, pagas às fabricas, quasi que chorou. (Riso.) Nas suas lamentações, tão commovido se mostrava que póde bem dizer-se que s. exa. foi o Jeremias das expropriações.

Pois, sr. presidente, pena e que o estado não tenha perdido muito mais, se e que perdeu alguma cousa, porque quanto mais houvesse perdido, mais ganharia, admittida a formula da commissão.

Imaginemos por um momento que a régie, em vez de ter boje 2:700 contos de valores, para entregar ao monopolista, tinha apenas, que sei eu? 1:000 contos somente. Vinha a commissão, vinha o sr. ministro da fazenda, que está de accordo com ella, applicavam a formula juntando aos 1:000 contos do valores existentes na regie os 800 contos de capital circulante, e fixavam o capital de laboração em 2:000 contos e o respectivo dividendo de 10 por cento etn 200 contos, em vez de 350, como e agora, só porque temos a infelicidade de entregar ao arrematante, não 1:000 contos de valores, mas 2:700 contos.

Mas que formula e esta, sr. presidente, que quanto mais vale o que damos, mais temos de pagar, e quanto mais houvessemos perdido nas expropriações, mais ganhariamos na adjudicação? (Apoiados.) Isto não e formula, isto é o ganha perde. (Riso.)

E já v. exa. notou, sr. presidente, que na explicação que a digna commissão nos dá no seu parecer temos nem mais nem menos do que tres especies differentes de capitães, capital de laboração, capital circulante e capital de giro? Atas o que vae girando são os taes 2:700 contos, com a circumstancia aggravante de se
reproduzirem pelo caminho (Apoiados.)

Francamente, eu não desejo maguar o sr. relator da commissão, de quem sou amigo ha muitos annos, mas sempre lhe direi que e para lastimar que, num projecto de lei d'este alcance, caisse s. exa. em leviandades e incoherencias d'esta ordem. (Apoiados.)

Disse o sr. Pedro Victor que não se póde estudar uma operação financeira tão complexa como esta é, discutindo isoladamente uma ou outra das suas condições, mas que e necessario examinal-as todas.

Perfeitamente de accordo; mas tambem é indispensavel observar que as hypothoses que s. exa. formulou ácerca dos lucros liquidos annuaes do arrematante são tão baixas, que nunca, em nenhum dos dezeseis annos da concessão, poderia haver partilha de lucros, como se ve do mappa que s. exa. teve a bondade de me communicar e a que logo me referirei.

D'ahi resulta que nos calculos de s. exa. se não fazem sentir os effeitos da formula, parecendo assim que para a commissão de fazenda a partilha de lucros que se promette ao estado e aos operarios é apenas destinada a illudir os incautos.

Justo é, portanto, que estudem agora isoladamente esta condição, aquelles que, confiando mais que a commissão, no futuro da empreza, entendem que ha de haver partilha de lucros, salvo se a escripturação do monopolista for sophismada, hypothese esta que, sendo possivel, ainda mais condemna o projecto em discussão.

Ora, no regimen da partilha de lucros quer v. exa. saber o que representa este favor, concedido ao arrematante, de tirar, alem de 80 contos para dividendo de 10 por cento do capital circulante, que a própria commissão fixa em 800 contos, mais 270 contos para dividendo do capital de 2:700 coutos que já está incluido nos 7:200 que elle vae amortisando annualmente?

Dezeseis annuidades de 270 contos, accumuladas ao juro de 5 por cento, valem no tim de dezeseis annos 6:545 contos de reis, isto e, 2,42 vezes 2:700 contos.

Assim, sr. presidente, no fim da concessão os 2:700 contos que o arrematante pagou pelos valores recebidos da regie já estarão inteiramente amortisados, á custa dos lucros liquidos da emproza; alem d'isso, os dividendos do 10 por cento d'esses 2:700 contos, tirados dos mesmos lucros antes da partilha, poderão n'essa epocha representar 6:545 contos; pois, como se isto ainda não bastasse, para que o estado no fim da concessão possa haver os referidos valores, já amortisados e mais que duplicados nas mãos do arrematante, e necessario que pague ao monopolista, não sómento 2:700, mas 3:260 contos de reis, porque a tanto monta expropriar-lhe as fabricas, machinismos, utensilios e depositos de materias primas, por 1:500 contos, como calcula a commissão, e comprar-lhe, ao preço medio de 3$520 reis por kilogramma, um stock de 500 toneladas de tabacos manipulados, igual em peso ao que elle recebeu da regie. Quer isto dizer que pelos 2:700 contos que o arrematante entrega agora ao estado póde vir a receber nem mais nem menos do que 12:505 contos, alem do adminiculo de mais 3:520 contos pela compra no fim da concessão de outras 1:000 toneladas de tabacos manipulados, sem prejuizo das 500 que já considerei.

E em troca de tudo isto o que recebe o estado immediatamente? Apenas mais 4:500 contos do que os valores que entrega. E é a isto que o sr. Pedro Victor chama um emprestimo de graça! Não está má a graça! (Riso.)

Passemos ao n.° 3.º da mesma base 9.º, que e assim redigido:

«3.° A receber, para lhe dar o destino conveniente, todo o tabaco de tomadias, entregando ao estado metade do valor das gratificações que actualmente pertencem aos agentes do governo por kilogramma de tabaco apprehendido, e

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ficando a cargo do thesouro o pagamento integral d'essas mesmas gratificações.»

Disse o sr. Navarro que havia ahi um beneficio a favor do arrematante, porque só teria de pagar metade das gratificações que pertencem aos agentes do governo, entretanto que a régie paga actualmente essas gratificações por inteiro.

O sr. ministro, muito satisfeito por encontrar a opposição em erro, observou, na resposta dada ao sr. Navarro, que a régie nada tem com essas gratificações que são pagas pelo governo, de modo que o n.° 3.° da base 9.ª representaria, não uma vantagem, mas uma desvantagem para o monopolista.

Pois quem está em erro não é o sr. Navarro, mas o sr. ministro, o que é tanto mais para admirar, visto que se trata de um assumpto que corre pela sua pasta.

É certo que o governo é quem paga aos guardas fiscaes a gratificação de 400 réis por cada kilogramma de tabaco apprehendido, mas a régie compra este tabaco ao commando da guarda fiscal precisamente pelo mesmo preço de 400 réis; logo tudo se passa como se a régie pagasse directamente as gratificações.

Ora, o monopolista, nos termos do 11.° 3.° da base 9.º, recebe todo o tabaco de tomadias, mas só terá de pagar metade d'essas gratificações, isto é, 200 réis por kilogramma de tabaco apprehendido; logo tem o beneficio e não o prejuizo de metade das mesmas gratificações, como affirmou erradamente o sr. ministro da fazenda. (Apoiados.)

Chegâmos ao n.° 5.° da base 9.ª, que representa, como v. exa. vae ver, um pesadissimo encargo para o arrematante.

De facto diz-se na primeira parte desse numero que o concessionario é obrigado a entregar ao governo, no dia em que findar a concessão, um peso de tabacos manipulados não inferior a 1.500:000 kilogrammas. Isto era o limite minimo do onus para o monopolista. Tudo d'ahi para cima, nada, d'ahi para baixo.

Tão triste era a situação do arrematante que até commoveu um dos illustres deputados da maioria, o sr. Jacinto Cândido, que propoz que as 1:500 toneladas representassem, não o limite inferior, mas o peso definitivo dos tabacos que o arrematante terá de entregar ao governo.

Vem, porém, a segunda parte do mesmo n.° 5.° da referida base 9.ª, que trata, como disse, das obrigações do arrematante, e acrescenta-lhe o doce encargo de receber do governo, por cada um d'esses 1.500:000 kilogrammas, 85 por cento do preço de venda.

Assim é que o arrematante, no começo da concessão, receberá da régie umas 500 toneladas de tabaco manipulado, por 32 por cento do preço actual de venda, que é proximamente de 3$451 réis por kilogramma, entretanto que no fim da concessão tem o pesado encargo de entregar ao estado, não 500, mas 1:500 toneladas por 85 por cento do preço de venda n'essa epocha.

Ora, tendo o arrematante a faculdade de elevar os preços actuaes até 20 por cento em media, ha de usar d'essa faculdade, ainda que não seja senão no ultimo mez da concessão e em relação ás marcas que lhe houverem sido designadas pelo governo, a fim de auferir os maiores lucros da venda que a este tem de fazer no fim da concessão.

N'estas condições, como demonstrarei mais tarde, o preço corrente medio de venda será de 4$141 réis, e o governo terá de pagar ao arrematante 1:500 toneladas de tabaco a 3$520 réis por kilogramma, ou 5:280 contos de réis, além de 1:500 contos de réis que se referem á expropriação das fabricas, machinismos, utensilios e depositos de materias primas.

Pediu o sr. relator á opposição que, se encontrasse neste projecto algum alçapão escondido, alguma porta falsa, ou alguma palavra menos correcta, lha indicasse para se corrigir immediatamente. Pois, se s. exa. era sincero ao fazer este pedido, modifique este n.° 5.° da base 9.ª, porque isto é um verdadeiro alçapão por onde se some o melhor de 6:780 contos de réis em prejuizo do thesouro. (Apoiados.) Redija-a, a exemplo do que se tem feito em contratos analogos, por fórma que, no fim da concessão, as fabricas, machinismos, utensilios e depositos de materias primas, bem como um peso de tabacos manipulados igual ao recebido, reverta á posse do estado, sem indemnisação alguma para o arrematante, embora se reduza o supprimento que o governo recebe immediatamente ou a importancia da renda annual que lhe deve entregar o monopolista, durante o praso da concessão.

A base 10.ª, no seu n.° 1.°, fixa o praso da concessão em dezeseis annos, mas o sr. relator já declarou que as disposições do futuro contrato são taes que a concessão durará de facto dezesete annos, com a circumstancia aggravante do arrematante não ter de pagar renda ao estado no decimo septimo anno, e tudo isto para beneficio do thesouro e para defeza do sagrado principio da liberdade de industria que o sr. ministro tanto adora! (Apoiados.)

Mas o monopolio de facto, se não de direito, ainda ha de durar muito mais, porque nem ao governo será facil pagar 6:780 contos de réis, ao findar a concessão, para passar novamente á regie, nem o regimen da liberdade será então exequivel desde que as novas fabricas e só as novas fabricas e não as que ficam em poder do arrematante, serão obrigadas a organisar caixas de reformas e de soccorros, a admittir o pessoal operário que pertence actualmente á régie, e a comprar ao estado 5:280 contos de réis de tabacos manipulados, em proporção da sua producção provavel.

Mas, admittamos a melhor das hypotheses. A da concessão durar apenas dezeseis annos. Disseram o sr. ministro e o sr. relator, em nome da commissão, que haviam fixado este praso, muito maior que o de doze annos adoptado na lei de 18 de agosto de 1887, porque agora o arrematante tem de dar immediatamente ao governo 7:200 contos de réis, entretanto que em 1887 nada tinha que despender de prompto.

Isto não é exacto, porque a base 8.ª da referida lei obrigava o concessionario em 1887 a adquirir as fabricas de tabacos em laboração no continente, que tivessem de ser expropriadas, pagando por ellas não só o valor que lhes fosse arbitrado, mas tambem os lucros cessantes que, para as fabricas constituidas era sociedade anonyma com acções devidamente cotadas, seriam representados pela differença entre o valor arbitrado e o da totalidade das acções pela ultima cotação anterior a 31 de dezembro de 1886.

Ora, sendo estas bases idênticas às que estabeleceu a lei de 1888 para a expropriação das referidas fabricas por parte do governo, segue-se dahi que o arrematante do 1887 teria de dar por ellas exactamente as mesmas sommas que o governo pagou, porque me custa a admittir que, se as expropriações fossem feitas em nome de um particular, houvessem de custar menos do que quando realisadas, como foram, por conta do estado.

O encargo em 1887 seria, portanto, tambem de 7:200 contos de réis ou ainda mais, visto que o sr. ministro da fazenda declarou que ainda é necessario dispender mais 1:444 contos com essas expropriações.

É verdade que o sr. relator está neste ponto em completo desaccordo com o sr. ministro, porque, no mappa que me communicou e de que logo tratarei, calcula apenas em 674 contos de réis o que o estado ainda terá a dispender.

Eu creio que é o sr. relator que tem rasão, porque n'aquelles 1:444 contos de réis se comprehendem verbas que não dizem respeito ás expropriações.

Como quer que seja, porém, vê-se que o estado gastou nas expropriações ou 7:874 contos de réis, como diz o sr. relator, ou 8:644, como pretende o sr. ministro, e o mesmo teria de gastar o arrematante em 1887.

Como é, pois, que s. exas. pretendem explicar o alar-

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gamento do praso pelo facto do concessionário actual ter 7:200 contos de réis de despezas iniciaes e o de 1887 não ter nenhumas, se as d'este ultimo ainda seriam mais avultadas, como acabamos de ver?

Querem, porventura, sustentar que, aberto o concurso em 1887, o exclusivo ficaria fatalmente nas mãos da antiga companhia nacional, e que, possuindo esta quasi todas as fabricas era laboração, poderia pagar as poucas mais que teria de expropriar pelo capital do 2:400 contos do réis que no n.° 2.° da base 7.ª da lei de 18 de agosto de 1887 correspondia ao capital chamado de laboração no n.° 1.° da base 9.ª do actual projecto?

Sem discutir o que haveria de sophistico n'este modo de apresentar a questão, observarei apenas que quem assim raciocine e argumente terá então de confessar que os beneficios que o estado auferiria em cada anno, pelo contrato de 1887, seriam muito maiores do que pelo actual, porque a partilha de lucros começaria muito mais cedo e em muito maiores proporções, como o demonstra com toda a evidencia o quadro seguinte:

[Ver quadro na imagem]

Assim, a partilha de lucros para o estado começaria, pela lei de 1887 quando estes attingissem 4.532:352$941 réis, entretanto que pelo projecto actual só começará quando forem de 5.307:601$779 réis, e tanto o estado como o pessoal operario e não operário receberiam annualmente quantias muito mais avultadas do que agora.

O dilemma é este, portanto: ou o arrematante em 1887 teria de pagar immediatamente o mesmo que o do 1890, para adquirir o exclusivo, ou as quantias que entregaria annualmente ao estado seriam muito mais elevadas

E é depois d'isto, é depois do haverem confessado que vamos entregar por 7:200 contos de reis o que nos custou 7:874 ou 8:644 contos, que suppõem haver justificado o arbitrio com que augmentaram de doze a dezeseis annos, ou antes a dezesete, o praso pelo qual vão enfeudar a melhor receita do estado nas mãos do estrangeiro (Apoiados.)

Vamos agora ao n.° 7.° da mesma base 10.a, o qual corresponde ao n.° 3.° da base 9.ª da proposta ministerial.

Dizia o sr. ministro da fazenda no n.° 3.° da base 9.a, que o concessionario do exclusivo ficava obrigado a «produzir e vender, sem augmento nos preços correntes actualmente, as marcas adoptadas pela administração geral dos tabacos, e em harmonia com as exigencias do consumo, com excepção das marcas especiaes destinadas para a setima secção da zona fiscal, podendo fabricar e entregar ao consumo quaesqucr outras marcas nas condições que julgar por mais convenientes».

Diz a commissão no n.° 7.° da base 10.ª que o concessionário terá o direito de estabelecer, para a venda dos tabacos fabricados, os preços que julgar mais convenientes, comtanto que, em relação às marcas actuaes da administração geral dos tabacos ou a outras marcas novas, introduzidas no consumo, não eleve os preços de venda em mais de 20 por cento, em média, do preço por que actualmente é exposto ao consumo um determinado peso e qualidade de tabaco.

Segundo nos observou o sr. relator, a modificação, n'este ponto, da proposta ministerial teve por fim restringir a faculdade que esta deixava ao arrematante de fixar, como quizesse, o preço das marcas novas, faculdade de que elle abusaria de certo, introduzindo talo de couve e tabaco podre nas marcas actuaes para as desacreditar em competencia com as marcas novas, e vendendo depois estas ultimas por preços exagerados.

Esta rasão só tem um inconveniente: é o de provar de mais. (Apoiados.)

Não é necessario melhor argumento para condemnar absolutamente o projecto que estamos discutindo. (Apoiados.)

Se este projecto se presta a taes abusos, se o systema que vamos implantar póde dar taes resultados, o melhor que temos a fazer é rasgar o parecer em vez de o discutir. (Apoiados.) Eu comprehendo que se explore, em beneficio do estado, o vicio do tabaco, mas envenenar lentamente a população com tabaco podre, isso é levar muito longe as exigências do thesouro. (Apoiados.)

Porque, sr. presidente, se o monopolista podia, pela proposta do lei que deu origem a este projecto, substituir, nas marcas actuaes, o tabaco são pelo tabaco podre ou talo de couve, a fim de as desacreditar, vendendo assim por maior preço relativo as marcas novas, tambem agora pelo projecto em discussão póde fazer igual substituição, tanto nas marcas actuaes como nas novas, para augmentar por outra fórma os seus lucros, porque ninguem contestará que o talo de couve e o tabaco podre valham menos que o são. (Apoiados.)

Mas, deixando de parte esta originalíssima defeza do projecto, imaginada pelo
sr. relator, vamos ver como é que a commissão restringiu as disposições da proposta ministerial.

No que respeita ás marcas actuaes a restricção consiste em permittir que o arrematante augmente o preço actual de mais 20 por cento, quando pela proposta tal augmento lhe era absolutamente defezo. Não está má restricção!

No que se refere ás marcas novas dizia, é verdade, a proposta que o arrematante as poderia vender pelo preço

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que quizesse, mas como elle ficava obrigado a produzir e vender as marcas actuaes, em harmonia com as exigencias do consumo, na competencia d'estas estava muito naturalmente a limitação do preço d'aquellas. A restricção em relação às marcas novas consiste em permittir que se eleve tambem até 20 por cento o preço por que actualmente é exposto ao consumo igual peso de tabaco da mesma qualidade.

Isto é restringir? Tanto o não é, que a commissão, em sua consciencia, entendeu que devia transferir esta disposição para a base 9.ª, que trata dos direitos do concessionario, quando na proposta ministerial figurava entre as obrigações deste, compendiadas na base 10.ª (Apoiados.)

Se o intento da commissão fosse realmente restringir as faculdades do arrematante, em vez de as alargar, como de facto alargou, num ponto que é da maior gravidade para o consumidor e do maior interesse para a empreza, teria procedido do modo muito diverso. Quanto ás marcas actuaes teria mantido a prohibição de lhe elevar os preços correntes, como constava da proposta do governo; quanto ás marcas novas teria preceituado que o seu preço seria fixado, por accordo entre o governo e o concessionario, tomando-se por base o preço actual de igual peso de tabaco da mesma qualidade e, porventura, tambem a importancia provavel do consumo dessas novas marcas e até talvez a maior ou menor riqueza da classe social a que ellas fossem destinadas.

O sr. Pedro Victor: - A v. exa. não lhe custava nada ler o final da base 7.ª, e logo só convencia.

O Orador: - O final da base 7.ª diz:

«A falta de pagamento de qualquer das duas prestações importa a rescisão definitiva e immediata do contrato nos termos absolutos da base 16.º»

Creio que nada tem isto com o tabaco podre. (Riso.)

O sr. Pedro Viotor: - Eu queria indicar o final do n.° 7.° da base 10.ª

O Orador: - Isso agora é outra cousa. O ultimo paragrapho do n.° 7.° da base de que se trata diz:

«O concessionario não poderá nunca, em relação às marcas actuaes da administração geral dos tabacos, ou a outras marcas novas, introduzidas no consumo, elevar, durante os dezeseis annos da concessão, o preço de venda em mais de 20 por cento, em media, do preço por que actualmente é exposto ao consumo um determinado peso e qualidade de tabaco.»

Perfeitamente, e o sr. relator é que me não quer comprehender.

Eu digo que assim como o peso e a qualidade do tabaco foram considerados pela commissrio como bases seguras para impedir que o arrematante, com respeito ás marcas novas, eleve de mais de 20 por cento o preço equivalente das marcas actuaes, tambem as mesmas bases podiam servir para obstar a que elle elevasse o preço das novas marcas acima do preço corrente neste momento. (Apoiados.)

É isto o que se devia ter feito. Assim se teria restringido a liberdade de preço consentida na proposta ministerial com respeito ás marcas novas. Mas pela fórma por que se redigiu o n.° 7.° da base 10.ª, alargaram-se as faculdades do arrematante, de um modo muito notavel, como eu hei de demonstrar quando expozer á camara o que vale este augmento, que se permitte, de 20 por cento no preço actual do tabaco. (Apoiados.)

É verdade que por parte do governo e da maioria se tem sempre sustentado que o concessionario não poderá elevar, até 20 por cento, o preço actual dos tabacos, porque se o fizesse a si proprio prejudicaria, pelo augmento que haveria de contrabando.

Então porque se não elimina esta faculdade, satisfazendo assim aos reparos da opposição? (Apoiados.)

Mas porque se não poderá elevar o preço dos tabacos?

A lei de 27 de abril do 1871 augmentou de 9,1 por cento os direitos sobre o tabaco em rolo, de 7,7 por cento os do tabaco em folhas, de 10 por cento os dos charutos e de 12,5 por cento os das outras especies de tabacos manipulados; a lei de 31 de março de 1879 elevou de 20 por cento os direitos sobre todas as especies de tabacos; e o rendimento das alfandegas, salvo as perturbações resultantes da antecipação de despachos, continuou sempre a crescer.

Quem póde, portanto, affirmar em consciencia, que o preço do tabaco entre nós attingiu o maximo a que póde chegar? (Apoiados.)

Quer v. exa. ver o que dizia em 1879 a commissão de fazenda desta camara sobre a proposta apresentada pelo sr. Antonio de Serpa, que então era ministro da fazenda, para augmentar de 20 por cento os direitos do tabaco?

Dizia que da conversão em lei da referida proposta devia resultar acrescimo importante da receita publica; e este parecer, sr. presidente, era assignado pelo sr. Lopo Vaz, relator da commissão, e pelos srs. Hintzo Ribeiro e Julio de Vilhena, vogaes.

Com estas auctoridades respondo eu ao sr. Franco Castello Branco e aos oradores da maioria quando sustentam que o arrematante não poderá elevar o preço actual dos tabacos. (Apoiados.)

Por fim desejo observar que nenhuma disposição se inseriu n'este projecto tendente a evitar que o arrematante possa no ultimo periodo da concessão formar grandes depositos de tabacos nacionaes ou estrangeiros, para os vender mais tarde, em concorrencia com a administração que se seguir á sua. (Apoiados.)

Vou agora entrar na apreciação dos calculos do sr. Pedro Victor; mas antes disso peço a v. exa. e á camara que me permitiam descansar alguns minutos, porque, tendo começado a fallar na sessão diurna, me sinto deveras fatigado.

(Pausa.)

O sr. relator formulou duas hypotheses diversas: suppoz, em primeiro logar, que o consumo de tabaco se manteria constante, entro nós, durante os dezeseis annos mais proximos; e, em segundo logar, que esse consumo augmentaria de 1,63 por cento em cada um desses annos.

Ambas essas hypotheses estão figuradas no mappa seguinte, reproducção do que s. exa. teve a bondade de me communicar, mas reproducção incompleta, no que respeita a algumas parcellas das duas ultimas columnas, porque quando eu me dava ao enfadonho trabalho de o copiar por meu proprio punho, já me estava sendo instantemente reclamado pelo illustre deputado o sr. Jacinto Candido, que tambem carecia de examinar o referido mappa, para poder responder ao sr. Elias Garcia.

E a isto está reduzido o parlamento portuguez para estudar um projecto d'esta magnitude e alcance! (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda julgou inutil fundamentar, como lhe cumpria, a sua proposta de lei; a commissão, essa fez os seus cálculos, mas guardou-os cautelosamente para si e não os inseriu no seu parecer; o sr. relator, quando fallou, referiu-se, é verdade, aos mappas e tabellas organisados pela commissão, mas tambem lhes não deu publicidade, nem no Diario das camaras, nem no jornal de que s. exa. é redactor, nem em qualquer outro; e se um deputado da opposição se lembra, como eu fiz, de pedir alguns desses mappas e tabeliãs, para os copiar e examinar, vê-se logo assaltado por um illustre deputado da maioria que, apesar de ser vogal da commissão de fazenda, tambem d'elles carecia ainda, para tomar parte no debate, como tomou. (Apoiados.)

Tudo isto é deploravel, sr. presidente. (Apoiados.)
Temos sessões diurnas, temos sessões nocturnas; temos sessões ás quintas feiras, dia destinado aos trabalhos em commissões, e, ainda por cima, as propostas e projectos da lei se apresentam aqui tão despidos de esclarecimentos e

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tão desacompanhados de documentos, que, se quizermos estudar os que se referem, por exemplo, ao caminho de ferro de Mossamedes, teremos de vir aqui ámanhã domingo, e se queremos examinar os que dizem respeito ao monopolio dos tabacos temos de andar a solicital-os, como um favor, da parte do sr. relator da commissão. (Apoiados.)

Tenho visto pareceres apresentados pelas respectivas commissões, nos parlamentos francez e italiano, por exemplo, sobre assumptos de menor alcance, que, se houvessem servido de modelo á nossa commissão de fazenda, tel-a-íam levado a fundamentar mais largamente, do que o fez, um projecto de lei tão importante, como aquelle que tem por tim enfeudar durante dezeseis annos a melhor receita do estado. (Apoiados.)

Vamos, porém, ao mappa do sr. relator, que eu inserirei no meu discurso para melhor se comprehenderem as observações que sobre elle tenho a fazer e que em nada são prejudicadas pelas omissões que eu disse haver nas parcellas das duas ultimas columnas, visto que o que interessa são as respectivas sommas.

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Mappa comparativo dos rendimentos da régie e do exclusivo arrematado em 17 annos suppondo a liquidação completa para as das operações

[Ver tabela na imagem]

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Examinemos a primeira parte do mappa que se refere á hypothese do consumo constante.

O sr. relator partiu da base, que eu logo discutirei, de que no anno de 1889-1890 o rendimento da regie foi de 3:246 contos de róis, e, dada a hypothese inicial, repete esta cifra em todas as linhas da columna intitulada Rendimento da regie.

Depois parte de outra base, que tambem logo apreciarei, relativamente ás baixas que se dito annualmente no pessoal da régie, e assim calcula a correspondente diminuição de encargos que inscreve na columna immediata.

Os numeros da columna A, que representam o rendimento total da régie, obtêem-se muito naturalmente sommando os numeros correspondentes das duas columnas anteriores.

Na columna immediata, designada pela letra B, inscreve o rendimento constante que o estado auferirá annualmente do monopolio, fixando-o na importancia de 4:370 contos do réis, que a seu tempo examinarei.

A columna seguinte, cujos numeros se obtêem por differença entre os das columnas B o A, menciona as quantias que o estado receberá a mais do monopolio comparado com a régie.

A columna immediata, intitulada juros, da, como o seu nome indica, a importancia dos juros accumulados d'essas quantias, postas a render, até o fim da concessão, á taxa de 5 por cento ao anno.

Finalmente a ultima columna, que resulta da addição das duas immediatamente anteriores, designa o valor adquirido, no fira da concessão, pelas quantias inscriptas na columna B-A, com os seus juros accumulados na rasão de 5 por cento ao anno.

Até aqui tudo é perfeitamente correcto, sob o ponto do vista arithmetico, porque, quanto às bases e hypotheses em que se funda o mappa, logo as discutirei.

Depois o sr. relator somma os dezeseis números de cada uma das cinco ultimas columnas o tambem nenhum reparo tenho a fazer a tal respeito.

Mas, em seguida, toma a ultima columna que, como disse, contém, não as quantias recebidas pelo estado a mais em cada anuo, mas essas quantias com os seus juros accumulados até o fim da concessão, e, da respectiva somma, que monta a 21:716 contos de réis, deduz os 4:700 contos, em que avalia a importancia do que o estado tem de dar ao arrematante n'essa epocha, o, como a differença é de 17:016 contos e entende que o monopolio durará de facto cerca de dezesete annos, diz-nos no seu mappa e repete insistentemente no seu discurso que o estado virá a receber do concessionario approximadamente mais 1:000 contos por anno do que receberia da regie, se esta fosse mantida.

Isto agora é que eu contesto absolutamente. Dado, mas não concedido, que as bases e hypothese adoptadas pelo sr. relator, e, portanto, o seu mappa fossem exactos, o que eu vou demonstrar é que s. exa. se equivocou nas conclusões que do sen proprio mappa tirou, tomando, por lapso, a ultima columna, em vez da antepenultima, como devera ter feito.

Para melhor fazer comprehender da camara, que não tem á vista o mappa do sr. relator, qual foi o erro praticado por s. exa., vou citar um exemplo, que tornará mais frisante o caso succedido.

Todos sabem qual é o immenso poder da capitalisação dos juros, que permitte que uma pequena quantia attinja, com o decorrer dos tempos, sommas que parecem fabulosas.

Imaginemos que um individuo deposita num banco a quantia de 2 contos de réis ao juro de 5 por cento ao anno. Adquirirá assim o direito a uma ronda annual de 100$000 réis. Mas, se tanto o depositante, como os seus successores, se impozerem o preceito de não receber, durante um longo periodo, os termos successivos d'esta renda, deixando-os todos em poder do banco para tambem irem vencendo o juro de 5 por cento, ao cabo de dois seculos, por exemplo, as duzentas annuidades de 100$000 réis com os seus juros accumulados representarão a importantissima somma de 34:583 contos de réis, que, alem do capital primitivo do 2 contos de réis, terá o banco de pagar aos descendentes do depositante, se então lhe for requisitada.

Posto isto, o que faz o sr. relator seguindo o engenhoso methodo de calculo que adoptou no seu mappa?

Toma aquelles 34:583 contos de réis de juros accumulados, divido os por 200, numero de annos da operação, o que lhe da approximadamente 173 contos, e depois vem dizer-nos que um individuo que disponha da modesta quantia de 2 coutos, póde com ella auferir uma renda real e effectiva de 173 contos por anno: basta para isso que entregue essa quantia em qualquer banco, que receba depositos a 5 por cento, com a declaração expressa de que fica collocada a juros compostos durante dois seculos, porque logo que ouça uma tal declaração começará o banco I servir ao depositante, não uns modestos 100$000 réis por anno, mas 173 contos de réis, que continuará a pagar religiosamente a elle e aos seus successores durante duzentos annos.

Isto é absurdo, não é verdade? (Apoiados.)

Pois é o resultado rigoroso a que conduz o methodo de calculo do sr. relator, applicado ao caso que eu figurei e em que suppuz propositadamente um periodo bastante longo, para melhor fazer comprehender a incorrecção de tal methodo.

Assim é que o sr. Pedro Victor, querendo achar a media annual das quantias que o estado receberá a mais do monopolio, comparado com a régie, vão dividir por 17 não a somma dos saldos annuaes em favor do estado, contados anno a anno, como faria qualquer mortal, mas a somma d'esses saldos, com os seus juros accumulados até ao fim. da concessão, como se não devessem ser recebidos senão n'essa epocha, e achando 1:000 para quociente, vem dizer-nos muito ancho: logo, o estado receberá 1:000 contos de réis a mais em cada anno. (Riso.)

Se estivesse presente o sr. Fuschini, repetir-lhe-ía o Solatium est miseris socios habere penates, com a devida vénia do sr. relator, que por ser pontifice tambem fallou em latim. (Riso.)

A columna que o sr. Pedro Victor devia ter tomado para calcular o beneficio medio annual, que, segundo o seu proprio mappa, o estado auferiria a mais do monopolio, não era a ultima, mas a ante-penultima, e então já o resultado numerico seria muito diffcrcnte, como vamos ver.

A columna B-A mostra nos que o estado recebe a mais durante a concessão a somma de 13:889 contos de réis, a qual dividida pelo numero 17, que s. exa. toma para divisor, corresponde á media annual de 817 contos. Mas o estado, no fim da, concessão entrega ao arrematante a quantia de 4:700 contos de réis, que equivale, ao juro de 5 por cento, a uma renda annual de 182 contos durante os referidos dezesete annos. Logo, do proprio mappa do sr. relator se deduz que, na hypothese do consumo constante, e dadas as bases que s. exa. tomou, o rendimento que o estado tiraria a mais do monopolio seria sómente de 635 contos de réis, approximadamente, e não de 1:000, como s. exa. affirmou gratuitamente, praticando logo um primeiro erro em favor da sua argumentação, de 365 contos. Mas vamos agora á hypothese e bases que s. exa. adoptou para organisar a metade do mappa a que me estou referindo. Se o illustre deputado se mostrou tão pouco cauteloso nas proprias deducções arithmeticas do seu mappa que a todos são faceis de verificar, que confiança podem merecer a hypothese e bases que s. exa. tomou?

A hypothese fundamental de ser constante o consumo, durante dezeseis annos, briga, como mais tarde demonstrarei, com os resultados estatisticos deduzidos das aliando-

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gas do reino, qualquer que soja o periodo, largo ou curto que se considere, e com a lei da progressão do consumo em todos os paizes estrangeiros e sobretudo n'aquelles que, como o nosso, têem ainda uma capitação muito baixa

Examinemos agora a base adoptada com respeito ao rendimento liquido da régie no anno de 1889-1890, que e sr. relator lixou em 3:246 contos de réis.

S. exa. teve a bondade de me communicar, a meu pedido, o calculo relativo a este rendimento, que é o seguinte

Previsão 1889-1890

Régie .... 3:052 contos
Estado .... 3:246 contos

«Na régie resolveu-se como o unico processo economico possivel licenciar com 2/3 do ordenado medio ou 460 réis em media, todo o pessoal sobresalente para igualar a producção ao consumo. Dos 4:503 operarios existentes é preciso licenciar uns 1:050 para obter este resultado.

«Suppondo que se tinha introduzido esse melhoramento desde o principio do anno economico de 1889-1890;

«A previsão para os lucros liquidos realisados e approximadamente exactos, seria:

«Producto bruto de 1.001.465k,457 a 3$326 réis vendidos no semestre .... 3.331:162$070
«Rendimento de propriedade .... 1:771$856
3.332:933$926

«Materia prima - tabaco, a 301,8 .... 302:242$275
«Mão de obra, a 438,4 .... 434:035$110
«Commissão .... 508:504$277
«Juros e descontos .... 51:546$097
«Despezas geraes .... 93:454$005
«Officinas subsidiarias .... 10:000$000
«Tabacos de exportação .... 10:321$913
«Impostos atrasados .... 552$107
«Despezas eventuaes .... 289$125
«Encargos da administração - inspecção .... 4:751$106
«Legado de Paulo Cordeiro a empregados .... 1.865$283
«Legado de Paulo Cordeiro a operarios .... 13:006$185
«Addidos .... 2:697$000
«1050x150ax460 .... 72:450$000

«Bonus ao tabaco do Douro .... 6:579$102
101:348$676
«Saude e beneficencia .... 21:519$027
«Amortisações - deterioração e quebra .... 272:155$193
1.806:667$805

«Régie:

«Liquido por semestre .... 1.526:266$121
«Tabacos estrangeiros .... 96:935$429
«Liquido total para o estado .... 1.623:201$550

Notarei, muito de passagem, a impropriedade com que o sr. Pedro Victor toma, exclusivamente, os elementos referentes ao segundo semestre de 1889, para sobre elles basear todos os seus calculos relativos ao rendimento da régie no anno economico de 1889-1890, quando na administração geral dos tabacos se conhece já o valor de grande parte desses elementos, referido não sómente a metade deste anno economico, mas a todo elle.

Observarei tambem muito de leve que se não sabe qual é a proveniencia d'esta nota. Foi fornecida pela régie? Foi concebida pelo sr. relator? Que authenticidade, que valor legal se lhe póde attribuir?

Tão pouco me demorarei na critica d'aquella somma de 97 contos de réis, em que são computados os direitos sobre tabacos estrangeiros durante um semestre, somma que seria exaggerada se se referisse aos direitos antigos, mas que é diminuta se, como parece, incluo o augmento ultimamente decretado.

Sómente sobre uma das verbas d'esta nota desejo chamar insistentemente a attenção de v. exa. e da camara. Refiro-me a estes 272 contos de réis que apparecem no fim sob o titulo de amortisações, deteriorações e quebras.

Amortisações de que?

O sr. Pedro Victor: - Ainortisação do capital perdido para a régie.

O Orador: - Agora ficámos sabendo, visto que a nota o não dizia, que se trata do supposto capital perdido, que tem sido o objecto das lamentações do sr. ministro da fazenda.

E, como o tal capital perdido, no dizer da commissão, é, segundo esta, de 4:520 contos de réis, eu supponho que, d'aquelles 273 contos, são 254 approximadamente destinados á amortisação do referido capital.

É necessario, portanto, que a camara saiba, e para alguma cousa serviu a minha insistencia em obter do sr. relator esta nota, que, alem dos 3:246 contos de réis, que, segundo o mappa da commissão, o estado auferirá da régie no anno de 1889-1890, ainda ha mais 254 contos que, apesar de supprimidos no mappa e muito bem escondidos na nota, tambem entrarão nos cofres publicos, sob o titulo do amortisações.

Verdade seja que o total assim recebido pelo estado, na importancia de 3:500 contos de réis, ainda está longe dos 3:800 contos de que fallava o sr. ministro no seu relatorio e de que tambem fallou no seu discurso. Mas não é este o unico ponto em que ministro e commissão mostram completo desaccordo. (Apoiados.)

Que fundamento ha, porém, para deduzir, dos lucros liquidos industriaes da régie, 254 contos de réis para amortisação do capital perdido, como quer o sr. relator da commissão de fazenda, ou 432 contos para juro e amortisação dos 7:200 contos gastos na expropriação das fabricas, como quer o sr. Pinheiro Chagas, presidente d'essa commissão, ou ainda 400 contos para o mesmo fim, como quer o sr. ministro da fazenda no seu relatorio?

Se se tratasse de apreciar em absoluto qual é o rendimento definitivo que o estado aufere da régie, claro é que se deveriam deduzir dos seus lucros liquidos industriaes, não 254, nem 432, nem 400 contos, como quer cada um dos mencionados cavalheiros, mas 405:416$595 réis, porque a tanto montam os encargos de juro e amortisação dos 7:200 contos auctorisados por emquanto para a expropriação das fabricas.

Mas desde que o que se pretende é comparar, sob o ponto de vista dos redditos para o estado, o systema da régie com o do monopolio, não só póde fazer tal deducção nos lucros liquidos da régie, sem a fazer tambem e por igual quantia na renda fixa do monopolio, visto que se descreve como uma das principaes vantagens deste ultimo regimen o supprimento de 7:200 contos que o arrematante entregará immediatamente ao governo.

Querer, porém, contar simultaneamente no activo do monopolio, permitta-se-me a expressão, o beneficio que para o estado resulta do recebimento de prompto destes 7:200 contos, e no passivo da régie o encargo do 405 contos, que e a parte correspondente a 7:200 contos na operação realisada em 13 de agosto de 1888, é falsear a comparação que se pretende levar a effeito, porque é fazer figurar duas vezes, em favor do monopolio, a mesma e única vantagem.

Assim como para comparar quebrados é necessario reduzil-os ao mesmo denominador, assim tambem para comparar a régie com o monopolio é mister reduzir estes dois systemas aos mesmos termos, Quer conservemos o primei-

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to, quer passemos para o segundo, o encargo actual do 405 contos, para juro e amortisação da parte correspondente na operação de 1888, ha do sempre subsistir; logo a unica vantagem, n'este ponto, do monopolio sobre a régie está nos 7:200 contos que o arrematante entrega ao estado no começo da concessão.

Se estes 7:200 contos fossem destinados a saldar a parte correspondente do emprestimo de 1888, hypothese que não corresponde de certo á realidade dos factos, mas que póde admittir-se sob o ponto de vista mathematico, então estariamos auctorisados, na comparação entre os dois systemas, a deduzir dos lucros liquidos da régie, os 405 contos de encargos actuaes, sem fazer outro tanto com respeito á renda fixa do monopolio; mas neste caso não poderíamos contar entre as vantagens d'este ultimo regimen a do recebimento immediato de 7:200 contos, visto que esta quantia, entregue pelo arrematante, seria applicada precisamente na suppressão, para o caso do monopolio, d'aquelle encargo de 405 contos, o que, como se vê, vem tudo a dar na mesma.

Insisti n'este ponto, porque ácerca delle tem havido singular equivoco e confusão, tanto por parte do sr. ministro da fazenda, como por parte dos oradores da maioria e até do proprio relator, (Apoiados.) que fazem sempre, consciente ou inconscientemente, com que figure duas vezes em prol do regimen do monopolio aquella quantia de 7:200 contos de réis que o estado recebe no começo da concessão. (Apoiados.)

Examinarei agora a segunda base adoptada pelo sr. relator para calcular os números inscriptos na columna do seu mappa intitulada «diminuição de encargos».

Disse s. exa., quando respondeu ao sr. Fuschini, que as baixas no pessoal da regie subiam annualmente a 4,73 por cento, sendo 2,60 por cento de fallecimentos e 2,13 por cento de reformas.

Interrompi, n'esse momento, o illustre relator para lhe perguntar em que estatistica se fundava e s. exa. teve a bondade de responder-me immediatamente que tomara uma estatística de quatro mezes.

Quatro mezes! Mas para que se contentou s. exa. com o periodo de quatro mezes, quando poderia considerar um anno inteiro?

O sr. Pedro Victor: - Eu pedi á administração geral dos tabacos os elementos que houvesse sobre este assumpto e só me forneceram os que dizem respeito aos mezes de janeiro a abril do anno em que estamos.

O Orador: - É porque provavelmente v. exa. pediu esses elementos já ha tempo, talvez ainda antes de findar o ultimo anno economico.

Mas se o illustre relator obteve, como diz, a nota do pessoal existente era fins de abril deste anno, podia ter deduzido a percentagem das baixas de dez mezes de exercício, porque no relatório da administração encontraria a nota do pessoal em 30 de junho de 1880. (Apoiados.)

Pois o espirito de s. exa., habituado a estudar questões desta natureza, contentou-se com uma estatistica de quatro mezes apenas, para d'ahi deduzir a lei da reducção do pessoal da regie, que já funcciona ha mais de dois annos?

Melhor fôra então recorrer ás estatisticas estrangeiras da mesma industria ou fundar-se sobre as tábuas de mortalidade, mais ou menos applicaveis ao caso, do que tomar como base scientifica a que se deduzia de quatro mezes apenas do exercicio.

A verdade é que a régie já dispõe dos elementos necessarios para se determinar exactamente o numero de baixas no anno completo de 1889-1890, porque conhece, como era de prever, o pessoal existente em 30 de junho de 1890.

O numero total de baixas, na classe dos tarefeiros, durante o anno de 1889-1890 foi de 371 ou de 7,8 por cento, e não sómente de 4,73 por cento, como affirmou o sr. relator, e, deduzindo as reformas, que não representam a suppressão immediata o completa dos respectivos salarios, e montam a 4,6 por cento e não 2,13 por cento, como disse s. exa., fica a percentagem das baixas effectivas reduzida a 3,2 por cento, em vez do 2,6 por cento, como suppoz.

A mesma reducção effectiva de 3,2 por cento se deu, como mais tarde demonstrarei, no quadro do pessoal de empregados e jornaleiros.

O sr. Pedro Victor: - V. exa. diz-me que influencia tem esse erro nas minhas conclusões.

O Orador: - Não fiz o calculo rigoroso, nem o poderia fazer, porque ignoro como foi que s. exa. conduziu o seu.

Por emquanto basta-me demonstrar que as bases, de que partiu o illustre relator, são falsas.

O sr. Pedro Victor: - Mas então que resultados obteve v. exa.?

O Orador: - Lá chegaremos com tempo e paciencia.

Entretanto vou insistindo em que s. exa., por se basear numa estatistica de quatro mezes apenas, tomou um numero deficiente para representar a percentagem das baixas em um anno completo; e vou tambem observando que a taxa da mortalidade cresce progressivamente de anno para anno, em vez de se conservar constante, como s. exa. suppoz, quando se considera um grupo de determinados individuos, sobretudo se, como acontece aos operários dos tabacos, exercem uma industria insalubre.

(Interrupção do sr. Pedro Victor.)

Eu fiz os meus calculos por outro processo mais simples, desembaraçando-os de todas as complicações com que v. exa. baralhou e confundiu os seus. Logo os exporei á camara.

Agora o que eu de modo algum suppunha é que tinha obrigação de reformar os cálculos do illustre relator, só para satisfazer a sua curiosidade. Mas já que tanto aperta, sempre observarei grosso modo que be s. exa., partindo da percentagem de baixas de 2,6 por cento, obteve, para a diminuição de encargos, durante os dezeseis annos da concessão, uma media de 214 contos de réis, como se deduz facilmente do seu mappa, póde admittir-se, por approximação, que teria obtido a media de

[Ver fórmula na imagem]

ou 263 contos de réis se tivesse partido da verdadeira percentagem, que é de 3,2 por cento, havendo, por este motivo, um erro no seu mappa de cerca de 49 contos em prejuizo da régie.

O que é necessario frisar bem é o facto de se apresentar ao parlamento um projecto de lei d'esta importancia, sem ser devidamente fundamentado, e vir depois o sr. relator fazer um estendal de calculos, impossiveis de apreciar n'uma simples exposição oral, mas que agora se reconhece estarem errados, graças á minha curiosidade de lhos pedir para os poder examinar. (Apoiados.)

E é com taes processos que se desacredita a régie e se prepara um excellente negocio para o futuro arrematante! (Apoiados.)

Mas não param aqui os erros e omissões.

O sr. relator calculou em 4:370 contos de réis, como se vê na columna B do seu mappa, o rendimento fixo que o estado auferirá do monopolio, porque, á renda de 4:250 contos, paga pelo arrematante, acrescentou 40 contos dos direitos nas ilhas e 80 contos do imposto de licença; mas esqueceu-se s. exa. das despezas que, dado esse regimen, terá o estado de fazer com a metade das gratificações pelas tomadias de tabacos, com o subsidio para a caixa de reformas, com as operações de seccagem e fermentação dos tabacos do Douro e com o serviço da inspecção, despezas que, como logo provarei, montam a cerca de 33 contos de réis por anno.

Finalmente tambem s. exa. se esqueceu de attender a que a concessão que só faz ao monopolista de supprimir o bonus commercial representa uma economia de 291 contos, que tambem a régie poderia realisar se lhe dessem igual faculdade.

Em conclusão vê-se que o tal beneficio de 1:000 contos

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do monopolio sobre a régie, já reduzido, pela correcção do lapso arithmetico do sr. relator, a contos .... 635

Teria de soffrer as seguintes deducções:

1.° Quantia destinada indevidamente a amortisações .... 254
2.° Erro devido á insufficiencia da percentagem das baixas .... 49
3.° Suppressão do bonus commercial .... 291
4.° Encargos com que fica o governo, no caso do monopolio .... 33
627
8

E se se notar que no calculo do rendimento das alfandegas praticou o sr. relator um erro, por deficiencia, superior a 8 contos de réis, reconhece-se assim que o tal beneficio de 1:000 contos do monopolio se evaporou pouco a pouco, isto mesmo na hypothese absurda de se conservar constante o consumo durante dezeseis annos, apesar de não se elevar o preço dos tabacos; isto mesmo sujjpondo que o arrematante será bastante ingénuo, como admittiu o sr. relator, para vender pelos preços actuaes as 1:500 toneladas de tabacos que o estado tem de lhe comprar no fim da concessão; isto mesmo tomando por base o calculo arbitrario e deficiente do rendimento liquido do anno economico de 1889-1890, fundado apenas nos elementos relativos á primeira metade d'este anno, e ainda assim interpretados ao sabor do sr. relator. (Apoiados.)

Occupemo-nos agora da segunda parte do mappa do sr. relator, onde s. exa. figurou a hypothese do consumo augmentar de 1,63 por conto em cada anno.

Disse s. exa., ao expor os seus calculos perante a camara, que tomara esta percentagem na estatistica dos ultimos dezoito annos da régie franceza, e, desejando eu evitar qualquer equivoco, interrompi n'esse momento o illustre relator para lhe perguntar se era, com effeito, aos ultimos dezoito annos que se referia a estatistica que lhe servira de base, e s. exa. promptamente confirmou a sua primeira declaração.

A rasão da minha insistencia é tão facil de perceber, como difficil é de explicar a affirmação do illustre relator.

É que, referindo-se ao anno do 1880 o ultimo relatorio da régie franceza, comprehende-se no periodo de dezoito annos, tomado para base das apreciações de s. exa., o anno de 1871, em que a França hoffreu uma relacção consideravel na sua área e população, e, portanto, no sen consumo. Então o illustre relator entende que póde comparar cegamente os numeros referentes ans annos de 1868 e 1886 sem querer saber se neste intervallo Decorreu algum acontecimento notavel que influa poderosamente na lei que pretende deduzir da estatistica? (Apoiados.)

Alem d'isso o que é que s. exa. foi buscar á régie franceza? Foi o augmento do consumo, ou o augmento do rendimento liquido?

A julgar pelos dizeres do seu mappa, parece que o illustre relator parte da hypothese que e o consumo, que augmenta de 1,63 por cento; mas a julgar pelas cifras n'elle inscriptas é o rendimento liquido que s. exa. faz crescer nessa proporção, como se o rendimento liquido devesse necessariamente ser proporcional ao consumo, o que está longe da verdade.

Para fixar as idéas e ver se desembrulho esta meada, vou reunir e comparar alguns elementos deduzidos do ultimo relatório da régie franceza, referente, como tenho dito, ao anno de 1886.

[Ver tabela na imagem]

Reconhece-se, portanto, que no periodo que o sr. relator considerou, de 1868 a 1886, nem o consumo total, nem o rendimento liquido cresceram de 1,03 por cento como s. exa. gratuitamente affirmou com ares dogmáticos, procurando assim convencer a camara.

O consumo augmentou apenas de 0,59 por cento, mas o rendimento liquido augmentou de 3,19 por cento. Basta attentar na grande discordancia entre estas duas percentagens para desde logo se reconhecer a impropriedade com que se faz começar num anno anterior ao de 1871 o periodo de que se quer deduzir a lei da variação.

Se tomarmos, como é justo, para ponto de partida o anno de 1872, em que póde dizer-se que a França já estava restabelecida das graves perturbações que lhe causou a guerra com a Allemanha, reconheceremos que o consumo total nos quatorze annos decorridos até 1886 augmentou de 2,38 por cento em cada anno, e o rendimento liquido de 2,63 por cento.

Era o primeiro d'estes dois numeros e não o de 1,63 que devia ter tomado o illustre relator se queria basear-se, como disse, nos resultados da regie franceza. A progressão que eu adoptei nos meus calculos foi, como logo direi, de 2,40 por cento, porque, n'este ponto, a estatistica franceza coincide perfeitamente com a nossa.

Mas não só á segunda hypothese, formulada pelo sr. Pedro Victor, falha, como acabo de demonstrar, o proprio fundamento que s. exa. lhe dera, como tambem é certo que a segunda parte do seu mappa, que se refere a essa hypothese, padece dos mesmos erros do que a primeira, no que respeita ás bases adoptadas.

Alem d'isso nas conclusões tiradas dessa parte do mappa, equivocou-se outra vez o sr. relator, tomando a ultima columna, em vez da antepenultima, para calcular em cerca de 900 contos de réis o beneficio que o estado retirará do monopolio comparado com a regia, quando é incontestavel que, feitas as rectificações dos erros e omissões mais grosseiros, só converteria immediatamente esse beneficio n'um prejuizo de uma centena de contos de ruis, pela mesma rasão porque na primeira hypothese se reduziu a zero o supposto beneficio do cerca de 1:000 contes. (Apoiados.)

O illustre relator ainda nos annunciou que nos casos do consumo augmentar de 3 ou 5 por cento, o beneficio do monopolio para o estado seria de 621 ou 300 contos de réis respectivamente.

Finalmente, tambem nos disse que havia estudado a hypothese da elevação dos preços até 20 por cento.

Mas d'estes ultimos trabalhos não se dignou s. exa. dar-me conhecimento e por isso mo é impossível aprecial-os.

Estou, porém, auctorisado a suppor que foram feitos com o mesmo escrupulo do que aquelles de que tive communicação e a que venho de referir-me largamente.

Vou agora, sr. presidente, expor o methodo que eu entendo que se deve seguir na apreciação d'esta operação financeira, que estamos discutindo, e hei de procurar tornar-me tão claro e perceptivel quanto em mim caiba.

Para este effeito arredarei todas as hypotheses e considerações estranhas á comparação que só pretende realisar, e assim evitarei a confusão do trabalho do sr. relator, que, enxertando umas cousas nas outras, chega a conclusões que ninguem percebe.

A primeira questão a resolver, independentemente de todas as outras, é a de saber quaes seriam realmente os

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lucros líquidos annuaes da regie se lhe dessem as mesmas vantagens e concessões que ao arrematante vão ser conferidas, e quaes serão os rendimentos que o estado retirará annualmente do projectado monopolio.

Feita esta comparação teremos depois, e só depois, de entrar em linha de conta com as quantias que o estado recebe do monopolista no começo da concessão e com as que lhe paga no fim.

Para resolver aquella primeira questão é indispensável assentar numas certas bases, das quaes a mais importante se refere á determinação dos lucros liquidos no anno de 1888-1889, não dos lucros líquidos escripturados, porque esses são conhecidos de todos, mas dos lucros líquidos que a régie teria realisado nesse anno se não se houvessem dado circumstancias extraordinárias e excepcionaes que não mais se repetirão nos annos seguintes.

É por este estudo que eu vou começar o meu trabalho.

Os lucros liquidos escripturados nos treze mezes decorridos desde 30 de maio de 1888 até 30 de junho de 1889, segundo o respectivo balanço, publicado a pag. 166 e 167 do relatorio do conselho de administração geral dos tabacos, referente á gerencia de 1888-1889, foram de réis 3.875:190$153.

Realisaram-se estes lucros apesar de serem muito elevadas, por motivos estranhos áquella administração, a quota da materia prima em tabacos de toda a espécie, a quota das despezas de fabrico e até a quota da venda.

Para se ver quanto esta asserção é verdadeira, basta comparar a importancia d'estas quotas, na nossa gerencia de treze mezes de 3888-1889, com a que tiveram em França, no anno do 1886, a que se refere o ultimo relatorio, que tenho presente, da régie dos tabacos n'este paiz.

Achâmos assim:

[Ver tabela na imagem]

Ora 1$606 é 2,96, ou cerca de tres vezes maior que 542.

No que respeita á materia prima é facil explicar a causa a que se deveu o seu grande custo.

No primeiro periodo d'esta gerencia, isto é, de 30 de maio a 31 de dezembro de 1888, estiveram-se consumindo os depositos de tabaco em rama recebidos das emprezas expropriadas, pelos preços marcados nos respectivos inventarios, que eram muito superiores aos do mercado.

As quantidades o os preços do tabaco em rama recebido das diversas emprezas foram as seguintes:

[Ver tabela na imagem]

O que equivale ao preço médio de 452,8 réis, entretanto que no segundo periodo da gerencia, isto é, no primeiro semestre de 1889, foi o preço apenas de 351,3 réis. O excesso de preço de 101,5 réis applicado á referida quantidade de 937:973,103 kilogrammas dá uma despeza a mais de 95:204$270 réis.

Alem d'isso, pela expropriação, adquiriram-se quantidades enormes de tabacos manipulados, sem relação com as necessidades, nem com as reclamações do consumo, e que ou se haviam de destruir ou se haviam de refabricar.

Refabricaram-se; mas d'ahi resultou que cerca de 58 toneladas de tabacos manipulados que, apesar de haverem sido adquiridos ao preço de 4#890 réis por kilogramma, eram invendaveis e constituiam pejamento nos depositos, foram reduzidos á condição de materia prima, ficando por isso o seu valor fabril igual tão sómente á media do preço da rama, que foi, como disse, de 351,3 réis no primeiro semestre de 1889.

O prejuízo foi de 4$890-351,3 ou 4$538,7 por kilogramma, e, portanto, para 58 toneladas, de .... 263:244$600
É verdade, porém, que no valor destruido, pelo facto do refabrico destas 08 toneladas, figuram os respectivos direitos aduaneiros que têem verba especial no activo do balanço sob titulo de encargos de tabacos expropriados. Esses direitos devem ter sido de 58:000 kilogr.x1$740 réis ou .... 100:920$000
Diferença .... 162:324$600

Os recambios feitos pelos compradores, n'este exercicio, montaram a 32:850k,175 e deram logar á perda do respectivo valor de fabrico ou 32:850k,175x487 réis ou 15:998$030 réis.

Vemos, portanto, que a producção foi onerada com os seguintes encargos:

Excesso de preço do tabaco emrama, recebido das fabricas .... 95:204$270
Refabrico de 58 toneladas de tabaco manipulado, idem .... 162:324$600
Recambio de 32:850k,175 de tabaco manipulado .... 15:998$035
273:526$905

Do excesso nas despezas de fabrico e nos encargos de venda me occuparei mais tarde porque, como veremos, só gradualmente podem reduzir-se a justos limites. No que toca, porém, a este excesso de 273:526$905 réis foi elle devido a circumstancias excepcionaes que umas, as que se referem ao processo adoptado na expropriação das antigas emprezas, não mais se repetirão nos annos seguintes, entretanto que outras, as que respeitam aos recambios feitos pelos compradores, tambem de futuro desapparecerão, visto que pelo artigo 95.° do regulamento organico dos serviços da administração geral dos tabacos, de 20 de dezembro de 1888, foram muito judiciosamente abolidos os recambies a partir de 31 de dezembro de 1889.

Assim, pois, se não fossem estas circumstancias extraordinarias que representaram, como vimos, um prejuízo de .... 273:526$905
os lucros liquidos escripturados de .... 3.875:190$153
ter-se-íam elevado a .... 4.148:717$058

Mas ha tambem uma correcção subtractiva a fazer.

Nos lucros liquidos de 1888-1889 figura o saldo dos lucros da companhia nacional, correspondentes aos cinco primeiros mezes de 1888, na importancia
de .... 456:228$044
Em compensação abonaram-se juros aos accionistas dessa companhia a rasão de 6 por cento ao anno sobre o valor arbitrado ás acções pelo periodo decorrido, des-

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1394 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

de o principio do anno de 1888 até á data do resgate, na importância de .... 327:522$651
Differença .... 128:705$393
a qual deduzida dos lucros acima calculados .... 4.148:717$058
dá para lucros liquidos em treze mezes .... 4.020:011$665

Ora as vendas, liquidas de recambios, foram:

Em junho de 1888 de .... 138:861k,831
E no anno economico de 1888-1889 de .... 1.842:479k,149
1.981:340k,980

Dividindo aquelles lucros liquides de réis 4.020:011$665 em duas parcellas proporcionaes ás vendas liquidas de recambios, n'estes dois periodos, achâmos que a parte dos lucros liquidos correspondente ao anno de 1888-1889 é de .... 3.738:270$000

E acrescentando o rendimento das alfandegas, calculado, a paginas 24 do relatorio do sr. ministro da fazenda, em .... 131$768$302

Seria o rendimento total dos tabacos no anno de 1888-1889 do .... 3.870:038$302

se não fossem as circumstancias excepcionaes a, que me tenho referido.

A este rendimento liquido total rectificado de 3:870 contos de réis corresponde o rendimento por kilogramma de 9:870 ou 2$100 réis, que servirá de base a todos
1:842
os calculos de rendimentos futuros que dentro em breve apresentarei á camara.

Occorre, porém, antes de ir mais longe examinar se da escripturação do anno de 1889-1890, embora incompleta, não póde deduzir-se desde já a confirmação ou infirmacão do resultado que apurámos para o anno de 1888-1889.

É o que eu vou fazer, procurando em primeiro logar as quantidades, liquidas de recambies, dos tabacos vendidos nesses dois annos, determinando em seguida proporcionalmente quaes deveriam ser os lucros liquidos no anno de 1889-1890 e indagando por fim se esses lucros se terão de facto realisado ou não n'este ultimo anno.

Quanto ás vendas compendiei-as no quadro seguinte, composto, no que respeita ao anno de 1889-1890, com os elementos que me foram obsequiosamente fornecidos pela administração geral dos tabacos, e no que se refere ao anno de 1888-1889, com os números deduzidos do mappa publicado a paginas 122 e 123 do relatório da mesma administração.

[Ver tabela na imagem]

[Ver tabela na imagem]

(f) A diminuição no producto medio do tabaco entregue ao consumo em 1889-1890, bem como no preço medio pago pelo consumo, explica se pela maior venda na zona fiscal, Açores e ultramar, onde o preço do tabaco é inferior.

Basta lançar um rapido olhar sobre esto quadro para desde logo se reconhecer quão mal informado estava o sr. relator da commissão, quando em sessão de 12 do corrente veiu affirmar á camara que a venda ordinaria no anno de 1889-1890 fora inferior em 21 contos déreis á de 1888-1889.

Segundo creio, s. exa. argumentou exclusivamente com os elementos relativos ao segundo semestre de 1889, sem se dar ao incommodo de tomar tambem os que se referem ao primeiro semestre de 1890. Alem d'isso parece ter-se esquecido que a tora a venda ordinária houve, a partir de agosto de 1889, a venda official que em 1888-1889 ainda não existia.

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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1395

Como quer que seja, o que não padece a menor duvida é que só a venda ordinaria no continente, attendendo á venda official, augmentou de um anno para o outro de 22 toneladas e 63 contos de réis, e a venda total, liquida de recambios e descontos, augmentou de 145 toneladas e 160 contos de réis.

Deduzindo do quadro anterior só o que respeita às quantidades vendidas, que arredondarei em toneladas, teremos:

[Ver tabela na imagem]

Os lucros liquidos totaes em 1888-1889 teriam sido, como affirmei, de 3:870 contos de réis, e, portanto, os lucros liquidos, por kilogramma, de 3:870
1:842
ou 2$100 réis, se não fossem as circumstancias excepcionaes que n'esse anno vieram onerar o preço fabril.

Se as condições de fabrico e de venda tivessem sido no anno de 1889-1890 as mesmas que no anno anterior, haveria um meio fácil de saber se aquella relação deduzida do anno de 1888-1889, era ou não exacta. Bastaria para isso applical-a á quantidade de tabacos vendidos realmente no anno de 1889-1890, o que daria 2$100x1:987 ou 4:175 contos de réis, e verificar depois se os lucros liquidos no referido anno se approximam d'esta quantia.

Mas, na verdade, aquella quantia do 4:175 contos, calculada proporcionalmente, tem de soffrer duas correcções, uma additiva, porque, tendo baixado o preço da matéria prima e diminuído o numero de operarios, o preço fabril em 1889-1890 deve ter sido inferior ao do anno anterior, outra subtractiva, porque tendo augmentado o consumo na zona fiscal, nos Açores e no ultramar, onde o tabaco é vendido por menor preço, baixou o producto medio do kilogramma entregue ao consumo de 2$935 réis a 2$805 réis, como o demonstra o quadro a que já me referi e que será publicado com o meu discurso.

Ora estas duas correcções teem approximadamente a mesma importancia; logo, se a relação, deduzida do anno de 1888-1889, entre os lucros liquidos e as vendas liquidas, é verdadeira, devemos encontrar no anno de 1889-1890 lucros líquidos equivalentes á quantia de 4:175 contos, acima calculada.

É exactamente o que a escripturação d'este ultimo anno, embora incompleta, parece confirmar.

Effectivamente não estão ainda apurados os lucros líquidos do anno de 1889-1890, mas sabe-se quaes foram as quantias que o estado recebeu da régie durante este anno; e, como no exercicio anterior as entregas haviam excedido os lucros liquidos em 92:409$941 réis, e não é, portanto, provavel que no ultimo anno tenha havido tambem excesso das entregas sobre os lucros liquidos, podemos approximadamente considerar estes como iguaes áquellas.

Teremos, pois:

Entregas feitas ao thesouro até 30 de junho de 1890 .... 3.508:702$268
Rendimento das alfandegas de julho de 1889 a fevereiro de 1890 (relatorio de fazenda, paginas 24) .... 101: 649$947
Calculando que nos restantes quatro mezes de março a junho o rendimento cobrado nas alfandegas tenha sido proporcional .... 50:824$973
E que por conta d'este anno economico se escripturarão, como se fez em relação ao anterior, não 300:000$000 réis, como se diz no relatorio de fazenda, mas apenas 150:000$000 réis, conforme a emenda feita pelo sr. ministro num aparte com que interrompeu o discurso do sr. Emygdio Navarro .... 150:000$000
Somma .... 3.811:177$188

Mas ha compensações a fazer n'esta somma.

A primeira resulta da comparação dos dinheiros em caixa e dos saldos de dividas por tabacos em 30 de junho de 1889 e em 31 de maio de 1890, não podendo em vez d'esta ultima data tomar-se, como mais convinha, a de 30 de junho de 1890, porque ainda não está fechada a escripturação relativa a este ultimo mez.

Temos, portanto, em 30 de junho de 1889:

1.° Letras a receber .... 304:499$251
Remessas .... 16:764$788
Letras em cobrança no Porto .... 1:828$030
383:092$069
2.° Compradores de tabacos, conta corrente .... 574:929$664
3.° Contas em liquidação .... 44:075$487
4.° Caixa .... 7:537$973
1.009:635$193

E em 31 de maio de 1890:

1.° Letras a receber .... 371:559$081
2.° Compradores de tabaco, conta corrente .... 220:926$977
3.° Contas em liquidação .... 218:368$819
4.° Recebedores .... 36:855$747
5º Caixa .... 5:082$581
852:793$205
A menos em 31 de maio de 1890 .... 156:841$988

A segunda compensação refere-se ás consignações de tabacos nas recebedorias que em 30 de junho de 1889 ainda não existiam, e que em 31 de maio de 1890 se elevavam a 100:669$897 réis, sendo o tabaco computado pelo preço de venda. Tomando, porém, sómente o custo do fabrico ou 32 por cento desta quantia, teremos a mais, em 31 de maio de 1890, réis 32:214$367.

A terceira compensação respeita aos stocks comparados do 30 de junho de 1889 e 30 de junho de 1890.

Temos:

A) Tabacos manipulados nos depósitos de Lisboa o Porto:

Em 30 de junho de 1889, 369:082k,908 .... 1.403:812$870
Em 30 de junho de 1890, 451:301k,935 .... 1:883:272$745
Differença .... 479:459$875

Mas os tabacos figuram nos depositos pelo preço de venda; tomando, porém, sómente o custo do fabrico ou 32 por cento d'esta quantia, vem:

a mais em 30 de junho de 1890 .... 153:427$160

B) Tabacos e outros generos nos armazens geraes (alfandegas):

Em 30 de junho de 1889 .... 295:995$756
Em 30 de junho de 1890 .... 634:940$583

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1396 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A mais em 30 de junho de 1890 .... 333:944$827

C) Tabacos em rama e paioes nas officinas:

Em 30 de junho de 1889 .... 698:053k,614
Em 30 de junho de 1990 .... 873:114k,007
Differença .... 175:060k,393

E admittindo o preço de 300 réis por kilogramma, vem a mais em 30 de junho de 1890 .... 52:518$188

Logo, a mais nos stocks em 30 de junho de 1890 .... 544:890$105

Assim, resumindo, teremos:

Lucros calculados como acima .... 3.811:177$188

Compensações:

A deduzir:

Reducção no dinheiro em caixa, e nos saldos de dividas por tabacos .... 156:841$988
3.654:335$200

A augmentar:

Consignações de tabacos ..... 32:214$367
Stocks comparados .... 544:980$105
Os lucros escripturados em 1889-1890 devem ser, pois, de cerca de .... 4.231:439$672
Mas para tornarmos estes lucros líquidos homogéneos com os de 3.870:038$302 réis, calculados para 1888-1889, a fim de poderem comparar-se entro si, e necessario ainda attender a que, tendo os recambios cessado sómente em 31 de dezembro de 1889, elevaram-se ainda em 1889-1890 a 13.402k,223, o que representa um prejuizo de 13:402k,223x487 ou .... 6:526$883
Os lucros líquidos, se níio tivesse havido recambios, seriam pois de .... 4.237:966$555

Basta examinar estes números para desde logo se comprehender a imprudencia com que o sr. ministro da fazenda vae alienar, por dezeseis annos, a primeira receita do estado, de sua natureza progressiva, para obter uma renda annual fixa que não excede sensivelmente o que já, hoje produz a régie. (Apoiados.)

É verdade que s. exa. inventou uma nova theoria de escripturação industrial. O augmento nos stocks de 30 de junho de 1890, comparados com os de igual data do anno anterior, não devo na opinião de s. exa. ser considerado para o calculo dos lucros liquidos de 1889-1890. Isto é uma descoberta originalissima. (Apoiados.)

Disse s. exa. que o maior abastecimento dos depositos só prova que a producção excedeu o consumo, e que aquillo que se apresenta com uma vantagem não e senão um grave inconveniente.

Nada d'isto é exacto. (Apoiados.)

A régie que se administra sem capital circulante, não pôde, logo a principio, abastecer os seus depositos de materia prima e tabacos manufacturados, nem tão pouco estabelecer os seus paioes de rapé. Nas arrematações successivas de 26 de dezembro de 1888 e de 9 de janeiro, 9 de fevereiro e 9 de abril de 1889, adquiriu apenas 1:744 toneladas de tabacos em rama, isto é, menos do que o que se consumiu durante o anno de 1889 para que essas arrematações eram destinadas.

Mas, na praça aberta em 28 de setembro de 1889 para o fornecimento de tabaco em folha destinado ao anno de 1890, resolveu adquirir conjunctamente o que fosso necessario para abastecer os depósitos e paioes, e por isso elevou a quantidade a arrematar a 2:500 toneladas; isto é, mais 75(3 toneladas do que no anno anterior.

E tanto o motivo allegado levianamente pelo sr. ministro da fazenda não é verdadeiro, que, na praça que já está annunciada para 16 do proximo mez de agosto, e é destinada ao consumo do anno do 1891, se não pedem mais de 1:505 toneladas de tabacos. (Apoiados.)

Assim, abastecidos os depositos e paioes, a administração reduziu logo aos seus justos limites a acquisição da materia prima, o que demonstra que quando a comprou a mais não foi para dar trabalho ao excesso de pessoal, como o sr. ministro affirmou gratuitamente. (Apoiados.)

Pois tambem s. exa. pretenderá que o stock a mais de 175 toneladas de tabaco em rama e paioes, nas officinas, representa um prejuízo e não deve ser contado nos lucros liquidos do ultimo anno economico? (Apoiados.)

Mas, sr. presidente, muito têem que aprender as régies estrangeiras com a sciencia do nosso ministro da fazenda.

Aqui tenho eu o relatorio da régie franceza, referente ao anno de 1886, no qual depois de se haver determinado a differença entre as receitas totaes e as despezas totaes, se acrescenta a essa differença, para calcular os lucros liquidos, o augmento occorrido durante o anno, no capital da régie, e representado não só pelos tabacos, de toda a espécie, a mais nos armazens, manufacturas e depositos, como tambem pelo maior valor dos immoveis e moveis, machinas e utensilios, fornecimentos, etc.

Aqui tenho tambem o relatorio da régie, italiana, referente ao anno de 1888-1889, no qual, para calcular os lucros liquidos, se deduz tambem da differença entre as receitas e as despezas a diminuição que soffreu nesse anno o patrimonio, representado pelos tabacos e pelo patrimonio mobiliario.

Deixemos, porém, o sr. ministro da fazenda com as suas perigrinas theorias e vamos ao que mais interessa. (Apoiados.)

Como a escripturação commercial relativa ao anno de 1888-1889 ainda está por fechar não tomarei para fundamento dos meus calculos os lucros liquidos provaveis d'ste anno, avaliados, como vimos, em 4:238 ou 4:231 contos de réis. conforme, se attenda ou não aos prejuízos dos recambies que já foram insignificantes, porque cessaram a partir de 1 de janeiro de 1890.

A apreciação que d'esses lucros fiz e que veiu plenamente confirmar as minhas previsões, serviu-me, apenas, para corroborar a primeira base que eu estabeleci, a saber, que nas condições de fabrico e de venda que se deram no anno de 1888-1889, exceptuando, porém, as que determinaram a elevação do preço da materia prima a mais de 351,3 réis por kilogramma o as que resultaram dos recambios, os lucros liquidos serão de 2$100 réis por kilogramma de tabaco vendido.

Mas, no que respeita ás vendas realisadas, está inteiramente concluida a escripturação de 1889-1890 e, por isso, tomarei para segunda base não a quantidade de tabaco vendido em 1888-1889, mas a que se vendeu em 1889-1890, fazendo ainda assim n'esta ultima algumas reducções para me collocar sempre abaixo da verdade.

A venda total, liquida de recambios foi, em 1889-1890, como disse, de 1:987 toneladas; mas, attendendo a que o arrematante não disporá das mesmas vantagens e facilidades que tem actualmente a régie para fornecer tabacos aos Açores, elimino por inteiro nas minhas contas o consumo ahi feito de 18 toneladas, e attendendo a que póde ter havido excesso de venda na zona fiscal, reduzo o consumo ahi, que foi de 86 toneladas, a 31 sómente, o que corresponde á capitação de 775 kilogrammas, applicada aos 40:000 habitantes da 7.ª secção da referida zona fiscal.

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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1397

E agora vem a proposito observar ao sr. relator que a venda na zona fiscal póde ter subido de 36 toneladas em 1888-1889 a 80 toneladas em 1889-1890, sem que d'ahi se deva concluir immediatamente que houve contrabando n'este ultimo anno da referida zona para o interior do paiz, como s. exa. affirmou. (Apoiados.)

Effectivamente a 7.ª secção da zona fiscal só começou a funccionar em janeiro de 1889, e portanto a venda n'essa zona só se realisou durante metade do anno de 1888-1889, entretanto que se estendeu por todo o anno de 1889-1890; logo o augmento de venda n'este ultimo anno foi sómente de 14 toneladas e não de 50 como á primeira vista podia parecer.

É verdade que s. exa. tambem ponderou que a capitação na zona fiscal foi no anno de 1889-1890 do mais de 2 kilogrammas o que lhe parece excessivo; mas varias rasões podem explicar este augmento de consumo sem ser necessario attribuil o a causas menos legitimas, como s. exa. fez.

Porque a estatistica nos mostra que o consumo legal entre nós é de 450 grammas, em media, por habitante, não quer isto dizer nem que esse seja o consumo real, nem que este ou aquelle se mantenham uniformes para todos os pontos do paiz. Da sua contiguidade ao reino vizinho, onde a capitação é muito maior do que a nossa, se deve- naturalmente concluir que na zona fiscal e o consumo real superior ao do resto do paiz; do facto do tabaco da regie ser alli vendido por metade do preço ordinario, deve necessariamente resultar que o consumo legal tenda a approximar-se do consumo real.

N'outros paizes, em Italia, por exemplo, onde existem estatisticas perfeitas, notam se grandes disparidades no consumo por habitante, quando se muda de povoação ou de região. Em Potenza é de 193 grammas, em Avelino de 222, em Sondrio de 224, ao passo que em Veneza é de 1:370, em Ferrara de 1:301, em Rovigo de 1:245. Na Sicilia é de 285 grammas, ao passo que no Veneto é de 799.

Como quer que seja, porém, eu reduzi o consumo na zona fiscal a 775 grammas por habitante, que é proximamente a capitação hespanhola, e reduzi o consumo total no anno de 1889-1890 a 1:915 toneladas, a saber:

Venda ordinaria .... 1:755
Venda official .... 76
Somma .... 1:831
Venda na zona fiscal .... 31
Venda no ultramar .... 66
Venda iliquida .... 1:928
Recambios .... 13
Venda liquida .... 1:915

A terceira base de que careço, para calcular o mappa de que dentro em breve me occuparei, é a que se refere á progressão do consumo.

O consumo é o producto de dois factores: a população e a capitação.

Se a capitação fosse constante, o consumo cresceria proporcionalmente á população, como suppoz o sr. Fuschini.

Mas a estatistica mostra que a capitação tende a crescer em todos os paizes da Europa que estão abaixo da media de 1 kilogramma e tanto mais rapidamente quanto mais distantes se acham d'essa media. Assim na Suecia, o consumo, que era apenas de 350 grammas no quinquennio de 1860-1864, subiu rapidamente a 850 grammas no quinquennio de 1880-1884, isto é, 25 grammas por anno ou 7 por cento.

Em França subiu de 800 grammas no primeiro quinquennio a 930 grammas no segundo, isto é, 6,5 grammas por anno ou 0,8 por cento.

Na Noruega subiu de 950 grammas no primeiro quinquennio a 1:040 grammas no segundo, isto é, 4,5 grammas por anno ou 0,5 por cento.

D'aqui resulta, que o consumo cresce mais rapidamente do que a população, nos paizes que estou considerando.

Exemplifiquemos:

Em França a população era, segundo o recenseamento de 1881, de .... 37.072:048
Segundo o recenseamento de 1880, de .... 38.218:903
Augmento em cinco annos de .... 546:855

Augmento por anno 109:371 ou 0,29 por cento.

A quantidade total de tabacos vendidos, foi:

Kilogrammas

Em 1881 .... 34.230:794
Em 1886 .... 30.052:343
Augmento em cinco annos .... 1.815:549

Augmento por anno 363:110 ou 1,07 por cento.

Quer isto dizer que durante este quinquennio o consumo cresceu 3,7 mais depressa do que a população.

Não é, pois, este criterio o que deve servir para determinar a progressão do consumo.

Mais racional é ir buscar a lei segundo a qual tem variado a quantidade do tabaco despachado annualmente nas alfandegas do continente.

Em 1881-1882 póde dizer-se que já desapparecêra a perturbação devida á elevação de 20 por cento nos direitos que o sr. Antonio de Serpa levou a effeito em 1879.

Comparemos os tabacos despachados n'esse anno com os de 1885-1880.

Teremos:

Kilogrammas

Em 1881-1882 .... 1.681:505
Em 1885-1886 .... 1.971:377
Augmento em quatro annos .... 289:872

Augmento por anno 72:468 ou 4,31 por cento.

Se quisermos deixar de parte o anno do 1885-1886, ainda que mais não seja senão com o fundamento, allegado pela commissão de fazenda, no seu parecer, de que em 1880 já podia começar a fazer-se sentir o effeito de alguma antecipação de direitos, acharemos:

Kilogrammas

Em 1881-1882 .... 1 681:505
Em 1884-1885 .... 1.803:202
Augmento em tres annos .... 121:757

Augmento por anno 40:586 ou 2,41 por cento.

Mas tomemos um periodo mais largo, começando, por exemplo, no anno de 1872-1873 em que já, tinha desapparecido o effeito do augmento de 10 por cento sobre os direitos, realisado pelo sr. Carlos Bento; encontraremos:

Kilogr.

Em 1872-1873 .... 1.414:085
Em 1885-1880 .... 1.971:377
Augmento em treze annos de .... 557:292

Augmento por anno 42:869 ou 3,03 por cento.

Por todas estas considerações deve admittir se que o augmento annual de consumo será pelo menos de 2,40 por cento, o que, referido ao consumo de 1889-1890, que depois de varias reducções fixei em 1:915 toneladas, representa sómente 46 toneladas a mais em cada anno, ou, quando muito, 63 por cento apenas do augmento de 73 to-

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neladas que se deu de 1888-1889 para 1889-1890, apesar das referidas reducçÕes.

Com esta base e com as outras duas de que antes me occupei, estou habilitado a preencher as columnas A e B do mappa junto, oude, alem da hypothese, que eu supponho corresponder á verdade, do augmento do consumo de 2,4 por cento, figura tambem a do augmento de 1,6 por cento, por ser a que fez o sr. relator, embora fundado sobre elementos errados, como já tive occasião de mostrar; (Apoiados) o as explicações que eu vou dar á camara sobre a organisação deste mappa, no que respeita á primeira hypothese, applicam-se mutatis mutandis á segunda.

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Mappa comparativo da «régie» e do monopolio

[Ver tabela na imagem]

1.ª hypothese - Augmento do consumo de 2,4 por cento

[Ver tabela na imagem]

2.ª hypothese - Augmento do consumo de 1,6 por cento

[Ver tabela na imagem]

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Observarei antes de tudo, que eu supponho que a administração, por conta do arrematante, começa em 1 de janeiro de 1891, o que não deve ir longe da verdade, tendo em attenção o espaço de tempo que é necessario para o concurso, assignatura do contrato, etc.

Vejâmos agora como se calculam os numeros da columna A.

O que se acha em frente do anno de 1888-1889 foi apenas ali inscripto para memoria e representa a totalidade das vendas liquidas realisadas de facto nesse anno.

O que corresponde ao anno de 1889-1890 e que me vae servir de ponto de partida para os annos seguintes representa não a totalidade das vendas liquidas realisadas n'esse anno, mas o que resta depois de feitas varias reducções a que já mais de uma vez me tenho referido.

Para calcular o numero que hei de escrever em frente do anno de 1891, basta-me reflectir que do anno economico de 1889-1890 ao anno civil de 1891 decorre anno e meio, e como eu supponho que o augmento do consumo é de 2,4 por cento em cada anno, será, n'esse periodo, de 3,6 por cento de 1:984, ou de 69 toneladas, que juntas a 1:915 perfazem o numero 1:984 que eu procurava.

Para passar d'este ultimo numero ao seguinte, que corresponde ao anno de 1892, basta juntar-lhe 2,4 por cento de 1:915 ou 46; e assim se formam todos os outros números da colunaria A pela addição do numero constante 46 ao numero immediatamente anterior.

Occupemo-nos agora da columna B. Os numeros ali inscriptos obtêem-se multiplicando respectivamente os numeros da columua A pela quantia de 2:100$000 réis, que e o quociente dos numeros 3:870 e 1:842, correspondentes ao anno de 1888-1889, e que representa, como vimos, os lucros liquidos por tonelada, nas condições de fabrico e de venda realisadas nesse anno, com excepção das que respeitam aos recambies e ao excesso do preço da materia prima sobre 351,3 réis. Os numeros d'esta columna significam, portanto, os lucros liquidos que tanto o estado como o monopolio aufeririam em cada um dos annos futuros se as referidas condições se conservassem invariaveis.

O augmento de anno para anno seria apenas n'essas condições de 46 toneladas x 2:100$000 réis ou 96:600$000 réis, o que não póde considerar-se excessivo se reflectirmos que o rendimento das alfândegas do continente em direitos de tabaco foi:

Em 1881-1882 de .... 2.931:849$928
Em 1885-1886 de .... 3.488:217$021
e cresceu, portanto, em quatro annos de .... 556:367$093

ou de 139:000$000 réis por anno.

Se excluissemos d'esta comparação o anno de 1885-1886 pelos motivos allegados pela commissão de fazenda, teriamos ainda:

Rendimento em 1881-1882 .... 2.931:849$928
Rendimento em 1881-1885 .... 3.164:662$768
Augmento em tres annos .... 233:812$840

o que equivale a 78:000$000 réis por anno.

A media entre as medias de 139:000$000 e 78:000$000 réis, assim calculadas, daria 108:000$000 réis, o que ainda está acima do augmento admittido na hypothese de se manterem as condições fabris e do venda do anno de 1888-1889.

Mas estas condições modificar-se-hão necessariamente, umas por virtude da lei, outras por effeito da morte e outras causas.

Assim, já no anno do 1889-1890 o preço da matéria prima, que fora de 351,3 réis em 1888-1889, baixou, como disse, a 284 réis. Mas por prudencia, admittirei que essa reducção é no futuro de 50 réis somente, como se vê na columna C do mappa, o que equivale a suppor que o preço da matéria prima se conservará constante e igual a 301,3 réis.

Na quota das despezas de manipulação tambem ha de haver uma gradual e successiva reducção, quer subsista a régie quer se estabeleça o monopolio nos termos da lei, que estamos discutindo. Para chegar a apreciar a importancia d'essa reducção começarei por apresentar á camara o quadro comparativo do pessoal operario do tarefeiros no ultimo dia dos annos economicos de 1888-1889 e 1889-1890.

Quadro comparativo do pessoal operario de tarefeiros no ultimo dia dos annos economicos de 1888-1889 e 1889-1890

[Ver quadro na imagem]

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A reducção total de 371 operarios em 30 de junho de 1890 foi devida ás seguintes causas:

[Ver tabela na imagem]

Convindo observar que as mulheres demittidas foram rigorosamente em numero de 64, mas que houve 3 readmissões na conformidade da lei, o que reduziu o numero util de demissões a 61, como se inscreveu no quadro.

As 371 baixas effectuadas durante o anno de 1889-1890 na classe de tarefeiros correspondem a mais de 7,8 por cento do numero de 4:733 operários d'essa classe, existentes em 30 de junho de 1889.

Convem todavia observar que nem todas as baixas representam suppressão immediata e completa dos respectivos salarios, porque n'ellas se incluem tambem as reformas em numero do 221. Descontando estas ficarão as baixas effectivas reduzidas a 150 ou 3,2 por cento do numero total de 4:733.

Examinemos agora os quadros do pessoal de empregados e jornaleiros.

A administração geral dos tabacos organisou em 24 de janeiro de 1889 o quadro desse pessoal, que vigorou até o fim do anno economico de 1888-1889, com as alterações que a marcha progressiva da remodelação dos serviços foi n'elle introduzindo; em 20 de julho do mesmo anno formulou as tabellas que vigoraram durante o exercicio de 1889-1890; e finalmente em 7 de junho ultimo organisou as tabellas destinadas ao exercicio de 1890-1891.

Em cada um d'esses documentos se fixam os quadros e vencimentos normaes do pessoal, compensando por meio do abonos transitorios as differenças que possam existir entre o normal e o effectivo e que têem de manter-se para não prejudicar direitos adquiridos.

Estas differenças, pois, e os supranumerarios addidos, a quem era mister conservar, em virtude do disposto na base 9.ª da lei de 22 de maio de 1888, determinam uma certa divergencia entre o quadro normal e o encargo effectivo, divergencia, que o tempo irá gradualmente attenuando, como já se reconhece na passagem do primeiro para o segundo anno da régie. O proprio quadro normal tambem soffreu e póde continuar a soffrer reducções, que não são para desprezar.

Comparando as tabellas do exercicio de 1889-1890 com as do de 1890-1891, encontrâmos, no que respeita á despeza:

[Ver tabela na imagem]

e no que se refere ao numero de empregados e jornaleiros

[Ver tabela na imagem]

Assim, a reducção no numero de empregados e jornaleiros, em effectividade, foi de 31 sobre 957, ou de mais de 3,2 por cento, e a reducção na respectiva despeza, elemento de comparação ainda mais seguro, vista a grande desigualdade que só dá nos vencimentos e salarios dos diversos empregados e jornaleiros, foi do 8:381$260 réis sobre 278:477$480 réis ou de 3 por cento.

Sendo, pois, as baixas effectivas de pouco mais de 3,2 por cento, tanto no pessoal de tarefeiros, como no pessoal de empregados e jornaleiros, e sendo de 3 por cento a reducção da despeza relativamente a este ultimo, não póde dizer-se que eu não fique abaixo da verdade, tomando apenas a percentagem de 2,4 por cento, tanto mais que, como é sabido, dado um grupo de individuos adultos, como o que é constituido por todo o pessoal da régie, a taxa da mortalidade crescerá de anno para anno e não se conservará constante, como eu supponho por excesso de prudencia.

A régie italiana, que, recebendo a administração das mãos do antigo monopolista, não teve, como a nossa, de luctar com o grande excesso de pessoal, proveniente das diversas emprezas que expropriámos, conseguiu, apesar d'isto, economisar 11,5 por cento na despeza com os jornaleiros e tarefeiros, nos quatro annos decorridos de 1884-1885 a 1888-1889, o que equivale a 2,875 por cento ao anno, e isto sem diminuir os salarios, mas apenas reduzindo gradualmente os operários ao numero strictamcnte necessario e fazendo uma distribuição do trabalho mais racional e, economica.

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Fixada em 2,4 por cento a lei da diminuição annual do pessoal da régie, é facil d'ahi deduzir qual deva ser a variação no custo da manipulação.

A manipulação nacional subiu era 1888-1889 a 385,75 réis por kilogramma, entretanto que em França não excedeu 97 réis em 1886.

Esta enorme differença que vae do simples ao quadruplo, explica-se, como já disse, pelo grande excesso de pessoal, que não só obsta á introducção de machinismos aperfeiçoados, mas que, sendo até de mais para a própria fabricação exclusivamente manual, já de si mais cara, ainda a onera com os encargos dos licenceados e outros. (Apoiados.)

N'uma administração desafogada e bem ordenada, a relação entre o pessoal empregado e a tonelagem fabricada, não deve exceder um certo limite que na régie italiana fica ainda áquem de um individuo por tonelada.

Estamos infelizmente muito acima d'este limite e só tarde e muito tarde poderemos attingil-o; mas d'aqui até lá devemos admittir que o custo da manipulação vae variando proporcionalmente á relação existente entre o pessoal e a tonelagem, isto é, que vae decrescendo na rasão directa do primeiro e na rasão inversa da segunda.

Conhecemos todos estes elementos relativamente ao anno de 1888-89. O custo da manipulação foi, como disse, de 386 réis, numeros redondos; a tonelagem vendida foi de 1:842, e o pessoal, facil tambem de definir numericamente, designal-o-hei por p.

No anno de 1889-1990 a tonelagem foi de 1:915, o pessoal, segundo a lei de diminuição adoptada, deve representar-se por (1 - 0.024) p ou 0,976 p; logo o custo, c, da manipulação será determinado pela proporção

[Ver fórmula na imagem]

d'onde se tira

[Ver fórmula na imagem]

No anno civil de 1891 a tonelagem será de 1:984 como indica a columna A do mappa a que me estou referindo, e visto achar-se este anno distanciado anno e meio ou desoito mezes do anno economico 1889-1890, deve o pessoal representar-se por

[Ver fórmula na imagem]

p ou 0,940 p, e o custo, c, será determinado pela proporção

[Ver fórmula na imagem]

d'onde se tira

[Ver fórmula na imagem]

No anno seguinte de 1892 a tonelagem será de 2:030, como se deduz da columna A do mappa, o pessoal deve representar-se por (0,940 - 0,024) p ou 0,916 p, e o custo, c, será dado pela proporção

[Ver fórmula na imagem]

d'onde se tira

[Ver fórmula na imagem]

E assim se vae calculando o custo successivo da manipulação nos differentes annos até 1906, o qual deduzido de 386 réis, custo referente, como disse, a 1888-1889, dá os numeros inscriptos na columna D do mappa, que representam, como o respectivo titulo indica, a economia na quota das despezas de manipulação em cada um d'esses annos.

Os numeros da columna E obtêem-se sommando os números correspondentes das columnas C e D e representam as reducções futuras no preço fabril provenientes da economia na materia prima e na quota de fabrico.

Os numeros da columna F resultam da multiplicação dos numeros correspondentes das columnas A e E e designam as economias futuras nas despezas totaes de fabrico, quer este seja administrado pelo estado, quer pelo arrematante.

Passemos agora á columna G.

Como disse na sessão diurna, o arrematante fica aliviado do pagamento do bonus commercial que a régie actualmente concede, sem limite minimo de importancia de compras. As percentagens d'esse bonus são as seguintes:

Rapé .... 3 por cento
Folha picada .... 4 por cento
Charutos ordinarios .... 4 por cento
Charutos finos .... 8 por cento
Cigarros .... 4 por cento
Cigarrilhas .... 8 por cento

Quanto representam estas percentagens applicadas á totalidade dos tabacos vendidos n'um anno?

O quadro seguinte responde a esta pergunta no que se refere ao anno de 1888-1889.

[Ver quadro na imagem]

Por elle se vê que o bonus commercial applicado ás vendas realisadas em 1888-
1889 representa 291 contos de réis ou 4,58 por cento do producto bruto das vendas, liquidas de recambies, n'esse anno.

Se o governo entende que póde dispensar o monopolista do pagamento d'esse bonus, porque não procede por igual fórma para com a régie? (Apoiados)

No anno do 1889-1890 a reducção nos encargos que teria resultado da eliminação do bonus commercial, calcula-se proporcionalmente á quantidade de tabaco vendida e é de

[Ver fórmula na imagem]

m 1891 uma proporção análoga dará [Ver fórmula na imagem] ou 314 contos de réis. E assim se calculam facilmente os números inscriptos na columna G, mencionando-se entre parenthesis e só para memória os que correspondem aos annos

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economicos de 1888-1889 e 1889-1890, porque a reducção de que se trata só começará a vigorar em 1891, isto é, quando a administração passar para o monopolista.

Tratemos agora da columna H. Mencionam-se ahi os números correspondentes ao augmento de direitos sobre tabacos manufacturados, despachados, para consumo, nas alfândegas do continente do reino, augmento que, tendo sido pedido pela administração geral dos tabacos, lhe foi negado e vae agora ser concedido ao arrematante. (Apoiados.)

Segundo o boletim estatistico do conselho geral das alfândegas, n.° 12, de janeiro a dezembro de 1889, a importação para consumo no continente do reino e ilhas adjacentes, durante este anno, foi a seguinte:

Kilogrammas

Tabaco em charutos .... 40:997
Tabaco manipulado em quaesquer outras especies e talo picado .... 21:071

Mas, segundo se vê a paginas 72 do orçamento geral para 1890-1891, no anno economico de 1888-1889 despacharam-se para consumo na alfândega de Ponta Delgada.

Kilogrammas

Tabaco manipulado

Charutos .... 287
Varias especies .... 932

Logo, deduzindo estes numeros d'aquelles, póde dizer-se que no anno de 1888-1889 foram as quantidades despachadas no continente do reino, as seguintes:

Kilogrammas

Tabaco em charutos .... 40:710
Tabaco manipulado em quaesquer outras espécies e talo picado .... 20:139

Applicando a estas quantidades o augmento de direitos preceituado na base 23.ª que é de 1$000 réis por kilogramma para charutos e de 500 réis para tabacos manipulados em quaesquer outras espécies e talo picado, obtem-se o producto de 50:779$500 réis

Tal seria, pois, a importancia do referido augmento de direitos em 1888-1889, se já então se houvesse realisado; só para memoria vae essa importancia mencionada entre parenthesis na columna H.

Outro tanto póde dizer-se da importancia de 52:792$000 réis correspondente ao anno de 1889-1890 e calculada proporcionalmente á quantidade de tabaco vendida, visto que eu admittirei que a progressão nas quantidades despachadas é a mesma que se dá nas quantidades vendidas.

Assim é que o augmento de direitos no anno civil de 1891 se obtém acrescentando 3,6 por cento ao augmento já calculado para o anno económico de 1889-1890, visto que aquelle anno civil está distanciado anno e meio deste anno economico.

Analogamente o augmento de direitos no anno civil de 1892 calcula-se acrescentando 2,4 por cento ao augmento correspondente ao anno anterior.

E assim successivamente se vão determinando os números inscriptos na columna H do mappa.

A columna I não carece de menção especial e resulta da addição das columnas F, G e H.

Na columna K, que se obtém sommando os numeros das columnas B e I, mencionam-se os lucros liquidos que auferirá o arrematante e que auferiria por igual a régie se lhe fizessem as mesmas vantagens e concessões que aquelle se vão dar. (Apoiados.)

Occupemos-nos agora das columnas do mappa compararativo em que se calcula a receita annual para o estado, no caso de se arrematar o exclusivo do fabrico.

Na columna L inscreve-se o rendimento fixo de réis 4.257:000$000, a saber;

Renda fixa paga pelo arrematante nos termos do n.° 2.° da base 5.ª, contos de réis .... 4:250

A acrescentar:

Direitos de tabaco nas ilhas .... 40
Somma .... 4:290

A deduzir:

Metade do valor das gratificações que actualmente pertencem aos agentes do governo, por kilogramma de tabaco apprehendido, na conformidade do n.° 3.° da base 9.ª .... 5
Subsidio para a caixa de reformas, segundo a alinea c) do n.° 9.° da mesma base .... 10
Despezas com as operações de seccagem e fermentação dos tabacos do Douro, 400 toneladas a 25$000 réis .... 10
Inspecção .... 8
33
Quantia fixa por anno .... 4:257

Na columna M menciona-se o producto do imposto de licença, de 40 réis por kilogramma, que tem de ser pago pelo arrematante, obtendo-se os números correspondentes pela multiplicação dos da columna A pela quantia fixa da 40$000 réis.

A columna N refere-se á partilha, entre o estado e o concessionário, nos termos do n.° 1.° da base 9.º, dos lucros liquidos d'este ultimo, que são dados na columna K. A formula applicavel é a seguinte:

N = 0,445 K - 2361,882

Os numeros da columna O, que resultam da somma da números correspondentes das columnas L, M e N, dão a receita annual que o estado auferirá no caso do monopolio.

E, finalmente, a columna P, obtida por differença entre as columnas K e O, demonstra os augmcutos nas receitas annuaes do estado, que resultarão da régie comparada com o monopólio, e que serão em media, como se vê, de 1.190:000$000 réis por anno, ou seriam pelo menos de 962:000$000 réis, na hypothese, formulada pelo sr. relator da commissão, do augmento do consumo ser apenas de 1,6 por cento.

Determinados assim na columna P do mappa comparativo os prejuizos que o estado soffrerá nas suas receitas em cada um dos dezeseis annos do monopolio, e que são, como que outras tantas quantias entregues annualmente pelo governo ao arrematante, é mister agora considerar os outros elementos da operação financeira de que se trata.

Para facilitar a apreciação do regimen do monopolio durante os dezeseis annos propostos, é indispensavel referil-o a um outro e determinado systema, e não a todos promiscuamente, como pretendeu fazer o sr. relator, complicando assim inutilmente a questão. (Apoiados.)

Estamos agora na régie; e, portanto, sob o ponto de vista exclusivo do estudo que temos em mira, é racional admittir que no fim da concessão se volta outra vez aquelle regimen, para assim melhor poder ajuizar se da projectada transição, pelo do monopólio, durante dezesseis annos.

Mais tarde cumprirá aos poderes públicos examinar se mais convirá proseguir no systema do monopolio, ou passar ao da liberdade, ou voltar ao da régie; mas no entretanto, se eu desde já poder demonstrar que a transformação temporaria da actual régie no monopolio é ruinosa para o estado, terei conseguido o meu fim, que é condemnar o projecto em discussão; e escusado me será formular hypotheses sobre o que virá a ser no futuro o regimen dos tabacos entre nós. (Apoiados.)

Assente este ponto, indicarei agora summariamente os traços geraes da operação completa.

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1404 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O estado entrega certos valores ao arrematante em 1 de janeiro de 1891 e recebe d'elle outros valores em 1 de janeiro de 1907. Haverá compensação, ou resultará d'ahi prejuizo para alguma das partes? É o que vamos ver.

Em 1 de janeiro de 1891, entrega o estado, alem de diversos valores de carteira e outros, todos os predios e fabricas da régie, machinismos, utensilios, matérias primas em ser e em via de manipulação, bem como os tabacos manipulados em deposito, por 0,32 do seu preço de venda; e, no entender da commissão, este activo, depois de deduzido o passivo que fica a cargo do arrematante, representa cerca de 2:700 contos de réis a favor d'este ultimo.

Ora, como disse o sr. Fuschini, com assentimento do sr. relator, os stocks de tabaco manipulado n'aquella data, devem ser approximadamente de 500 toneladas, que ao preço médio de venda de 3$451 réis por kilogramma, valerão 1.725:500$000 réis. E 32 por cento d'esta quantia são 550 contos de réis, números redondos.

Póde, pois, dizer-se que o estado entrega ao arrematante, afóra o tabaco manipulado, 2:150 contos de réis de outros valores.

Em 1 de janeiro de 1907 restituirá o arrematante ao estado, não todos os valores recebidos, mas sómente as fabricas, utensilios, machinismos, depositos de materias primas em ser e em via de manipulação, que o sr. relator computou nos seus calculos em 1:500 contos de réis.

Logo, deixando de parte por emquanto os tabacos manipulados, o estado receberá a menos 650 contos de outros valores, segundo as declarações da própria commissão.

É verdade que, tendo o governo entregado apenas 500 toneladas de tabaco manipulado em 1 de janeiro de 1891, receberá 1:500 em 1 de janeiro de 1907; isto é, 1:000 toneladas a mais, que representam um certo valor.

Mas que valor será este? Para que servem estas 1:000 toneladas de tabaco, que bastarão, em 1907, para o consumo do paiz durante cerca de quatro mezes e meio?

Poderá, porventura, o estado, ao herdar a administração do monopolista, suspender durante quatro mezes e meio os salarios dos operarios, que ainda então serão de sobra, para dar tempo a que se escoe este excedente de stocks? Não, de certo. E quer o governo licenceie o pessoal mantendo-lhe os seus salarios, quer tenha de refabricar, como póde bem acontecer, esses stocks recebidos a mais, o que é certo é que as referidas 1:000 toneladas de tabaco manipulado só podem representar para o estado o valor da matéria prima; isto é, 300 contos de réis.

Assim o estado receberá a mais era tabacos manipulados cerca de 300 contos de réis, e receberá a menos n'outros valores cerca de 650 contos de réis. Mas, como estes números não podem ser calculados senão por approximação, e como, alem d'isso, quero sempre ficar aquém da verdade, admittirei que elles se compensam, isto é, que o arrematante restitue exactamente ao estado os mesmos valores que este lhe entregou.

Dada esta hypothese que, como acabo de demonstrar, é contraria á minha argumentação e, portanto, às conclusões a que pretendo chegar, nada mais temos a fazer, para poder apreciar no seu conjuncto a operação financeira em discussão, do que comparar as quantias em dinheiro, que, independentemente dos outros valores a que já me referi, são pagas pelo governo ao arrematante e por este áquelle, em diversas epochas.

Alem dos prejuizos annuaes para o estado descriptos na columna P do mappa e que na operação financeira figuram como outras tantas quantias pagas pelo governo ao arrematante a meio do anno a que dizem respeito, ha ainda a considerar que o monopolista deve entregar ao governo duas prestações de 3:600 contos de réis cada uma nos dias 1 de janeiro e 1 de março de 1891, e que o governo terá de pagar ao arrematante, metade no dia 1 de janeiro de 1907 e metade no dia 1 de março do mesmo anno, não só os 1:500 contos de réis em que são computadas as fabricas, utensilios, machinismos e depositos de materias primas era ser e em via de manipulação, mas tambem 0,85 do preço de venda de 1:500 toneladas de tabaco manipulado.

Falta apenas saber quanto representa esto ultimo encargo.

Ficando o concessionario, como fica, com a faculdade de augmentar até 20 por cento em media os preços actuaes de venda, é evidente que elle ha de usar d'essa faculdade, ainda que mais não seja senão nas vésperas de findar a concessão, para poder venderão governo pelo maximo preço as 1:500 toneladas de tabaco que este tem forçosamente de lhe comprar. Póde até aproveitar a ambiguidade e pouca clareza do n.° 7.° da base 10.ª, para augmentar de muito mais de 20 por cento os preços das marcas que hão de figurar n'essa venda e que o governo tem do designar com tres annos de antecedencia, diminuindo propositadamente os preços das outras marcas, para manter o preço medio total dentro dos limites de 120 por cento que lhe são impostos.

Como quer que seja, eu admittirei que a elevação do preço médio de venda dos tabacos adquiridos pelo estado é apenas de 20 por cento.

Ora o preço médio, por kilogramma, pago pelo consumidor no anno de 1888-1889 foi de réis .... 3$451
Acrescentando-lhe mais 20 por cento ou .... $690
Será o preço medio corrente auctorisado de .... 4$141

Mas o preço para o estado tem uma reducção de 15 por cento e é, portanto, de 0,85x4$141 réis ou 3$520.

A quantia que o estado tem de entregar ao arrematante no fim da concessão, pela acquisição forçada de 1:500 toneladas de tabacos manipulados, é, portanto, de 1:500x3:520$000 réis ou contos .... 5:280
E acrescentando a quantia que tem de dar pela expropriação das fabricas, machinismos, etc. .... 1:500
Elevar-se-ha a contos de réis .... 6:780

a somma total que o estado ha de pagar ao monopolista, em duas prestações iguaes nos dias 1 de janeiro e 1 de março de 1907.

Conhecidas assim inteiramente as quantias que têem de ser pagas de parto a parte e as epochas dos respectivos pagamentos, é necessario agora referir todas essas quantias, com os seus juros accumulados, a uma mesma epocha, e escolher a taxa do juro, nesse calculo, de modo que, no apuramento final, as quantias additivas sommadas sejam precisamente iguaes ás quantias subtractivas tambem sommadas. A taxa de juro, que der este resultado, será a taxa de juro da operação financeira, que se comprehende no proiecto em discussão.

A determinação da taxa que satisfaça ao preceito indicado só por tentativas póde fazer-se. Ensaiei successivamente os valores de 13,8 por cento e 15 por cento e os resultados que obtive constam do quadro seguinte, onde tomei para referencia o dia 1 de janeiro do 1907, por ser áquelle em que supponho terminar a concessão:

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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1405

[Ver tabela na imagem]

Sendo positiva, como se vê, a differença correspondente á primeira tentativa e negativa a que corresponde á segunda, prova isto que o juro da operação está comprehendido entre 13,8 por cento e 15 por cento. Uma simples interpolação dará a taxa procurada que se reconhece assim ser approximadamente de 14,096 por cento.

Se, como se figura na ultima columna do quadro, se suppozer que todas as quantias, pagas do parte a parte, vencem o juro annual de 5 por cento até o dia 1 de janeiro de 1907, reconhecer-se-ha que, feito o balanço completo da operação nesse dia, terá o estado perdido 17:713 contos de réis, a que corresponde uma annuidade da 730:683$000 réis, paga, durante os dezeseis annos da concessão, no dia 1 de julho de cada um desses annos.

Um trabalho analogo feito em relação á hypothese, formulada pelo sr. relator, de ser o augmento annual do consumo de 1,6 por cento somente, deu-me os resultados constantes do quadro seguinte:

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1406 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Uma simples interpolação prova que o juro da operação seria neste caso de 11,636 por cento approximadamente.

Se, como se figura na ultima columna do quadro, se suppozer que as quantias, pagas de parte a parte, vencem o juro de 5 por cento ao anno, até o dia 1 de janeiro de 1907, reconhecer-se-ha que, feito o balanço definitivo da operação n'essa data, terá o estado perdido 12:567 contos de réis, a que corresponde uma annuidade de 518:404$000 réis durante os dezeseis annos da concessão.

Quiz ainda formular uma terceira hypothese. A de se augmentar immediatamente de 20 por cento o preço médio de venda dos tabacos, mantendo-se, por esse motivo, durante o praso da concessão, invariável o consumo e igual a 2:000 toneladas, que é proximamente o limite que terá attingido em 1891, quando começa o regimen do monopolio.

Nas condições de fabrico e de venda, que eu tenho sempre supposto para o anno de 1888-1889, os lucros liquides por kilogramma de tabaco seriam, como temos visto mais de uma vez, de .... 2$100
Mas as condições futuras em que se encontrará o monopolista, e em que se encontraria a régie se lhe dessem as mesmas vantagens, são difterentes d'essas. Em primeiro logar, o preço da matéria prima diminuiu de .... $050
Póde, em segundo logar, admittir-se que, pela reducção successiva do pessoal, virão as despezas de manipulação a diminuir em media, durante os dezeseis annos, de .... $074
Em terceiro logar, no anno de 1888-1889 o preço médio pago pelo consumidor foi de .... 3$451
A importancia media das commissões, bonus e descontos foi de 14,96 por cento. $516
E o producto medio do tabaco entregue ao consumo foi de .... 2$935
Mas partimos da hypothese de que o preço actual de venda ou .... 3$451
será augmentado de mais 20 por cento, ou .... $690
e elevado, portanto, a .... 4$141
A importancia media das commissões baixará ao contrario a 10,38 por cento ou .... $430
E o producto medio do tabaco entregue ao consumo será de .... 3$711
quer isto dizer que haverá um beneficio a mais de .... $776
Logo os lucros liquidos, por kilogramma, serão para o arrematante e seriam para a régie de .... 3$000
E os lucros liquidos totaes de 2:000x3:000$000 ou contos .... 6:000
a que é necessario ainda acrescentar o augmento dos direitos de alfandega, computado, numeros redondos, em contos .... 50
Somma .... 6:050

Assim, pois, na hypothese do que me estou occupando o arrematante realisará annualmente 6:050 contos de lucros líquidos e outro tanto aconteceria â régie se lhe fizessem as mesmas vantagens e concessões que áquelle se dão.
Arrematado o exclusivo, o estado só receberá annualmente 4:667 contos, a saber:

Rendimento fixo, como nas hypotheses anteriores .... 4:257
Imposto de licença 2:000x40$000 ou .... 80
Partilha de lucros 0,445x6:050 - 2:361,882 ou .... 330
4:667

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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1407

Assim, por virtude da adjudicação do monopolio o estado perderá durante os dezeseis annos da concessão uma annuidade constante de 1:383 contos de réis e tudo se passa, portanto, como se entregasse annualmente ao arrematante essa annuidade.

As referidas dezeseis annuidades postas a render a juros compostos de 21,45 por cento ou de 21,00 por cento até 1 de janeiro de 1907, valerão n'este dia respectivamente 102:097 ou 152:826 contos de réis.

Inscrevendo estes numeros no quadro seguinte e completando-o pelo mesmo processo adoptado nos que correspondem às duas hypotbeses anteriores, reconhecer-se-ha por interpolação que o juro real da operação será neste caso de 21,453 por cento.

[Ver tabela na imagem]

Suppondo que as quantias pagas de parte a parte vencem o juro annual de 5 por cento, como se figura na ultima columna do quadro, reconhecer-se-ha, do balanço da operação feito em 1 de janeiro de 1907, ter o estado perdido n'essa data 24:633 contos de réis, a que corresponde uma annuidade de 1.016:141$000 réis durante dezeseis annos.

Finalmente, quiz ainda figurar uma 4.ª e ultima hypothese, que eu considero absolutamente inadmissível, e que só serve como ponto de referencia.

É a de se conservar constante o consumo durante os dezeseis annos da concessão, embora se não elevem os preços actuaes.

Aos lucros líquidos por kilogramma apurados em 1888-1889, na importancia de .... 2$100

ha a acrescentar:

1.° Diminuição do preço da materia prima .... $050
2.° Reducção nas despezas de manipulação .... $074
3.° Reducção nas commissões de venda que baixarão em media de 14,96 a 10,38 por cento ou de 4,58 por cento. Ora, 4,58 por cento de 3$451 réis, dá .... $158
Logo, os lucros liquidos por kilogramma serão para o arrematante, e seriam para a régie, de .... 2$382
E os lucros liquidos totaes serão de 2:000 x 2:382$000 réis, ou contos .... 4:764
a que é necessario acrescentar ainda o augmento de direitos, ou .... 50
Somma .... 4:814

Assim, pois, n'esta hypothese que estou discutindo, o arrematante realisará annualmente 4:814 contos de lucros líquidos, e outro tanto aconteceria á régie se lhe dessem iguaes vantagens.

Concedido o monopolio, o estado receberá annualmente 4:337 contos sómente, a saber:

Rendimento fixo, como nas hypotheses anteriores .... 4:257
Imposto de licença, 2:000x40$000 réis .... 80
Somma .... 4:337

Assim, por virtude da adjudicação do monopolio, o estado perderá dezeseis annuidades, iguaes a 477 contos, que podem considerar-se como outras tantas quantias pagas ao arrematante a meio do anno a que dizem respeito.

Estas dezeseis annuidades, postas a render a juros compostos de 6,5 ou 7 porcento até 1 de janeiro de 1907, valerão neste dia respectivamente 13:170 ou 13:760 contos de réis.

Inscrevendo estes numeros no quadro seguinte, e completando-o como os anteriores, reconhece-se, por interpolação, que o juro real da operação seria n'este caso de 6,659 por cento.

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1408 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

Se suppozessemos, como se figura na ultima columna do quadro, que as quantias pagas do parte a parte venciam o juro annual de 5 por cento, até o dia 1 de janeiro de 1907, reconhecer-se-hia que do balanço da operação, feito n'esta data, resultaria uma perda total para o estado representada pela quantia de 2:670 contos do réis, a que corresponde uma annuidade de 110:141$000 réis durante dezeseis annos.

Assim, resumindo, os resultados a que cheguei:

1.° Conservação dos preços actuaes. Augmento de consumo 2,4 por cento por anno, hypothese fundada nos mais seguros elementos estatísticos do paiz e do estrangeiro. Juro real da operação 14,096 por cento.

Suppondo de 5 por cento o juro da liquidação, prejuizo para o estado de 17:713 contos em 1 de janeiro de 1907, ou de dezeseis annuidades de 730:683$000 réis durante a concessão.

2.° Conservação dos preços actuaes. Augmento de consumo 1,6 por cento por anno, hypothese baseada erradamente pelo sr. relator sobre a estatística da régie franceza que dá uma progressão muito maior. Juro real da operação 11,636 por cento.

Suppondo a liquidação feita a 5 por cento, prejuízo para o estado de 12:567 contos em 1 de janeiro de 1907, ou de dezeseis annuidades de 518:404$000 réis durante a concessão.

3.° Augmento de 20 por cento nos preços actuaes. Consumo invariavel e igual a 2:000 toneladas por anno. Juro real da operação 21,453 por cento.

Suppondo a liquidação feita a 5 por cento, prejuizo para o estado de 24:633 contos em 1 de janeiro de 1907, ou de dezeseis annuidades de 1.016:141$000 réis durante a concessão.

4.° Conservação dos preços actuaes. Consumo invariavel e igual a 2:000 toneladas, hypothese absolutamente inadmissível porque briga com todos os elementos estatisticos. Juro real da operação 6,659 por cento.

Suppondo a liquidação feita a 5 por cento, prejuízo para o estado de 2:670 contos em 1 de janeiro de 1907, ou de dezeseis annuidades de 110:141$000 réis durante a concessão.

Pois nós estamos, porventura, reduzidos á triste situação de pagar, não 6,7 por cento, porque este juro corresponde a uma hypothese inadmissível, mas 11,6 por cento, 14,1 por cento ou 21,5 por cento para obtermos um empréstimo de 7.200:000$000 réis, paralysando o maior rendimento do estado durante dezeseis annos sem direito de rescisão nem de revisão? (Apoiados.)

Em Hespanha existe a faculdade de remissão e, alem d'isso, examinam-se, em periodos determinados, os lucros liquidos do monopolio, podendo d'ahi resultar augmento progressivo de rendimento para o estado, (Apoiados.) e nós vamos enfeudar as nossas receitas, durante dezeseis annos, por uma renda fixa que a régie já nos dá! (Apoiados.)

Eu vou terminar.

Expuz rapida e modestamente á camara os calculos que fiz com muito trabalho para formar a minha opinião a este respeito. (Apoiados.)

É em virtude d'este estudo, a que eu procedi com todo o escrupulo, sem nenhum espirito partidario, (Apoiados) sem o menor intuito politico, (Apoiados) que eu venho dizer á camara com toda a franqueza, com toda a sinceridade, com toda a honestidade da minha consciencia, que este projecto foi mal concebido, (Apoiados) está ainda mais mal redigido, é absolutamente inopportuno e altamente prejudicial aos interesses do estado. (Apoiados da esquerda.)

Fiz todas as considerações que me pareceram justas, formulei as hypotheses que supponho serem verdadeiras e que estou prompto a sustentar se forem contestadas, e como o mathematico que, dadas as equações que resolvem o problema, tira d'ellas cegamente o valor das incognitas, assim eu cheguei friamente á convicção sincera de que esta operação é ruinosa para o thesouro. (Apoiados da esquerda.)

Vou mais longe. Se um projecto desta natureza fosse apresentado ao parlamento por uma situação politica da

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SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE JULHO DE 1890 1409

minha feição, não o votaria, porque á minha consciencia repugnaria sempre apoiar uma medida tão prejudicial ao paiz. (Apoiados da esquerda.)

Eu ainda comprehendia que se passasse directamente, como se pensara fazer em 1887, do regimen da liberdade para o do monopolio, porque, em fim, esperava-se obter, sem incommodo nem dispêndio algum, um beneficio importante para o thesouro, resultante da exploração de um vicio que é prejudicial á saúde.

Mas, tomar o estado sobre si, como tomou, os encargos, as difficuldades e até o odioso da transformação do systema da liberdade no do exclusivo, para, logo depois, sem dar tempo á experiencia, entregar nas mãos do arrematante esse instrumento valioso que tem agora em seu poder e que por toda a Europa tom produzido os mais benéficos resultados, digo-o francamente, não é só um expediente grosseiro, é mais do que isso, é um erro e um erro gravissimo (muitos apoiados da esquerda) e denuncia por parte do governo uma tal sofreguidão de alcançar uns milhares de contos, seja porque meio for, que mal se compadece esse propósito com aquellas apreciações optimistas, que fez o sr. ministro da fazenda, no ultimo discurso que proferiu nesta casa, sobre o estado prospero das condires financeiras do paiz. (Apoiados da esquerda).

Mas ou appello ainda para o espirito esclarecido do sr. ministro da fazenda. A discussão deste projecto tem sido tão brilhantemente sustentada nesta casa pelos meus illustres collegas da opposição, que s. exa. certamente ha de ter visto a questão sob novos aspectos por que ainda a não tinha talvez encarado até aqui.

Pois, não insista s. exa. pela approvação d'este projecto em ambas as casas do parlamento na actual sessão. Aproveite o interregno parlamentar para avocar a si de novo o assumpto.

Durante esse tempo proteja a régie, acompanhe-a de todos os seus desvelos, conceda-lhe todas as vantagens e facilidades que quer dar ao arrematante; estude a questão com vontade de acertar e se reconhecer que tinha errado, venha confessal-o francamente ao parlamento. Não se envergonhe de o fazer. (Apoiados da esquerda.) O sr. Marianno de Carvalho, que é um estadista e um homem politico de não menor vulto que s. exa., não se dedignou de vir dizer ao parlamento em 1888 que tinha errado, que não tinha encetado o verdadeiro caminho, porque reconhecera ulteriormente que a régie ainda era o melhor systema de administração dos tabacos.

Mas, se ao contrario, s. exa., na proxima sessão legislativa, nos poder demonstrar, em virtude do seu estudo, que a réqie é um systema condemnado entre nós, creia que já então não encontrará por parte da opposição as mesmas difficuldades, os mesmos embaraços, as mesmas criticas, talvez um pouco acerbas, que lhe estamos fazendo. (Apoiados da esquerda.)

Homem novo, como é, e de largo futuro, não queira iniciar a sua carreira ministerial, ligando o seu nome a uma proposta d'esta ordem.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos dos seus collegas.)

O sr. Lourenço Malheiro: - Leu a sua moção de ordem:

«A camara, satisfeita com as explicações do governo, continua na ordem do dia.»

Em seguida começou a apresentar algumas considerações em resposta ao sr. Ressano Garcia e como logo desse a hora pediu para lhe ficar a palavra reservada.

O sr. Presidente: - A hora deu, v. exa. dirá se deseja ficar com a palavra reservada para a sessão seguinte.

O Orador: - Então peço a v. exa. que me reserve a palavra.

O sr. Presidente: - O sr. Emygdio Navarro tinha pedido a palavra para antes de se encerrar a sessão. Tem s. exa. a palavra.

O sr. Emygdio Navarro: - Foi publicado no limes um artigo que vem hoje reproduzido num jornal da noite, e para honra de todos nós devo dizer que esse artigo indignou tão profundamente quão dolorosamente a todos que o leram. (Muitos apoiados.)

Refere-se esse artigo ás bases estipuladas entre Portugal e a Inglaterra para a solução da pendencia, que actualmente existe, entre estas duas nações. Se essas bases fossem verdadeiras nós perderiamos não só tudo aquillo que pelo ultimatum de 11 de janeiro nos era exigido pela Inglaterra, mas muito mais do que isso, (Apoiados.) e por consequencia as negociações do governo portuguez teriam tido como resultado, não só de nada resgatarmos do que nos tinha sido tirado, mas de concedermos ainda muito mais.

Para nos convencermos da nossa justiça basta olhar para a região que vae de Tete ao Zumbo, e vermos que essa região está cheia de prazos da corôa, que pagam renda, com occupação effectiva, nunca contestada, e que não obstante, dada a convenção em similhantes bases, passarão esses vastos territórios para o dominio da Inglaterra ou da companhia Sul-Africana.

Não posso deixar, pois, de pedir, sobre este assumpto, explicações ao governo, pelo que, peço ao sr. ministro da fazenda, que communique aos seus collegas dos estrangeiros ou da marinha, o desejo que tenho de que qualquer de s. exas. venha aqui na terça feira, para dar informações que, oxalá, possam tranquilisar o espirito publico.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Digo ao illustre deputado que me encarrego de participar, aos meus collegas dos estrangeiros e da marinha, a noticia do facto a que v. exa. se referiu.

E com relação a essas noticias v. exa. e a camara comprehendem que nada posso dizer, por isso que esse negocio corre pela pasta dos estrangeiros, e é por ella que, sempre n'esta camara se tem tratado do assumpto.

Mas sempre direi que basta attentar na origem d'essas informações para dever estarmos de sobreaviso.

O sr. Emygdio Navarro: - Uma vez que o sr. ministro da fazenda diz que nos devemos pôr em guarda contra a noticia, devo dizer que no mesmo jornal foram publicadas ha quinze dias as bases do convenio, entre a Inglaterra e a Allemanha, e que a noticia foi confirmada pelos factos.

O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada, e mais os projectos n.ºs 152, sobre o caminho de ferro de Mossamedes, e 151 sobre aguas em Setúbal.

Está levantada a sessão.

Era pouco mais de meia noite.

O redactor = Sá Nogueira.

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