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Sessão de 28 de abril de 1879
Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva
Secretarios — os srs. Antonio Maria Pereira Carrilho
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita
SUMMARIO
Approva-se o parecer sobre a eleição de Timor, e é proclamado deputado, e presta juramento, o sr. Pedro Augusto Correia da Silva. — Apresentam-se algumas representações e requerimentos. — Trocam-se alguma explicações entre o sr. Goes Pinto e ministro da fazenda. — Apresenta o sr. ministro da guerra tres propostas: a 1.°, fazendo algumas alterações na lei do recrutamento em vigor; a 2.ª, legalisando varias despezas d"orçamento de 1876-1877; e a 3.ª, terceira fazendo uma modificação na reforma do generala to. — Na ordem do dia continua a dissensão do capitulo 3.º do orçamento: falla o sr. Lopo Vaz, o fica ainda pendente o assumpto. — Nomeia-se a grande deputação que deve ir ao paço comprimentar Suas Magestades no dia seguinte, anniversario da outorga da carta constitucional.
Abertura — As duas horas da tardo.
Presentes á chamada 56 srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Adriano Machado, Agostinho Fevereiro, Gonçalves Crespo, Avila, Carrilho, Mendes Duarte, Barros e Sá, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Avelino de Sousa, Barão de Ferreira dos Santos, Carlos do Mendonça, Diogo de Macedo, Costa Moraes, Goes Pinto, Firmino Lopes, Pinheiro Osorio, Francisco Costa, Pereira Caldas, Sousa Pavão, Van-Zeller, Paula Medeiros, Freitas Oliveira, Costa Pinto, Jeronymo Osorio, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Alves, Tavares do Pontes, Frederico Laranjo, Frederico Costa, Figueiredo de Faria, Rodrigues de Freitas, Borges, Pereira Rodrigues, Sousa Monteiro, Sá Carneiro, Lopo Vaz, Luiz de Lencastre, Freitas Branco, Luiz Garrido, Faria o Mello, Manuel d'Assumpção, Correia de Oliveira, Alves Passos, Arai la o Costa, Mariano do Carvalho, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro Correia, Visconde de Balsemão, Visconde de Sieuve do Menezes.
Entraram durante a sessão — Os srs.: Fonseca Pinto, Osorio de Vasconcellos, Tavares Lobo, Alfredo de Oliveira, Alfredo Peixoto, Braamcamp, Pereira de Miranda, Lopes Mendes, A. 3. Teixeira, Arrobas, Pinto de. Magalhães, Pereira Leito, Victor dos Santos, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Cazimiro Ribeiro, Emygdio Navarro, Hintze Ribeiro, Mesquita e Castro, Francisco de Albuquerque, Mouta e Vasconcellos, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Jeronymo Pimentel, Anastacio de Carvalho, Sousa Machado, Pires de Sousa Gomes, José Luciano, Ferreira Freire, Mello Gouveia, Barbosa du Bocage, Julio de Vilhena, Almeida Macedo, Luiz do Bivar, Pires de Lima, M. J. Gomes, Macedo Souto Maior, Pinheiro Chagas, Miranda Montenegro, Pedro Barroso, Pedro Jacome, Visconde de Andaluz, Visconde da Arriaga, Visconde do Moreira de Rey, Visconde de Villa Nova da Rainha.
Não compareceram á sessão — Os srs.: Carvalho e Mello, Alipio Leitão, Torres Carneiro, Emilio Brandão, Pedroso dos Santos, Saraiva de Carvalho, Bernardo de Serpa, Conde da Foz, Moreira Freire, Filippe de Carvalho, Fortunato das Novos, Gomes Teixeira, Palma, Melicio, Barros o Cunha, João Ferrão, J. A. Neves, Almeida e Costa, Ornellas de Matos, Dias Ferreira, José Guilherme, Namorado, Teixeira de Queiroz, J. M. dos Santos, Taveira de Carvalho, Lourenço de Carvalho, Rocha Peixoto, M. J. de Almeida, M. J..Vieira, Nobre de Carvalho, Marçal Pacheco, Pedro Carvalho, Pedro Roberto, Ricardo Ferraz, Rodrigo de Menezes, Thomás Ribeiro, Visconde da Aguieira, Visconde de Alemquer, Visconde da Azarujinha, Visconde do Rio Sado.
Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
Officio
Do ministerio da guerra, acompanhando, em satisfação ao requerimento do sr. visconde do Sieuve de Menezes, nota do assentamento de praça do coronel Silverio José da Cunha.
Declarações
1.ª Declaro que faltei ás sessões de 25 e 26 do corrente por motivo justificado. = Costa Moraes. Enviada á secretaria.
2.ª Declaro que faltei á sessão de 26 do corrente por incommodo do saude. = Luiz de Freitas Branco. Enviada á secretaria.
3.ª Declaro que, se estivesse presente quando se votou a proposta do sr. Rodrigues do Freitas, teria votado contra a sua admissão. = Costa Moraes.
Enviada á secretaria.
4.ª Não tenho podido comparecer ás ultimas sessões por incommodo de saúdo. = O conego, Alfredo Cesar de Oliveira.
Inteirada.
Representações
1.ª Da camara municipal do concelho de Amares, pedindo que não seja approvado o projecto de lei, apresentado na sessão de 24 do mez proximo findo, sem que primeiro se estudem todas as variantes pelo valle do Cavado e pelo do Tamega.
Apresentada feio sr. deputado Alves Passos e enviada á commissão de obras publicas e fazenda.
2.ª Da camara municipal do concelho de Ponte do Sor, pedindo que se decrete que, para avaliações dos bens descriptos em inventarios, a nomeação dos louvados seja restricta ás pessoas das localidades, em que estiverem situados os bens.
Apresentada pelo sr. deputado Navarro e enviada á commissão de legislação civil.
3.ª Dos habitantes da Quinta dos Trigaes, pedindo para serem transferidos para o concelho do Sabugal.
Apresentada pelo sr. deputado Fonseca Pinto e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de estatistica.
4.ª Dos moradores da freguezia de Romeu, pedindo que se legisle do modo que os tres povos de que a freguezia se compõe fiquem pertencendo á comarca de Macedo de Cavalleiros, tambem na parte judicial.
Apresentada pelo sr. deputado Firmino Lopes e enviada á commissão de legislação civil, ouvida a de administração publica.
SEGUNDAS LEITURAS
Projecto do lei
Senhores. — Os moradores da freguezia de Romeu (composta de Romeu, Vimieiro e Valle de Campo), pretendem na parte judicial pertencer á comarca de Macedo do Cavalleiros, como já e sempre pertenceram na parte administrativa, fiscal e politica, porque estão a muito menor distancia de Macedo do que do Mirandella, têem uma estrada que as liga directamente com Macedo, entretém n'esta villa as suas relações commerciaes, o tratam de seus negocios judiciaes ao mesmo tempo que vão pagar contribuições, etc. Alem d'isso têem o juizo ordinario de Alla a uma distancia igual ao terço do que teriam de percorrer para o juizo ordinario de Mirandella,
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Tão pequeno numero de fogos, que não excede a 60, e os limitados haveres de toda a freguezia nada influem na classificação, na importancia da comarca de Mirandella, o ao mesmo tempo é satisfeito o desejo de quasi todos os habitantes e uma necessidade das mais instantes, o que se mostra na representação junta.
Por taes motivos tenho a honra de apresentar o seguinte
PROJECTO DE LEI
Artigo 1.° A freguezia de Romeu (composta das povoações Romeu, Vimieiro e Valle de Campo), pertencente á comarca de Mirandella, passará para a comarca de Macedo de Cavalleiros.
Art. 2.° A mencionada freguezia fica pertencendo ao juizo ordinario de Alla, e ao districto de Cortiços, da referida comarca.
Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.
Camara dos deputados, 26 de abril de 1879. = O deputado pelo circulo n.° 27 (Macedo de Cavalleiros), Firmino João Lopes.
Enviado á commissão de legislação civil, ouvida a de administração publica.
Projecto de lei
Senhores. — O nosso ultramar, para prosperar e desenvolver-se em vantagem sua o da metropole, tem varias necessidades, sendo uma d'ellas a de bons funccionarios publicos que ali levem, com o cabedal da intelligencia e do trabalho, a pratica de negocios e a sciencia do manejo dos serviços publicos.
Para que assim seja é não só justo mas necessario que os poderes publicos não regateiem, aos que vão servir em paragens longiquas e menos salubres, as vantagens justas e equitativas, como fazem nações que podem ser modelo e exemplo em boa administração colonial.
O serviço prestado no ultramar é mais arduo, mais difficil, mais acompanhado de perigos, e por isso mais digno de remuneração.
E de toda a vantagem que os empregados da metropole vão servir nas repartições do ultramar, levar ali a pratica dos negocios e as luzes adquiridas nas repartições do reino, mas sem vantagens ninguem trocará o viver no seu paiz pela vida no ultramar.
Uma das vantagens a que aspiram os empregados publicos é, sem duvida, a reforma mais vantajosa, e não será esta esperança um dos menores incentivos a encaminhar para os serviços do ultramar os entregados nas repartições do reino, o que é de vantagem, como já fica dito.
E demais não é justo que os empregados civis deixem de ter vantagens que já hoje são concedidas aos empregados militares.
Por taes motivos, e levado por taes considerações, tenho a honra do sujeitar á vossa illustrada consideração o seguinte
PROJECTO DE LEI
Artigo 1.° Aos empregados da metropole que servirem em commissão no ultramar será contado pelo dobro para a reforma no reino o tempo que durar a commissão, não sendo o tempo d'esta inferior a tres annos.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 26 de abril de 1879. = Luiz de Lencastre.
Enviado á commissão do ultramar.
O sr. Goes Pinto: — Vou dirigir algumas palavras ao sr. ministro da fazenda, que tenho a honra de ver presente, mas desde já declaro a V. ex.ª que o faço para satisfazer a um dever de consciencia, e não porque tenha muita esperança de que s. ex.ª attenda, como devera, aos meus justos protestos.
Eu venho pela primeira vez a esta casa, mas conheço bastante a historia parlamentar do nosso paiz para me convencer, e com mágua o declaro, que poucas vezes, como na actual sessão, o governo se tem empenhado, de uma maneira notavel, em mostrar a maxima indifferença para com os representantes da nação, embora pretenda mascarar essa indifferença com as mais amáveis palavras que os factos desmentem.
V. ex.ª sabe que levámos dias e dias a instar pela presença dos srs. ministros n'esta casa, e não podendo s. ex.ª esquivar-se ás nossas instancias, começaram por comparecer aqui os srs. Corvo e Sampaio, que todos sabem que occupam no gabinete uma posição perfeitamente excepciona], por motivos que me escuso de indicar.
Quando aqui vinham os outros srs. ministros, e alguns deputados lhes faziam perguntas, todos ouviam dizer, principalmente aos srs. presidente do conselho o ministro das obras publicas: «Meus senhores, façam interpellações, porque nós não podemos estar aqui a responder a sabatinas».
Creio que V. ex.ª sabe o que quer dizer, o que significa fazer interpellações.
Nós estamos com quatro mezes de sessão, já decorreu um mez depois da sessão ordinaria, e, das interpellações annunciadas, apenas se pôde realisar a da Zambezia, e essa ainda assim a muito custo, e na ausencia do sr. ministro que era interpellado.
Creio, por conseguinte, que podemos convencer-nos de que as interpellações que os srs. ministros nos recommendam não têem valor alguns para s ex.as (Apoiados.)
Toda a gente sabe que o serviço dos telegraphos está realmente deploravel. (Apoiados.)
O nosso collega e meu amigo o sr. Navarro, que não vejo presente, annunciou a este respeito uma interpellação, mas tal interpellação ainda não se pôde realisar.
Os contratos Burnay prendem com uma questão que o ministerio não pôde negar que politica e administrativamente é importantissima.
O sr. Luciano de Castro annunciou uma interpellação a este respeito, e o sr. ministro das obras publicas ainda não deu a mais pequena attenção a tal interpellação.
O sr. presidente do conselho vem aqui cheio de uma indignação, que eu quero suppor um pouco fictícia, quando por acaso se põe em duvida que a maioria seja a representação genuina do voto popular; todavia s. ex.ª que ha muito tempo está gerindo a pasta do reino, na ausencia, que eu deploro, do sr. Sampaio, ainda não se lembrou de que o sr. Barros e Cunha annunciou uma interpellação a s. ex.ª, em que eu declarei desejar tomar parte, ácerca do seu procedimento nas eleições geraes.
Creio que s. ex.ª teria n'essa occasião, pelos altos dotes da sua intelligencia, o pelo seu prestigio no seio da representação nacional, um ensejo propicio para mostrar que o governo não tinha faltado aos seus deveres, intervindo nas eleições de uma maneira que eu não quero classificar agora.
Como estas, muitas outras questões desprezadas.
Devo declarar a V. ex.ª, que com esta quasi indifferença do governo para com o parlamento, não me pareço que sejamos nós, a opposição, os mais prejudicados. (Apoiados.)
Mas, ha mais alguma cousa, e agora me refiro muito especialmente ao sr. ministro da fazenda.
Ha um notavel desleixo, que de outro modo o não quero qualificar, em remetter a esta camara documentos e esclarecimentos, que, sem sombra de favor, exigimos no uso plenissimo dos nossos direitos, porque creio que s. ex.as nos não quererão negar a qualidade de juizes dos actos do governo.
Quero contar a V. ex.ª, porque é edificante, o que tem acontecido commigo, com respeito a dois requerimentos que dirigi ao sr. ministro da fazenda.
Em 3 de fevereiro requeri eu a s. ex.ª, entre outros documentos, o seguinte:
(Leu.)
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Penso que toda esta correspondencia pedida em relação a nomeação do segundo official Thomás Gonçalves Vianna, se deve reduzir, naturalmente, a tres officios: um officio da participação da morte do segundo official, que deixou o logar vago; um officio, que naturalmente iria d'aqui, mandando fazer a proposta; e talvez um officio fazendo a proposta ou propostas.
Não fallo da correspondencia particular, que representa actualmente um papel importantissimo, um factor de muita valia, na nossa administração; fallo só" na correspondencia official. (Apoiados.)
Pedi mais:
(Leu.)
Queria ser informado do quaesquer requerimentos, em que se solicitasse o logar vago, e das respectivas informações e despachos.
Que me consto, houve apenas um requerimento, que, já se vê pelo systema do governo de não negar a justiça, mas emmudecel-a, se deixou ficar na gaveta, não tendo despacho algum.
Pedi tambem documentos que se referiam especialmente á demissão tumultuaria que s. ex.ª fez de Adeodato José de Carvalho, primeiro escripturario da repartição de fazenda.
Isto foi em 3 de fevereiro.
No dia 7 de fevereiro, notando eu que se tinha publicado com uma pequena inexactidão o meu requerimento, repeti-o, para simplificar a questão, porque n'esse segundo requerimento eu pedi apenas as informações dadas no anno findo.
Peço desculpa á camara, porém ella comprehende perfeitamente que não posso accusar o sr. ministro, de desleixo, sem que torne esse desleixo bem palpavel.
No dia 27 de fevereiro, estando presente o sr. ministro da fazenda, instei com s. ex.ª para que me mandasse os documentos, e acrescentei as seguintes palavras:
«O meu desejo (de tomar parto na interpellação do sr. Barros e Cunha) será frustrado se s. ex.ª não der as providencias necessarias para que venham á camara os documentos pedidos por mim e por outros srs. deputados.
«Não é justo que eu venha dizer que o sr. ministro da fazenda fez nomeações e demissões gravemente injustas, som que esteja munido dos documentos competentes; á vista d'estes documentos é que eu hei do procurar levar a camara ao convencimento do que o sr. ministro não procedeu como devia.»
S. ex.ª respondeu-me que brevemente enviaria os documentos pedidos, e acrescentou que, vindos elles, e mesmo antes da ordem do dia, podiamos ter uma conversação parlamentar em que s. ex.ª tratasse do justificar a demissão e a nomeação que tinha feito. Essa promessa ficou por cumprir.
Mais tarde, na sessão de 8 de março, tive occasião de me referir a s. ex.ª que me havia dito que tivessemos paciencia, porque eram 148 deputados a pedir documentos. Tratei do mostrar que não havia rasão alguma no que s. ex.ª dissera, porquanto até ao dia 15 de março só haviam sido feitos uns doze ou quinze requerimentos pedindo esclarecimentos pelo ministerio da fazenda, e que, portanto, a observação de s. ex.ª era absolutamente infundada.
Como quer que seja, eu ainda posteriormente instei pela remessa dos documentos, mas estamos a 28 do abril, são decorridos tres mezes depois que eu os pedi, e s. ex.ª ainda os não mandou!
Deixei passar o tempo preciso para me julgar auctorisado a declarar aqui, bom alto, que o sr. ministro da fazenda me não mandou, nem manda, os documentos, porque quer esconder duas violencias, duas odiosas infracções de lei, commettidas por s. ex.ª, com a circumstancia aggravante de ser uma d'ellas destinada a adquirir adhesões na eleição geral de deputados, e a outra destinada a immolar uma victima aos manes da candidatura ministerial de Vianna do Castello.
Eu tenho muito pouca ou nenhuma pratica das discussões parlamentares, e realmente quando tenho de qualificar estes actos, elles por tal modo me impressionam, que receio muito que me acuda aos labios algum adverbio ou adjectivo que V. ex.ª possa ter por extra-parlamentar.
E lei d'este paiz a lei de 23 de dezembro de 1869, que tenho presente, lei firmada pelo nome venerando do muito illustre deputado o sr. Anselmo Braamcamp, meu illustre chefe. Essa lei trata da reforma do serviço das alfandegas, e é lei vigente, porque ainda nada se legislou em contrario.
Diz ella, no seu artigo 62.°, que «as promoções para os logares superiores a aspirantes serão feitas entre os empregados das alfandegas em que se derem as vacaturas, e da classe immediatamente inferior para a superior, sendo alternadamente uma por antiguidade e outra por concurso».
Em duas palavras, o artigo não reconhece outro modo de fazer promoções em logares de alfandegas senão por antiguidade e concurso.
Pois aconteceu que em fins de agosto vagou um logar de segundo official na alfandega de Vianna do Castello, e o sr. ministro da fazenda, arbitrariamente, tumultuariamente, nomeou para esse logar o aspirante mais moderno d'aquella alfandega com prejuizo de todos 03 terceiros officiaes e de todos os aspirantes mais antigos.
Eu posso dizer que não houve outro fim n'este procedimento senão conquistar adhesões para a eleição do deputados, e talvez obedecer a imposições feitas ao ministro por amigos poderosos.
Eu sei que é um bom empregado aquelle que foi nomeado, mas não são menos bons empregados áquelles que foram injustamente preteridos.
V. ex.ª tem muito conhecimento das cousas parlamentares, e talvez me possa dizer que nome hei de dar a este facto, a esta audaz violação de lei.
Dir-me-hão, como já se me disse, que s. ex.ª, conquistando adhesões por uma simples nomeação, por outro lado talvez afastasse de si os votos d'aquelles que eram preteridos.
Mas s. ex.ª, que é muitissimo prudente, salvo quando escreve áquelles celebres relatorios de fazenda, que se bandearam para a opposição, não deixou seguramente de, muito paternalmente, avisar os empregados da alfandega de que a demissão, ou, pelo menos, a transferencia, seria o premio de quem acreditasse, sob o regimen do sr. Fontes, na liberdade do voto.
Mas o sr. ministro fez mais, foi mais longe; quando viu perdida a candidatura do meu nobre adversario, que s. ex.ª indicava como o braço direito do governo nas questões de fazenda, com um amavel sorriso, mas com o mais feroz dos decretos demittiu um primeiro escripturario da repartição de fazenda, um grande influente eleitoral, que dispõe da totalidade... do seu voto!
Eu tambem pedi todos os documentos que dissessem respeito a esta demissão, porque seria possivel que ella fosse de algum modo justificada; mas, se esses documentos existissem, prezando s. ex.ª devidamente o seu logar, não se leria demorado em os mandar.
Eu não quero acreditar, nem por um instante, que s. ex.ª tenha querido dar tempo a que nas repartições de fazenda do districto do Vianna se forjassem processos... posthumos com relação ao pobre empregado demittido.
Mas, sabe V. ex.ª porque aquelle empregado, que aliás é muito. activo, intelligente e zeloso, conforme o demonstram as certidões passadas pelo actual delegado do thesouro e por muitos escrivães de fazenda; sabe V. ex.ª porque elle foi assim cruelmente demittido? Porque parece que não votou no seu director geral!
No sabbado, vespera da eleição, o escrivão de fazenda
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disso aos empregados: «Amanhã, domingo, os senhores vão a minha casa buscar a lista official». Eram, provavelmente, as ordens do delegado do thesouro.
Estas listas eram feitas com muito methodo. Escriptas em meia folha de papel almasso, a do escrivão de fazenda tinha o n.° 1, a do escripturario demittido o n.º 2; e assim seguidamente pela ordem de hierarchia na repartição. Os methodos variaram n'aquella eleição. Para o governo civil disse-se — que se não distribuiam listas áquelles empregados, porque seria bonito que cada empregado apresentasse a lista escripta pelo seu proprio punho.
Seria bonito! V. ex.ª sabe o que isto quer dizer n'uma terra pequena onde se conhece a calligraphia de cada funccionario I (Apoiados.)
O empregado demittido não foi buscar a lista, e o administrador do concelho, que estava presente ao escrutinio, e creio mesmo que não estava lá para outra cousa, deu noticia de que fallava a lista n.° 2. Participação ás repartições superiores; processo summario; demissão!
Ora eu creio que isto não é serio, nem justo, nem gravo da parte Tio governo. (Apoiados.)
Dizer a um empregado: «Fique sem pão, já que o seu director geral ficou sem uma cadeira no parlamento», será muito amavel para o candidato vencido, mas é um acto revoltantemente injusto. (Apoiados.)
Pergunto, por consequencia, ao sr. ministro da fazenda se s. ex.ª quer ou não remediar estes dois actos, que são absolutamente injustos o da nomeação feita contra lei, e o da demissão tambem contra lei.
O demittido não foi ouvido conforme creio ser de direito commum. Fez um requerimento para que se lho dissesse quaes as rasões da sua demissão. Silencio absoluto da parte do sr. ministro da fazenda!
Pergunto a s. ex.ª, repito, se quer do algum modo remediar estes dois actos, aliás eu apresentarei dois projectos de lei, que provavelmente a maioria da camara rejeitará, -mas que no futuro alguem converterá em lei, fazendo justiça.
Cumpri o meu dever como soube e pude; o sr. ministro que cumpra o seu. Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O sr. Ministro da Fazenda: — O illustre deputado dirigiu varias arguições ao governo. A primeira foi que os ministros não estavam presentes na camara antes da ordem do dia, para responder ás perguntas o interpellações dos illustres deputados.
Ha quinze dias que tenho vindo constantemente á camara e tenho estado presente antes da ordem do dia. No principio d'esta sessão legislativa aqui estive tambem muitas vezes, o se durante algum tempo deixei de vir, foi porque na outra casa do parlamento houve largas discussões a que linha de assistir, e algumas vezes me inhibiram de o fazer os negocios do que tinha a tratar na secretaria. Parece-me, pois, que não posso ser accusado de não estar aqui para responder aos illustres deputados. (Apoiados.)
Outra arguição é que se tem annunciado varias interpellações, que não se têem verificado. É verdade, mas o illustre deputado não póde provar que se tem malbaratado o tempo em discussões inuteis, em assumptos que não são da maxima conveniencia para o paiz. (Apoiados.) Estamos discutindo o orçamento; não digo que as interpellações não são necessarias e muito convenientes, mas o orçamento não o é menos. (Apoiados.)
Começámos já as sessões nocturnas. Não "se póde dizer que tenham sido preteridos negocios importantes. Não se têem discutido algumas interpellações. Era absolutamente impossivel tel as discutido todas, a menos que se não discutissem projectos urgentes, como áquelles que se têem discutido, como é, entre outros, o orçamento.
Mas, finalmente, a principal arguição foi por não ter mandado á camara os esclarecimentos podidos por a. ex.ª
São tantos os que tenho mandado para a camara, que não sei se os que s. ex.ª pediu vieram; mas mandar todos os que se lêem pedido era completamente impossivel no tempo que tem decorrido desde que a camara se abriu. Se a secretaria não fizesse outra cousa senão tirar copia dos documentos pedidos poios srs. deputados, e pelos dignos pares, que têem igual direito, ainda assim talvez não coubesse no tempo.
Tomei agora nota dos documentos pedidos pelo illustre deputado, a que acabou de se referir, e vou mandal-os.
A respeito da nomeação do um segundo official da alfandega, e da demissão, que s. ex.ª reputou illegal o tumultuaria, direi que a nomeação do segundo official foi feita em harmonia do decreto do 27 do dezembro de 1869, porque sómente os logares das alfandegas, superiores a aspirante, são preenchidos alternadamente por antiguidade ou concurso. Para os outros não está esta regra estabelecida na lei.
Ora, os logares de aspirantes das alfandegas de Lisboa o Porto correspondem aos de segundos officiaes das alfandegas do segunda classe maritimas, como é a de Vianna do Castello, e aos primeiros officiaes das alfandegas da raia. E todos os ministros têem entendido a lei, considerando que sómente estão sujeitos á regra alternada da antiguidade e do concurso os logares superiores ao do aspirante das alfandegas de Lisboa o Porto. Para todos os outros é livre a escolha do governo.
E não houve governo nenhum que mandasse abrir concurso para os logares inferiores. (Interrupção do sr. Goes Pinto.)
Sempre se entendeu que os logares inferiores a aspirantes das alfandegas de Lisboa e Porto eram da livro escolha do governo, e este, sem abrir concurso e sem seguir a antiguidade, nomeia o que lhe parece mais apto.
Eu interpretei a lei da maneira como a têem interpretado todos os ministros. -
Diz-se que eu despachei o mais moderno dos empregados da alfandega de Vianna. (Interrupção.)
Diz o illustre deputado que eu linha promovido o mais moderno, mas s. ex.ª sabe que os aspirantes se classificam por grupos de alfandegas, e, portanto, podia muito bem ser que o empregado de que se trata fosse o mais moderno dos ires de Vianna do Castello, o não o mais moderno do todo o grupo das alfandegas da mesma classe. O caso e se elle era apto.
Portanto, a nomeação foi perfeitamente legal; podia ser inconveniente, é verdade, se esse empregado não fosse capaz; mas creio que o era.
Referiu-se tambem o illustre deputado á demissão tumultuaria de um escripturario.
O governo está perfeitamente no seu direito demittindo e nomeando escripturarios, porque não ha lei alguma que estabeleça regras para a sua nomeação ou demissão, e, portanto, o governo não procedeu tumultuariamente, como disse o illustre deputado.
Direi a s. ex.ª, já que classificou esta questão como uma vingança eleitoral; direi, repito, que entendo que os empregados não devem ser nomeados nem demittidos por questões eleitoraes; mas 6 opinião minha que os empregados de fazenda não devem intrometter-se em eleições, de maneira que comprometiam as funcções que representam, e lauto que, por occasião da ultima eleição geral, eu expedi circulares n'este sentido.
Não trato de indagar minuciosamente, nem me parece conveniente que se possa levar tão longe essa indagação, quaes os empregados que, em todo o paiz, trabalharam em eleições, para os demittir, porque é difficil separar-se do empregado a sua qualidade de homem e a sua qualidade do empregado, para se saber se abusaram, ou não, da sua influencia de funccionarios.
Todos os empregados da fazenda têem mais ou menos
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influencia sobre os contribuintes, mas eu desejaria muito que elles não se occupassem de eleições, nem a favor nem contra o governo.
Creio que houve apenas tres em todo o paiz, posto que intervieram nas eleições a favor ou contra o governo muitos empregados, mas parece-mo que houve apenas uns tres empregados que me foram apresentados como estando nas circumstancias de se dever lazer recair sobre elles o rigor da lei, que prohibe a intervenção dos funccionarios na lucta eleitoral.
Creio mesmo que não procedi contra todos os que, como taes, me foram apresentados; apenas o fiz a alguns, o este a que o illustre deputado se referiu é provavelmente um d'elles.
Lembro-me ainda do outro, a respeito do qual me constou que não era mau empregado, e que por isso deve ser readmittido na primeira occasião.
Eu já disse que podemos muito bem applicar uma disposição que me parece muito rasoavel, o é que, quando o governo se vê obrigado a demittir por quaesquer circumstancias um empregado, se a falta não é tão grave, não é tão seria, que elle deva ficar para sempre privado do seu logar, e, sobretudo, se elle é a outros respeitos bom empregado, depois do algum tempo o torne a admittir, porque tem já alguns mezes de privação do seu logar para o castigar pela falta commettida. O mesmo digo a respeito d'este a que o illustre deputado se referiu.
O illustre deputado perguntou se eu estava resolvido a readmittir este empregado; eu respondo que, se tiver d’elle boas informações, não terei duvida em assim proceder.
Em todo o caso, nem na demissão d'este empregado, nem na nomeação do segundo ciliciai de Vianna do Castello, eu exorbitei da lei ou pratiquei algum acto tumultuario.
O sr. Goes Pinto: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se me dá licença para dizer duas palavras ácerca d’este assumpto.
A camara resolveu affirmativamente.
O sr. Goes Pinto: — Começo por agradecer a demonstração que a camara acaba de me dar, demonstração que realmente muito me penhora, o vou corresponder a ella, sendo o mais breve que possa.
Finalmente, encontro no sr. ministro da fazenda o meu antigo professor, o homem para mim digno de todos os respeitos! Finalmente encontro-o, porque s. ex.ª disse que, se tivesse boas informações a respeito do empregado a que me referi, não teria duvida em o readmittir.
Creio que da rainha parte seria injusto, e mesmo pouco generoso, continuar n'este momento a tratar este assumpto; e tanto que, tencionando eu mostrar á camara e a s. ex.'1 um manifesto a favor da politica do governo, assignado por um empregado de fazenda. o que significa uma verdadeira propaganda, podendo mesmo mostrar, firmados pela mesma assignatura, convites para reuniões politicas, não o farei, em vista da maneira por que o sr. Antonio de Serpa me respondeu.
Ainda assim insto novamente com s. ex.'1 para que se digne fazer-mo o favor de me mandar os documentos que pedi, a fim de que depois em occasião opportuna possamos tratar este assumpto mais largamente.
Agradeço á camara, repito, a sua benevolencia; e agradeço ao sr. ministro da fazenda a resposta que me deu, a qual, todavia, me não impedirá do em tempo competente contestar algumas das asserções de s. ex.ª.
O sr. Freitas Oliveira: — Por motivo justificado, tive de retirar-me antes de terminar a sessão do sexta feira, e não pude comparecer na sessão de sabbado.
Constou me, porém, que n'essa sessão houve uma votação nominal, sobre se se devia ou não admittir á discussão um projecto apresentado pelo illustre deputado, o sr. Rodrigues de Freitas, para se reduzir a lista civil.
Como eu não desejo que seja interpretada a minha ausencia como um proposito do fugir a dar a minha opinião sobre este assumpto, vou declarar o meu voto; e não faço agora considerações algumas sobre o relatorio do projecto e sobre as rasões em que se fundou o illustre deputado para, o apresentar, porque não quero tomar o tempo á camara, nem renovar n'este momento uma questão que poderá apparecer em occasião mais opportuna.
O meu procedimento, se estivesse presente, quando se propoz se o projecto devia ser admittido á discussão, era o mesmo que tive em 1869, quando dois deputados, não republicanos, mas monarchicos, apresentaram uma proposta analoga á do illustre deputado; eu admittiria á discussão, essa proposta para a combater e para a rejeitar.
E exactamente o que fazia se estivesse presente quando o illustre deputado, o sr. Rodrigues de Freitas apresentou o seu projecto. (Apoiados.)
O sr. Pereira Caldas: — Desejava lazer algumas observações ao sr. ministro das obras publicas, mas como s. ex.ª não está presente, pedia ao sr. ministro da fazenda o obsequio de lhe transmittir as que vou fazer, o que são poucas.
Por cartas que n'este instante acabo de receber do Algarve, consta que corre ali como certo que o governo mandou suspender todos ou quasi todos os trabalhos das obras publicas n'aquelle districto.
No caso que isto assim seja, desejava lembrar ao sr. ministro das obras publicas a conveniencia de continuar os trabalhos d'aquella provincia, porque infelizmente as classes menos favorecidas da fortuna continuam a ser opprimidas pela miseria resultante da crise agricola, que ha uns poucos de annos afflige a provincia do Algarve.
S. ex.ª sabe perfeitamente que os desgraçados que luctam com os horrores da fome e da miseria não têem culpa das irregularidades que, porventura, se tenham praticado na direcção das obras publicas do Algarve; e continuando a existir 03 mesmos motivos que tem justificado o auxilio que o governo tem prestado até agora aquella provincia, eu pedia, portanto, ao sr. ministro das obras publicas que se servisse tomar as providencias necessarias para que os trabalhos n'aquelle districto continuassem até que se realisassem as colheitas pendentes.
Ha. mesmo obras que é uma necessidade concluir, para serem convenientemente utilisadas, como, por exemplo, a ponte de. Santo Estevão que serve para ligar a estrada do S. Bartholomeu de Messines ao porto de Lagos, assim como a estrada de Silves ao porto do Lagos.
Reconheço que o Algarve tem sido já bastante pesado ao thesouro, mas estou inteiramente convencido que o paiz não ha de levar de certo a mal que o governo continue a dispensar o seu valioso auxilio aquella provincia, a fim de acudir aos desgraçados que luctam com a fome o com a miseria, e que carecem de trabalho para viver.
Espero, pois, que o sr. ministro tomará na consideração que merece este meu pedido.
O sr. Fuschini: — Mando para a mesa o parecer das commissões reunidas, de fazenda o obras publicas, sobre a proposta do governo para a construcção de uma ponto sobre o Douro em frente da cidade do Porto.
O sr. Costa Moraes: — Mando para a mesa a declaração de que faltei ás duas ultimas sessões por motivo justificado, bem como a declaração de que, se estivesse presente quando se sujeitou á votação da camara a admissão _ á discussão do projecto do sr. Rodrigues de Freitas, tel-o-ía rejeitado.
O sr. Fonseca Pinto: — Por parte da commissão do poderes mando para a mesa um parecer da mesma commissão, relativo á eleição pelo circulo n.° 146, Timor.
Esta eleição não offerece duvida alguma. O processo eleitoral correu com a maxima regularidade. Não houve reclamação. O sr. deputado apresentou o seu diploma em fórma legal, e acha se n'esta casa em virtude da eleição anterior, exercendo as suas funcções.
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Rogo, pois, a V. ex.ª se digno consultar a camara sobre se dispensa o regimento, a fim do entrar desde já em discussão este parecer.
O parecer é o seguinte:
Parecer
Senhores. — A vossa commissão de verificação de poderes examinou com detida attenção o processo eleitoral relativo ao circulo n.° 149, Timor, e tem a honra do submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte parecer.
Mostra o processo que, nas differentes assembléas de que o circulo se compõe, se procedeu no dia 29 de dezembro do anno preterito á eleição de um deputado, o tendo entrado na uma 430 listas, numero igual ao das descargas feitas nos cadernos do recenseamento, obteve o cidadão Pedro Augusto Correia da Silva, escriptor publico, residente em Lisboa, 427 votos, e o cidadão Jacinto da Gama, 3 votos; e attendendo a que o acto eleitoral correu com a maxima regularidade em todas as assembléas, porquanto nem as actas das differentes assembléas primarias e de apuramento asseveram a preterição de formalidades legaes, nem contra a eleição se apresentou protesto ou reclamação alguma.
Attendendo a que o cidadão mais votado obteve a maioria absoluta dos votos do numero real dos votantes, nos termos prescriptos no artigo 33.° da lei de 23 de novembro de 1859, o apresentou o seu diploma em devida fórma:
A vossa commissão é de parecer que esta eleição deve ser approvada, e proclamando-se deputado o cidadão Pedro Augusto Correia da Silva.
Sala da commissão, 28 de abril de 1879. — Visconde de Sieuve de Menezes — Antonio Telles de Vasconcellos Pimentel = Manuel Correia de Oliveira = Luiz de Lencastre = J. M, Borges — Agostinho José da Fonseca Pinto.
Dispensou-se o regimento para entrar em discussão, e foi logo approvado.
O sr. Adolpho Pimentel: — Desejava lazer um pedido ao sr. ministro das obras publicas, mas como o não vejo presente, espero que o seu collega da fazenda terá a bondade de lh'o transmittir.
Seja-me antes, porém, permittido congratular-mo por que um illustre deputado da opposição, o sr. Pereira Caldas, ha pouco acabasse de pedir ao sr. ministro das obras publicas, que mandasse continuar os trabalhos que lhe constava se achavam parados no Algarve.
E digo que folgo com isto, porque sendo as circumstancias extraordinarias por que estava passando aquella importante região, que mais imperiosamente determinaram áquelles trabalhos, e continuando as mesmas circumstancias, isto é, a miseria entre os povos daquella provincia, entendo que o governo os não deve deixar morrer á miseria, e, por conseguinte, a melhor maneira do o conseguir é dar-lhe meios de, pelo trabalho, ganharem a sua subsistencia.
Folgo, pois, de que um membro da opposição venha justificar as obras extraordinarias que ali se fizeram. Foi necessario dispensarem-se as formulas legaes e ás vezeos demoradas de orçamentos conscienciosa e minuciosamente organisados, para se dar todo o desenvolvimento aos trabalhos de viação publica.
E esta a explicação da palavra folgar, por mim empregada, e nunca porque eu me alegrasse com a existencia d'essa miseria, que eu sou o primeiro a lastimar que opprima povos tão laboriosos, como os da provincia do Algarve. (Apoiados.)
O pedido ao sr. ministro das obras publicas era para que s. ex.ª desse as providencias que julgasse mais rasoaveis, a fim de que terminasse o inconveniente altissimo, que se dá no caminho de ferro do Minho, porque ha na estação de Nine um trasbordo prejudicial tanto para os passageiros, como para quem envia mercadorias. (Apoiados.)
O sr. Alves Passos já ha mais de um mez chamou a attenção de s. ex.ª para este assumpto, e eu, tendo a honra de representar o concelho do Braga na junta geral do districto, consegui que na consulta d'aquella junta algumas considerações se fizessem, apresentando estes inconvenientes, e ao mesmo tempo mostrando a necessidade de se fazer alguma cousa para o remediar.
Hoje que tenho a honra de representar o circulo de Barcellos n'este parlamento, não posso ficar silencioso, e deixar de chamar a attenção do governo para este inconveniente, por isso que elle não só prejudica todos os que viajam n'aquella linha ferrea, ou que tem de mandar mercadorias, mas prejudica principalmente os povos de Barcellos e Braga. (Apoiados.)
Como disse, a junta geral de districto já ha dois annos, na sua consulta, fazia ver a conveniencia de remediar este mal, já a camara municipal de Braga creio que representou n'esse sentido, bem como a associação commercial; parece-me, pois, impossivel que o governo deixe de attender a tão justo pedido.
Esta questão de trasbordo de passageiros e baldeação de mercadorias não é só um incommodo, mas representa uma despeza importante até para a exploração da linha.
Não sou homem technico, mas tenho-lhes ouvido dizer, que o trasbordo não sei se é computado em 8 a 10 por cento da despeza de exploração.
Ora, creio que isto se póde remediar sem grande difficuldade, havendo, por exemplo, em Nine uma machina de força superior, que podesse conduzir os dois comboios; ou então, caso isso não podesse ter logar, construir no local que fica entre a linha do ramal de Braga o Vianna um grande barracão ou telheiro onde se podesse fazer esse trasbordo sem que, quando chovesse, tanto os passageiros como as mercadorias se molhassem, porque é este um incommodo de tal ordem, que só quem tem por ali passado é que sabe bem aprecial-o.
isto quanto ao ministerio das obras publicas.
Emquanto ao ministerio do reino, renovo o pedido que fiz ha tempos ao sr. ministro do reino, chamando a sua attenção para o estado da instrucção secundaria.
Ha dias, visitando a cidade de Evora, fui ali procurado por uma commissão escolastica, para me agradecer o eu ter chamado a attenção do governo sobre este importantissimo assumpto, e pedindo-me que continuasse a insistir com o governo para que elle tomasse uma resolução qualquer a este respeito, a fim de melhorar o estado actual, que julgavam pessimo.
Disse a essa commissão, que me procurou, que nada tinha que agradecer-me, porque como representante do paiz cumpri o meu dever advogando os interesses da instrucção secundaria, e chamando a attenção do governo para este assumpto.
Disseram que representariam aos poderes publicos, principalmente a esta camara, e enviariam a representação ao illustre deputado por Evora; hoje communicaram-me que essa representação tinha sido enviada ao solicito representante d'aquelle circulo, o meu particular amigo José Maria dos Santos.
Cumprindo o que prometti aquella commissão, bem como a uma outra do lyceu de Braga, novamente insisto sobre este assumpto, chamando para elle a attenção do governo, porque se a reforma da instrucção secundaria não poder ser apresentada a tempo de ser discutida, é necessario que o governo tome alguma providencia a tal respeito, porque estamos na vespera dos exames.
Talvez houvesse um alvitre rasoavel, e que já foi seguido pelo governo, mas com importante despendio para o thesouro, e que não sendo seguido tão largamente como então, mas de uma maneira mais economica, podia trazer vantagem para o ensino sem haver grande inconveniente para o thesouro, nem para os rapazes que frequentam os lyceus districtaes.
Esse alvitre é o seguinte: em logar d'essas chamadas grandes ambulancias do examinadores se formasse um pe-
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queno grupo do professores do magisterio superior ou das pessoas que fossem mais competentes nas materias das disciplinas que nos lyceus se professam, indo para cada lyceu uma pequena commissão de tres membros um competente em linguas; outro n'aquellas disciplinas principalmente preparatorias das sciencias physico-mathematicas, como mathematica elementar, introducção e desenho; e o terceiro competente em historia, geographia, oratoria e philosophia, preparatorio este indispensavel para todo e qualquer ramo do instrucção superior.
Esta pequena commissão ambulante junta ao professorado dos differentes lyceus faziam os exames, sem prejuizo para o ensino e com vantagem para todos.
Este alvitre pôde ser desde já adoptado pelo governo. O que 6, porém, necessario é que termine o actual estado, que é não só inconveniente para a instrucção, mas acha-o vexatorio para os estudantes, e offensivo para a dignidade dos professores dos lyceus districtaes.
Espero que o sr. ministro da fazenda communicará aos seus collegas do reino e obras publicas as modestas considerações que acabo de fazer, e á camara agradeço a indulgencia com que se dignou escutal-as.
O sr. Figueiredo de Faria: — Mando para a mesa duas representações: uma da camara municipal da Villa do Conde, e outra da camara municipal da Povoa de Varzim pedindo a approvação do projecto apresentado em 24 do mez passado para o prolongamento do caminho de ferro de via reduzida que vae do Porto a Villa Nova de Famalicão até Chaves, e que tem dois ramaes; um que partindo da Regua passa por Villa Real e o outro por Amarante.
Este caminho corta o interior do duas ricas provincias do Minho e Douro.
Peço a V. ex.ª que mande estas representações á commissão competente, e peço tambem que consulte a camara sobre se permitte que sejam publicadas no Diario, a exemplo do que se tem praticado com outras identicas.
O sr. Avelino de Sousa: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Celorico de Basto, e outra da camara municipal do concelho de Mondim, em que se pede para que seja approvado o projecto de lei, apresentado n'esta casa, em sessão de 22 do passado mez, pelo illustre deputado o sr. Sá Carneiro, attinente a construcçâo do caminho de ferro, de via reduzida, de Famalicão a Chaves, e de Cavez, pelo valle do Tamega, a Amarante e Villa Pouca.
Sabem todos, sr. presidente, a importancia das vastas regiões que estas linhas são destinadas a atravessar, e ninguem ignora que toda a circumscripção territorial, comprehendida pelo valle do Tamega, não tem uma só estrada que dê exportação aos seus valiosos fructos.
Os concelhos de Celorico do Basto e Mondim, notavelmente ricos pela sua excellente producção vinicola, densidade de população, riqueza pecuária e feracidade do solo, têem sido tão desconsiderados, o tanto e tão injustamente, que, como expuz, não têem uma unica estrada.
A approvação, pois, do projecto em questão, satisfazendo uma necessidade de incontestavel interesse geral, attenua tambem, até certo, ponto, a injustiça flagrante de que áquelles todos têem sido victimas.
Mando a representação para a mesa, a fim de que se lhe dê o competente destino.
O sr. Mariano de Carvalho: — Vou mandar para a mesa um requerimento, pedindo com urgencia pelo ministerio das obras publicas alguns documentos, e peço mesmo os originaes.
Para ver se aplaco as iras do sr. ministro das obras publicas contra mim em relação aos pedidos de documentos, acrescentarei que não demorarei por mais de quarenta e oito horas o processo que peço agora.
O que posso assegurar á camara é que este negocio é gravissimo.
Ha uma empreza, cuja denominação não conheço bem, a qual trabalha na fabrica de vidros da Marinha Grande, que a tom arrendada creio que até 1894 por 2:050$000 réis, concedendo-se-lhe 12:000 carradas de lenha dos pinhaes nacionaes. Esta empreza parece ter conseguido agora que se lhe concedam mais 4:000 carradas de lenha por um preço barato, ou gratuitamente.
Este negocio é gravissimo, não tanto por se ter concedido a um particular uma propriedade do estado, como porque esse facto é a morte das outras fabricas de vidros que não têem as mesmas vantagens que desfructa a fabrica da Marinha Grande.
Se ella já tinha doze mil carradas de lenha gratuitamente, se dispunha de pessoal habilitado pertencente á fabrica, se desfructava officinas vastas e apropriadas, e se se lho dão agora mais quatro mil carradas de lenha por um preço barato, ou gratuitamente, é evidente que as outras fabricas não podem concorrer com ella.
Ha em Lisboa tres ou quatro fabricas de vidros que, alem de comprarem a lenha, pagam por ella o imposto do consumo, e, portanto, se se concedem aquella todas estas vantagens é clarissimo que as fabricas de Lisboa não podem fazer concorrencia á da Marinha Grande.
Peço a V. ex.ª que inste, tanto quanto for possivel instar, com o sr. ministro das obras publicas para que s. ex.ª mande para a camara estes documentos, e mando para a mesa o meu requerimento.
E o seguinte:
Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se remetta com a maxima urgencia a esta camara todo o processo original, relativo a uma concessão de lenhas pedida pela empreza da fabrica de vidros, da Marinha Grande.
O processo não será demorado mais que quarenta e oito horas.: — Mariano de Carvalho.
Enviado á secretaria para expedir com urgencia.
ORDEM DO DIA
Continua a discussão do orçamento do ministerio da fazenda
O sr. Lopo Vaz: — Succede no uso da palavra sobre o orçamento e sobre a questão de fazenda ao illustre deputado o dr. Emygdio Navarro, que é sem duvida um dos talentos mais brilhantes da actual opposição parlamentar e que é tambem, folgo de dizel-o, meu antigo amigo.
Fomos companheiros nas lides academicas, fomos condiscípulos no curso da faculdade de direito na universidade de Coimbra, e por isso estou habituado ha muito a apreciar e a admirar as magnificas manifestações do seu talento, e a vastidão dos seus conhecimentos acrescentados dia a dia pela assiduidade incansável no trabalho de que tem sempre dado provas.
Se eu chego por momentos a convencer-me de que poderei responder satisfactoriamente ás observações feitas pelo illustre deputado contra o governo e principalmente contra a administração financeira da actual situação, não é porque eu tenha demasiada confiança nos meus recursos para combater s. ex.ª, mas porque confio na justiça da causa, que defendo e na natureza da administração do governo actual.
O illustre deputado e meu amigo fez sobre o assumpto considerações especiaes, relativas ao capitulo que se discute, e observações geraes, relativas á questão de fazenda.
Ma primeira categoria avulta principalmente a opinião, que s. ex.ª manifestou, pronunciando-se contra o systema de juro e amortisação, segundo o qual tem sido feita a emissão das obrigações dos caminhos de ferro do Minho o Douro, e já o illustre deputado e meu amigo o sr. Mariano do Carvalho, se não me engano, tinha emittido a mesma opinião.
Não ha duvida que em theoria a opinião de s. ex.as é ou póde ser verdadeira, porque mal se comprehende, e não parece mesmo que seja uma regra normal de administração o estabelecer-se amortisação das dividas do estado,
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quando o estado carece do recorrer annualmente ao credito para saldar o seu orçamento ordinario.
Mas nos dominios da pratica e da sciencia politica, nos dominios da sciencia da governação publica, os principios abstractos são modificados pelas verdades experimentaes conhecidas pela experiencia, corroboradas pela observação o justificadas pelas conveniencias e necessidades da nação.
Comprehende-se praticamente, sem existir o equilibrio orçamental, sem estar equiparada a receita com a despeza ordinaria, que em vista das necessidades de um povo, convenha estabelecer o principio do juro e amortisação para uma certa especie de titulos fiduciarios, e esta hypothese póde dar-se e dá-se em relação aos titulos dos caminhos do ferro e em relação aos de outros melhoramentos materiaes com que se pretende dotar o paiz n'um praso mais ou menos longo.
O principio estabelecido da amortisação estabelece um favor especial para os titulos d'esta especie, e tanto mais especial o tanto mais justificado, quanto são os caminhos de ferro que fomentam notavelmente o desenvolvimento das receitas publicas, concorrendo assim poderosamente para o futuro equilibrio orçamental. Alem da influencia que têem no desenvolvimento da riqueza publica, os caminhos de ferro têem receita sua, produzem directamente e immediatamente rendimentos para o estado, que, embora na actualidade sejam inferiores aos encargos das sommas despendidas, serão superiores a esses encargos em um futuro mais ou menos proximo, e, portanto, facilmente se justifica que se conceda o favor especial da amortisação para os titulos representativos das sommas despendidas em caminhos de ferro, embora as circumstancias financeiras não permittam estender desde já esse favor a todos os titulos de divida publica.
Na actualidade, em que não existo entre nós o equilibrio orçamental, a amortisação gradual e successiva das obrigações dos caminhos do ferro acha a sua justificação na conveniencia de proteger especialmente uma especie do titulos que têem do ser lançados em alta escala ao mercado, a fim de levarmos a effeito a rede dos nossos caminhos de ferro. E uma protecção e garantia que se lhes dá, no intuito do attrahir para elles os capitães disponiveis, nacionaes e estrangeiros.
Esta garantia estende-se ao presente e tambem ao futuro.
Estende-se ao presente, porque desde já se vae effectuando a amortisação. Estende-se ao futuro, não só porque essa amortisação continuará até á completa extincção dos titulos amortisaveis, mas ainda por outro motivo.
Se logo que se estabelecer o equilibrio entre a receita ordinaria e a despeza ordinaria, se decretasse a amortisação successiva de toda a nossa divida publica, sem distincção da que foi destinada a caminhos de ferro, está visto que a percentagem de amortisação seria muito inferior á que se poderia estabelecer se a amortisação fosse só extensiva á parte da divida destinada á construcção de caminhos de ferro.
Os capitães disponiveis, que procuram collocação nas obrigações dos caminhos de ferro, têem, pois, desde já a garantia de que, ainda que no futuro se estabeleça o principio da amortisação da nossa divida publica, o quantitativo ou percentagem annual da amortisação d'aquellas obrigações nunca será inferior ao que foi fixado por occasião da emissão, qualquer que seja e por minimo que seja o quantitativo ou percentagem annual da amortisação, que no futuro venha a estabelecer-se para os demais titulos de divida publica.
Assim o entendeu a Belgica, assim o entenderam as nações cultas, porque quasi todas estabeleceram tambem a amortisação das obrigações dos caminhos de ferro, quando não haviam ainda realisado o equilibrio orçamental.
De resto, esta questão não merece mais larga discussão, porque não é uma questão de principios fundamentaes da sciencia da governação publica, mas sim uma questão de fórma de administração, uma simples questão de conveniencias, as quaes, como acabo de mostrar, não podem ser contestadas.
O illustre deputado é meu amigo, o sr. Emygdio Navarro, empenhou-se tambem em demonstrar, em relação á politica financeira do governo actual, que este é contradictorio, porque fez promessas que não cumpriu, porque prometteu extinguir o deficit orçamental, que, em logar de se extinguir, augmenta de dia para dia. S. ex.ª acrescentou que o governo se enganara, ou enganara o paiz, nos calculos orçamentaes, o que em qualquer dos casos o logar d'elle não era ali, porque devia saír d'aquellas cadeiras o abandonar o poder a quem não se enganasse, nem enganasse o paiz, a quem não fosse contradictorio.
Creio que o governo não se enganou, nem enganou o paiz. O governo póde ter formulado melhor ou peior os calculos orçamentaes, e a realidade dos factos póde não ter correspondido exactamente aos calculos feitos.
Tem acontecido isto a todos os governos, (Apoiados.) o todos sabem que é impossivel prever com exactidão todas as receitas ordinarias e todas as despezas ordinarias. O proprio regulamento do contabilidade, prefixando os preceitos segundo os quaes devera ser calculadas as receitas, é um obstaculo poderoso á perfeita e inalteravel conformidade entre a importancia das receitas calculadas e a das receitas cobradas, porque se é difficil e talvez impossivel prever a natureza e o numero de todas as circumstancias, que hão de actuar através dos tempos no augmento das receitas publicas, é muito mais difficil, mais do que isso, é absolutamente impossivel prever com exactidão a intensidade o a extensão em que essas circumstancias hão de actuar no desenvolvimento da receita ou da riqueza da nação em um determinado anno economico.
Mas se este facto fosse motivo para a queda do governo, era preciso tambem que houvesse para o substituir um partido qualquer, que no poder não se tivesse enganado tambem nos mesmos calculos e nas mesmas promessas. (Apoiados.)
E isso exactamente o que não ha.
Disse o illustre deputado que o governo tinha promettido extinguir o deficit de uma só vez, e comtudo o deficit permanece constantemente no orçamento.
É preciso que interpretemos as palavras do sr. presidente do conselho, porque me parece que ellas têem significação muito diversa da que lho tem sido attribuida, o da que aqui expoz o illustre deputado, o sr. Dias Ferreira, que sinto não ver presente, e que manifestou e desenvolveu o seu pensamento, pretendendo demonstrar que o deficit devo ser extincto de uma só vez por meio do augmento das receitas e da diminuição das despezas.
As palavras do sr. presidente do conselho devem ser entendidas em termos habeis.
Quando s. ex.ª disse que o deficit se extingue por uma vez, ou não se extingue nunca, não quiz affirmar que devia ser extincto immediatamente, de uma só vez e ora um só anno.
Estas palavras querem dizer exactamente o contrario d'isto; querem dizer que o equilibrio orçamental permanente e definitivo não póde obter-se artificialmente, mas sim pelo desenvolvimento successivo das receitas ordinarias e pelo desenvolvimento successivo das despezas ordinarias, reclamado pelas necessidades do serviço e conveniencias da nação, do tal arte que a progressão da despeza ordinaria seja menor do que a progressão da receita ordinaria..
É assim que o deficit se extingue, e não supprimindo artificialmente despezas que sejam necessarias para a regularidade e pontualidade dos serviços, não é acrescentando artificialmente impostos, que possam affectar as fontes da riqueza publica. (Apoiados.)
Por este ultimo modo pôde extinguir-se o deficit uma vez, póde extinguir-se em um dado anno, ou em um dado semestre, mas não se extingue por uma vez, não se extin-
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gue do um modo permanente, porque o augmento de impostos, que affecte as fontes da riqueza, produz com o andar dos tempos a diminuição da receita; e a diminuição das despezas necessarias para a regularidade dos serviços produz a perturbação e deficiencia d'esses serviços, e por isso ha de desapparecer fatalmente, qualquer que seja o governo ou o partido que esteja á frente dos negocios publicos, em nome das necessidades indeclinaveis da civilisação e das exigencias imperiosas do paiz.
Ha, pois, differença fundamental entre extinguir-se o deficit immediatamente e de uma só vez e extinguir-se por uma vez, e por isso o nobre presidente do conselho e a situação actual não estão em contradicção. (Apoiados.)
Poderá a opposição dizer o mesmo? Não, sr. presidente.
O sr. Dias Ferreira, a quem por vezes terei de me dirigir, e que, repito, sinto não ver presente, entende que o deficit se extingue de uma só vez, por meio do augmento da receita e da reducção da despeza, e s. ex.ª que foi ministro duas vezes, e dictador outras tantas, nunca extinguiu o deficit! (Apoiados.)
Entendendo nós que o deficit se deve extinguir gradual e successivamente, comprehende-se que em um certo e dado periodo da nossa administração não logremos attingir o equilibrio orçamental, mas quem entende que o deficit póde e deve desapparecer de uma só vez, isto é, em virtude do conjuncto do medidas tributarias e financeiras apresentadas em uma sessão parlamentar, quem assim entende e apesar d'isso quando é governo não realisa de chofre e immediatamente o equilibrio orçamental, não tem justificação possivel. (Apoiados.)
O sr. Dias Ferreira que apoiou este governo em uma epocha em que havia deficit orçamental, e sendo sua opinião de que o deficit se póde e deve extinguir de uma vez; s. ex.ª que apoiou este governo de 1871 a 1875, quando a riqueza brotava como que espontaneamente por toda a parte, porque não exigiu então d'elle que estabelecesse o equilibrio orçamental? (Apoiados.)
Hoje que o paiz e a Europa estão atravessando uma grande crise, na occasião em que é impossivel augmentar os impostos, em virtude d'essa crise, na occasião em que é impossivel reduzir de uma maneira consideravel as despezas que significam e exprimem retribuição de trabalhos publicos, porque quando não ha trabalho particular, é preciso que haja trabalho publico, é que s. ex.ª vem exigir do governo o immediato equilibrio orçamental, S. ex.ª é que está em contradicção, não é o governo.
E não é só o sr. Dias Ferreira que é menos coherente a este respeito.
Se temos de examinar o capitulo das contradicções, eu posso ler á camara, e desde já lhe peço desculpa de ter de ler varios documentos, o relatorio de uma proposta de lei apresentada ás côrtes em 30 de julho de 1868, pelo sr. Carlos Bento, então ministro dá fazenda.
Esta proposta de lei é precedida de um relatorio em que se lêem as seguintes palavras.
«O equilibrio entre a receita e a despeza ordinaria do estado é indispensavel que se restabeleça, e não é superior ás nossas forças o estabelecel-o de prompto, etc..»
Em 30 de julho do 1868 o ministro da fazenda d'essa epocha pensava que se podia extinguir o deficit de prompto, pela reducção das despezas e pela elevação das receitas.
Fez-se a reducção das despezas e a elevação das receitas, e comtudo não se conseguiu o equilibrio orçamental, e o deficit continuou campeando impavido até ao advento ao poder da actual situação politica.
Se ha, pois, contradictorios, não é aqui, é ahi, ou se nós o somos, tambem o sois vós. (Apoiados.)
O illustre deputado o sr. Emygdio Navarro accusou tambem o governo de contradictorio no que respeita á maior ou menor moderação nas despezas publicas.
S. ex.ª disse que a situação actual, que nos primeiros annos da sua administração se apresentára como tendo aprendido com as lições da experiencia e apregoando a necessidade da moderação nas despezas, gasta immoderadamente, faltando assim ao seu programma e enganando o paiz.
Por isso s. ex.ª dizia ao governo: saia d'ahi, enganou-nos, dê o logar a quem é substitua e seja moderado nas despezas publicas.
Mas quem o ha de substituir? S. ex.ª entende por certo que deve ser o partido progressista. Ora, sr. presidente, eu não quero attribuir ao partido progressista responsabilidades que pertencem ao partido historico, porque não preciso d'isso para a minha argumentação.
O partido progressista apoiou a situação transacta, não pôde deixar de perfilhar as responsabilidades d'essa situação, o portanto é quanto me basta.
Quer V. ex.ª e a camara saber qual foi a moderação das despezas feitas pelo governo apoiado pelo partido progressista?
Eu tenho aqui a conta que passo a ler á camara.
Nota das despezas em dinheiro, effectuadas pelos cofres do estado, durante o anno economico de 1877-1878
“Ver Diario Original”
No anno economico de 1877-1878 gastou-se: no primeiro semestre, administração do sr. duque d'Avila e do sr. Barros e Cunha, 11.812:000$000 réis, despeza orçamental excluidos os encargos da divida publica, e despezas por leis especiaes e a legalisar; e no segundo semestre, do qual cinco mezes são da responsabilidade da administração actual, gastou-se 11.027:000$000 réis, menos do que no primeiro semestre 784:670$961 réis. Na propria
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despeza Orçamental o governo do sr. duque d'Avila e do sr. Barros e Cunha consumiu: no primeiro semestre réis 8.795:000$000 e o governo actual 8.451:000$000 réis no semestre immediato. Por consequencia, na propria despeza orçamental de 1877-1878, o governo actual gastou menos do que o do sr. duque d'Avila 344:075$364 réis.
Aqui tem V. ex.ª e a camara o que é e no que consiste a moderação das despezas, quando preside aos negocios publicos um governo apoiado pelo partido progressista.
Eu estou já a ver affluir aos labios dos illustres deputados da opposição o seguinte argumento: «Os srs. argumentam com o segundo semestre de 1877-1878, pois nós havemos de argumentar com o primeiro semestre de 1878— 1879.»
Vejamos a conta do que se gastou no anno civil de 1878:
Nota das despezas em dinheiro, effectuadas pelos cofres do estado, durante o anno civil de 1878
“Ver Diario Original”
Nós gastámos no segundo semestre do anno economico de 1877—1878, e no primeiro semestre do anno economico corrente, até 31 de dezembro, 23.447:000$000 réis pelos differentes ministerios, excluida a pinta do credito publico, emquanto que a administração de que fez parte o sr. Barros e Cunha gastou no primeiro semestre do anno economico de 1877-1878 11.812:000$000 réis, o que corresponde em doze mezes á despeza de 23.025:000$000 réis.
Se nós gastássemos durante o anno civil de 1878 proporcionalmente tanto como gastou o governo do sr. duque de Avila e Barros e Cunha, teriamos despendido réis 23.625:000$000; como, porém, a despeza que fizemos foi de 23.447:000$000 réis, a nossa administração apresenta uma moderação de despeza em seu favor na importancia de 177:000$000 réis, pouco mais ou menos. (Apoiados.)
(Interrupção do sr. Emygdio Navarro que não se percebeu.)
A despeza a que s. ex.ª se refere está descripta nos ultimos mezes do anno economico de 1870-1877, em abril, maio e junho, segundo creio.
(Interrupção do sr. Emygdio Navarro.)
Isso é outra hypothese. Em relação á escripturação de despezas antigas legalisadas por leis especiaes, já disse e repito que essas despezas estão descriptas nos ultimos mezes do anno economico de 1876—1877 e por consequencia não pôde argumentar-se com ellas contra o meu calculo, que não se refere a esse anno economico.
Em relação á nova interrupção do illustre deputado, cumpre responder-lhe que nem" todas as obras em que despendeu a situação transacta, tinham sido começadas por nós: basta citar, como exemplo, muitas estradas do districto de Bragança, que foram mandadas construir pelo sr. Barros e Cunha, como s. ex.ª no outro dia declarou á camara.
Mas nem mesmo o facto de termos começado muitas obras, com as quaes o governo do sr. Barros e Cunha despendeu valiosas sommas, justifica completamente a situação transacta no que respeita ao quantitativo das despezas feitas durante a. sua administração, porque o illustre deputado, que me interrompeu, sabe perfeitamente que na latitude e desenvolvimento a dar ás obras, em construcção, ás obras começadas, ha ou pôde haver muitos graus. (Apoiados.)
Estas obras do districto de Bragança fazem-me lembrar aquella celebre estrada de Cavez, para abrir caminho para Vidago, por qualquer outro ponto que não fosse Villa Real, por isso que a viagem por este sitio era muito incommoda e o sr. Barros é Cunha não queria porventura incommodar-se a subir a serra do Marão. (Riso. Apoiados.) Aqui está o que é para o governo, apoiado pelo partido progressista, a moderação nas despezas. (Apoiados.)
(Interrupção que não se percebeu.)
Apoiei essa situação é verdade, e tomo a responsabilidade dos actos que apoiei, (Apoiados.) mas a minha argumentação não colho contra mim.
Eu não accuso o ministerio actual de immoderação nas despezas, e portanto o meu argumento não colhe contra mim; s. ex.ª? (dirigindo-se aos srs. deputados da opposição) é que lhe fazem essa accusação, o a minha argumentação colhe, portanto, perfeitamente contra s. ex.as, porque o ministerio que apoiaram gastou mais do que a situação regeneradora. (Apoiados.)
Se esta situação é immoderada nas despezas, por maioria de rasão o é a que foi apoiada pelos illustres deputados.
Os illustres deputados da opposição, continuando na enunciação das contradicções em que pretendem ter caído o actual governo, dizem que elle tem defendido nos seus relatorios, e apregoado nos seus discursos, que os encargos das sommas pedidas ao credito para a realisação dos melhoramentos materiaes, devem ser suppridos pelo augmento de receita, de modo que esta se eleve até fazer face aos encargos das sommas que se têem levantado; mas que o governo tem despendido largamente, realisado grandes emprestimos, sem que tenha creado a receita necessaria para fazer face aos encargos d'elles provenientes e sem que haja o equilibrio orçamental.
Ora, é preciso que eu diga a s. ex.ª que a sua asserção não é exacta. O augmento da receita ordinaria durante a administração regeneradora é muito superior ao augmento da despeza ordinaria realisada durante a mesma administração. (Apoiados.)
Logo demonstrarei que o governo não pôde ser accusado de não ter creado receita para fazer face aos encargos das
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sommas levantadas para despezas extraordinarias, e que o augmento de receita ordinaria effectuada durante a actuai administração é superior ao augmento da despeza tambem ordinaria que se realisou durante o mesmo tempo.
O governo actual, para occorrer ás despezas ordinarias que tem feito a maior, tem arrecadado receita que não só tom compensado esse augmento de despeza, mas alem d'isso, quanto a ellas, tem fornecido um saldo importante para ser descontado na importancia a que montava o deficit ordinario antes d'esses augmentos de receita e de despeza, deficit que por consequencia tem sido relativamente menor do que era antes do advento ao poder da situação actual. (Apoiados.)
Mas supponhamos que o governo estava em contradicção entre as suas promessas e os seus actos, como affirmam s. ex.as Haviamos de entregar-lhes o poder, estando tambem os illustres deputados em contradicção? (Apoiados.)
Não construiu porventura a situação que teve o apoio do s. ex.as aquellas estradas do districto de. Bragança a que ha pouco me referi, sem se augmentar as receitas para fazer face aos encargos das sommas a gastar com essas estradas, o sem haver ainda equilibrio orçamental? (Apoiados.)
De mais a mais o sr. Carlos Bento, que eu não cesso de admirar, já dizia no relatorio da citada proposta de 30 de julho de 1868 o seguinte:
«Pertence ao credito occorrer á despeza extraordinaria indispensavel para garantir o progresso moral o material, que deve constituir a marcha da nossa civilisação.
A receita para fazer face ás operações de credito destinadas a custeiar a despeza extraordinaria, deve, em regra, sair do imposto votado ao mesmo tempo em que se decretar o encargo.»
Esta doutrina já foi sustentada n'uma das sessões passadas pelo sr. Braamcamp, e tom sido sempre sustentada no parlamento. Mas quer V. ex.ª e a camara saber como se cumpriu este principio? Fazendo-se 500 ou 600 kilometros de estradas desde o 1.° de janeiro de 1868 até 30 de junho de 1871, quando havia deficit orçamental de 4, 5 e 6 mil contos. (Apoiados.)
Em resumo: se os illustres deputados da opposição sustentam que as receitas devem augmentar proporcionalmente aos encargos das sommas levantadas para as despezas extraordinarias, eu respondo que durante a administração do actual governo o augmento da receita tem sido superior ao augmento da despeza ordinaria, na qual estão computados áquelles encargos; se sustentam que não deve recorrer-se ao credito para realisar os melhoramentos materiaes, emquanto não houver equilibrio orçamental, respondo que já demonstrei que essa doutrina não tem sido praticada por s. ex.ª quando estão no poder. Em tal caso havemos em nome da nossa supposta contradicção entregar o poder a quem é tão flagrantemente contradictorio?
Não pode ser. (Apoiados.)
Prosigamos no exame do capitulo das contradicções.
O meu illustre amigo-o sr. Pinheiro Chagas, que sinto não ver presente, indignou-se contra o governo, accusam de o de esbanjador e de pouco economico, por não querer reduzir o numero de 23:000 praças, que vinha designado no projecto sobre a fixação da força armada.
O illustre deputado pedia essa reducção por motivos de economia e por entender que tamanho numero de praças só servia para atropellar os eleitores o violar a liberdade eleitoral em Ceia e em outras localidades.
Este anno é perigosa para s. ex.ª a força publica sob o ponto de vista da ordem, da liberdade e da economia, mas quando estava no poder a situação transacta o illustre deputado queria essa força não para garantir a ordem, a liberdade e a segurança dos cidadãos, mas para dar espadeiradas á porta do passeio publico nos transeuntes indefezos. (Muitos apoiados.)
Em 14 de junho de 1877 dizia o ministro da guerra, o digno par Antonio Florencio de Sousa Pinto, que o illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas apoiava, no decreto que foi passado para o levantamento de um credito extraordinario para serem pagas as despezas feitas com as praças em serviço alem das 18:000 auctorisadas no orçamento de 1875-1876, dizia, repito, o seguinte:
«Não tendo as necessidades do serviço permittido que no anno economico de 1875-1876 a força do exercito se reduzisse a 18:000 praças... etc..»
N'estas palavras o illustre ex-ministro da guerra affirmou que as praças existentes no exercito alem das 18:000 eram necessarias ao serviço. Pensa porventura V. ex.ª e a camara que o illustre deputado se levantou para fulminar o governo que subscreveu aquellas palavras? Pelo contrario, sr. presidente.
O illustre deputado não protestou contra aquellas palavras e por consequencia reconheceu a necessidade da existencia d'aquelle numero de praças em serviço. (Apoiados.) Não só não protestou, mas deu a sua adhesão e apoio enthusiasta ao governo, que affirmou aquella doutrina. (Apoiados.)
O mesmo aconteceu a respeito do credito extraordinario para pagamento das reservas. (Apoiados.) No decreto respectivo da mesma data de 30 de junho de 1877 affirma-se que no anno economico anterior não foi possivel dispensar do serviço as praças da reserva; affirmou isto o sr. general Florencio de Sousa Pinto sem protesto do illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas.
Então não se levantava s. ex.ª para condemnar as affirmações do governo. (Apoiados.),.
Este anno, porém, como é preciso accusar accintosamente o governo actual, e buscar argumentos para o combater, recorre-se á conservação da reserva no exercito e ao numero de praças em effectivo serviço. (Apoiados.)
Aqui tem, portanto, V. ex.ª e a camara qual é a coherencia e a logica dos illustres deputados da opposição. E havemos de entregar lhes o poder por causa das nossas suppostas contradicções, quando elles são padres-mestres, quando nos levam a palma n'este ponto? Não, não pode ser. (Apoiados)
Tambem o governo tem sido accusado de despender importantes sommas no armamento do exercito e nas fortificações de Lisboa e seu porto. }
Foi o illustre deputado, o sr. Braamcamp, creio eu, que primeiro poz em relevo este facto para 'demonstrar que o governo actual augmenta immoderadamente as despezas publicas.
Examinemos ainda, sob este ponto de vista a coherencia da opposição parlamentar.
V. ex.ª, e a camara, hão de estar lembrados do que se dizia no relatorio do um projecto datado de 13 de agosto de 1868, quando tinhamos um deficit orçamental maior do que o actual, e, alem d'isso, tinhamos o deficit de credito. (Apoiados)
Esse projecto (do qual lerei uma parte do relatorio, e que foi assignado por pessoas insuspeitas para a opposição, como os srs. Joaquim Thomás Lobo d'Avila, José Maria Rodrigues do Carvalho, Dias Ferreira, este ultimo senhor com declarações, é verdade, mas acceitando o pensamento ao governo, pois que não assignou vencido, e outros srs. deputados) recaia sobre uma proposta do lei em que o ministro da guerra, o nobre marquez de Sá, propunha, e muito bem. que o governo ficasse auctorisado a despender réis 100:000$000 para continuar as fortificações de Lisboa, e começar o armamento das fortalezas que defendem o porto da mesma cidade.
N'aquelle tempo approvavam-se as fortificações de Lisboa e o armamento das fortalezas do seu porto; hoje clama-se contra o Pimpão, como lhe chamam, que é aliás um dos elementos da defeza d'esse porto; (Apoiados.) e diz-se que não se devia armar o porto, sem se terem feito primeiro as fortificações do lado de terra, como se não se podesse
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fazer o contrario, (Apoiados.) ou não fosse mais regular fazer ambas as cousas ao mesmo tempo. (Apoiados).
Então, repito, as circumstancias eram muito graves, o deficit orçamental era muito maior do que actualmente, e muitissimo maior o deficit de credito, (Apoiados) e, todavia, a illustre commissão de fazenda, da qual faziam parte os cavalheiros a que ha pouco me referi, escrevia as seguintes palavras no citado relatorio:
«A questão que poderia levantar-se na occasião presente seria, no entender da commissão, a da opportunidade, em visto do estado das nossas finanças; mas quando todos reconhecem que os nossos meios de defeza contra qualquer invasão ou aggressão estrangeira serão quasi nullos se não tivermos assegurado por obras de fortificação convenientes as duas principaes bases de operações do norte e sul do reino, que são o Porto e Lisboa, não é licito hesitar sobre a concessão dos recursos necessarios para construir ou melhorar esses meios de defeza, por maiores que tenham de ser os sacrificios que d'ahi resultem; porque, para sustentação da nossa independencia, não haverá portuguez digno d'este nome que recuse ao governo do seu paiz os meios necessarios, por mais criticas que sejam as circumstancias de cada um.»
Era assim que es pensava a respeito das fortificações de Lisboa e seu porto em 13 de agosto de 1868.
Então quando era tão grave a conjunctura em que se encontravam as nossas finanças, como o confessa a propria commissão de fazenda d'esse tempo, não duvidavam os partidos representados na actual opposição parlamentar tomar a responsabilidade de dar ao governo os meios necessarios para continuar as obras das fortificações de Lisboa e começar o armamento das fortalezas.
Hoje que o. estado do credito publico é relativamente prospero, que a desproporção entre a despeza e a receita é menor, queriam porventura os illustres deputados que nós assumissemos a responsabilidade, a tremenda responsabilidade perante a nossa consciencia, perante a historia e perante o paiz, de negar ao governo actual os meios necessarios para o proseguimento d'esses trabalhos? (Apoia-los) Não tihamos nem deviamos fazer isso.
A proposta do nobre marquez de Sá teve tambem parecer da commissão de guerra, assignado entre outros pelos srs. Belchior José Garcez, José Paulino de Sá Carneiro, Antonio José de Barros e Sá, Sebastião do Canto e Castro Mascarenhas e José Rodrigues Coelho do Amaral, no qual se lê o seguinte:
«Considerando finalmente que os representantes da nação não menos devem attender aos resultados funestos que de uma injusta aggressão se poderiam originar encontrando o paiz n'um estado quasi indefezo, e que da continuação do similhante situação e abandono por falta de meios pedidos nos virá uma odiosa e bem merecida responsabilidade.»
E esta odiosa responsabilidade, que os illustres deputados não queriam para si em 1868, e que nós não queremos igualmente para nós em 1878, e antes e depois d'esta data. (Apoiados.)
Como pão tomámos esta responsabilidade, vem agora os illustres deputados da opposição, collocando-se em contradicção com a boa doutrina, que sustentaram ha dez annos, pretender lançar odioso sobre a responsabilidade que assumimos, de votar ao governo sommas importantes para fortificações e armamento.
Vou concluir, sr. presidente, o exame do capitulo das suppostas contradicções da situação, que actualmente dirige os negocios publicos.
Mas com grande pezar meu não posso deixar de. dizer ao illustre deputado o sr. Navarro, que não posso concordar em que, em nome das nossos suppostas contradicções, seja chegado o momento opportuno do governo entregar o poder a outras mãos.
Ou o governo actual não tem sido contraditório, como me parece ter demonstrado, ou se o tem sido, os illustres deputados, que haviam de succeder-lhe no poder, estão igualmente ou superiormente contradictorios, e por consequencia não têem direito aquellas cadeiras em nome das contradicções dos seus adversarios politicos. (Apoiados)
Sr. presidente, o illustre deputado e meu amigo, o sr. Emygdio Navarro, passando ao capitulo dos melhoramentos materiaes, disse que não queria caminhos de ferro que custam 60:000$000 réis por kilometro, e que caminhos de ferro por tal preço não servem ao paiz. E porque?
Porque os encargos que d'ahi provém são superiores na opinião de s. ex.ª ás vantagens que o paiz aufere.
Procurou demonstrar esta proposição apresentando o rendimento das linhas ferreas já construidas, e mostrando que ellas não produzem rendimento liquido apreciavel, se se tomar em consideração os encargos das sommas que custou a sua construcção.
Nós não tinhamos ainda descoberto até hoje na esphera dos melhoramentos materiaes o ponto em que se distanciava a escola regeneradora da escola progressista.
Depois de tantos dias de discussão, parece finalmente ler apparecido o ponto de divergencia entre nós e o partido progressista; mas creio que o illustre deputado não encontrará nos chefes do seu partido a approvação e sancção da doutrina expendida por s. ex.ª, porque elles têem quando ministros mandado construir muitos kilometros de estradas, que não rendem directa e immediatamente um vintem para o thesouro. (Apoiados.)
O principio proclamado por. s. ex.ª importa a condemnação de todos os melhoramentos materiaes, embora elles influam consideravelmente no desenvolvimento da riqueza publica, sempre que esses melhoramentos não produzam directa e immediatamente para o thesouro rendimento liquido do todos os encargos. (Apoiados.)
Aonde é na Europa que, no começo da construcção de caminhos de ferro, elles renderam immediatamente para si? Em parte nenhuma. (Apoiados.)
A população da Belgica é consideravelmente maior que a nossa em relação ao tracto de. terreno que occupamos; porque occupamos 89:000 kilometros quadrados no continente, e a Belgica, que tem mais população do que Portugal, apenas occupa 29:000; podendo, por isso, dizer-se que, em relação á superficie do seu territorio e do nosso, cada 100 kilometros quadrados de territorio belga tem mais do triplo da população existente em cada 100 kilometros quadrados de territorio portuguez. Pois a Belgica, quando começou a construir os caminhos de ferro, tirou logo d'esses caminhos rendimento liquido dos encargos da construcção e despezas de exploração? De certo não. (Apoiados.)
E na França o que aconteceu? Quem estiver ao facto da historia economica da França, tem necessariamente conhecimento das grandes perturbações das emprezas de caminhos de ferro, perturbações que algumas vezes, como por exemplo no anno de 1847, foram a causa principal de grandes crises financeiras, o que nos dá a medida do que seriam n'esse tempo os seus rendimentos liquidos, apesar das subvenções do estado.
Não ha muitos dias que eu vi uma estatistica do rendimento da rede dos caminhos de ferro francezes em 1867, segundo a qual o rendimento liquido havia sido de 5,10 por cento.
E dava-se este facto em França, onde quasi todo o paiz está cortado do estradas e de caminhos de ferro, e depois de ter decorrido tão longo numero de annos desde que se havia começado a construcção d'esses caminhos.
Nós não podemos calcular para hoje o rendimento dos nossos caminhos de ferro no futuro, não só porque a influencia da construcção de um caminho de ferro no desenvolvimento da riqueza geral não se traduz desde logo em rendimento liquido de todos os encargos de construcção e despezas de exploração, mas tambem porque a successiva
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construcção de outros caminhos de ferro vão actuar no aumento de rendimento dos já construidos.
Se um qualquer de dois caminhos de ferro póde produzir 5, dois produzirão mais do 10, porque se auxiliam mutuamente no desenvolvimento do rendimento de cada um d'elles.
Não e licito, pois, argumentar com o rendimento actual dos nossos caminhos de ferro, contra a vantagem economica d'esses caminhos, porque esse rendimento ha de augmentar successivamente com o complemento de toda a nossa rede de caminhos do ferro, e com o progressivo desenvolvimento da riqueza publica.
Nem, em materia de melhoramentos materiaes, se deve argumentar sómente com o rendimento directo d'esses melhoramentos, para o thesouro publico, porque a sua grande vantagem economica está, não no seu rendimento directo, mas sim no seu rendimento indirecto, no desenvolvimento da riqueza, facilitando e accelerando todos os transportes. (Apoiados.)
O sr. Navarro: — Eu disse que os caminhos de ferro do Minho o Douro não tinham dado vantagens directas nem indirectas, por isso que o movimento das mercadorias era quasi insignificante.
O Orador: — Estou de accordo com o illustre deputado. Concordo em que os caminhos de ferro do Minho e Douro não produzem ainda para si, mas a causa está em que esses caminhos não desenvolveram ainda largamente a riqueza publica...
O sr. Navarro: — Comparei o desenvolvimento das mercadorias com o dos passageiros, e demonstrei que aquelle era insignificante.
O Orador: — Se o illustre deputado quer tirar a conclusão de que a riqueza publica ainda não está notavelmente desenvolvida nas provincias do Minho e Traz os Montes, estou perfeitamente de accordo.
Não o está, em primeiro logar, porque a exploração da parte construida d'essas linhas ainda existe ha pouco 'tempo, e em segundo logar porque essas linhas ainda não estão concluidas.
Sr. presidente, isto é materia corrente em toda a parte. Todos sabem que os caminhos do ferro valem menos pelos rendimentos que podem produzir, do que pela influencia enorme que lêem através dos tempos no desenvolvimento da materia collectavel do paiz.
É esta a sua principal missão, missão importantissima, que não se realisa inteiramente logo que começa a exploração, mas gradual e progressivamente, e direi mesmo indefinidamente através dos tempos.
Assim o têem entendido todas as nações cultas, que por largos annos construiram e exploraram milhares de kilometros de caminhos de ferro sem realisarem rendimentos liquidos.
Visto que fallei em melhoramentos materiaes, passemos a analysar algumas considerações apresentadas a este respeito pelos illustres deputados da opposição que hão tomado parte no debato.
Disse-se aqui, e creio que foi o sr. Braamcamp, que os nossos melhoramentos materiaes nos têem custado muito caros, nos têem custado 100.000:000$000 réis, e que não sabia se elles valeriam tão grande somma.
Eu começo por declarar que, fallando sobre melhoramentos materiaes, não quero argumentar com o relatorio do sr. Barros e Cunha.
E seja dito de passagem, que por desgraça minha encontrei hoje aqui poucas das pessoas a quem me propunha responder.
O sr. Barros o Cunha, que não vejo presente, n'um momento de enthusiasmo rhetorico disse n'uma das sessões passadas que não consentia que se fizesse do seu relatorio argumento de accusação ou do defeza partidaria.
Achei graça a esta prohibição de s. ex.ª, confesso ingenuamente porque suppunha que a todos nós era licito argumentar a nosso sabor com um documeuío official emanado do ministerio das obras publicas e apresentado opportunamente ás côrtes. Todavia, declaro que não me sirvo d'elle nem para accusação, nem para defeza partidaria, porque elle só póde servir para accusar o seu auctor do falta do rigor logico na sua argumentação. S. ex.ª diz que desde 1852 até 1877 so pediram ao credito noventa e tantos mil contos de réis o que approximadamente se gastou a mesma somma em melhoramentos materiaes, que assim foram entregues á navegação, ao commercio e á industria.
Ora, sr. presidente, se estes melhoramentos não tiverem sido realisados economicamente, ou se alguns forem de tal natureza que delles não provenha vantagem apreciavel, é evidente que nem todas as sommas gastas em melhoramentos materiaes foram augmentar e fomentar a riqueza da nação. Nem só isso. Se porventura as despezas ordinarias durante o mencionado periodo de vinte e cinco annos ou parte d'elle tiverem estado reduzidas ao indispensavel ou ao util, a consequencia logica é que no caso de não ler havido essas superfluidades, poder-se-ía ter gasto [cm melhoramentos noventa e tantos mil contos sem pedir ao credito igual ou superior quantia, mas sim menor.
Ora, como o relatorio do sr. Barros e Cunha não demonstra nem que se construiu sempre economicamente, nem que as obras construidas foram ou são todas de incontestavel vantagem nem que as despezas ordinarias estiveram sempre reduzidas ao que era exigido pela regularidade dos serviços, segue-se que em materia de melhoramentos materiaes não posso servir-me do relatorio de s. ex.ª nem para defeza, nem para accusação.
Mas supponhamos que os melhoramentos materiaes custaram 100.000:000$000 réis, como disse o sr. Braamcamp. Perguntou s. ex.ª: Valerão 100.000:000$000 réis esses melhoramentos? Produzirão 6.000:000$000 réis para o paiz?
Produzem, e produzem muito mais. (Apoiados.)
As receitas ordinarias do estado subiram 11.000:000$000 réis pouco mais ou menos desde 1867 até 1879, e é incontestavel que, se não fossem os caminhos do ferro, as estradas o todos os melhoramentos materiaes que se têem emprehendido, de certo não teriamos tido tão grande augmento na receita publica. (Apoiados.)
O illustre deputado o sr. Marianno de Carvalho citou ha dias a Belgica para exemplo e modelo de boa administração financeira.
A Belgica tinha em 1867 a receita de 29.880:000$000 réis, ou 6$097 réis por habitante, e as despezas eram approximadamente outro tanto.
Nós estavamos n'essa occasião em grandes difficuldades, porque as nossas despezas ordinarias excediam consideravelmente as receitas ordinarias.
Por consequencia, até 1867, quando a Belgica era já prospera, nós tinhamos tido uma progressão muito maior nas despezas ordinarias do que nas receitas ordinarias.
A progressão que até 1867 era maior na despeza e menor na receita, d'essa epocha em diante começou a ser menor na despeza e maior na receita, pois que até 1878 as receitas ordinarias augmentaram mais de 10.000:000$000 réis, emquanto que as despezas ordinarias augmentaram apenas, se não me engano, cerca de 8:000:000$000 réis, em todo o caso augmentaram muito menos do que as receitas.
Isto prova que as condições da riqueza publica mudaram a datar de 1867 para cá.
Qual será a rasão por que a progressão da riqueza publica augmentou de 1867 para cá?
Nós somos o mesmo paiz e o mesmo povo, possuimos o mesmo solo que já possuíamos até 1867, e por isso devemos attribuir aquella mudança favoravel na progressão da riqueza geral a causas extraordinarias que vieram actua? desde aquella data com maior intensidade do que até então.
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Essas circumstancias são as estradas, são os caminhos de ferro, são os melhoramentos materiaes.
Ahi têem os illustres deputados um modo de demonstrar que os nossos melhoramentos valem os 100.000:000$000 réis que custaram.
Vejamos, porém, se é possivel descobrir ácerca de melhoramentos materiaes quaes são os pontos fundamentaes da divergencia entre nós e o partido progressista.
Os illustres deputados que nos accusam de estarmos sempre cantando o hymno dos melhoramentos materiaes, conformam-se com o nosso pensamento, acceitam o nosso principio de que esses melhoramentos fomentam a riqueza e devem ser construidos com dinheiro pedido ao credito.
O sr. Mariano de Carvalho, n'um dos mais brilhantes discursos que lhe tenho ouvido o que têem sido pronunciados n'esta discussão, começou por fazer mui sensatas e ao mesmo tempo espirituosas considerações a proposito do que era e não era deficit na opinião de muitos financeiros, procurando pôr em desfavor a distincção entre deficit ordinario e extraordinario.
Mas em outra parte do sou discurso fez s. ex.ª a apologia do deficit extraordinario em relação as receitas ordinarias, porquanto disse, referindo-se por certo aos melhoramentos materiaes, que, em sua opinião, certas despezas de natureza transitória e beneficio permanente devem ser realisadas por meio de sommas pedidas ao credito, para que os beneficios e os encargos se repartam pelas gerações presentes e futuras.
Os illustres deputados querem, pois, que se recorra ao credito para realisar os nossos melhoramentos materiaes. Nós professamos esta mesma doutrina; temol-a proclamado sempre o portanto estamos de accordo.
Prosigamos a ver se descobrimos o ponto de divergencia.
Os illustres deputados affirmam que querem que se recorra ao credito, mas que ao mesmo tempo se elevem as receitas de modo a fazer face aos encargos das quantias que se levantarem por meio do credito.
Nós queremos e sustentamos a mesma doutrina, e já eu ha pouco disse que tinhamos feito face a todos os nossos augmentos da despeza ordinaria com os augmentos da receita cobrados durante a administração actual, e que ainda havia um saldo para diminuir a importancia do deficit preexistente.
Por consequencia não está aqui tambem o ponto da nossa divergencia.
Os illustres deputados não querem, não entendem que se façam melhoramentos materiaes emquanto não houver equilibrio entre a receita e despeza ordinaria, porque se assim pensassem, então a divergencia entre nós seria profunda; e não só entre nós, mas entre s. ex.as e o seu passado, porque, como disso ha pouco, s. ex.as construiram muitas estradas sem estar equilibrado o orçamento ordinario. E Deus nos livre de que houvessem pensado de outro modo os governos do nosso paiz, porque ainda hoje não teriamos uma só estrada. (Apoiados.)
Não sei, portanto, onde está o ponto de divergencia entre nós e o partido progressista, no que respeita aos melhoramentos materiaes.
Elle quer, como nós, que se construam melhoramentos que não produzam directamente para o thesouro rendimento liquido; quer, como nós, que as sommas necessarias para essa construcção, sejam pedidas ao credito; quer, como nós, que se faça face aos encargos d'estas sommas com o augmento da receita ordinaria.
Qual é, pois, pergunto eu, o diapasão, a pedra de toque da moderação ou não moderação nas despezas com esses melhoramentos?
Qual é esse diapasão em nome do qual nos accusaes de termos immoderados nas despezas com obras publicas, de sermos excessivos no desenvolvimento dos trabalhos publicos?...
Áquelles que concordam comnosco nos pontos que acabo de indicar, ha de ser difficil descobrir bom fundamento para nos accusar de darmos desenvolvimento excessivo ás obras publicas.
No que respeita ao partido constituinte, é mais facil descobrir o nosso ponto do divergencia.
O illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas negou que nós tivessemos feito melhoramentos materiaes. Não fizemos nada e estou persuadido de que na opinião de s. ex.ª, nunca o faremos emquanto não fizermos o caminho de ferro da Beira Baixa. (Apoiados.)
Como preferimos o caminho de ferro da Beira Alta, que atravessa povoações importantes e terrenos cultivados, ao caminho de ferro da Beira Baixa, que atravessaria charnecas despovoadas e incultas, não temos feito melhoramentos materiaes.
Sem se fazer o caminho de ferro da Beira Baixa não ha melhoramentos materiaes no paiz, nem feitos por esta administração nem por outra qualquer.
Desenganemos-nos; quem os ha de fazer todos é s. ex.ª, mas n'um folhetim. (Riso.)
Deixemos, porém, este assumpto o vamos á questão do deficit.
Os illustres deputados pensaram achar contradicção nas palavras do sr. ministro da fazenda pelo facto d'elle vir n'esta sessão parlamentar declarar á camara que não julga opportuna a occasião para extinguir o deficit do orçamento, por entender que ha occasiões na vida dos povos em que é preferivel haver deficit a recorrer a medidas largamente tributarias.
Os illustres deputados pensaram achar contradicção entre estas palavras do sr. ministro da fazenda e os relatorios em que s. ex.ª nos outros annos tinha manifestado a necessidade urgente de realisarmos o nosso equilibrio financeiro.
V. ex.ª e a camara sabem perfeitamente que só o muito desejo da parte da opposição podia notar a contradicção entre estas affirmações do sr. ministro da fazenda.
S. ex.ª affirmou então como affirma hoje a suprema necessidade de equilibrarmos o nosso orçamento, mas s. ex.ª não negou então o que affirma hoje, e vem a ser que ha occasiões, que ha periodos na vida de uma nação em que é imprudente ou pelo menos em que não é conveniente propôr e levar a pratica as medidas necessarias para realisar o equilibrio orçamental.
Esta opinião não é só do sr. ministro da fazenda, é de todos os ministros, é de todos os governos e de todos os partidos que lêem occupado aquellas cadeiras ha mais de vinte annos, e que nunca extinguiram o deficit sem embargo de pensarem, como o actual ministro da fazenda, que haveria grande vantagem publica em se realisar o equilibrio orçamental.
Procederam todos assim, porque por um lado os recursos, e por outro lado as necessidades do paiz lh'o têem imposto fatalmente, e não porque carecessem todos do patriotismo necessario para adoptar as providencias precisas para equilibrar o orçamento. (Apoiados)
A questão versa pois unicamente em saber se a occasião actual é opportuna para estabelecer as medidas financeiras necessarias para realisar o equilibrio orçamental.
Ou o deficit seja de 3.000:000$000 réis como foi calculado no orçamento pelo governo e pela commissão de fazenda, de que tenho a honra de fazer parte, ou seja de 5.000:000$000 réis, 6.000:000$000 réis, ou 7.000:000$000 réis como foi calculado pelos illustres deputados da opposição, o que é certo é que não seria possivel estabelecer-se o equilibrio orçamental sem se recorrer em alta escala ao imposto.
Suppondo mesmo que se podem fazer algumas reducções nas despezas ordinarias não é natural que essas reducções orcem por 3.000:000$000 réis, e muito menos por réis 5.000:000$000, 6.000:000$0000 réis, ou 7.000:000$000
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réis, em que os illustres deputados computaram o deficit.
Por consequencia, repito, seria necessario para estabelecer desde já o equilibrio orçamental, recorrer em alta escala ao imposto.
Agora pergunto: seria opportuna, seria rasoavel a occasião para isso? Não me parece.
Não podemos aggravar n'esta occasião consideravelmente o imposto sobre a propriedade agricola, porque as colheitas d'estes ultimos annos no nosso paiz têem sido muito escassas. (Apoiados.)
A industria vinicula, que já luctava com difficuldades gravissimas provenientes do oidium que, depreciando o rendimento das vinhas pelo augmento do custo do grangeio, diminuiu ao mesmo tempo a producção, acha-se agora a braços com o terrivel flagello do phylloxera, que lhe tem causado já gravissimos prejuizos. (Apoiados.)
A industria cerealífera, que tem tido desde 1875 escassas colheitas, acha-se agora de mais a mais em lucta com os cereaes dos Estados Unidos, lucta verdadeiramente esmagadora, concorrencia que eu reputo incompativel com a conservação e desenvolvimento da industria cerealifera tanto entre nós como na França e na Inglaterra, se porventura os governos d'estas nações não proverem de remedio quanto antes.
Os preços dos cereaes nos nossos mercados vão baixando, apesar da escassez das nossas colheitas.
Em 1877, por exemplo, o preço medio do trigo ribeiro foi de 512 réis e em 1878 foi de 481 réis; o seu preço maximo foi de 601 réis n'aquelle anno e de 579 em 1878. O preço minimo do trigo rijo nacional foi em 1877 de 420 réis e em 1878 de 405 réis.
O preço medio do trigo rijo nacional foi superior ao preço medio do trigo rijo estrangeiro na sua maxima parte proveniente dos Estados Unidos, no anno de 1877 em 13 réis; pois no anno de 1878 já o preço medio d'aquelle foi inferior ao d'este em 1 real.
D'aqui se vê que a concorrencia do trigo rijo e molle proveniente dos Estados Unidos põe em grandes difficuldades os nossos proprietarios, e estas difficuldades vão já apresentando symptomas que podem classificar-se como assustadores.
Em 1875 ainda os preços maximos e minimos dos nossos trigos eram superiores aos maximos e minimos dos trigos estrangeiros, mas em 1878 já aconteceu exactamente o contrario, como se vê da seguinte tabella:
“Ver Diario Original”
Não ha exagero em classificar de assustadores estes symptomas, porque são a demonstração evidente de que no nosso mercado se procuram já os cereaes estrangeiros de preferencia aos nacionaes.
Em 1875 o preço minimo e maximo dos nossos cereaes era superior ao dos estrangeiros, o que quer dizer que os trigos estrangeiros para terem facil acceitação no nosso mercado careciam de ser postos á venda por preço inferior ao dos trigos nacionaes.
Em 1878 aconteceu já exactamente o contrario; o preço minimo dos nossos trigos foi inferior ao dos trigos estrangeiros, o que prova que os productos nacionaes careceram de vender mais barato para tentar obstar á preferencia sempre crescente que os compradores vão dando aos trigos estrangeiros; e o preço maximo dos nossos trigos foi igualmente inferior ao dos estrangeiros, o que prova que mesmo nas occasiões do maior escassez de trigo no mercado os compradores preferiram o trigo estrangeiro ao nacional, preferiram comprar aquelle, embora por preço um pouco mais elevado.
Não é, pois, sem rasão que eu julgo terrivel e assustadora para a nossa industria cerealifera a concorrencia dos cereaes dos Estados Unidos.
N'estas circumstancias, sob o imperio d'este estado do cousas, seria superfluo proceder a larga demonstração para provar que não seria prudente, nem justo aggravar agora com um imposto consideravel a nossa agricultura. (Apoiados.)
E não é só entre nós que se dá este facto; não é só entre nós que a concorrencia dos cereaes dos Estados Unidos está causando grandes damnos á agricultura nacional.
Observa-se phenomeno similhante na França e na Inglaterra.
Na França têem sido escassas, nos ultimos annos, as colheitas agricolas, como se prova pela larga importação do generos alimenticios feita por aquelle paiz nos ultimos annos.
A importação d'estes generos em 1877 foi já considerabilissima, mas em 1878 aquelle paiz importou tantos generos alimenticios como no anno precedente, e, alem d'isso, mais 537 milhões de francos, comprehendendo tambem o vinho, emquanto que a sua exportação de cereaes foi em 1878 inferior á do anno precedente em 131 milhões de francos.
Pois apesar d'estes factos, que demonstram um estado de crise agricola, o preço dos cereaes em França tem diminuido nos ultimos annos. Em Inglaterra tem-se dado o mesmo facto.
A Inglaterra tem estado desde 1873 em quasi constante crise agricola, porque desde aquella data não teve ainda dois annos seguidos de colheitas regulares; pois apesar d'isso o trigo em grão era em janeiro de 1879 vendido por preço inferior ao de 1873 em 29 por cento e a farinha em 22 por cento.
O quarter de trigo custava em Inglaterra: em 1873, 55 shillings e 11 dinheiros; em 1876, 50 shillings e 8 dinheiros; em 1878, 40 shillings e 8 dinheiros; em janeiro de 1879, 39 shillings e 7 dinheiros.
Este facto é unico, é sem exemplo na historia de todas as grandes crises agricolas da Europa, o deve chamar a seria attenção de todos os governos. Sempre que havia escassas colheitas cerealiferas, os cereaes subiam de preço; agora está acontecendo na Europa exactamente o contrario. O que não succederá, qual não será a depreciação dos cereaes quando na Europa houver seguidamente algumas colheitas abundantes ou mesmo regulares? Fácil é de prevel-o, se os governos não adoptarem providencias attinentes a conjurar o mal; facil é de prevel-o, se attendermos a que nos Estados Unidos cada semente produz, em termo medio, mais de setenta, sem que seja necessario estimular e enriquecer o solo com prévia applicação de adubos.
Julgo ter demonstrado sufficientemente que seria inopportuna a occasião para aggravar os impostos que oneram a nossa agricultura. (Apoiados.)
A nossa industria tambem é pequena o acanhada. Tem-se desenvolvido lentamente, por isso que tem pequenos mercados consumidores. Lucta Com grande difficuldade contra os artefactos estrangeiros, porque tem pequenos mercados" consumidores; não pôde vender muito, o quem não vendo muito não pôde vender barato. (Apoiados.)
Alem d'isso os nossos industriaes não têem acompanhado o progresso das artes no que respeita ao aperfeiçoamento dos methodos de fabrico.
É certo que pôde objectar-se contra o que deixo exposto que os elevados direitos protectores da nossa pauta compensam de certo modo a nossa industria do facto de não poder produzir tão barato como a industria estrangeira, há-
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bilitando-a assim a poder competir vantajosamente com ella.
Este argumento colhe ou póde colher em circumstancias normaes, mas nada prova no estado actual das cousas, porque se a nossa industria tem por um lado a seu favor os elevados direitos pautaes sobre os artefactos estrangeiros, tem por outro lado contra si na actualidade a espantosa depreciação d'estes artefactos nos principaes mercados do mundo, depreciação proveniente do excesso da producção sobre o consumo.
A Inglaterra vê diminuir dia a dia a exportação dos seus artefactos, não só porque a industria se tem aperfeiçoado e desenvolvido mais ou menos em todas as nações, mas principalmente porque lhe vão falhando os dois grandes mercados, a India ingleza e os Estados Unidos. *
Aquella produz já muitos artefactos; os Estados Unidos não só produzem já para si, mas exportam já muitos milhões do dollars de artefactos produzidos nas suas fabricas o officinas.
À França começa a -experimentar já tambem os effeitos da crise fabril.
A consequencia d'este estado de cousas tem sido a depreciação de todos os productos industriaes.
Alem d'estes factos, eu posso citar outros que levarão por corto a V. ex.ª o á assembléa o convencimento não só do que a crise fabril existo, existe tendo por corrolario a depreciação dos artefactos, mas tambem do que este estado não só não tem melhorado, mas até se tem aggravado no ultimo anno.
E fallarei especialmente da França e da Inglaterra, porque são estas nações as que principalmente actuam no nosso mercado em tudo quanto respeita ao commercio de artefactos, ou productos fabris.
Em 1877 houve em Inglaterra 171 greves, e em 1878 houve 277 assim classificadas: 66 na industria mineira, 39 na metallurgica, 77 nas emprezas de construcção, 58 nas fabricas de algodão e 37 em diversas industrias.
Cresceu, pois, espantosamente o numero das greves com a circumstancia extraordinaria de que d'estes 277 greves só 4 obtiveram solução completamente favoravel ás suas exigencias e 17 obtiveram transacções: todas as mais não conseguiram absolutamente nada, ou forçaram as officinas a fechar-se, ou tiveram de submetter-se a salarios exiguos.
Estes factos provam que os emprezarios luctam com taes difficuldades pela diminuição do consumo e pela depreciação dos productos, que proferiam fechar as suas fabricas e os seus estabelecimentos industriaes a ceder ás exigencias dos grevistas ou a transigir com elles, porque as condições das suas industrias não lhes permittiam ceder, nem transigir,.j (•
O grande numero de fallencias é tambem um symptoma de crise fabril e do depreciação de todos os productos.
Pois na Inglaterra, onde houve em 1877, 13:194 fallencias, numero já o levadissimo, houve 17:702, isto é, mais 4:508 em 1878!
Nos Estados Unidos dá-se já tambem facto similhante. O numero das fallencias, que fóra em 1873 de 5:183, foi em 1877 de 8:872, com um passivo de 190.000:000 dollars, o em 1878 foi de 10:478 com um passivo de dollars 234.000:000!
Os Estados Unidos, em virtude das suas leis altamente protectoras, têem desenvolvida excessivamente a sua industria e o seu commercio em relação ás necessidades dos seus mercados consumidores, nacionaes e estrangeiros, e por isso tanto pela depreciação actual dos seus artefactos, como pelo crescido numero, das suas fallencias de anno para anno, o seu estado commercial e fabril vae occupando seriamente as attenções dos seus homens publicos.
N'estas circumstancias, seria conveniente ir aggravar o imposto sobre a nossa industria, justamente na occasião em que ella tem do luctar contra a excessiva e anormal depreciação dos productos estrangeiros? Creio que não. (Apoiados.)
Alem d'estas causas que acabo do apresentar e que se referem principalmente á crise fabril estrangeira, lemos tambem na actualidade a prejudicar a nossa industria o mau cambio do Brazil, que tem obstado á importação do capitães o favorecido a sua exportação, obrigando por consequencia os bancos a retrahir as suas operações de credito, taes como descontos, emprestimos sobre penhores, sobre contas correntes, etc. etc..
D'aqui se vê que a industria que precisa de recorrer necessariamente ao credito para desenvolver largamente a sua producção, não encontra nos. bancos o auxilio indispensavel, o vê-se, portanto, forçada a reduzir a producção ao quantitativo do seu consumo effectivo a dinheiro do contado, vendo-se assim duplamente prejudicada pela contracção da sua producção o pelo excesso do producção da industria estrangeira. Isto pelo que respeita á nossa industria em geral, pois que em alguns ramos de industria, embora poucos, tambem entre nós se observa o mesmo excesso de producção sobre o consumo.
Citarei como exemplo, que aliás supponho quasi unico, a nossa industria do fiação de algodão, a qual desde 1871 a 1876 foi acommettida de um delirio perfeitamente similhante á febre bancaria.
Em 1876 fiava-se já no paiz duas vezes mais fio de algodão do que era realmente consumido, o por consequencia achavam-se as fabricas em difficuldades provenientes do excesso da producção sobre o consumo, difficuldades que se têem aggravado de dia para dia, porque, tendo cessado a especulação e sendo o consumo real inferior á producção, veiu como consequencia inevitavel a grande depreciação do fio de algodão.
Lucta, pois, esta industria com uma crise temerosa, que aproveitei a occasião de expor á camara o ao sr. ministro da fazenda, chamando para ella a sua attenção.
N'estas condições não era regular, seria iniquo que se augmentassem consideravelmente os impostos sobre a industria. Os impostos sobre o commercio, áquelles que lhe são pedidos directamente, tambem não se podem augmentar consideravelmente, porque os direitos pautaes são já exagerados, o tambem porque em virtude do mau cambio do Brazil o das circumstancias que apontei em relação ás forças metallicas dos bancos, as operações commerciaes estão muito restrictas.
Portanto, se não podemos aggravar com augmento consideravel de impostos nem o commercio, nem a industria, nem a agricultura, quer dizer, nenhum dos elementos da producção, nenhuma das forças productivas do paiz, como poderiamos, pois, aggravar com impostos o trabalho, que está na rasão directa da producção, ou o consumo que está na rasão directa do trabalho?
Diminuindo a producção, diminue o trabalho; diminuindo o trabalho, diminue e difficulta-se o consumo;.e portanto, seria tambem uma flagrante iniquidade crear ou augmentar impostos que podessem perturbar o modo de ser normal do consumo nacional.
Julgo que demonstrei que na occasião presente não seria conveniente recorrer em alta escala ao imposto para realisarmos o immediato equilibrio orçamental, e que ha por consequencia occasiões na vida das nações em que é preferivel manter o deficit orçamental a adoptar as providencias necessarias para assegurar o immediato equilibrio entre a receita e a despeza. (Apoiados.)
Sr. presidente, como que presinto já a seguinte exclamação dos illustres deputados da opposição: «Vejam o resultado dos melhoramentos materiaes. Lá se vae o hymno dos melhoramentos. A industria arruinada, a agricultura luctando com uma crise, o commercio retraindo!»
Os caminhos de ferro o os melhoramentos materiaes concorrem muito para o desenvolvimento da riqueza publica,
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mas não podem obstar a uma crise agricola, não podem fazer que a terra produza, quando a intemperie das estações o não permitte; não podem fazer que o solo americano seja menos productivo do que o europeu, não podem obstar ás grandes crises economicas, como a que estamos atravessando, porque estas crises são a consequencia inevitavel de leis imperiosas da esphera economica, dão o corrolario logico da grande desproporção em um dado momento entre os factos economicos, a producção, a troca e o consumo, ou entre os capitães disponiveis e a capitalisação, ou, finalmente, entre o numerario disponivel e o credito. Demonstrado que o deficit não póde ser extincto immediatamente por meio de medidas tributarias, resta averiguar qual deve ser a politica financeira dos governos para o extinguir no futuro, mas para isso convem descobrir primeiro a rasão historica da existencia do nosso deficit orçamental.
Provirá elle do exagero das nossas despezas ordinarias? Parece-me que não.
Eu não posso propor-me demonstrar que todas as despezas ordinarias, que actualmente se fazem, bem como as que de antes se fizeram, são e foram absolutamente necessarias, ou mesmo uteis, nem que parte d'ellas são e foram superfluas, porque não tenho conhecimentos, nem fôlego para tanto.
Mas o que me parece é que as despezas ordinarias do nosso paiz não têem sido exageradas: se em alguns serviços houve excessiva despeza, em outros houve falta, de modo que, feito o confronto de umas com as outras, não se póde dizer que o quantitativo das nossas, despezas ordinarias seja ou tenha sido exagerado, como se collige do confronto com as despezas das outras nações.
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D'estas nações a que menos gasta por habitante, depois de nós, é a Belgica, que ainda assim gasta mais 2,5212 réis do que nós. '
Nem se diga que este argumento não colhe a favor da moderação relativa das nossas despezas ordinarias, porque se a Belgica faz mais despezas do que nós, tambem tem os serviços melhor organisados, tem os serviços mais desenvolvidos, tem finalmente serviços uteis á nação, os quaes nós não temos, embora d'elles careçamos. Não contesto estes factos; pelo contrario, axfirmo-os, mas em compensação nós temos serviços organisados n'uma superficie de 94:000 kilometros quadrados, comprehendendo o continente e. as ilhas, e"a Belgica apenas em 29:000 kilometros quadrados; em compensação a nação portugueza tem por vezes de fazer de Pelicano tirando o sangue das suas veias para o mandar ás suas filhas de alem mar, ás provincias ultramarinas, e a Belgica não.
Ha mais: o sr. Mariano de Carvalho demonstrou no outro dia á camara que o quantitativo da divida publica da Belgica era inferior ao nosso.
E, todavia, sr. presidente, eu acabo de mostrar á assembléa que na Belgica gasta-se muito mais do que entre nós.
Pois se a nossa despeza, tanto ordinaria como extraordinaria, tem sido muito menor do que a da Belgica, e se apesar d'isso devemos muito mais do que aquella nação, o que deve concluir-se? Conclue-se que a nossa riqueza se desenvolveu no passado com muita morosidade; conclue-se que foi grande, e durou por largos annos, o nosso infortunio, pois que começámos os nossos melhoramentos e inaugurámos a politica do fomento muito depois da Belgica, pois que andámos por muito tempo entretidos em luctas civis,
sacrificando as vidas e esterilisando os campos, em logar de promovermos o desenvolvimento da riqueza publica, e a prosperidade moral e material da nação.
A prova do que affirmo está em que desde 1867 para cá o nosso confronto com a Belgica, no que respeita á administração financeira, é extremamente lisonjeiro para nós.
Desde 1867 para cá, periodo a que já hoje me referi, quer V. ex.ª, e a camara, ver como a Belgica elevou a sua despeza dos ministerios?
Despeza pelos ministerios:
1867......... 117.810:000 francos ou 21.205:000$000
1877......... 179.410:000 francos ou 32.293:000$000
Não se comprehende n'estas verbas a despeza com os encargos da divida publica.
Quer dizer, subiu a 11.000:000$000 réis; subiu mais de 50 por cento; as receitas tambem subiram 50 por cento.
Mas entre nós o que se deu em igual periodo?
As receitas ordinarias elevaram-se até 1878 mais do 10.000:000$000 réis, emquanto que a elevação da despeza ordinaria não excedeu no mesmo periodo a 8.000:000$000 réis, notando-se ainda a circumstancia de que nas contas do anno de 1877-1878 todas as despezas com a construcção de estradas vem descriptas como despeza ordinaria.
Assim, pois, n'este periodo a Belgica augmentou tanto as despezas ordinarias como as receitas ordinarias, emquanto que nós augmentámos muito mais estas receitas do que aquellas despezas.
Ha no confronto vantagem para nós.
Ha ainda vantagem sobre outro ponto de vista.
A Belgica augmentou 50 por cento as suas despezas pelos ministerios, e outro tanto as suas receitas ordinarias.
Nós augmentámos muito pouco as despezas pelos ministerios, como pôde observar-se confrontando as despezas ordinarias dos annos de 1866-1867 e 1877-1878, deduzindo previamente d'essas despezas os encargos da divida publica n'uma e n'outra epocha, muitos dos quaes são provenientes do largo desenvolvimento que ha alguns annos se têem dado aos trabalhos publicos, e que não tiveram ainda tempo de fructificar.
Mas ainda que não se faça tal deducção, a nossa administração financeira pôde supportar confronto nos ultimos dez annos com a da Belgica.
As nossas despezas ordinarias em 1867 foram de réis 20.600:000$000 réis, e em 1877-1878 de 28.600:000$000 réis, numeros redondos, e por consequencia houve augmento da despeza na proporção de 38 por cento.
A nossa receita ordinaria, que lei inferior a 15.000:000$000 réis em 1866-1867, foi superior a 25.000:000$000 réis em 1877-1878, houve, pois, um augmento de receita na proporção de 70 por cento, pouco mais ou menos.
O confronto, portanto, entre nós e a Belgica é, folgo muito de o dizer, para honra d'este governo e de todos os governos que têem havido de 1867 para cá, muito favoravel para nós. (Apoiados.)
Se apesar da vantagem que d'esta comparação resulta para nós, ainda nos achámos n'uma situação relativamente menos boa, a que devemos attribuir essa circumstancia?
Em primeiro logar ás condições de fortuna d'aquelle paiz, que com um territorio tres vezes mais pequeno do que o nosso tem comtudo uma população muito maior, o que é de todos o mais poderoso elemento de riqueza.
Depois d'isso aos desacertos politicos, financeiros e administrativos praticados anteriormente a 1867, e não no periodo de 1867 para cá, nem no periodo d'esta administração. (Apoiados.)
Penso ter provado tanto quanto possivel que não lemos o direito do attribuir a existencia do deficit orçamental ao exagero das despezas ordinarias, porque nós relativamente gastámos menos do que as outras nações.
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Podemos attribuil-o á quota do imposto?
Tambem não, porque o illustre deputado o sr. Mariano de Carvalho já demonstrou que nós pagavamos uma quota maior do que a da Belgica, Jeito o desconto relativo aos caminhos de ferro; e, ainda que o não demonstrasse, o que está a priori demonstrado é que sempre que ha deficit, todos os governos se empenham em o attenuar e tratam de explorar as fontes de riqueza publica em proveito do thesouro.
A que havemos, pois, de attribuir a existencia do desiquilibrio orçamental?
Aos factos que se deram até 1867, ao escasso desenvolvimento da nossa riqueza até aquella data, que não permittia o augmento das receitas, ao mesmo tempo que as necessidades imperiosas da civilisação e a urgencia de muitos serviços indispensaveis á sociedade forçavam fatalmente os governos a augmentar as despezas ordinarias.
Esta é que é a verdade.
Por consequencia, quando pensámos em extinguir o deficit, o desde que lhe sabemos a causa, qual a ordem de medidas a adoptar?
E a ordem de medidas tendentes a fomentar a riqueza publica, porque do que precisámos é de que a riqueza se desenvolva n'uma progressão maior do que até aqui.
As nossas despezas têem-se desenvolvido, agora e no passado, n'uma progressão menor do que lá fóra, e as nossas receitas têem-se desenvolvido, até 1867, n'uma progressão menor, e desde 1867 em progressão maior do que lá fóra, e temos deficit, ao passo que a Belgica não o tem.
Qual é a rasão d'isto?
E que lá fóra a riqueza publica, começou a desenvolver-se em grande escala mais cedo do que entre nós, e, por consequencia, o unico systema a adoptar para todos os governos, o mal farão se assim não procederem, é dotar o paiz com medidas tendentes a continuar e augmentar o fomento da riqueza publica.
Assentado, como está, o principio de que o modo de extinguir o deficit é o fomento da riqueza publica, não para o extinguir de uma vez, mas por uma vez, para se augmentar quanto possivel a, progressão das receitas ordinarias relativamente á das despezas ordinarias, a consequencia é que a politica financeira que nos pôde convir é a politica do fomento.
Esta é a primeira condição para a resolução da questão financeira.
D'este modo chego á convicção de que, não só este governo, mas todos os governos, têem obrigação de dar largo desenvolvimento aos melhoramentos materiaes, como condição impreterivel para o equilibrio da receita com a despeza. (Apoiados.)
Mas não bastam unicamente os melhoramentos materiaes, e devo dizer a V. ex.ª o á camara, a este respeito, que se porventura a iniciação dos melhoramentos materiaes realisados em alta escala constituem o trophéu de glorias do partido regenerador, desejaria, que, não só este, mas todos os partidos, tivessem attendido mais ás reformas economicas.
Não faço accusação a ninguem, ou se a faço é a. todos os nossas governos, porque o mal não é de agora; vem do longe e de muito longe.
Um dos requisitos, sem duvida mais importantes, para que possamos aspirar ao largo e rapido desenvolvimento da nossa agricultura, da nossa industria e do nosso commercio é incontestavelmente a, barateza dos capitães.
N'este ponto estou inteiramente de accordo com os illustres deputados os srs. Anselmo Braamcamp e Emygdio Navarro.
Capitães baratos: tal é o problema economico porventura é mais importante na actualidade, que cumpre resolver, como uma das primeiras condições para o largo desenvolvimento da riqueza, o, portanto, da receita, publica.
Segundo runa estatistica que eu extractei de um documento official belga, o preço dos capitães, a taxa do desconto tem sido muito inferior á do nosso paiz no largo periodo do 1851 a 1871, a que se refere a mesma estatistica:
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Em vinte e uni annos a taxa media do desconto foi approximadamente de 4 por cento n'estas nações, emquanto que entre nós a taxa do juro nunca inferior a 5 por cento, raras vezes inferior a 6 por cento, é frequentemente do 7, 8,9 e mais por cento.
N'estas condições, nem a agricultura, nem a industria, nem o commercio podem desenvolver-se com aquella rapidez que seria para desejar. N'este ponto estou de accordo com os illustres deputados da opposição; no que não estou de accordo é em outro ponto.
S. ex.as acham que o recurso do estado ao credito é sempre nocivo á barateza dos capitães. Eu não o entendo assim, porque me parece que tal doutrina não é verdadeira em absoluto.
Quando o estado recorre largamente ao paiz para fomentar o trabalho, para desenvolver a riqueza, para dar trabalho em toda a parte, augmenta o consumo, promove e excita a producção, fomenta as trocas, e, por consequencia, só por um lado levanta, das mãos dos capitalistas os capitães disponiveis, por outro lado augmenta os capitães disponiveis, as economias do operario que trabalha, do proprietario e industrial que produzem e do commerciante que transporta.
A compensação é grande e extremamente vantajosa para a economia do paiz.
Carecemos, porém, em todo o caso. como meio de extinguir o deficit pelo augmento da progressão da riqueza publica o particular, carecemos, repito, de estudar as medidas economicas tendentes a baratear os capitães nos nossos mercados.
Para, a realisação d'este intuito deve concorrer efficazmente a revisão completa do nosso regimen economico. Nós temos escola mercantil de mais nas nossas alfandegas, e laisser faire, laisser passer de mais do regimen interno da nossa industria. E mister prohibição de menos nas nossas pautas, e menos Bastiat e menos Quesnay no interior do paiz.
O laisser faire, laisser passer, quando significa a inercia do estado perante, a iniciativa individual, quando significa o respeito pela liberdade de todos o de cada um, é santo, justo, e, alem d'isso, indispensavel para o progresso moral e material do paiz. Quando, porém, exprime a inercia do estado perante a inercia individual, quando significa a, ausencia, de estéreos na senda do progresso, tanto por parte do estado, como por parte, dos cidadãos, é a maior de todas as calamidades e tem sido uma das principaes origens do atrazo da, nossa agricultura e da nossa industria em confronto com o estado actual da civilisação material das nações cultas da Europa e do inundo. (Apoiados.)
Um outro requisito indispensavel para o equilibrio orçamental por meio de rapido desenvolvimento da riqueza é a organisação da nossa circulação fiduciária, como meio de augmentar e multiplicai o instrumento das trocas.
A circulação fiduciária era por habitante em França em 1869 de 6$300 réis, na Inglaterra em 1868 de 6$480 réis, na Belgica em 1869 do 7$380 réis, na Confederação
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Sessão de 28 de abril de 1879
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
da Allemanha do Norte em 1870 de 5$580 réis, nos Paizes Baixos em 1860 de 13$320 réis.
Desde estas datas a circulação tem ainda augmentado e em algumas nações muito consideravelmente.
Pois em Portugal a nossa circulação era em 1874 de 871 réis por habitante, ou ainda menos, porque fiz o calculo sobre uma população de 4.200:000 almas, numero inferior á realidade em vista da ultima estatistica da população.
É, pois, insignificante a nossa circulação fiduciária, mesmo quando a comparámos com a que tivemos n'outros tempos.
Em 1838 a nossa circulação por habitante era de 1$622 réis, e em 1845 antes do curso forcado era de 2$710 réis.
Temos, pois, retrogadado muito sob este ponto de vista.
Urge, como condição impreterivel de uma boa politica de fomento, prover a este estado de cousas, logo que as circumstancias o permittam.
O momento actual não é opportuno para isso.
O governo actual, em tempo, apresentou uma proposta. n'esse sentido, com cujo pensamento fundamental eu estou completamento de accordo, embora discorde do que respeita á solução da questão transitória, mas foi adiada a discussão d’ella, porque ao governo parece, assim como é opinião minha, que não é conveniente por emquanto a sua discussão, em vista das tendencias que o cambio do Brazil tem apresentado para nos ser desfavoravel por longo tempo.
Quando se apresentou aquella proposta todos julgavam que a crise fosse transitória, como resultante do uma perturbação passageira nos nossos bancos, mas posteriormente causas estranhas ao paiz fizeram com que a crise se tornasse duradoura, e com que o cambio do Brazil tenha continuado a ser-nos adverso.
Eu não sou d'aquelles que julgam que o largo desenvolvimento da circulação fiduciária é sobretudo util para as occasiões de crise. Entendo, pelo contrario, que só é grandemente util nos tempos de prosperidade. Em circumstancias criticas pôde ser um perigo, e raras vezes é um bem. Será um perigo, porque n'essas occasiões o descredito e a desconfiança podem estender-se ás notas do banco. É raras vezes um bem, porque sob a influencia permanente dos maus cambios estrangeiros e da diminuição da actividade nacional, todo o numerario que não é absolutamente indispensavel ás trocas vae para as nações que têem o cambio favoravel, e portanto as notas em circulação no paiz dão logar á exportação" de igual valor em moeda, sendo as proprias notas o instrumento de que se servem os exportadores de moeda para exhaurirem as reservas metallicas dos bancos, a fim de as enviarem para o estrangeiro. Faço estas declarações para que se não diga que eu irrogo censura ao governo pelo facto de não ter feito discutir a proposta de organisação fiduciária, que apresentou ás côrtes em 1877.
É n'este caminho que devemos proseguir, como meio de matar o deficit orçamental.
O equilibrio do orçamento não se decreta n'um anno; nem de uma só vez, mas sim em virtude de um plano successivamente executado: n'este ponto é governo e a maioria d'esta casa conformam-se inteiramente com a opinião do illustre deputado o sr. Anselmo Braamcamp. E o plano deve consistir no fomento da riqueza pelo complemento dos nossos melhoramentos, pela revisão do nosso regimen economico, pelo barateamento dos capitães e pela opportuna organisação da circulação fiduciária. Se a nossa riqueza fosse proporcionalmente igual á da França, por exemplo, se ella permittisse que ao contribuinte se pedisse tanto como se pede em França, só as nossas alfandegas e contribuições indirectas poderiam produzir por habitante 6$786 réis ou por 4 milhões e meio de habitantes 30.456:000$000 réis em logar de 14.284:000$000 réis em que esta proveniencia é calculada no orçamento de 1879-1880, e similhantemente o imposto do sêllo produziria 3.483:000$000 réis em logar dos 974:000$000 réis em que é calculado no orçamento. A nossa posição topographica o muitas outras circumstancias não permittirão talvez que a nossa riqueza venha a equiparar-se, proporcionalmente já se vê, á da França, mas com certeza não nos impõem tambem, como limite insuperavel, que continuemos tanto o tanto distanciados.
Eu não quero fatigar a camara com mais considerações relativas ao deficit; a camara deve estar cansada de me ouvir. (Muitas vozes: — -Não, não, não está.)
Mas visto que tomei a palavra, não me sentarei sem me referir a algumas das accusações que têem sido feitas á administração actual.
O governo tem sido accusado de exceder as verbas do orçamento. O governo não pôde encobrir este facto, porque todos o sabem, e não o quer encobrir porque tem apresentado sempre regularmente ao parlamento as contas dos diversos ministerios; confessa francamente o facto, e toma a responsabilidade d'elle perante o parlamento e o paiz.
Ha pouco mais de dois annos governava este paiz um governo presidido pelo sr. duque d'Avila, o qual excedia progressivamente as verbas auctorisadas na lei orçamental, e o governo que assim procedeu merecia ao partido progressista um apoio tão leal e tão sincero como incondicional. Gomo é pois que 03 srs. deputados do partido progressista accusam hoje o governo por exceder as verbas orçamentaes? É preciso que s. ex.as demonstrem que o mesmo facto é virtude quando praticado por governos que tenham o seu apoio, e que é crime quando praticado por governos que o não tenham. (Apoiados.)
Façam a demonstração, se lhes apraz.
Sr. presidente, as despezas orçamentaes podem agrupar se em duas grandes categorias. Pertencem á primeira aquellas, cujo quantitativo é por sua natureza fixo, como são os vencimentos de todos os servidores do estado, etc.. Pertencem á segunda aquellas despezas cujo quantitativa é por sua natureza eventual e dependente de muitas circumstancias, como, por exemplo, as chamadas despezas eventuaes dos ministerios, as de construcção, as retribuições por serviços extraordinarios e muitas outras.
Em regra não é difficil aos poderes publicos evitar os excessos das verbas orçamentaes nas despezas da primeira categoria, logo que no orçamento se descrevam os vencimentos de todos os servidores do estado.
Nas despezas da segunda categoria, qualquer que seja o desejo e a vontade dos governos, necessidades imperiosas do serviço publico, ou circumstancias graves da nação, impõem frequentes vezes fatalmente ao governo o excesso das verbas orçamentaes. (Apoiados.)
Em 1876, por exemplo, o governo actual em nome da salvaguarda dos interesses da nação, adiantou aos bancos valiosas sommas, algumas d'ellas tendo por base a futura rescisão dos contratos relativos ás classes inactivas; para attenuar os effeitos da crise, economica que então assolava o paiz, mandou dar largo desenvolvimento por toda a parte aos trabalhos publicos; para minorar na mesma occasião o estado afflictivo dos povos do Algarve, mandou applicar grandes quantias á construcção do caminho de ferro e das estradas d'aquella provincia.
Para todas estas despezas e muitas outras impreteriveis ou excedeu as verbas orçamentaes, ou nem verba tinha no orçamento, e apesar d'isso, estas illegalidades foram reclamadas pela opinião, exigidas pela imprensa, e sanccionadas pela consciencia publica, (Apoiados.) e constituem ainda hoje, como constituirão por muito tempo, um dos actos mais notaveis e um dos serviços mais brilhantes prestados ao paiz pelo governo regenerador. (Apoiados)
Não é só quando perigam os grandes interesses da nação que o governo se vê forçado a exceder as verbas do orçamento.
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Em obras publicas, sobretudo, acontece isso frequentemente.
Supponha V. ex.ª, e a camara, que se tinha feito a planta de um edificio, e em harmonia o plano e o orçamento feito pelos technicos; o governo pedia ao parlamento, e este votava, a construcção do edificio, auctorisando para esse fim a verba de 20:000$000 réis, por exemplo.
Mandou-se proceder á construcção da obra, mas os calculos dos engenheiros falharam; porque os calculos dos engenheiros não só falham quando estes trabalham sob a direcção do governo regenerador, mas tambem quando trabalham sob a direcção de outros governos. (Apoiados.)
Isto acontece no nosso paiz, como acontece em todos os paizes. (Apoiados.)
Eu podia ler á camara uma estatistica curiosa, em relação a muitas obras da França, da Italia e de outros paizes em que as sommas gastas excederam muito as sommas orçadas pelos engenheiros.
Supponha-se, repito, que os calculos falharam; a mão de obra necessaria excedeu a calculada, um acontecimento imprevisto arruinou ou destruiu uma parte do edificio já construida, os salarios dos operarios foram maiores do que áquelles que estavam computados no orçamento; e por todas estas circumstancias, ou por alguma d'ellas a obra está em meio e os 20:000$000 réis consumidos.
Se o parlamento está aberto, pôde o governo pedir-lhe a votação de uma nova verba: mas se o não está?
Se não manda proseguir na obra, perde as vantagens da aprendizagem dos operarios feita n'aquella construcção, podem deteriorar-se os materiaes postos no logar da construcção e ainda não collocados, pôde damnificar-se a parte já construida, torna mais cara a obra pelo empate dos capitães, porque só mais tarde a obra estará prompta para servir ao fim a que é destinada, e pôde prejudicar outros interesses se houver vantagem publica na rapida conclusão do edificio. (Apoiados.)
Mas se o governo, para fugir a estes inconvenientes, manda proseguir na obra excede as verbas do orçamento, e é accusado pela opposição parlamentar de ter gasto illegalmente.
Collocado n'este dilemma, o que deve fazer o governo?
Deve mandar proseguir na obra, deve assumir a responsabilidade da illegalidade, quaesquer que sejam ou passam ser os clamores dos seus adversarios politicos. (Apoiados.)
Não é só em obras publicas que muitas vezes o governo se vê forçado, pelo imperio das circumstancias, a exceder as verbas orçamentaes.
Por exemplo, no ministerio da guerra por vezes têem sido excedidas as verbas orçamentaes para compra de rações para o exercito.
Se o principio de que as verbas orçamentaes não devem ser excedidas em caso algum fosse um principio absoluto e inquebrantável, a consequencia seria que logo que se extinguisse a verba auctorisada para rações, o governo deveria deixar morrer de fome os pobres soldados, ou aliás despedil-os do serviço embora n'elle fossem indispensaveis.
Qualquer das conclusões é absurda.
Nem por isso se diga, como me parece que disse o sr. Pereira de Miranda, que visto excederem-se as verbas orçamentaes, é completamente inutil a discussão do orçamento. Que áquelles que, quando são poder, não fazem discutir e votar o orçamento, declarem inutil a sua discussão e votação, comprehende-se. Mas o partido regenerador tem sustentado sempre que a discussão parlamentar do orçamento é uma das maiores conquistas da civilisação moderna e uma das principaes funcções do parlamento.
O orçamento discute-se e vota-se, não para que o governo o não exceda em caso algum, mas para que haja de assumir grande responsabilidade perante o parlamento e o paiz, e careça de justificar-se quando, porventura, as necessidades publicas o forcem a exceder as verbas orçamentaes.
Este prurido de legalidade à tort et à travers dos illustres deputados da opposição, este prurido do legalidade á outrance é reduzido aos justos limites pelos seus respectivos partidos, quando estão no poder, pois que não duvidam exceder as verbas orçamentaes, quando assim é necessario, para eximir de perigos os grandes interesses da nação, ou para evitar qualquer perturbação nos serviços publicos.
N'uma palavra: a discussão e votação do orçamento tem a suprema vantagem de habilitar a opposição a accusar o governo, quando este exceder as auctorisações parlamentares, de forçar o governo a defender-se e justificar-se, e de elucidar a opinião publica para pronunciar o seu juizo, dirimindo-a contenda entre o governo e a opposição. (Apoiados.)
Sr. presidente, o governo tem sido accusado tambem por causa das suppostas malversações dos dinheiros do estado nas obras publicas do Algarve.
Não quero agora entrar na discussão do merecimento d'este assumpto.
Está pendente o inquerito a que o sr. ministro das obras publicas mandou proceder, e pior isso limito-me a dizer, que não só eu, mas toda a maioria d'esta casa estamos convencidos de que, assim como s. ex.ª e o governo se mostraram incapazes de punir presumptivos innocentes (para mim todos são innocentes emquanto não se provar que são culpados), para satisfazer a declamações, a devaneios ou a odios de quem quer que seja, assim tambem se mostrarão incapazes de proteger culpados, se os ha, para satisfazer a pedidos ou a affectos.
Todos estamos convencidos d'isso, e não digo que é uma condição impreterivel do nosso apoio ao governo, porque reputo a condição superflua por desnecessaria. (Apoiados.)
Faça-se luz sobre esta questão e similhantes.
Faça-se luz, muita luz; faça se uma luz tão clara e brilhante que não fique na sombra o facto ou indicio de somenos importancia.
Que nos importa a nós o director das obras publicas do Algarve? Não sei quem elle é, nem preciso, nem quero sabel-o.
Faça-se luz n'esta questão para se proclamar a innocencia se não houver culpa, e para que ninguem nem ao menos sonhe que o governo portuguez é capaz de acobertar culpados ou criminosos, se os houver e tiver conhecimento da sua culpa ou crime.
Ao sr. ministro das obras publicas e ao governo peço, que, logo que esteja terminado o inquerito, o traga ao parlamento, se elle estiver aberto, ou, se o não estiver, o mande publicar no Diario do governo.
Se houver culpados, diga-se quem elles são; se houver innocentes declare-se isso, publique-se isso para que não pese sobre elles nenhuma suspeita odiosa e injusta.
O sr. Laranjo: — Apoiado.
O Orador: — Agradeço ao illustre deputado o seu apoiado, e tenho-o por bom symptoma.
A luz que eu peço para a questão do Algarve, espero que será a demonstração completa da probidade e do zêlo do illustre ministro das obras publicas. (Muitos apoiados.)
O apoiado do illustre deputado opposicionista mostra-me que a opposição não quer elevar-se á custa da injusta infamação dos seus adversarios politicos, dá-me a esperança de que os illustres deputados, em logar de continuarem a insinuar desde já que a falta de intempestiva; publicidade é prova de protecção a culpados, resolveram aguardar a opportuna publicação dos documentos, porque então, e só então, poderemos todos julgar com conhecimento de causa.
Ainda bem que entraram no bom caminho. Deus Nosso Senhor os firme e avigore n'esse proposito.
O sr. Laranjo: —E a syndicancia de Coimbra?
O Orador; — Não sei que syndicancia é essa a que se
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refere o illustre deputado; recordo-me de que em uma das sessões passadas se começou a fallar d'essa syndicancia antes da ordem do dia, mas fiquei sem saber ao que ella se refere, porque n'essa occasião ausentei-mo da sala para fumar.
Digo isto sem a minima intenção de offensa ao illustre deputado a quem considero não só pelo seu talento, pelo logar que occupa na universidade, e porque é meu collega, mas tambem porque não tenho motivo algum para o contrario; mas ausentei-me n'essa occasião.
Uma voz: — O governo recusou a publicação da syndicancia.
O Orador: — Não posso entrar, como disse, no merecimento de um assumpto que desconheço, mas estou certo do que, se o governo recusou essa publicação, é porque a julgou inopportuna em um dado momento. As conveniencias publicas muitas vezes reclamam o segredo transitorio em relação a alguns factos ou documentos da administração, assim como as conveniencias da justiça reclamam o segredo até ao despacho de pronuncia.
O segredo perpetuo sobre negocios publicos é que se não comprehende, nem pôde admittir, e por isso estou convencidissimo de que, se o sr. ministro das obras publicas recusou em um dado momento a publicação da syndicancia, nem por isso entende que haja do recusai-a sempre.
O governo tem sido accusado tambem do augmentar excessivamente as despezas ordinarias, de alargar os quadros e crear logares para collocar os seus afilhados.
Eu não posso passar em revista todos os serviços publicos, mas citarei alguns exemplos, para vermos até que ponto é fundada a accusação.
Vejamos quanto se gasta com as secretarias de estado, onde estão os altos funccionarios do estado, áquelles que estão junto do governo, e onde é natural que o governo quizesse collocar os seus amigos mais dilectos.
Pede-se no orçamento de 1870-1880 para despezas com as secretarias dos differentes ministerios 379:000$000 réis.
Quer V. ex.ª saber quanto se pedia no orçamento de 1865-1866, apresentado á camara pelo sr. Joaquim Thomás Lobo d'Avila, então ministro da fazenda do partido historico? Pediam-se 505:000$000 réis, isto é, mais réis 126:000$000 do que no orçamento d'este anno pede o governo actual.
Da quinze annos, quando governava o paiz o sempre economico partido historico, quando não tinha ainda visto a luz o chamado esbanjador governo da fusão, quando os serviços publicos tinham menor desenvolvimento o extensão, o partido historico pedia mais 126:000$000 réis para as secretarias do estado. Aqui tem V. ex.ª como o governo alarga, sem necessidade, os quadros do funccionalismo publico, para collocar os seus amigos.
Não está presente o sr. Dias Ferreira, porque se estivesse do certo s. ex.ª diria, que nada tinha que ver com isso.
Não foi s. ex.ª, porventura, chamado em 1868 em nome do povo, em nome da janeirinha, para reduzir as despezas, consideravelmente augmentadas pelo ministerio da fusão, e ainda mais consideravelmente elevadas pelo ministerio historico que precedera o da fusão?
Vejamos, pois, o que s. ex.ª pedia para as secretarias de estado na proposta orçamental para 1868-1869, apresentada pelo illustre deputado ao parlamento.
Pedia 548:000$000 réis, mais 169:000$000 réis do que o governo actual pede no orçamento que está em discussão!
E este era o governo das economias; este era o governo da janeirinha, quer dizer, a expressão, por excellencia, do governo das economias!... (Apoiados.)
A opposição pôde dizer-me a este respeito que s. ex.ª apresentou aquelle orçamento no mez de abril, isto é, pouco tempo depois do ter subido ao poder o ministerio da janeirinha, e que, portanto, o governo da janeirinha não tinha tido ainda tempo de preparar as economias em nome das quaes fóra chamado a governar.
Supponhamos que assim é, e vamos ao orçamento de 1869-1870, apresentado ao parlamento pelo sr. conde de Samodães.
Tinham decorrido cerca de dezeseis mezes depois da saída do ministerio da fusão; desde 26 do janeiro que estava publicado o decreto sobre as deducções nos ordenados dos funccionarios publicos, estava-se em plena maré de reformas e economias. Era ministro da fazenda o sr. conde de Samodães, de cujo espírito de economia ninguem ousará duvidar, o qual não só sentia vivamente, mas até annunciava ao paiz e ao mundo a extrema pobreza da fazenda publica, declarando positivamente que era necessario cercear muitissimo as despezas publicas.
Pois s. ex.ª pedia para as secretarias do estado no orçamento para 1869-1870 apresentado ao parlamento a quantia de 448:000$000 réis, isto é, mais 69:000$000 réis do que se pede no orçamento apresentado pelo actual governo para o anno do 1879-1880. (Apoiados.)
Ha dez annos, sendo ministro da fazenda o sr. conde de Samodães e dirigindo os negocios publicos o ministerio reformista que na sua curta, mas brilhante existencia foi sempre implacavel, talvez excessivamente implacavel com os funccionarios publicos, pediam-se 69:000$000 réis mais do que dez annos depois pede o governo actual. (Apoiados.)
Aqui está como o governo actual alarga os quadros sem necessidade imperiosa dos serviços e para collocar os afilhados, e aqui está tambem como os outros governos reduziam os quadros ao strictamente indispensavel, pondo de parte os seus amigos! (Apoiados.)
Eu não nego que em muitos capitulo» de despeza este governo tem augmentado as despezas ordinarias, mas isso é consequencia natural do desenvolvimento successivo dos serviços. (Apoiados.)
Por exemplo; a instrucção publica. Desde que vamos alargando a instrucção publica, creando escolas, tomos que pagar mais ordenados, porque lemes maior numero de professores.
Os caminhos de ferro. Desde que temos maior numero do kilometros em exploração precisámos de mais/pessoal para fiscalisação e conservação, e de mais pessoal o material para exploração.
As estradas ordinarias. A proporção que se vão construindo mais kilometros maior numero do pessoas lemos que subsidiar para as vigiarem e conservarem. (Apoiados.)
Ha ainda, outras despezas que têem acrescido, mas o que não se pôde provar facilmente é que esse augmento tem ido alem das necessidades imperiosas do serviço publico.
Por exemplo, para o ministerio da fazenda pedem-se 110 orçamento actual mais 504:000$000 réis do que se pedia no orçamento para 1872-1873; mas, comparando os dois periodos, resulta que em 1872-1873 a arrecadação dos impostos do estado, isto é, o preço das funcções relativas ao serviço das receitas publicas é relativamente, maior.
Em 1872-1873 pedia-se para as despezas do ministerio da fazenda, excluidos os capitulos relativos aos encargos geraes, a quantia de 1.420:000$000 réis, e calculavam-se os impostos directos, indirectos, sêllo e registo em réis 16.447:000$000.
Procurando-se a proporção em que aquella despeza está para esta receita, achar-se-ha a do 8,63 por cento.
Em 1879-1880 aquella despeza é orçada em réis 1.924:000$000, e esta receita em 22.611:000$000 réis, seja na proporção de 8,49 por cento, o que dá relativamente uma vantagem' na economia da arrecadação dos impostos para o anno do 1879-1880 de 0,11 por cento das receitas calculadas.
Poderia levar ainda mais longe este confronto, porque segundo a proposta orçamental de 1869-1870 a propor
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ção d'aquella despeza para aquella receita era do 10,4 por cento, o ainda superior na proposta do orçamento para 1868-1869.
Mas não quero levar tão longo este confronto, porque então as receitas publicas eram assas minguadas.
Vejamos agora se o governo actual é com justo fundamento accusado de ler augmentado o deficit, elevando consideravelmente as despezas.
“Ver Diario Original”
Assim, pois, o deficit medio annual no periodo de quatro annos, que antecedeu o advento ao poder da actual situação, foi, pouco mais ou menos de 7.900:000$000 réis.
Vejamos agora qual foi o deficit annual medio desde 30 de junho de 1871 a 30 de junho de 1878:
“Ver Diario Original”
Assim, pois, segundo este calculo, no qual vão computados como receita ordinaria os juros dos titulos na posse da fazenda e as reposições dos ministerios, o deficit medio annual durante a actual administração foi de 6.300:000/5000 réis; isto é, foi inferior ao deficit medio do periodo anterior em mais de 1.500:000$000 réis, media annual.
Não é, pois, sem fundamento que ou disse em varios pontos do meu discurso que o governo actual tinha cobrado durante a sua administração augmentos de receita suficientes não só para fazer face a todos os seus augmentos de despeza, mas ainda para diminuir a importancia do deficit preexistente, e note-se que me tenho referido ás despezas totaes, tanto ordinarias como extraordinarias.
Façamos agora a comparação da administração do actual governo com um outro periodo de prosperidade publica similhante ao que disfructámos até 1876, façamos o confronto com a administração financeira de 1861 a 1865.
Em 1871-1872 a receita ordinaria foi de 19.208:0005000 réis, e a despeza ordinaria de 23.666:000$000 réis; no periodo subsequente de seis annos a receita ordinaria foi, media annual, de 21.395:000$000 réis.
Cobrámos, pois, nos seis annos mais de 5.000:000$000 réis, media annual, em relação ao que tinhamos cobrado em 1871-1872.
As despezas ordinarias foram no citado periodo de seis annos de 25.727:000$000 réis, media annual, e portanto comparando esta despeza com a que se fez em 1871-1872 resulta que no periodo de seis annos as despezas ordinarias foram de mais 2.061:000$000 réis, emquanto que as receitas foram do mais 5.000:000$000 réis, ou ainda mais. Não póde, pois, o governo ser accusado de ter aggravado inconsideradamente o deficit orçamental ordinario, porque os augmentos da receita ordinaria têem excedido os augmentos da despeza ordinaria em mais de 3.000:000$000 réis, media annual.
Façamos agora o confronto com um periodo de similhante prosperidade publica.
Em 1860-1861 a receita ordinaria foi de 13.l25:OOO$OOO réis e a despeza total foi de 16.099:000$000 réis: deficit 2.974:000$000 réis.
No periodo de quatro annos que vae de 30 de junho de 1861 a 30 de junho de 1865 quando governavam os historicos, a media annual da receita ordinaria foi de réis 15.438:000$000 o a media das despezas totaes foi do réis 21.651:000$000; deficit 6.213:000$000 réis. ¦ Ao passo que as receitas foram, media annual, de mais 2.313:000$000 réis do que em 1860-1861, as despezas foram de mais 5.552:000$000 réis, Excesso do augmento da
despeza total sobre o augmento da receita ordinaria, réis 3.239:000$000 réis.
Ora do calculo que acima expuz quando confrontei os sete annos de administração do actual governo com os quatro annos anteriores, vê-se que emquanto que os augmentos de receita ordinaria foram em media de 6.438:000$000 réis, os augmentos da despeza total foram sómente de róis 4.842:000$000 réis; excesso dos augmentos da receita sobre o augmento da despeza 1.596:000$000 réis.
D'aqui pôde ver V. ex.ª e a camara o quanto differe a administração actual da que houve no paiz n'um periodo tambem de grande prosperidade publica.
O grande augmento das despezas ordinarias não teve logar em 1866-1867 durante a administração fusionista, como muita gente suppõe. Teve, sim, logar em um periodo anterior á fusão dos partidos historico e regenerador.
Se V. ex.ª e a camara compulsarem as contas dos ministerios e do thesouro publico, verão que as grandes difficuldades, em que se encontraram os governos nos annos de 1867 o subsequentes não foram provenientes de augmentos inconsiderados das despezas ordinarias dos annos de 1866 e 1867, porque esses augmentos foram pequenos; mas sim de diminuição das receitas ordinarias, em virtude da crise espantosa que se manifestou em 1866.
Confrontando as despezas ordinarias do anno de 1864-1865, ultimo anno da administração historica, com as do anno de 1866-1867, ultimo anno economico, cuja administração é da exclusiva responsabilidade do governo da fuzão, encontra-se na despeza ordinaria um augmento approximadamente de 1.000:000$000 réis, mas só com a junta do credito publico gastaram-se n'este anno mais 300:000$000 réis do que n'aquelle. Tomando em conta esta verba e alem d'isso a verba gasta a mais com os encargos da divida fluctuante, achar-se-ha que o augmento da despeza ordinaria dos ministerios não foi consideravel, nem poderá reputar-se a serio, como origem de uma temerosa crise financeira.
Visto que cheguei a este ponto, não concluirei sem omittir a minha opinião sobre a causa das perturbações que teve o credito publico em Portugal nos annos de 1868 e 1869, visto que quasi todos os deputados, que têem tomado parte n'este debate, se referiram a este assumpto.
Muitos dos illustres deputados regeneradores attribuem ao partido reformista e ao historico os males que affligiram o paiz n'essa epocha; e os da opposição attribuem ao governo fusionista; mas para mim a causa primordial da perturbação do credito publico durante os annos de 1868 o 1869 foi a administração do ministerio da janeirinha.
O governo da janeirinha subiu ao poder em nome de uma agitação popular. Bafejavam-n'o as auras da opinião publica, cantou-se em hymnos patrioticos por toda a parto o seu advento ao poder, annunciaram-se grandes reformas tributarias e financeiras, que iam equilibrar o orçamento.
Como correspondeu a janeirinha á missão que lhe era imposta pelas circumstancias e pela opinião?
Como devia corresponder sabemos nós.
Como devia corresponder era augmentando a receita e diminuindo a despeza, porque o paiz exigia isso. Mas ella supprimiu a receita e não supprimiu a despeza.
Em 1867 o deficit orçamental era já grande, não tanto pelo exagero das despezas ordinarias durante a administração fusionista, como principalmente pelo successivo decrescimento das receitas a contar do 1.° de julho de 1865, que então affectava o nosso paiz e as nações estrangeiras.
O governo encontrava-se em grandes difficuldades, visto que o deficit orçamental crescia de dia para dia em virtude da diminuição da receita, vendo-se portanto obrigado a recorrer em escala progressiva ao credito para prover ás despezas publicas.
Acontecia isto quando o cambio do Brazil nos era do tal modo desfavoravel, que o governo não podia encontrar
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no mercado portuguez os capitães de que precisava, carecendo por isso de procural-os no mercado de Londres.
Este achava-se em estado de crise extraordinaria, porque linha sido atacado da febre bancaria, crise mui similhante aquella com que nós luctámos em 1875.
Era tal o retrahimento dos capitães no mercado de Londres, que nunca em tempos de paz se tinha visto, nem viu depois retrahimento tão consideravel.
Tínhamos, pois, grande desequilibrio orçamental e não era satisfactorio o estado do nosso credito, nem o das nações estrangeiras.
Tal era o estado das cousas em 1866 e 1867.
O governo da fusão, para obviar a seu modo o quanto possivel a este estado de cousas, apresentou ao parlamento, em 1867, varias propostas tributarias que foram convertidas em leis, cuja receita foi calculada em mais de réis 1.300:000$000.
O grande erro da fusão, erro que a comprometteu perante a opinião do paiz, consistiu em propôr augmentos de receita sem propôr tambem diminuição das despezas ordinarias, na parte em que significavam excessos do funccionalismo, ou retribuição do serviços inuteis ou dispensaveis.
Subiu ao poder o governo da janeirinha em 1868 e subiu em nome do equilibrio orçamental.
O povo não se recusava a pagar mais, mas exigia que se gastasse menos. E este o programma em nome do qual o governo da janeirinha subiu ao poder. Como correspondeu este governo ao seu programma e á legitima expectativa publica?
Correspondeu-lhe, supprimindo a receita creada pelos seus antecessores sem a substituir por outra equivalente. Correspondeu-lho, não decretando reducções consideraveis na despeza. Correspondeu-lhe, apresentando ao parlamento uma proposta de orçamento que divergia da que tinha sido elaborada pelo governo da fusão nos dois seguintes pontos: 1.°, em diminuir a receita em 1.322:000$000 réis; 2.°, em diminuir a despeza, quer V. ex.ª e a camara saber em quanto? Quasi não se acredita, pois parece uma suprema irrisão perante a gravidade das circumstancias; diminuía a despeza em 28:000$000 réis!...
Um governo, que tinha subido ao poder em nome do equilibrio orçamental, legou ao partido reformista, aos seus successores, um desequilibrio orçamental aggravado em mais do 1.300:000$000 réis; legou-lhe o malogro completo da espectativa publica; legou-lhe a recente recordação de uma dictadura obnoxia, que só soube destruir e que não teve a coragem, nem a iniciativa do edificar.
Que magnifica occasião se perdeu, sr. presidente, para dotar o paiz de reformas tributarias, financeiras e economicas de grande alcance!
Em logar d'isso, proclamou-se geralmente que não deviam augmentar se os impostos, sem que primeiro se diminuíssem as despezas.
Esta doutrina proclamada pelos que hostilisam os governos, pôde ser um argumento mais ou menos logico, mais ou menos rhetorico, segundo as despezas deverem ou não ser reduzidas.
Proclamada, porém, pelos que os apoiam, carece de ser acompanhada desde logo da effectiva reducção d’essas despezas, porque, se o não for, pôde levar á anarchia ou á revolução.
A administração do governo da janeirinha, malogrando completamente a expectativa publica, produziu viva commoção no paiz e no estrangeiro, da qual resultou para nós um grande mal, porque se começou a duvidar na praça de Londres, não dos recursos do paiz, mas da seriedade do governo portuguez.
Ainda bem que lhe succedeu o sr. bispo de Vizeu, porque o paiz julgou encontrar n'elle o seu salvador, o por isso lançou-se nos seus braços em logar de procurar salvar-se a si proprio, o foi este talvez o serviço mais importante prestado pelo sr. bispo de Vizeu ao seu paiz.
O povo agitára-se para precipitar do poder áquelles que julgava seus inimigos — o governo da fusão — o para os substituir pelos seus amigos — o governo da janeirinha—, a quem confiara a salvação da causa publica.
Malogrado pela politica financeira dos seus amigos, se não tivesse confiado plenamente no sr. bispo de Vizeu, é natural que o povo procurasse salvar-se a si proprio, e só Deus sabe quaes poderiam ler sido as terriveis consequencias do tal acontecimento.
N'estes termos, sr. presidente, pergunto eu: quaes seriam as causas das perturbações do nosso credito em 1868 e 1869
Seria por haver deficit orçamental? Não, porque deficit orçamental houve até 1865, e apesar d'isso o nosso credito não andava arrastado no mercado de Londres.
Deficit orçamental temol-o tido desde 1871 até hoje; o nosso credito, ou tem prosperado, ou tem-se mantido quasi inalteravel na prosperidade.
Seria porque não se fizeram reducções na despeza publica? Não, porque o governo reformista e o governo historico fizeram importantissimas reducções na despeza. Seria porque estes governos não augmentassem as receitas? Tambem não, pelo mesmo motivo.
Seria por causa das circumstancias do mercado de Londres, como em 1866 e 1867? Não, porque o mercado de Londres dia a dia melhorava de 1868 por diante, emquanto que o nosso credito, do 1868 a 1869, peiorava em logar de melhorar, como devia, em obediencia á lei economica dos mercados.
Foi porque, apesar da respeitabilidade do sr. Braamcamp, do sr. bispo do Vizeu, e do finado duque de Loulé, foram precisos largos annos de amarguras e de sacrificios para convencer o mercado de Londres de que o governo portuguez linha seriedade, de que o governo portuguez pensava a serio na sua organisação financeira. Tão viva era a impressão que tinha legado a politica financeira da! janeirinha!
Foi o que nos legou um governo sem pensamento governativo, sem systema de administração, sem cousa nenhuma.
Peço desculpa á camara de lho ter tomado tanto tempo. Algumas outras considerações que linha ainda de fazer, ficam para melhor occasião. Vozes: — Muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): — Tenho a honra de mandar para a mesa tres propostas de lei, que não leio para não cansar a camara n'esta altura do debate: a primeira fazendo algumas modificações na lei do recrutamento actualmente em vigor; a segunda, legalisando varias despezas do orçamento de 1876-1877; e a terceira, fazendo uma modificação pouco importante na reforma do generalato.
Leram-se na mesa as seguintes:
Proposta de lei n.° 110-A
Senhores. — Tenho a honra de submetter á vossa illustrada deliberação algumas providencias, que me parece conveniente adoptar para melhorar e aperfeiçoar o serviço do recrutamento.
As leis por que se tem regido o lançamento e a distribuição do importante imposto de sangue, em parte por deficiencia de disposições e n'outra parte pela largueza das isenções, que a jurisprudencia, sempre benevola n'este assumpto, ainda mais tem ampliado, dão causa a que o mesmo imposto deixe de ser repartido com a rigorosa justiça que em geral deve presidir á repartição dos impostos.
Movido da conveniencia de remediar estes inales e do
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attender ao mesmo tempo ás exigencias do serviço publico na organisação da força armada, incumbi uma commissão composta do pessoas esclarecidas e competentes de propôr as providencias que julgasse acertadas para conseguir este duplo fim.
A commissão desempenhou-se da sua incumbência com a intelligencia e zêlo proprios dos seus membros, o propoz um projecto de alterações na legislação vigente, com as quaes em maxima parte me conformei e que têem principalmente em vista:
1.° Conseguir a maior exactidão e verdade dos recenseamentos;
2.° Restringir as isenções do serviço militar, a fim de que este se torne, quanto possivel, obrigatorio para todos os que reunam as condições que constituem a incidencia do imposto;
3.° Facilitar e favorecer a defeza dos direitos dos interessados;
4.° Abreviar, sem quebra do direito de discussão, o expediente do processo do recrutamento, para que n'este se obtenha a celeridade que convem a este ramo do serviço publico.
Com estas providencias e com as demais que no mesmo intuito a vossa illustração vos suggerir, entendo que merecerá a vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° O recrutamento para as forças militares de terra e de mar continua a ser feito por meio de recenseamento e de sorteio, na conformidade das leis vigentes e das alterações determinadas n'esta lei.
Art, 2.° Para a determinação do domicilio dos mancebos que hão de ser recenseados observar-se-hão as regras seguintes:
1.ª O domicilio dos menores não emancipados é o de seus paes, tutores ou pessoas de quem legitimamente dependam;
2.ª O domicilio dos menores solteiros emancipados é o de seus paes, tutores ou pessoas de quem legitimamente dependiam antes da emancipação;
3.ª O domicilio dos menores casados é o da sua propria residencia, segundo as regras geraes de direito;
4.ª O domicilio dos mancebos, que não residam no reino, e cujos paes ou tutores tambem estiverem ausentes, ao tempo das operações do recenseamento, é o que tinham quando se ausentaram;
5.ª Os mancebos nascidos em paiz estrangeiro de paes que não tivessem no reino domicilio conhecido, consideram-se domiciliados no logar do domicilio dos mais proximos ascendentes paternos que no reino fossem domiciliados.
§ 1.° Para os effeitos das leis do recrutamento não são reconhecidas mudanças de domicilio que não tenham sido manifestadas perante as camaras municipaes de que trata o artigo 44.º do codigo civil, com a antecipação do seis mezes ao dia em que começarem as operações do recenseamento.
§ 2.° Podem ser recenseados nos concelhos em que forem encontrados todos os mancebos visivelmente aptos para o serviço militar, que não mostrarem terem sido recenseados na idade legal, e que não excedam a de trinta annos completos. '
§ 3.° Ninguem pôde ser attendido em reclamação fundada em erro de domicilio sem provar que está recenseado no domicilio legal.
Art. 3.° No recenseamento annual de cada concelho ou bairro serão inscriptos todos os mancebos que desde 1 de janeiro ale 31 de dezembro do anno em que começarem as operações do recenseamento completarem vinte annos.
Art. 4.° O recenseamento para o recrutamento militar e incumbido a uma commissão composta do administrador do concelho ou bairro, presidente, de dois vereadores eleitos pela camara, e de dois cidadãos chefes de familia, paes
ou tutores, sendo possivel, de mancebos que entrem no recenseamento.
§ 1.° Os dois cidadãos chefes de familia poderão ser differentes para as diversas freguezias e residentes n'aquella de cujo recenseamento ce tratar, e serão nomeados pela camara.
§ 2.° Os parochos e regedores assistirão ao recenseamento dos mancebos das suas freguezias, e terão assento na mesa com voto consultivo.
§ 3.° Os parochos apresentarão á commissão os livros dos nascimentos que possam servir de informação para a organisação do recenseamento.
§ 4.° Poderão, alem d'isso, ser chamadas pela commissão quaesquer outras pessoas que estejam nas circumstancias de prestar informações.
§ 5.° Servirá de secretario da commissão o do administrador do concelho, ou outro empregado da administração que seja designado pelo administrador.
Art. 5.° O recenseamento para o sorteamento e recrutamento militar terá por base:
1.° As listas parochiaes organisadas pelos parochos;
2.º As relações, que devem sei entregues annualmente pelos chefes ou administradores dos estabelecimentos de caridade e beneficencia, de todos os mancebos sob a sua dependencia que estejam nas condições de entrarem no recenseamento militar;
3.º As relações, dadas pela camara municipal, dos filhos dos estrangeiros que tenham obtido naturalisação, o d'aquelles que tenham mudado de domicilio para o concelho o estiverem sujeitos ao recrutamento;
4.° O descobrimento, por qualquer modo obtido, dos mancebos que devendo ter sido recenseados nos annos anteriores não o tenham sido, uma vez que não excedam a idade de trinta annos.
Art. 6.° Até ao dia 6 do outubro de cada anno será remedida pelos parochos das freguezias ao administrador do respectivo concelho ou bairro uma lista, por elles assignada, contendo o nome, filiação e mais circumstancias indicadas no modelo approvado pelo governo de todos os mancebos domiciliados na freguezia ou n'ella residentes, e que durante o anno tenham completado ou venham a completar vinte annos.
§ 1.° A lista de que trata este artigo será organisada era vista dos elementos do que tratam os artigos antecedentes e do quaesquer outras informações e esclarecimentos que possam ser obtidos.
§ 2.° Os parochos serão auxiliados, para a formação das listas, pelas juntas de parochia o pelos agentes da auctoridade, de qualquer natureza, que haja na parochia.
§ 3.° Os parochos que deixarem de cumprir a obrigação imposta n'este artigo, ou praticarem alguma omissão, serão condemnados correccionalmente na multa de 20$O0O a 100$000 réis, segundo o grau da culpa, e salva a pena maior em que incorrerem, havendo falsidade ou dolo.
Art. 7.° As operações do recenseamento começarão no dia 10 de outubro do anno anterior aquelle para que se faz o recrutamento.
§ 1.° A commissão recenseadora, depois do installada, designará os dias, seguidos ou alternados, em que ha de funccionar, os quaes serão annunciados por editaes affixados nas portas das igrejas de cada freguezia, e pelos parochos á missa conventual.
§ 2.° As sessões da commissão recenseadora serão sempre publicas.
§ 3º (...) do recenseamento serão dirigidas do (...) ultimadas até ao dia 15 de novembro.
(...) proporção que se ultimar o recenseamento de cada freguezia, mandar-se-ha immediatamente affixar na porta da igreja matriz uma copia com a declaração de que os interessados podem desde logo apresentar, perante a respectiva commissão, as suas reclamações por escripto,
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mas que serão admittidos a reclamar verbalmente quando se tratar da rectificação do recenseamento.
Art. 0.° Alem do annuncio a que se refere o artigo precedente, serão citados pessoalmente todos os mancebos comprehendidos no recenseamento para poderem reclamar o que entenderem do justiça, declarando-se-lhes na citação o dia que a commissão recenseadora designou para proceder á rectificação do recenseamento da respectiva freguezia o para tomar conhecimento das reclamações dos interessados.
§1.° A citação será feita nos termos geraes do direito por meio de quaesquer agentes da auctoridade publica no concelho ou parochia, entregando-se ao interessado uma cédula impressa com as respectivas declarações e conforme o modelo approvado pelo governo.
§ 2.° A citação será feita ao proprio mancebo recenseado ou a seu pão, mãe, tutor, parente até ao terceiro grau, amo, e na falta d'estes na pessoa do um vizinho.
Art. 10.° No primeiro domingo que seguir ao dia 15 de novembro, a commissão recenseadora precederá, em audiencia publica, ás rectificações do recenseamento, lendo-se em voz intelligivel o recenseamento do cada freguezia, e notificando-se as reclamações que contra elle hajam sido apresentadas por escripto ante a commissão. Acceitar-se-hão as reclamações que n'esse acto forem apresentadas pelos interessados, seus paes, tutores, mães, parentes até ao terceiro grau, amos ou procuradores.
§ 1.º As reclamações poderão ser feitas tanto contra a inclusão como contra a exclusão de qualquer mancebo.
§ 2.° A commissão ouvirá summariamente o reclamante se a reclamação for verbalmente feita, admittirá as provas que se apresentarem a favor ou contra, e resolverá o que for de justiça, fazendo-se de tudo uma acta, na qual resumidamente se narre o que occorrer e a resolução que se tomou.
Art. 11.° Se não for possivel aos interessados offerecer logo as provas da sua reclamação, a commissão marcará um praso rasoavel para dentro d'elle serem apresentadas, devendo constar da acta esta circumstancia.
Art. 12.° As resoluções que forem tomadas pelas commissões recenseadoras serão intimadas aos reclamantes ou ás pessoas mencionadas no artigo 9.°, com a declaração que da decisão podem interpor recurso para o juiz do direito da comarca dentro do praso de oito dias, a contar do da intimação.
§ unico. Se os interessados estiverem presentes ao acto da publicação da decisão, serão ahi mesmo intimados, e os oito dias contam-se desde esse acto.
Art. 13.° As reclamações serão decididas pela commissão até ao dia 15 do dezembro, e as alterações provenientes d'estas decisões addicionadas ao recenseamento, e bem assim annunciadas em cada freguezia por editaes affixados na porta da igreja..
Art. 14.° Os recursos para o juiz de direito e d'este para a relação respectiva serão processados do mesmo modo e pela mesma fórma que o são os recursos em materia de recenseamento eleitoral. Os juizes do direito decidirão estes recursos até ao dia 15 de janeiro.
§ unico. Não é permittido recurso do revista. Art. 15.º As commissões recenseadoras farão no recenseamento todas as rectificações que forem determinadas pelos tribunaes á proporção que lhes forem apresentados os despachos e sentenças, de modo que o recenseamento esteja concluido até 31 de janeiro. O recenseamento assim rectificado fica definitivo, o por elle se fará o sorteamento sem alteração alguma, excepto na caco mencionado no artigo seguinte.
Art. 16.° Se em qualquer tempo, ainda depois do sorteamento, se descobrir que um mancebo foi recenseado em mais de um concelho, o governador civil, em conselho de districto, resolverá em qual dos concelhos deverá ser considerado como legitimamente recenseado; se, porém, os concelhos pertencerem a differentes districtos, a resolução pertencerá ao governo, o segundo ella se procederá, nos termos ulteriores do recrutamento.
Art. 17.° No primeiro domingo que se seguir ao dia 15 de janeiro, as commissões recenseadoras procederão em cada concelho ou bairro do continente do reino e ilhas adjacentes, ao sorteamento annual dos mancebos recenseados para o recrutamento militar. Esta operação começará ás dez horas da manhã e continuará n'esse dia e nos seguintes se preciso for, som outra interrupção que não seja a indispensavel para a comida o repouso. Lavrar-se-ha em cada dia uma acta, da qual constará com precisão e clareza tudo o que occorrer na sessão do sorteamento, declarando-se os nomes dos mancebos que foram sorteados segundo a ordem dos numeros que lhes houverem tocado. A acta será assignada, depois de lida em voz alta, pelos vogaes da commissão, e subscripta pelo secretario.
Art. 18.° O sorteamento feito nos termos do artigo anterior não poderá mais ser modificado ou alterado, excepto se por decreto do governo for annullado, havendo irregularidades taes que não possam ser sanadas. Da resolução do governo cabo recurso para o tribunal supremo do contencioso administrativo.
Art. 19.° Findo o sorteamento, a commissão respectiva remetterá ao governador civil copia authentica assignada por todos os seus membros, da acta ou actas que se tiverem feito durante o sorteio. Os vogaes da commissão são responsaveis pela exactidão d'estas copias, e incorrerão na multa do 50$O00 réis até 200/5000 réis, por qualquer inexactidão que houver com relação a cada um dos mancebos sorteados, salvas porém as penas maiores em que incorrerem havendo falsidade.
Art. 20.° Dentro de tres dias, depois de terminado o sorteio, será o seu resultado anuunciado por editaes afixados á porta do edificio em que se houver effeituado.
§ unico. Alem do annuncio por edital determinado n'este artigo, cada mancebo sorteado será notificado pessoalmente por meio de cédulas impressas, das quaes uma será entregue ao interessado ou á pessoa que o represente, e a outra com a certidão da intimação junta ao processo. Declarar-se-ha ao interessado o numero que lhe coube, em sorte, e bem assim que pôde apresentar até ao dia 20 de fevereiro qualquer reclamação, ou requerer a exclusão ou isenção do serviço militar por algum dos motivos admittidos nos artigos seguintes.
Art. 21.° Serão excluidos do serviço militar em qualquer tempo, ainda que o não requeiram, e logo que se descubra a causa da exclusão:
1.° Os estrangeiros;
2.° Os clerigos de ordens sacras, se as tiverem recebido com licença do governo;
3.° Os inuteis por lesões que incapacitem do todo o serviço militar;
4.° Os que não tiverem um metro e Cincoenta e quatro centimetros de altura;
5.° Os condemnados em alguma das penas que produzam perda dos direitos politicos, segundo a legislação penal.
Art. 22.° Serão dispensados do serviço militar em qualquer tempo antes do assentamento de praça:
1.° Os que tendo já satisfeito o tempo do serviço militar effectivo estejam licenciados na reserva;
2.° Os que no recrutamento de algum anno anterior se tenham feito substituir pela fórma auctorisada na lei.
Art. 23.° Serão dispensados do serviço militar, allegando a causa da isenção em tempo legitimo:
1.° Os que se fizerem substituir nos termos da lei;
2.° Os que tiverem um irmão prestando serviço militar effectivo.
§ 1.° Se no mesmo sorteamento couber a sorte a dois Irmãos só um d'elles será obrigado a prestar o serviço mi
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litar. Não se accordando entre si qual d'elles deve assentar praça, preferirá o que tiver numero anterior.
§ 2.° São considerados como servindo effectivamente no exercito para os effeitos d'este artigo:
1.° O irmão do recruta que tiver morrido em combate ou por ferida recebida em combate;
2.° O que morrer por effeito de molestias endémicas adquiridas no serviço militar nas possessões ultramarinas.
§ 3.° Não são considerados como servindo no exercito para as effeitos d'este artigo:
1.° Os militares com patente de official ou os empregados civis com graduação do official;
2.° Os que servirem como substitutos de outros.
§ 4.° Para se dar a isenção estabelecida n'este artigo, exige-se que o irmão do mancebo sorteado esteja servindo effectivamente no dia em que este for proclamado recruta.
Art. 24.° Nenhuma outra causa de exclusão ou de escusa do serviço militar será admittida alem das que vão taxativamente mencionadas nos dois artigos anteriores. Todas as causas de isenção ou do escusa admittidas nas ' leis anteriores para o recrutamento do exercito o da marinha ficam abolidas. '
Art. 25.° As pessoas enumeradas no n.° 2.° do artigo 8.° da lei de 27 de julho do 1855, cujos meios de subsistencia dependeram exclusivamente do trabalho de algum mancebo recrutado, serão subsidiadas durante o tempo em que este servir effectivamente, n'aquella qualidade, no exercito ou na armada, com uma prestação alimenticia semanal, proporcionada ás circumstancias das pessoas soccorridas, arbitrada e paga pela respectiva camara municipal.
§ 1.° Das deliberações das camaras municipaes em execução d'este artigo cabe recurso para o juiz de direito da comarca, e ulteriormente para a relação do districto.
§ 2.° Nos recursos de que trata o § antecedente, observar-se-ha o processo seguido nos recursos eleitoraes sem pagamento do custas nem de sellos.
Art. 26.° A commissão tomará -conhecimento das reclamações ácerca das exclusões e isenções á proporção que lhes forem apresentadas, decidindo-as em audiencia publica, precedendo sempre citação e audiencia dos seis mancebos que immediatamente se seguirem na ordem dos numeros sorteados, os quaes serão admittidos a impugnar a causa da isenção ou exclusão! Serão alem d'isto admittidos a impugnar a causa da isenção ou exclusão quaesquer dos outros mancebos sorteados. Até ao dia 2 de março estarão decididas todas as reclamações.
Art. 27.° Das decisões das commissões haverá recurso, que será interposto dentro de oito dias da intimação para a commissão districtal, estabelecida pelo artigo 5.° da lei de 4 de junho do 1859, a qual decidirá todos os recursos até ao dia 20 de abril. D'esta decisão não ha recurso.
Art. 28.° As juntas de revisão, estabelecidas pelo artigo 45.° da lei de 27 de julho de 1855, desempenharão o serviço da inspecção dos mancebos sorteados que lhes forem apresentados pela auctoridade administrativa na cabeça do concelho a que pertençam os sorteados; póde comtudo o governador civil determinar que dois ou mais concelhos sejam reunidos para este fim unicamente. N'este caso a inspecção será executada no concelho que for cabeça de comarca.
§ 1.° Nas inspecções feitas fóra da sede do districto, o governador civil poderá delegar a sua auctoridade em um dos vereadores da camara municipal, que não tenha pertencido á commissão recenseadora.
§ 2.° Das decisões das juntas revisoras podem recorrer tanto a auctoridade publica como os interessados.
§ 3.° Das decisões tomadas nas inspecções feitas na sede do districto é competente para recorrer o secretario geral, e das tomadas nos outros pontos é competente para recorrer o administrador do concelho onde se reunir a junta, o qual para esse fim assistirá ás inspecções.
§ 4.° No continente do reino os recursos serão resolvidos pelas juntas militares de saude da 1.ª e 3.ª divisões, competindo a junta da 1.ª divisão os recursos interpostos das inspecções feitas na area da 1.ª o 4.ª divisões, o á junta da 3.ª divisão os recursos interpostos das inspecções feitas na area da 2.ª e 3.ª divisões.
§ 5.° Para a decisão dos recursos interpostos das inspecções feitas nas ilhas adjacentes o governo designará o modo por que se ha de constituir a junta de saude e o local em que ha de funccionar, segundo o exigirem as circumstancias das localidades.
Art. 29.° Decididas definitivamente todas as reclamações e recursos interpostos pelos sorteados, e logo que o contingente for mandado distribuir, a commissão procederá em audiencia publica, no dia fixado pelo governo, á formação da lista definitiva dos mancebos que devem constituir os contingentes das freguezias do concelho n'aquelle anno, e proclamará recrutados os mancebos sorteados nos lermos do artigo 43.° da lei de 27 de julho de 1855.
Art. 30.° O contingente para o exercito de mar será preenchido:
1.° Pelos que voluntariamente quizerem alistar-se como praças effectivas da armada;
2.° Pelos mancebos sorteados que voluntariamente optarem pelo serviço naval;
3.° Pelos mancebos sorteados que exercerem ou tiverem exercido em qualquer classe a profissão maritima;
4.° Pelos mancebos sorteados que se empregarem nos navios de vapor da marinha mercante, como fogueiros, machinistas, chegadores ou em qualquer serviço;
5.° Pelos mancebos sorteados que se empregarem nas construcções navaes, como constructores, carpinteiros de machado ou quaesquer outros misteres proprios de taes construcções.
§ 1.° Não havendo numero sufficiente para preencher 6 contingente naval, os que faltarem serão tirados d'entre os recrutas destinados ao exercito, a quem haja cabido os primeiros numeros na sorte.
§ 2.° Um regulamento especial determinará o modo pratico de dar cumprimento á disposição do presente artigo.
§ 3.° O serviço no exercito de mar será de cinco annos, sem sujeição a reserva.
§ 4.° No exercito de mar podem ser admittidos a assentar praça voluntariamente os mancebos que, satisfazendo aos mais requisitos exigidos nas leis, tenham dezeseis annos do idade.
Art. 31.° O governo designará os dias e o logar em cada districto, em que a respectiva auctoridade militar deverá receber os mancebos recrutas do contingente annual.
Art. 32.° Alem do aviso por editaes affixados nas portas das igrejas de cada freguezia, cada recruta será pessoalmente avisado do dia em que deve apresentar-se com guia á auctoridade militar competente no deposito das recrutas em cada districto.
§ unico. O serviço de apresentação das recrutas nos respectivos depositos militares será dirigido do modo que esteja completo, quanto possivel, dentro de trinta dias.
Art. 33.° Os recrutas effectivos ou supplentes que se não apresentarem nos respectivos depositos militares dentro do vinte dias, contados da intimação, serão considerados refractarios.
Art. 34.° Podem ser admittidos a assentar praça voluntariamente, o pelo tempo do um anno, os mancebos que, tendo as condições de robustez necessaria, assim o requeiram antes do sorteamento, com a obrigação de se fardarem, equiparem e sustentarem á sua custa.
§ unico. No caso d'este artigo o voluntario só será dispensado do serviço activo mostrando por exame feito no corpo militar a que pertence, que está prompto nos exercicios militares e manejos da arma em que serviu.
Art. 35.° E o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios á execução d'esta lei e das demais re-
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lativas ao serviço do recrutamento, e a codificar em um só diploma todas as disposições em vigor sobre esta materia.
Art. 36.° Fica revogada a legislação em contrario. Secretaria d'estado dos negocios do reino, 28 de abril de 1879. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.
Proposta de lei n.° 110-B
Pela promulgação do plano de reforma na organisação da secretaria da guerra e na do exercito, approvado pela carta de lei de 23 de junho de 1864, foram supprimidos os postos de brigadeiro e marechal de campo, que até então existiam no quadro do estado maior general, e estas duas classes passaram a ser encorporadas no novo posto de general de brigada.
Por effeito d'esta disposição o posto de general de brigada ficou sendo immediato ao do coronel, arbitrando a tabella que faz parte d'aquelle plano o soldo mensal de 90$000 réis, quando anteriormente o marechal de campo tinha apenas o de 75$000 réis; n'estes termos, para que os coroneis, que então o eram, e que tinham o direito da expectativa de serem reformados com este ultimo soldo, não auferissem de repente a vantagem do obterem a reforma com 120000 réis desde logo que fossem promovidos a generaes do brigada, restringiu-se-lhes, no artigo 72.°, esse direito, impondo-se-lhes, para conseguirem aquella vantagem, a obrigação de servirem quatro annos consecutivos no posto de general de brigada; conservando unicamente aos demais, que não tivessem aquelle periodo de tempo de serviço no posto de general de brigada, o direito de se reformarem com o soldo mensal de 75$000 réis, que até então gosavam os brigadeiros, quando se reformavam em marechaes de campo.
Esta disposição era de sua natureza transitória e não tem rasão do ser hoje que são passados mais de quatorze annos, o que os individuos que ascendem ao posto de general de brigada já soffreram a delonga de permanecerem no posto do coronel todo o tempo que anteriormente transitavam pelos postos de brigadeiro e de marechal de campo.
Para resalvar, porém, a rapida passagem do posto de coronel á reforma em general do divisão, posto que a restricção seja uma excepção á regra geral, tratarei unicamente de deduzir o praso exigível para que os generaes do brigada possam obter a sua reforma no posto immediato, e 6 com este intuito que submetto á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° Os generaes de brigada poderão obter a sua reforma no posto immediato, em conformidade com a lei geral das reformas, um anno depois de promovidos a este posto.
Art. 2.° Fica, por este modo, alterado o artigo 72.° do plano de reforma na organisação da secretaria da guerra e na do exercito, approvado pela carta do lei de 23 de junho de 1864, e revogada toda a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da guerra, em 28 de abril do 1879. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.
Proposta de lei n.° 110-C
Senhores. — A despeza do ministerio da guerra, relativa ao anno economico de 1876-1877, excedeu na quantia de 181:432544 réis as sommas legalmente auctorisadas, como se vê da conta do respectivo exercicio ultimamente publicada.
Parte, porém, d'esta quantia na importancia de réis 32:292$150, proveniente do augmento de vencimentos por diuturnidade de serviço aos capitães, ao auditor junto do ministerio, e aos juizes e auditores do tribunal superior de guerra e marinha, do abono aos antigos auditores, e bem assim dos subsidios do marcha e do residencia eventual, acha-se já auctorisada pelas leis de 13 de maio de 1872, 9 de abril de 1875 e 25 de abril de 1876, e por isso não carece de nova legalisação.
O excesso a descoberto fica portanto reduzido á somma de 152:140$394 réis, e justifica-se pela insufficiencia de algumas verbas votadas; pelo augmento de preço nos generos alimenticios, que fez elevar os subsidios e subvenções para a alimentação das praças de pret, dos collegiaes e dos militares invalidos; pelos supprimentas irrecusáveis aos hospitaes militares, pelas reparações urgentes em quarteis e diversos edificios, o por outras rasões fundadas nas necessidades impreteriveis do serviço, que tornaram indispensavel realisar despezas excedentes ás sommas auctorisadas.
Para ser sanccionada, pois, a applicação da referida quantia, tenho a honra de propôr á vossa approvação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É legalisada a despeza de 152:140$394 réis, que a mais se effectuou em differentes capitulos da despeza do ministerio da guerra, no anno economico de 1876-1877.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da guerra, 28 do abril de 1879. — Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.
Foram enviadas ás respectivas commissões.
O sr. Presidente: — Previno os sr. deputados de que hoje ha sessão á noite.
Os srs. deputados que hão de compor a grande deputação que ha de ámanhã ir ao paço da Ajuda comprimentar Sua Magestade EL-Rei por ser o anniversario da outorga da carta constitucional são, alem da mesa, os srs.:
Agostinho José da Fonseca Pinto.
Alfredo Cesar de Oliveira.
Anselmo José Braamcamp.
Augusto José Pereira Leite.
Antonio Candido Gonçalves Crespo.
Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel.
Francisco do Albuquerque Mesquita e Castro.
Francisco Augusto Florido da Mouta o Vasconcellos.
Francisco Manuel Pereira Caldas.
Henrique Ferreira de Paula Medeiros.
Jeronymo da Cunha Pimentel.
José Vicente Barbosa du Bocage.
Visconde de Andaluz.
Visconde da Arriaga.
Visconde de Moreira de Rey.
Visconde de Sieuve de Menezes.
Podem aggregar-se á grande deputação todos os srs. deputados que o quizerem fazer.
A recepção é á uma hora da tarde.
A ordem da noite é a mesma que eu tinha dado para a sessão de sabbado passado.
E previno os srs. deputados de que á noite darei para a primeira parte da ordem do dia da sessão de quarta feira a eleição do um membro effectivo e de um substituto da junta do credito publico, conforme a lei determina.
Está levantada a sessão.
Eram cinco e meia horas da tarde.
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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
E N.° 64
-Senhores deputados da nação portugueza. — A camara municipal do concelho de Cabeceiras de Basto viu, com a maior satisfação, o projecto de lei apresentado na camara dos senhores deputados da nação portugueza, na sessão de 21 de março ultimo, pelos ex.mos deputados José Paulino de Sá Carneiro e outros, concernente á construcção do caminho do ferro de via reduzida, desde a Povoa do Varzim, por Villa Nova do Famalicão, Guimarães, Fafe, Arco, Ponte do Cavez, Villa Pouca de Aguiar e outros pontos, até Chaves, o são de tal magnitude as vantagens que d'essa construcção resultam para as provincias do Minho o Traz os Montes, e não só para estes mas tambem para o paiz inteiro, em rasão da sua vasta população o da riqueza dos productos que nas mesmas se auferem, que a camara supplicante não pôde deixar de vir respeitosamente unir seus votos aos daquelles benemeritos deputados, que apresentaram o mencionado projecto, implorando da camara dos senhores deputados da nação portugueza a approvação do mesmo, de cuja realisação dimanará sem duvida a satisfação do uma das mais imperiosas necessidades d'aquellas provincias, sem a qual se torna impossivel a desenvolução e progresso da sua industria agricola o manufactora. —Pede a V. ex.as se dignem deferir a presente supplica, approvando o mencionado projecto. — E. R. M.
Cabeceiras de Basto, 21 do abril do 1879. — (Seguem as assignaturas.)
E N.° 220
Senhores deputados da nação portugueza. — Os abaixo assignados, habitantes do Porto e de Villa Nova de Gaia, usando da faculdade que lhes concede o artigo 145.°, § 28.° da carta constitucional, vem respeitosamente pedir o auxilio o iniciativa d'esta camara, para que a ponte metallica que se pretendo construir naquella cidade, em substituição da actual ponte pensil, o não seja no local d'esta, mas unicamente entre os eixos das ruas de S. João o Ferreira Borges.
Senhores! Como todo o paiz sabe, a affinidade de interesses, a communicação e convivencia do Porto com Villa Nova de Gaia são de tal ordem o tão completas e estreitas, que estas duas terras teem-se, por assim dizer, unificado n'uma só. E d'ahi resulta a necessidade de que a ponto que as una, esteja, quanto ser possa, no centro de ambas ellas e dê a mais facil e prompta communicação aos seus habitantes.
Por outro lado, apesar da estação do caminho de ferro em Campanhã, a estação das Devezas terá sempre uma vantagem e superioridade immediata sobre aquella, para Villa Nova de Gaia o para a parto occidental do Porto. E convem por isso que a ponte metallica seja collocada de modo que dê o mais facil accesso a essa estação.
Ora, nenhum d'estes resultados se consegue, ficando a nova ponte no local da actual ponte ponsil.
Collocada assim na extrema de Villa Nova e fóra do centro commercial do Porto, e a uma grande distancia o difficil accesso da estação das Devezas, continuaria servindo, como serve actualmente, a ponto pensil, apenas para carros e para um ou outro passageiro; e a força do commercio o dos transeuntes continuaria, como faz hoje, a transportar-se de uma margem á outra do Douro, por meio das barcas estacionadas ao fundo da rua de S. João ou Ferreira Borges.
Porém, se a ponte metallica for construida no centro dos eixos d'estas duas ruas, não só a communicação do Porto com Villa Nova será mais prompta e commoda, e a distancia d'essa ponte para a estação das Devezas muito menor e accessivel, mas estará collocada no centro do commercio de uma e outra terra; o portanto terá satisfeito ás mais imperiosas necessidades que determinam a sua construcção.
Foi por isto que os engenheiros Eça o Victoria votaram a favor d'este local, na conferencia de engenheiros ha pouco tempo celebrada no Porto sobre tal objecto; e esse voto, pela auctoridade que tem, basta para justificar esta representação dos abaixo assignados.
Pretendem, pois, os mesmos abaixo assignados, que os senhores deputados da nação portugueza, como representantes da soberania nacional, o attendendo a que a ponte de que aqui se trata, não é só um grande melhoramento para uma grande cidade, mas tambem, pela influencia que ha do exercer no commercio, um melhoramento para todo o paiz, empreguem a sua iniciativa e o sou poder, a fim de que ella seja construida no referido centro dos eixos das ruas de S. João e Ferreira Borges, e não onde está a ponte pensil.
Para isso— Pedem aos senhores deputados se dignem deferir-lhes— E. R. M.