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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

sempre pelo contrario sido benigna e equitativa, prestando-se facilmente as transacções, perdoando os atrazados e contentando-se com o reconhecimento do seu direito para o futuro.

Associo-me, porém, sr. presidente, e associo-me de todo o coração e com perfeita convicção aos pedidos d'aquelles meus patricios e conterraneos na parte era que elles supplicam a interpretação da lei por motivos tão justos e tão auctorisados.

Quando uma porção tão grande de habitantes do solo portuguez diz que soffre, e que soffre muito; quando diz que o seu soffrimento resulta da obscuridade, da confusão ou da omissão de uma lei, o parlamento não deve responder com o silencio, synonymo do desprezo; o parlamento n'este caso tem obrigação de fallar, deferindo ou indeferindo, pois que ás vezes o indeferimento equivale ao deferimento. Se os foreiros não têem rasão e se não têem justiça, diga se-lhe isto, mas não se consinta que aquelles infelizes povoa estejam perpetuamente n'uma esperança, que por fim póde acabar com desespero!

Eu lamento, sr. presidente, que os povos d'aquellas duas comarcas não tenham sido bem aconselhados, e que no principio, ou ainda agora, não tivessem seguido outro caminho melhor, abraçando o meio da paz e da conciliação, ou aceitando nobremente ante os tribunaes as questões propostas, e seguindo as aconselhados por homens peritos e scientes, por verdadeiros sacerdotes da justiça, e não por especuladores interessados em os desvairar, para não conhecerem os seus verdadeiros interesses.

Estava persuadido que se assim tivessem andado teriam achado nos tribunaes protecção pelo menos para parte dos aggravos de que se queixam, aos quaes me persuado que esta camara deve e póde dar remedio.

A maior injustiça de que se queixam, sr. presidente, é a de que as acções sejam propostas contra um só dos pretendidos foreiros, e que este considerado cabecel ou cabeceiro de todo o prazo, seja condemnado a pagar todo o fôro correspondente ás mil glebas em que ás vezes está dividido o prazo.

N'esta parte, sr. presidente, eu não hesito em emittir desde já a minha opinião. Não sei se o casal cerrado é ou não prazo emphyteutico; respeito a decisão dos tribunaes e acato a como representando a verdade judicial; mas no que diz respeito á obrigação do cabecel ou cabeceiro, no que respeita á obrigação de um só possuidor de uma pequena porção de terreno pagar todo o fôro, obrigação solidaria de um por todos, emquanto a isto não posso accordar-me, nem posso accommodar a minha intelligencia e o meu coração.

Sei quanto é o soffrimento, e tanto maior é quanto mais prompto deve ser o remedio. Depois da lei de 22 de julho de 1846 terminaram todos os serviços pessoaes, ainda mesmo os impostos ou estipulados em contratos especiaes de aforamento. O serviço dos cabeceis ou cabeceiros é um verdadeiro serviço pessoal, e os serviços pessoaes que pela ordenação do reino eram contados entre os direitos reaes, como restos dos costumes feudaes ou das corvéas dominicaes, oriundos do direito dos romanos que os conservavam sempre aos seus libertos, como se vê do titulo de operis libertorum, foram extinctos e abolidos.

Estes serviços são violentos e odiosos, repugnantes á liberdade do homem. Foi por isso que pelo novo codigo civil portuguez são prohibidos, determinando-se no artigo 1:657.° que não se poderá estipular encargo algum extraordinario ou casual, a titulo de melhoria, laudemio, ou outro qualquer, determinando se outrosim, que o fôro seja pago, em regra, na freguezia onde estiver sito o predio.

Emquanto á obrigação de um possuidor de uma pequena porção do prazo, pagar ou ser obrigado a pagar todo o fôro, isto ainda é mais repugnante. Declarar-se solidaria esta obrigação, que nasce de um direito que está dividido por muitos, repugna com os principios da rasão e da justiça; assim diz Pothur, no seu Tratado das obrigações, tomo 1.°, pag. 282, e assim tomo eu a liberdade de repetir ante a camara dos deputados, certo como estou de que ninguem poderá contestar esta proposição.

Se o prazo está dividido em glebas, ha realmente tantos prazos quantas são as glebas, tal é a expressa disposição do artigo 1:662.°, § 4.° do codigo civil, e antes de tal disposição eram já principio de rasão e de justiça, sanccionado com respeito aos donatarios da corôa, na lei dos foraes.

Em vista d'estas considerações tão succintamente expostas, e que não posso agora nem devo desenvolver, porque não é a occasião propria, tenho para mim, que se aquelles infelizes foreiros patricios meus tivessem tido bons conselheiros, que lealmente os dirigissem nas suas pendencias, teriam obtido, ante os tribunaes, e mesmo antes de se recorrer aos tribunaes, remedio para a maior parte dos males de que se queixam, e a que elles proprios innocentemente tem dado occasião.

Eu não sou actualmente deputado pelo circulo de Chaves, mas já o fui. Não tenho na actualidade mandato algum especial d'aquelles povos, mas tenho no coração a indelevel recordação da confiança com que já me honraram. O sentimento da gratidão é em mim indelevel, e obedecendo a elle, constituo-me aqui, agora e sempre, procurador dos meus patricios para solicitar do parlamento a justiça que lhes for devida. Não cessarei de instar e de reclamar, e tenho a esperança de que serei ouvido, porque não intento pedir senão a justiça devida. Não intento pedir favores exagerados e não merecidos com o fim de especular com a credulidade dos que soffrem; mas limitando-me a pedir que a camara não seja surda aos clamores, aos pedidos, d'aquelles pobres transmontanos, limitando-me a pedir que a camara tome conhecimento dos requerimentos dos que a imploram e que defira o que for justo, não serei exagerado. Requeiro portanto a v. ex.ª que mandando reunir na secretaria da casa todos os papeis, requerimentos, reclamações e informações que ali houver a similhante respeito, se digne remette-los á commissão de legislação para d'elles tomar conhecimento.

O sr. Falcão da Fonseca: — Com quanto tivesse pedido a palavra para dirigir uma interpellação ao sr. ministro das obras publicas, permitta-me v. ex.ª e a camara que em primeiro logar responda ás observações feitas pelo meu collega e amigo o sr. Barros e Sá.

S. ex.ª referiu-se a uma questão que tem sido ventilada por muitas vezes n'esta casa, e á qual me tenho associado de coração.

V. ex.ª sabe que alguns povos das comarcas de Montalegre e Chaves mandaram por intermedio do seu representante, algumas representações á camara com o fim de ser interpretada a lei dos foraes de 22 de junho de 1846.

A camara estará de certo lembrada de que eu n'essa occasião levantei a minha voz, associando-me aos desejos do deputado d'aquelle circulo que então era o sr. Antunes Guerreiro, e pedi que essas representações fossem remettidas á commissão de legislação, a fim de satisfazer o pedido d'aquelles povos, se o julgasse de justiça. O que então disse escuso agora de repetir, e sómente me limito a dizer que agradeço ao sr. Barros e Sá as palavras benevolas que dirigiu á administração da serenissima casa de Bragança.

V. ex.ª está ao facto de que aquella administração não tem empregado violencias para com os seus foreiros, antes pelo contrario tem usado de benevolencia, de todos os meios suasorios, e até tem perdoado todos os fóros atrazados.

Portanto deve fazer-se justiça á administração da serenissima casa de Bragança pelo modo como tem tratado estes negocios, com relação a um assumpto que não deixa de ser melindroso.

Ainda direi algumas palavras sobre este assumpto.

Aquelles povos entendem que a lei de 22 de junho de 1846 deve ser interpretada, e não são só elles, são os seus