O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

300

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Já aqui declarei que sou liberal convicto, e por isso mesmo que sou liberal, entendo que todos os cidadãos portuguezes são iguaes perante a lei, e que todo e qualquer cidadão, tendo as habilitações que a lei exige, póde aspirar a todos os cargos da republica (apoiados). Não posso por isso considerar o circulo do Carregal como a arca de alliança, onde ninguem póde tocar. Que importa que eu tivesse a minha eleição certa por um outro circulo, se os meus amigos queriam eleger-me tambem pelo circulo do Carregal?

Honro-me muito com essa eleição, e creio que não commetti crime prestando o meu nome para ella; não offendi alguem, nem desconsiderei o sr. Coelho do Amaral, porque os circulos eleitoraes não são patrimonio de alguem (apoiados).

O sr. Mariano de Carvalho: — Felicito me e felicito a camara por termos o gosto de ver n'esta casa, antes da ordem do dia, o illustre ministro da guerra.

Disse em algumas sessões anteriores que desejava dirigir a s. ex.ª não censuras, mas algumas simples perguntas sobre negocios importantes do seu ministerio, que dizem respeito á defeza do paiz.

Aproveito a occasião rara do illustre ministro estar presente para lhe dirigir essas perguntas, e esperarei a resposta.

Todos sabem que entre muitas cousas que concorreram para as brilhantes victorias dos exercitos prussianos sobre os da França, avultou uma muito principal. Creio que a Prussia triumphou não só pela uniformidade de disciplina do exercito, pela sua melhor artilheria, pela mais completa educação do povo e do soldado prussiano, mas sobretudo pelo methodo que a Prussia tem para a escolha e instrucção dos seus officiaes, e particularmente dos officiaes technicos. Parece me que todas as nações da Europa que têem pretensões a ser potencias militares, ou as que apenas pretendem sustentar a sua dependencia e dignidade, procuram quanto possivel approximar-se do systema prussiano nas cousas militares.

Pela pratica que tenho do ensino publico, no qual exerço um logar modesto, julgo que a instrucção dos officiaes technicos do nosso paiz, tanto do estado maior como da engenheria e artilheria, não corresponde ás necessidades da arte militar tal qual ella é hoje. Sem exigir que o sr. ministro traga desde já uma reforma completa do exercito, que sei estar dormindo ha mezes na commissão externa encarregada d'esse trabalho, desejo que o illustre ministro exponha á camara quaes são as suas idéas a respeito do aperfeiçoamento da instrucção dos officiaes technicos do exercito portuguez.

Tambem ouvi que o illustre ministro trouxe a esta camara algumas propostas para melhorar o nosso armamento. S. ex.ª propoz, alem da compra de machinas para transformação de armas e fabrico de cartuxame, que se comprassem umas seis metralhadoras.

Acho que a metralhadora é uma arma de guerra util; mas não me parece que seja indispensavel a qualquer exercito.

Quando começou a guerra da França contra a Prussia, a França possuia metralhadoras e a Prussia não as tinha, mas com a superioridade da sua artilheria em grande parte inutilisou o effeito das metralhadoras.

Se o nosso exercito já tivesse armamento completo de infanteria, cavallaria e artilheria, achava justificadíssima a compra não só de seis metralhadoras mas de sessenta ou mais. Porém, quando acontece que nos regimentos de cavallaria, quando ha cavallos não ha selins; quando ha selins não ha cavallos; quando ha cavallos e selins não ha homens; quando ha cavallos, selins e homens não ha pistolas; quando o armamento de infanteria é ainda imperfeitíssimo, e o armamento de artilheria está muito longe do seu estado completo, não me parece conveniente que vamos já tratar da compra de metralhadoras (apoiados).

Desejava ouvir o sr. ministro da guerra sobre n armamento do nosso exercito, e em particular sobre o que s. ex.ª tem feito para o melhoramento da arma de cavallaria, cuja importancia a guerra franco-prussiana bem mostrou.

Eu sei que s. ex.ª com muito louvavel zêlo tem procurado desenvolver no paiz as escolas de tiro, o que é uma bellissima instituição desde que os fogos de infanteria fazem hoje parte predominante no exito das batalhas; mas parece-me que não podemos alcançar proveito algum da escola de tiro emquanto não houver instructores devidamente habilitados para os dirigir.

Preciso saber se s. ex.ª tem procurado preparar instructores para dirigir aquellas escolas.

O sr. Ministro da Guerra: — V. ex.ª e a camara sabem que eu não fui prevenido de qual o assumpto ou perguntas que s. ex.ª acaba de me dirigir. Como v. ex.ª ouviu, são objectos de muita ponderação a que não póde responder se de momento e precipitadamente; por consequencia, peço a v. ex.ª que se digne convidar o illustre deputado a formular as suas perguntas n'uma nota de interpellação, e logo que eu me ache habilitado darei parte a v. ex.ª

O sr. Presidente: — Em vista da declaração do sr. ministro, este incidente não póde continuar.

(Susurro.)

O sr. Mariano de Carvalho: — Vou responder ao sr. ministro em duas palavras: é extraordinario o que se passa. Dirigi ao sr. ministro differentes perguntas sobre objectos de sciencia militar, e s. ex.ª que é ministro da guerra d'este paiz, que é general, responde que eu devo formular as minhas perguntas n'uma nota de interpellação. Sinto isto.

O sr. Presidente: — E eu sinto dizer ao sr. deputado que o sr. ministro da guerra lhe está indicando o que manda o regimento; mas paremos aqui para não estar a fazer dialogo.

O Orador: — Entendo que o regimento marca o caminho a seguir nos debates parlamentares e nas interpellações que se dirigem aos srs. ministros, mas não creio que o regimento de modo algum, quando se pergunta a um ministro o seu pensamento sobre um dado objecto, determine que se formule uma nota de interpellação. Nunca vi seguir este procedimento na camara, e até v. ex.ª disse ha pouco, que as interpellações servem para questões de facto.

O sr. Presidente: — Peço perdão, sinto cortar-lhe a palavra. O sr. ministro póde responder se quizer, e não respondendo, o sr. deputado formula a sua interpellação.

O Orador: — Vejo-me obrigado a appellar de v. ex.ª para a camara, a fim de que ella permitta que eu continue por mais alguns minutos a...

Vozes: — Falle, falle.

O sr. Placido de Abreu: — Se esta discussão continua, eu peço a palavra a v. ex.ª

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro da fazenda.

(Varios srs. deputados pedem a palavra.)

O sr. Mariano de Carvalho: — É uma cousa incrivel que estando eu com a palavra, v. ex.ª a vá dar ao sr. ministro da fazenda (apoiados).

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara. O sr. deputado formulou um requerimento, e quando acabava de o formular, o sr. ministro da fazenda pediu a palavra, e eu entendi que era sobre o modo de propor. Se é sobre o modo de propor, dou a palavra ao sr. ministro da fazenda, aliás vou submetter á deliberação da camara o requerimento que fez o sr. deputado.

O sr. Ministro da Fazenda: — É simplesmente para perguntar a v. ex.ª se a resolução da camara altera a ordem estabelecida na primeira e segunda parte da ordem do dia.

O sr. Presidente: — Agora vou consultar a camara sobre se quer que continue com a palavra o sr. deputado pela Chamusca.

A camara annuiu.