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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ctica realise o que era theoria se estabeleceu na lei fundamental. Pertence-lhe pela carta a independencia absoluta. Pelas leis organicas está hoje dependente do executivo nos despachos, nas promoções e nas transferencias. Está, alem d'isso, miseravelmente retribuido. A administração da justiça, que deve ser prompta, proxima e barata, é muitas vezes o contrario, morosa, distante, difficil e carissima. É urgente firmar plenamente a independencia do poder judicial, estabelecer-lhe a dotação correspondente ás suas elevadas funcções, e torna-lo inteiramente distincto dos outros poderes.

A reforma parlamentar é, talvez, a primeira das mais instantes necessidades. Uma lei eleitoral, que assegure livre e certa a verdadeira representação, tanto da maioria como das minorias, e que, deixando a opção, estabeleça rigorosas as incompatibilidades, adoptando o systema da Belgica; e a camara alta electiva tambem pelo systema da America do Norte, salvas pequenas modificações, são reformas indispensaveis.

A actual lei de recrutamento deve ser desde já substituida pelo ensino militar obrigatorio nas cabeças do concelho ou de comarca. Melhor retribuida esta carreira, em breve o alistamento voluntario excederá as necessidades dos contingentes de recrutas, que agora debalde se pedem. O exercito será mais numeroso, e todo o paiz fica apto para pegar em armas nos casos urgentes. Entretanto, e transitoriamente, os recrutas serão distribuidos a cada concelho, e o seu numero fixo será apresentado obrigatoriamente pelas camaras municipaes nos prasos determinados.

É indispensavel dar aos municipios, devidamente organisados, vida propria e quanto possivel independente; o mesmo systema deve seguir-se nos districtos, ou talvez nas provincias com mais largas attribuições. A vida municipa as assembléas provinciaes, devem preparar com excellentes habilitações muitos membros para a representação nacional, hoje quasi abandonada ao funccionalismo, ou por este usurpada. O antagonismo da nação com a sua representação é de todos o peior mal que um paiz póde soffrer.

A distribuição do imposto, abolidas muitas das actuaes leis tributarias e desde já a do imposto de transmissão, deve ser feita nos municipios, devidamente organisados. A pena de nullidade imposta aos contratos particulares a pretexto de direitos fiscaes, tão estulta como iniqua, deve desapparecer immediatamente, substituindo-se pelas multas e pela punição, ainda assim mais sobre os empregados publicos, que intervem nos contratos, do que sobre os particulares. Os recursos sobre distribuição do imposto, e todas as questões sobre direitos civis ou fiscaes, pertencem exclusivamente ao poder judicial, perante o qual a fazenda é como qualquer outro litigante, e urge que desappareçam d'este paiz os conselhos e suas delegações que hoje o opprimem, e com os quaes a pretexto de administração se usurparam funcções a um poder independente.

O contingente tributario lançar-se-ha como quantia certa aos municipios, e estes entregarão por duodecimos mensaes a somma correspondente a cada mez. A cobrança nos municipios deve preceder a epocha do primeiro pagamento ao estado quatro ou tres mezes pelo menos, e quer se aceite o pagamento por letras de facil desconto, quer se abone aos municipios um juro modico, obtem-se o indispensavel adiantamento da receita, cessando todos os inconvenientes da actual divida fluctuante.

Os municipios tributarão livremente os rendimentos de cada contribuinte ahi residente ou proprietario, salvo o recurso unico para o poder judicial. Não são difficeis de estabelecer as garantias mais amplas, que sejam necessarias para segurar ao estado o pagamento integral nos prasos devidos.

A nossa legislação dispersa e cahotica é um dos maiores males que affligem a patria, tolhendo o desenvolvimento da riqueza pela incerteza dos direitos. A codificação em todos os diversos ramos é necessidade urgente. Não é codificar para tornar a lei immutavel, e muito menos para a a confundir com leis dispersas, como tem acontecido ao codigo civil, apesar das disposições que expressamente o prohibem. A codificação não inhibe a reforma constante e progressiva das leis codificadas, só exige a inserção immediata das alterações feitas á proporção que se fazem e se realisam.

O systema actual, desde que as attribuições legislativas, usurpadas a pretexto de regulamentos e de portarias, foram transferidas para os conselhos e para os funccionarios superiores, que trabalham sem unidade de acção nem de pensamento, dispersaria e inutilisaria sem duvida possivel, em curto periodo, a codificação mais completa e mais perfeita. Não cura, e muito menos extirpa o mal, a causa unica que o produz. É urgente pois, e é indispensavel, a organisação immediata de um corpo collectivo superior, que, á similhança do conselho d'estado francez n'esta parte, seja exclusivamente encarregado dos trabalhos de codificação, de preparar ou consultar sobre os projectos de reformas, acompanhando-os de largas e completas exposições dos seus fundamentos e motivos, de preparar os regulamentos e instrucções para a execução, e de receber todas as consultas e informações sobre as divergencias e obscuridades que as diversas leis apresentam na pratica. Só assim se conseguirá a codificação completa, distincta mas harmonica, em todos os diversos ramos de legislação, sustentando-se simultaneamente a vantagem da codificação e a não menor da reforma constante e successiva.

A organisação da propriedade immovel reclama alteração profunda. Cada uma das reformas ultimamente feitas tem depreciado a propriedade, prejudicando sensivelmente a agricultura, primeira fonte da nossa riqueza. A divisibilidade forçada é a negação do direito de propriedade; a amplissima faculdade para dividir, concedida ao proprietario, affirma e reconhece uma condição essencial e inherente aquelle direito. A liberdade do proprietario sobre a terra, que é sua, deve ser ampla e absoluta emquanto possue e no momento em que transmite. A geração seguinte ha de exercer os mesmos direitos com igual plenitude. Não podem os mortos governar os vivos, nem impedir-lhes ou restringir-lhes os seus direitos.

Nas successões testamentarias, salvos os alimentos e ainda algumas quotas legitimarias, o testador deve exercer amplissima liberdade, podendo designar a fórma das partilhas, e deixar o que é seu como quizer. Nas partilhas e alienações forçadas, que a lei actualmente impõe, soffre a propriedade immovel, arruina-se o commercio, torna-se impossivel a industria. Um paiz que sustenta a nossa actual legislação, ainda que sobre elle chovam todos os dons da fortuna — fertilidade do solo, excellente clima, feliz posição geographica — não póde progredir, definha e arruina-se por força.

As nossas relações externas, com a nação vizinha principalmente, reclamam seria attenção. O que tem sido não póde ser; continuar o systema seguido, não é só prejudicial, é impossivel.

A independencia nacional ha de manter-se; a esse respeito vela a nação inteira. Mas as independencias não se mantêem com festejos de anniversarios, nem com gloriosas recordações, embora descriptas em prosa sublime, ou cantadas era verso altisonante. A boa administração, a vontade, nacional, são as unicas garantias serias. A haver medidas de prevenção, não podem ser outras senão a boa organisação é disciplina da marinha e do exercito, e sobretudo á já indicada substituição da actual lei do recrutamento, que em breve habilitará para as armas, em caso urgente, toda a população válida do paiz.

Mantida porém a nossa plena independencia, é indispensavel, que as mais intimas relações commerciaes e economicas se estabeleçam quanto antes com a nação vizinha; e este é dos mais seguros meios de conjurar o perigo, que