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SESSÃO DE 15 DE MAIO DE 1885 1587

parlamento vae votar, de coração leve, um. donativo de 1.000:000$000 réis á casa real, donativo que irá perder-se sem proveito para ninguém n'essa voragem, n'esse sorvedouro que tem sido a causa permanente que explica as dividas da corôa ?!
O momento não podia ser menos opportuno, e oxalá que o paiz não guarde na sua memória a triste coincidencia d'esta eloquente approximação!
Bem disse o sr. Beirão:
"Mal aconselhado andou o governo, imprudentemente andaram os ministros, vindo lançar no actual momento para a tela da discussão um debate de tal ordem."
A maioria d'esta casa pude dentro em pouco vir sanccionar com o seu voto unanime este projecto, mas a maioria d'esta casa o que não póde é impedir que lá fora se discuta a sua votação, se julgue o seu procedimento, e se aprecie na devida conta um facto, que será no paiz mais um elemento dissolvente ajuntar-se ás innumeras causas de perturbação que, pouco apouco, dia a dia, hora a hora, estão sendo aggravadas por todos aquelles que toem a responsabilidade do governo e que contribuem em largas proporções, não sei se consciente ou inconscientemente, para tornar cada vez mais intenso este mal estar de que soffre a nação e que mais tarde ou mais cedo ha de que fatalmente produzir uma profunda e porventura irremediavel catastrophe social!
É, pois, imprudentissimo, srs. ministros, trazer no momento actual á discussão este projecto; e oxalá que aquelles que tomam tão leviana e sobranceiramente a responsabilidade de similhante lei não tenham que vir dentro em pouco a arrepender-se d'essa... como lhe chamarei?, d'essa facilidade com que pretenderam anteparar golpes que não sei se, apesar de tudo, não irão mais longe do que fragil escudo que em frente d'elles se apresenta!
Passemos a responder á segunda pergunta.
Tem a casa real o direito de receber uma dadiva de tal valor?
Eu não venho aqui discutir, porque o ensejo não é ainda apropriado, se mesmo dentro da legalidade existente, tal como ella tem sido estabelecida por esta camara, não venho aqui discutir, repito, se mesmo dentro da estricta observancia do espirito e da letra das leis que regulam o assumpto, a casa real tem direito a receber tudo quanto de facto recebe.
A seu tempo e quando se discutir o orçamento tratarei d'este ponto.
Não venho por isso agora investigar se todas as verbas que no orçamento estão consignadas para a dotação da casa real são legitimas e legaes, se estão acobertadas por uma disposição clara, explicita e terminante da lei. Assim, nem mesmo quero discutir n'este momento se a verba da dotação do sr. Infante D. Augusto é ou não legitima. A seu tempo, como já disse, me occuparei d'este assumpto. E a camara já sabe, por experiencia, que não costumo faltar ao que prometto...
Acceitando, pois, por hypothese, como perfeitamente auctorisada tudo quanto a casa real recebe actualmente, pergunto, se a administração fazendaria d'esta casa nos offerece garantias sufficientes para que nós possamos ir alienar uma parte do dominio do estado em seu beneficio, a fim de a livrar das apertadas difficuldades em que se encontra?
Vejo, em primeiro lugar, que a casa real tem uma divida importante á fazenda publica, que ainda não liquidou, apesar das ordens dadas peio ministerio da fazenda differentes periodos.
Todos sabem como é constituida essa divida. Representa os direitos não cobrados nas alfandegas, e recaindo em objectos de uso da casa real.
Esta divida merecia já ha bastante tempo a consideração dos poderes publicos, porque em 30 de julho de 1839 um illustre ministro portuguez, o sr. Manuel António de Carvalho, publicava uma portaria ordenando que se procedesse por encontro á liquidação dos direitos em divida á fazenda.
Percorro os anuaes parlamentares, sr. presidente, percorro a collecção da nossa legislação, percorro, emfim, todos os documentos publicos, e debalde eu procuro o andamento á ordem que por meio d'esta portaria tinha sido expedida.
É necessario que volvam quarenta annos completos para que nós cheguemos a 22 de novembro de 1879 e encontraremos outro illustre ministro da fazenda, o sr. Barros Gomes, que, seja dito de passagem, sinto ver assignado sem declarações no projecto em discussão firmando uma portaria para se nomear uma commissão liquidataria, presidida por juiz do supremo tribunal, e tendo por secretario o sr. Conselheiro Lopo Vaz, commissão á qual incumbia regularisar os termos em que havia de ser paga a referida divida, depois de previamente apurada.
Assim, sr. Presidente, foi necessario, como disse, que volvessem quarenta annos completos para que a portaria do sr. Manuel Antonio de Carvalho, absolutamente esquecida, fosse reforçada com a nova portaria do sr. Conselheiro Barros Gomes!
É frisante o confronto da maneira como se exigia o cumprimento das leis por parte dos simples particulares, e por parte da administração da casa real!
É frisante, sr. Presidente, e é instructivo!...
Mas, pergunto, ainda depois d'esse olvido de quarenta annos, que andamento deu ao trabalho de que estava incumbido a commissão nomeada por portaria do sr. Barros Gomes?
Essa commissão, até hoje, custa acredital-o! Não apresentou o resultado dos seus trabalhos nem tão pouco se dissolveu! É verdade, que nos documentos que pedi pelo sr. Ministro da fazenda e que me foram enviados pelo sr. Ministro, se encontra uma pretendida resposta a esta minha interrogação.
A respeito dos trabalhos da commissão nomeada por portaria de 22 de novembro de 1879, diz-se o seguinte em officio do ministerio da fazenda de 27 de março findo:
"A commissão nomeada pela portaria de 22 de novembro de 1879 não apresentou ainda (ha sete annos!!) o resultado dos seus trabalhos, podendo comtudo dizer que a importancia das reclamações feitas pela administração da casa real monta a 145:494$198 réis, e a do credito na alfandega de Lisboa por direito de objectos recebidos desde o anno de 1855 até 1879, é de 51:677$647 réis; d'esta ultima epocha em diante a mesma administração tem mandado pagar os direitos na alfandega dos generos despachados.
Não nos diz, nem nos podia dizer a resposta do sr. Ministro da fazenda qual a somma que attinge a liquidação que não está realisada; limita-se a communicar á camara que as reclamações da casa real ascendem a uma certa quantia; mas pergunto ao sr. Ministro : porventura dá elle por boas todas as verbas que constam da reclamação por boas todas as verbas que constam da reclamação da casa real? Vejo que s. exa. não me responde, e que por isso não tomo, o que eu já esperava, a responsabilidade de acceitar como boas e como procedentes todas as reclamações de que n'este documento se falla. Quer dizer, portanto que a questão está exactamente nos termos em que estava, quando foi nomeada a commissão liquidataria em 22 de novembro de 1879!
Já vê, pois, v. exa., sr. Presidente que a casa real, que vem agora pedir que o estado lhe dê 1.000:000$000 réis para pagar as suas dividas, começa ella propria por não liquidar as dividas que ainda tem em aberto com a fazenda publica, por despachos realisados e não pagos nas alfandegas!
Mas ha mais, sr. Presidente. As faltas da casa real não são só estas. A casa real não possue inventario, apesar de ter o usufructo de bens importantissimos que pertencem á