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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 27 DE ABRIL DE 1864

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretários os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 65 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Soares de Moraes, Ayres de Gouveia, Carlos da Maia, Eleutherio Dias, Brandão, Gouveia Osorio, A. Pinto de Magalhães, Mazziotti, Pinheiro Osorio, Palmeirim, Barão do Vallado, Albuquerque e Amaral, Abranches, Almeida e Azevedo, Bispo Eleito de Macau, Ferreri, Almeida Pessanha, Cesario, Claudio Nunes, Cypriano da Costa, Domingos de Barros, Poças Falcão, Abranches Homem, Coelho do Amaral, Diogo de Sá, Borges Fernandes, F. L. Gomes, F. M. da Costa. F. M. da Cunha, Pereira de Carvalho e Abreu, Medeiros, Sant'Anna e Vasconcellos, Mendes de Carvalho, Fonseca Coutinho, Nepomuceno de Macedo, Sepulveda Teixeira, Torres e Almeida, Matos Correia, Mello e Mendonça, Neutel, Faria Guimarães, Infante Pessanha, Alves Chaves, Costa e Silva, Frasão, Alvares da Guerra, Rojão, Sieuve de Menezes, Menezes Toste, José de Moraes, Gonçalves Correia, Batalhós, Martins de Moura, Alves do Rio, Manuel Firmino, Mendes Leite, Sousa Junior, Murta, Pereira Dias, Miguel Osorio, Placido de Abreu, Ricardo Guimarães, Charters, R. Lobo d'Avila, Thomás Ribeiro e Teixeira Pinto.

Entraram durante a sessão — Os srs. Affonso Botelho, Annibal, Braamcamp, Vidal, Abilio, Sá Nogueira, Correia Caldeira, Arrobas, Fontes Pereira de Mello, Mello Breyner, Antonio Pequito, Pinto de Albuquerque, Magalhães Aguiar, Lopes Branco, A. de Serpa, A. V. Peixoto, Zeferino Rodrigues, Barão das Lages, Barão da Torre, Barão do Rio Zezere, Carlos Bento, Cyrillo Machado, Conde da Torre, Fernando de Magalhães, Bivar, Bicudo Correia, Cadabal, Gaspar Pereira, Gaspar Teixeira, Guilhermino de Barros, Henrique de Castro, Blanc, Silveira da Mota, Gomes de Castro, J. A. de Sousa, Mártens Ferrão, João Chrysostomo, J. da Costa Xavier, J. J. de Azevedo, Aragão Mascarenhas, Albuquerque Caldeira, Calça e Pina, Joaquim Cabral, Simas, Rodrigues Camara, J. Pinto de Magalhães, José da Ga-

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ma, Galvão, Sette, Fernandes Vaz, Luciano de Castro, J. M. de Abreu, Silveira e Menezes, Oliveira Baptista, Mendes Leal, Camara Falcão, Levy M. Jordão, Camara Leme, Freitas Branco, Rocha Peixoto, Pinto de Araujo, Monteiro Castello Branco, Fernandes Thomás e Visconde de Pindella.

Não compareceram — Os srs. Adriano Pequito, Garcia de Lima, A. B. Ferreira, Quaresma, Gonçalves de Freitas, Ferreira Pontes, Seixas, Lemos e Napoles, Pereira da Cunha, David, Barão de Santos, Garcez, Freitas Soares, Oliveira e Castro, Beirão, Pinto Coelho, Conde da Azambuja, Drago, F. F. de Mello, Barroso, Fernandes Costa, Ignacio Lopes, Vianna, Gavicho, Pulido, Chamiço, Ferreira de Mello, Coelho de Carvalho, Lobo d'Avila, Veiga, Figueiredo de Faria, D. José de Alarcão, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Julio do Carvalhal, Affonseca, Alves Guerra, Sousa Feio, Modesto, Moraes Soares, Simão de Almeida e Vicente da Seiça.

Abertura — Á uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Uma declaração do sr. Ayres de Gouveia, de que, por incommodo de saude, não pôde comparecer á sessão de hontem. — Inteirada.

2.º Uma representação da misericordia do Redondo, pedindo que sejam desamortisados os bens das misericordias, applicando-se o seu producto a contratos de mutuo. — Á commissão de administração publica.

3.º Da camara municipal de Machico, pedindo a prorogação, por mais tres annos, da lei de 20 de agosto de 1861. — Á commissão de fazenda.

SEGUNDAS LEITURAS

PROJECTO DE LEI

Senhores. — Sendo a conservação dos monumentos considerada um dever para as nações illustradas, torna-se este dever tanto mais rigoroso, quando esses monumentos são dos poucos que restam da quadra mais brilhante da historia nacional. Evora é uma das nossas cidades que tem maior copia de recordações de tempos remotos. Se muitos dos antigos edificios particulares têem sido ultimamente restaurados, devido isso a esforços isolados; se o soberbo templo de S. Francisco deveu a uma subscripção voluntaria, que subiu a 6:411$480 réis, ser ha poucos annos concertado, interrompendo-se a incessante destruição do templo; não podia a municipalidade, representante dos cidadãos que desenvolveram taes esforços, deixar de os acompanhar em tão nobre tarefa. Dentre os monumentos, vestigios do glorias passadas, avulta o que ainda resta do palacio de El-Rei o Senhor D. Manuel, sendo uma galeria, ou talvez frente do palacio, do possivel reparo e conservação. Contíguos se encontram uns muros meio derrubados, que tradicionalmente conservam o nome de galeria das Damas. Estas ruinas ligam o antigo palacio com o edificio do convento de S. Francisco, e alguns affrontam o átrio de sua bella igreja. O terreno que dá entrada para o palacio e a cerca do convento podem muito bem encorporar se no passeio publico da cidade, formando-se na frente da igreja uma formosa praça.

O edificio do convento, vasto e construido com solidez, póde com sacrificios de algum vulto, accommodar-se a serviços municipaes e publicos. Desejosa a camara municipal de Evora de partilhar a louvavel emulação de seus concidadãos, requereu ao governo lhe fossem concedidos os restos do palacio e annexos, o edificio e cerca do convento.

Ao poder legislativo pertence satisfazer estes nobres desejos, e como representando n'esta camara os votos que a ella me deram accesso, cabe-me a honra de offerecer á elevada consideração da mesma camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São concedidos á camara municipal do concelho de Evora os restos do palacio de El Rei o Senhor D. Manuel, pertenças e terrenos annexos, conhecidos pelo nome generico de Trem, e que têem estado a cargo do ministerio da guerra; assim como o edificio e cerca do extincto convento de S. Francisco, da mesma cidade, entregues ao parocho da freguezia de S. Pedro por decreto de 20 de maio de 1845.

Art. 2.° A camara municipal de Evora incumbe:

1.º Restaurar os restos d'aquelle palacio, dando-lhes um destino que permitta a possivel conservação para perpetuar a memoria do monumento, e conveniente applicação a serviço publico ou municipal.

2.º Accommodar o edificio do convento para n'elle se estabelecerem uma sala de audiencias da comarca, uma aula nocturna do instrucção primaria, e todos os demais serviços municipaes a que entenda a camara conveniente applica lo.

3.º Abrir na frente da igreja uma praça que a desaffronte, aformoseando-se a entrada para o templo.

Art. 3.° Os edificios e terrenos cedido reverterão á fazenda nacional se dentro de tres annos a camara municipal de Evora não tiver dado começo ás obrigações impostas no artigo antecedente, ou se der ás mesmas propriedades destinos diversos d'aquelles para que é feita a concessão.

Art. 4.° Reverterá igualmente para o ministerio da guerra tudo quanto por esta lei é pela mesma repartição entregue á camara municipal, se dentro de seis mezes a camara não tiver posto á disposição do mesmo ministerio um edificio que tenha as precisas condições, para n'elle se estabelecer uma enfermaria em que possam ser tratados até dez cavallos do regimento de cavallaria aquartelado na cidade de Evora, e atacados de molestias contagiosas.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Camara dos deputados da nação, 26 de abril de 1864. = O deputado pelo circulo de Evora, Manuel Alves do Rio = J. M. Rojão.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda, ouvida a de guerra.

O sr. Presidente: — Vou dar a palavra aos senhores que estão inscriptos para antes da ordem do dia.

O sr. Coelho do Amaral: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Ceia, sobre a liberdade de commercio dos vinhos e abolição do systema restrictivo do Douro.

Delenda Catargo, sr. presidente! Não abandono o meu posto.

Bem desejava que se achasse presente o sr. ministro das obras publicas para sobre este objecto provocar ainda uma ultima explicação de s. ex.ª, comquanto esteja desenganado, e até quasi de antemão eu saiba qual ella possa ser.

S. ex.ª disse aqui em uma das sessões anteriores que = esta questão não póde ser resolvida sem que se estabeleçam bancos hypothecarios, e sem que a construcção do caminho de ferro do Porto á Regua esteja concluida =. Persuado-me que foram estes, pouco mais ou menos, os fundamentos com que s. ex.ª quiz provar a conveniencia do adiamento d'esta discussão.

Não posso conformar-me com a opinião de s. ex.ª, e se o paiz tem de esperar a realisação d'estas medidas antes que se resolva a questão da liberdade de commercio dos vinhos, terá que esperar muito tempo, e os interesses compromettidos n'esta questão não são de tão pequena importancia, que devam sacrificar-se essas medidas que, embora muito valiosas, eu considero de uma importancia secundaria para a questão.

O estabelecimento dos bancos hypothecarios e do credito agricola virá proximo, mas a construcção do caminho de ferro do Porto á Regua não póde vir proxima, e eu não comprehendo como antes d'elle se não deva resolver a questão do Douro, ou antes questão de todo o paiz, porque a ella estão affectos interesses que não estão circumscriptos só a uma area tão limitada como a da demarcação do Douro, mas que são muito mais extensos do que aquelles que são representados pela demarcação, e que são, diga-se a verdade, muito mais valiosos (apoiados).

Entendo que não podem nem devem comprometter-se estes interesses, não direi indefinidamente, mas por um praso muito longo, porque um praso de tempo muito longo deve mediar até que o caminho de ferro do Porto á Regua esteja concluido. É esta uma nova face que se dá á questão de que ella não se póde resolver, sem compromettimento dos interesses do Douro, antes de se construir esta linha ferrea.

Se o Douro transportava até aqui os seus vinhos para o Porto pelo rio, creio que póde continuar a transporta-los do mesmo modo.

Dir-se-ha que no caminho de ferro se transportam com muito mais segurança, e que elle offerece passagem a estes productos, sempre e em todas as quadras do anno, emquanto que o Douro em algumas quadras não a offerece sem risco. Ora permitta-se-me o dizer que esta observação, em face dos factos, se não é frívola é de muito pequeno peso, é um argumento ad terrorem de nova data. Serve para esta questão, e para a do caminho de ferro. Toca a explora lo.

As representações que têem concorrido a esta camara de tantos concelhos, de tantas localidades vinicolas compromettidos n'esta questão, têem um fim justificado, e justificadissima é a anciedade com que pedem aos representantes do paiz uma prompta resolução d'ella. Ainda ha pouco o meu nobre amigo e collega, o sr. Domingos de Barros, mandou para a mesa uma representação de varios patricios nossos, e respeitaveis negociantes do Rio de Janeiro, em que desenvolvem de uma maneira bem clara e concludente a necessidade de se resolver esta questão com muita brevidade; porque, á prompta resolução d'ella, estão affectos altos interesses, não só d'este paiz, mas d'aquelles commerciantes. A posição que n'aquella praça póde ganhar o nosso commercio de vinhos, que já ali foi tão importante, está dependente, segundo a opinião dos nossos patricios, da promptidão com que reconquistarmos o posto que tivemos n'aquelle mercado, e que varias circumstancias, sendo as primeiras a escassez das colheitas, em rasão do oidium, e o pouco escrupulo dos exportadores substituindo vinhos por surrapas, nos fizeram perder.

Os vinhos do Mediterraneo, que ali podiam concorrer com menos despezas de preparo e talvez de transporte, aproveitaram a occasião de desalojar os nossos e tomar-lhes a freguezia. Mas hoje que, pela declinação da molestia, nos vamos rehabilitando para fornecer de novo os mercados do Brazil e que ali se está operando uma transformação no paladar dos consumidores, porque os vinhos do Mediterraneo, os vinhos doces, vão perdendo de moda, ao passo que os nossos vinhos seccos, os vinhos delgados e os verdes do Minho, têem muito procura e boa offerta; quando, reflicto eu, e desejava que me ouvisse o nobre ministro das obras publicas, se dá um conjuncto de circumstancias favoraveis para reganharmos um largo mercado, que deve crescer todos os dias, seremos nós que, em vez de facilitar, estejamos difficultando a concorrencia ali do primeiro e mais valioso producto do nosso paiz?!

E para conceder aos vinhos verdes do Minho, aos bellos vinhos seccos do alto Trás os Montes, a saída livre pela barra do Porto, será necessario esperar pelos bancos hypothecarios e pela construcção do caminho de ferro d'aquella cidade para a Regua?

E ha de dizer-se aos bons vinhos da Beira, ricos de tantas especialidades, aos bellos vinhos do Dão e da Bairrada, os quaes o caminho de ferro do norte, avizinha tanto da rica e opulenta praça do Porto, que não podem ali ir offerecer-se á representação commercial, nem mostrar a sua competencia para concorrerem nos differentes mercados, antes que o Douro esteja habilitado com instituições bancarias e com um caminho de ferro especial para continuar mantendo a sua superioridade? Não podem taes evasivas occupar o logar de argumentos serios.

Sr. presidente, não percamos occasião de buscar consumo aos nossos vinhos, cuja producção irá augmentando extraordinariamente de anno para anno. Ajudemos, facilitemos ao paladar dos consumidores do Brazil os meios de quebrarem as suas relações com os vinhos do Mediterraneo. Se estes vão ali perdendo terreno, não nos descuidemos nós era adquirir uma freguezia que é nossa, e, que nos está convidando.

Mas tudo isto está dependente da questão do Douro, e por isso, repito, que não se póde esperar, para a sua resolução, que se estabeleçam os bancos hypothecarios, e que se faça a construcção da linha ferrea do Porto á Regua.

Eu já perdi a esperança de ver resolvida a questão n'esta sessão. Não concordo na procedencia dos motivos que se adduzem para justificar a protelação. Não acredito n'elles, mas no que acredito intimamente é que a legislatura seguinte ha de infallivelmente resolver esta questão, e ha de resolve-la na sua primeira sessão.

As vozes, os clamores, que se levantam em toda a parte pedindo a resolução prompta e breve, vozes que significam variados e fortes interesses, hão de trazer os poderes publicos a decidi-la, como convem, no sentido da liberdade.

Alem d'estes interesses estão tambem os principios mais triviaes da sciencia, que condemnam este monopolio insustentavel da restricção.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Este e todos.

O Orador: — Todos, já se vê, e folgo ter esta occasião para mostrar ao meu distincto, intimo e muito prezado amigo, o sr. Sant'Anna, que não estamos, nem podemos estar, longe de harmonisar as nossas opiniões, salvo alguma muito pequena discrepancia; se porventura em uma ou outra questão ella se possa alimentar.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — A favor dos cereaes.

O Orador: — A favor dos cereaes não estou em uma pequena discrepancia com o meu amigo; n'esta hypothese, collocada no terreno das necessidades de momento d'este paiz, a discrepancia é profunda.

Quando a questão dos cereaes se suscitou eu estava convencido, e estou ainda, de que a escassez não era real, que não estava imminente a fome, e bem depressa os factos e as informações geraes vieram em meu auxilio, vieram mostrar que a fome do Porto foi uma fome ficticia e artificial, preparada e creada imprudente e imprevidentemente pelos monopolistas (apoiados), e por isso sustento que n'este objecto, particularmente com referencia á actualidade, estava e estamos a muita distancia um do outro.

Se porventura o meu illustre amigo se convencer, como eu, de que não havia necessidade de introducção de cereaes para satisfazer ás necessidades do consumo, que quero sempre abastecido, porque não desejo que haja fome, não quero que o povo soffra fome, e quando se demonstre que ha essa necessidade serei o primeiro a vir pedir remedio para ella, porque primeiro que tudo está attender ás necessidades das classes desvalidas e pobres; quando, digo, o sr. Sant'Anna e Vasconcellos, meu amigo, se convencer de que tal necessidade não existe, como espero que o convencerá a baixa do preço dos generos, para mim é fóra de duvida que o seu animo generoso não quererá, com prejuizo das classes agricolas, com prejuizo da nossa lavoura, insistir por uma medida que fosse ferir os interesses d'estas classes, sem necessidade e sem beneficiar as classes operarias, as classes consumidoras, sobre as quais viriam reflectir-se os males das productoras.

De resto, estou de accordo com o meu illustre amigo, nem podia deixar de estar, e folgo sempre que tenho occasião de dar um testemunho da harmonia e concordancia das minhas opiniões com as de um tão leal correligionario, com quem ando em uma longa camaradagem, e da qual provavelmente nunca nos desligaremos, porque a uniformidade das nossas crenças e o enraizamento que ellas têem no nosso animo nunca nos ha de pôr muito distantes um do outro.

Voltando, sr. presidente, á questão do Douro, o que digo é que a questão do Douro exige uma definitiva resolução. N'esta sessão não se resolve.

O sr. Gouveia Osorio: — Porquê?

O Orador: — Respondendo ao meu amigo, o sr. Gouveia Osorio, digo que se não resolve n'esta sessão, porque ella vae muito adiantada, e á camara estão entregues trabalhos e medidas muito importantes que ella tem a resolver.

O sr. Gouveia Osorio: — Em 1859 resolveu-se em tres dias.

O Orador: — Diz o meu amigo que esta questão em 1859 resolveu se em tres dias, mas peço licença para lhe observar que as leis não se fazem só n'esta casa, fazem-se com o concurso das duas casas do parlamento, e sem fazer allusão alguma, que pésa ser taxada de indiscreta ou de cortez á outra casa do parlamento, parece-me que ali as opiniões não estarão tão conformes como se acham aqui sobre esta questão, e por consequencia pão se resolverá lá com tanta facilidade como se decidiria aqui, e em todo o caso não o poderia ser sem a preterição de medidas importantes e urgentes, que estão affectas ás duas casas do parlamento, e que a escassez do tempo que resta para o encerramento da sessão não dará logar a que se tratem sem preterição de outras. É a explicação que acho ao adiamento da questão dos vinhos, e que todavia lamento muito.

Persuado-me que n'esta referencia que faço á camara dos dignos pares não vae nenhuma palavra de descortezia ou falta da reciproca consideração, como cumpre ás duas casas dispensarem-se uma á outra.

Peço a v. ex.ª a bondade de ordenar que a representação, que vou mandar para a mesa seja transcripta no Diario de Lisboa, assim como algumas outras que eu e alguns

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dos meus illustres collegas temos apresentado, pedindo sempre a sua publicação no Diario de Lisboa, em conformidade com uma resolução da camara, e por descuido ou por não ser ouvido pela mesa não tem tido logar a publicação. Peço que sejam todas publicadas, e creio que não é preciso recorrer a uma resolução da camara, porque quando vieram aqui as primeiras representações do Douro resolveu-se que fossem publicadas, assim como quaesquer outras que se apresentassem sobre o mesmo assumpto.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — É uma resolução vigente, e se algumas d'essas representações deixaram de ser publicadas foi por descuido ou por esquecimento.

O Orador: — Das que se têem apresentado n'esta sessão ainda nenhuma foi publicada; peço que o sejam todas, assim para a instrucção d'este grande processo, como para que sejam bem avaliados os interesses que se envolvem n'esta momentosa questão.

Poderia fazer mais algumas observações, mas o sr. ministro não se acha presente, de quem eu desejava provocar ainda uma explicação para me não restar duvida ou meio algum de tranquillisar a minha consciencia, e para mostrar que fiz quanto estava ao meu alcance em favor de uma medida de eterna justiça, e na qual sou altamente empenhado, não só porque conheço os grandes interesses que ella envolve para o paiz, mas porque represento aqui um circulo que é essencialmente vinhateiro (apoiados); e então devo ao paiz e devo ao meu circulo o testemunho de que pela minha parte tenho empregado quantos esforços em mim cabem para que essa questão se resolva no interesse geral de todos e no interesse do proprio Douro, que não quero sacrificar.

Já o disse mais de uma vez, e repito-o ainda, que estou intimamente convencido de que os interesses licitos do Douro não soffrem com a resolução d'esta questão.

Nós somos pouco exigentes, e ella é muito simples pela nossa parte, pela parte dos ante-restrictivistas; porque nós contentâmo-nos que nos deixem livremente entrar no Porto e saír pela barra do Porto; não queremos outra cousa, e em troco d'isto, concedemos aos restrictivistas tudo quanto elles queiram, todas as isenções que têem imaginado, e aquellas que possam imaginar sem prejuizo de terceiro.

Desde já me comprometteria, se aqui estivesse, conceder a todas o meu humilde voto, comtanto que tenhamos entrada livre n'uma cidade portugueza, e livre saída por uma barra portugueza (apoiados).

Nós, filhos de Portugal, pedimos pouco, não pedimos mais nada; pedimos só que não sejamos considerados estrangeiros na nossa terra (apoiados).

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Sr. presidente, eu pedi a palavra, para mandar para a mesa um parecer da commissão de fazenda e um requerimento de um velho sargento de veteranos, que fez a campanha da Peninsula, e que mostrou sempre, a sua intrepidez nos combates, factos pelos quaes mereceu a honra de ser condecorado. Este homem acha-se em más circumstancias, é um velho valetudinario que pede á camara que lhe melhore a sua posição.

Peço que este requerimento seja remettido á commissão respectiva, para sobre elle dar o seu parecer o mais brevemente que poder ser.

Aproveito a occasião para em poucas palavras responder ao meu amigo e collega o sr. Francisco Coelho do Amaral.

E inutil repetir aqui a muita consideração em que tenho os altos dotes de espirito e de caracter de s. ex.ª

(Interrupção do sr. Coelho de Amaral que se não percebeu.)

O Orador: — Não offendo a sua modestia, é a manifestação sincera da verdade e dos meus sentimentos para com v. ex.ª

Eu espero, em vista da tenacidade e dos excellentes argumentos economicos, com que s. ex.ª defende a questão do Douro, que se approximará das minhas opiniões com relação á liberdade dos cereaes (apoiados).

Estou convencido de que a unica lei de cereaes que se devia apresentar n'esta camara era a livre admissão d'elles, sem nenhuma especie de direitos protectores. Esta é a minha convicção.

No entretanto não estou longe de aceitar uma lei, não com escala movel, porque é isso contra todos os principios, mas uma lei com um imposto modico e que se vá progressivamente diminuindo.

Eu, sr. presidente, tenho a convicção de que quando esta questão for melhor estudada, quando todos se convencerem de que não lucram com o statu quo e que pelo contrario lucram com a abundancia, que ha de ser o resultado natural e fatal (no sentido obvio da palavra), da admissão dos cereaes, quando os productores intelligentes se compenetrarem d'esta verdade, o direito protector, se o houver, ha de acabar por si mesmo.

Para se chegar a adquirir um convencimento serio n'esta questão é necessario estuda-la a fundo (apoiados), e dar á meditação o tempo preciso, a fim de poder olha-la desapaixonadamente, e chegar a uma conclusão, que o bom senso aceita, que a experiencia tem sanccionado em toda a parte e que está de accordo com os bons principios economicos.

Um dos pontos que convem estudar é o das causas que originam a barateza do genero, do qual tanto se arreceiam alguns illustres deputados, e meus amigos; é preciso encarar a questão debaixo de todos os seus aspectos.

Ora a barateza do genero provém de duas causas — ou da abundancia, e não me parece que nenhum dos illustres deputados queira vir apresentar argumentos em contrario ás vantagens da abundancia de um genero de primeira necessidade; ou da falta de recursos do consumidor para adquirir o genero. Convem aqui notar que a barateza, que é filha d'esta segunda causa, não pôde ser produzida senão, pela legislação prohibitiva.

Ora quando os illustres deputados tiverem reflectido bem nas causas que podem produzir a barateza do genero, elles serão os primeiros a abandonar os preconceitos, que porventura ainda tenham com relação a esta questão, approximando-se de mim, como eu me approximei de ss. ex.ª na questão do Douro.

Esta questão dos vinhos do Douro deve ser resolvida promptamente. Eu entendo com os illustres deputados que a legislação sobre este assumpto é, no estado em que está, um verdadeiro aleijão economico.

Estou convencido de que todos aquelles que entram n'esta questão de boa fé (e n'este caso considero eu um dos campeões do lado contrario, o meu particular amigo e collega, o sr. Affonso Botelho), quando tiverem meditado neste objecto (abstracção feita de interesses de localidades, e de considerações de certa ordem); estou convencido, digo, que ss. ex.ªs serão os primeiros a concordar em que é preciso entrar por uma vez no verdadeiro caminho da liberdade.

A regeneração economica de um paiz não se faz consagrando um culto eterno a velharias, que nenhum principio aconselha.

A regeneração economica de um paiz faz se, tendo fé nos principios, e introduzindo na legislação esses mesmos principios (apoiados).

Estas poucas palavras, de que eu peço desculpa á camara, são á manifestação sincera das minhas opiniões com relação a estes assumptos, aos quaes tenho applicado as poucas faculdades que a natureza me concedeu.

Vozes: — Muito bem.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para chamar a attenção da commissão de verificação de poderes. Ha bastante tempo que lhe foram remettidos varios documentos, para ella dar o seu parecer sobre elles, e até hoje ainda não foi possivel da lo; talvez que a commissão tenha tido muito que fazer, mas eu insisto em que ella apresente o seu parecer, como entender na sua alta sabedoria, a respeito das differentes questões que lhe estão affectas.

Parece-me que é da dignidade da camara resolver questões sobre que ha ou pôde haver duvida; e depois da discussão se poderá chegar ao conhecimento da verdade. Talvez que eu fique vencido, mas respeito sempre as decisões da camara; mas o que não pôde ser é ter a commissão fechados na gaveta esses documentos, sem apresentar o seu parecer; e n'isto não vae censura a ninguem. Vejo presentes alguns dos membros da commissão; não exijo uma resposta, mas o que peço é que apresentem o seu parecer quanto antes; quando não ver-me-hei na necessidade de pedir a palavra todos os dias até concluir esta minha tarefa.

O sr. Ayres de Gouveia: — Mando para a mesa uma representação dos porteiros e continuos do governo civil do Porto, que pedem augmento de ordenado.

Mando igualmente uma representação dos substitutos extraordinarios das faculdades academicas da universidade de Coimbra, que pedem tambem augmento de ordenado; mas parece-me que seria melhor acabar com a distincção entre substitutos ordinarios e extraordinarios, e equipara los em ordenados.

Peço ás commissões, a que forem remettidas estas representações, que as tomem na consideração que merecem.

ORDEM DO DIA

DISCUSSÃO DE DIFERENTES PROJECTOS DE LEI

Entrou em discussão o projecto de lei n.° 6, de 1863.

E o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 6

Senhores. — Foi presente á vossa commissão de legislação o requerimento, documentado, do juiz de segunda instancia na relação do Porto, José Bernardo Gonçalves Ferreira Pinto da Cunha, para que seja considerado e contado como feito na segunda instancia o serviço que este juiz prestára desde 13 de setembro de 1856, em que fôra despachado para a relação dos Açores e de que não tomára posse por impossibilidade justificada de saude e idade, continuando comtudo em exercicio até que fôra despachado para a relação do Porto.

A commissão, considerando que o juiz de que se trata fôra promovido para a segunda instancia na relação dos Açores por decreto de 13 de setembro de 1856;

Considerando que tem setenta annos de idade, trinta e nove de bom serviço effectivo e quarenta e cinco de serviço não effectivo;

Considerando que pela sua deteriorada saude e avançada idade é que não tomára posse do referido logar de juiz da relação dos Açores;

Considerando que continuara em exercicio em virtude da auctorisação do governo, de 13 de fevereiro de 1857, até que vagasse um logar nas relações do reino;

Considerando que o mesmo juiz é digno de toda a consideração pelos seus longos e sempre distinctos serviços na carreira da magistratura e pelos que prestára á causa da liberdade, sendo perseguido, pronunciado e preso e seus bens confiscados:

E a vossa commissão de legislação de parecer que seja convertido emulei e approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E contado para o effeito sómente da aposentação ao juiz de segunda instancia na relação do Porto, José Bernardo Gonçalves Ferreira Pinto da Cunha, como prestado na segunda instancia, o tempo de serviço d'este magistrado desde 13 de setembro de 1856, em que fôra despachado juiz da relação dos Açores.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 28 de junho de 1862. = José Bernardo da Silva Cabral = Antonio Pequito Seixas de Andrade (com declaração) = Manuel Pinto de Araujo = João Rodrigues da Cunha Aragão Mascarenhas = Manuel Bento da Rocha Peixoto = Joaquim Antonio de Calça e Pina =: João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens (com declaração) = Alberto Antonio de Moraes Carvalho (com declaração.)

Foi logo approvado na generalidade e na especialidade. Passou se ao projecto de lei n.° 62, d'este anno.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 62

Senhores. — Foi presente á commissão de fazenda um projecto de lei n.° 68-B, de iniciativa do sr. deputado José de Menezes Toste, em que se propõe que seja auctorisado o governo a conceder ao asylo de mendicidade da Praia da Victoria o edificio e cerca do extincto convento de Nossa Senhora da Luz da mesma villa, para n'elle se collocar com a devida regularidade aquella humanitária instituição; e

Considerando que se o fim christão e humanitario que se tem em vista persuade a conveniencia da concessão, é comtudo pouco rasoavel, vista a informação da secretaria de fazenda, de 14 de agosto de 1863, satisfaze-lo inteiramente, pois que em uma parte do alludido edificio está collocado o tribunal judicial, que não pôde privar-se d'ella sem manifesto prejuizo dos interesses publicos;

Attendendo porém a que, segundo outras informações obtidas pela commissão, pôde o sobredito asylo collocar-se no resto do edificio que se acha inoccupado:

Por estas rasões é a vossa commissão de opinião, de accordo com o governo, que se dê para o estabelecimento de caridade a parte do edificio que não está occupado pelo tribunal, convertendo-se em lei o seguinte projecto:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder ao asylo da villa do Praia da Victoria o granel e a cerca de um edificio sito n'aquella villa, o qual se denomina do extincto convento de Nossa Senhora da Luz, devendo collocar-se ali o sobredito asylo.

Art. 2.° Quando se não realise aquella collocação no espaço rasoavel de tempo que o governo determinar ou se dê aquella parte do edificio e cerca um destino differente d'aquelle que é mencionado no artigo 1.°, voltarão esta e aquella em qualquer tempo que seja á posse e dominio da fazenda nacional.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 14 de abril de 1864. = Belchior José Garcez = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = João Antonio Gomes de Castro = Anselmo José Braamcamp =: Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Guilhermino Augusto de Barros.

Foi logo approvado na generalidade.

O sr. Sieuve de Menezes: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que se passe já a discussão da especialidade.

Assim se resolveu, e seguidamente foram approvados sem discussão os tres artigos do projecto.

Seguiu-se o projecto de lei n.° 38, deste anno.

E o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 38

Senhores. — A junta de parochia da freguezia de Ventosa, concelho de Vouzella, districto administrativo de Vizeu, pede a concessão de uma pequena casa que foi da commenda de Santa Maria de Ventosa, hoje pertencente á fazenda nacional, cujo rendimento annual é de 600 réis e o valor total de 15$000 réis, como informou a esta commissão a secretaria d'estado dos negocios da fazenda em officio de 22 de junho de 1863.

O pedido da junta está fundado tanto nas circunstancias em que se acha, não podendo recolher convenientemente muitos dos objectos indispensaveis ao culto divino, como no facto de não ter casa propria onde possa celebrar as suas sessões.

Considerando a commissão que a casa pedida é de pouco valor, e bem assim que as rasões apresentadas são de toda a consideração, é de parecer que seja convertido em lei o seguinte projecto:

Artigo 1.° É auctorisado o governo a conceder á junta de parochia de Ventosa, concelho de Vouzella, districto administrativo de Vizeu, a casa que pertenceu á commenda de Santa Maria de Ventosa, e que se acha mencionada na lista 1:199-A de 24 de maio de 1859, n.° 27:290.

Art. 2.° A casa a que se refere o artigo 1.° voltará á posse e dominio da fazenda nacional no caso em que se lhe dê o destino, que não seja aquelle que se deduz das obrigações que a junta de parochia tem de preencher.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 18 de março de 1864. = Belchior José Garcez = João Antonio Gomes de Castro = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Anselmo José Braamcamp = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida.

Foi approvado na generalidade.

O sr. Ayres de Gouveia: — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se quer desde já passar á discussão d'este projecto na especialidade.

Resolveu-se afirmativamente, e foram approvados sem discussão os artigos do projecto.

O sr. Luciano de Castro (sobre a ordem): — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Faço este requerimento, porque fui um dos membros da commissão de legislação que assignei vencido o parecer da mesma commissão, sobre o processo instaurado contra o sr. deputado Gouveia Osorio.

Fui levado, pela força das minhas convicções a assignar, esse parecer vencido; e tinha grande empenho em dizer os motivos por que assim obrei, não para convencer a camara, mas para lhe expor as rasões que tive para assim proceder, visto que se tratava de uma questão pessoal.

Por objecto de serviço não pude estar presente na camara quando se tratou d'este parecer, e fui obrigado a deixar passar a discussão sem declarar as rasões do meu voto. Faço pois este pedido á camara por desaggravo meu,

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visto que, não só na imprensa, mas em outras partes, se terá dito que alguns dos membros da commissão, por cobardia, deixaram de comparecer n'essa occasião; e eu não não deixei de vir aqui por cobardia nem receio de emittir a minha opinião francamente, como costumo sempre em todas as occasiões; e tinha até pelo contrario grande capricho em a sustentar.

Peço pois que se imprimam estes documentos, porque, com a sua publicação julgo-me completamente desaggravado; e na ausencia de outras explicações, esta publicação supprirá tudo o que eu podesse dizer á camara.

Leu-se na mesa o seguinte:

REQUERIMENTO

Requeiro que se mandem publicar os documentos, que devem existir na secretaria da camara, relativos ao processo em que foi pronunciado o sr. deputado Antonio de Gouveia Osorio, depois de concluida a publicação da syndicancia de Villa Real. = José Luciano de Castro.

Foi approvado.

O sr. Paula Medeiros: — Envio para a mesa, por parte da commissão de administração publica, o parecer dado sobre o projecto de lei apresentado pelo governo, para ser auctorisada a camara municipal do concelho de Arouca a contrahir o emprestimo de 1:000$000 réis para comprar um edificio, que lhe sirva para paços do concelho e outras repartições publicas.

O sr. Faria Blanc: — Pedi a palavra para declarar á camara que a deputação, nomeada para apresentar á sancção real tres autographos de decretos das côrtes geraes, cumpriu a missão de que foi encarregada, sendo recebida por Sua Magestade com a sua costumada benevolencia.

Entrou em discussão o projecto n.º 40, d'este anno.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 40

Senhores. — A commissão de guerra, a quem foi presente a proposta de lei n.° 145, da sessão de 1859, de que renovou a iniciativa o sr. deputado Mello e Mendonça, e que tem por fim auctorisar o governo a proceder á liquidação e subsequente pagamento dos vencimentos a que tem direito o dr. José Romão Rodrigues Nilo, detidamente o examinou, e tendo devidamente apreciado os documentos com que o dito dr. Nilo instrue o seu requerimento, que motivou o mencionado projecto de lei, adopta como seu o parecer da illustre commissão de guerra de 1859, e as rasões em que o fundamenta, e tendo ouvido a illustre commissão de fazenda, que sobre o assumpto deu opinião favoravel, tem a honra de propor á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a mandar proceder á liquidação e subsequente pagamento dos vencimentos que pertencem ao dr. José Romão Rodrigues Nilo até á data da publicação da sentença de 21 de setembro de 1837, pela qual foi julgado quite da responsabilidade que sobre elle pesava, e apto para receber os vencimentos que em virtude da suspensão lhe haviam sido retirados.

Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão, 29 de março de 1864. = Augusto Xavier Palmeirim = Placido Antonio da Cunha e Abreu = D. Luiz da Camara Leme = Fernando de Magalhães Villas Boas = José Guedes de Carvalho e Menezes = João Nepomuceno de Macedo = Francisco Maria da Cunha.

A commissão de fazenda tem a honra de devolver á illustre commissão de guerra o projecto de lei n.° 145, do anno de 1859, relativo ao dr. José Romão Rodrigues Nilo, e é de parecer que é de toda a justiça mandar proceder á liquidação e subsequente pagamento dos vencimentos a que tiver direito o dito doutor, approvando-se o referido projecto de lei.

Sala da commissão, 11 de março de 1864. =. Belchior José Garcez (vencido) = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Placido Antonio da Cunha e Abreu = João Antonio Gomes de Castro — Hermenegildo Augusto de Faria Blanc — Guilhermino Augusto de Barros = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida = Anselmo José Braamcamp.

O sr. Vicente Carlos (sobre a ordem): — Acaba de ser dirigido á mesa, pelo digno relator da illustre commissão de administração publica, um projecto do governo, para ser auctorisada a camara municipal do concelho de Arouca a contrahir um emprestimo da quantia de 1:000$000 réis, para a compra de um edificio que sirva de paços do concelho, e n'elle estabelecer outras repartições publicas; o parecer da illustre commissão foi favoravel, e como o objecto é urgente e as camaras devem ter pouca duração antes do encerramento, resultaria á camara municipal grave prejuizo se o projecto não fosse discutido e approvado antes do dito encerramento, peço por isso a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que, dispensado o regimento sobre segundas leituras e impressão do projecto e parecer, se entre já na discussão d'elle.

O sr. Presidente: — Consultarei a camara no fim da discussão do projecto n.° 40.

Não havendo quem pedisse a palavra sobre este projecto, foi submettido á votação, e approvado.

O sr. Faria Blanc (sobre a ordem): — Mando para a mesa tres pareceres da commissão de fazenda. O primeiro, sobre proposta do governo, para ser auctorisado a comprar em hasta publica, por conta do estado, tres predios sitos na rua do Jardim do Tabaco, pertencentes á sociedade, em liquidação, manutenção civil, para ali se estabelecerem armazens de deposito, debaixo da administração e fiscalisação da alfandega grande de Lisboa. O segundo, tambem sobre proposta do governo, para ser reduzido a um por milhar o direito de 2 por cento a que estão sujeitas as baldeações das mercadorias. E o terceiro, que diz respeito aos empregados da alfandega do Funchal.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Foi mandado para a mesa um parecer da commissão de administração publica, approvando uma proposta do governo, que tem por fim auctorisar a camara municipal de Arouca a contrahir um emprestimo para a compra de um edificio. Devia ser remettido á imprensa para ser impresso e distribuido. Agora o sr. Vicente Carlos requereu que se dispensasse o regimento para entrar já em discussão.

O sr. José de Moraes: — Eu opponho-me a que seja discutido qualquer projecto, que for mandado para a mesa por uma commissão, antes de ser impresso; porque ao menos desejo le-lo.

Não sei o que contém o projecto; poderá ser muito justo, e de certo o é, basta ser protegido pelo illustre deputado; mas não posso votar por elle emquanto não for impresso e dado para ordem do dia.

O sr. Vicente Carlos: — O illustre deputado não tem rasão para se oppor a que se discuta desde já este assumpto, dispensando-se o regimento.

O illustre deputado está fazendo opposição sem ao menos ter conhecimento do que se diz no projecto, deixe le lo, e depois de saber o que elle contém, mais regularmente se lhe opporá, mas o caso é tão simples que não sei o que se lhe pretende oppor.

O caso é o seguinte: a camara municipal do concelho de Arouca não tendo casa dos paços do concelho que lhe preste para isso e para o judicial as necessarias acommodações, reconhecendo a necessidade de mandar construir ou haver uma casa com as necessarias accommodações para as funcções da mesma camara, e alem d'isso para a administração do concelho e repartição de fazenda, e para isso resolveu depois pedir auctorisação ao governo para expropriar um edificio que era das freiras de Arouca, para o referido fim, auctorisação que lhe foi concedida; é preciso paga-la, pede-se auctorisação para contrahir um emprestimo de réis 1:000$000 para pagamento d'essa casa.

Para auctorisação d'este emprestimo é que o governo apresentou o projecto precedido e instruido de um processo regular, em que figuram as deliberações da camara e conselho municipal, orçamento de meios e deliberação do conselho de districto.

Se peço a dispensa do regimento não é mais que para poupar tempo, a fim de que essa auctorisação seja concedida quanto antes nas duas casas do parlamento.

Aqui não ha irregularidades; o processo está regular, o projecto foi apresentado pelo governo, a commissão adoptou-o e deu sobre elle um parecer favoravel; portanto a meu ver não se offerece duvida alguma.

Para que o illustre deputado e todos os mais nossos collegas tenham conhecimento do assumpto e da verdade do que digo e do que votam, bastará que ouçam ler o projecto e parecer e alguns documentos que os acompanham.

O sr. Luciano de Castro: — Pedia a v. ex.ª e á camara que ouvisse breves palavras a respeito d'este projecto.

Parece-me que não póde haver duvida era a camara annuir ao pedido do sr. deputado, entrando immediatamente na discussão d'este parecer.

A camara municipal de Arouca expropriou uma casa chamada Hospedaria por motivo de utilidade publica. O governo auctorisou esta expropriação, e até pelo ministerio do reino so requereu se ministerio da fazenda que não se pozesse em praça esta casa, porque estava pendente um processo de expropriação. A casa foi expropriada, e é necessario paga-la. O projecto tende a legalisar o que está feito, e nada mais.

Conheço este objecto, porque correu na direcção geral dos proprios nacionaes; tive informações a respeito d'elle; é uma cousa regular que me parece que não ha a menor duvida em que seja approvado desde já.

Portanto espero que a camara não demorará a approvação d'elle.

O sr. José de Moraes: — Eu não queria combater este projecto, como ao illustre deputado se afigurou, nem o combato.

Segundo diz o illustre deputado auctorisasse a camara municipal de Arouca a levantar um emprestimo para pagar uma casa que expropriou; e diz mais que o projecto foi apresentado pelo governo e que este ouviu a estações competentes. Acredite o illustre deputado, não posso deixar de approvar o projecto, mas o que não quero é que esta camara vá votar um projecto pela simples leitura na mesa.

A camara pôde fazer o que quizer, mas eu não dou o meu voto.

O sr. Luciano de Castro: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida, e resolveu a camara dispensar a impressão d'este projecto, a fim de entrar já em discussão. E o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 76

Senhores. — A vossa commissão de administração publica examinou com a devida attenção a proposta do governo n.° 66-B, para ser auctorisada a camara municipal do concelho de Arouca a contrahir um emprestimo de 1:000$000 réis para pagamento da expropriação da casa da hospedaria de cima das freiras do convento d'aquella villa, a fim de servir de paços do concelho, e dar accommodação ás mais repartições publicas.

Segundo o processo que acompanha a proposta do governo, a camara municipal d'aquelle concelho, em sessão de 18 de março de 1863, ponderando os graves inconvenientes que se seguiam para o serviço publico d'aquelle municipio, em rasão dos paços do concelho não ter as necessarias accommodações, a fim de que a camara e o poder judicial podessem funccionar regularmente, e tomando em consideração a circumstancia da camara estar pagando aluguer de uma outra casa em que se achava a administração do concelho, reconheceu a absoluta necessidade de haver uma casa que, servindo de paços do concelho, podesse tambem dar accommodação á administração, repartição de fazenda e recebedoria, e para isso deliberou expropriar a dita casa de hospedaria, levantando para esse fim um emprestimo de 1:000$000 réis.

Consta do mesmo processo que a camara do conselho municipal, em sessão de 6 de maio do mesmo anno, consignaram no orçamento uma verba calculada sobre o imposto de 2 reaes lançados em cada quartilho de vinho, que no concelho se vendesse, sendo especialmente applicado o producto ao pagamento da expropriação da dita casa, o que, por accordão do conselho de districto de 20 de junho do mesmo anno, foi approvado; e a final, por decreto de 12 de novembro do mesmo anno, foi a camara auctorisada para expropriar a referida casa.

Attendendo a que a acquisição d'aquelle edificio, para servir de paços do concelho e mais repartições publicas, é de absoluta necessidade e utilidade municipal;

Attendendo a que o pensamento e a camara foi completamente approvado pelo conselho municipal, pelo conselho de districto e governador civil, e a que o mesmo governo decretou a auctorisação para a camara expropriar aquella casa;

Attendendo a que a camara municipal na impossibilidade de, pelos recursos ordinarios, poder emprehender e levar a effeito o seu pensamento a expropriação e pagamento da casa, e não querendo elevar o imposto directo para não sobrecarregar os povos, creou o imposto indirecto de 2 reaes sobre cada quartilho de vinho vendido no concelho, para com esse producto amortisar o capital e pagamento do juro;

Attendendo a que o conselho não tem outros rendimentos de que a camara possa lançar mão para esse fim, e a que, contrahindo o emprestimo nas condições da proposta, se não priva dos meios de satisfazer as suas despezas ordinarias, e a que tal emprestimo se não pôde dizer oneroso para os habitantes d'aquelle concelho:

E a vossa commissão de administração publica de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho de Arouca a levantar um emprestimo da quantia de 1:000$000 réis, em metal, com o juro não excedente a 6 por cento ao anno.

§ unico. A camara abrirá concurso para a realisação do emprestimo, que será contratado com quem se offerecer a faze-lo por menor juro.

Art. 2.° O producto do emprestimo será exclusivamente applicado ao pagamento do custo da expropriação auctorisada por decreto de 12 de novembro de 1863, da casa da hospedaria de cima, pertencente ás freiras daquella villa, a fim de servir de paços do concelho, e para accommodação das outras repartições publicas.

Art. 3.° Para pagamento do juro e amortisação do emprestimo é applicado o producto do imposto de 2 réis sobre cada quartilho de vinho que se consumir no concelho, durando esse imposto até o completo pagamento do emprestimo e juro.

§ unico. A receita proveniente do dito imposto, e a sua applicação, formarão capitulos especiaes no orçamento ordinario da camara municipal.

Art. 4.° Os vereadores ou quaesquer outros funccionarios que auxiliarem ou approvarem o desvio da quantia mutuada, ou da importancia do imposto que serve de garantia, para qualquer outra applicação diversa da que lhe é destinada por esta lei, incorrerão nas penas estabelecidas no artigo 54.° da lei de 26 de agosto de 1848.

Art. 5.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 27 de abril de 1864. = Barão do Vallado, presidente = Henrique F. de Paula Medeiros = Ricardo A. P. Guimarães = Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães = J. M. Rojão = A. J. Braamcamp = J. R. da Cunha Aragão Mascarenhas = F. Coelho do Amaral.

Foi logo approvado na generalidade.

O sr. Vicente Carlos: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se dispensa o regimento, a fim de se passar já á discussão da especialidade.

Assim se resolveu; e seguidamente foram approvados sem discussão todos os artigos do projecto.

O sr. Ministro das Obras Publicas (João Chrysostomo): — Requeiro a v. ex.ª que ponha em discussão o projecto dos caminhes vicinaes que ficou pendente de hontem, e que a camara de certo reconhece como objecto de summa importancia publica (apoiados).

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal): — Requeiro a v. ex.ª que, depois de discutido o projecto, que acaba de ser solicitado pelo meu collega das obras publicas, se digne pôr em discussão o projecto n.° 73, dado já para ordem do dia, relativamente aos soccorros para Cabo Verde. Parece-me que é objecto de que se deve tratar com grande urgencia (apoiados), supponho mesmo que não occupará muito tempo á camara.

Ha, depois d'esse, o parecer, que foi distribuido segunda feira, e que já está dado tambem para ordem do dia. E o n.° 72 que se refere ao banco nacional ultramarino. Peço tambem que entre em discussão.

Tenho procurado dar todo o tempo necessario á maior ellucidação do assumpto. Fui informado de que na praça commercial de Lisboa se procuravam assignaturas para uma representação relativamente a este projecto. Tenho esperado por ella ou seja na secretaria ou na camara. Nada quiz precipitar. Desejei, e desejo ouvir tudo. Entretanto assumpto de tal ordem não pôde estar eternamente á espera de representações de qualquer genero que se queiram fazer. E indispensavel pois que tome a camara conhecimento d'elle e que adopte uma resolução, porque as provincias do ul-

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tramar não hão de indefinidamente adiar um dos seus principaes remedios.

Aproveito a occasião para tambem solicitar a apresentação á discussão, o mais breve possivel, do projecto n.° 59, relativamente ao credito extraordinario para completar as construcções navaes que estão em andamento, e o projecto relativo á reforma da escola naval.

A camara conhece a importancia d'estes projectos. Não acrescentarei mais instancias;

O sr. Presidente: — Vae ler-se o projecto n.° 73, em que o governo pede soccorros para Cabo Verde; e depois continuará a discussão do projecto sobre caminhos de ferro vicinaes.

Leu-se, e é o seguinte:

projecto de lei N.° 73

Senhores. — A commissão de fazenda examinou a proposta de lei n.° 66-C, na qual é o governo auctorisado a applicar até á quantia de 70:000$000 réis para acudir com soccorros aos habitantes de Cabo Verde, constituindo metade d'essa quantia um adiantamento que ha de ser encontrado nos rendimentos das alfandegas d'aquelle archipelago, e a outra metade um donativo feito pelo thesouro aquella provincia, em vista da crise alimenticia que está soffrendo.

A vossa commissão, considerando que apesar dos soccorros prestados pelo governo e pela caridade publica, se torna indispensavel enviar com urgencia para aquella possessão outros recursos, com os quaes se possa debellar a temerosa crise por que está passando aquella possessão, é de parecer, depois de ter ouvido a illustre commissão do ultramar, que seja approvado o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E o governo auctorisado a applicar até a quantia de 70:000$000 réis para acudir com soccorros aos habitantes de Cabo Verde.

Art. 2.° A metade d'esta quantia será paga pelo ulterior rendimento das alfandegas de Cabo Verde, a outra metade subministrada pelo thesouro publico a titulo de donativo aquella provincia.

Art. 3.° O governo dará conta ás côrtes do uso que fizer da auctorisação concedida por esta lei.

Sala da commissão, em 23 de abril de 1864. = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Claudio José Nunes = Guilhermino Augusto de Barros = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida = Anselmo José Braamcamp = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = João Antonio Gomes de Castro.

Senhores. — A commissão do ultramar tendo examinado a proposta de lei apresentada pelo governo para ser applicada a quantia de 70:000$000 réis, a fim de acudir com soccorros aos habitantes de Cabo Verde; e attendendo aos horrores da fome e das doenças com que estão lutando aquelles nossos irmãos, e á continuação da crise que de dia para dia ameaça maiores proporções e que para a combater não são sufficientes os soccorros colligidos pela caridade publica: é de parecer que a referida proposta de lei deve ser convertida em projecto de lei nos mesmos termos em que está redigida, para que sem demora o governo fique habilitado com os meios sufficientes para correr em auxilio de tantos infelizes.

Sala da commissão, em 22 de abril de 1864. = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Levy Maria Jordão = Francisco Luiz Gomes = Bernardo Francisco de Abranches = Ricardo Augusto Pereira Guimarães = Antonio José de Seixas = Henrique de Castro = Joaquim José Rodrigues da Camara = Joaquim Pinto de Magalhães,

O sr. Sá Nogueira: — Eu approvo o projecto, mas será bom que elle não passe sem fazer algumas observações que serão muito poucas.

Parece-me que uma parte dos males por que Cabo Verde tem passado, pelo menos o aggravamento d'elles, se poderia ter evitado se as auctoridades, talvez me engane, tomassem a tempo as medidas que deviam tomar, se offerecessem trabalho á gente que precisava d'elle para obter uma subsistencia. Se o offerecessem a tempo e nas proprias localidades, talvez se evitasse que muitos habitantes da ilha de S. Thiago corressem á capital, cidade da Praia, e fizessem os tumultos que, segundo o que tenho ouvido e o que tenho lido, ali tiveram logar.

Era necessario que as auctoridades tomassem medidas a tempo, e fornecessem meios de trabalhar, porque é muito mau precedente estarmos a dar alimentos de graça a quem tem força para o trabalho, o que não serve senão de alimentar o pauperismo n'aquellas povoações, e torna-las imprevidentes. D'este modo não terão nunca receio de que appareça uma calamidade d'estas, porque dirão que lá está o governo, lá está a mãe patria que lhes hão de acudir.

Quando venha uma calamidade extraordinaria, que seja necessario acudir-lhe de repente, voto por isso, voto para que se lhe dêem todos os soccorros precisos, mas que se lhe dêem a tampo, e quando podessem trabalhar era melhor que se aproveitasse o seu trabalho e que recebessem os seus salarios como paga d'elle, mas me como esmola.

O sr. Ministro da Marinha: — Isso já está determinado.

O Orador: — Diz-me o sr. ministro da marinha que isso está determinado, e creio que já o vi, mas eu fallo dos factos. Parece-me que os factos nao têem correspondido ao que está determinado.

Era sobre isto que eu tinha a fazer estas observações, e não direi mais nada.

O sr. Ministro da Marinha: — Depois das ultimas palavras do illustre deputado, limito-me a pouco.

Reconheceu s. ex.ª agora mesmo que já pelo governo, a este respeito, foi providenciado minuciosamente n'uma portaria publicada no Diario de Lisboa, a qual especificava os diversos modos de prestar setes soccorros, declarando quaes deviam ser dados aos invalidos, ás creanças, e ás mulheres impossibilitadas de poderem concorrer ao trabalho, quaes aos lavradores, e quaes aos operarios e aos braços occupados nas differentes obras publicas. De duas especies com effeito devem ser os auxilios—soccorros de domicilio aos cultivadores das terras, para que estes não abandonem o amanho d'ellas, porque daria isso em resultado para a futura estação uma nova e mais terrivel crise, — soccorros para aquelles que podessem ser applicados aos trabalhos de estradas, edificios, e obras de irrigação, que immediatamente se mandaram ampliar e activar.

Devo acrescentar que no Boletim da provincia foi publicada tambem uma portaria do governador, na qual, justamente para evitar o pauperismo n'aquella provincia, se incitava a actividade, e com boas rasões se admoestavam e cohibiam os abusos provenientes da indolencia natural a esses povos, e da sua repugnancia a maiores trabalhos. D'esse documento se vê que havia quem quizesse receber os soccorros sem os pagar com o seu trabalho, podendo faze-lo. O tumulto occorrido teve era grande parte essa causa. De taes tendencias da população não pôde o governo ser responsavel nem as auctoridades locaes. E um mal longamente inveterado, cujo remedio é tambem longo e difficil.

Não se trata porém aqui de corrigir taes tendencias nem é esta a opportunidade de elaborar a educação de um povo, cuja grande maioria se acha ainda n'um estado vizinho do primitivo. Trata-se de acudir-lhe, quando está estendendo a mão tremula de fome e exhausta de miserias (apoiados).

As reformas necessarias tem achado, hão de achar resistencias era muitas causas locaes, em muitos interesses, em muitos abusos. Isso pertence á administração e ao futuro. Ao presente toca a diligencia e a caridade (apoiados).

O sr. Carlos Bento: — Pedi a palavra unicamente para manifestar o meu voto, e parece-me que por esta occasião não devemos tratar nem de censurar, nem de louvar o governador ou as auctoridades.

Agora não se trata, e peço perdão ao illustre deputado que me precedeu, de fazer observações sobre politica retrospectiva. Ha fome ou não ha fome n'aquellas ilhas? Que me importa que o governador tenha cumprido ou não as suas obrigações? Tem-se morrido á fome ou não nas ilhas de Cabo Verde? Pergunto a v. ex.ª, e v. ex.ª creio que está de accordo n'este ponto, porque o facto é infelizmente exacto.

Não desconheço o judicioso das observações apresentadas pelo illustre deputado, o sr. Sá Nogueira. Podem as auctoridades ter commettido todas as faltas, todos os erros, mas o que é fóra de duvida é que ha fome n'aquellas ilhas, e que esta não foi o resultado da imprevidencia e dos actos dos individuos.

Qual era a previdencia humana que podia fazer com que houvesse chuva ou deixasse de a haver na estação propria? Quem poderia evitar uma calamidade?

Sei muito bem que a humanidade tem feito progressos; sei que se fossemos estabelecer um fóco de pauperismo n'aquellas ilhas teriamos feito muito mal, mas é preciso não desconhecer que esta crise não foi creada por imprevidencia ou defeitos dos individuos; esta desgraça foi uma calamidade publica, é o resultado de uma sécca, e já era outras occasiões ali a tem havido.

Todos sabem que aquelle archipelago tem sido victima muitas vezes do flagello da fome; todos sabem que até os proprios estrangeiros o tem soccorrido por mais de uma vez, e não ha de ser agora a camara dos deputados da nação portugueza que ha de mostrar se hesitante em manifestar sentimentos de humanidade, que outros têem tido por iguaes motivos.

Todos sabem que os Estados Unidos e a Inglaterra são pouco partidistas dos soccorros, que podem estabelecer o pauperismo pelo modo por que o entendeu o illustre deputado, mas note se que em Inglaterra ha a lei dos pobres, comquanto lá se não queira proteger a ociosidade.

Voto por este projecto que auctorisa o governo a despender até 70:000$000 réis, e voto o porque é necessario distinguir entre elle e as despezas superfluas que se propõem; voto o, porque quando se trata de fome não é permittido haver hesitações (apoiados).

Deste voto, dado n'esta occasião, hei de tirar motivo para reagir contra outras despezas, quando entender que não estão no mesmo caso (apoiados).

O sr. Mártens Ferrão: - Sr. presidente, fui prevenido pelo illustre deputado e meu amigo, o sr. Carlos Bento, nas reflexões que s. ex.ª acaba de apresentar á camara.

Voto este projecto como um dever de homem publico, voto o por um principio de sentimento, que n'este ponto me levaria a prestar o meu assentimento a qualquer proposta apresentada pelo governo, que tendesse a alliviar a triste sorte dos nossos irmãos d'alem-mar.

Entendo e entendi sempre que é dever da mãe patria velar pelas colonias, auxilia-la, e ter por ellas a solicitude de mãe. É isto um dever social, é um dever de coração; os estados não podem nem devem ser indifferentes ao sentimento. O estado é o homem! Tem os mesmos sentimentos.

A caridade particular pôde dar grandes resultados, e já os tem dado, ainda n'esta occasião em relação a Cabo Verde, mas a caridade particular não basta só, principalmente n'um paiz onde o seu desenvolvimento não tem chegado ao ponto em que se encontra em outros paizes. N'um paiz onde as fortunas particulares não são muito consideraveis, a caridade particular só por si não pôde ser sufficiente para fazer face a uma crise, como aquella que existe actualmente em Cabo Verde. É mister por isso que o estado venha sem demora em soccorro dos que soffrem.

Na Inglaterra, por exemplo, onde ha fortunas collossaes, a caridade particular em occasiões de crise, como ainda ha pouco, pôde ir muito mais longe do que em outros paizes. Mas entre nós onde não existem essas fortunas collossaes,

os grandes esforços que se fazem são importantes, é certo, mas raras vezes são sufficientes. O dever do governo por consequencia é não deixar que aquelle estado continue, é mostrar-se solicito em acudir aos soffrimentos do povo, e ao mesmo tempo evitar que o pauperismo se desenvolva e se habitue. E esta é uma grande questão!

Voto pois o projecto e desejaria te-lo votado ha mais tempo. Não desejo mesmo com as minhas palavras retardar a sua approvação. Apenas perguntarei ao nobre ministro se s. ex.ª entende que esta verba é a sufficiente para acabar com a crise alimenticia que tem logar nas ilhas de Cabo Verde.

Não recuso o meu voto á somma pedida, nem o recusarei a uma somma maior. Se o nobre ministro entende que esta verba não é sufficiente, fique s. ex.ª habilitado com os meios necessarios para que não peze sobre o paiz que, por falta de meios e de soccorros, possa perecer algum irmão nosso d'aquellas paragens! (Apoiados.) E uma cousa que fere os nossos sentimentos e o nosso orgulho nacional (apoiados).

Tambem pedirei ao nobre ministro da marinha que trate s. ex.ª de procurar prevenir de futuro que, quando se tornem a dar crises similhantes, não encontrem completamente desprevenida a provincia, como o estava actualmente. São frequentes estes acontecimentos no archipelago de Cabo Verde em consequencia da falta de chuvas, é por consequencia um dever do governo precaver para que, dada uma circumstancia como a actual, a provincia esteja em condições de poder evitar que um flagello similhante tome as proporções que infelizmente este tem tomado.

Pense o sr. ministro nos meios convenientes, para que de futuro não se possam repetir factos tão infelizes e que contrariam essencialmente o desenvolvimento das nossas colonias. Desde que se vir que n'ellas são frequentes estes acontecimentos, ha de esterilisar se e affrouxar o justo enthusiasmo que se manifesta pelo seu desenvolvimento (apoiados). Termino aqui.

O sr. Ministro da Marinha: — Quando o governo propoz esta somma, não o fez sem examinar o que em epochas anteriores se havia concedido aquella provincia para acudir a calamidades analogas. Por exemplo, na ultima calamidade d'este genero, que assollou a provincia foram despendidos por parte do governo 75:000$000 réis proximamente, e pediram ao ás côrtes 60:000$000 réis, se bem me lembro.

Na occasião presente o governo abriu já um credito de 12:000$000 réis. Juntando esta somma á que é proposta, sobem os subsidios officiaes a 82:000$000 réis, somma superior aquella que nas citadas circumstancias foi applicada pelos meus antecessores. Se addicionarmos os donativos do paiz, das outras provincias do ultramar e dos nossos irmãos residentes no Brazil, não anda longe do 140:000$000 réis a totalidade dos auxilios, o que já constituo um valor importante, cumprindo ponderar ainda que a subscripção da caridade publica tem excedido muito, ao que me consta, quantas para igual fim anteriormente se emprehenderam, pelo que muitos louvores se devem ás auctoridades, ás commissões e aos benemeritos cidadãos que em tão piedosa obra activa e zelosamente collaboraram.

O governo tem pois as possiveis probabilidades de que a somma pedida será sufficiente. Quando porém me enganasse, quando mesmo quaesquer circumstancias supervenientes e imprevistas fizessem reconhecer a necessidade de maior despendio, declaro francamente que recorreria a um credito supplementar, vindo depois pedir á camara a sua approvação, e dar lhe as devidas contas (apoiados). O fim do governo, da camara, de todo o paiz é o mesmo. E indispensavel dar vida aquella população desesperada e faminta. Esta a medida dos soccorros (apoiados).

Emquanto ás causas que produzem estas calamidades, a bem dizer periodicas, e aos meios de as precaver, a questão é outra.

A causa principal d'esse terrivel phenomeno, segundo a opinião de pessoas entendidas, está na falta de arborisação; a rasão da falta de arborização está na repugnancia d'aquelles povos ao arvoredo. É preconceito da terra que a sombra das arvores impede o desenvolvimento das searas.

Em muitos terrenos, onde se daria bem a mandioca, facil cultura e excellente alimento em taes paizes, cultivam exclusivamente a canna, para d'ella unicamente extrahirem a aguardente que os enerva e embrutece. Nenhuma previdencia, nenhuma precaução, nem se quer a que o natural instincto indica. A todas as tentativas de arborisação, já ensaiadas em diversas epochas e por differentes modos e meios, corresponde o povo com obstinada resistencia, e a devastação dos arbustos, já pelos gados, já pelos homens. Similhantes prevenções não se desarreigam sem longa e porfiada luta. É tambem uma educação lenta e difficil. É preciso toda a acção e energia de auctoridades intelligentes e zelosas (apoiados). São necessarios pertinazes e esclarecidos cuidados da administração local. E uma obra de paciencia e tempo, de perseverança e coragem (apoiados). Isto não o exige o illustre deputado como condição previa... não exige de certo. Bem o sei, faço inteira justiça á sua alta illustração e amor patrio.

Para começar um systema de previsão o primeiro meio deve ser a creação de celeiros communs (apoiados). Esta creação pôde ser poderosamente auxiliada pelo estabelecimento do banco ultramarino. Assim como todas as incurias logica e fatalmente derivam umas das outras, assim todos os melhoramentos se encadeiam e dão as mãos (apoiados).

Mas a actua! falta d'estas instituições, que só o tempo, o estudo, e resoluta iniciativa preparam e realisam, não estorva que se vote este urgente soccorro (apoiados). Todas as ponderações administrativas que fizermos são boas para o futuro, mas o indispensavel agora é o auxilio para o presente, e é isso o que se propõe (apoiados).

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Creio ter-me sufficientemente explicado ácerca dos diversos pontos a que se referiu o illustre deputado. Reconheço com satisfação que unicamente o seu zêlo pela causa publica o leva a fazer estas observações, que não são, que não serão perdidas (apoiados),- como não é perdido nada do que se diga a respeito do ultramar, que se conhece muito pouco, e por ser tão pouco conhecido dá occasião a apparecerem tão oficiosos emprezarios da sua salvação, que querem tudo menos o conveniente, que discreteam sobre tudo e ignoram os factos que se estão passando, chegando muitas vezes a pedir ou recommendar o que já está feito! (Apoiados.)

O sr. Arrobas: — Sr. presidente, é minha infelicidade ter sempre de limitar a menos do possivel o que tenho a dizer quando tenho occasião de fallar sobre as cousas de Cabo Verde. Agora quer a camara votar este merecido auxilio, e por isso, e porque tem a tratar do orçamento que ficou adiado, não pôde ser distrahida com esta discussão, visto que todos estão de accordo em votar a verba pedida por acclamação (apoiados).

Era minha intenção não tomar a palavra, porque nunca o faço senão quando o julgo indispensavel, mas fui obrigado a isso pelo que ouvi aos illustres oradores que me precederam, e principalmente ao sr. deputado Sá Nogueira.

S. ex.ª disse que entende não se dever dar soccorro senão a troco de trabalho por occasião da fome que está affligindo os habitantes de Cabo Verde, e eu que conheço a provincia, porque a governei por occasião da ultima fome, vou informar a camara de que nem sempre se pôde seguir o que o sr. deputado indica. Será possivel ter obras publicas para empregar dezenas de milhares de pessoas em obras publicas, aonde estão os projectos feitos, aonde ha o grande pessoal director que seria necessario. Devem empregar-se os válidos em obras publicas até os limites do possivel; assim no meu tempo houve trabalhos de estradas, construiram-se novos armazens para a alfandega da capital, fizeram se seis armazens espaçosos no ilhéu de Santa Maria, abriram-se valias de esgotamento na varzea da companhia, -fez-se a estrada da fonte Anna para a fonte do Pacheco, fez-se um grande edificio destinado para trem e officinas de operarios, edificio que hoje e o quartel do batalhão de 1.ª linha, melhoraram-se os caminhos,;fizeram-se varios aterros na cidade da Praia, fez-se grande parte do hospital da misericordia, sendo isto na capital, seguiu-se o mesmo systema para as outras ilhas conforme a possibilidade de direcção, estado sanitario das povoações, existencia de materiaes, etc.; mas procurei mais o que em cada ilha se podia produzir para animar a producção pagando o trabalho com generos alimenticios; assim, na ilha do Fogo, que é muito abundante de combustivel, pagava pelo preço ordinario cada feixe de lenha que se apresentava, pagava na mesma rasão a semente de purgueira, e quando havia grandes porções compradas vendiam-se em praça, e o producto servia para compra de novos mantimentos para soccorros.

Na ilha da Boa Vista, aonde ha abundancia de pedra calcaria, barro e combustivel, pagava toda a cal, telha e tijolo que ali se fabricava, e d'este modo conservava o preço ordinario aquelles productos, e procurava quanto possivel dar soccorros a troco de trabalho; mas isto não podia abranger tão numerosa povoação, e alem d'isso os cultivadores de terras, embora válidos, embora rendeiros ou proprietarios, de terras, estavam privados de recursos, precisavam semente para as terras e de as cultivar, para não haver fome no anno seguinte por falta de amanho das terras; era pois preciso emprestar semente e mantimentos aos válidos, neste caso, sem os obrigar ao trabalho fóra de suas fazendas (apoiados).

Ainda me não arrependo de deixar em Cabo Verde, quando saí, uma divida activa de muitos contos de réis por estes emprestimos que julguei e julgo muito uteis e merecidos (apoiados); quem não podia pagar na occasião da fome e tinha propriedades podia pagar mais tarde, e era um erro exigir-lhe que viesse trabalhar em obras publicas abandonando terras e familia (apoiados).

Concordo, sr. presidente, em que se devem tomar providencias permanentes para minorar, senão evitar, aquellas crises em Cabo Verde, e as principaes medidas é proteger as industrias que não dependem tanto da regularidade das chuvas e arborisar a provincia: aqui propuz e passaram varias leis para proteger as industrias do sal e do café.; tambem fiz propostas para se estabelecer a arborisação como serviço publico, e para isso propus uma escola de agricultura pratica, uma quinta modelo e uma companhia de plantadores e guardas ruraes; mas isso foi olhado como desejo de crear um ninho em Cabo Verde, como se diz haver em Lisboa, e eu então deixei ficar o projecto para não o arriscar. Mas no orçamento do anno passado lá se incluiu, por minha proposta, uma verba para arborisação da provincia (apoiados).

Emfim não quero tomar mais tempo á camara, e adiarei para outra occasião o mais que tenho a dizer sobre este assumpto: por agora só direi que sinto ter apprehensões de que não será sufficiente, para conjurar a crise a verba proposta pelo governo, sendo, de mais a mais necessario subvencionar tambem o cofre das despezas ordinarias para não atrazar os pagamentos aos empregados, que tendo já bem tenues vencimentos, ficariam reduzidos a quasi indigentes se não lhes pagassem em dia agora que tudo é tão caro (apoiados); mm como o sr. ministro deu ao governador geral instrucções para poder saccar, como aquelle cavalheiro merece toda a confiança e o governo declara que depois levantará, se for necessario, as sommas que forem precisas, se o forem eu nada mais tenho a dizer, e voto o parecer.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Requeiro a v. ex.ª que tenha a bondade de consultar a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida, e em seguida foi approvado o projecto na generalidade e na especialidade.

O sr. Sá Nogueira: — Quando ha pouco fallei comecei por dizer que não votava contra o projecto; por consequencia as reflexões que se fizeram, parecendo que eu me oppunha á proposta do governo, não têem cabimento.

Como não quero levar tempo á camara não responderei ás reflexões do sr. Carlos Bento; dir-lhe-hei só que se devemos ir buscar alguns exemplos a Inglaterra não é por certo ao modo por que n'aquella nação se dão soccorros aos pobres (apoiados).

O sr. Ministro da Marinha (para uma explicação): — Tinha-me esquecido uma informação de facto, essencial para completar as explicações que ainda agora tive a honra de dar ao illustre deputado, o sr. Mártens Ferrão.

Acrescentarei pois que pelo ultimo paquete tive informações das auctoridades de Cabo Verde, nas quaes se pedem 40:000$000 réis por mez para acudir á crise! A enormidade e desproporção de tal somma com todos os precedentes anteriores dispensa acrescentar copiosas reflexões. No calculo da população, enviado n'essas informações, calculo evidentemente arbitrario, a proporção dos invalidos para os válidos é de tres partes para uma. As rações são computadas em 60 réis diarios por cada uma, sendo o alimento usual d'aquelles povos o milho e o arroz. Já vê s. ex.ª que não podia julgar seguras similhantes bases, e devia necessariamente preferir as que resultavam dos antecedentes exemplos e factos era situação analoga. Menciono esta circumstancia por que entendo que em taes assumptos nada se deve omittir. Escuso addicionar que se ordenou que do todos os soccorros, sem emprego e distribuição se formulassem as competentes contas, por que, se a nação promptamente auxilia, nem por isso prescinde do direito de averiguar e saber o uso que se faz dos seus auxilies (apoiados).

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma no projecto que ha pouco se approvou, auctorisando a camara municipal -de Arouca a contrahir um emprestimo de 1:000$000 réis, para a compra de uma casa.

Mandou-se expedir para a outra camara;

Approvou-se á ultima redacção do projecto n.º 58.

O sr. Mello Breyner: — Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra sobre a proposta do governo, ácerca do contingente de recrutas.

Mando tambem para a mesa o parecer da commissão sobre as emendas feitas na camara dos dignos pares aos projectos n.os 43 e 46.

Mandaram-se imprimir.

O sr. Presidente: — Continua a discussão sobre o projecto n.° 123.

Art. 4.° — approvado sem discussão.

Art. 5:°—idem.

Art. 6.°

O sr. Bivar: — Entendo que a faculdade concedida ao governo pelo artigo 6.º é excessiva, se attendermos ao que dispõe a lei de 1862 sobre as estradas em geral.

Vejo que por essa lei para se alterar qualquer cousa a respeito de estradas, com relação ao seu traçado, é indispensavel um decreto, e com relação á sua classificação é preciso uma lei; e aqui dá-se a faculdade ao governo de unicamente, ouvindo as camaras, sem dependencia de mais formalidade alguma, podar a seu bel-prazer mudar uma estrada considerada de primeira ordem para estrada municipal; quer dizer, sobrecarregar o municipio unica e simplesmente por sua livre vontade.

Não me parece que este principio esteja em harmonia com a nossa legislação; pôde se dizer talvez que o intuito deste artigo é que quando uma estrada, em consequencia do caminho de ferro, se julgue desnecessaria para o transito (O sr. Aragão: — Menos importante.) fica o governo auctorisado a apea-la da classificação que tinha, e considera la como estrada municipal; e desde o momento que se considera util para o municipio, justo é que fique tambem a cargo do municipio. Entretanto parece-me que as palavras do artigo 6.º se, prestam a uma interpretação, que trazes inconvenientes que primeiro ponderei, sem vantagens algumas. Se porventura o intuito da commissão é aquelle que eu apresentei, é conveniente que se dê ao artigo uma redacção mais clara, affim de que na lei se não veja o principio que auctorisa o governo, quando muito bem quizer, a subtrahir das despezas geraes certas e determinadas estradas, o que será um meio de aggravar a já triste situação da receita das municipalidades.

Pedia pois á commissão que declarasse se este não é o seu intuito, se o seu intuito é unicamente quando se der a circumstancia de alguma estrada em construcção, pela construcção dos caminhos de ferro, ou pela construcção de estradas mais importantes, deixar de ter um uso geral, e ficar unica e simplesmente para uso municipal, se é só n'este caso que o governo fica auctorisado a mudar-lhe a classificação. Se assim é, eu pedia á illustre commissão que manifestasse a sua opinião, e desse uma outra redacção a este artigo, de maneira que elle ficasse claro, e sem apresentar inconvenientes a sua intelligencia.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Pedi a palavra para declarar, por parte da commissão, que a intelligencia que o meu amigo, o sr. Bivar, attribue ao artigo é exactamente a que a commissão lhe deu. A commissão não teve outras vistas senão as do illustre deputado. Quando uma estrada geral por qualquer motivo deixa de ter importancia geral, e o estado não pôde custear a sua despeza e continuação, se esta estrada continua a conservar uma grande importancia municipal, o estado deixa de a ter na consideração de geral, e passa-a para municipal. Mas o que o meu amigo, o sr. Bivar, entende que pôde colligir-se d'aqui é que antes de construidas as estradas, uma d'ellas, que está classificada como geral por lei, o governo a passe a municipal, e imponha ás municipalidades a obrigação de a construirem. Parece-me que esta intelligencia não foi a que a commissão teve era vista, nem o governo a podia ter. Por isso, se o illustre deputado convem, eu não tenho duvida em propor, por parte da commissão, que se diga em logar das palavras já existentes, as palavras já construidas.

O sr. Bivar: — Cedo da palavra, estou satisfeito com a explicação que acaba de dar o illustre deputado.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Por parte da commissão mando para a mesa a minha proposta.

Leu-se na mesa, e foi com ella approvado o artigo 6.º

Art. 7.º — approvado.

O sr. Vicente Peixoto: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda sobre a proposta do governo para o embandeiramento de navios estrangeiros como nacionaes.

Art. 8.°, 9.°, 10.° e paragraphos — successivamente approvados.

Art. 11.°

O sr. Bivar: — Eu não perco do vista de modo nenhum as disposições d'este projecto, e vejo que uma das grandes difficuldades que eu n'elle tinha observado, e que expuz quando se tratou da discussão da generalidade, em parte foi remediada;. não se concedeu tanto como eu desejava, mas já se concedeu alguma cousa, e portanto eu, longe de querer impedir o andamento d'este negocio, quero que elle caminhe e se conclua. Mas não posso deixar de fazer reflexões, quando pela leitura de alguns dos artigos entendo que as devo apresentar.

Tenho pena de não ter pedido fallar sobre o artigo 10.°, porque queria pedir algumas explicações ao sr. ministro das obras publicas sobre esta expressão por pessoas habilitadas.

Todo o mundo sabe que nos municipios do nosso paiz infelizmente ha pouca gente habilitada, e seria bom que se dissesse quaes eram as habilitações necessarias, para que se saiba se os municipios poderão empregar nestes estudos individuos que os possam fazer sem comtudo serem homens approvados nas escolas da sciencia, e para que depois, quando esses estudos vão ás repartições superiores, se não possa dizer: Não se approvam, porque os individuos que foram chamados para os fazer não têem as habilitações necessarias, as habilitações technicas para procederem a esses trabalhos. E se assim for, o que acontece é que muitos d'esses municipios, não tendo pessoal technico de que possam dispor para os estudos, não tendo pessoal com as habilitações scientificas, esta lei em grande parte nao ha de poder ter andamento quando se tratar da sua execução, por isso que falta o principal, que vera a ser o pessoal technico. Por consequencia desejava que o sr. ministro me podesse dar algumas explicações, para se saber quaes eram as habilitações que devem ter os individuos que as camaras possam chamar para formarem os traçados e os projectos das estradas.

Engenheiros civis já se sabe que ha poucos entre nós, os engenheiros militares estão empregados nas obras publicas, não sei pois quaes hão de ser as pessoas que as camaras hão de chamar, salvo á custa de muito dinheiro, para fazerem os estudos. Bom seria pois que o sr. ministro nos podesse dar algumas explicações a este respeito, apesar de já estar votado o artigo 10.° Isto da minha parte não é impugnação ao mesmo artigo, mas é para se saber o que neste caso se poderá fazer por parte dos municipios, quando se tratar deste objecto.

Agora o meu fim principal, pedindo a palavra sobre este artigo 11.°, é porque vejo que n'elle se declara que as reeducações de traçados e a abertura ou construcção das estradas ficam unica e exclusivamente dependentes de alvarás dos governos civis.

Nós já estabelecemos a prescripção de que os negocios sobre viação municipal ficavam a cargo de uma commissão districtal em que entrava o governador civil. Fizemos distincção entre estradas municipaes de primeira ordem e de segunda ordem; as estradas municipaes de primeira ordem dissemos que ficariam a cargo dessas commissões districtaes de viação, ainda que as camaras tivessem de pagar as despezas que com ellas se fizessem, e as estradas municipaes de segunda ordem, essas deixámo-las completamente a cargo das camaras municipaes. Ora, o que eu achava mais regular era que, depois de a commissão districtal com todos os tramites que o negocio ha de seguir, ter dado a sua approvação a respeito da construcção de uma estrada, se pozesse de parte o tal alvará; entendo que, depois d'isto, era escusado difficultar mais o negocio e deixar de exigir o alvará do governador civil para que a abertura da estrada se fizesse. Mas se não quizerem, se entenderem que esta formalidade é essencial, então pedia que ella se empregasse unica e simplesmente no caso em que a commissão districtal tem de entender na construcção das estradas municipaes, e que se não tornasse esta formalidade necessaria para as outras estradas que a nossa commissão entendeu que poderiam ficar unica e simplesmente a cargo dos municipios; isto para sermos mesmo coherentes, já que fizemos essa distincção entre umas e outras estradas municipaes.

Pedia portanto que no artigo 11.° se introduzisse apenas uma emenda de redacção n'este intuito, se isto é aceitavel.

Não quero ajuntar mais reflexões: offereço estas que fiz á commissão: se ella entender que deve aceita-las, ellas irão consignadas na lei; se não as aceitar, nem por isso terei feito menos o meu dever.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — As explicações que o illustre deputado desejou ter em relação ao artigo 10.°, ácerca de quaes são os empregados technicos que se devem julgar habilitados para poderem estar á testa d'estas

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instrucções, não tenho duvida alguma em as dar, e julgo satisfarão o illustre deputado.

Eu entendo que legalmente technicos para estes trabalhos são os engenheiros e os conductores de obras publicas, mas que essa qualidade não se deve restringir a estes, e que podemos considerar taes aquelles homens que tenham dado prova de poderem estar á testa de trabalhos d'esta ordem. Isso faz-se em toda a parte, na Inglaterra, França, etc. São engenheiros de facto que, pela pratica que têem, podem ser considerados habilitados para dirigirem estas obras.

Ora entre nós pôde haver algum individuo que não tenha as habilitações escolares, mas tendo dado provas praticas, tendo estado á testa de certos trabalhos, devem ser considerados como habilitados para dirigirem taes obras. E se esta não é a habilitação escolar, é comtudo a idoneidade que tem o individuo para construir essas obras, idoneidade que se exige como garantia da boa construcção. Mas não é mais que isto.

Agora quanto ao artigo 11.° considero este alvará como o diploma de homologação das decisões da commissão, e parece-me que deve ser concedido pelo governador civil, porque este é o presidente d'aquella especie de conselho que ha nos districtos administrativos para esta ordem de trabalhos; portanto elle é o poder executivo d'estes concelhos, e convem que das decisões d'elles haja um diploma que pôde ser um accordão, uma resolução; emfim, um diploma expedido debaixo de qualquer nome, mas parece-me que se deve conservar á auctoridade administrativa o caracter que effectivamente tem de ser o poder executivo das resoluções que tomarem estes corpos collectivos. E é esta a excepção que me parece ser conveniente adoptar n'este artigo.

O sr. Sieuve de Menezes: — O artigo 11.° diz o seguinte (leu).

Não impugno a doutrina d'este artigo; desejo unica e simplesmente que a abertura ou reconstrucção das estradas não fique completamente dependente de conceder ou não conceder o governador civil o alvará de que falla este artigo, e por isso vou mandar para a mesa um additamento, que espero a commissão não terá duvida em aceitar.

É o seguinte:

ADDITAMENTO

Lavrado em sessão da commissão de viação municipal. = Sieuve de Menezes.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Declaro, por parte da commissão, que não tenho duvida alguma em aceitar o additamento do illustre deputado.

O sr. Bivar: — Direi poucas palavras. As explicações que pedi ao illustre ministro provieram do seguinte facto. Eu sei que uma camara municipal da provincia a que pertenço quiz fazer uma obra, e teve difficuldade em encontrar um homem technico para levantar a planta d'essa obra. Tratava-se da construcção de um edificio para as sessões da municipalidade; e houve está difficuldade, porque os engenheiros do districto a que pertence essa camara municipal não podiam desviar-se das obras publicas de que estavam encarregados.

N'estas circumstancias a camara municipal chamou um homem que tinha acabado de dirigir uma obra importante que se fez n'um sitio do Algarve, pertencente a um cavalheiro d'esta capital, homem que já tinha sido mestre de obras em diversos trabalhos publicos, e que fez a planta do edificio e seu orçamento. Teve este negocio de vir ás instâncias superiores respectivas para ser approvado, e aconteceu que ellas entenderam que se não podiam approvar aquelles estudos, visto que não eram feitos por individuo ou engenheiro competente.

A camara municipal viu-se em embaraços; demorou-se muito tempo este negocio, porque grande foi tambem a demora para alcançar um engenheiro que fizesse a planta do edificio e orçamento, visto que sem isso não podia ser resolvido nas instancias superiores.

Esta circumstancia portanto, que de repente me occorreu, é que fez com que eu chamasse a attenção do illustre ministro das obras publicas sobre o assumpto, para que depois as camaras municipaes não dissessem que — não podiam contar com engenheiros de obras publicas, porque são poucos os que nós temos; e que ellas, não podendo chamar senão individuos habilitados, porque as instancias superiores não recebiam os estudos senão feitos por elles, não podiam mandar vir outros, pois não tinham dinheiro. Seguindo-se d'ahi que essas plantas, que são indispensaveis para as estradas, não se podiam fazer.

Foi pois esta circumstancia que motivou as reflexões que dirigi ao illustre ministro das obras publicas.

E posto logo á votação o

Art. 11.°, com o additamento do sr. Sieuve de Menezes aceito pela commissão — foi approvado.

Art. 12.°, 13.°, 14.°, 15.°, 16.° com os respectivos paragraphos —- successivamente approvados.

Art. 17.°

O sr. Vicente Carlos: — Sr. presidente, eu não posso aceitar a doutrina contida n'este artigo 17.° e seus dois primeiros numeros, porque entendo que contém uma manifesta injustiça.

Ficarem os proprietarios feitores, rendeiros ou colonos que estiverem collectados em algumas das contribuições, predial, industrial ou pessoal, sujeitos á contribuição da prestação de tres dias de trabalho por si e por todos os individuos varões válidos de dezoito a sessenta annos completos e que forem membros da sua familia ou domesticos e que residirem no concelho, é a meu ver uma injustiça proveniente da adopção de uma base que depende do acaso, de circumstancias e ás vezes da felicidade ou infelicidade dos individuos chefes de familia.

E não se pense da melhor fortuna ou soffrivel posição d'esses chefes de familia na sociedade quanto a haveres ou fortuna. Que todos os chefes de familia sejam obrigados a prestar por si ou por outrem á sua custa esse serviço dos tres dias de trabalho não estando comprehendidos nos §§ 1.° e 2.° do artigo, acho eu rasoavel, o contrario não porque o ter o chefe de familia muitos filhos ou muitos parentes ou creados vivendo comsigo, é cousa que não prova os seus meios de subsistencia para elle e para a familia, é uma cousa casual, e assim viria uma tal disposição a produzir a injustiça de muitos chefes de familia, aliás muito menos abastados que outros chefes de familia duplicada ou triplicadamente com mais haveres, serem obrigados a prestar duas, tres quatro vezes mais o serviço, que o chefe de familia mais abastado, mas felizmente com menos familia ou domesticos, virá a prestar, e comtudo ninguem dirá que esse chefe de familia mais abastado, mas com menos filhos ou domesticos, ha de tirar menos vantagens dos seus bens depois de feitas essas obras de estradas, de modo que é menos abastado chefe de familia, mas com mais familiares ou domesticos varões, vem a concorrer com maior contribuição por si e pelos seus, do que o chefe de familia mais abastado e com menos familia.

Quereria portanto que o sr. ministro e a illustre commissão lançassem mão de uma outra base que não desse estes resultados, ou que modificasse esta disposição de modo que desappareça esta injustiça.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Tenho a dizer ao illustre deputado que se não dá tal desigualdade e injustiça. A commissão não podia adoptar base alguma differente d'esta.

Os individuos que por esta lei são collectados são os habitantes das casas, e entram todos no computo para a contribuição que têem a pagar os chefes de familia. Se são indigentes cá têem o § 3.° que os isenta da contribuição, e se são jornaleiros cá têem tambem uma disposição no projecto a seu favor.

Como era possivel fazer aqui distincção do numero de filhos que tem cada pae para lhe impor mais ou menos obrigações? Não podia ser. Adoptou-se a regra geral, e depois attenua-se quanto é possivel. Os indigentes não pagam nada, e os jornaleiros têem dois dias de trabalho, emquanto os outros têem tres.

Esta contribuição vae o mais conforme possivel com a contribuição pecuniaria. Na contribuição pecuniaria o individuo que tem creados paga mais do que aquelle que os não tem, o que tem cavállos ou carruagens paga mais do que aquelle que não tem nada d'isto; aqui dá-se o mesmo caso, quem tem mais meios de trabalho paga mais do que quem tem menos.

Parece-me pois que, á vista d'esta explicação, o illustre deputado reconhecerá que não ha aqui a desigualdade nem a injustiça que se lhe afigurou.

O sr. Vicente Carlos: — Peço perdão ao illustre deputado para lhe dizer que os seus argumentos me não convenceram, e que eu não confundo a contribuição pessoal de que aqui se trata com as outras contribuições; conheço que são cousas diversas, e que aqui se trata do pessoal, mas nem assim deixo de achar injustiça n'esta disposição.

Pois não pôde mesmo, por calculo, um bom proprietario arrendar todos os seus bens, ficar com um creado apenas, e dando-se de mais a mais a circumstancia de ter poucos familiares varões, isentar-se assim do serviço que aliás teria de prestar se cultivasse as terras com seus creados de que precisava, e ficarem os seus caseiros sujeitos a prestarem muitos dias de serviço pelos varões familiares ou domesticos que têem comsigo e lhes são necessarios para fabricarem os bens do seu senhorio? E que differença de posição e de interesses ha entre o senhorio e os seus caseiros?

Diz o illustre deputado: «Lá estão os §§ 2.° e 3.° para os que são indigentes ou jornaleiros». Muito bem, mas para aquelles que nem são indigentes nem jornaleiros, mas sim caseiros, ou mesmo que têem alguns bens, mas poucos, e o seu rendimento não chega para os sustentar todo o anno, ou se chega não lhe sobra, para estes ahi está a desigualdade do serviço dependente da circumstancia se teria maior ou menor quantidade de filhos ou familiares varões, e a desigualdade entre estes e outros bons proprietarios.

O sr. Aragão Mascarenhas: — O illustre deputado está confundindo duas cousas muito diversas, está confundindo a contribuição pecuniaria com a contribuição do trabalho, e d'esta confusão é que provém a insistencia nas suas idéas. Se se tratasse da contribuição pecuniaria, tinha logar attender a todas as considerações de maior ou menor rendimento que o illustre deputado apresentou, para guardar a devida proporção no pagamento da contribuição; mas aqui trata-se do imposto sobre o trabalho e não sobre o rendimento, aqui trata-se do capital do trabalho; quem estiver em circumstancias de trabalhar, esse é que é o tributado. Se um homem tem quatro filhos e outro dois, como nós pretendemos impor dias de trabalho, se elles podem trabalhar, guardou-se ainda a proporcionalidade, porque cada um é tributado na proporção do capital trabalho que possue. O unico inconveniente que se podia dar é se o homem fosse invalido, se precisasse do seu trabalho para comer, se fosse indigente; mas estes são exceptuados na lei. O indigente que não possue capital trabalho, não é tributado.

Não insisto mais n'isto (apoiados), porque creio que a camara não precisará de mais explicações a este respeito.

O sr. Sieuve de Menezes: — Não impugno a materia do artigo. Assim como reconheço que é necessario que as camaras municipaes procedam á construcção das obras, tambem reconheço a necessidade de ter meios para as fazer.

A explicação que provocara do illustre ministro e sobre que chamava a sua attenção, era ácerca da disposição do n.° 2.°, que me parece não estar bem redigido, porquanto diz (leu.)

Ora o carro sem bois nao pôde andar. Então pedia ao nobre relator da commissão declarasse se os carros pagam contribuição com os animaes que vão juntamente, ou se é em separado.

O sr. Aragão Mascarenhas: — O nobre deputado sabe muito bem que quando se trata de carros e carruagens entende-se com animaes; mas sabe igualmente que tendo animaes para tiro, para alugar e para puxar, sem ter carros, é preciso que esses contribuam. Convenho em que se vote o artigo, salva a redacção.

E pondo se logo á votação o

Art. 17.°, salva a redacção — foi approvado.

O sr. Ayres de Gouveia: — Mando para a mesa um parecer da commissão de instrucção publica ácerca da academia polytechnica do Porto, para ser ouvida a commissão de fazenda.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Na ausencia do sr. presidente do conselho de ministros tenho a honra de mandar para a mesa a convenção postal entre o governo portuguez e o governo prussiano.

E a seguinte

PROPOSTA DE LEI N.° 76-A

Em cumprimento do disposto no artigo 10.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, venho apresentar vos a convenção postal, que acaba de ser celebrada entre Portugal e a Prussia.

Por ella observareis que ficam consideravelmente reduzidos os portes das correspondencias entre os dois paizes, o que muito deverá contribuir para o maior desenvolvimento das relações entre os subditos das duas coroas, principalmente entre aquelles que se dedicam ao commercio e industria.

Convencido pois o governo de Sua Magestade da utilidade de se levar a effeito esta convenção, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° E approvada, para poder ser ratificada pelo poder executivo, a convenção postal entre Portugal e a Prussia, assignada em Lisboa, pelos respectivos plenipotenciarios em 26 de abril de 1864.

Art. 2.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios estrangeiros, em 27, de abril de 1864. = Duque de Loulé.

Foi remettida á commissão diplomatica.

E pondo-se logo á votação o

Artigo 18.° e §§ — foi approvado.

Artigos 19.°, 20.°, 21.°, 22.°, 23.° e respectivos §§ — successivamente approvados.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Pedia a v. ex.ª que se continuasse na discussão do orçamento das obras publicas.

O sr. Presidente: — Continua a discussão do capitulo 6.° do orçamento do ministerio das obras publicas.

O sr. Bivar (sobre a ordem): — Vou ler a minha moção de ordem (leu).

Não se trata de introduzir no orçamento uma despeza nova; mas trato unica e simplesmente de consignar uma verba da verba total destinada para melhoramentos de barras e rios, que vem no mappa da despeza extraordinaria do estado, com applicação ás obras da barra de Villa Nova de Portimão, e não é uma applicação nova que peço.

Chamo a attenção do sr. ministro das obras publicas sobre as considerações que vou fazer.

Até agora o governo tinha assentado depois de estudos feitos para os melhoramentos do porto de Villa Nova de Portimão, que se applicassem os trabalhos de uma draga para o profundamento do fundeadouro. Acontecia que as despezas feitas com essa draga, eram pagas por conta do estado, pela verba marcada no nosso orçamento para melhoramentos e obras da barras e rios no continente do reino. Examinando-se contas do ministerio das obras publicas, vejo que com o trabalho d'essa dragagem se gastavam pouco mais de 6:000$000 réis annualmente.

Entendeu-se agora, depois que a lei de 7 de julho de 1862 decretou o começo de certas obras n'aquelle porto, e marcou que para ellas se levantasse um imposto especial que é o consignado na tabella da lei que acabo de referir, que pelo ministerio das obras publicas se não paguem as despezas d'essas dragagens, e mandou que ellas sáiam do imposto especial.

Segundo o que vejo na secção 8.º do capitulo 6.° do ministerio das obras publicas, este imposto está computado em 9:751$787 réis.

Desde o momento em que só para as dragagens se tira a quantia de seis contos e tanto, o importe d'esta obra, segundo as contas do ministerio das obras publicas de 1862 e 1863, é de 6:858$000 réis; já vê V. ex.ª que pouco pôde restar do imposto, e não é á custa só do imposto local que uma obra de utilidade publica, como esta, se deve fazer.

Quando vejo que as obras da barra da Figueira, da barra de Vianna e mesmo da barra de Aveiro, alem do imposto especial têem tambem subsidio consignado pela receita geral do orçamento, parece-me que as obras da barra de Villa Nova de Portimão não devem ser exceptuadas; e que portanto o governo deve da verba destinada para melhoramentos de portos e barras, deduzir esta quantia, para que não seja desfalcada a importancia do imposto especial.

Alem d'isso, se se addicionar esta verba que peço, e que não é disposição nova que pretenda introduzir no orçamento, porque o que simplesmente se determina é que da verba geral se tire esta quantia para estas obras especiaes; nós conheceremos que aquellas obras ficarão n'este caso dotadas com um rendimento annual de 15:000$000 ou cerca de 16:000$000 réis.

Ora, o governo pela lei de 7 de julho de 1862 ficou auctorisado a levantar por emprestimo as sommas necessarias

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para estas obras, e marcou-se lhe o meio por que o devia fazer, os juros que deveria pagar, etc. Todas as condições necessarias para que o governo sobre o imposto creado podesse levantar as sommas necessarias a fim de se effectuarem estas obras, foram estabelecidas n'essa lei, e por conseguinte o governo está no caso de poder levantar uma somma crescida por meio de emprestimo, e applica-la a estas obras, do que resultará que ellas hão de caminhar com mais promptidão, promptidão que é necessaria, porque em obras d'esta ordem não devemos ir tão devagar, quando não só depois de muitos annos poderemos tirar d'ellas proveito.

Já vê pois a camara qual é o meu fim. E que as obras da barra de Villa Nova de Portimão sejam subsidiadas como o são todas as outras, e que a somma que até agora o governo applicava para pagamento das dragagens que se faziam n'aquelle porto, continue a ser applicada da mesma fórma, e que não seja o custo d'estas dragagens deduzido do imposto especial. O meu desejo é que esta despeza especial saia da verba destinada para o melhoramento dos rios e portos, de sorte que as obras da barra de Villa Nova de Portimão, alem da dotação especial, tenham tambem parta da dotação geral. Isto daria o resultado de haver um rendimento annual que habilitasse o governo a levantar um emprestimo, e a proporcionar-lhe os meios de dar o desenvolvimento devido a uma obra d'esta ordem. Devendo ainda notar que é sabido que, quando pouco dinheiro se gata em trabalhos hydraulicos, quando se foge ás despezas, quasi sempre este gasto é uma pura perda.

Desejava que o sr. ministro das obras publicas attendesse a este negocio, e que, uma vez que tinha mostrado tão grande solicitude pelos interesses do Algarve, como mostrou pela apresentação da proposta de lei que ha dois dias mandou para a mesa, attendesse tambem a um dos principaes portos do Algarve, e que seria de grande conveniencia dar á lei o desenvolvimento que ella naturalmente deve ter em beneficio da causa publica.

Demais, a estrada chamada do litoral está em construcção, e essa estrada é cortada pelo rio que passa junto de Villa Nova de Portimão. A lei de 7 de julho de 1862 ordena que se construa uma ponte que ha de ligar estas duas partes da estrada que se acham interceptadas pelo rio. Chamava por isso tambem a attenção do sr. ministro das obras publicas, a fim de que s. ex.ª mandasse fazer os devidos estudos para a construcção d'esta ponte, a qual se deverá fazer logo que o governo julgue conveniente que se faça.

Não pretendo arvorar-me em indicador das diversas obras que ha a construir, mas não posso tambem deixar de notar que esta ponte é essencial, porque logo que se construir a estrada litoral, ella fica interceptada pelo rio, o que de maneira alguma póde ser conveniente.

S. ex.ª sabe muito bem que se tem estudado este negocio por mais de uma vez. Primeiro tratou-se de uma ponte pensil, e o conselho das obras publicas entendeu que não era esse o systema mais conveniente. Mandou-se depois estudar o systema de uma ponte de barcas, e depois ainda o systema de uma ponte de ferro assente sobre pilares de cantaria, e mais tarde entendeu se que este systema não era bom e que outro havia melhor.

N'este ponto acabaram os estudos, e eu pedia ao governo que indicasse ao engenheiro que está á testa dos trabalhos n'aquelle districto, que continuasse n'estes estudos, a fim de se ver se se approvava um estudo ou um plano para a construcção d'esta ponte, porque sem estar applicado o plano, segundo o qual a ponte ha de ser construida, está claro que ella nunca se póde edificar.

Pedia por isso ao nobre ministro que desse as suas ordens para que este estudo se fizesse. O official está n'aquella localidade e creio que não custa dinheiro este trabalho, porque ao mesmo tempo que está dirigindo as obras, póde fazer esse estudo sem que d'ahi venha encargo para o thesouro.

Solicitava pois do nobre ministro e da illustre commissão que tivessem esta proposta na devida consideração, porque ella tende a dar desenvolvimento a uma obra, e é sabido que as obras uma vez começadas é necessario progredir n'ellas com um certo desenvolvimento, aliás o dinheiro que se gastar será uma pura perda.

Desejava tambem que o sr. ministro das obras publicas, quando tomasse a palavra, me dissesse se está ou não na disposição de, sobre este imposto e mesmo sobre qualquer subvenção, tirada da receita especial, com que o estado quizesse acudir a esta obra, empregar todos os seus esforços para que se possa levantar um emprestimo que se applique ás obras mencionadas na lei de 7 de julho de 1862, a fim de poderem continuar com mais actividade e de que proveitosamente se gastem as sommas que lhes são destinadas na mesma lei.

Limito aqui as minhas observações.

Quando s. ex.ª houver por bem responder me fallarei mais detidamente sobre este negocio.

Leu-se logo na mesa a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que ao capitulo 6.° do ministerio das obras publicas se addicione a quantia de 6:000$000 réis, tirada da verba destinada para melhoramentos de portos e rios, com applicação ás obras da barra de Villa Nova de Portimão. = Bivar.

Foi admittida.

O sr. Julio do Carvalhal: — Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas, a fim de que seja ainda hoje remettido para a imprensa.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje; e mais os projectos n.°s 71 e 72 de 1864; n.° 87 de 1862 e n.° 54 de 1864.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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