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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Eu não reclamo, mas o que vi manifestar-se foi o espanto de partir da presidencia do conselho de ministros uma declaração, que eu logo declarei falsa, e que, se fosse verdadeira, não seria menos estranhavel nem menos inconveniente. Tal declaração, nova n'esta casa, nenhum ministro a podia fazer, e sem provas só o sr. marquez d'Avila era capaz de a fazer.

O sr. Presidente: — Peço licença ao sr. deputado para lhe repetir a observação que fez, de que não está presente o sr. presidente do conselho. V. ex.ª é bastante cavalheiro e energico, e preferirá esperar pela presença do sr. ministro para fallar em frente de s. ex.ª

O Orador: — Esse era o meu maior desejo e tambem o meu maior prazer, creia o v. ex.ª E é essa tambem a unica rasão por que eu aguardei hontem com paciencia, que me não é habitual, o comparecimento do sr. marquez de Bolama n'esta casa antes de se entrar na segunda parte da ordem do dia. Mas, como ha pouco disse, s. ex.ª demorou-se de proposito nos corredores da camara exactamente até ao momento de se entrar na segunda parte da ordem do dia, occasião em que eu não podia fallar; e visto que hoje não comparece antes, eu não posso deixar de fallar na sua ausencia.

Peço a v. ex.ª e á camara que se note, que eu sou forçado pelo sr. presidente do conselho a entrar n'estas considerações na sua ausencia. Não é pequeno o pesar que eu sinto por essa ausencia, e repito que o meu maior desejo era fallar na presença de s. ex.ª Se elle estivesse presente, eu havia de ser mais extenso e mais severo nas minhas apreciações.

Alem d'isso desde que o sr. ministro do reino collocou as questões n'uma posição especial, que eu aceito plenamente, v. ex.ª, sr. presidente, póde, creio eu, ser muito mais benevolo para qualquer de nós, e consentir que em relação um ao outro possamos fallar sem guardarmos completamente certas attenções, e sem nos exagerarmos nas sempre louvaveis cortezias parlamentares.

V. ex.ª sabe que estes principios foram estabelecidos pelo proprio sr. ministro do reino. Emquanto s. ex.ª fallou, empregou as palavras que quiz, contra as quaes alguns dos meus collegas reclamaram. Mas eu não reclamei contra palavra nenhuma que elle proferisse, não tenho a menor tenção de reclamar, e Deus me livre de o fazer.

Desde que o sr. ministro do reino estabeleceu como regra que póde negar qualquer cousa que eu affirmo, dispensando-se de apresentar quaesquer provas; desde que s. ex.ª estabeleceu o principio de que o paiz julgará entre as affirmativas contrarias de ambos nós, eu aceito a questão n'este terreno, não exijo documentos a s. ex.ª, não os apresento tambem, e n'aquelles pontos que não sejam comprovados com documentos fico satisfeito porque o paiz julgará entre ambos nós. Affirme s. ex.ª o contrario do que eu affirmo, eu não escolho juizes, e não temo a decisão, seja quem for que decida.

Disse eu em um áparte, que era falso o que s. ex.ª affirmava; e as notas tachygraphicas supprimiram uma outra palavra—falsíssimo — que eu pronunciei. Eu declarei — é falso e falsissimo. E o que disse é o que repito e o que sustento.

O sr. ministro do reino respondeu que de aqui em diante, quando'lhe fizessem pedidos d'aquella natureza, havia ter o cuidado de os exigir escriptos e assignados.

Creio que isso sempre se fez, e por esta occasião, ainda que não venha muito a proposito, eu declaro a v. ex.ª que nunca tive pretensões a ostentar um catonismo absoluto. Muitas vezes, com ministros com quem tenho tido relações, que nunca tive nem hei de ter com o actual sr. ministro do reino, tenho-me encarregado de lhes mostrar a conveniencia ou a justiça de serem dadas algumas distincções honorificas, fundamentando esses pedidos com as provas e documentos que mostrassem os merecimentos d'aquelles individuos que pretendiam ser agraciados.

Eu tenho feito isto algumas vezes, confesso-o sem difficuldade, e não me arrependo de o ter feito. Não sei se todos os meus collegas que me ouvem o têem feito tambem, mas se não o têem feito, têem pelo menos visto outros faze-lo, e sabem perfeitamente como isto se faz.

Ninguem ignora que quando se faz um pedido d'esta ordem, entrega-se ao ministro um memorial escripto, com o nome da pessoa a agraciar, e apontando-se os serviços que tem para se lhe poder conceder essa graça. Este memorial é sempre assignado pela pessoa que o apresenta, e fica archivado no ministerio do reino, juntamente com os papeis em que a graça se funda, para que a todo o tempo o ministro fique com a garantia de puder saber quem foi a pessoa que lhe fez o pedido, a qual moralmente responde por qualquer duvida que possa suscitar-se a respeito dos serviços ou do merecimento do individuo que assim foi agraciado.

Estes pedidos, todos o sabem, nunca se fizeram por outra maneira. N'estas circumstancias eu posso usar e uso pela segunda vez do argumento ad exhibendum. Se o facto é verdadeiro, o documento ha de existir por força no ministerio do reino ou nas mãos de s. ex.ª Se existe, apresente-o; se não existe, s. ex.ª não tem direito nenhum a que se acredite a sua asserção. Se a sua asserção fosse verdadeira, por força s. ex.ª havia de ter o documento na sua mão.

Eu tenho ainda outros motivos, outros fundamentos para affirmar que aquella asseveração não é verdadeira.

O sr. marquez d'Avila era presidente do conselho quando eu vim pela primeira vez a esta casa, e presidia a um ministerio que eu apoiei por muito tempo, e que desejaria poder sempre apoiar. S. ex.ª foi n'esse tempo, mesmo em publico, aqui n'esta camara, excessivamente amavel para commigo, e tão excessivamente, que uma vez cheguei a ponto de me julgar aqui um pouco envergonhado da manifestação da sua benevolencia. Todavia nunca tive nem procurei ter com s. ex.ª relações proximas; nunca entrei em sua casa; até 1868 apenas o conhecia de nome, e depois de 1868 nem uma só vez entrei no gabinete de s. ex.ª quando s. ex.ª tem sido ministro.

Em 1868, epocha a que s. ex.ª se referia de certo, porque agora eu nem com elle fallo, n'essa epocha, quando o sr. marquez d'Avila era presidente do conselho, era tambem ministro o sr. Dias Ferreira, com quem eu tenho as mais intimas relações de amisade. Este facto demonstra a toda a luz da evidencia, que se eu n'esse tempo tivesse alguma pretensão, não me dirigiria ao sr. marquez d'Avila, com quem não tinha relações nenhumas, e ter-me-ía dirigido ao meu amigo o sr. Dias Ferreira, com o qual sempre estive em convivencia estreita e de todos os dias.

Eu affirmei e affirmo que a asserção de s. ex.ª era falsa, e estou no meu pleno direito para o affirmar, porque no caso de ser verdadeira, s. ex.ª havia de ter um documento escripto que a comprove, e sem o exhibir não póde ser acreditado.

Ha aqui porém um ponto mais grave. Depois de s. ex.ª ter affirmado que eu tinha pedido uma certa condecoração e depois de ter declarado quem era a pessoa para quem eu a pedia, acrescentou o seguinte. «Eu entendo que se não deve prostituir o cofre das graças, e nenhum ministro tem zelado mais do que eu o que elle contém. Graças não são para distribuir com mão aberta, caiam sobre quem caírem. Não me atrevi nunca a apresentar ao chefe do estado decreto algum de tal natureza, sem que tivesse a convicção de que a pessoa a quem o decreto se referia era digna da graça concedida, por qualquer circumstancia que a tornasse recommendavel.

Tendo s. ex.ª declarado que eu tinha pedido uma graça para uma pessoa que me era inteiramente ligada, e acrescentando em seguida que só concedia graças a quem as merecia, porque entendia que não se podia prostituir o cofre das graças, póde deduzir-se d'aqui uma insinuação mais ou