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SESSÃO DE 18 DE MAIO DE 1885 1615

representar n'esta casa, e affecta graves e importantissimos interesses dos meus constituintes.
Em uma das sessões passadas o illustre deputado, o sr. Carlos Lobo d'Avila, disse, em paraphrase coneeituosa, que a amizade dos srs. ministros pelos seus amigos não devia ir ate ao ponto de sacrificar-lhes a bolsa do contribuinte.
Eu digo, em paraphrase igualmente conceituosa, que a minha amizade pelos srs. ministros não vae até ao ponto de sacrificar lhes os legitimos direitos e interesses dos que me elegeram. Digo-o e sinto-o.
Ora, apesar d'esses legitimos interesses terem sido gravemente lesados pelos despachos contradictorios do ministerio da marinha, eu não levantaria a questão n'esta casa, não me occuparia d'ella, se não a encontrasse já levantada por um illustre deputado, a quem respeito muito, mas que representa n'esta casa as queixas d'aquelles a favor dos quaes têem sido proferidos esses despachos contradictorios e impossiveis.
E sabe v. exa. porque?
Porque eu creio que isso pouco aproveitaria a causa dos queixosos.
Mas, como a questão foi levantada por um collega meu e não por mim, eu entro n'ella, só com o intuito de a expor como ella é, e assim desaggravar aquelles que têem sido e estão sendo victimas d'aquelles despachos.
Bem sei que vale pouco o desaggravo perante a importancia dos interesses de quem, inutilmente, tem requerido da sua justiça; mas mal pareceria que eu ficasse silencioso quando represento nesta casa os que estão verdadeiramente esbulhados dos seus direitos, apesar de eu ter empregado todas as diligencias junto do sr. ministro da marinha para que justiça lhes fosse feita.
Não terá sido por falta de boa vontade da parte do s. exa., quero crel-o, mas certo e que todas as minhas diligencias têem sido infructiferas.
Disse eu, sr. presidente, que são contradictorios e impossiveis os despachos que têem sido proferidos pela secretaria da marinha, e disse muito intencionalmente pela secretaria da marinha, porque, verdade, verdade, imagino que o sr. ministro da marinha tem andado nesta questão da pesca do atum como uma especie de Pilatos no credo. (Riso.)
Eu sei que s. exa. me vae logo responder com a responsabilidade legal, mas eu sou d'aquelles homens que entendem que as responsabilidades legaes devem sempre ceder o passo as responsabilidades reaes.
Não venho accusar nenhuma estação official, porque nenhuma tem responsabilidade parlamentar; mas, se a não venho accusar, tambem não lhe venho fazer elogios nem tecer-lhe dithirambos para a dispôr em meu beneficio. Nem uma nem outra cousa farei. Não censuro as estações officiaes, porque não cabe a censura na minha alçada; tambem não quero pelos meus louvores merecer-lhes as boas graças.
Quero e devo unicamente expôr á camara o estado da questão, que e importante, que e grave, porque affecta uma das industrias mais importantes do paiz, implica com valiosissimos capitaes e póde contender com o pão e subsistencia de centenares de familias.
A questão das pescarias d'atum, no Algarve, como v. exa. sabe, e antiga, mas nos ultimos dez annos tem tomado um caracter mais serio e complicado.
A sua importancia tem subido extraordinariamente de ponto, em vista da enorme procura que tem tido o atum nos mercados estrangeiros, e por virtude dos processes de prepare que as fabricas de conservas italianas têem vindo estabelecer no paiz.
Era este um assumpto que devia ter chamado a attenção dos governos, mas bem se importam os governos com as industrias do paiz!
A medida mais notavel que o poder central publicou a este respeito foi a celebre portaria do sr. Mello Gouveia 1882, em virtude da qual se riscaram com um traço de penna todos os direitos adquiridos aos pescadores do atum e a todas as emprezas de pescarias.
Lembro-me perfeitamente que, quando se publicou aquella portaria, eu fui expor ao sr. Mello Gouveia a grave injustiça e os inconvenientes crueis da sua doutrina. A todas as ponderações que eu fazia s. exa. limitava-se a dizer-me: que o que estava feito, estava feito. Depois de largas considerações, s. exa. concluiu que em vista do modo como eu argumentava lhe parecia que eu era um jurisconsulto, mas que elle não mudava, porque era um...casmurro (Riso.)
E ficámos n'isto.
Não ha nenhuma disposição de lei ácerca de licenças ou concessões de pescarias no Algarve.
É claro que o mar e do dominio publico e todo o cidadão tem o direito do pescar nas suas aguas; mas ao governo, como administrador das cousas publicas, incumbe fazer os regulamentos necessarios para que o exercicio do direito d'uns não prejudique o exercicio do direito dos outros.
Mas nem isso mesmo se tem feito. Nem leis nem regulamentos
Por junto, algumas portarias, que são outros tantos despachos sobre casos correntes.
Muitas vezes uns despachos vão do encontro a outros, e nem isso admira, porque o ministerio da marinha e um verdadeiro pandemonio do negocios. É quasi impossivel que um ministro tenha competencia para cuidar e saber de todos os assumptos especiaes de todas as repartições.
E n'este assumpto especial, como nem ha lei nem jurisprudencia assentada, resulta que as pretensões succedem-se umas s outras, accumulando se uns sobre outros os despachos que as resolvem, despachos muitas vezes contradictorios e muitas vezes proferidos com prejuizo dos requerentes.
N'esta questão de pescarias é preciso contar-se com a situação topographica dos sitios onde se faz a pesca, e com a natureza especial d'esta. Todos sabem que a costa do Algarve corre na direcção do rumo noroeste, e que e uma linha sinuosa com saliencias e reintrancias.
O atum vem dos mares do norte, e no percurso da sua emigração, por motivos que não sei explicar, segue invariavelmente, depois de dobrar o cabo de S. Vicente, na direcção da costa do Algarve, a internar-se no Mediteraneo, d'onde volta passados poucos mezes. Ou porque a alimentação no Mediterraneo seja mais adequada n'esta epocha do anno, eu porque a temperatura das aguas mediterraneas seja mais propicia á desova, seja porque motivo for, certo é que invariavelmente o peixe segue este caminho. De maneira que ha duas especies de pesca: a de direito, e a de revez, e, correspondentemente, duas especies de armações com os mesmos nomes.
Chamam-se armações de direito, porque as armações collocadas nas costas do Algarve para colher o peixe no seu caminho para o Mediterraneo têem de lançar as suas guias ou quarteis de fóra para a direita. Dizem-se de revez as outras destinadas a colher o peixe quando volta do Mediterraneo, e que por isso têem de lançar em sentido opposto.
Eu faço estas explicações, porque o sr. ministro da marinha, no anno passado, chamou a Pedra da Galé uma armação de revez. É de direito mas não admira que s. exa. não tenha completo conhecimento deste assumpto.
Mas, posto isto, é claro e comprehende-se deseja, que nas armações de direito nunca a que esteja a este pode prejudicar a que estiver a oeste, e, pelo contrario, a que ficar a oeste pode sempre prejudicar as que ficarem a este.
Dada esta explicação ácerca do rumo da costa, do curso do peixe e da natureza das armações, é obvio que a armação da Pedra da Galé que esta a oeste das da Oira, Forte e Vallongo, nunca póde, em caso algum, ser prejudicada por estas e sim estas por aquella.